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COMPREENDENDO O DHARMA

ESTUDO COMPARADO DE RELIGIÃO E ESPIRITUALIDADE

LÚCIO VALERA
(Loka Sākṣi Dāsa)

BHAKTI RASA VEDĀNTA


Estudos e informações

Pindamonhangaba
2020

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COMPREENDENDO O DHAMA
ESTUDO COMPARADO DE RELIGIÃO E ESPIRITUALIDADE

RELIGIÃO E DHARMA
O que significa religião? Significa quase tudo, porque as religiões dizem res-
peito à totalidade da vida, abordando as questões mais básicas da existência.
Mesmo as ciências naturais eram originalmente religiosas; somente nos úl-
timos trezentos anos religião e ciência se separaram como caminhos de co-
nhecimento. (Bowker, 1997, p. 6).
Segundo Klaus Hock, “um dos problemas na definição do termo ‘religião’ reside
no fato de que o próprio termo nasceu num contexto cultural e histórico muito especí-
fico – num primeiro momento, pertence à história intelectual ocidental” (Hock, 2010, p.
17). Inclusive não encontramos uniformidade na definição e uso desse termo.
Entre nós, do Ocidente, religião remonta à palavra latina religio, que lhe dá o
sentido de “atuação com consideração” ou “observância cuidadosa”. Para os romanos,
a palavra religio implicava tanto exatidão ritual como atuação correta no ato religioso
(Hock, 2010, p. 17-18). Hock, portanto esclarece que:
Cícero (106-43 a.C.), em seu tratado De natura deorum (Sobre a natureza dos
deuses) define religio como cultus deorum, ou seja, como “culto aos deuses”,
como “cultivo” ou “adoração” dos deuses, estando em evidência o compor-
tamento ritual correto... Cícero expressa a compreensão romana de “reli-
gião”, conforma a qual se trata na religião menos de crer corretamente do
que de realizar corretamente os atos dirigidos aos deuses – portanto, a reli-
gião romana caracteriza-se não pela ortodoxia, mas pela ortopraxia (Hock,
2010, p. 18).
Quanto à religião ter vindo de religare, devemos isso a Lactâncio (século III/IV),
que deriva religio de religare “ligar (amarrar)”, “ligar de novo” e “ligar de volta. Contudo,
será Agostinho (354-430) que adotará essa definição e descreverá a religio vera, “reli-
gião verdadeira”, como aquela que é orientada pelo zelo de “reconciliar” e “ligar de
volta”, visto que “a alma que se afastou de Deus ou se desgarrou dele” (Hock, 2010,
p.18). Lactâncio, dessa forma, redireciona o termo religio para exprimir tanto o conceito
da transcendência segundo o pensamento cristão, quanto a natureza da relação de fé
instaurada pelo cristianismo entre o nível humano e o divino.
Apesar de Agostinho (séc. IV d.C.) inicialmente tentar conciliar os dois conceitos
anteriores dando a religio um outro sentido, o de religere “reeleger” (como retorno à
Deus), no fim ele volta e retoma a leitura de Lactâncio (que, a partir daí, acabou se im-
pondo), exortando o homem a tender para Deus, entregando a Ele a própria alma. A
partir daí a ideia de que religio significa religare, ou seja, uma ligação baseada na sub-
missão e no amor entre o homem e Deus se estabeleceu. São Tomas (séc. XII d.C.) nada
mais fez do que seguir e aprofundar esse conceito estabelecido do Lactâncio e Agosti-
nho.
A definição de religião, segundo o termo latino, assumida inquestionavelmente
pela tradição cultural do Ocidente, é algo recente. Nos evangelhos – e em todo o cânon

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– não aparecem nem o termo “religião”, nem outros equivalentes: Jesus proclama-se
como o “caminho, a verdade e a vida” (Jô 14,6).
Outras religiões também se expressam utilizando outros termos ligados ao con-
ceito de “caminho”. Na região da mesopotâmia temos o termo gischar “regra moral” e
no Egito a palavra maat “essência da existência”, “justiça”.
No Oriente, encontramos a noção de dharma no budismo, que é uma espécie de
guia para a pessoa alcançar a verdade e a compreensão da vida. Pode ser chamado tam-
bém de "lei natural" ou "lei cósmica". Essa noção de “caminho” e “lei cósmica” também
está presente no tao, na visão china do universo, que integra elementos da religião po-
pular arcaica, do taoísmo, do confucionismo e do próprio budismo estrangeiro. Tudo
isso nos leva a uma definição de religião como busca de harmonia ou equilíbrio consigo
mesmo, com a natureza e com o cosmos.
Nesse ecletismo chinês, podemos identificar um tipo de monismo orientado para
a unidade (Neville, 2005, p. 64), mas, que não se relaciona com a noção teísta ocidental
de uma Divindade totalmente transcendente e de um “Eu” monista substancial que dá
consistência a tudo, nem com o negativismo niilista do budismo. O chinês vê positiva-
mente os processos de interação com a vida (Neville, 2005, p. 93-94).
Na Índia temos o conceito arcaico de ṛtu “fundamento ou ordem cósmica" – en-
sinado no Ṛg Veda – e de dharma, “lei ou dever divino”. Na tradição védica, dharma
indica a conduta virtuosa que preserva a ordem cósmica bem como o dever que harmo-
niza a pessoa com a sua família, com a sociedade, com o universo, e finalmente com sua
verdadeira natureza de "servo eterno da Divindade" sanatana-dharma.
DHARMA – O MARCO DA VIDA HUMANA
O sábio Jaimini, em sua hermenêutica dos textos védicos, quando afirma
athāto dharma-jijñāsā, “agora, então, devemos indagar sobre o dharma” (Mīmāṁsā-
sūtra, 1.1.1), estabelece a importância de da ação (karma) correta em concordância
como o dharma, como o primeiro e básico ensinamento dos Vedas para a humani-
dade. Dessa forma, segundo a tradição védica, o dharma se apresenta como o fator de
distinção entre a vida humana e existência animal.
āhāra-nidrā-bhaya-maithunaṁ ca
sāmānyam etat paśubhir narāṇām
dharmo hi teṣām adhiko viśeṣo
dharmeṇa hīnaḥ paśubhiḥ samānaḥ
“Comer, dormir, temer (defender-se) e ter vida sexual, é algo comum tanto
para os animais como para os seres humanos. A característica específica
(viśeṣa) que distingue o homem dos animais é a consciência do dharma, ou
religião. Sem dharma não há diferença alguma entre os homens e os ani-
mais” (Hitopadeśa, 1.25; Cāṇakya-neti, 17.15).
O que seria esse dharma? Derivada da raiz verbal dhṛ "suportar, sustentar, man-
ter, firmar", a palavra dharma tem o sentido de “dever” ou de “aquilo que mantém”. O
Mahābhārata explica que: dhāraṇā-dharma ity āhur dharmo dhārayati prajāḥ, “Aquilo que
sustenta, aquilo que mantém juntos as pessoas, isso é o dharma” (Mahābhārata, Karṇa
Parva, 69.59).

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Dharma refere-se à natureza ou ao caráter intrínseco de qualquer coisa ou subs-
tância (vastu). Dessa forma, podemos falar do dharma de objetos, plantas ou animais. O
dharma do fogo, então, seria aquecer ou iluminar e o da água seria solver, fluir. No seu
sentido metafísico, o dharma eterno do ser humano, como parte integrante. do Absoluto
(o Brahman), seria servir ao Todo, servir ao Senhor Supremo.
Geralmente se traduz dharma como “lei”, “dever”, “conduta prescrita”, “vir-
tude”, “preceitos éticos” e até mesmo “religião”, o termo também significa “natureza”,
“condição peculiar” ou “qualidade essencial”. Śrīla Prabhupada define dharma como
“ocupação”, porque, segundo ele, o significado básico da palavra dharma é “aquilo que
sustém a existência de alguém” (Prabhupada, 1995, tomo 1.1, p. 105). Isso é corrobo-
rado pelo Mahābhārata: dhāraṇād dharma ity āhur dharmo dhārayati prajāḥ, “O que
suporta, o que mantêm as pessoas juntas, é o dharma” (Mahābhārata, Karṇa-parva,
69.59).
Portanto, no mundo material o dharma se apresenta na forma de diferentes
ocupações ou deveres segundo o status da consciência da entidade viva. Nos seres hu-
manos ações (karma) influência das leis da natureza (os guṇas) – o homem está sujeito
a determinadas tendências que os levariam a estabelecer diversos objetivos existen-
ciais.
PURUṢĀRTHA- AS METAS DA VIDA HUMANA
A vida humana, conforme o status de sua consciência – o que é determinado
pelos seus atos (karma) e pela influência das leis da natureza (os guṇas) – o homem
está sujeito a determinadas tendências que os levariam a estabelecer diversos objeti-
vos existenciais. Esses objetivos específicos, conhecidos como puruṣārthas ou interes-
ses (artha) dos seres humanos (puruṣa). Esses “objetivos seriam quatro:
1) Dharma - religiosidade ou harmonia com as leis morais ou da natureza;
2) Artha - desenvolvimento econômico ou segurança material;
3) Kāma - prazer ou gratificação dos sentidos; e
4) Mokṣa - libertação ou emancipação da matéria.
Podemos considerar dharma como valor moral, artha como valor econô-
mico, kāma como valor psicológico e mokṣa como valor espiritual. Todos eles são con-
siderados vitais e integrados em um esquema de valores que dão sentido e valor à
existência humana.
dharmārtha-kāma-mokṣāṇāṁ
yasyaiko’ pi na vidyate
ajāgalas tan asyeva
tasya janma nirarthakam
“A vida de quem não tem religião (dharma), riqueza (artha), prazer (kāma)
e perspectiva de salvação (mokṣa) é sem propósito, como as tetas no pes-
coço de um bode” (Hitopadeśa, 1.26; Cāṇakya-neti, 13.9).

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Quem observa o dharma, levaria uma vida segundo os rituais e deveres religio-
sos, em harmonia com o Cosmos e suas leis. Nesse ponto a ética védica seria a dos sa-
crifícios, pois eles garantiriam e se identificavam com a harmonia cósmica; asseme-
lhando de alguma forma com a ética cósmica encontrada no Epicurismo. Essa vida, en-
tretanto, seria “proativa” no dharma e se distinguiria da vida meramente “reativa”
no karma. Ela possibilitaria a obtenção de artha, desenvolvimento econômico. Conse-
quentemente, quem obtém artha pode ir buscar kāma a satisfação de seus desejos.
Os três primeiros puruṣārthas (dharma, artha e kāma) não são finais ou perma-
nentes, pois tratam principalmente da religião material, do desenvolvimento econô-
mico, da satisfação dos sentidos e não podem satisfazer as necessidades perenes da
alma. Portanto, quem progressivamente passa por eles e realiza que seus frutos são
transitórios, chega a um estado de esgotamento material e sede de transcendência.
O desgosto e frustração pela mediocridade da existência material levariam en-
tão à busca de liberação ou emancipação espiritual. A busca da superação da existên-
cia material temporária chama-se mokṣa. Seria o quarto puruṣārtha, que é eterno e fi-
nal. Isso é corroborado por Patañjali Muni, o famoso expoente do sistema de yoga,
que declarou e seus Yoga-sūtras:
puruṣārtha-śūnyānāṁ guṇānāṁ pratiprasavaḥ
kaivalyaṁ svarūpa-pratiṣṭhāyā citi-śaktir iti
“A liberação ocorre quando se cumpre as metas da vida humana (pu-
ruṣārthas) e transcende-se a influência dos guṇas (os modos da natureza);
os guṇas retornam à sua fonte e a consciência situa-se em sua própria natu-
reza” (Yoga-sūtras. 4.34).
Mokṣa, também significaria união mística com a Divindade. Essa união ou co-
munhão seria de dois tipos: 1) Kaivalya - a absorção da alma individual, com perda da
sua individualidade, na unidade ontológica do Ser, que é a “mística do ser”; e
2) Prema - a comunhão da alma individual, com retenção da sua individualidade, com
Deus, que é a “mística do amor”.
PARAMA-PURUṢĀRTHA – A META SUPREMA
Da mesma forma que no Cristianismo, na tradição bhakti do Vaishnavismo con-
sidera que a graça salvadora da Divindade propiciaria um quinto puruṣārtha. Ele apesar
de ser também considerado como uma variante de mokṣa “salvação”, como
prema (amor espiritual), mas a condição soteriológica e o bem último (śreyas) por ex-
celência. Prema, como a “mística do amor” estaria bem além da elevação ao Paraíso –
obtido por meio do karma –, e da salvação em mokṣa – obtido por jñāna –, onde a
alma individual se fundiria na existência impessoal da Divindade.
Consequentemente, acima dos quarto puruṣārthas o amor místico de Deus si-
tuar-se-ia supremo, como o parama-puruṣārtha “a meta suprema da vida”. Essa meta
suprema é explicada no Śrīmad-Bhāgavatam:
sa vai puṁsāṁ paro dharmo
yato bhaktir adhokṣaje
ahaituky apratihatā
yayātmā suprasīdati

