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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Prof. Rodrigo Lemos Arteiro

E-mail: rodrigoarteiro@toledoprudente.edu.br

03/02/2015

INTRODUÇÃO

Historicamente o Direito Processual Penal foi criado para os modelos totalitários de


governo, uma ferramenta para recolher informações de cidadãos de modo a imprimir uma
punição, muitas vezes excluindo pessoas indesejadas da sociedade, passiveis de discriminação.

Na idade media, o Processo Penal foi a instituição da própria inquisição, servindo para
identificar o herege e puni-lo queimando-o vivo, ou seja, a punição não servia para proteger o
Estado Democrático, mas sim, como forma de opressão.

O Processo Penal Nazista, não buscava a justiça, mas tão somente mapear os Judeus e
exterminá-los simplesmente por serem indesejados.

No Brasil durante o Regime Militar o Processo Penal era ferramenta para localização
de pessoas subversivas que se opunham ao Regime. Nessa época criou-se o interrogatório
preliminar, em que ocorriam as sessões de tortura e o réu era obrigado a assinar como se
tivesse confessado os crimes pelos quais estava sendo acusado. Assim, pessoas eram
perseguidas e eliminadas em uma estrutura totalitária.

No atual contexto, com o Estado Democrático de Direito, o Processo Penal tornou-se


ferramenta para uma aplicação justa do Direito Penal.

CONCEITO

Processo Penal é o ramo da ciência jurídica que se propõe a disciplinar e regrar a


atividade persecutória do Estado, fazendo valer a aplicação justa do Direito Penal na solução
dos conflitos de interesses entre o Poder de Punir do Estado e o Direito de Liberdade do Réu.

O conceito abarca o objeto, finalidade e o conflito que sempre existirá.

OBJETO  ATIVIDADE PESECUTÓRIA DO ESTADO

O objeto de estudo e regramento do Processo Penal é uma atividade que o Estado


desempenha, denominada Atividade Persecutória.

Atividade Persecutória são todos os atos que o Estado passa a praticar quando ele
toma conhecimento de um crime, ou seja, a prática de um crime deflagra uma movimentação
do Estado que é inerente à sua condição.

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Esta atividade persecutória se propõe a elucidar e punir crimes. O Estado se


movimenta para elucidar (reunir provas) e apresentar uma acusação em juízo.

Os atos praticados pelo Estado são determinados por Lei, dessa forma, o Estado é
obrigado a desempenhar a atividade que é vinculada por Lei.

FINALIDADE

A finalidade da atividade persecutória é fazer aplicar o Direito Penal, dessa forma, o


Processo Penal é instrumento de aplicação do Direito Penal, em outras palavras, o Processo
Penal é indispensável para a aplicação do Direito Penal, a atividade persecutória precisa
acontecer para se aplicar o Direito Penal.

Isso ocorre porque o Direito Penal é instrumento de coação direta. O Estado se auto
limita no seu direito de punir e se auto determina que ele só poderá punir com o Devido
Processo Legal.

Com isso, concluímos que o Direito Penal, não é auto executável ou auto aplicável, por
ser o ramo do Direito mais atroz, mais invasivo, entrando na esfera de intimidade do indivíduo,
dessa forma, ele só acontece pela via processual. O cidadão somente sentirá o Direito Penal
através do Processo Penal.

O Direito Penal paira sobre a cabeça de todos, mas apenas entra na vida das pessoas
através do processo. Existe um instituto em inglês denominado “Bill of atender”, que são Leis
punitivas que impõe o Direito Penal em concreto (Leis que substituem uma sentença). Nossa
legislação não admite esse tipo de Lei, pois não respeitaríamos o processo. Não permitindo o
processo, não se permite o debate acerca do fato bem como não se permite a dosimetria no
poder de punir do Estado.

O Processo Penal é ramo de jurisdição obrigatória ou necessária para indivíduos que


praticam fatos típicos, independentemente de quem seja.

PERSECUÇÃO PENAL

Ela é tão intensa e ampla que possui duas fases:

 Fases

o Inquisitiva ou Investigatória

o Judicial ou Processual

Possui como desfecho a condenação ou absolvição.

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 Lide Penal  Direito de Punir vs Direito de Liberdade

O objeto da Persecução Penal é a Lide Penal, ou seja, a Persecução Penal se propõe a


solucionar uma lide penal.

Lide, por si só, é o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida,
trazendo este conceito para Lide Penal, podemos defini-la como conflito de interesse (Poder
de Punir x Direito de Liberdade) qualificado pela pretensão punitiva do Estado e resistido
pelo direito de defesa do réu.

Quando a Lide for Penal sempre o conflito de interesse recairá sempre sobre dois bens
da vida (Direito de Punir do Estado vs Direito de Liberdade do Réu).

PRETENSÃO PUNITIVA VS DIREITO DE DEFESA

A pretensão punitiva é concretizada através do pleito condenatório, em regra,


requisitado pelo Ministério Público e Direito de Defesa baseia-se na intenção de se ver
absolvido o réu.

Se não houver o Direito de Defesa, não há como ocorrer a condenação. A Lide Penal é
sempre pautada pela Lei, pois lidamos com valores indisponíveis, diferentemente da Lide Civil
que é dinâmica e abarca diversas situações e direitos.

SISTEMA PERSECUTÓRIO DO ESTADO

A Persecução Penal acontece dentro de um sistema, harmonizado pela Constituição


Federal. É o sistema que impulsiona a atividade persecutória e se funda em 4 pilares
constitucionais:

1) Órgãos de Segurança Pública (Art. 144, CF);


a. Predominantemente da fase inquisitiva.

2) Ministério Público (Art. 129, I, CF);


a. Possui a incumbência de iniciar a fase judicial.

3) Poder Judiciário (Art. 5°, XXXV, CF); e


a. É o guardião de direitos, atuando em toda a persecução, mas
predominantemente na fase judicial.
i. Na fase inquisitiva atua fiscalizando-a, supervisionando-a e fazendo
controle de legalidade da investigação.

4) Defesa (Art. 133, CF).


a. Possui a incumbência de refrear a atividade persecutória, para que não haja
abusos, injustiças ou erros.

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i. É tão importante o papel da defesa, que se ela não atuar, qualquer ato
punitivo é nulo. Queira ou não o réu, queira ou não os demais órgãos
do sistema persecutório a defesa sempre será obrigatória, caso
contrário não há legitimação da punição.
ii. Nenhum poder pode invadir a vida do cidadão sem a participação da
defesa, dessa forma, o advogado acaba legitimando a construção do
Poder Estatal.

04/02/2015

LEI PENAL VS NORMA PENAL

A Norma ou Lei Processual só possui razão de ser para concretizar a Norma ou Lei
Penal.

A Lei é um texto (uma unidade relacional ou unidade normativa), enquanto que a


Norma é uma ideia (uma unidade jurídico-ideológica), dessa forma, para alcançar a Lei basta a
leitura, enquanto que a Norma depende de interpretação. A Lei é concreta e a Norma
abstrata, que expressa o sentimento normal de justiça. A Lei é sempre continente enquanto
que a Norma é conteúdo, ou seja, a Norma esta contida na Lei, em outras palavras, a Lei
veicula a norma, visto que a Lei incorpora a Norma. A Lei Penal é descritiva (descreve
condutas) enquanto que a Norma é proibitiva, visto que, a Lei descreve a conduta que ela não
quer ver ocorrer. A Lei Penal pode sofrer controle formal de constitucionalidade, enquanto
que a norma sofre controle material de constitucionalidade.

LEI NORMA
Texto Ideia
Leitura Interpretação
Concreta Abstrata
Continente Conteúdo
Descritiva Proibitiva
Controle Formal de Constitucionalidade Controle Material de Constitucionalidade

Pelo Princípio Constitucional da Legalidade, as Normas só podem ser vinculadas


através de Lei, pois somente ela é capaz de expressar a vontade popular de forma
democrática. Por isso o parlamentar deve captar o senso de justiça da sociedade e inseri-lo na
Lei.

O que caracteriza uma Norma Penal é a existência de uma sanção. Dessa forma, a
Norma Penal é toda aquela que delimita o poder de punir do Estado, tanto instituindo-o,
como destituindo-o bem como limitando-o.

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Quando o Estado institui o poder de punir ele esta restringindo um Direito


Fundamental que é a liberdade de ir e vir. Na verdade quando ele institui o Direito de Punir ele
esta disciplinando o Direito de Liberdade.

Dessa forma o Art. 5°, XV, CF, que disciplina o direito de liberdade acaba sendo uma
norma constitucional de aplicabilidade imediata, mas de eficácia contida, pois cada vez que há
a criação e um novo crime cominado a uma sanção, a liberdade individual fica reduzida, ainda
que apenas no campo abstrato, pois a instituição da punição por si só já regra a sociedade.

Sendo assim, a Norma Penal é a mais invasiva de todas e por isso possui um Controle
Constitucional muito rigoroso. O primeiro limite, por exemplo, é que apenas Lei pode instituir
Norma Penal. O Segundo limite ocorre no tempo, pois toda norma penal que amplia o poder
de punir do Estado não pode retroagir para antes de sua entrada em vigor, porque o cidadão
ao tempo da conduta possuía o Direito Adquirido a Liberdade praticando aquele ato que
somente depois passou a ser previsto como crime.

NORMA PROCESSUAL PENAL

É instrumental, ritualística, não pune ou restringe a liberdade de alguém. Mas ela pode
dificultar a vida do cidadão, quando ela restringe o Direito de Defesa, diminuindo um prazo,
extinguindo um recurso, dificultando a atividade probatória, criando exigências burocráticas
para o Habeas corpus, entre outras, mas como podemos perceber nenhuma delas reflete
diretamente no Direito de Liberdade do Réu.

Entre outras características, toda Norma Processual Penal está vinculada a Jurisdição,
adstrita à atividade jurisdicional. A Norma Processual define o espaço de poder que o Juiz
possui dentro do processo. Aliás, todo poder do Juiz decorre do Processo e, portanto, se não
existir base processual, o exercício do poder será abusivo.

NORMA PROCESSUAL NO TEMPO

Não se pode fazer retroagir uma Norma Processual Penal no tempo, seja para piorar
ou melhorar a situação do réu. Não existe direito adquirido processual. A Lei pode, por
exemplo, restringir recursos, diminuindo a amplitude de defesa. Decorre disso o seguinte
princípio:

Princípio da Aplicabilidade Imediata (Art. 2°, CPP) – A Norma Processual é aplicada


assim que entra em vigor, independente da norma vigente à época do fato. Tempus regit
actum – o tempo rege o ato processual.

o Caso Daniela Perez (e Guilherme de Pádua) – Por conta do crime uma


mobilização popular deu iniciativa a um projeto de Lei que tornou o homicídio
qualificado um crime hediondo, no entanto, por se tratar de norma penal e ter
endurecido as regras contra aqueles que praticam tais crimes, os autores do

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crime que deflagrou a iniciativa popular não puderam “provar do próprio


veneno”, pois a nova regra não pode ser aplicada ao caso.

o Caso Nardoni – Foi responsável por desencadear um processo jurídico que


modificou o rito do júri, tornando-o mais célere e extinguindo o recurso
Protesto por Novo Júri (recurso do réu para ter um novo julgamento se a pena
tivesse mais de 20 anos). Nesse caso, a norma processual penal foi aplicada no
próprio Caso Nardoni.

NORMA PROCESSUAL NO ESPAÇO

Para as normas processuais só existe o Princípio da Territorialidade, ou seja, ela só


vigora no território nacional, pois quem aplica a norma processual penal são os juízes
brasileiros, sendo uma questão de soberania interna, reforçando a ideia que a norma
processual está adstrita, vinculada à atividade jurisdicional. Um Juiz argentino, por exemplo,
nunca aplicaria a norma processual brasileira.

A territorialidade, no entanto, é chamada “temperada”, pois pode ter sua


aplicabilidade restringida dentro do próprio território brasileiro quando há “imunidade
judiciária”. Os embaixadores e seus familiares por questão de política diplomática possuem tal
imunidade e no caso de cometerem crimes, eles não se submetem a aplicação da norma
processual penal brasileira, para que a soberania entre Estados seja preservada evitando crises
políticas. O praticante do crime, no entanto, ficará sujeito a responsabilização em seu país de
origem de acordo com as normas processuais vigentes no Estado em questão.

A “imunidade judiciária” assemelha-se ao foro por prerrogativa de função, mas não se


confunde com ele, pois, este último, diz respeito a imunidade judiciária para foros de primeira
ou até segunda instancia.

FONTES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL

 Fonte Formal ou de Produção

Formaliza o Direito Processual. É a União que produz o Direito Processual, por meio de
seu órgão legislativo que é o Congresso Nacional (Art. 22, I, CF). Todo o Direito Processual é
uno no território nacional (penal, civil, trabalhista), visando não ocorrer fragmentação
federativa.

Os Estados podem, de forma concorrente, legislar sobre normas procedimentais.

As normas processuais tratam da relação jurídica processual, de direitos e deveres


processuais, como o direito de defesa, provas, recursos, sustentação oral, etc. E para tal se faz
necessário Lei Federal.

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As normas procedimentais tratam da rotina forense, marcha do processo,


investigações (em que não há direito a ampla defesa), ou seja, elas não tratam de direitos e
deveres.

 Fonte Material ou de Cognição

Utilizada para conhecer o Direito Processual, para obter a norma processual. A fonte
material ou de cognição, portanto, é a própria Lei Processual Penal, contida no Código de
Processo Penal.

INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL

“Interpreta-se a Lei para obter a norma.”

“Toda e qualquer Lei admite todo e qualquer tipo de interpretação.”

Quando a Lei for interpretada, não poderá criar uma nova Lei, pois caso contrário
violaríamos o princípio da legalidade. É possível, no entanto, extrairmos a norma e sua
abrangência.

 Quanto ao Sujeito:

o Interpretação Autentica ou Legislativa

O próprio legislador interpreta a Lei. Pode acontecer do legislador criar uma Lei
interpretativa de modo a explicar uma Lei “mal feita”.

Quando a Lei interpretativa não modifica o âmbito de Direito da Lei interpretada, não
há conflito, no entanto, quando a Lei interpretativa muda o âmbito de direito da Lei
interpretada, ou seja, modifica o poder de punir do Estado, esta última possui efeito de Lei
posterior, promovendo modificação no ordenamento jurídico, promovendo a derrogação ou
ab-rogação da Lei anterior. Nos casos em que a Lei interpretativa torna-se mais gravosa, não
poderá retroagir à época da Lei interpretada, de modo que não se crie conflito intertemporal
de Leis.

o Interpretação Doutrinária

Realizada por estudiosos do Direito com rigor cientifico. É a mais abrangente das
interpretações. Ela não vincula, mas influencia o Direito.

o Interpretação Judicial

Deriva de toda e qualquer decisão judicial. Sempre que um Juiz decide alguma
questão, aplica o direito, exerce a jurisdição, faz-se a interpretação judicial, ainda que sucinta.

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Essa interpretação pode evoluir para jurisprudência, quando ela se torna repetitiva e
padronizada para casos semelhantes. Em regra, jurisprudência não vincula os magistrados,
mas também os influencia, podendo ser utilizada como elemento argumentativo.

No entanto, quando o STF edita uma Súmula Vinculante ela torna-se norma de Direito
que não habita a Lei e deve ser seguida pelos Magistrados e pela Administração Pública,
cabendo reclamação, caso alguém tome atitude contrária. As Súmulas Vinculantes estão
sujeitas ao controle formal e material de constitucionalidade.

 Quanto ao Método

o Interpretação Gramatical

Mera análise sintática do texto de Lei. Possui pouco valor científico.

Sua importância se limita a impossibilitar que o interprete deturbe o sentido da língua


para modificar a interpretação da norma.

o Interpretação Histórica

Se preocupa com a origem dos institutos jurídicos e como foram aprimorados.

o Interpretação Teleológica ou Finalística

Busca a finalidade da norma, ou seja, para que ela serve; o que se propõe a fazer ou
regrar. Possui alto valor científico.

o Interpretação Sistemática

É a mais científica de todas, pois inter-relaciona as normas, os institutos jurídicos como


sendo um sistema único.

 Quanto ao Resultado

Preocupa-se com a extensão da norma, se está além ou aquém da Lei Penal.

o Interpretação Restritiva

Quando o interprete restringe o âmbito da aplicação da norma, pois a Lei “disse mais
do que queria”.

o Interpretação Declaratória

Quando há exata simetria entre a Lei e a Norma, ou seja, a Norma está na medida da
Lei. Não há necessidade de se modificar o âmbito de incidência.

o Interpretação Extensiva

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Ocorre quando a Lei “disse menos do que queria”, dessa forma, o interprete precisa
estender o âmbito de aplicação da norma. Mesmo as normas penais que instituem poder de
punir admitem a interpretação extensiva. Por exemplo, no estatuto do desarmamento trata
como crime portar arma, munição ou acessórios, sendo necessário uma interpretação
extensiva com relação ao que são acessórios (torna a arma mais letal ou facilita seu uso).

INTERPRETAÇÃO ANALÓGICA VS ANALOGIA

A interpretação analógica é uma espécie de interpretação extensiva e como vimos


acima é perfeitamente aceitável, havendo inclusive situações onde o próprio legislador cria um
rol exemplificativo e abre a possibilidade para que o interprete insira outros exemplos a esse
rol, como por exemplo: “homicídio qualificado por explosão, incêndio ou qualquer outro meio
cruel”.

No entanto, a interpretação analógica não pode se confundir com a analogia, que não
é interpretação, mas sim uma técnica de supressão de lacuna normativa. Neste caso, a norma
não existe sendo necessário “pegar emprestada” outra norma para regular naquela lacuna. Em
se tratando de Direito Penal a analogia in malam partem é proibida, pois seria uma forma de
burlar o princípio da legalidade.

10/02/2015

PRINCÍPIOS NO PROCESSO PENAL

PÓS POSITIVISMO

Hoje vivemos uma fase chamada pós positivista do direito, alguns denominam de
direito contemporâneo outros utilizam uma expressão muito criticada chamada neo-
constitucionalismo e neste aspecto viver no pós positivismo significa dizer que os operadores
do direito, sobretudo os Juízes estão superando a visão legalista, a Lei não é mais o único
caminho para se declarar direitos.

Isso ocorre porque estamos diante de uma crise de confiança na Lei, sobretudo
porque estamos diante de outro problema que é uma crise de confiança moral e ética no
Parlamento. A sociedade já não mais confia no Parlamento, não só no Brasil, mas no mundo
todo, as pessoas desconfiam da efetividade da Lei como principal instrumento de concretizar
direitos, justamente porque não se sabe como elas são aprovadas.

Começamos a verificar que a legislação é utilizada para manipular o poder


fortalecendo a situação politica instalada e com isso perde seu sentido fundamental de
concretizar direitos. Não confiamos mais na Lei como a vontade do povo, porque o apoio
político é comprado, manipulado. A Lei passa por uma crise de aceitação, autoridade,

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legitimidade, por isso quando a Lei “não pega” significa que a sociedade não a reconhece
como boa, não confia naquilo que ela manifesta.

O resultado politico deste contexto é simples, pois verificamos uma lacuna, um


espaço deixado pelo legislativo que é ocupado pelo judiciário, inclusive o Supremo. Se existe
um espaço político, ou seja, se um poder não ocupa é natural que outro venha e o ocupe.

Assim o Judiciário assume o que chamamos de ativismo judicial absorvendo a


credibilidade deixada pra traz pelo legislativo e a maior prova disso foi a criação das Súmulas
Vinculantes, que possuem força de Lei e foram incorporadas pelo Brasil através da Emenda 45
de 2005.

O pós positivismo muda a relação do judiciário e do legislativo, com o judiciário


assumindo uma posição mais ativa, mais concretista, concretizando direitos que o legislativo
deixou de realizar, utilizando como base diretamente a Constituição Federal. Dessa forma, o
judiciário passa a utilizar os Direitos Constitucionais Previstos para concretizar direitos.

Antigamente havia um passivismo judicial, sendo o Poder judiciário um mero


aplicador da Lei, em outras palavras, um simples mecânico aplicador da Lei.

O pós positivismo possui como sua principal marca o reconhecimento que os


princípios possuem força normativa tal qual as Leis. Atualmente isso é óbvio, mas a 20 – 30
anos atrás os princípios eram apenas dicas, ideias, valores, cartas de intenções, mas não
normas, sendo dotados apenas de norma valorativa. (Sugestão de leitura: A Força Normativa
da Constituição – Autor Korad Hesse).

O Pós positivismo se inicia na Alemanha logo após a queda do muro de Berlim. E a


partir do momento que se tem esse conhecimento criamos duas categorias de normas: Norma
Princípio e Norma Regra.

FORÇA NORMATIVA DOS PRINCÍPIOS

 Norma Princípio

As normas princípio são um comando altamente hierarquizado. A Norma princípio


está no topo do sistema jurídico e possui alta carga valorativa. Ela não perde a natureza ética,
mas é norma, portanto, obrigatória e deve ser cumprida.

Possuem alta carga valorativa, expressando valores e sentimento do que é certo ou


errado. As normas princípio são elitizadas e escassas. Mas são importantes, pois expressam
valores que irradiam em todo o sistema jurídico.

Servem para originar as demais normas, inspiram sua criação, propiciam uma melhor
interpretação para as demais normas, servem de fundamento de validade e existência de
outras normas.

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Norma princípio é flexível, ou seja, elas se misturam umas nas outras, justamente por
expressarem valores.

O Direito Italiano utiliza a expressão dúctil (Sugestão de Leitura: Direito Ductil –


Gustavo Zagrebelsky), norma maleável, moldável caso a caso. Em outras palavras é possível
moldar a aplicação da norma princípio para solucionar determinado caso.

Alguns defendem que a norma princípio é norma rarefeita, porque possui baixa
densidade normativa (devido o caráter flexível) e alta carga valorativa. O resultado prático
disso é que quando duas normas flexíveis entram em colisão haverá a interferência de uma
na outra.

Quando houver colisão de normas princípios antagônicas se resolve pela ponderação


ou otimização de valores. Por exemplo, Direito de Intimidade vs Direito a Informação /
Moralidade Política  A secretária de Marcos Valério durante a CPI dos Correios divulgou a
agenda dele que acabou por desaguar no Mensalão, sendo uma clara violação do Direito de
Intimidade, no entanto, nenhum Juiz a censurou por isso, pois aqui a moralidade política era
mais importante que a intimidade. Outro caso emblemático, foi da Daniela Cicarelli transando
com o namorado na praia, na ocasião ela obteve uma liminar caçando o acesso ao “You Tube”
no Brasil inteiro, neste caso o Juiz preservou a intimidade, pois a intimidade era mais
importante que a informação. Ou seja, nesse caso queríamos ver a Cicarelli por diversão
enquanto no outro houve invasão de intimidade, mas pela moralidade política.

Quando falamos em norma princípio não podemos estabelecer uma opinião pré-
definida acerca de uma norma ser mais importante que outra, pois sempre devemos levar em
conta o caso em concreto.

As normas princípio, portanto, se encontram em um plano supralegal, no plano


constitucional.

 Norma Regra

Existe em grande quantidade. Alias é argamassa do ordenamento jurídico, em outras


palavras a matéria prima do ordenamento jurídico é a norma regra. Por isso possui uma
hierarquia reduzida, abaixo da norma princípio.

A norma regra é dotada de alta densidade normativa. Sendo dura, inflexível e


invariável. A norma regra é criada caso a caso, moldada para uma realidade. Preestabelecida
já moldada para determinado fato. Ela possui viés prático, pragmático. Ela até expressa
valores, mas sua principal função é pragmática (aplicada pra casos pré estabelecidos), cujo
objetivo é solucionar problemas da vida cotidiana.

A norma regra quando entra em contradição com outra norma regra ocorre o
fenômeno denominado de antinomia, no qual somente uma sobrevive. Em outras palavras, a
que for mais adequada ao caso prepondera e a outra é aniquilada. Para avaliarmos a norma
mais adequada utilizamos os três critérios de solução de antinomia: Hierarquia, Especialidade
e Cronologia.

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Não há ponderação, não há mistura. O Art. 121, CP, por exemplo, só é aplicado
quando um sujeito mata o outro, não há como avaliarmos o valor da vida. Ela é prática. É tudo
ou nada, não é possível sinalizarmos.

Todos que são processados no Brasil possuem direito de defesa, sendo esta uma
norma princípio, agora quando a norma estabelece 10 dias para se defender estamos diante
de uma norma regra. (Sugestão de Leitura: Teoria dos Direitos Fundamentais – Robert Alexy; e
Pós Positivismo no Sistema da Civil Law - Ronald Dworking).

 Postulado Normativo (Criação Brasileira)

(Sugestão de Leitura: Teoria dos Princípios - Humberto Ávila)

Humberto Ávila criou a categoria Postulado Normativo também denominado de


Metanorma ou a Norma das Normas. O postulado normativo esta acima da norma princípio.
Dessa forma, é ela quem orienta a aplicação da norma princípio. Na verdade ela orienta a
solução dos conflitos, a ponderação dos valores constitucionais.

Se já existem poucas normas princípio, postulados normativos são raríssimos e


atualmente conseguimos identificar 3: Dignidade da Pessoa Humana (postulado normativo de
direito material) – dignificar o ser humano é não permitir que ele seja usado como um fim útil
ao Estado, em outras palavras o Ser humano não pode ser usificado, não pode ser meio para
enriquecimento, nem para a opressão e muito menos para a escravidão; o Devido Processo
Legal é um postulado do Direito Processual, que discorreremos sobre ele a seguir; por fim
existe um terceiro postulado que é a Justiça, também denominado de Princípio de
Razoabilidade ou Equilíbrio entre os Meios e os Fins. Por exemplo, não podemos querer matar
um passarinho com canhão e nem um cavalo com um estilingue, há que se ter razoabilidade e
proporcionalidade, dessa forma, por mais que uma Lei dissesse o contrário ela estaria violando
o postulado normativo da proporcionalidade (razoabilidade).

DEVIDO PROCESSO LEGAL

“Due processo of law”

O Devido Processo Legal é o que tem de melhor o Direito Processual, tendo sido criado
em 1215 na Magna Carta juntamente com o Principio da Legalidade (Máxima do direito
Material). O Devido Processo Legal, nada mais é que a legalidade no processo. Na Magna
Carta, possuía a intenção de limitar o poder do Estado.

Atualmente temos o Devido Processo (Legal) Substancial e Formal.

DEVIDO PROCESSO SUBSTANCIAL

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Devemos observar no Processo não somente os atos previstos em Lei, mas muito além
deles, o Processo não deve ser somente licito, mas precisa ser justo, não deve simplesmente
seguir a Lei, mas concretizar a Justiça.

O Devido Processo Substancial prima pela proporcionalidade das respostas Estatais


aplicadas aos Direitos Fundamentais. Não basta seguir a legalidade estrita a formalidade legal,
o Processo deve trazer um resultado justo gerando uma resposta proporcional ao
desdobramento do fato, para isso devemos analisar o efeito que o resultado do Processo
gerou nos direitos fundamentas do cidadão frente à conduta que gerou tal sanção.

O Devido Processo não é exclusividade do Judiciário, pois se lermos o Art. 5°, LIV, CF
perceberemos que ele normatiza que o Estado só restringira a liberdade e tirará os bens após
o Devido Processo Legal, dessa forma, ele se irradia como Postulado Normativo, perante os
três poderes, refletindo no ato de legislar, julgar e de administrar e aplicar a Lei.

O Devido Processo legitima o poder do Estado em qualquer uma das esferas


(legislativo; executivo; e judiciário).

O Devido Processo propicia a participação democrática do cidadão na construção do


ato de poder. Nós cumprimos a Lei porque participamos indiretamente na sua criação,
elegendo os parlamentares para que eles façam Leis em nosso nome. Agora se o parlamentar
é incompetente temos um problema, se a Lei é ruim outro problema.

Nós nos submetemos a uma decisão judicial porque participamos do contraditório,


ou seja, pudemos interferir na convicção do Juiz com nossos advogados, dessa forma, nos
obrigamos a cumprir a coisa julgada.

Imagine que os parlamentares se reúnam e decidam editar uma Lei disciplinando que
o crime de corrupção passa a ser de menor potencial ofensivo (norma penal mais branda,
portanto retroagiria), certamente violaria o Devido Processo Substancial, pois estaríamos
dando uma resposta desproporcional à gravidade do ato.

Dessa forma, o Devido Processo Substancial possui dois extremos: A vedação ao


excesso (punitivo, restrição de direitos e de ingerência), mas também a vedação a infra
proteção (ou vedação a proteção deficiente), pois a sociedade não pode ficar desguarnecida
no que se refere a sua proteção.

Sendo assim, se criarmos uma Lei que tira o poder do Juiz, violaria pela infra proteção,
por outro lado, se uma Lei concedesse poderes ao delegado para invadir domicílios a qualquer
horário sob qualquer pretexto, violaria pelo excesso. Podemos exemplificar também no caso
de um Juiz condenar alguém por furtar um pacote de bolacha à 15 anos de reclusão, ele não só
violaria o sistema trifásico de modulação da pena como também violaria o Devido Processo
Substancial no que tange a vedação ao excesso.

Assim, podemos perceber como é abrangente o Devido Processo Substancial, sendo


um postulado que engloba outros princípios que estudaremos mais a frente como o do Juiz
Natural; o Promotor Natural; a Vedação aos Tribunais de Exceção, etc.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Encontramos a aplicação do Devido Processo Substancial na relação entre particulares


também, demonstrando a eficácia horizontal dos direitos fundamentais (Sugestão de Leitura:
Eficácia dos Direitos Fundamentais - Ingo Wolfgant Sarlet).

Não apenas os Juízes restringem Direitos Fundamentais no Brasil, visto que, quando
um simples guarda de transito nos multa por uma infração qualquer, por exemplo, também
estará restringindo direito fundamental.

DEVIDO PROCESSO FORMAL

Aqui falamos do legalismo estrito, o positivismo clássico. Dessa forma, o Devido


Processo Formal é a mera sucessão de atos processuais previstos em Lei para legitimar uma
decisão final de uma determinada autoridade.

Em resumo o Devido Processo Formal nada mais é que os atos processuais previstos
em Lei que sempre existiram e sempre foram discutidos, no entanto, considerar apenas eles
seria pararmos na fase de positivismo.

O Devido Processo Formal é importante porque é objetivo, altamente pautado pela


Lei proporcionando maior segurança jurídica, ao passo que o Devido Processo Substancial é
mais subjetivo. O ideal é a aplicação de ambos, havendo uma adequação entre a legalidade e
a justiça.

JUIZ NATURAL

Não basta fazer o Processo de acordo com a Lei. O julgador também precisa ter
autoridade conforme prevê a Lei. Ou seja, para que um Juiz possa julgar em um Processo a Lei
precisa lhe dar competência. A Lei estabelece os limites do poder do Juiz e normatiza o que ele
pode ou não julgar, ou seja, o poder é pré-delimitado pela Lei. Isso nada mais é que principio
do Juiz Natural ou Legal.

Em resumo, Juiz Natural é o competente para julgar o caso, porque a Lei lhe concedeu
poder para aquele caso. A mesma lógica se aplica para o promotor natural.

PROMOTOR NATURAL

Aquele que a Lei lhe concedeu o poder para acusar pela pratica daquele crime.

A Constituição traz um mandamento extremamente simples e sintético: Ninguém será


processado e nem julgado se não pela autoridade competente. Quem define a autoridade
competente e os limites de seu poder é o legislador.

No mandamento constitucional a palavra processado refere-se ao promotor natural,


enquanto que a palavra julgado ao juiz natural.

Kleber Luciano Ancioto Página 14


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Se um Ministro do Supremo julgar uma ação de divorcio a decisão é nula, pois eles não
possuem competência para isso. Cada Juiz decide determinadas causas e cada promotor acusa
determinados crimes, caso qualquer um deles extrapole suas funções, a sua atuação no
processo é nula.

Isso é necessário para não ocorrer invasão, usurpação de poderes entre uma
autoridade ou outra.

Agora esses princípios não podem ser confundidos com o da Vedação aos Tribunais de
Exceção, que passamos a explicar abaixo.

VEDAÇÃO AOS TRIBUNAIS DE EXCEÇÃO

Nada mais é que a vedação aos Tribunais Ex Pos Factum, criados após o fato, Tribunais
de Encomenda, Tribunais com Julgamento Vinculado ou Pré-estabelecidos. Não se trata de
Tribunais de Justiça, mas sim Tribunais Políticos. Aqui o problema é intertemporal trazendo a
Politização da Jurisdição.

Tribunais de Guerra são exemplos de Tribunais de Exceção, criados para punir os


perdedores da guerra. O resultado disso é que a guerra continua. Para evitar isso se criou o TPI
- Tribunal Penal Internacional, pois antes não havia a busca por Justiça, mas sim Barbárie
Institucionalizada.

11/02/2015

PUBLICIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS

Art. 5°, LX, CF – a lei só poderá restringir a publicidade dos atos


processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o
exigirem;

Dessa forma, a regra é que se de publicidade dos atos processuais. O processo é inteiro
público, mas o que se publica é a sucessão de atos.

O processo é público, porque o Juiz precisa dar conhecimento e prestar contas dos
seus atos e decisões para as partes e para a sociedade. O Juiz quando conduz um processo não
pode ter nada a esconder e deve prestar conta do Poder que não é dele, mas sim do povo e ele
exerce em nome do povo, o Poder Jurisdicional.

A publicidade também é fundamental para que as partes possam reagir aos atos e
decisões constantes no processo. Quando se da publicidade para um ato ou decisão a parte
toma conhecimento e tem oportunidade de reagir aquele ato. A publicidade libera a eficácia
dos atos e decisões em relação as partes, para que elas acolham ou recorram da decisão.

Kleber Luciano Ancioto Página 15


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Assim que um ato ou decisão é publicado retira-se das partes a possibilidade de


alegarem ignorância, inocência e boa fé, por isso a publicidade impulsiona o processo para a
fase subsequente.

Ela é, no entanto, uma regra que comporta exceções nos casos de sigilo ou segredo de
justiça, utilizados para resguardar a intimidade do cidadão (ocorre mais em processo civil) ou
atender o interesse público do processo, pois às vezes o sigilo é fundamental para o
esclarecimento de crimes.

Para nós, portanto, o que interessa é o sigilo para atender o interesse público do
processo. Dessa forma, temos duas normas principio em colisão: publicidade e sigilo.

É claro que o sigilo também não é tão amplo, sendo regrado. Pra nós o que vai
interessar são dois tipos de sigilo: Da Investigação e Dos Documentos ou Peças
Investigatórias.