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“A suprema ocupação [dharma] para toda humanidade é aquela pela qual os
homens possam atingir o serviço devocional amoroso ao Senhor transcen-
dental. Este serviço devocional tem de ser desinteressado e ininterrupto para
satisfazer o eu completamente” (Śrīmad-Bhāgavatam, 1.2.6).
vāsudeve bhagavati
bhakti-yogaḥ prayojitaḥ
janayaty āśu vairāgyaṁ
jñānaṁ ca yad ahaitukam
“Aquele que presta serviço devocional à Personalidade da Divindade, Śrī
Kṛṣṇa, imediatamente adquire conhecimento sem causa e desapego do
mundo” (Śrīmad -Bhāgavatam, 1.2.7).
dharmaḥ svanuṣṭhitaḥ puṁsāṁ
viṣvaksena-kathāsu yaḥ
notpādayed yadi ratiṁ
śrama eva hi kevalam
“As atividades ocupacionais [dharmas] executadas por um homem de acordo
com sua própria posição não passam de esforços inúteis se não provocam
atração pelas mensagem da Personalidade da Divindade” (Śrīmad -Bhāgava-
tam, 1.2.8).
dharmasya hy āpavargyasya
nārtho 'rthāyopakalpate
nārthasya dharmaikāntasya
kāmo lābhāya hi smṛtaḥ
“Todos os deveres ocupacionais [dharmas] destinam-se certamente à liber-
tação última. Nunca devem ser executados em troca de ganho material. Além
disso, segundo os sábios, alguém que esteja engajado no serviço ocupacional
não deve de forma alguma usar o ganho material [artha] para cultivar o gozo
dos sentidos [kāma]” (Śrīmad-Bhāgavatam, 1.2.9).

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DHARMA COMO CAMINHO PARA DEUS
A Bhagavad-gītā se nos apresenta praticamente como um ensaio de religião
comparada, pois ele reconhece a veracidade e validade dos diversos dharmas védicos.
Nele encontramos uma análise de metas (sādhya) e práticas (sādhana) para elucidar o
processo nóetico védico que se desenvolve dialeticamente em três fases ou momentos,
denominados karma “ação”, jñāna “conhecimento” e Bhakti “devoção”. William De-
adwyler considera que, se os Vedas lidam factualmente com verdades e conhecimentos
universais, tal processo seria paradigmático do desenvolvimento espiritual da humani-
dade (Deadwyler, 1988, p. 366).
Quando queremos chegar a um destino, a uma determinada cidade, utilizamos
vário caminhos e diferentes meios de transporte. Da mesma forma, segundo a tradição
védica, para se alcançar o Ser supremo (Paraṁ brahma), em suas diferentes manifesta-
ções, há diversos sādhanas, ou meios.
O Absoluto é um, mas pode ser conhecido de muitas formas, os Vedas deixam
isso bem claro: ekaṁ sad viprā bahudhā vadanti, “Um é o real, mas os sábios falam so-
bre Ele de muitas formas (Ṛg Veda, 1.164.46). A razão disso é que Ele se manifesta de
acordo com o humor de quem se aproxima dele: ye yathā māṁ pradyante tāṁs ta-
thaiva bhajāmy aham, “Como eles se voltam para Mim, Eu o aceito da mesma ma-
neira”, (Bhagavad-gītā, 4.11).
Segundo o Bhāgavatam, a realidade uma e não-dual (advaya) é percebida e se
manifesta diferentemente:
vadanti tat tattva-vidas
tattvaṁ yaj jñānam advayam
brahmeti paramātmeti
bhagavān iti śabdyate,
“Os videntes conhecedores da Verdade não-dual e plena de conhecimento,
descrevem-na como Brahman, o ‘Ser Absoluto’, Paramātmā, a ‘Alma Su-
prema’, e Bhagavān, a ‘Pessoa Todo-opulenta’” (Śrīmad-Bhāgavatam,
1.2.11).

SĀDHYA E SĀDHANA – A META E O CAMINHO


Em sânscrito, o destino ou objetivo a ser alcançado chama-se sādhya “meta ou
télos”. e o método ou caminho adequado para obtê-la chama-se sādhana “prática ou
práxis”. Agora, quem determinou um sādhya específico e adota um sādhana corres-
pondente pode obtê-lo chamamos de sādhaka “adepto”.
Acrescentando aos três caminhos e metas, descritos inicialmente na Bhagavad-
gītā, mais um caminho ou sādhana, que seria dhyāna “meditação”, com seu respectivo
objetivo (sādhya), que seria siddhi “perfeição mística”, podemos delineiar os tipos bá-
sicos de caminhos ou sādhanas: 1) Karma – o caminho do trabalho consequencial, que
gera um fruto; 2) Jñāna – o caminho do conhecimento emancipador; 3) Dhyāna – o ca-
minho da meditação e integração; e 4) Bhakti – o caminho da devoção amorosa.
A seguir, temos quatro tipos de objetivos, ou sādhyas, que são alcançados pelos
quatro caminhos acima: 1) Bhukti – o prazer material até o nível do Paraiso (meta de

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karma); 2) Mukti – a libertação pelo autoconhecimento (meta de jñāna); 3) Siddhi – a
perfeição ou poderes psíquicos (meda de dhyāna); e 4) Prema – amor divino ou comu-
nhão amorosa com Deus (meta de bhakti).
Agora, quem é o sādhaka? É o adepto que já escolheu o objetivo (sādhya) e o
método (sādhana) que o levará até lá, e está trilhando o caminho. Sé o caminho é
karma, ele é um karmi “trabalhador fruitivo”; se o caminho é jñāna ele é um jñāni “co-
nhecedor”; se o caminho é dhyāna, ele é um dhyāni “meditador”; e se o caminho é
bhakti, ele é um bhakta “devoto”.

1) KARMA – AÇÃO FRUITIVA


A palavra karma (ou karman), que deriva da raiz verbal kṛ, tem muitos sentidos
como: “ação”, “trabalho”, “feito”, “produto”, “efeito” etc. Karma mais precisamente
seria uma ação consequencial ou fruitiva, ou seja, uma ação que gera “consequência”
ou “frutos”. Por isso, quando a consequência da ação é negativa, desarmônica ou pe-
caminosa recebe o nome de vikarma “ação incorreta”. Agora, quando a ação é inó-
cua ou não gera resultado algum denomina-se akarma ou niṣkarma “inação” ou “não
ação”. Considera-se que as atividades espirituais, como bhakti “serviço devocional”,
por serem dirigidas à Divindade, sem qualquer desejo de retorno ou recompensa (nis-
kāma karma), estariam na categoria de akarma ou niṣkarma.
Qual é o critério pelo qual nos julgamos um karma “certo” ou “errado”, “bom”
ou “mal”. “certo e errado” refere-se à moralidade como lei, e “bom e mal” refere-se a
ela como fim. Devemos ajustar a nossa conduta segundo padrões morais. o seguir das
regras é o “certo”. o que é para ser alcançado é o “bom”.
O Mahābhārata, com um conceito similar à “regra de ouro”, quando
afirma: sarva-bhūteṣu vartitavyaṁ yathātmani, “faça aos outros o que gostaria que te
fizessem” (Mahābhārata, Śānti-parva, 167.9), considera que fazer bem aos outros é
correto (puṇya) e fazer mal aos outros é errado (papa). já o pensador Kaṇada, res-
ponde que: yato ‘bhyudayaniḥ śreyasa-siddhiḥ sa dharmaḥ, “aquilo que possibilita a
elevação, é bom” (Vaiśeṣika-sūtras, 1.1.2).
A marca característica da tradição védica, a doutrina do Brahman ou Realidade
Única, baseia-se na ideia de que a natureza de todas as entidades vivas não só está in-
trinsicamente “unida à totalidade da natureza”, mas possui também a “potencialidade
de transcender a ordem natural”. O ātman (o si-mesmo, o eu) dentro de cada um, vive
esquecido de sua posição constitucional como parte integrante do Brahman, e deve
ser guiado em uma existência que o ajude a avançar no caminho da recordação, em di-
reção à felicidade de sua natureza essencial. Esse seria então śreyas ou niḥśreyasāya, o
bem último ou a meta última da existência.
Mas, considera-se o caminho do karma, ou das ações meritórias (punya) neste
mundo, como o primeiro passo para essa recordação. Seria o que já foi descrito como
o caminho de pravṛtti-mārga. É o caminho que busca não a liberação ou emancipação
espiritual, mas sim, uma existência progressiva através de uma forma de misticismo sa-
crificial que, em harmonia com os princípios do dharma, buscaria o acúmulo
de karma pleno de méritos.

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Esse caminho se caracteriza pela crença no poder dos sacrifícios védicos de pro-
duzir efeitos nesta vida e em outra vida, e na existência de uma lei inalterável e eterna
envolvida nesses sacrifícios (DasGupta, 1927, p. 17-18). Seria uma vida cuja meta se-
ria bhoga, o prazer ou desfrute material nessa vida e depois no Paraíso.
Prakṛti, a natureza material, é ao mesmo tempo o contexto e a força que impul-
ciona, pelo karma, a existência material da alma espiritual (jīvātmā). Ela seria uma po-
tência divina e o solo material da criação, que é descrita na Bhagavad-gītā:
daivī hy eṣa guṇa-mayī mama māyā duratyayā
“Esta Minha energia divina, que consiste dos três modos da natureza é difí-
cil de superar.” (Bhagavad-gītā, 7.14).
Essa potência existiria primordialmente de forma imanifesta em um estado ca-
ótico de equilíbrio perfeito que seria perturbado como que pelo olhar criativo do Pu-
ruṣa, o Espírito supremo. Esse é o processo de evolução, onde Jagat, a “ordem cós-
mica” seria vista como um desdobramento evolutivo do estado primordial, de quie-
tude, onde todas as tensões são mantidas em perfeito equilíbrio, para estruturas com-
plexas. No ato criativo da Divindade, a manifestação cósmica se manifestaria pela inte-
ração dos três gunas (modalidades ou qualidades da matéria), que são ao mesmo
tempo partes inerentes e qualidades constitutivas da Prakṛti. Seriam eles:
1) rajas (do verbo rañj “mover”) movimento, dinamismo, excitação, prazer, an-
siedade, paixão etc.;
2) tamas (do verbo tam “sufocar”) restrição, resistência, inércia, massa, peso,
preguiça, opacidade, ignorância etc.;
3) sattva (do verbo as “existir”) luz, iluminação, harmonia, equilíbrio, claridade,
alegria, leveza, bondade etc.
Eles teriam como equivalentes os conceitos platônicos de Logistikon (o ele-
mento racional, que corresponderia a sattva), Thumos (o elemento da paixão, que cor-
responderia a rajas), e Epitmumia, o desejo cego, que corresponderia a tamas (Aze-
vedo, 1997, p.5).
Devemos compreender os guṇas ao mesmo tempo fisicamente (macrocosmo) e
psiquicamente (microcosmo), pois englobam ao mesmo tempo os fenômenos e a per-
cepção desses fenômenos no homem, isto é, o mundo psíquico ou sutil e o mundo fí-
sico ou grosseiro. Consciência (sattva), energia (rajas) e massa (tamas), portanto, são
todos estados da prakṛti e, por extensão, de cada corpo humano, animal, vegetal ou
mineral. Tudo, em última instância, dependeria de sua combinação e interação. Nas
coisas concretas e densas – como as pedras – temos mais tamas. Já nas coisas sutis e
leves – como a luz – teríamos mais sattva.
Assim, todo tipo de impulsos para a ação ou para abster-se de ação brota da
mistura dos guṇas, e constitui a estrutura da natureza humana. Kṛṣṇa explica na Bha-
gavad-gītā, que toda ação neste mundo depende da influência dos guṇas da natureza
material:
prakṛteḥ kriyamāṇāni guṇaiḥ karmāṇi sarvaśaḥ
ahaṅkāra-vimūḍhātmā kartāham iti manyate