O Sigilo da Investigação é o mais intenso que existe. Este sigilo se manifesta para os
cidadãos inclusive os advogados, abrangendo a todos que não sejam dos Órgãos Persecutórios,
não sendo oponível apenas ao Promotor, Juiz e ao Delegado. A investigação não fica
registrada em bancos de dados públicos, não há como alguém saber que ela existe, em outras
palavras, esse sigilo não tem como ser relativizado. Geralmente esse sigilo cessa em um dia
muito desagradável, quando é deflagrada a prisão dos envolvidos na investigação.

O Sigilo dos Documentos ou Peças Investigatórias é mitigado, mas é o que mais


incomoda, porque os indivíduos investigados sabem que existem documentos que os
comprometem na polícia. Este sigilo, no entanto, não é oponível ao advogado (Súmula
Vinculante 14), dessa forma, o advogado possui direito de acesso ao inquérito e aos
documentos que estão ali encartados. O advogado possui a prerrogativa profissional de ler o
inquérito até para decidir se ele atuará ou não no caso.

Súmula Vinculante 14 – É direito do defensor, no interesse do


representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já
documentados em procedimento investigatório realizado por órgão
com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do
direito de defesa.

Caso o Delegado não permita o acesso do advogado, um simples Mandado de


Segurança de duas laudas simplesmente relatando o fato para qualquer Juiz Federal culminará
com a concessão do direito. Dessa forma, há apenas uma maneira do Delegado resguardar
algum documento, que é não encartá-lo no inquérito, pois a Súmula Vinculante disciplina que
o direito de acesso são aos documentos encartados no inquérito, sendo assim, o Delegado
possui a prerrogativa de guarda-lo fora do inquérito, como estratégia. Nestes casos de Sigilo
dos Documentos ou Peças Investigatórias, o Advogado não possui direito de fazer carga,
podendo apenas fazer vista e quando muito tirar uma foto.

MOTIVAÇÕES DAS DECISÕES JUDICIAIS

Kleber Luciano Ancioto Página 16


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Este princípio é muito importante, constando no Art. 93, IX, CF.

Art. 93, CF – Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal


Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os
seguintes princípios: [...] IX – todos os julgamentos dos órgãos do
Poder judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões,
sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em
determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente
a estes, em casos nos quais a preservação do direito À intimidade do
interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;
[...]

O princípio das motivações das decisões judiciais na verdade é uma determinação


imposta a todo Juiz. Dessa forma, o Juiz ao decidir deve dar as razões, explicar juridicamente a
decisão. Motivar uma decisão é argumenta-la juridicamente para defender sua opção de
Justiça. O Juiz precisa sustentar a argumentação com base no ordenamento jurídico vigente.

Quando o Juiz motiva sua decisão, ele presta esclarecimentos, explicações as partes e
a sociedade de um Poder que, como vimos, não é dele, mas que ele o exerce. Poderoso é o
Estado, o Juiz é o depositário do Poder, o detentor momentâneo do Poder e precisa expor
porque decidiu daquela maneira.

Com isso as partes podem se resignar da decisão, em outras palavras, aquele que
“tomou ferro” possui o direito de saber o porquê recebeu aquela punição.

A motivação também é fundamental para que as partes possam recorrer da decisão. A


matéria prima para o pleito recursal é a motivação da decisão judicial. Motivar, nada mais é,
que justificar de forma racional porque a decisão precisou interferir daquela forma na vida
alheia, visto que, o Juiz, mesmo sendo um semelhante igual a todos exerce o Poder de decidir
a vida de muitos.

A motivação nos permite realizar o controle da legalidade da decisão do Juiz, ou seja,


observar se a decisão esta ou não pautada pela Lei.

Decisão sem motivação é considerada nula, porque não possui conteúdo jurídico.
Uma decisão sem motivação é inexpressiva do ponto de vista jurídico.

Uma decisão sem motivação não pode ser reformada em um Tribunal, dessa forma, o
que se faz é anula-la e manda-la de volta para o Juiz prolate outra decisão, ou seja, para que
ele reavalie o mérito. Se o Tribunal decidir no buraco deixado pelo Juiz, ele suprime o direito
ao duplo grau de Jurisdição, pois ele decide como primeira instância.

CONTRADITÓRIO

Art. 5°, LV, CF – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo,


e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

Kleber Luciano Ancioto Página 17


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

O contraditório molda um modelo processual bilateral em que a verdade é produto da


confrontação (dialética). A verdade eclode pelo debate, pelo “toma lá da cá”.

Ele promove o equilíbrio entre as partes, pois fala uma parte, depois fala a outra,
argumenta uma parte, depois argumenta a outra e assim por diante.

Pensando o processo no âmbito estrutural o contraditório propicia um tratamento


igualitário às partes concedido pelo Juiz.

Contraditório origina-se da lógica dialética Aristotélica e não é um privilegio do


processo. A razão do contraditório é apurar a verdade judicial. O contraditório matura os fatos
fazendo eclodir a verdade ou se aproximando dela. A lógica aristotélica trabalha com quatro
expressões: hipótese – tese – antítese – síntese.

o Hipótese – É uma meia verdade, uma verdade imatura (Fase de Investigação);


o Tese – Afirma uma verdade (Promotor oferece denuncia);
o Antítese – Contraria a verdade (Advogado de defesa);
o Síntese – Há a definição de quem esta certo, quem se destaca (Decisão
Judicial).

O contraditório não é apenas argumentativo, mas é comprobatório também, e pelo


fato dele ser probatório é que as provas adquirem legitimidade para que o Juiz possa se
fundamentar nelas, ou seja, ao se juntar uma prova o Juiz sempre terá que ouvir a outra parte
acerca dela.

O antônimo de contraditório é algo que é unilateral, cujo nome técnico é inquisitorial,


sempre que o réu não tiver a oportunidade de dar uma resposta a uma prova ela é
denominada prova inquisitorial. O processo inquisitivo foi muito utilizado na idade média.

Atualmente a investigação é considerada inquisitorial, visto que, o delegado não


chama ninguém para opinar no inquérito.

AMPLA DEFESA

É diferente do contraditório, mas depende dele. Só exercemos a ampla defesa quando


somos acusados de algo. É denominado “ampla” porque ela abarca duas sub modalidades: a
autodefesa + a defesa técnica.

Com relação a Autodefesa, ele na verdade é um direito fundamental que todo cidadão
possui de opor resistência passiva ao Estado, no sentido de não se auto incriminar. Ninguém
é obrigado a produzir provas contra si mesmo, ninguém é obrigado a colaborar com o Estado
persecutório. Não é obrigado a falar, nem a dialogar e nem a dar bom dia à autoridade, o
individuo pode ficar em silencio e inclusive mentir, sendo essa uma resistência passiva.

A resistência ativa é crime, mas a passiva não, visto que, o indivíduo não pode ser
obrigado a colaborar com o Estado quando seu intuito é puni-lo.

Kleber Luciano Ancioto Página 18


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

O réu ou investigado que mente para a autoridade não comete crime, mesmo que
mentir para um Juiz. As testemunhas, no entanto, possuem compromisso com a verdade e se
mentirem sai presos. Já o réu não é preso, pois não temos no Brasil o crime chamado perjúrio
que é mentir na condição de réu.

A autodefesa é um direito fundamental renunciável, disponível, dessa forma, se a


pessoa quiser colaborar com o Estado ela pode.

A Defesa Técnica, por sua vez, é indisponível, sendo condição de validade do processo
penal. Aqui não existe querer ou não querer, pois sempre existirá defesa técnica. O direito de
defesa deve ser sempre exercido no curso da ação penal por advogado inscrito nos quadros da
OAB, mesmo que contra vontade do réu. A Defesa Técnica é exigência para se cumprir o
Devido Processo Formal, mas nem sempre abarca o Devido Processo Substancial.

A Defesa Técnica, não é exclusiva de advogados, visto que, em algumas situações


qualquer cidadão poderá exercer essa função, como por exemplo, para impetrar Habeas
Corpus em favor de quem sofre coação ilegal.

PLENITUDE DE DEFESA

Existe plenitude de defesa no Júri. Aqui há mais direitos resguardados que na Ampla
Defesa, ou seja, a Plenitude de Defesa possui tudo que a Ampla Defesa possui e mais um
pouco.

A Plenitude de Defesa prima pela Defesa Efetiva, ou seja, uma defesa de qualidade
técnica, que gere aptidão para absolver.

Ela não se limita ao campo do direito, podendo discutir-se qualquer conhecimento


humano, sejam filosóficos, políticos, religiosos, teatrais, cênicos, populares, etc., uma piada,
por exemplo, remove o rancor e faz bem para a saúde, etc.

Em resumo, a defesa precisa ser de qualidade e se o Juiz perceber que o advogado de


defesa “está patinando” deve suspender a sessão de julgamento e mandar nomear outro
advogado. Para tal, o Juiz declara o réu indefeso, suspende a sessão e marca outra sessão
com outro advogado.

VEDAÇÃO DAS PROVAS ILÍCITAS

Art. 5, LVI, CF – são inadmissíveis, no processo as provas obtidas por


meios ilícitos; [...]

A Vedação da Prova Ilícita é nada mais nada menos do que o Principio da Legalidade
no Processo Penal, é a consagração do Estado de Direito. Se o processo se propõe a punir uma
ilegalidade, por questão de coerência lógica ele precisa se pautar pela Lei e deve fazer isso com
preservação de direitos fundamentais.

Kleber Luciano Ancioto Página 19


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Não podemos querer provar um crime praticando outro, não podemos em hipótese
alguma pegar o produto de um crime e utiliza-lo em outro crime. O Estado não pode torturar
alguém para obter um depoimento para condenar outro. A ilegalidade vicia o processo e o
inutiliza. Desta forma, esta ilegalidade a qual nos referimos, pode gerar duas provas ilícitas:
Prova originariamente ilícita ou Prova ilícita por derivação.

A Prova originariamente ilícita é um crime camuflado por um ato processual, em


outras palavras um crime com aparência de ato processual. Por exemplo, condenar alguém
com base em um depoimento extraído sob tortura (claro que depois da sessão de tortura
estará no termo de depoimento que o individuo depôs livremente), enfim esta prova por si só
é imprestável e tudo que dela derivar também. A ilegalidade é como se fosse um vírus que
contamina o processo, por isso que alguns denominam de Teoria da Arvore Envenenada o que
chamamos de Prova ilícita por derivação.

A Prova ilícita por derivação é resultado da propagação da ilegalidade. O processo


penal baseia-se em nexos causais entre uma prova e outra.

Por exemplo, o indivíduo é torturado e o delegado descobre onde fica a boca de fumo,
o Juiz determina a busca e apreensão, encontra-se um pó branco cuja pericia comprova ser
cocaína, neste caso a prova pericial é prova ilícita por derivação, porque a boca de fumo foi
obtida pela prática de tortura.

Agora não podemos levar essa regra a “ferro e fogo”, por isso aplicamos uma Teoria
denominada de Fonte Independente da Prova, ou seja, quando temos uma fonte livre da
ilegalidade independente da prova ilícita, a prova volta a ser considerada lícita. Dessa forma,
por essa teoria há uma ruptura, uma quebra do nexo causal que obsta a propagação do ilícito.

Voltando ao nosso exemplo, houve a tortura, mas o Ministério Público também estava
investigando e tinha obtido a informação sobre a boca de fumo por outra fonte independente,
neste caso, aquela pericia que inicialmente se mostrava ilícita volta a ser lícita porque deriva
de outra fonte lícita.

24/02/2015

IGUALDADE PROCESSUAL

Denomina-se também de Princípio da Paridade de Armas e propõe um tratamento


equilibrado (equânime) para as partes.

Essa igualdade deve ser substancial, o que significa tratar desigualmente as partes na
medida de suas desigualdades para obter um tratamento efetivamente paritário.

Se observarmos o próprio Sistema Processual Penal já propõe essa igualdade


substancial em alguns casos, como por exemplo, a aceitação da prova ilícita que comprove a
inocência do réu; a presunção de inocência do réu, o que significa que se houver dúvida
quanto a sua culpa ele deverá ser absolvido. Esse tratamento desigual é importante porque o
réu é a parte mais fraca no processo e se pararmos para analisar ele luta contra duas

Kleber Luciano Ancioto Página 20


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

instituições muito poderosas que é o Ministério Público e a Polícia Judiciária, portanto, é justo
que ele possua algumas vantagens processuais. Seguindo nessa mesma linha é por isso que o
réu obrigatoriamente deverá ter uma defesa técnica, quer ele queira, quer não, quer ele tenha
condições financeiras, quer não.

LEGALIDADE ESTRITA DAS PRISÕES PROCESSUAIS (Art. 5°, LXI a LXVI, CF)

Aqui temos um único princípio esparso em seis incisos do Art. 5°, CF, ou seja, este
princípio representa a junção de todas as normas constantes do inciso LXI ao LXVI. Dessa
forma, estes incisos contem regras que limitam ou condicionam o exercício do Poder Prisional
do Estado.

Sendo assim, não se pode simplesmente chegar e prender alguém como ocorria na
época da ditadura militar, ao passo que os direitos previstos não podem nem ser suprimidos
por Lei, visto que, eles delimitam um campo mínimo de proteção ao Direito de Liberdade de ir
e vir.

É importante deixarmos claro que estas regras não se aplicam as prisões pena ou
prisões sanção, pois estas decorrem do Direito Penal, após proferida uma condenação em
definitivo pautadas em um juízo de culpabilidade.

As prisões denominadas processuais ou cautelares, no qual essas regras se aplicam,


não se prestam para punir ninguém e não são baseadas no reconhecimento de culpa de
alguém, sendo meramente instrumentais. Possuem o proposito de resguardar o processo
penal e a sociedade, dessa forma, elas se prestam para que o resultado do processo seja útil
ou para evitar a propagação de um crime.

As prisões processuais são a exceção necessária para proteger o processo e a


sociedade e não podem ser banalizadas.

Art. 5°, LXI, CF – ninguém será preso senão em flagrante delito ou por
ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente,
salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar,
definidos em lei;

Atualmente no Brasil alguém só pode ser preso de duas formas: Flagrante delito ou
por Ordem Judicial. Dessa forma, ninguém pode ser preso por ordem de um delegado ou
promotor, a única autoridade que determina que se prenda alguém é o Juiz, salvo a prisão em
flagrante que não depende de ordem judicial, sendo dependente somente da prática do crime.

Art. 5°, LXII, CF – a prisão de qualquer pessoa e o local onde se


encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à
família do preso ou à pessoa por ele indicada;

A comunicação imediata ao Juiz decorre da Cláusula de Reserva de Jurisdição que


aduz que é monopólio do Juiz deliberar sobre o Direito de Liberdade dos cidadãos, seja no
momento em que ele manda prender, seja no momento que ele analisa o auto de prisão em

Kleber Luciano Ancioto Página 21


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

flagrante. Dessa forma, imediatamente após a prisão em flagrante o auto de prisão em


flagrante deve ser enviado para o Juiz para que ele analise a legalidade do auto.

Art. 5°, LXV, CF – a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela


autoridade judiciária;

Sempre que existir uma falha formal no auto de prisão em flagrante o Juiz deve
reconhecer de ofício o relaxamento da prisão, isso porque, uma falha na estrutura formal do
auto de prisão acaba por desconstituir o Título (problema documental) e ele (Título) não
produz eficácia jurídica para manter alguém preso.

Art. 5°, LXIV, CF – o preso tem direito à identificação dos responsáveis


por sua prisão ou por seu interrogatório policial;

É um vício grave quando o Delegado não emite a Nota de Culpa, que funciona como
um recibo do preso. Na nota de culpa ira constar os responsáveis por sua prisão, quem o
interrogou além de outros elementos como o motivo da prisão. Isso tudo é fundamental para
que posteriormente possamos apurar responsabilidades.

A Nota de Culpa serve também para evitar que o indivíduo suma aos cuidados do
Estado, o mais interessante, no entanto, é que a Nota de Culpa é fornecida ao próprio preso e
enquanto o advogado ou familiares não chegam ele fica com o papel na cela.

A Nota de Culpa é importante para o advogado, pois facilita a localização do inquérito


referente ao caso, bem como para que o advogado possa conversar com as autoridades que
estiveram com o preso anteriormente e assim poder formular o Pedido de Liberdade
Provisória.

Art. 5°, LXVI, CF – ninguém será levado à prisão ou nela mantido,


quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança.

O Pedido de Liberdade Provisória não é baseado em uma ilegalidade formal, ou seja,


não se questiona a forma do flagrante, mas sim os pressupostos da prisão, ou seja, o
advogado terá que convencer o Juiz que não há mais pressuposto (fundamento) para mantê-lo
preso, em outras palavras, que não há fundamento para mantê-lo preso, visto que ele não
representa risco a sociedade. Dessa forma, o Advogado deve juntar documentos comprovando
que o preso não oferecerá perigo nem para a sociedade e nem para o processo, para só então
o Juiz Revogar a Prisão.

Resumindo, o pedido de liberdade provisória ataca o mérito da prisão, ao passo que o


relaxamento não, atacando apenas a formalidade da prisão.

Em regra a liberdade provisória não depende do pagamento de fiança, ou seja, o


indivíduo é solto apenas com o compromisso de responder ao processo. Mas temos os crimes
afiançáveis também.

A fiança nada mais é do que a substituição da prisão pelo dinheiro, para tal, o réu
deposita em juízo o valor da fiança e pode responder ao processo em liberdade, se por acaso
ele vier a ser declarado inocente, o valor da fiança pode ser resgatado.