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“As ações são efetuadas pelos modos da natureza, o tolo egoísta pensa as-
sim ‘eu sou o agente’” (Bhagavad-gītā, 3.27).
kārya-kāraṇa-kartṛtve hetuḥ prakṛir ucyate
puruṣaḥ sukha-duḥkhānā bhoktṛtve hetur ucyate
“Se há efeitos, causas e agentes, a origem está na matéria; se os prazeres e
sofrimentos são gozados, a origem está na alma” (Bhagavad-gītā, 13.21).
A importância desta análise está na ideia de que o padrão de ações e comporta-
mento afeta, por sua vez, o nível ou a composição das qualidades. Esta é a chave para
o mistério da lei do karma. Os seres humanos nascem de acordo com as propensões e
predileções (saṁskāra) dos padrões passados de karma, mas são livres para se livrar
deles.
Nesse contexto, o karma se manifesta nas seguintes fases:
a) Sañcita karma (karma armazenado, estocado, amontoado, acumulado do passado -
visto no caráter) - o acumulado ou potencial ou programado, isto é, aquilo que virá
acontecer. Resultado ou herança de todas as nossas ações passadas, mas que ainda
não começou a germinar, amadurecer e transformar-se na colheita de uma vida. So-
bre ele, por meio de processos, técnicas e métodos de Yoga, podemos agir para neu-
tralizar seu poder germinativo (“fritar as sementes”, na linguagem de Patañjali). Se-
ria como evitar ou mudar o que estaria para acontecer.
b) Vartamāna [ou āgāmi] karma1 (karma vindouro que está a caminho, que ainda está
sendo criado) - Destino que ainda não assumimos, que está sendo efetuado ou se-
meado agora, será brevemente incluído no sañcita karma. É o karma sobre o qual
temos plena administração, por ser aquilo que estamos fazendo no presente. Nosso
livre-arbítrio delibera e faz opções: praticar ou não à ação; conduzi-la numa direção
ou noutra. Você tem domínio sobre a ação (karma) que agora está praticando. Pode
optar por contrair dívidas ou ganhar crédito. Plantará frutas ou urtigas.
c) Prārabdha karma2 (karma cujos efeitos já estão atuando completamente) - aquele
que está se cumprindo, também chamado “karma maduro”, o qual já não se pode
evitar, corrigir, mudar, e já começou produzir frutos na forma de acontecimentos
presentes (É a parte do Sañcita karma que está sendo vivida no momento atual). Só
nos é possível padecê-lo com equanimidade e sabedoria. E isto também é Yoga.
Imagine um arqueiro que tem uma seta no arco retesado, têm mais algumas na al-
java às costas e há uma que acabou de disparar, voando para o alvo. As setas da aljava
representam o sañcita karma; a seta o āgāmi karma; e finalmente, a seta atirada, o
prārabda karma.
A desigualdade que reina no nascimento pode ser mudada pela ação honesta e
correta durante a vida. O nascimento, portanto, não é questão de acidente ou circuns-
tâncias fortuitas. É o resultado de ações passadas e uma plataforma para ações futu-
ras. Todas as criaturas movem-se automaticamente em direção à fonte de seu ser.
Esse anseio por uma “volta ao lar”, por assim dizer, é um processo subconsciente no
ser humano quando está com sua força mínima, e um anseio plenamente

1
Também é conhecido como kriyamanam, anārabdham e sāñcīyamānam.
2
Que está maduro, inevitável (da raiz prakk, “antecipado”+ arabda, “começando”
11
autoconsciente numa pessoa consciente da altíssima missão que lhe foi confiada en-
quanto protagonista moral do mundo. (Mukerji, 1990, p. 86).

2) JÑĀNA – CONHECIMENTO EMANCIPADOR


A palavra jñāna significa “conhecimento, discernimento” e jñāna-yoga é, conse-
quentemente, a “yoga do conhecimento”. É o caminho que se dedica à gnose, ao saber
Absoluto. Segundo Feuerstein, “Às vezes, jñāna também é empregada para expressar a
mais elevada iluminação produtora da verdade, mas no composto, jñāna-yoga é usada
no sentido de investigação intuitivo-filosófica, ou discernimento (viveka)” (Feuerstein,
1977, p. 26).
São as percepções equivocadas que nos fazem sofrer agora e gozar a seguir, para
depois voltar a sofrer. Só o descortinar da verdade nos salva disto. Nosso falso-ego, que
identifica a individualidade da jīva com a personalidade dos seus corpos materiais den-
sos e sutis, é fictício e gerador de sofrimentos, igualmente fictícios. É preciso remover a
ilusão. Os sofrimento e prazeres nos maltratam igualmente, ambos geram falsas expec-
tativas. Esta importante constatação nos torna equânimes, e a equanimidade (titikṣa) é
um pré-requisito para a salvação.
Triunfar das dualidades é a primeira etapa a vencer para se libertar da ignorância.
Mas é preciso que a pesquisa intelectual seja sustentada incessantemente por uma dis-
ciplina moral rigorosa. Deus só pode aparecer quando o ego morrer. A discriminação
deve ser feita a cada instante, e além disso é preciso aceitar a renúncia total a todo
apego, por mais sutil que ele seja.
O método utilizado pelo jñāna-yoga pode ser encontrado de alguma forma em
algumas tradições do yoga e no vedānta advaita, Lembra também , em alguns aspectos,
o cristianismo apofático. Esta mística estabelece como meta espiritual a realização do
ser por meio da fusão ontológica da alma no conhecimento de um Absoluto (Brahman),
desprovido de qualquer qualidade (nirguṇa) ou variedade (nirviśeṣa), o que levaria à
renúncia (vairāgya) dos desejos e paixões materiais.
O sādhana de jñāna busca o “conhecimento libertador”, ou seja, conhecer a
verdade que liberta. Portanto sua meta é mokṣa “a libertação”. Almeja ultrapassar o
plano de Māyā, a ilusão. É um caminho difícil, e por isso reservado a poucos. Escapar à
consciência da dualidade e multiplicidade é escapar ao tempo, ao espaço, à causalidade,
e obter o conhecimento do Absoluto (Brahman), pelo conhecimento da identidade do
Eu (ātmā-jñāna).
Podemos exemplificar como jñāna yoga o caminho trilhado principalmente pe-
los seguidores do vedānta advaita, onde se busca o conhecimento ou verdade que li-
berta o praticante (sādhaka) do ego e do desejos materiais, através de:
1) Viveka, “discriminação” entre o que é permanente e o que é impermanente.
2) Vairagya, “renúncia” ou desinteresse por todos os objetos de prazer mate-
rial.
3) Tapas, “austeridade”, que é composta de ṣat-sampatti, “os seis tesouros”,
que são: I) śama “paz de espírito” ou “tranquilidade”; II) dama “domínio de
si” ou “controle dos sentidos; III) uparati “controle da mente” ou

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“interrupção de toda atividade voltada a um objeto”; IV) titikṣā “tolerância”;
V) samādhāna, “contemplação” ou “concentração mental”; e VI) śrāddhā,
“fé”.
4) Mumukṣutva, “desejo de libertação”.
5) Śravana, “audição atenta”.
6) Manana, “reflexão” sobre o que foi ouvido.
7) Nididhyāsana, “meditação” nas afirmações unitárias das Upaniṣads.
Mas, não são todos os místicos que consideram a libertação ou mokṣa, gestado
em jñāna, como sendo a meta final. Por exemplo, para os místicos vaishnavas, a reali-
zação aham brahmasmi “eu sou brahman”, apesar de ser autorrealização, não é a meta
espiritual última mas o que possibilita trilhar o caminho em direção ao destino espiritual
supremo. Segundo Prabhupāda: “O primeiro passo na autorrealização é compreender
que nossa identidade é algo à parte do corpo. ‘Eu não sou este corpo; eu sou alma espi-
ritual’ é uma realização essencial para toda pessoa que deseja transcender a morte e
entrar no mundo espiritual que está mais além” (Prabhupāda, 1972, p.7).
Portanto, jñāna como conhecimento da natureza da alma, da natureza da Divin-
dade e da relação entre ambos, possibilita a forma suprema de devoção, prema-bhakti,
que se distingue do mero sentimentalismo.

3) DHYĀNA – MEDITAÇÃO MÍSTICA


Dhyāna-yoga “yoga da meditação”, também denominado rāja-yoga “yoga real”,
como, é o caminho (sādhana) que conduz a siddhi “a perfeição” da existência. A perfei-
ção última seria aquela que possibilita a comunhão de jīvātmā “a alma individual” com
Paramātmā “a Superalma”, presente em todos os seres como a fonte última de todo
conhecimento ou consciência.
Através da autodisciplina e do controle mental o rāja-yoga ensina o praticante
a controlar os sentidos e as ondas mentais (vṛttis), que surgem na consciência, para de-
senvolver a concentração que permite a meditação e o sāmadhi em comunhão com
Deus. No Haṭha-yoga (“Yoga da força”) temos a disciplina física, mas no Rāja-yoga en-
contramos a disciplina mental.
śrī ādi nāthāya namostu tasmai
yenopadishtā hathayogavidyā
vibhrājate pronnatarājayogam
ārodhumichchoradhirohinīva
“Ofereço minha reverência ao Senhor primordial (Śiva) que expos o conhe-
cimento do haṭha-yoga, que são coo os degraus que conduzem ao cume do
rāja-yoga” (Haṭha-yoga-pradīpikā, 1.1)
O Rāja Yoga se identifica, no todo, com a escola filosófica (darśana) do Yoga,
que, apesar de ser um sistema filosófico autônomo, herdou suas bases teóricas do
Saṅkhya, ensinado nas escrituras védicas. Seu texto básico é o clássico Yoga-sūtras, es-
crito pelo sábio Patañjali.
Os Kleśas