Kleber Luciano Ancioto Página 22


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Art. 5°, LXIII, CF – o preso será informado de seus direitos, entre os


quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da
família e de advogado;

O indivíduo preso possui direito a manter contato com a família ou pessoa por ele
indicada e tem direito também a auxílio jurídico que vai exatamente analisar a legalidade da
prisão formular pedidos para assegurar a liberdade do indivíduo.

Aqui é importante falarmos que na prática o Habeas Corpus cabe para tudo, ou seja,
para pedir o relaxamento da prisão, a concessão de liberdade provisória, etc., mas para a
banca da OAB o Habeas Corpus só é cabível quando não couber o pedido de relaxamento ou
liberdade provisória.

O Habeas Corpus é o remédio constitucional mais antigo do Brasil existindo desde a


Constituição de 1824 devendo ser utilizado em regime de urgência. Uma particularidade
interessante é que quando foi assinada a Lei Aurea, muitos advogados entraram com Habeas
Corpus em favor dos escravos contra os Fazendeiros, que não tinham conhecimento que a Lei
havia sido assinada e estava em vigor, com isso podemos concluir que o Judiciário acelerou a
aplicação da Lei Aurea.

O Juiz pode conceder de oficio tanto Habeas Corpus, o relaxamento de prisão, como a
liberdade provisória, no entanto, nada impede que os advogados os requeiram.

PRESUNÇÃO DO ESTADO DE INOCÊNCIA

Este princípio constitucional disciplina que ninguém pode ser declarado culpado sem
uma decisão judicial com transito em julgado em definitivo. Isso significa que enquanto o
indivíduo é réu ou investigado ele goza de uma presunção de inocência. Na prática isso
significa que a presunção de inocência precisa ser vencida pela acusação, mas para sermos
mais claro, a presunção de inocência gera o fenômeno de inversão do ônus da prova, ou seja,
o ônus de provar a culpa é da acusação. Quem precisa criar o certificado de certeza do crime e
de certeza da culpa na consciência do Juiz é o Promotor através de provas e alegações
postuladas em juízo. Tanto é tarefa do Ministério Público que se ele não fizer muito bem esse
papel o réu é absolvido por insuficiência de provas.

Absolvição dubitativa é baseada no juízo de dúvida, nestas hipóteses o Juiz absolve


porque tem duvidas sobre a culpa, porque a prova é frágil ou insuficiente. Este é o in dubio pro
reu processual, dessa forma, sempre que o Juiz criminal ficar na dúvida ele não deve condenar,
mas absolver por um juízo dubitativo.

A presunção de inocência não só cria a absolvição dubitativa como também a


absolvição categórica, que é baseada no juízo de certeza, ou seja, o Juiz fica convencido da
inocência. O individuo absolvido categoricamente não pode ser condenado nem na esfera
cível, enquanto que quem é absolvido dubitativamente pode sofrer um processo civil para
cobrir eventual dano.

Kleber Luciano Ancioto Página 23


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

A sentença que absolve denomina-se sentença absolutória, isso porque durante o


tempo que o indivíduo responde ao processo ele é considerado inocente, mas essa inocência é
relativa e quando ele vence o processo, o Juiz concede a sentença absolutória, porque ela faz a
inocência que era relativa se tornar absoluta.

O instrumento que o Ministério Público utiliza para derrubar a presunção de inocência


é a Ação Penal, em outras palavras, manifestando a Ação Penal é que o Ministério Público
refuta (ataca) a presunção de inocência.

DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

Antigamente havia duvidas se o Princípio do Duplo Grau de Jurisdição era


constitucional, mas atualmente não paira mais duvida que ele é sim um princípio
constitucional implícito, pela forma hierarquizada que a constituição escalona o Poder
Judiciário.

O Duplo Grau de Jurisdição se fundamenta na busca pelo aperfeiçoamento da Justiça,


mas também para atender uma necessidade do ser humano de se obter uma segunda opinião,
que possui a função de resignar o ser humano deixando-o conformado com a decisão.

Coloca o Juiz de primeira instância atento aos seus próprios julgamentos, porque ele
sabe que suas decisões podem ser revistas e controladas, dessa forma, ele tenta a todo tempo
dar uma decisão boa e de qualidade, visto que ele não deseja ser censurado pelo Tribunal.

Permite uma reanálise do julgamento por Juízes mais experientes, que possuem
maiores vivencia e melhor que isso, a reanálise é feita por um grupo de Juízes (Três
desembargadores compondo uma Turma ou Cinco compondo uma Câmara), proporcionando
uma decisão mais democrática.

Ele ainda prolonga a vida do processo abrindo uma nova fase chamada de fase
recursal e com isso permite o amadurecimento do debate contraditório, para que o
julgamento venha com maior segurança jurídica e com menor chance de erro.

É importante ressaltarmos que para existir o Duplo Grau é necessário que tenhamos
duas decisões em um mesmo processo, dessa forma, embora o Habeas Corpus seja impetrado
no Tribunal ele não decorre do Duplo Grau, sendo uma ação autônoma de impugnação.

Sabendo disso, para respeitarmos o Duplo Grau, temos que ter no mínimo duas
decisões de mérito devidamente motivadas e fundamentadas, em outras palavras, o duplo
grau não se esgota em duas decisões apenas, mas sim em duas decisões de mérito sendo uma
em primeira instância e outra em segunda instância.

Dessa forma, se por alguma falha formal a decisão de primeiro grau for anulada, no
caso do Tribunal decidir aquilo que a primeira instância não decidiu não há respeito ao Duplo
Grau, pois a decisão em segundo grau deve se pautar em manter ou reformar a decisão em
primeira instancia. Lembrando que uma decisão de mérito é aquela que soluciona o conflito e
dá destinação ao Direito Material discutido conforme o fato.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

O Foro por Prerrogativa de Função não possui o Duplo Grau, mas o julgamento é
realizado por um colegiado além de possuir vários instrumentos próprios como os embargos
de declarações e de instrumentos, dessa forma, não há como afirmar que não existe reanálise
da decisão, mas apenas que não há uma mudança de Tribunal. Sendo assim, o Duplo Grau não
se justifica àqueles que possuem Foro por Prerrogativa de Função devido o julgamento ser
altamente elitizado com o que temos de melhor na Justiça.

25/02/2015

PRINCÍPIOS INFRACONSTITUCIONAIS

Ao contrário dos Princípios Constitucionais que se prestam a limitar o exercício do


Poder do Estado evitando abusos, os Princípios Infraconstitucionais servem para impulsionar a
Persecução Penal.

Antes de adentrarmos especificamente em cada princípio vale ressalvarmos que


quando nos referirmos a Persecução Penal, estaremos nos referimos tanto ao Inquérito
presidido pelo Delegado, como a Ação Penal de responsabilidade do Promotor de Justiça.

 Obrigatoriedade da Persecução Penal

Alguns doutrinadores também o denominam de Princípio da Legalidade do Processo


Penal.

Esse princípio nos propõe que os Órgãos Persecutórios sejam instituídos por Lei e
pautados (disciplinados) pela Lei. Ele impõe um dever legal ao Delegado e ao Promotor para
desempenhar suas funções principais, típicas, quais sejam investigar e acusar
respectivamente.

Dessa forma, o Delegado deve investigar e o Promotor deve acusar porque a Lei
manda, não importando suas respectivas autonomias de vontade, pois estas funções são
primordiais, típicas, inerentes do cargo que ocupam e, portanto, devem ser executadas.

Não há espaço para que o Delegado ou Promotor avaliem se devem ou não investigar
ou acusar, por uma razão muito simples o Poder de Punir do Estado é indisponível, ou seja,
não está sujeito a voluntarismos ou critérios políticos, justificando a rigidez legal que não cede
espaço para arbítrio. Em outras palavras, o interesse de punir e fazer justiça, não pertence ao
Promotor, Delegado e nem mesmo ao Estado, pertence à Sociedade que se faz representar
pelas Leis, sendo assim, cumpra-se as Leis.

Sabendo disso, um Promotor que se recusa a acusar ou um Delegado que se nega a


abrir um inquérito poderiam estar agindo ilegalmente e tudo dependerá da forma como eles
se negam a executar tal função, nesse sentido, se eles motivarem a decisão de forma
republicana, expondo juridicamente suas razões do porque se recusaram não estarão

Kleber Luciano Ancioto Página 25


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

cometendo ilícito algum, caso contrário poderíamos estar diante de um ato ilegal. Em resumo,
motivando o agente justifica o ato, mas vale ressalvar que para não cumprir uma função típica,
a fundamentação deve ser técnica baseada em conhecimento jurídico e que afaste a
obrigatoriedade, não podendo ser uma argumentação baseada em aspectos políticos ou
subjetivos.

Se o Promotor acusar, mas também não argumentar bem, dando a impressão de que
ele não queria estar naquele caso, o Juiz pode discordar da forma de acusação do Promotor e
relatar o fato ao Procurador Geral. Este ato não viola a inércia do Judiciário, pois o Juiz cumpre
uma obrigação administrativa no processo, realizando o controle da legalidade a todo
instante, dessa forma, ele pode entender que sobre o prisma da Obrigatoriedade o Promotor
não esta cumprindo com o seu dever e relatar os fatos para que o Procurador Geral avalie e
tome as providências que achar cabível.

 Indisponibilidade da Persecução Penal

Enquanto a obrigatoriedade impõe um dever legal pré investigatório e pré processo, a


Indisponibilidade da Persecução Penal se refere ao curso do inquérito e ao curso do
processo, normatizando que o Delegado não pode desistir do inquérito e o Promotor não pode
desistir da ação.

Quem possui competência para arquivar inquéritos são os Juízes ou o Procurador


Geral. O Delegado e o Promotor nunca poderão arquivar um inquérito, podendo no máximo,
no caso do Promotor, pedir o arquivamento.

O Promotor, diante das provas que lhe são apresentadas, pode pedir para absolver o
réu e isso não pode ser interpretado como uma desistência da ação, visto que, o seu pedido é
dependente da continuidade da ação, dessa forma, não fere o Princípio da Indisponibilidade da
Ação Penal. Tanto que o Juiz pode condenar o réu, mesmo com o Promotor pedindo para
absolvê-lo. E nestas situações, é cabível inclusive que o Promotor impetre Habeas Corpus para
beneficiar o próprio réu que ocupou o polo passivo da ação que ele representou o que nos leva
a concluir que a indisponibilidade aplica-se apenas a Ação, mas não ao mérito.

 Oficialidade

O Princípio da Oficialidade aduz que a Persecução Penal é monopólio estatal só


podendo ser desempenhada por Órgãos Públicos oficialmente instituídos por Lei, o que na
pratica significa que não podemos privatiza-la, em outras palavras a Persecução Penal é
intransferível, indelegável, porque provém da soberania estatal e se pudéssemos transferi-la
estaríamos delegando a possibilidade de um particular limitar direito fundamental de outro
particular.

Nos EUA é possível a delegação ou privatização da Persecução Penal. Lá, escritórios de


advocacia são contratados pelo governo através de licitações e os advogados destes escritórios
são investidos na função de Promotores. Este sistema baseia-se puramente no capitalismo

Kleber Luciano Ancioto Página 26


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

onde a concorrência de mercado gera eficiência, ao passo que se um escritório não estiver
desempenhando bem seu papel o Estado rescindi o contrato e contrata com outro.

 Oficiosidade

Significa que a Persecução Penal é uma tarefa desempenhada de ofício, o que significa
dizer que não depende de provocação de terceiros.

A regra é que, Promotores e Delegados desempenhem suas tarefas com autoridade


extraída diretamente do ordenamento jurídico, salvo nas hipóteses de Ação Penal Pública
Condicionada à Representação, em que o Delegado só investiga e o Promotor só oferece
denuncia se houver representação, sendo este um ato liberatório, ou seja, depois que libera
ele segue por impulso oficial.

 Intranscendência da Persecução Penal

É a versão processual do Princípio da Intranscendência da Pena, que aduz que a pena


não passa da pessoa do condenado. Aqui da mesma forma, a Persecução Penal não pode gerar
impactos ou restrições para as pessoas que não estão envolvidas no crime, em contra senso,
só podem ser submetidas a Persecução Penal as pessoas que estejam envolvidas no crime.

Este fato advém do próprio Direito Penal (Art. 29, CP) que adotou, como regra, em
nosso sistema a Teoria Monista, onde o crime é visto como um fenômeno uno que vincula as
pessoas, sendo assim, a Intranscendência da Persecução Penal vincula apenas as pessoas que
participaram no crime e por estarem vinculados a um só fato, todos responderão juntos no
mesmo processo, podendo cada uma receber uma pena diferenciada conforme sua
culpabilidade.

Em resumo, é a Teoria Monista nos permite na perspectiva processual penal


vislumbrar o Princípio da Intranscendência da Persecução Penal, onde só sofrera a Persecução
Penal quem estiver vinculado ao crime, por isso que não existe no processo penal a
intervenção de terceiros.

 Inércia do Poder Judiciário

A inércia ocorre somente pré processual e ela existe para preservar a imparcialidade
dos julgamentos, em outras palavras, para que os julgamentos possam ser prolatados de
forma imparcial. Se o Juiz romper com a inércia por mera liberalidade a tendência é que ele
julgue em favor daquela determinada parte.

O que rompe a inércia do Juiz é o exercício do direito de ação. Dessa forma, o papel
da Ação é ativar o Judiciário e uma vez ativado se desenvolve por Impulso Oficial, ou seja, ele
se dinamiza por meio dos atos praticados ao longo do processo.

Kleber Luciano Ancioto Página 27


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Os cartórios existem para auxiliar o Juiz no Impulso Oficial preservando-se sempre a


imparcialidade, ou seja, o impulso não deve pender mais para um lado do que para o outro. A
imparcialidade só deve acabar quando o Juiz prolata a sentença e decide a causa.

 Boa Fé Objetiva Processual

Trata-se de um Princípio que estabelece posturas no processo, tanto pelas partes


como pelo Juiz.

A postura deve ser de honestidade, transparência, colaboratividade e ética. Dessa


forma, um Juiz não pode decidir utilizando como base uma prova ilícita ou violar prerrogativa
profissional do advogado, entre outras.

Prerrogativa Profissional do Advogado são direitos fundamentais que o advogado


possui para fazer frente ao poder do Estado. Por exemplo: direito de acesso físico a repartições
públicas, salvo em casos de segredo de justiça; direito de ser ouvido por qualquer autoridade;
direito de usar a palavra perante Tribunais e Órgãos Jurisdicionais; direito de acesso aos autos,
visto que advocacia é gestão de informação, ou seja, o acesso aos autos é necessário para que
o advogado possa trabalhar; etc. Quando a prerrogativa profissional do advogado é violada o
problema deixa de ser do advogado e passa a ser da OAB que possui competência para em ato
público desmerecer a atitude da autoridade.

Voltando ao princípio, quando o réu viola a boa fé objetiva ele sofre o peso da
Persecução, em outras palavras, se ele atrapalhar na investigação, sumir com uma prova,
ameaçar testemunhas, certamente será preso. Mas, em contrapartida o réu também não
precisa ser tão colaborativo ao ponto de se auto criminar, sendo assim, o Principio da Boa Fé
Objetiva Processual não possui o condão de passar por cima do Principio da Ampla Defesa,
onde o sujeito possui a prerrogativa de se autodefender não fazendo provas contra si
mesmo.

 Indivisibilidade da Persecução Penal

Este princípio é semelhante a intranscendência e nos propõe que a Persecução Penal


não pode ser fragmentada entre os autores do crime, no sentido de não se pode acusar um e
não acusar o outro, não se pode investigar um e não investigar o outro que participou do
mesmo crime. Dessa forma, ou se processa todos ou não se processa ninguém, ou se investiga
todos ou não se investiga ninguém. E isso se justifica também pela Teoria Monista.

Se todos estão atrelados ao crime todos devem ser investigados no inquérito e/ou
acusados. Isso se fundamenta no próprio Princípio da Isonomia, dessa forma, não é permitido
distribuir e escolher quem será investigado e/ou processado.

Nesse sentido, se duas pessoas praticam o crime de dano contra um veículo, cuja ação
penal é privada, a vítima do crime não pode apresentar queixa crime apenas contra um dos
autores, devendo ou apresentar contra ambos ou contra nenhum.

Kleber Luciano Ancioto Página 28


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Com isso percebemos que o Princípio da Indivisibilidade possui eficácia sobre três
aspectos da Persecução: na Investigação; na Representação para Investigação; e no Ingresso
da Ação Penal.

03/03/2015

SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS

Estes sistemas condicionam o Processo, não a investigação. Aqui não nos referimos ao
Sistema Persecutório, mas apenas ao Sistema Processual. O Sistema Persecutório é mais amplo
que o Sistema Processual, abrangendo a Fase de Investigação e a Ação Penal.

Já podemos adiantar que nosso Sistema Processual Penal desde a CF 88, é o


Acusatório, no entanto, veremos abaixo os três Sistemas existentes:

 Sistema Inquisitivo

Este Sistema é próprio de Estados Autoritários em que o Processo Penal não serve
para preservar direitos processuais. O Sistema Inquisitivo não contempla Instrumentos
Processuais, mas sim o puro exercício do poder e dominação política, ao passo que ele não
contempla a ampla defesa, o contraditório, o devido processo e admite prova ilícita, alias mais
que prova ilícita ele admite a tortura, pois legitima tal prática para obtenção de informações.