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O que motiva a prática da meditação é a constatação de que a vida material está
imbuída de sofrimento, limitação, insegurança, fragilidade e conflitos que oprimem a
existência humana. Portanto o Yoga-sūtra nos traz uma reflexão que aponta as causas
primeiras dessa existência, os kleśas:
pariṇāma-tāpa-saṁskāra duḥkhair guṇa-vlrtti-virodhāc ca duḥkham eva
sarvaṁ vivekinaḥ
“Para quem já conseguiu desenvolver o discernimento, tudo é miséria por
causa das dores provocadas por mudanças, ansiedades e tendências, como
também por conta dos conflitos entre as tendências naturais que o homem
encontra em sua natureza, e os pensamentos e desejos predominantes em
um particular período de tempo” (Yoga-Sūtras, 2.15).
Ao emitir esse diagnóstico, Patañjali chamou a atenção para o sofrimento hu-
mano, que os ingênuos e alienados procuram ignorar ou escamotear com as várias faces
do prazer. Aceita a verdade, evidencia-se a necessidade de uma terapia, um caminho,
uma solução. Segundo ele: heyaṁ duḥkham anāgatam, “A dor que ainda não sobreveio,
pode e deve ser evitada” (Yoga-Sūtras, 2.16).
Uma terapia de alcance e eficácia depende da identificação das causas últimas
da doença. Removidas estas, a enfermidade cessa. O ser humano só se livrará definiti-
vamente da miséria quando, após conhecidas suas verdadeiras causas, empenhar-se to-
talmente para suprimi-las.
Ainda segundo Patañjali, os cinco kleśas geram e nutrem todas as formas de so-
frimento. Eles são enumerados numa sequência de causação, isto é, indicando que o
anterior gera o que se segue: 1) Avidyā- a ignorância fundamental; 2) Asmitā - o egoísmo
ou nossa identificação com o corpo material; 3) Rāga - o apego ao que é agradável; 4)
Dveṣa - a repulsão ou aversão ao desagradável; e 5) Abhiniveśa - sede de viver, apego
instintivo à existência ou medo da morte.
Patañjali ensina como vencer a ignorância, a causa-raiz de todos os demais
kleśas: viveka-khyātir aviplavā hānopāyaḥ, “A ininterrupta percepção do Real é o meio
de afastar e dispersar avidyā” (Yoga-Sūtras, 2.26).
Mas como isso será possível ? Patañjali responde: yogāṅgānuṣṭhānād aśuddhi-
kṣaye jñāna-dīptir ā viveka-khyāteḥ, “Pela prática das etapas [aṅgas] do yoga, destrói-
se a impureza, sobrevindo a iluminação que propicia a percepção da Realidade (Yoga-
Sūtras, 2.28).
Aṣṭāṅga Yoga
Porque é constituído por oito (aṣṭa) componentes ou membros (aṅgas), o Raja-
yoga também é conhecido por Aṣṭāṅga-yoga (“Yoga de oito etapas”). São eles: 1) Yama
“disciplina”; 2) Niyama “autodisciplina”; 3) Āsana “postura”; 4) Prāṇayāma “controle do
alento”; 5) Pratyāhāra “retração dos sentidos”; 6) Dhāraṇā “concentração”; 7) Dhyāna
“meditação”; e 8) Samādhi “transe”.
Há duas fases no Aṣṭāṅga Yoga. A primeira é externa (bahira) e compreende os
cinco primeiros aṅgas. Começa com yama e termina com pratyāhāra. A segunda é in-
terna (antar). Tem início com dhāraṇā e culmina com a parada da mente (samādhi). A
perfeição alcançada na primeira fase garante a vitória na segunda. A bahirāṅga se com-
pões de:

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1) Yama - um conjunto de cinco abstinências ou comportamento a evitar, que nos as-
seguram paz com os outros e aprimoram o nosso karma:
a) Ahinsa - não deseje agredir, ferir ou matar qualquer ser;
b) Satya - não minta;
c) Asteya - não furte;
d) Brahmacarya - não perverta, nem exacerbe, nem se submeta ao sexo;
e) Aparigraha - não deseje nem aceite propinas.
2) Niyama - mandamento a serem cumpridos. São sábias prescrições ou virtudes e
condutas asseguradoras de paz interior:
a) Sauca - pureza externa e interna, corporal e mental;
b) Santoṣa - contentamento ou sentimento de bastante;
c) Tapaḥ - austeridade visando a incinerar desejos egocêntricos, inferiores e ins-
tintivos;
d) Svadhyāya - estudo e investigação sobre o Ser;
e) Īśvara-pranidhana - completa rendição ou submissão a Deus..
3) Āsana (“postura”) - postura do corpo que seja bastante estável e cômoda, permi-
tindo o meditador permanecer longo tempo imóvel, sem fadiga e sem descon-
forto, a ponto de não sentir seu físico. Os āsanas eliminam com distúrbios que o
corpo físico causa à mente e aperfeiçoam a circulação bioenergética (prânica) por-
que atuam dobre os naḍīs (canais sutis), limpando-os, desobstruindo-os e sobre os
cakras (centros psíquicos e energéticos), ativando-os.
4) Prāṇāyama (“disciplina da respiração”) - controle e expansão (ayama) da circula-
ção da energia vital (prāṇa) no “corpo sutil”, o que além de promover a saúde psi-
cofísica, predispõe a mente para a concentração.
5) Pratyāhāra - deve ser entendido como a interrupção da conexões normais dos sen-
tidos com o ambiente físico. É uma interface entre os dois mundos - o interno (an-
tar) e o externo (bahira). Os aṅgas anteriores (yama, niyama, āsana e prāṇāyama)
permitem este difícil corte com o mundo exterior. Alcançado o “silêncio dos senti-
dos”, torna-se possível a imersão da consciência no universo interior. Pratyāhāra
serve de portal.
Os problemas naturais e obstáculos encontrados por quem lida com a mente po-
derão ser vencidos se o desempenho moral do aspirante eliminou as perturbações ge-
radas por desejos e emoções, se a postura de meditação (āsana) conseguiu o mesmo
em relação aos distúrbios nascidos do corpo físico, se os prāṇāyamas corrigiram desor-
dens energéticas no corpo prânico, e finalmente se pratyāhara conseguiu interromper
a atividade dos órgãos sensórios. Assim então, quando se supera a fase externa do mé-
todo (bahiraṅga) inicia-se a grande aventura no universo interno do meditante.
Finalmente, temos os aṅgas seguintes (6, 7 e 8), denominados conjuntamente de
antarāṅga yoga, ou saṁyama, que se apresentam como uma disciplina (sādhana) es-
pecial no universo da mente e na abissal realidade que a transcende.

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6) Dhāraṇā – “concentração”, onde o meditante começa com dhāraṇā ou concentra-
ção sobre o objeto escolhido (viṣaya), que pode ser uma coisa, uma lei, um princí-
pio, um conceito, um fenômeno, uma deidade ou um fato da existência.
7) Dhyāna – “meditação” propriamente dita, que é um prolongamento natural da
concentração firme.
8) Samādhi – “transe”, que é a consequência natural de dhyāna, quando ocorre o “sa-
ber intuitivo”, isto é, o conhecimento unitivo, onde ocorre uma comunhão entre o
sujeito que conhece e o objeto conhecido. A mente cessa de funcionar. Todos os
saṁskāras-vṛttis (impressões mentais) e vāsanās (tendências e desejos sutis) são
completamente queimados. Esse estado de consciência puro obtido, além da in-
fluência dos guṇas, denominado śuddha-sattva, ou Vasudeva, permite a comunhão
ontológica com Brahman, o aspecto impessoal da Divindade, ou o vislumbre da Per-
sonalidade da Divindade, Paramātmā ou Bhagavan, que por Sua graça se manifesta
no coração do yogī.
Pelo poder da concentração de saṁyama nos diferente aspectos do universo, o
yogī pode obter perfeições sobrenaturais, chamadas siddhis. Os siddhis são: 1) Animā -
pequenez; 2) Mahimā - grandeza; 3) Garimā - peso; 4) Laghimā - leveza; 5) Prāpti -
acesso às coisas; 6) Prākāmya - fazer o desejável; 7) Vaśitva - controle sobre os ele-
mentos; e 8) Īśatva - domínio sobre tudo.
Essas obtenções, resultantes de realizações ou samādhis inferiores, se apresen-
tam como obstáculos, ou provas no caminho para a obtenção do samādhi final, que
constitui a proposta de Patañjali. Segundo Feuerstein: “Depois que cada pensamento,
cada emoção ou qualquer outro ato interno tenha sido serenado e totalmente subju-
gado, o Eu transcendente [puruṣa] habita em seu esplendor ilimitado” (Feuerstein,
1977, p.22).
O estado de perfeição do yoga é apresentado por Śri Kṛṣṇa para Arjuna, na Bha-
gavad-gītā:
yuñjann evaṁ sadātmānaṁ
yogī vigata-kalmaṣaḥ
sukhena brahma-saṁsparśam
atyantaṁ sukham aśnute
“Fixo no Eu, estando livre de toda a contaminação material, o yogī alcança
o estágio de perfeição mais elevado de felicidade em pleno contato com
Brahman” (Bhagavad-gītā, 6.28).

4) BHAKTI – SERVIÇO DEVOCIONAL


O termo Bhakti deriva da raiz sânscrita Bhaj, “dividir em”, “participar”; significa amor e
devoção a Suprema Personalidade de Deus. Os Bhakti-yogīs se ocupam no serviço amo-
roso devocional de cinco maneiras diferentes: 1) Śānta-bhakti, devoção em neutrali-
dade; 2) Dāsya-bhakti, devoção em servidão; 3) Sākhya-bhakti, devoção em amizade; 4)
Vātsalya-bhakti, devoção como pai ou mãe; e 5) Mādhurya-bhakti, devoção como
amante conjugal do Senhor Supremo (Prabhupāda, 1990, p. 351).
Na Bhagavad-gītā 10,10 Kṛṣṇa diz para Arjuna que

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teṣāṁ satata-yuktānāṁ
bhajatāṁ prīti-pürvakam
dadāmi buddhi-yogaṁ taṁ
yena mām upayānti te
“Para aqueles que estão constantemente devotados e Me adoram com amor
extático, Eu dou a compreensão com a qual eles podem vir a Mim” (Bhaga-
vad-gītā , 3.45).
A Bhagavad-gītā, certamente, é a obra mais primeva, amplamente fundamen-
tada em Bhakti-yoga. Para se ter uma ideia, o décimo segundo capítulo é dedicado ao
Serviço devocional, bhakti-yoga ou buddhi-yoga. No início do capítulo, Arjuna indaga a
Kṛṣṇa:
evaṁ satata-yuktā ye
bhaktās tvāṁ paryupāsate
ye cāpy akṣaram avyaktaṁ
teṣāṁ ke yoga-vittamāḥ
“Quem é considerado mais perfeito: os que estão ocupados apropriada-
mente em Seu serviço devocional (bhakti) ou os que adoram o Brahman im-
pessoal, o imanifesto?” (Bhagavad-gītā, 12.1).
No verso seguinte, Kṛṣṇa lhe responde:
mayy āveśya mano ye māṁ
nitya-yuktā upāsate
śraddhayā parayopetās
te me yuktatamā matāḥ
“Aquele cuja mente está fixa em Minha forma pessoal, sempre ocu-
pado em Me adorar com grande fé transcendental, Eu considero mais
perfeito” (Bhagavad-gītā, 12.2),.
Segundo o Śrīmad-Bhāgavatam, bhakti constitui-se dos seguintes estágios: 1)
Śrāvana, audição atenta aos Nomes divinos; 2) Kīrtana, o canto em louvor aos Santos
Nomes de Deus; 3) Smāraṇa, meditação em Deus; 4) Pada-sevaṇa, reverência aos pés
do Senhor; 5) Arcāna, devoção ritual; 6) Vāndaṇa, prostração diante da imagem do Se-
nhor; 7) Daśya, devoção submissa a Deus; 8) Sakhya, amizade, uma vez que o Supremo
eleva o devoto à condição de um amigo; e 9) Ātmā-nivedāna, auto oblação, através da
qual o adorador entra no corpo imortal de Deus.
Ser, indubitavelmente, com Śrī Caitanya Mahāprabhu que o serviço devocional,
Bhakti-yoga, ganha um ímpeto notório, da mesma forma como Patañjali o fez com o
Yoga nos seus Yoga sūtras.
O processo de Bhakti-yoga, além de ser considerado o estado ápice do Yoga é
também ao mesmo tempo a comunhão ou conjunção de todos os outros processos. Al-
guns yogīs místicos alegam que no Bhakti-yoga não há controle adequado dos sentidos.
Mas Segundo Śrīla Prabhupāda
[...] Bhakti-yoga ocupa realmente a alma espiritual em atividades. A percep-
ção da matéria é transcendida até estados ainda mais sutis dos sentidos. Os
sentidos são transcendidos até a mente mais sutil, e então até as atividades
respiratórias e gradualmente até a inteligência. Além da inteligência, a alma

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viva é compreendida pelas atividades mecânicas do sistema de Yoga, ou a
prática de meditação com restrição dos sentidos, regulação do sistema res-
piratório e aplicação da inteligência para elevar-se à posição transcendental.
Esse transe para todas as atividades materiais do corpo (Prabhupāda, 1995,
tomo 1.2, p.203).
O processo de Bhakti-yoga é anterior a Buddha, e a palavra Bhakti é encontrada
no Śvetaśvata-Upaniṣad VI.2 e, evidentemente, na Bhagavad-gītā muitas vezes. Como
comentamos anteriormente, o Bhagavad-gītā encerra em si no mínimo três grandes ca-
minhos para a liberação: o do Jñāna-yoga (do conhecimento acerca de Kṛṣṇa), o do
Karma-yoga (da ação em consciência de Kṛṣṇa ) e o do Bhakti-yoga (devoção a Kṛṣṇa).
Na Bhagavad-gītā 11, 53-54 Kṛṣṇa diz para Arjuna, logo após ter mostrado Sua forma
universal que:
nāhaṁ vedair na tapasā
na dānena na cejyayā
śakya evaṁ-vidho draṣṭuṁ
dṛṣṭavān asi māṁ yatha.
“Não se pode compreender a forma que você vê agora com seus olhos trans-
cendentais simplesmente através do estudo dos Vedas, nem se submetendo
a penitências sérias, nem através de caridade, nem através de adoração. Não
é através destes meios que a pessoa pode ver-Me como sou” (Bhagavad-
gītā, 11, 34).
bhaktyā tv ananyayā śakya
aham evaṁ-vidho ‘rjuna
jñātuṁ draṣöuṁ ca tattvena
praveṣṭuṁ ca parantapa
“[..] só através do serviço devocional indiviso é possível compreender-Me tal
como Eu Sou, como estou diante de você, e assim é possível ver-Me direta-
mente. Só desta maneira você pode entrar nos mistérios da Minha compre-
ensão” (Bhagavad-gītā, 11, 54).
As Formas de Bhakti
Para todo o bhakti-yogī, a meta a ser atingida é o amor por Kṛṣṇa, ou Kṛṣṇa
prema, supremo amor por Deus ou amor puro por Kṛṣṇa. No Bhakti-Sūtra, 5, de Nārada,
lê-se que o devoto de Kṛṣṇa “(...) não vê nada exceto o amor, não ouve nada exceto
sobre o amor, fala apenas de amor e pensa somente no amor” (Feuerstein, 1977, p. 28).
Em síntese, Bhakti-yoga é o Yoga do amor puro por Deus, o estágio mais evoluído de
qualquer prática de Yoga.
As formas principais de veneração a Deus denominam-se de Dāsya-bhāva,
Sakhya-bhāva, Vātsalya-bhāva, Sānta-bhāva, Kānta-bhāva e Madhura-bhāva, respecti-
vamente. No Dāsya-bhāva o devoto atua como servo do Senhor, de mesma maneira
como um servo relaciona-se com o patrão, ou como Hanumān se relacionava com Rāma
no Rāmāyaṇa, uma vez que Deus é então concebido como pessoa. Numa etapa poste-
rior, esta forma de amor poderá ser semelhante a relação de amigos, passando então a
chamar-se de Sakhya-bhāva. Quando o amor por Kṛṣṇa possui as características do amor
de um pai pelo filho denomina-se Vātsalya-bhāva. Um exemplo disso é o sentimento
que mãe Yāsodā, a mãe adotiva de Kṛṣṇa, possuía por Ele. Quando o amor que se sente
por Kṛṣṇa é semelhante ao que um filho sente pelo seu pai, é chamado de Sānta-bhāva.

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Por outro lado, quando amor que se sente por Kṛṣṇa é semelhante ao que uma esposa
sente pelo marido, denomina-se Kānta-bhāva. O sentimento de amor por Kṛṣṇa como
um apaixonado por sua adorada, amor do tipo conjugal, como no exemplo de Kṛṣṇa e
Radhārānī, recebe o nome de Madhura-bhāva.
Devemos acrescentar que, as diferentes formas de amor por Kṛṣṇa desenvolvi-
das no Bhakti-yoga, apesar dos exemplos que se costumam citar, não são exatamente
as formas de amor carnal que as pessoas pensam tratar-se. Apesar de que este mundo
material, na maneira platônica, ser apenas um reflexo, um arremedo, do mundo espiri-
tual, todas as formas de amor carnal entre os mortais, quando não devotado a Kṛṣṇa,
são contaminações, e não se constituem, de modo algum, de amor por Deus, por Kṛṣṇa,
mas de ação fruitiva em busca da simples satisfação dos sentidos grosseiros.
É importante frisar que as últimas escolas de Bhakti, principalmente protagoni-
zadas por Rāmānanda, Tulsīdās, Vallabha, Nānak, Rāmānuja, Madhvācārya e Śrī Cai-
tanya Mahāprabhu, enfatizam que podemos atingir o estágio de Kṛṣṇa-prema - amor
puro por Deus - mediante o canto dos Santos Nome dele. Mas, a repetição mecânica e
sem sentimento não logra atingir um benefício maior, principalmente se não tiver sido
autorizada por um guru ācārya. Além disso, é recomendado a leitura dos livros sagrados,
canto dos poemas e hinos védicos vaiṣṇavas, práticas como o ekādasī etc., visando con-
trolar a mente e atingir o estágio de perfeição de amor puro por Deus (Kṛṣṇa prema).

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DHARMA COMO MANIFESTAÇÃO HISTÓRICA
Nessa seção será apresentado um esboço das principais tradições religiosas, ou
seja, faremos uma abordagem da “história das religiões”, para que possamos fazer uma
“comparação das religiões” utilizando a análise das metas (sādhya) e práticas (sādhana)
em seu desenvolvimento dialético.
1 - XAMANISMO
“O xamanismo não é propriamente uma religião, mas um conjunto de métodos
extáticos e terapêuticos cujo objetivo é obter o contato com o universo paralelo, mas
invisível, dos espíritos e o apoio destes últimos na gestão dos assuntos humanos” (Eli-
ade, 1999, p. 267).
O xamanismo é uma prática ancestral, tão remota quanto a consciência do Ho-
mem. Embora muitos pensem que o xamã é uma figura indígena, e os índios tenham
realmente preservado esta tradição, ela remonta ao período em que os homens viviam
nas cavernas, na Era Paleolítica. A cultura xamânica abrange a práxis medicinal, mágica,
religiosa e filosófica. Seu exercício engloba atos de cura, estados de transe, transforma-
ções e interação entre os corpos dos participantes e espíritos, tanto dos xamãs quanto
de criaturas míticas, de animais, de pessoas que já morreram, entre outras. O Xama-
nismo associa-se especialmente aos povos nativos da Ásia setentrional e das Américas.
A fonte desta expressão está localizada entre os asiáticos e árticos – este termo
foi provavelmente criado pelos Tugus siberianos -, mas é praticamente impossível situar
historicamente ou geograficamente o Xamanismo, bem como seu início. Ele se constitui,
desde remotas eras, há pelo menos 40.000 a 50.000 anos, na Idade da Pedra, em um
exercício universal, segundo alguns uma herança da Espiritualidade para o ser humano.
Vestígios desta tradição estão presentes nas mais diversas religiões. Traços dele têm
sido investigados por antropólogos nas Américas, na África, entre os indígenas australi-
anos, esquimós, indonésios, da Malásia, Senegal, Patagônia, Sibéria, Bali, na Antiga In-
glaterra, por várias partes da Europa, até mesmo no Tibet, onde se estabeleceu uma
vertente que o une ao Budismo, o ‘Xamanismo Bon’.
Os xamãs controlam os espíritos no corpo e podem abandonar os estados coti-
dianos da existência a fim de viajar, ou voar, para o que é tido como outros mundos.
Eles, geralmente homens, podem ingerir substâncias alucinógenas ou realizar rituais
para atingir estados alterados de consciência, entrando em contato com entidades do
mundo dos espíritos. Os espíritos ruins terão de ser controlados ou combatidos; os
bons terão de ser convencidos a ajudar. Ao retornar ao mundo comum, os xamãs que
atingiram seu intento são vistos como tendo prestado serviços essenciais à comuni-
dade; caso contrário, irão enlouquecer e até mesmo morrer.
Usando os poderes e a sabedoria obtidos em seus encontros com outras reali-
dades, são capazes de curar através de canções, massagens, ervas ou mágicas, de pre-
dizer o futuro, controlar as disputas, combater desastres naturais e atacar inimigos.
(Bowker, 1997, p. 180)
Religião indígena
O xamanismo é constante em diversas manifestações indígenas brasileiras. No
contexto indígena brasileiro, o pajé corresponde à imagem do xamã. Proveniente do

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tupi, esta palavra substituiu no nosso idioma a expressão ‘xamã’. Mas as práticas são
as mesmas, com algumas variações culturais. Este sacerdote conhece profundamente
a essência humana, seja no seu aspecto orgânico, quanto no psíquico. No Brasil, esta
tradição é conhecida como pajelança, e é comum o uso de instrumentos musicais ca-
racterísticos de nosso país, como maracás, zunidores, entre outros. O Pajé, por sua
vez, normalmente fuma cachimbos de grande porte. O essencial, porém - as técnicas
de cura e as comunicações espirituais -, está sempre presente nestes rituais.
Xamanismo ou Pajelança – Comunicação com os encantados e entidades ances-
trais através de cânticos, danças assim como nos índios Guarani Kaiová e utilização de
instrumentos musicais (maracá, zunidores) para captura e afastamento de espíritos
malignos tipo mamaés, anhangás. Há também a utilização do jejum, restrições dietéti-
cas, reclusão do doente, além de uma série de práticas terapêuticas que incluem: o
uso do tabaco (o pajé fuma grandes cachimbos) e outras plantas psicoativas, aplicação
de calor e defumação, massagens, fricções, extração da doença por sucção/ vômito,
escarificação no tórax e locais inflamados com bico, dentes de animais ou fragmentos
de cristais.
No Brasil rural e urbano, apesar da tradição multiétnica dos ameríndios, ob-
serva-se a presença dessas práticas médicas-religiosas em comunhão com rituais cató-
licos e espiritualistas de origem africana. Esse xamanismo é conhecido em algumas re-
giões como pajelança cabocla, culto aos encantados, toré, catimbó, candomblé de ca-
boclo, em rituais de umbanda, culto a Jurema sagrada.
Atualmente no Brasil existem várias vertentes de neo-xamanismo ou xama-
nismo urbano, entre estas linhas diversos grupos se reúnem para estudar e trocar co-
nhecimentos sobre o tema.
O Xamanismo, ou como conhecemos (índios) costumavam se obliterar em ca-
vernas, matas virgens, além de florestas, os rituais com seiva de animais mortos era
um costume tanto quanto normal, o Xamanismo vem desde a existência brasileira, e
com isso, tem suas apresentações, coloniais realizadas apenas entre eles, e a diferenci-
ação, de raças.
2 - HINDUÍSMO
Por hinduísmo não estamos apenas indicando a religião da Índia, mas sim o con-
glomerado de tradições religiosas que seguem ou aceitam a autoridade os Vedas, em
claro contraste com as que não o fazem. Nesse último caso podemos incluir o budismo,
o Jainísmo e o Siquísmo. Então, todas as tradições religiosas indianas que não contestam
a autoridade das escrituras védicas inserem-se dentro do amplo conceito do hinduísmo.
Indianistas como Arthur A. Macdonell, bem como mestres tradicionais do Hin-
duísmo, consideram que o termo “hinduísmo” foi introduzido pelos estrangeiros prove-
nientes das províncias próximas da Índia, como o Afeganistão, o Baluchistão e a Pérsia.
Há um rio chamado Sindhu que faz fronteira com as províncias situadas ao noroeste da
Índia, e, uma vez que os muçulmanos daquela região não conseguiam pronunciar corre-
tamente a palavra Sindhu, eles chamavam o rio de “Hindu” e os habitantes desta região
de “hindus”. Na Índia, segundo o idioma védico, os europeus são chamados mechas ou
yavanas. De modo similar, “hindu” sempre foi o nome dado aos indianos “infiéis” pelos