O Sistema não exige que as decisões sejam motivadas, o Juiz Inquisitor ao decidir não
diz o porquê esta decidindo daquela forma, dessa forma, não há mecanismos de controle das
decisões, não contempla Habeas Corpus, não há publicidade, sendo o puro exercício do poder
sem limites, um sistema irracional, sem qualquer base científica ou filosófica.

Isso ocorre porque não há divisão de poderes entre Órgãos Persecutórios, ou seja,
tudo se concentra em uma só autoridade ou um só Órgão, em outras palavras as quatro
funções persecutórias (Investigar, Acusar, Defender e Julgar) são concentradas na figura da
autoridade inquisitiva. Sendo assim, não há dialética aristotélica, não há divisão de tarefas, não
há discussão de teses, por uma questão estrutural fundada em um sistema irracional. Este
Sistema foi muito usado na idade média, onde a igreja era o Estado e existia o Tribunal da
“Santa Inquisição”, no entanto, não precisamos ir muito longe, recentemente durante o
Regime Militar no Brasil nós vivemos o Sistema Inquisitivo.

Em resumo, no Sistema Inquisitivo a dialética aristotélica não existe, visto que a


decisão é unilateral negando a condição de ser humano no processo, o individuo aqui pode
até não ser escravo, mas não goza de personalidade jurídica para exercer direitos
processuais.

 Sistema Acusatório

Kleber Luciano Ancioto Página 29


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

É próprio de Estados Constitucionalizados e Democráticos. Baseia-se em uma estrutura


de Separação de Poderes Persecutórios, com Órgãos independentes e autônomos cumprindo
funções distintas.

Dessa forma, criam-se os Órgãos de Polícia para investigar, o Ministério Público para
acusar, o Juiz para julgar e o Advogado para defender que possuem a função de controlar uns
aos outros.

No Sistema Acusatório a confrontação é obrigatória, ou seja, cada Órgão cumpre


função vinculada por Lei e há regime de autocontrole demonstrando ser um Sistema pautado
em uma racionalidade de justiça. Em outras palavras, este sistema possui base científica,
preserva poderes processuais, permitindo a ampla defesa, o contraditório, o devido processo e
vedando as provas ilícitas.

Os Princípios Processuais que estudamos modelam o Sistema Acusatório, havendo


inclusive necessidade de se motivar as decisões e dar publicidade dos atos processuais. Aqui os
princípios constitucionais limitam o Poder do Estado.

Isso não significa que o Sistema seja imune a falhas, por exemplo, a “farra do
cafezinho”, onde o Juiz toma café com o Promotor e as vezes até convida o Delegado se ali eles
debaterem sobre um processo qualquer, vai contra os Princípios básicos do Sistema Acusatório
acabando com a separação de funções colocando todos aparelhados pela força dominante
(partido do governo). No caso do Advogado embarcar nessa também, teríamos um modelo
inquisitivo de processo, onde os sujeitos (Órgãos) envolvidos estariam em conluio para
absolver ou condenar o réu de forma arbitrária. Dessa forma, esta situação é um atentado
contra o dinamismo democrático das instituições, que precisam estar aparelhadas e serem
independentes para exercerem suas funções sem influência.

 Sistema Misto

No Sistema Misto o Processo Penal possui duas fases, uma fase inquisitiva de
obtenção das provas sem contraditório, tendo a presença de um Juiz instrutor. E
sequencialmente uma fase em que a prova é debatida em contraditório com o Juiz julgador.
Nesse sentido, teremos um Juiz que colhe a prova na investigação e o Juiz que julga com base
na prova colhida em contraditório.

No Brasil tentou-se fazer algo parecido, mas por enquanto não foi efetivamente
implantado. Aqui denominados o Juiz que acompanha o inquérito como sendo o Juiz das
Garantias. Este Juiz não possui competência para julgar a causa, justamente por ficar muito
próximo do Delegado e do Promotor quebrando sua imparcialidade. Dessa forma, o Juiz que
acompanha o inquérito permanece somente até a sua conclusão, evitando o que a doutrina
chama de Quadro Mental Paranoico do Juiz, caso em que o Juiz cria a concepção mental da
culpa e busca provas e elementos para ratificar essa pré-concepção.

FASE INVESTIGATÓRIA DA PERSECUÇÃO PENAL

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

 Atividade Investigatória

É a atividade de agrupar informações de maneira documentada, por escrito, para que


sirvam de prova sobre um determinado crime.

Mas se pararmos para pensar é comum que outras entidades, como a imprensa,
também agrupem informações, no entanto estas informações não se caracterizam por ser de
conteúdo investigatório. Nesse sentido, o fator determinante para que uma informação seja
de conteúdo investigatório é que ela seja obtida através da Atividade Investigatória, ou seja, à
atividade desempenhada por um Órgão de Persecução Penal que possui a função, pautada por
Lei, de colher informações restringindo Direitos Fundamentais.

Em resumo, quem investiga restringe direitos fundamentais com o intuito de obter


informações para apurar e elucidar crimes. E por mais branda que a investigação seja ela é
desconfortável para qualquer pessoa, em outras palavras, somente pelo Estado ter uma
informação desfavorável contra uma determinada pessoa já é suficiente para constrangê-la. O
investigado pode, por exemplo, ter a propriedade e/ou liberdade restringida, ter o domicilio
invadido se houver um mandado de busca e apreensão, etc.

As vezes restringe-se Direitos Fundamentais de pessoas que nada tem a ver com o
crime, como, por exemplo, o do indivíduo que é intimado a comparecer na delegacia para
responder o que sabe sobre um determinado crime. O Estado possui esse poder investigatório
de entrar na vida das pessoas, restringir direitos individuais, para atender um interesse maior
que é o de coibir crimes. A obtenção da informação é vinculada ao proposito punitivo.

Esse Poder não pertence a nenhuma autoridade, sendo somente exercido por elas e
por se tratar de uma atividade republicana, o agente investigador precisa prestar contas do
que faz para a sociedade, em outras palavras, não se pode investigar com base em
subjetivismos ou interesses pessoais.

Por isso, a atividade investigatória esta constantemente exposta ao controle judicial de


legalidade, o que significa que toda investigação deve ser levada ao judiciário para ser
controlada por um Juiz. O Juiz apenas dá o andamento burocrático da investigação,
supervisando a legalidade das ações e dos fatos.

Na verdade a Atividade Investigatória é do Poder Executivo, mas quando extrapola, o


Judiciário é quem deve restaurar Direitos Fundamentais que estão sendo violados de forma
ilegítima.

Toda Atividade Investigatória é procedimentalizada, ou seja, precisa ser por escrito e


organizada em atos documentados. Isso para que se possa extrair efeitos jurídicos da
investigação, sendo este fato importante para diferenciarmos as informações que provém da
imprensa das informações que provém do Estado.

Ao procedimentalizar a investigação conseguimos controlar o seu conteúdo, controlar


os poderes que advém dela, em outras palavras, nos permite proporcionalizar o poder
investigatório de acordo com a gravidade do crime e do criminoso.

Kleber Luciano Ancioto Página 31


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Não há rito na atividade investigatória, mas existe o Devido Processo Substancial,


como em qualquer atividade pública estatal, promovendo a proporcionalização do poder
investigatório de acordo com o caso. Dessa forma, não podemos abusar do poder
investigatório em uma situação irrelevante e vice versa.

É importante que exista varias instituições correlatas, fundadas em um mesmo


propósito para minimizar a politização da investigação, visto que ela é dependente do poder
público e encontra barreias na própria estrutura do Estado. Por exemplo, quem determinada à
liberação de verbas para pagar o salário dos Delegados Federais é o Ministro da Justiça que
está ligado a Presidência da República, não sendo difícil, portanto, “controlar” uma
investigação.

INSTRUMENTOS INVESTIGATÓRIOS

 Inquérito Policial

É o instrumento mais antigo sendo pré-republicano, existindo desde o Império.

 P.A.C. – Procedimento Administrativo Criminal

É o instrumento mais polêmico, pois se origina de uma investigação realizada pelo


Ministério Público, no entanto, não há Lei criando o P.A.C., tendo sido criado através de uma
resolução baixada pelo próprio Ministério Público autorizando-o a investigar.

 T.C. – Termo Circunstanciado

É o instrumento utilizado para delitos de menor potencial ofensivo.

ÓRGÃOS DE SEGURANÇA PÚBLICA IMBUÍDOS DA PERSECUÇÃO PENAL

O panorama geral dos dois modelos de Polícia que temos no Brasil pode ser extraído
do Art. 144, CF, pois ele delimita todo o Poder Investigatório e Policial no Brasil, ou seja, ele diz
o que a Polícia pode ou não fazer. Este artigo ainda institui as policias e as organiza, sendo,
portanto, uma norma orgânica.

Art. 144, CF – A segurança pública, dever do Estado, direito e


responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos
seguintes órgãos: I - polícia federal; II - polícia rodoviária federal; III -
polícia ferroviária federal; IV - polícias civis; V - polícias militares e
corpos de bombeiros militares. § 1° A polícia federal, instituída por lei
como órgão permanente, organizado e mantido pela União e
estruturado em carreira, destina-se a: I – apurar infrações penais

Kleber Luciano Ancioto Página 32


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e


interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas
públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão
interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se
dispuser em lei; II – prevenir e reprimir o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem
prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas
áreas de competência; III – exercer as funções de polícia marítima,
aeroportuária e de fronteiras; IV – exercer, com exclusividade, as
funções de polícia judiciária da União. § 2° A polícia rodoviária federal,
órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em
carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das
rodovias federais. § 3° A polícia ferroviária federal, órgão permanente,
organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-
se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais.
§ 4° As polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira,
incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia
judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares. § 5° -
às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da
ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das
atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de
defesa civil. § 6° As polícias militares e corpos de bombeiros militares,
forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente
com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal
e dos Territórios. § 7° A lei disciplinará a organização e o
funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de
maneira a garantir a eficiência de suas atividades. § 8° Os Municípios
poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus
bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei. § 9° A
remuneração dos servidores policiais integrantes dos órgãos
relacionados neste artigo será fixada na forma do § 4º do art. 39. § 10.
A segurança viária, exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do seu patrimônio nas vias públicas: I –
compreende a educação, engenharia e fiscalização de trânsito, além de
outras atividades previstas em lei, que assegurem ao cidadão o direito
à mobilidade urbana eficiente; e II – compete, no âmbito dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios, aos respectivos órgãos ou
entidades executivos e seus agentes de trânsito, estruturados em
Carreira, na forma da lei.

 Polícia Administrativa / Preventiva

É a polícia que previne a ocorrência do crime, ou seja, estabelece a manutenção da


ordem pública, da incolumidade dos bens jurídicos. No Brasil esse papel é desempenhado pela

Kleber Luciano Ancioto Página 33


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Policia Militar Estadual de maneira genérica e a Policia Rodoviária Federal que cumpre o
papel de Polícia Preventiva nas rodovias.

É uma Polícia exibida, militarizada, pois possui a intenção de ser ostensiva. Precisa ter
símbolos, fardas, luzes, barulho, ela precisa aparecer porque a ostensividade intimida a prática
de crimes.

Possui o importante papel de causar um efeito denominado dissuatório, prevenindo o


crime pela intimidação.

A Polícia Preventiva atua com base na Força Pública e em situações de urgência, por
isso não é uma Polícia que depende de autorização judicial para agir, agindo com autoridade
pública, sendo, portanto, autoexecutória, ou seja, ela exerce sua força e depois que se
controla a legalidade do ato.

O Controle de Legalidade é sempre a posteriori. Por isso que a Polícia Administrativa


possui altos índices de letalidade, sendo, portanto, fundamental que ela trabalhe com a força,
mas que ela reduza o máximo possível o grau de letalidade.

Ela existe para resguardar situações de desordem e caos, recompondo a ordem, sendo
necessário, as vezes, causar um pouco de dor, pois a dor é o sentimento mais egoísta que
existe, ao passo que o sujeito quando esta sentindo dor não se preocupa com mais nada além
de sua própria dor.

É o Comandante Geral da Policia Militar, o responsável pela Chefia Institucional da


Policia Militar, estando acima dele o Secretário de Segurança Pública, que possui subordinação
direta com o Governador do Estado.

04/03/2015

 Polícia Judiciária / Repressiva

Ela possui uma relação positiva com o crime, no sentido de que ela só atua quando o
crime acontece. Ela depende do crime para atuar. Ela desenvolve sua atividade investigatória
depois que o crime ocorre, então ela serve para encontrar provas do crime e reprimi-lo.

Ela é representada pelas Policias Civis dos Estados e pela Polícia Federal. É
denominada Polícia Judiciária porque esta estruturalmente vinculada ao Poder Judiciário,
visto que, os inquéritos e investigações sempre tramitam em varas criminais. A todo tempo o
inquérito vai da Delegacia para o Fórum, nem que seja para o Juiz apenas observar o que esta
acontecendo, para que ele avalie a Legalidade da Investigação, sendo também a forma para
que o Ministério Público tome conhecimento da investigação.

É interessante percebermos que a Polícia Judiciária pratica seus atos e os submete de


imediato ao Juiz e isso evita as ilegalidades. Dessa forma, o Controle Judicial de Legalidade da
Policia Judiciária é antecipado, ao contrário da Policia Preventiva que é a posteriore.

Kleber Luciano Ancioto Página 34


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Sendo assim a autoridade policial apenas representa para a prisão, pois quem manda
ou não prender é o Juiz, que, portanto, assume a responsabilidade pelo mandado. Em outras
palavras, a autoridade policial apenas representa pelo fato, ou seja, demonstra os fatos para o
Juiz deixando ao seu critério os efeitos pelo ato.

Estruturalmente a Polícia Judiciaria é chefiada pelo Delegado Geral do Estado e acima


dele temos o Secretário de Segurança Pública.

Dessa forma, o Secretário de Segurança Pública chefia ambas as policias estando este
subordinado ao Governador o que acaba condicionando a Polícia a uma politização de suas
funções, em outras palavras, a Polícia torna-se suscetível à interferência política. Por isso não é
fácil investigar pessoas do alto escalão dentro do Estado, visto que, o executivo facilmente
pode cortar parte do orçamento daquele Órgão, sendo assim, acabamos por não ter
independência, podendo deturpar a realidade dos fatos.

Se passarmos para o Âmbito Federal, temos o Diretor Geral do Departamento da


Policia Federal, que está subordinado ao Ministro da Justiça, que está diretamente ligado a
Presidência da República. Com isso se ela (Polícia Federal) começa investigar algo que não seja
de interesse do partido do governo, bastaria cortar parte do orçamento. Mas atualmente não
está tão fácil controlar as investigações da Polícia Federal, porque ela se fortaleceu
institucionalmente, não podemos, no entanto, acreditar que não há pressão.

ATIVIDADE POLICIAL E PACTO FEDERATIVO (Lei 10.446/02)

A atividade policial é um Serviço Público, em outras palavras, a segurança pública é


prestada a população pelo Poder Executivo, sendo, portanto, um Órgão desse Poder, podendo
ser Estadual ou Federal. A Polícia Federal investiga fatos de competência Federal e a Estadual
os fatos de competência estaduais.

Sendo assim, a Delegacia de Polícia é um Órgão, não uma pessoa, na pratica isso
significa que a Delegacia de Polícia não pode figurar como parte em um Processo, sendo
necessário nestas situações processar o próprio Estado.

Todas as atividades exercidas pelo Poder Executivo, segue a lógica do Pacto Federativo
além da Lei 10.446/02, que é uma Lei pequena contendo apenas dois artigos, apelidada de
Lei da Força Tarefa ou Lei das Infrações Penais Interestaduais e Internacionais, que criou a
possibilidade de uma interferência da Policia Judiciaria da União (Polícia Federal) junto às
Polícias Preventiva e Judiciária dos Estados. Sendo necessário para tal, autorização do Ministro
da Justiça, sendo assim deve ser precedida por um pedido.

Art. 1°, Lei 10.446/02 – Na forma do inciso I do § 1o do art. 144 da


Constituição, quando houver repercussão interestadual ou internacional
que exija repressão uniforme, poderá o Departamento de Polícia
Federal do Ministério da Justiça, sem prejuízo da responsabilidade dos
órgãos de segurança pública arrolados no art. 144 da Constituição
Federal, em especial das Polícias Militares e Civis dos Estados,
proceder à investigação, dentre outras, das seguintes infrações penais:

Kleber Luciano Ancioto Página 35


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

I – sequestro, cárcere privado e extorsão mediante sequestro (arts.


148 e 159 do Código Penal), se o agente foi impelido por motivação
política ou quando praticado em razão da função pública exercida
pela vítima; II – formação de cartel (incisos I, a, II, III e VII do art. 4º
da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990); III – relativas à
violação a direitos humanos, que a República Federativa do Brasil se
comprometeu a reprimir em decorrência de tratados internacionais de
que seja parte; e IV – furto, roubo ou receptação de cargas,
inclusive bens e valores, transportadas em operação interestadual
ou internacional, quando houver indícios da atuação de quadrilha
ou bando em mais de um Estado da Federação; V – falsificação,
corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins
terapêuticos ou medicinais e venda, inclusive pela internet,
depósito ou distribuição do produto falsificado, corrompido,
adulterado ou alterado (art. 273 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 - Código Penal). Parágrafo único. Atendidos os
pressupostos do caput, o Departamento de Polícia Federal procederá à
apuração de outros casos, desde que tal providência seja autorizada
ou determinada pelo Ministro de Estado da Justiça.