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muçulmanos e mais tarde aos indianos “gentios” pelos missionários e colonizadores eu-
ropeus (Macdonell, 1972, p. 142).
Esta categoria religiosa, conhecida como hinduísmo, é conhecida na Índia como
o Sanātana-Dharma “religião eterna” ou Vaidika Dharma “religião dos Vedas”. Mas, não
é tão simples assim. Quando ela é observada além dos conceitos acadêmicos, na reali-
dade do dia a dia, na tradição popular, constataremos que não há apenas um tipo de
Hinduísmo, mas sim vários Hinduísmos. Segundo Paul Hacker, o hinduísmo tomado
como um todo pode ser observado em “duas formas de pensar, a neo-hinduísta e a tra-
dicionalista (Hacker, 1995, p. 232). Pode-se constatar que há uma distinção bem clara
entre os hinduísmos tradicionais e o neo-hinduísmo.
O hinduísmo tradicional foi uma das grandes reformas do Sanātana Dharma, que
ocorreu quando o bramanismo ou a antiga religião sacerdotal dos sacrifícios e das castas
foi contestado pela heterodoxia budista e jainista (Séculos V a VI a.C.). Os valores dessa
época, que podem ser encontrados nos textos das Upaniṣads, Purāṇas e Mahābhārata,
procuram integrar o bramanismo e as religiões proto-hinduísta, ou seja, conciliar os ele-
mentos védicos e tântricos (Eliade, ?, Tomo II, p. 256-258).
O termo “neo-hinduísmo”, como foi utilizado por Paul Hacker, refere-se à inter-
pretação do hinduísmo. por hindus em resposta aos interesses do Ocidente não-hindu,
e usando a terminologia e as suposições do Ocidente.
Os primeiros não aceitam serem rotulados como hinduísmo, mas sim pela desig-
nação de sua própria tradição. Para eles não há “um hinduísmo”, mas sim vários “hin-
duísmos”. O hinduísmo tradicional é categorizado em dois grupos amplos: os “hinduís-
mos smartas” e os “hinduísmos agâmicos.” Portanto, teologicamente falando, eles se-
riam vaiṣṇavas, śaivas, śāktas ou smartas, mas não hindus. Contudo, podemos constatar
que na Índia a maioria hindu da população se identifica como “hindus”. Mas isso se deve
mais às razões culturais, éticas ou políticas. Pois com a emergência do nacionalismo
hindu (hindutva), as religiões hindus uniram-se ecumenicamente para salvaguardar suas
identidades.
Os hinduísmos tradicionalistas smartas constituem-se de duas vertentes princi-
pais: (i) o “bramanismo ritualista” (Karma Mimaṁsā) – que é sobrevivência da própria
religião sacerdotal ortodoxa, mas agora amparado pela hermenêutica teológica dos Ve-
das, sacrifícios e mantras (hinos e preces), oferecida pelo Darśana do Purva Mimaṁsā.
Não há seitas brahmanista smarta, mas sim tradições familiares perpetuadas em linha-
gens védicas (gotras); e (ii) o “hinduísmo gnóstico do Vedānta Advaita” – que é a re-
forma feita por Shankara (780-820) no brahmanismo smarta arcaico, que foi interpre-
tado do ponto de vista dos ensinamentos filosóficos das Upanixades em detrimento dos
rituais. Essa tradição é a hermenêutica advaita (não-dualista) do Darśana do Vedānta.
Os hinduísmos tradicionalistas agâmicos possuem uma teologia e liturgia bem
definida principalmente pelos Āgamas, também conhecidos como Tantras, e identida-
des próprias que os definem como Religiões autônomas. As três grandes tradições reli-
giosas do Hinduísmo tradicional agâmico são: (i) o vaishnavismo, (ii) o shaivismo e (iii) o
shaktismo.
Os neo-hindus, entretanto, enfatizam que a unidade filosófica e teológica do
Sanātana Dharma só pode ser encontrada em um hinduísmo unificado e não sectário

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(que na verdade seria o neo-hinduísmo). Eles aceitam sem qualquer dificuldade se iden-
tificar com o hinduísmo. Segundo Hacker: “O neo-hinduísmo de fato afirma ser o hindu-
ísmo. Mas é um hinduísmo singular. Sua identidade substancial com o hinduísmo antigo
é questionável (Hacker, 1995, p. 230).
Quanto à questão do sentido de identidade hindu, Paul Hacker critica a “unidade
do hinduísmo”, e considera que “a unidade do hinduísmo é um postulado moderno, um
produto do neo-hinduísmo”. Pare ele ela é “inspirada essencialmente por apologias e
nacionalismos,” proclamada pelos “líderes do neo-hinduísmo” e adotada até certo grau
fora da Índia (Hacker, 1978, p. 482, 790, 802). Na verdade, a unidade do hinduísmo tra-
dicional é só uma unidade geográfica; e o próprio hinduísmo equivale basicamente a um
grupo de religiões que coexistem na mesma região geográfica e exibem várias caracte-
rísticas em comum, mas com muito mais sinais de divisão e antagonismo (Halbfass,
1995, p.12).
De acordo com o neo-hinduísmo, a verdadeira natureza do hinduísmo seria o
“universalismo” ou o “ecletismo radical”. Segundo ele, as tradições ortodoxas dos brâ-
manes ritualistas (bramanismo smarta) dos jñānis (smartismo de Shankara) e dos bhak-
tas e yogis (vaishnavismo, shaivismo e shaktismo) são “posições sectárias” do verda-
deiro hinduísmo.
Hacker considera que o pensamento neo-hindu procede do Ocidente e que os
pensadores neo-hindus se caracterizam como tal pelo fato de “sua formação intelectual
ser principalmente ou predominantemente ocidental. É a cultura europeia, e em muitos
casos até mesmo a religião cristã, que os levaram a adotar determinados valores religi-
osos, éticos, sociais e políticos. Mas depois eles articularam esses valores como sendo
parte da tradição hindu (Hacker, 1995, p.231).
Formado originalmente a partir do Brahma Samaj de Ram Mohan Roy (1774-
1833), que, nos fins do século XVIII, tentou um esforço de unidade religiosa. O neo-hin-
duísmo se fortaleceu com o Neo-vedānta de Vivekananda e Radhakrisnam. Sua influên-
cia também pode ser encontrada em Gandhi, Rabindranath Tagore, Sri Aurobindo e ou-
tros.
A conclusão filosófico-teológica última do neo-hinduísmo é o não-dualismo (ad-
vaita), bem similar à do Hinduísmo tradicional smarta de Shankara. Mas os pensadores
neo-hindus estabelecem o advaita de Shankara de uma forma inequivocamente mo-
nista-panteísta e universalista. Para Paul Hacker, Vivekananda (1863-1902) foi o “mais
influente modelador e propagador do espírito neo-hindu” (Halbfass, 1988, p. 228), bem
como “uma das principais figuras do pensamento e autoconhecimento hindu moderno
e exemplar expoente da autoimagem hindu em face ao Ocidente”. Em nome de um
“hinduísmo” genérico, Vivekananda levantou o estandarte do Advaita-Vedānta: “O sen-
tido de identidade [...] que (Vivekananda) tenta acordar em seus conterrâneos indianos
[...] significa, acima de tudo, a herança do Vedānta advaita, a herança de Shankara”
(Hacker, 1995, p.234).

3 - BUDÍSMO
O Budismo ou Bauddha, que em sânscrito, significa relacionado com Buddha, ou
seja, com “quem tem compreensão, iluminação ou sabedoria (buddhi)”, teve sua origem

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no Norte da índia com Siddhārta Gautama (563-483 a.C.), que ficou mais conhecido
como Buddha Sakyamuni.
A Doutrina básica de Buddha resume-se nas “Quatro nobres verdades”: 1)
Duḥkha - a existência do sofrimento (nascimento, morte, doença, velhice, aflição etc.);
2) Duḥkha Samudaya - a origem do sofrimento (ignorância e desejo.); 3) Duḥkha Nirodha
- a cessação do sofrimento; e 4) Duḥkha Nirodha Marga - o caminho para a cessação do
sofrimento (madhyana mārga).
Considera-se que o corpo é impermanente, composto de sofrimento e não tem
alma (anātman). Por isso o homem reencarna para ir se aperfeiçoando. Existe uma cons-
ciência que é o elo que o liga à outra vida. Através de reencarnações, vão-se queimando
os resíduos, a ignorância das Quatro verdades Nobres é eliminada e o homem atinge a
paz. A meta da vida seria, portanto o nirvaṇa, que é a cessação completa do sofrimento.
Propõe-se, portanto, o “Caminho Óctuplo”, também conhecido como Mad-
hyama Mārga “Caminho do Meio”:

1. Dṛṣṭi – visão correta;


Prajñā – conhecimento
2. Saṅkalpa – decisão correta;

3. Vāc – discurso correto;

4. Karma - ação correta; Sīla – moral

5. Ājīva - meio de vida correto;

6. Vyāyāma - esforço correto;

7. Amṛti - atenção correta; Samādhi - meditação

8. Samadhī - meditação.

Buddha foi principalmente um mestre e reformista ético e não um metafísico.


Ele foi mais um sábio e um terapeuta para a mente do que um pregador religioso. A
mensagem de sua iluminação mostra ao homem um modo de vida que conduz além do
sofrimento. Quando questionado sobre temas metafísicos, sobre se a alma era diferente
do corpo, se sobrevivia à morte, se Deus existia ou não, se o mundo era finito ou infinito
etc., ele evitava discuti-las.
Filosofias e teologias Budistas
Quanto às filosofias, sistematizada pelos diferentes mestres budistas, podemos
classificar os budistas em quatro escolas: 1) Mādhyamika (ou Śūnya-vāda); 2) Yogācāra
(ou Vijñāna-vāda); 3) Sautrāntika (Bāhyānumeya-vāda); e 4) Vaibhāṣika (Bāhya-
pratyakṣa-vāda). Nas escolas Mādhyamika e Yogācāra temos os seguidores do budismo
Mahāyāna, enquanto que nas escolas Sautrāntika e a Vaibhāṣika temos os do budismo
Theravāda. Essas classificações filosóficas decorrem de duas principais questões, uma
metafísica e outra epistemológica.