Dessa forma, é possível a intervenção da Policia Federal nas investigações nos crimes
de: Sequestro, Cárcere Privado, Extorsão mediante Sequestro, com motivação política, quando
a vítima for uma autoridade (podendo ser do Estado ou da União, sendo mais comum ser
autoridade do Estado). Ex. PCC sequestrar um Juiz; Formação de cartel, caracterizando crime
contra economia popular Ex. Combinação de preços nos postos de combustíveis de uma
determinada localidade; Crime que viole direitos humanos previstos em tratados
internacionais que o Brasil é signatário; Furto, Roubo e Receptação de cargas, transportadas
em operação interestadual ou internacional e Formação de Quadrilha ou Bando quando
atuarem em mais de um Estado da Federação; e Falsificação, corrupção, adulteração ou
alteração de produtos para fins terapêuticos e venda, depósito ou distribuição de produto
falsificado, corrompido, adulterado ou alterado.

Então, a Polícia Federal pode entrar na Jurisdição Estatual e atuar junto com a Polícia
Administrativa ou Judiciária porque existe Lei e nosso Federalismo é Cooperativo, o que
significa que as autoridades Estaduais e Federais podem conjugar esforços para preservar
valores. Essa regra veio para superar a ideia do Federalismo Dual ou Rígido que não permitia a
interferência de uma Polícia na outra.

Por isso é possível inclusive que a Força Tarefa Nacional ajude a Polícia Preventiva a
manter a ordem, como comumente vemos no Estado do Rio de Janeiro. É difícil, na atual
conjuntura, acontecer em São Paulo, por questões políticas existe uma dualidade São Paulo e
resto do Brasil.

FEDERALIZAÇÃO DA PERSECUÇÃO PENAL (Art. 109, §5° CF/88)

Hoje temos a Federalização da Persecução Penal expressamente no Art. 109, §5°, CF,
incorporada pela EC 45 de 2004.

Kleber Luciano Ancioto Página 36


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Art. 109, §5°, CF – Nas hipóteses de grave violação de direitos


humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de
assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados
internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte,
poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer
fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de
competência para a Justiça Federal. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004)

Ela se resume por ser uma Intervenção Federal Jurisdicional, ou seja, do Judiciário
Federal no Judiciário Estadual. Dessa forma, aqui relatizamos o Pacto Federativo no âmbito do
Poder Judiciário e transferimos a estrutura persecutória do Estado para a União.

Mas essa federalização não ocorre em abstrato, mas sim em determinados casos
concretos. Esse fenômeno não muda somente a figura do Juiz, mas toda estrutura
persecutória, sendo o STJ o responsável por decidir acerca da federalização.

Para isso, a partir da E.C. 45/04, foi criada uma ação constitucional chamada IDC –
Incidente de Deslocamento de Competência, que tramita no STJ – Superior Tribunal de Justiça
(Competência originária).

I.D.C. INCIDENTE DE DESLOCAMENTO DE COMPETÊNCIA

 Origem  E.C. n. 45/04 (Emenda da Reforma do Poder Judiciário)

 Fundamento

Possui como fundamento a punição de crimes que violam direitos humanos previstos
em Tratados Internacionais que o Brasil é signatário.

Há a Federalização da Persecução Penal quando a Justiça Estadual for ineficiente e não


conseguir punir crimes que violem Direitos Humanos, mas que o Brasil se comprometeu a
punir quando assinou o Tratado.

Dessa forma, o IDC existe para que a União consiga compelir o Estado membro a
cumprir o Tratado Internacional, visto que, se ele não cumprir com o seu dever a União
deslocará a competência.

Em ultima análise, isso serve para preservar a Soberania Estatal perante a comunidade
internacional, pois se o país não punir, quem assume a competência é o TPI, projetando sua
força dentro do Território Nacional, invadindo a soberania interna do país e isso é vexatório.
Segundo o Princípio da Complementariedade da Jurisdição Universal, a Jurisdição Universal é
subsidiária, complementar a jurisdição interna, ou seja, só é utilizada quando o Brasil não
cumpriu sua função.

Por conta disso a União busca fazer sua parte, para que não tenha sua soberania
invadida por uma decisão externa.

Kleber Luciano Ancioto Página 37


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Por fim, vale salientar que países que permitem o Genocídio, Tortura e Escravidão não
necessitam se quer de Tratados assinados para a intervenção internacional, visto que estes são
crimes contra a humanidade.

 Legitimidade Ativa / Passiva

Quem possui legitimidade ativa para propor o IDC é o PGR – Procurador Geral da
República no STJ.

Para propor o IDC se faz necessário uma investigação do MPF – Ministério Público
Federal para investigar duas coisas: se houve crime que violou direitos humanos e que a
Justiça Estadual é ineficiente. E uma vez havendo essas provas o PGR impetra a Ação contra o
Estado Membro que será representado pelo Procurador Geral do Estado.

Dessa forma, a legitimidade passiva é do Estado Membro que deverá prestar


informações ao STJ que julgará a Ação por meio de um Acórdão Irrecorrível. O que se pode
fazer na melhor das hipóteses é ingressar com Habeas corpus no Supremo, alegando a violação
de um direito.

 Efeitos da Decisão

O efeito é ex nunc, ou seja, os atos praticados na Justiça Estadual são válidos porque
na época em que foram praticados ela era a Justiça competente. Nesse sentido, a
federalização poderá ocorrer desde o início (inquérito) como no final (fase recursal), pois não
existe preclusão.

O efeito do Acórdão é constitutivo, pois ele constitui um novo âmbito de


competência para julgar o caso. Não há declaração de Incompetência Absoluta, por isso não
se anula o que foi realizado, mas apenas um deslocamento para outra competência.

O caso Dorothy Stang, foi a primeira situação em que a possibilidade do IDC ser julgado
procedente, culminou com o rompimento da inércia do Sistema Persecutório do Estado do
Pará, tendo, portando, um efeito político.

 Princípios

Muito se discutiu se o IDC violava o Princípio do Pacto Federativo ou do Juiz Natural,


visto que foram teses defendidas pelos promotores dos Estados da Federação para impedir o
IDC. Atualmente o STF já se pronunciou dizendo que não, justificando que o Princípio do Pacto
Federativo não é absoluto, sendo maleável, moldável e quanto ao Juiz Natural, não há
violação, visto que o Juiz desde o princípio já esta na comarca e a qualquer tempo ele pode
absorver um processo federalizado.

10/03/2015

Kleber Luciano Ancioto Página 38


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

INQUÉRITO POLICIAL

 Conceito

Procedimento Administrativo Inquisitorial presidido exclusivamente pelo Delegado


de Polícia visando agrupar provas necessárias para elucidação da autoria e materialidade dos
delitos. Nesse sentido, o inquérito não é um procedimento judicial e, portanto, não é presidido
por um Juiz e não se exerce Jurisdição em sentido estrito.

O Inquérito é o instrumento investigatório mais utilizado e mais antigo do Brasil.

 Histórico

O Inquérito Policial é um Instituto Pré-Republicano sendo tão antigo quanto o Habeas


corpus existindo desde o Código Imperial. Naquela época ainda não existiam os Delegados de
Polícia, mas sim os Inspetores de Quarteirão que faziam as vezes do Delegado.

 Finalidades

A principal finalidade do Inquérito é ser instrumento para agrupar provas, ou seja, ele
estoca as provas, para que posteriormente seja possível ingressar com uma Ação Penal.

Ele serve para proteger a própria Persecução Penal o qual ele esta inserido, em outras
palavras, ele serve para investigar crimes, mas também investigar situações de risco que
podem ir contra o resultado da Persecução Penal. Nesse sentido, o Inquérito serve como base
para prender pessoas que estão interferindo no resultado do Processo Penal.

Possui a finalidade de delimitar o âmbito do poder do Juiz durante a investigação ao


restringir Direitos Fundamentais. Qualquer poder do Juiz deverá estar delimitado pelo
inquérito, em outras palavras, o Juiz depende do inquérito como base cognitiva para justificar
suas ações. O Poder do Juiz não pode ser inventado, precisa ser extraído de uma base
cognitiva do instrumento, por isso Juiz não pode inventar prisão ou medidas que não
estiverem baseadas no Inquérito.

O Inquérito serve para controlar a legalidade dos atos praticados pela autoridade.
Nesse sentido, pela simples leitura do Inquérito conseguiremos identificar atos ilegais, em
outras palavras, é possível constatarmos ilegalidade pela própria análise dos autos onde
constam todos os atos da autoridade.

Por fim, o inquérito serve também, não só para comprovar a autoria e materialidade,
mas também para resguardar os direitos fundamentais daqueles que não estão envolvidos
no crime.

CARACTERÍSTICAS

Kleber Luciano Ancioto Página 39


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

1) Inquisitorial

É a característica mais importante e mais impactante, mas devemos ressalvar que


essa inquisitoriedade é adaptada ao Estado Democrático de Direito e não como era na Idade
Média.

No Inquérito o investigado não é réu, portanto, o investigado não é sujeito de direitos


processuais, embora continue sendo sujeito de direitos fundamentais. E não é, por uma razão
muito simples, porque não há processo judicial instaurado, então não há ainda sujeitos de
direitos processuais, não existe ainda essa figura no Inquérito. Por isso durante o Inquérito não
há o exercício do direito de defesa, não há como recorrer, exercer o direito de provar em
contraditório, porque ninguém foi acusado de nada ainda.

O Inquérito não serve para imputar crime, mas sim para agrupar provas. O Delegado
não imputa crime, quem faz isso é o Promotor quando acusa. Dessa forma, a questão é
estrutural, não existe defesa porque ninguém acusa e também não se exerce o direito de
provar, porque não há contraditório da prova, daí vem a característica inquisitorial.

Nesse sentido, no inquérito a prova é colhida unilateralmente pelo Delegado, ele não
precisa de alguém para legitimar as informações que obtém e ninguém o confronta. Ele pode
praticar as diligencias que quiser (dentro dos limites legais) para agrupar provas, por isso ele
pode inquerir o investigado da forma como ele quiser, mesmo que ele (investigado) não esteja
acompanhado de advogado.

O papel do advogado durante o Inquérito Policial é assegurar que nenhum Direito


Fundamental seja violado, pois não há o exercício de Direitos Processuais durante essa fase.
Nesse sentido o advogado deve se preocupar se esta havendo livre manifestação do
pensamento, se o investigado não esta sendo coagido, se não há colheita de provas ilícitas,
etc.

Com isso, podemos concluir que aqui temos uma inquisitoriedade com o objetivo de
obter informações da forma mais eficaz possível para que posteriormente o Ministério Público
possa utilizar estas informações para propor uma Denúncia.

2) Informativo

A doutrina utiliza uma expressão um tanto quanto pejorativa, dizendo que o Inquérito
é “meramente informativo”, dando uma impressão de reduzida importância ao Inquérito.

Parece óbvio, mas as provas do Inquérito servem realmente para informar. Mas
informar trata-se de qualquer coisa menos julgar. Com isso queremos dizer que a prova,
colhida no inquérito, não é instrutória, servem para informar o Promotor, mas não legitima o
Juiz para condenar ou absolver, porque há necessidade que elas sejam confrontadas em
contraditório.

Kleber Luciano Ancioto Página 40


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Se um Juiz decidir por uma condenação com base nas provas colhidas no Inquérito e
não debatidas em contraditório, a decisão é considerada nula. Por isso, por exemplo, que as
Testemunhas do Inquérito precisam depor novamente em juízo, para ganharem legitimidade
pelo crivo do contraditório. Nesse sentido, as provas colhidas servem para informar o
Ministério Público e posteriormente elas devem ser refeitas em juízo.

3) Força Probatória Relativa

É por serem meramente informativas que as provas do Inquérito são instáveis,


inacabadas, inícios de prova do ponto de vista Processual, visto que, elas não foram
produzidas em juízo, dai a doutrina dizer que as provas do Inquérito são provas relativas. É
por isso que a confissão na fase inquisitorial possui valor reduzido na valoração de provas.

Em juízo as provas colhidas no inquérito podem ser confirmadas e ganham força


absoluta pela atuação do Ministério Público e o Juiz pode utiliza-la para condenar ou ocorre o
oposto e a prova é inutilizada podendo levar a uma absolvição por insuficiência de provas.

4) Dispensável

Dispensável, porém útil, conforme doutrinadores do Ministério Público.

O Inquérito Policial é dispensável, porque não é a única via para se ingressar com uma
Ação Penal, ou seja, o Ministério Público não depende do Inquérito para propor Ação Penal.
Nesse sentido, o Inquérito não é pressuposto obrigatório para que o Ministério Público
propor de forma válida com Ação Penal.

A legitimidade do Ministério Público para propor Ação Penal não depende da


investigação, ou seja, o Ministério Público é parte constitucional para propor a Ação, embora o
Inquérito Policial seja a via mais utilizada, útil e eficiente, não é a única via investigatória.

Nesse sentido, o Ministério Público pode ingressar com Ação Penal com base em um
procedimento do IBAMA, por exemplo, nos casos de crimes ambientais; pode entrar com uma
Ação de Cobrança de Tributos com base em um procedimento da RECEITA FEDERAL; pode
ainda ingressar com uma Ação baseada em documentos privados como dossiês, ainda que na
maioria das vezes quando estes documentos chegam ao Ministério Público eles enviam para o
Delegado investigar e dar maior credibilidade.

Em alguns crimes, no entanto, nos parece ser indispensável o Inquérito como no caso
do crime de homicídio. Por outro lado, em crimes de menor complexidade, como um furto
realizado por um funcionário de um banco que foi filmado pelas câmeras de segurança, na
prática já seria possível propor a Ação, visto que, o inquérito só serviria para juntar provas e a
filmagem por si só já serviria como prova.

Com isso podemos concluir que não podemos vincular o Inquérito como pressuposto
para propor a Ação.

Kleber Luciano Ancioto Página 41


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

5) Indisponível (Art. 17, CPP)

Art. 17, CPP – A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos
de inquérito.

Dessa forma, o inquérito é indisponível em relação ao Delegado de Polícia que o


preside, o que significa que ele está legalmente vinculado a investigação, ou melhor, ao
prosseguimento da investigação.

Delegado não pode arquivar inquérito, não só porque a Lei não autoriza, mas também
porque o inquérito não é feito só para ele, sendo feito para o Ministério Público e demais
Órgãos do Judiciário, por isso o Delegado não possui essa prerrogativa.

As únicas pessoas que podem arquivar Inquérito são o Juiz, desde que exista um
pedido Fundamentado do Promotor ou o Procurador Geral de Justiça, que decidirá no caso do
pedido do Promotor pelo arquivamento ser negado.

Dessa forma, o Inquérito ser indisponível ao Delegado, acaba vinculando-o e


obrigando-o a investigar.

6) Escrito

Significa dizer que no Inquérito obrigatoriamente deve constar a documentalização


das diligencias, para que elas tenham força probatória com um teor de convencimento
mínimo. As autoridades que colocam o Inquérito por escrito possuem fé pública, dessa forma
há presunção de veracidade em tudo que consta no Inquérito. No entanto, essa presunção
pode ser refutada por um Habeas corpus, caso exista alguma violação de direito fundamental.

De qualquer forma dizer que há presunção de veracidade, não significa que as provas
contidas nos autos do Inquérito sirvam como Prova Instrutória servindo para fundamentação
de uma decisão judicial, pois como já vimos, há a necessidade delas serem debatidas em
contraditório.

Nesse sentido, tudo o que acontece durante a Investigação precisa estar documentado
para que se de fidedignidade absoluta. Por isso que lendo o Inquérito é possível encontrarmos
e apontarmos ilegalidades ou mesmo nos convencermos dos fatos.

7) Discricionariedade Investigativa

É uma das mais importantes características, tal quanto à inquisitoriedade. A expressão


discricionariedade significa uma margem de liberdade dada a uma determinada autoridade
dentro dos limites legais, que abre um rol de opções. Nesse sentido, podemos afirmar que a
discricionariedade é um desdobramento do Princípio de Legalidade. Na hipótese de alguma
autoridade extrapolar os limites legais estaremos diante de uma arbitrariedade e não
discricionariedade.

Sendo assim, o Delegado não é obrigado a seguir um rito, uma ordem legal para
investigar, possuindo liberdade para criar estratégias investigatórias, encadeando as

Kleber Luciano Ancioto Página 42


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

diligências conforme a sua própria convicção. E não há também nenhuma obrigação que
impõe ao Delegado deduzir certas convicções acerca das provas colhidas, em outras palavras
ele possui liberdade para formar sua convicção e decidir se vai ou não indiciar o investigado,
se vai ou não representa-lo para prisão.

A discricionariedade possibilita ao Delegado modular o poder investigatório, melhor


dizendo, proporcionalizar o poder investigatório caso a caso e, sobretudo, optar por indiciar
ou não um indivíduo.

Dessa forma, suponhamos que um Promotor mande uma ordem ao Delegado para
que ele investigue uma determinada pessoa, nesta situação o Delegado não estará obrigado a
investigar, desde que fundamente a recusa, porque ele possui discricionariedade; e mesmo no
caso de uma ordem judicial não manifestamente ilegal o Delegado pode se negar a cumprir
desde que fundamente sua decisão.

O indiciamento é função exclusiva do Delegado, ou seja, nem mesmo o Ministério


Público possui a competência para indiciar alguém e se em alguma circunstancia houver uma
ordem Judicial mandando que o Delegado indicie alguém fere-se o princípio da
discricionariedade investigativa, ao passo que apenas o Delegado possui a prerrogativa de
auferir a prova.

8) Sigiloso

O Inquérito pode ser sigiloso, mas para possuir essa característica ele depende de uma
determinação da autoridade policial. Em outras palavras, há a necessidade do decreto de sigilo
do inquérito fundamentado no interesse público de buscar a realidade dos fatos.

O sigilo como já vimos é exceção, pois a regra é a publicidade, por isso o sigilo só deve
ser decretado quando ele for pressuposto para que haja uma investigação eficiente.

Nesse sentido, poderemos ter o sigilo integral ou da investigação onde o inquérito


nem se encontra em um banco de dados públicos, sendo esse sigilo mais atroz que existe,
cessando normalmente em um dia muito infeliz, com o cumprimento de uma ordem de busca
e apreensão ou de prisão; mas existe também o sigilo parcial ou de peças investigatórias,
onde se sabe da investigação, mas não se acessa algumas peças. O sigilo parcial, no entanto,
não é oponível ao advogado da pessoa investigada que tem interesse naqueles documentos,
bastando juntar a procuração para ter acesso a estas partes (Súmula Vinculante 14), visto
que sonegar informação ao advogado é obstruir o exercício da profissão.

Súmula Vinculante, 14, STF – É direito do defensor, no interesse do


representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já
documentados em procedimento investigatório realizado por órgão
com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do
direito de defesa.

9) Controlável Judicialmente

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Todo Inquérito Policial é passível de supervisão judicial, que possui o intuito de


analisar se sua condução esta de acordo com a legalidade. Em outras palavras, o Juiz analisa se
o Inquérito esta sendo pautado pela Lei, conduzido de forma republicana, sem interferências
políticas ou interesses pessoais.

O controle judicial pode ocorrer de ofício, quando o Juiz analisa o Inquérito e constata
alguma ilegalidade e ele mesmo corrige ou repreende a autoridade responsável, mas, pode
também, ocorrer pela via do Habeas corpus, que é a Ação Constitucional apta quando se
busca que o judiciário declare a ilegalidade do Inquérito, a ilicitude de uma prova nele colhida,
para tranca-lo ou ainda para relaxar uma prisão no curso da investigação. Em outras palavras,
o Habeas corpus é a Ação Constitucional hábil quando o controle não é realizado de ofício pelo
Juiz.

11/03/2015

INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO POLICIAL

Qualquer informação de crime é uma manifestação de pensamento, dessa forma,


possui garantia Constitucional. Em outras palavras informar, um crime é um ato de vontade
(manifestando o pensamento) que possui efeitos jurídicos (abertura de um Procedimento),
mas para que o Procedimento se instaure aquele que trouxe as informações precisa se
identificar, já que a própria Constituição proíbe o anonimato.

ATOS DE INICIAÇÃO

 Notitia criminis espontânea

Neste caso é o cidadão quem leva a autoridade policial a informação acerca do crime
que possui conhecimento, sob qualquer condição, sob qualquer categoria, não possuindo
forma legal, burocracias ou rito.

Possui a característica de ser espontânea, pois não há necessidade de ser ativada por
nenhum Órgão Institucional partindo unicamente do cidadão, que possui a opção de informar
a polícia, em outras palavras, não há dever legal algum de informar, o cidadão comum poderá
permanecer em silêncio sem estar cometendo crime.

Em resumo, não há uma imposição legal, sendo apenas um Direito Constitucional que
qualquer cidadão possui de ir e informar o que sabe a qualquer autoridade.

 Notitia criminis por provocação

Kleber Luciano Ancioto Página 44


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Aqui a informação do crime é levada para a autoridade policial por um Órgão ou


Servidor Público, ou seja, o indivíduo possui o dever legal de informar o delito para a polícia.
Nestes casos a polícia é incitada obrigatoriamente a abrir uma investigação.

Neste sentido, o Órgão ou Servidor público possui o dever legal de levar a informação
até a polícia.

o Cognição Imediata (Direta)

Na Notitia Criminis por Provocação por Cognição Imediata, é a própria polícia se auto
informando, ou seja, o investigador de polícia leva a informação para o Delegado que abre o
inquérito.

Por exemplo, a Polícia Militar, em determinadas situações ao confeccionar um B.O.,


deverá levar ao conhecimento do Delegado que decidirá acerca da abertura de um inquérito, o
mesmo ocorre com o Investigador da Polícia Civil que sai em diligência e retorna com
informações sobre um crime.

o Cognição Mediata

Na Notitia Criminis por Provocação por Cognição Mediata, qualquer Órgão Público
externo que tenha conhecimento de um crime, deverá informar a Polícia.

Pode ocorrer nas mais diversas esferas do Poder, por exemplo, caso a Receita Federal
constate sonegação de impostos de um contribuinte, deverá levar as informações para que a
Polícia instaurar um inquérito, o mesmo ocorre caso o IBAMA tome conhecimento de um
crime ambiental, devendo informar a Policia para instaurar o inquérito e assim por diante em
todas as esferas do Poder.

Se o Servidor ou Órgão Público não comunicam o crime, caracteriza outro crime


denominado Condescendência Criminosa, que significa que o Servidor ou Órgão tomaram
conhecimento do crime, mas não levaram ao conhecimento da autoridade competente.

 Notitia criminis por cognição coercitiva

Neste caso, a polícia recebe informações acerca de um crime por ocasião da restrição
de um Direito Fundamental, como Liberdade e Propriedade.

Aqui fica caracterizado os casos onde o Estado exerce seu poder e descobre um crime,
nesse sentido ou o Estado estará Prendendo Alguém ou Interceptando Ligações Telefônicas,
se chegar a notícia de um crime, chamamos de notitia criminis por cognição coercitiva.

PEÇAS FORMAIS DE INSTAURAÇÃO

Kleber Luciano Ancioto Página 45


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Ao abrirmos a capa do inquérito a primeira peça que encontraremos, justificando a sua


instauração, serão as seguintes:

 Portaria

Ato investigatório de instauração do inquérito de atribuição exclusiva do Delegado de


Polícia, ou seja, somente o Delegado de Polícia pode baixar ou editar uma Portaria para abrir
um inquérito, sendo o procedimento mais utilizado.

O Delegado possui discricionariedade para decidir se a editará ou não, nesse sentido,


ao chegar uma informação que não caracteriza um crime, ele não estará obrigado a baixar
uma Portaria, mas, após baixa-la, o Inquérito não é mais disponível a ele, e, ele estará
vinculado ao dever legal de investigar.

Além de abrir o Inquérito a Portaria serve para estipular um roteiro investigatório ou


cronograma inicial de diligências, além de delimitar o objeto inicial de investigação, em
outras palavras, nele constará o tipo penal que se quer perquirir e o fato que chegou a
conhecimento da autoridade policial. Isso é necessário porque o Inquérito não pertence ao
Delegado, sendo uma ferramenta republicana de apurar delitos, nesse sentido, pode
acontecer do Delegado se ausentar de suas funções por um período e outro Delegado que o
substituir precisa ser capaz de continuar as investigações simplesmente lendo o que foi feito
até aquele momento no Inquérito.

O Delegado também possui o dever de formular uma fundamentação, mesmo que


sucinta prestando contas do porque decidiu instaurar o Inquérito.

A Portaria, ainda pode servir para decretar o sigilo da investigação, nesse sentido,
quando necessária a decretação do sigilo o Inquérito não é inserido em um banco de dados
públicos, mas somente em um banco de dados da própria polícia.

O roteiro das diligências não possui uma forma pré-estabelecida, ou seja, o Delegado
possui discricionariedade investigatória, não há um padrão legal ou rito investigatório pré-
concebido.

Quando um Delegado recebe informações robustas acerca de um crime, inclusive com


muitas provas, na Portaria mesmo, por ter discricionariedade, ele pode já indiciar o
investigado, sobretudo quando o individuo está foragido. Neste caso, estaríamos diante de um
indiciamento realizado sem a presença do investigado.

o Correlação da Portaria com os Atos de Iniciação.

Neste caso, o Delegado deverá destacar a origem da informação que pode ser
proveniente de uma Notitia criminis espontânea (noticia no jornal, telefonema, denúncia
presencial) ou de uma Notitia criminis por provação de cognição imediata. Estas informações
ganham um tom legal quando passam a consta-las na Portaria.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

 Requerimento

No Requerimento, temos uma Petição pleiteando a instauração do Inquérito, sendo


esta uma Petição Administrativa. Qualquer cidadão pode fazer um requerimento pedindo a
instauração de um inquérito, no Art. 5°, XXXIV, “a”, CF, nos garante o direito de Petição que é
reforçado pelo Art. 14, CPP.

Art. 5°, CF – [...] XXXIV – são a todos assegurados,


independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição
aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou
abuso de poder; [...]

Art. 14, CPP – O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado


poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a
juízo da autoridade.

Dessa forma, a Petição é um direito constitucional que qualquer cidadão possui de


levar ao conhecimento da autoridade competente informações e provas da pratica de um
crime. Em suma, a Petição é um Requerimento/Pedido de instauração de Inquérito dirigido ao
Delegado.

A Petição deve ser protocolada na Delegacia de Policia e o Delegado na maioria das


vezes defere o pedido no próprio rosto da Petição (P. ex. Defiro a instauração, autue-se. -
Assina e coloca a data). Neste caso, quando abrimos a capa do Inquérito será o próprio
Requerimento que encontraremos, justificando a sua instauração.

Pode ocorrer do pedido ser ilegal, por isso ao analisar o Requerimento o Delegado faz
um juízo de legalidade, nesse sentido, ele poderá indeferir a instauração do Inquérito por
considerar o fato atípico ou por não ser a autoridade competente para investigar, visto que, se
ele deferir ficará vinculado até o final do Inquérito.

Nos casos em que o requerente tiver seu Requerimento Indeferido, poderá recorrer
para o Delegado Geral do Estado, pedindo para que ele analise o pedido, visto que é ele quem
dá a ultima palavra acerca da existência de Inquéritos no Estado. Se ele entender pela
instauração do Inquérito, ele envia ordem para que o Delegado o Instaure.

Ocorre que ninguém utiliza esse recurso, visto que existe um caminho mais breve que
é através do Ministério Público. Desse modo, comumente se o Requerimento é indeferido o
cidadão pode envia-lo ao Promotor de Justiça e se ele entender que há a necessidade da
instauração, requisita ao Delegado através de uma Requisição.

o Correlação do Requerimento com os Atos de Iniciação.

Neste caso, a origem da informação necessariamente é proveniente de uma Notitia


criminis espontânea, realizada por um cidadão através de um Requerimento, já possuindo um
tom legal, tanto que se for deferido será o próprio Requerimento que constará como
documento de abertura do Inquérito.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

 Requisição

Alguns denominam de Ofício Requisitório, pois aqui existe uma ordem legal que
determina a instauração do Inquérito, emanada do Ministério Público ou do Próprio Poder
Judiciário.

Pode acontecer da Requisição emanar uma ordem manifestamente ilegal e nestes


casos o Delegado de Polícia pode se opor a Instauração, desde que faça fundamentadamente.
Imagine um Promotor que manda um Delegado investigar um Senador da República, neste
caso o Delegado sabe que há prerrogativa por função, deste modo poderá se opor a abrir o
Inquérito alegando que só o fará por ordem do STF.

Nesse sentido, estamos diante de uma ordem legal, mas que não se trata de uma
ordem absoluta, podendo o Delegado se negar a cumpri-la, desde que fundamente sua
decisão.

Essa Requisição não poderá emanar de um Juiz e esse mesmo Juiz julgar a causa, pois
fere os princípios do Sistema Acusatório estabelecendo, na verdade, um Sistema Inquisitorial,
pois se um Juiz manda um Delegado instaurar um Inquérito é como se ele já estivesse
condenando-o, quebrando com sua inércia pré-processual (Art. 40, CPP).

Art. 40, CPP – Quando, em autos ou papéis de que conhecerem os


juízes ou tribunais verificarem a existência de crime de ação pública,
remeterão ao Ministério Público as cópias e os documentos
necessários ao oferecimento da denuncia.

Nesse sentido, se o Juiz tomar conhecimento de um crime, para que ele não assuma
uma postura inquisitorial deverá extrair cópias do que obteve e enviar para o Ministério
Público, que decidirá se pedirá a instauração de Inquérito.

o Correlação da Requisição com os Atos de Iniciação.

A Requisição materializa uma Notitia criminis por provocação por cognição mediata.
Portanto, trata-se de ordem legal, imposta, dirigida ao Delegado de polícia que devera
instaurar o Inquérito.

 Auto de Prisão em Flagrante / Busca e Apreensão

O Auto de Prisão em Flagrante possui dois efeitos: Probatório (porque é um


documento dotado de fé pública, ou seja, possui presunção de veracidade) e Prisional (visto
que, titulariza a prisão, sendo o documento que o Delegado lavra para manter o indivíduo
preso).

Nestes casos, ao abrirmos o Inquérito teremos o Auto de Prisão em Flagrante ou o


Auto de Busca e Apreensão justificando a sua abertura. E é muito difícil advogar em favor do
indivíduo que é preso em flagrante, pois este documento possui força probatória muito forte

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

por possuir fé pública, por isso evitar a prisão em flagrante é muito mais interessante para a
defesa que seja lavrado um Auto de Comparecimento Espontâneo, que explicaremos abaixo.

o Correlação do Auto de Prisão em Flagrante / Busca e Apreensão com os Atos


de Iniciação.

São as formas mais comuns de se formalizar a Notitia criminis por cognição coercitiva,
visto que, no momento que se restringe direitos fundamentais poderá aparecer informações
do crime.

AUTO DE COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO

Imaginemos a situação de alguém que mata outrem que invadiu sua casa, o mais
recomendado nestes casos é ligar para o advogado, não importando a hora ou dia e ambos se
dirigirem a uma Delegacia de Polícia para lavrarem o Auto de Comparecimento Espontâneo.

Este auto dilui os efeitos negativos da Notitia criminis por cognição coercitiva, pois
aqui o sujeito estará agindo com boa fé objetiva processual, descaracterizando o flagrante,
sendo a postura mais civilizada e mais ética que se pode adotar em uma situação dessas.

Não há porque o indivíduo ficar preso, porque destituímos a autoridade de qualquer


fundamento para prendê-lo. E ainda que o indivíduo venha a ser condenado, este ato servirá
como uma atenuante importante que é a postura colaborativa do réu, destituindo qualquer
situação de fraudulência.

Não existe atitude que mais irrita Delegado de Polícia do que situações em que o
advogado ou o investigado se escusam dos questionamentos escondendo informações.

Em resumo, o flagrante ocorre quando o indivíduo esta praticando o crime, logo após
pratica-lo ou se estiver fugindo, desse modo aqui não há como prender em flagrante, visto que
o Réu esta colaborando com a investigação. Não há substrato fático para sustentar um auto de
prisão em flagrante.

DELAÇÃO

Veremos três hipóteses de delação, que derivam da Notitia criminis espontânea.

 Delatio criminis simples (Portaria)


o Verbal
o Escrito

Neste caso, teremos a Portaria, visto que o cidadão simplesmente leva a informação a
Polícia se identificando, visto que, como já falamos é vedado o anonimato. Ou seja, o
indivíduo liga para a Polícia ou vai presencialmente, podendo fazer isso falando ou por escrito

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

(whatsapp, e-mail, facebook, carta, etc. – nos casos de utilização do meio eletrônico o
Delegado dará um print na página e anexará a Portaria relatando sua fonte).

 Delatio criminis postulatória (Requerimento)

Aqui é diferente, pois teremos a hipótese de Requerimento, onde o cidadão solicita a


Instauração do Inquérito, informando o crime e anexando documentos comprobatórios.

 Delatio criminis inqualificada (Portaria)

Denominada também de denuncia anônima. Para qualquer manifestação do


pensamento é vedado o anonimato, isto porque a pessoa deve se responsabilizar pelo
pensamento manifestado e liberar eficácia jurídica, em outras palavras a manifestação do
pensamento só produz eficácia jurídica como ato jurídico perfeito se houver um signatário do
ato.

Diante disso o Supremo veda a Instauração Direta do Inquérito baseado em Denuncia


Anônima, visto que ela não possui o condão de produzir efeitos jurídicos para este fim, por
não conseguirmos atribuir a eficácia a uma pessoa.

Mas, a denúncia anônima é um dado da vida e como qualquer dado ou informação,


propicia a movimentação policial, ou seja, ela não possui força para promover a Instauração de
um Inquérito, mas pode motivar uma diligência para buscar informações. E no caso das
informações se confirmarem, o Delegado Instaurará o Inquérito baixando uma Portaria por
Notitia criminis por provocação de cognição imediata, ou seja, a base para a Instauração do
Inquérito não será mais a denúncia anônima, mas o resultado da diligência.

Veja que a denúncia anônima, não é base para uma busca e apreensão, para mandar
prender alguém ou mesmo para instaurar o inquérito, mas é uma informação e como qualquer
informação se confirmada poderá servir de base para a Instauração do Inquérito.

 Crime de Ação Penal Pública Incondicional

O Delegado possui o dever legal de investigar, não havendo necessidade de pedido.

 Crime de Ação Penal Pública Condicionada a Representação

O Delegado só investiga mediante a liberação dada pela vítima através da


representação.

 Crime de Ação Penal Privada

O Delegado só instaura o inquérito a pedido da vítima ou do seu representante legal.