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Para a questão metafísica “Existe alguma realidade, mental ou não-mental?” te-
mos três respostas ou escolas diferentes:
1) Os Mādhyamikas afirmam que não existe realidade alguma, mental ou material;
tudo é o vazio (śūnya). Portanto são conhecidos como “niilistas” (śūnya-vādīs) e seu
principal representante é Nāgārjuna (150-250 d.C.); 2) Os Yogācāras postulam que só o
mental é real, todo o mundo não-mental ou material é destituído de realidade. Portanto
são chamados de “idealistas subjetivistas” (vijñāna-vādīs) e seus principais representan-
tes foram Asaṅga (Século IV d.C.) e Vasubandhu (Século IV-V d.C.); 3) Os Sautrāntikas
são os “realistas críticos” (bāhyānumeya-vādīs); o fundador dessa escola foi Kumaralata
(Século I d.C.); e 4) Os Vaibhāṣikas são os “realistas empíricos” (bāhya-pratyakṣa-vādīs);
essa é a escola é dos seguidores do Mahāvibhāṣa Śāstra, que são os budistas realistas
(Sarvāsti-vādīs) da Kāśmīra.
Para a questão epistemológica, sobre o caminho a ser trilhado, o budismo divide-
se teologicamente em três grupos principais:
1) Theravāda (Sthaviravāda) “Escola dos Anciões” ou Hīnayāna “Pequeno Veiculo”: Seu
objetivo é o auto esforço para alcançar o nirvāṇa (iluminação) que leva à libertação do
ciclo de nascimentos. Portanto eles aderem mais aos conceitos das “Quatro nobres ver-
dades” e do “Caminho Óctuplo” que constituem um sistema filosófico e de conduta
ética. Para eles a adoração de deidades é de pouco valor.
2) Mahāyāṇa (Mahāsaṅghika) “Grande Veiculo”: Pregam o conceito dos Boddhisattvas,
que são os seres que renunciaram ao nirvāṇa para ajudarem os outros a evoluírem, e
enfatiza-se a prática das seis virtudes (pāramitā): 1) benevolência (dāna), 2) caráter
(śīla), 3) tolerância (kṣānti), 4) tenacidade e vigor (vīrya), 5) meditação (dhyāna), e 6)
sabedoria (prajñā). No Mahāyāna o método de alcançar o “estado de buddha”, consiste
de num sistema de fé orientado de uma forma altruística, no qual, em adição a práticas
meditativas, a devoção aos Boddhisattvas é considerada como um método igualmente
válido para se obter o “estado de buddha”. A meta seria situar-se num estado de “assim-
dade” (tathatā) e considerar tudo como “vazio e não-dual” (śunya).
3) Vajrāyāṇa “Veículo do Raio ou Diamante” ou Mantrayāṇa “Veículo dos Mantras”: As
escolas do Mahāyāna que utilizam as técnicas místicas do Tantrismo, como mantras,
yantras etc., são conhecidas como Mantrayāṇa, Tantrayāṇa ou Vajrāyāṇa. Elas se ca-
racterizam como caminhos que conduzem de forma rápida e seguramente à perfeição
da iluminação. Vajrayāṇa formado por vajra “raio” ou “diamante” e yama “caminho”,
“meio” ou “veículo” significa literalmente o “veículo do raio ou diamante”. De uma
forma especial śunya “vacuidade” é representado pelo vajra. Vajra3, significando “dia-
mante”, foi escolhido para denominar a tradição tântrica budista devido à indestrutibi-
lidade do diamante, bem como sua habilidade de cortar todas as coisas. Apesar de o
Vajrāyāṇa aceitar todas as suposições do Mahāyāṇa, ele as expande e elabora ainda
mais com doutrinas próprias. A meta no Vajrāyāṇa é obter a Natureza de Boddhi (a matiz
da iluminação). Todo ser senciente é um buddha em potencial, mas ele ou ela não está
ciente disso devido a densa neblina ou ignorância que cobre a mente. A neblina seria o
pensamento erradio que discrimina e polariza todos os conceitos. Uma vez acionada, a
natureza Boddhi emerge como uma luz clara. Este estado de realidade pode ser obtido
pela combinação de prajṣā (sabedoria ou insight) com upaya (meio de ação correta que
3
Dorje e o nome tibetano para vajra.
25
é o mesmo que karuṇa ou compaixão). Assim, literal e figurativamente, é a crença nos
dois princípios de insight e compaixão e a sua sahaja (co-emergência) que conduz a pes-
soa ao estágio de mahasukha (grande alegria).
Budismo Zen
Assim como a escola do Vajrāyāṇa, o Zen é um ramo da tradição bu-
dista Mahāyāna. No entanto, através de sua história, o Zen também foi recebendo in-
fluências das diversas culturas dos países por onde passou. O seu período de formação
na China, em particular, determinou muito de sua identidade. Ensinamentos e práti-
cas taoístas exerceram grande influência no chan chinês. Conceitos como o wu wei, a
natureza fluida da realidade e a "pedra não entalhada" ainda podem ser identificados
no zen japonês e nas escolas correlatas. Mesmo a tradição zen de "mestres loucos" é
claramente uma continuação da tradição dos mestres taoístas. Outra influência, em-
bora menor, veio do confucionismo e a isso soma-se, ainda, a influência que o zen re-
cebeu do xintoísmo ao chegar no Japão.
Tais peculiaridades já levaram alguns estudiosos a considerar o Zen como uma
escola "independente", fora da tradição Mahāyāna — ou até mesmo fora do budismo.
Essas posições, no entanto, são minoritárias: a vasta maioria dos estudiosos considera
o Zen uma escola budista, inserida na tradição Mahāyāna.
As duas últimas são conhecidas conjuntamente como escolas do “budismo rea-
lista” (Sarvāsti-vāda), porque afirmam que tanto o mental como o material são reais.
Quanto à questão epistêmica “Como conhecer sobre a realidade externa?”, os realistas
Sautrāntikas afirmam que o mundo somente pode ser percebido por inferência, en-
quanto os realistas Vaibhāṣikas aceitam a percepção direta como único meio de se per-
ceber o mundo.
O Budismo quase que desapareceu na Índia, talvez devido às invasões muçulma-
nas no século XI, disseminando-se pelo Śrī Lanka e Sudeste Asiático, em uma forma pró-
xima do cânone páli, através do budismo Theravāda. O budismo Mahāyāna espalhou-
se pela China, Mongólia, Coréia, Japão e Tibete assumindo várias formas sincréticas.

4 - SIQUISMO
O siquísmo (ou sikhismo) é uma religião da Índia, fundada por Nanak (1469-
1539). Ele foi o primeiro dos dez gurus, ou mestres, dos siques (ou sikhs). A maior
parte dos adeptos dessa religião vive no estado do Punjab, no noroeste da Índia.
Os siques acreditam que existe apenas um Deus. Todas as pessoas são conside-
radas iguais e têm oportunidade de se unir a Ele (ou se fundir com Ele). Mas primeiro
precisam superar o egocentrismo por meio do louvor a Deus, do trabalho árduo e da
partilha com os outros. Por isso, o siquismo se baseia em três conceitos pragmáticos:
nam japma, kirt karma e wand chhakma “lembra-se de Deus, viver honestamente e
ajudar os mais necessitados” (Somany, 1992, p. 134).
Muitos siques pertencem à ordem chamada Khalsa. Os membros dessa ordem
evitam o álcool, o tabaco e as drogas, e se dedicam à oração. Os homens têm sempre
uma espada presa ao cinto. Não devem cortar a barba nem o cabelo, que cobrem com
um turbante.

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O principal templo sique é o Harimandir, ou Templo Dourado, no estado do
Punjab. O livro religioso do siquismo chama- se Adi Granth (Primeiro Livro), ou Granth
Sahib. Contém quase 6 mil hinos, canções de louvor a Deus, escritos por Nanak e ou-
tros gurus.
De acordo com a tradição sique, no final do século XI, Nanak teve uma visão na
qual Deus lhe ordenava começar a pregar. Ele atraiu muitos seguidores e se tornou o
primeiro dos dez gurus. O último guru foi Gobind Singh, que morreu em 1708. Gobind
criou o Khalsa como uma irmandade armada. Ele achava que os siques estavam sendo
maltratados pelos governantes da Índia. Desde a sua morte, o guru dos siques não é
mais nenhuma pessoa, apenas o Adi Granth , o livro sagrado.

5 - TAOÍSMO
O taoísmo religioso (tao-chiao) refere-se a seitas, linhagens e movimentos reli-
giosos que buscam atingir o Tao (“o caminho”) como suprema realidade e, consequen-
temente, a imortalidade pela meditação, liturgia, alquimia e filosofia.
Para o taoísmo, Tao seria a ordem do mundo, o princípio eterno do qual proce-
dem todos os fenômenos. A unidade seria superior à multiplicidade. O mundo provem
da união do ser Yang e do não-ser Yin. Os fenômenos são puras aparências. Tudo é re-
lativo. Para reencontrar esta unidade é preciso renunciar ao estudo, à vida coletiva,
“vomitar a inteligência”, proceder pela intuição, concentrar-se em lugar de extravasar-
se, é simplificar-se (Schlesinger, 1995, p. 2467).
Descrevendo o Tao, Lao-Tze (século VI a.C.), um dos inspiradores do taoísmo,
afirma que “O Tao de que se pode falar não é o Tao eterno; o nome que se pode falar
não é o nome eterno” (Svoboda, 2000, p.22).
Embora o Tao-te-ching proclame incessantemente a supremacia do nada sobre
o ser, do vazio sobre o pleno, isso não deve ser entendido no termo simplista de uma
negação da vida. Ao contrário, o objetivo último do taoísmo é a obtenção da imortali-
dade. Esse objetivo insere-se numa teoria complexa da economia do corpo cósmico. O
ser humano é a imagem do universo, animado por um sopro primordial dividido em yin
e yang, feminino e masculino, Terra e Céu. O fenômeno da vida identifica-se com esse
sopro oculto por trás de suas manifestações (Eliade, 2003, p. 258).
O taoísmo conta com dois textos, o Tao Te Ching e o Chuang Tzu. Algumas sei-
tas estão ligadas ao controle ritual dos espíritos e das correntes cósmicas do yin e do
yang; outras na disciplina interior pela meditação ou controle da respiração e regimes
de exercício mental e corporal. Os manuais de treinamento estão reunidos numa
imensa coleção de escritos, que, em sua forma reduzida, contém 1.120 volumes. (Bow-
ker, 1997, p. 96).

6 - CONFUCIONÍSMO
O confucionismo é a influência ética dominante na vida religiosa e social tradici-
onal da China e do Japão. Deriva dos ensinamentos do sábio K’ung Fu’-tzu (551-479
a.C.), conhecido no Ocidente como Confúcio, um reformador ético e social em um

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tempo de desordem crescente na China. Confúcio era cético ou indiferente a muitas
ideias religiosas tradicionais, mas um advogado vigoroso da piedade filial e dos ritos
ancestrais como a base para uma sociedade forte.
No entanto, somente na Dinastia Han (206-221 d.C.) seus ensinamentos foram
formalizados em um sistema político e religioso, desenhado para manter o balanço e a
harmonia entre o céu, a terra e a humanidade, e seus trabalhos tornara-se textos ofici-
ais.
São os Cinco Clássicos e os Quatro Livros: Os Analectos, A Doutrina do Meio, O
Grande Aprendizado e Mêncio.
A regra moral básica de Confúcio era: “O que não queres que façam a ti, não
faça aos outros”. Ele também enfatizou o aprendizado e o ritual correto como formas
de educação moral. Acreditava que o Céu é a fonte do potencial humano para o bem e
a conduta correta, mas ensinava que raramente o Céu se comunicava diretamente
com as pessoas, que deveriam olhar o passado para aprofundar sua compreensão de
como se comportar. (Bowker, 1997, p. 90)
7 - XINTOÍSMO
A tradição popular nativa do Japão foi mais tarde chamada de xintoísmo ou
xintó. Xintó é um nome produzido no século VI a partir da palavra chinesa shen, “ser
divino”, e tao “caminho”, mas no japonês nativo isso foi traduzido como kami no michi
(ou kannagara no michi) “o caminho do kami” ou “o caminho em consonância com o
kami”.
O kami são os poderes sagrados presentes em todo cosmo (ou às vezes apenas
o sagrado presente em um objeto), cultuados especialmente em santuários, ou jinja.
Coisas maléficas e misteriosas, se forem extraordinárias, são chamadas kami. Há inú-
meros kamis (yaoyorozu no kami em japonês), vastas miríades divididas em celestiais
ou terrenas. Os mais importantes são os criadores Izanami e Izanagi e o sol kami, Ama-
terasu.
Os kamis são vitais para mediar o musubi. a potência criativa do universo. Para
lidar com os kamis, especialistas religiosos – xamãs e adivinhos – têm seu papel, e o ri-
tual correto é mais importante do que a doutrina “correta”. Na religião primitiva, cada
clã, ou uji, tinha seu kami guardião, o ujigami. Quando o clã do imperador se tornou
dominante, um “clã” sagrado foi formado, tendo o imperador como líder divino. (Bow-
ker, 1997, p. 100)
Assim como o caminho do kami, o xintoísmo não possui fundador ou cânone de
textos sagrados que constituam suas escrituras, assim como nenhum sistema de dou-
trina fixo ou consensual. Em geral, é visto como uma maneira de manter a sociedade
unida por valores e atitudes comuns, sendo os mitos e as práticas religiosas a linha que
costura o todo. É uma religião de participação em ritos e festas tradicionais, nos san-
tuários e, por extensão, os lares. (Bowker, 1997, p. 102)
O culto japonês pode ser sintetizado na palavra matsuri, vinda de um verbo que
significa “entreter’ ou “atender”. Passou então a significar “servir ao kami”, ou a uma
pessoa com autoridade, ou às almas que partiram. Matsuri implica, assim, uma atitude

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de respeito e obediência e uma disposição para ouvir e obedecer. Ele pode ser público
ou privado.
Em público, o matsuri expressa-se nos muitos festivais realizados nos santuá-
rios, onde o kami é recebido como convidado de honra e reverenciado com atos rituais
de ação de graças. Os santuários diferem entre si pela sua história, pelo kami que hon-
ram e santificam e pela natureza dos rituais que realizam, mas muitos deles comparti-
lham a crença de que os kamis são revitalizados nos santuários, especialmente no ano-
novo. Em privado, o matsuri envolve a tradução da vontade e do poder do kami para a
vida cotidiana.
8 - JUDAÍSMO
O judaísmo começo “no princípio”, bereshith bara Elohim: “No princípio, Deus
criou”. Estas são as primeiras palavras da Bíblia judaica, chamada Tanach, de T, N e K,
as letras iniciais das palavras hebraicas TORAH (orientação e instrução), Nebi’im (profe-
tas) e Ketubim (escritos).
Existem pelo menos cinco diferentes narrativas sobre a criação no Tanach, mas
é a partir de Gênesis (ou Bereshth, em hebraico) que os judeus vêem um propósito e
um desígnio no trabalho divino de criar o mundo e colocar o homem dentro dele.
“Deus viu tudo o que foi feito: e era muito bom.” O livro do Gênesis também mostra
como a paz e a harmonia originais foram perturbadas e destruídas. (Bowker, 1997, p.
112)
O povo judeu acredita ser descendente de uma tribo que viveu em Canaã, re-
gião normalmente entendida como uma extensa area no Mediterrâneo oriental e que
engloba a maior parte do que é hoje Israel, Jordânia e Síria. No tempo dos patriarcas –
Abraão, seu filho Isaac e o filho deste, Jacó – a região situava-se entre os grandes cen-
tros da civilização no Oriente Médio: Egito, ao Sul; Mesopotâmia, a leste; e a terra dos
hititas, ao norte.
Os judeus creem ser descendentes de Abraão, um “arameu errante”, que se
tornou o pai de uma grande nação. Deus fez uma aliança com ele e prometeu-lhe uma
terra da qual jorrasse “leite e mel”. (Bowker, 1997, p. 114) Também creem que Deus
enviou-lhes Moisés, o profeta que livrou os israelitas da escravidão no Egito por volta
do século XIV a.C.
Os judeus são muitas vezes descritos como o “povo do Livro”, porque baseiam
suas vidas na Bíblia e, como tal, têm especial reverência pela revelação de Deus na
Torá. A Torá encontra-se entre os primeiros livros da Bíblia, que, além de história, con-
têm os 613 mandamentos (ou obrigações) fundamentais da vida judaica.
Nos livros encontra-se leis rituais, regras de higiene e leis morais. Para os ju-
deus as leis fazem parte de uma relação de aliança com Deus – como Seu Povo Esco-
lhido, eles devem observá-las integralmente.
Como resultado de sua história de dispersão e exílio, há comunidades judaicas
na maioria dos países. Ao longo dos séculos, costumes diferentes se desenvolveram
em diferentes comunidades, e embora os judeus tenham um forte sentimento de se-
rem um só povo, há também muitas divisões entre eles. Além das diferenças de nacio-
nalidade, na Europa Ocidental e nos Estados unidos, no começo do século XX, alguns

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grupos quiseram atualizar a tradição e adaptá-la às condições da vida moderna. Foi o
começo do atual movimento ortodoxo dos tradicionalistas e do reformistas dos mo-
dernizantes (Bowker, 1997, p. 126).

9 - CRISTIANÍSMO
O cristianismo teve início com a vida, o ministério, a morte, a ressurreição e a
ascensão de Jesus, um judeu que os cristãos acreditam ser o Filho de Deus. Sua raiz, no
entanto, são mais antigas e penetram fundo na tradição judaica., com o cristianismo
considerando-se a Nova Aliança ou Novo Testamento em relação ao Antigo.
A história e interpretação primitiva de Jesus, que o considerou o Cristo, ou
Messias, está registrada no Novo Testamento, que inclui os Evangelhos, as Epístolas
(cartas) e outros escritos do século I. Todos eles reconhecem que Jesus foi, e é, a inter-
venção pessoal de Deus para restaurar Seu poder e força no mundo (Bowker, 1997, p.
136).
No início, o cristianismo era um movimento pequeno, seguro de sua experiên-
cia do Espirito Santo e de sua confiança na ressurreição de Cristo. Entretanto, na época
dos imperadores Constantino (280-337) e Teodósio I (379-337), ele tornou-se a religião
do Império Romano (Bowker, 1997, p.137). Considera-se que, nessa ocasião, Igreja Ca-
tólica Romana foi fundada por Pedro, um dos discípulos de Jesus, Ele foi o primeiro
bispo de Roma, que é o título oficial do papa. Ele foi escolhido por Jesus especifica-
mente para divulgar a fé cristã. Assi surgiu a Igreja Católica Romana.
Situada na cidade do Vaticano, que é um estado independente na cidade de
Roma, a Igreja Católica Romana é a voz autorizada do cristianismo para todos os católi-
cos do mundo (Somany, 1992, p. 182-183).
Os cristão jamais estiveram de acordo sobre a fé e a prática. Nos primeiros sé-
culos , concílios estabeleciam credos como a afirmação mínima da verdadeira crença.
Dois deles ainda são usados, o Credo dos Apóstolos e o Credo de Nicéia. Mas surgiram
divisões ainda mais importantes , especialmente entre o cristianismo ocidental e orien-
tal ou ortodoxo. As tentativas de unificação todas falharam. Os cristãos ortodoxos re-
jeitam as reivindicações de autoridade universal do Bispo de Roma, tornadas mais ab-
solutas pelo Concílio Vaticano I (1869-1870), que afirmou a infalibilidade papal em as-
suntos morais e de fé (Bowker, 1997, p. 137).
O cristianismo ortodoxo refere-se às Igrejas síria, grega e russa. Já o cristia-
nismo ocidental foi dividido pela Reforma (século XVI) e a Igrejas reformadas continua-
ram a se dividir quanto à doutrina e à prática, dando origem às Igrejas luterana, calvi-
nista, batista, metodista . Também temos a separação da Igreja anglicana.
O envolvimento da Igreja com as coisas do mundo levou alguns a aderir a or-
dens religiosas monásticas, onde se concentravam nas orações, muitas vezes com vo-
tos de pobreza, castidade e obediência. Liturgicamente, os cristão comemoram, em
festividades, a vida, morte, ressurreição e ascensão de Jesus, celebrando os santos,
mestres e mártires. A busca da santidade e o desejo de estar em “contato” com o sa-
grado tornou popular as peregrinações a santuários e relíquias. A prece, o culto e a ca-
ridade são básicos para a vida cristã (Bowker, 1997, p.137).

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10 - ISLAMÍSMO
A palavra islã deriva da raiz verbal slm, como em aslama “submeter-se” e sig-
nifica “submissão a (Deus)”. O particípio presente desse verbo, muslim “muçulmano”
indica “quem se submete” (Eliade, 2003, p.191).
Os muçulmanos professam, como os judeus, um monoteísmo rigoroso (não
aceitam, por exemplo, que Deus tenha se encarnado, como os cristãos) e têm um prá-
tica religiosa constante e regular, que os faz parar tudo o que estão fazendo cinco ve-
zes por dia, voltar-se na direção de Meca e rezar a Allah, Deus em árabe (Azevedo,
1994, p.35).
O islamismo ou islã começou historicamente na Arábia, no século VII, com o
Profeta Maomé. “A paz esteja com ele”, uma benção repetida a qualquer menção de
seu nome, mostra a reverência que se tem pelo Profeta.
A palavra Qur’ān (Corão), de qara’a, “ler, declamar”, é, para os muçulmanos, a
palavra de Deus transmitida por Gabriel a Maomé, o último da sucessão de profetas
bíblicos (Eliade, 2003, p. 193). Os dois grandes temas do Corão são o monoteísmo e o
poder de Deus, bem como a natureza e o destino dos homens em sua relação com
Deus. Deus é o único criador do universo, dos homens e dos espíritos; é benévolo e
justo. Recebe nomes que lhe descrevem os atributos como Onisciente e Onipotente.
Os seres humanos são os servos privilegiados do Senhor e têm a possibilidade de igno-
rar os mandamentos de Deus, sendo muitas vezes induzidos à tentação pelo anjo de-
caido Iblīs (Satã) expulso do céu.... No dia do Juízo todos os mortos ressuscitarão, se-
rão julgados e enviado para o inferno ou para o paraíso por toda eternidade (Eliada,
2003, p. 194)
Contudo, segundo o próprio relato, o islã começou como o modo de vida, ou
din (geralmente traduzido como “religião”), que Deus pretendeu para sua criação
desde o início. A revolta e o pecado humanos significam que Deus enviava constante-
mente profetas, incluindo Moisés, chamado Musa no islã, e Jesus, a figura central do
cristianismo, chamado ‘Isa pelos muçulmanos, para reconduzir as pessoas ao din apro-
priado. No entanto, com exceção de Maomé, todos eles foram rejeitados, perseguidos
e até executados (Bowker, 1997, p. 160).
Sharī’ah é a lei divina do islamismo, e a interpretação da lei é o figh ou jurispru-
dência. Maomé não fazia distinção entre a lei religiosa e a secular. Em cada país muçul-
mano a aplicação da sharī’ah depende do grau de secularização do próprio estado (Eli-
ade, 2003, p. 201).
Os sunitas são o principal troco do islamismo. Tornaram-se hegemônicos depois
da morte de Maomé. Os wahabistas, um ramo do sunismo, controlam a Arábia Sau-
dita, onde ficam as cidades sagradas de Meca e Medina. Os xiitas são o segundo maior
grupo islâmico. Consideram Ali, primo e genro de Maomé, o sucessor legítimo do pro-
feta. Estão presentes no Irã, parte do Iraque e Síria – com os alauitas (onde são mino-
ria, mas ocupam o poder). Os kharijita, durante a primeira divisão do Islã ficaram ao
lado dos xiitas, mas depois criaram uma corrente própria. O único grupo que sobrevive
são os ibaditas, que vivem em Omã e parte da Argélia.

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O sufismo, aspecto interior e místico do islamismo, é um modo de vida que
busca a realização da unidade e da presença de Deus por meio do amor, do conheci-
mento baseado na experiência, da ascese e da união extática com o Criador bem-
amado (Eliade, 2003, p. 204). Porque buscam uma ligação direta com Alá usando técni-
cas como música e dança, alguns países consideram a prática como ilegal, herética e
blasfema.

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