24/03/2015

Kleber Luciano Ancioto Página 50


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

ATOS INVESTIGATÓRIOS DA AUTORIDADE POLICIAL (Art.6°, CPP)

O Art. 6°, CPP elenca um roteiro investigatório, sendo ele meramente exemplificativo
ou aberto, em outras palavras temos um rol de providências investigatórias que o Delegado
deve seguir.

Estas medidas, no entanto, não representam um rito, ou seja, não existe uma ordem
pre-estabelecida, embora exista um rol de procedimentos investigatórios, não há uma ordem
concatenada como existe na Ação Penal, pois aqui o Delegado não esta sujeito ao Devido
Processo Formal, possuindo discricionariedade investigatória.

O referido artigo foi redigido em 1941, não sendo, portanto, projetado para os crimes
que existem atualmente, ou seja, ele não se presta para desarticular uma organização
criminosa internacional que utiliza a “deep web” para praticar crimes, não foi feito para
combater o terrorismo, para combater gigantescas estruturas de corrupção, mas se prestam
para nos indicar as providencias investigatórias clássicas que devem ser complementadas.
Nesse sentido, temos Leis mais novas que vieram para complementa-lo  Lei 12850/13 e
Lei 12683/12.

Vejamos primeiramente as providencias elencadas no Art. 6°, CPP.

Art. 6°, CPP – Logo que tiver conhecimento da prática da infração


penal, a autoridade policial deverá: I – dirigir-se ao local,
providenciando para que não se alterem o estado e conservação das
coisas, até a chegada dos peritos criminais; II – apreender os objetos
que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais;
III – colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do
fato e suas circunstâncias; IV – ouvir o ofendido; V – ouvir o indiciado,
com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do
Título VII, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por 2
(duas) testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura; VI – proceder a
reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII – determinar,
se for caso, que se proceda à exame de corpo de delito e a quaisquer
outras perícias; VIII – ordenar a identificação do indiciado pelo
processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha
de antecedentes; IX – averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o
ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica,
sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e
quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do
seu temperamento e caráter.

o I - Dirigir-se ao Local / Conservação

A primeira providência que a Polícia pode ter ao tomar conhecimento do crime é ir ao


local do crime, isola-lo para manter o estado das coisas, de forma que possibilite condições
para que os peritos produzam provas através do exame perinecroscópico (observação do
perímetro).

Kleber Luciano Ancioto Página 51


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Aqui já detectamos um problema, pois quando o crime é cibernético, não há como a


autoridade policial ir ao local do crime, hoje os indivíduos estão com o celular no bolso,
viajando pelo mundo praticando crimes, o que dificulta e as vezes impossibilita a
empregabilidade desse procedimento.

o II - Apreensão de objetos

Realizada somente após os peritos concluírem a análise do local do crime.

o III - Colher provas

Após realizada a apreensão, a Polícia deve colher toda e qualquer prova que ajude a
esclarecer os fatos e circunstâncias do crime. Ex. Anotar os nomes das testemunhas.

o IV - Ouvir o ofendido

Se possível a Polícia deve ouvir o ofendido, pois ele sempre será fonte de informações
importantes, principalmente se não houver testemunhas oculares.

o V - Ouvir o indiciado

Esse inciso se refere ao interrogatório policial, que é inquisitorial, então não depende
de participação de Advogado para ser válido, mas se o advogado estiver presente o Delegado
não poderá pedir para que ele saia.

No entanto, o Advogado durante o interrogatório não poderá praticar ato nenhum,


sendo permitida a sua presença apenas para acompanhar o depoimento e preservar o respeito
aos Direitos Fundamentais.

o VI - Reconhecimento de Pessoas e Coisas / Acareação

Acareação é na verdade colocar “cara a cara” as pessoas para tentar sanar eventuais
divergências nos depoimentos.

O Reconhecimento, por sua vez serve para identificação de objetos e indivíduos.

o VII - Exame de corpo de delito

Se for o caso, é a principal perícia do Processo Penal, porque é a única perícia que
prova a materialidade do crime, é prova vinculada. Se não houver exame de corpo e delito o
réu é absolvido por insuficiência de provas.

Esta é a prova menos confrontada em contraditória, visto que, o Processo Penal no


Brasil em regra é para pessoas mais pobres e o exame só pode ser confrontado por outro
exame, ficando caro para o Réu arcar com os custos.

Kleber Luciano Ancioto Página 52


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Nos crimes que não deixam vestígios permite-se a utilização do exame de corpo de
delito indireto, que é uma exceção.

o VIII - Identificação criminal

A identificação criminal é realizada pelo sistema deca-datiloscópico, ou seja, pela


impressão digital dos 10 dedos que são analisados pelo Sistema Delta.

o IX - Vida pregressa

Por fim, a Polícia verifica a vida pregressa do investigado do ponto de vida familiar,
individual e social, analisa o temperamento, caráter e estado de ânimo do investigado antes,
durante e depois do crime e apura, também, a condição econômica do investigado.

Essas informações do Art. 6°, CPP são elementos mínimos para individualizar a pena
e evidenciar o crime, visto que se julga o fato e a pessoa.

Mas esse artigo, como já adiantamos no início, ficou insuficiente para os dias atuais, e
hoje existe muitas outras formas de se investigar. Alguns desses novos mecanismos foram
disciplinados pela Lei 12850/13, que disciplina acerca das Organizações Criminosas.

LEI 12850/13 – ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

Seu Art. 3° guardada as devidas proporções equivale ao Art. 6° do CPP, tipificando a


organização criminosa e prevendo mecanismos investigatórios para apurar os crimes
praticados por estas organizações, havendo inclusive a possibilidade da Colaboração Premiada.

Art. 3°, Lei 12850/13 – Em qualquer fase da persecução penal, serão


permitidos, sem prejuízo de outros já previstos em lei, os seguintes
meios de obtenção da prova: I – colaboração premiada; II – captação
ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos; III – ação
controlada; IV – acesso a registros de ligações telefônicas e
telemáticas, a dados cadastrais constantes de bancos de dados
públicos ou privados e a informações eleitorais ou comerciais; V –
interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas, nos termos
da legislação específica; VI – afastamento dos sigilos financeiro,
bancário e fiscal, nos termos da legislação específica; VII – infiltração,
por policiais, em atividade de investigação, na forma do art. 11; VIII –
cooperação entre instituições e órgãos federais, distritais, estaduais e
municipais na busca de provas e informações de interesse da
investigação ou da instrução criminal.

Para termos ideia o quão avançado se tornam os instrumentos de investigação, o §14


do Art. 4° que regula a hipótese de Colaboração Premiada na referida Lei, disciplina a

Kleber Luciano Ancioto Página 53


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

possibilidade do colaborador renunciar o direito a autodefesa e estará sujeita ao compromisso


legal de dizer a verdade para poder fazer frente aos benefícios previstos no caput do mesmo
artigo, vejamos abaixo:

Art. 4°, Lei 12850/13 – O juiz poderá, a requerimento das partes,


conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena
privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele
que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e
com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou
mais dos seguintes resultados: I – a identificação dos demais coautores
e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles
praticadas; II – a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de
tarefas da organização criminosa; III – a preservação de infrações
penais decorrentes das atividades da organização criminosa; IV – a
recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações
penais praticadas pela organização criminosa; V- a localização de
eventual vítima com a sua integridade física preservada. [...] § 14° Nos
depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de
seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso
legal de dizer a verdade. [...]

LEI 12683/12 – TORNA MAIS EFICIENTE A PERSECUÇÃO PENAL NOS CRIMES DE


LAVAGEM DE DINHEIRO

Essa Lei alterou a Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9613/98), trazendo novas
ferramentas investigatórias e criou um poder de constrição de bens que antes não existia,
isso porque sabemos que para desarticular o crime de lavagem de dinheiro não basta prender
o cidadão sendo necessário empobrece-lo imediatamente, caso contrário a investigação corre
o risco de não ter um resultado útil.

Essa Lei acabou com o sigilo profissional do contadores e advogados, no sentido de


que se algum cliente chegar no escritório relatando um caso de lavagem de dinheiro, estes
profissionais teriam o dever legal de informar as autoridades, mas a OAB recomendou a não
aplicação deste dispositivo enquanto tramita a ADI que ela impetrou no STF, visto que se a
regra for utilizada é sinal que rumamos para um sistema inquisitorial.

o Postura Anti Republicana – Juiz do caso Eike Batista.

Como já discutimos anteriormente o Juiz precisa sempre justificar seus atos, visto que
o Poder Jurisdicional não é dele, sendo apenas exercido por ele. Nesse sentido todos ficamos
consternados com o caso do Juiz que sequestrou bens do Eike Batista visando satisfazer os
interesses dos credores ao final da Ação, no entanto, foi pego dirigindo o Porsche do
empresário e encontraram um piano também de propriedade do empresário na casa de um
dos vizinhos do referido Juiz, em uma grave demonstração de postura anti republicana. Ao
menos o Juiz poderia ter tentado justificar-se previamente se auto nomeando e nomeando seu

Kleber Luciano Ancioto Página 54


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

vizinho como administradores dos bens do empresário como autoriza o Art. 5° da Lei
9613/98.

Art. 5°, Lei 9613/98 – Quando as circunstâncias o aconselharem, o


juiz, ouvido o Ministério Público, nomeará pessoa física ou jurídica
qualificada para a administração dos bens, direitos ou valores sujeitos
a medidas assecuratórias, mediante termo de compromisso.

INDICIAMENTO

Indiciar é indicar provas contra uma pessoa.

 Conceito

É um ato investigatório de caráter declaratório de atribuição exclusiva do Delegado


de Polícia, que visa atestar a existência de provas que recaem contra um suspeito da prática
do crime. Em resumo, é o ato do Delegado que aponta a existência de provas contra
determinado suspeito.

Somente o delegado pode exercer tal juízo de valor, ou seja, somente ele pode valorar
as provas durante o Inquérito e apontar quais recaem sobre determinada pessoa.

Quando o Delegado indicia, não significa que ele esta incriminando, em outras palavras
ele não imputa a conduta a ninguém, visto que, esta função é do Promotor quando decide por
Denunciar.

O indiciamento pode acontecer em qualquer fase do Inquérito, pois ele não se vincula
a uma fase ou procedimento, bastando que haja prova robusta.

 Atribuição Legal

A Lei 12830/13, que dispõe sobre a investigação criminal conduzida pelo Delegado
de Polícia disciplina o indiciamento.

Esta Lei surgiu logo após as manifestações de julho de 2013, onde o povo reivindicava
entre outras coisas a não aprovação da PEC 37 que tirava o poder investigatório do Ministério
Público. Com isso a PEC não foi aprovada, no entanto, a Lei foi uma resposta direta do Governo
ao Ministério Público, visto que, ela tornou o Inquérito policial exclusivo da Polícia Judiciária e
ainda normatizou que o indiciamento é atribuição exclusiva do Delegado de Polícia, por isso,
nenhum Promotor ou Juiz pode mandar que o Delegado indiciasse alguém.

No entanto, o indiciamento é praticado desde a década de 40 no Brasil e o


fundamento legal anterior é o próprio Art. 6° do CPP, conforme elencado abaixo.

 Atos de Indiciamento
 Identificação (Art. 6°, VIII, CPP);
 Qualificação (Art. 6°, IX, CPP); e

Kleber Luciano Ancioto Página 55


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

 Interrogatório Policial (Art. 6°, V, CPP).

Na identificação e qualificação não há exercício da autodefesa, portanto, há o


compromisso com a verdade. O indivíduo que mente para a polícia quanto a sua identificação
(Art. 307, CP) ou quanto a sua qualificação (Art. 299, CP) pratica crime.

Art. 307, CP – Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para


obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a
outrem: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa, se
o fato não constitui elemento de crime mais grave.

Art. 299, CP – Omitir, em documento público ou particular, declaração


que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa
ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito,
criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente
relevante. Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa, se o
documento é público, e reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa, se
o documento é particular.

No interrogatório policial, no entanto, vigora a autodefesa (não autoincriminação).


Aqui o indivíduo pode ficar em silêncio, pode mentir e pode até mesmo renunciar a
autodefesa e prestar informações para caracterizar uma colaboração premiada.

O indiciamento por consignação ocorre quando o indivíduo esta foragido, dessa


forma, só há identificação e qualificação, não havendo o interrogatório, com isso constará no
banco de dados que o indivíduo é suspeito e está foragido.

CONTROLE DO INDICIAMENTO

O indiciamento pode ser controlado pelo Juiz, ou seja, o Juiz faz o controle de
legalidade do indiciamento verificando se não há violações de direitos fundamentais. O que
não é permitido é que o Juiz substitua o mérito do Delegado, ou seja, que ele analise a prova
no lugar do Delegado.

 Indiciamento:

o De Menor

Não é possível indiciar o menor por causa do ECA – Estatuto da Criança e Adolescente,
visto que, o indiciamento é um instituto do Código de Processo Penal utilizado para investigar
crimes e o menor esta sujeito ao ECA, que prevê que o menor não pratica crimes.

o De Inimputável

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

No caso do maior inimputável não há qualquer impedimento, visto que o indiciamento


decorre do fato e cabe ao agente provar sua inimputabilidade durante o processo para ser
absolvido.

o Durante Ação Penal

A Lei 12830/13 veda peremptoriamente o indiciamento durante a Ação Penal, visto


que é ato exclusivo do Delegado de Polícia.

Em outras palavras, durante a Ação Penal não se admite o indiciamento, porque o


direito precluiu, ou seja, o momento oportuno (Fase Policial) passou. Juiz que recebe a
denuncia e manda indiciar, esta adotando uma postura inquisitiva, pois é como se o Juiz
dissesse que a prova existe e que o Delegado não viu fazendo um pré-julgamento.

o Para a Prisão Cautelar

O indiciamento não é pressuposto para prisão cautelar, pelo contrário, em regra


prende-se para depois indiciar. São pressupostos distintos, a prisão é para preservar o
processo enquanto que o indiciamento serve para indicar provas do crime.

o De quem possui Foro por Prerrogativa

É possível o indiciamento de quem possui foro por prerrogativa desde que exista um
inquérito distribuído perante o Tribunal Competente.

25/03/2015

FASE CONCLUSIVA DO INQUÉRITO

 Encerramento

O encerramento do Inquérito Policial pode ocorrer de duas formas: Normal ou


Anormal.

o Normal

Trata-se do encerramento previsível, para o qual o Inquérito é feito, que ocorre


através de um Relatório, ou seja, o Inquérito possui o objetivo de ser encerrado dessa forma.

o Anormal

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Trata-se do encerramento atípico, que se dá pelo Trancamento do Inquérito.


Excepcionalmente teremos o encerramento anormal por um instituto chamado Arquivamento
de Mérito, que não comporta desarquivamento (é fruto de atuação jurisdicional e faz coisa
julgada material), visto que o Simples Arquivamento não é considerado um encerramento
anormal, por ele poder ser desarquivado.

 Prazo para conclusão

Art. 10, CPP – O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias,


se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso
preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em
que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trinta) dias,
quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.

Nesse sentido, o prazo para conclusão do inquérito de investigado solto é de 30 dias, e


para o investigado preso é de 10 dias.

Este prazo refere-se ao tempo máximo para que o inquérito seja distribuído em uma
Vara Criminal, quando, então, o Juiz pode autorizar a prorrogação do prazo, por quantas vezes
julgar necessário, por isso, dependendo da complexidade da investigação, pode ocorrer de
algumas levarem anos para serem concluídas.

São requisitos para a prorrogação a existência de uma Autorização Judicial e Anuência


do Ministério Público, prorrogando por períodos de 30 dias, sem limitação quanto ao número
de prorrogações que podem ser concedidas. É importante ressaltar que no caso de Réu preso
a prorrogação torna-se mais difícil;

 Destinatários

O Inquérito quando chega ao Fórum vai para uma Vara Criminal, havendo dois tipos de
destinatários: o Imediato e o Mediato.

Neste sentido, o destinatário imediato ou direto é o Ministério Público, que ao tomar


conhecimento do Inquérito poderá realizar três procedimentos: solicitar o arquivamento,
solicitar para complementar a investigação ou denunciar, dessa forma, é ele o responsável
por tomar a próxima providencia após a conclusão do Inquérito.

Já o destinatário mediato ou indireto é o Poder Judiciário, que possui uma função


meramente burocrática durante o Inquérito, viabilizando a tramitação do Inquérito Policial
no Fórum e abrindo vista para o Ministério Público.

RELATÓRIO

 Conceito

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Ato investigatório de atribuição exclusiva do Delegado de Polícia, que sintetiza as


principais diligências e provas obtidas acerca do crime investigado.

É uma peça investigatória onde somente o Delegado relata no Inquérito, ou seja,


nenhuma outra autoridade possui competência, em outras palavras só o Delegado possui
atribuição legal para relatar Inquérito Policial trazendo um panorama geral da investigação.

 Conteúdo

O conteúdo do relatório é de natureza descritiva, ou seja, ele contém a descrição das


provas produzidas e em face de quem elas foram produzidas. Este conteúdo é descritivo, pois
durante o Inquérito ou no Relatório o Delegado não faz juízo de valor, ou seja, ele não imputa
comportamento a ninguém, ele não imputa a pratica da conduta típica a ninguém, tendo a
função apenas de descrever as provas em face do indivíduo investigado.

O Delegado é um agente investigador e não acusador, por isso ele apenas descreve as
provas, e o juízo de valor, imputando condutas, quem realiza é o Advogado, o Promotor e o
Juiz.

Existe uma única exceção legal, um único caso em que o Delegado é chamado a fazer
Juízo de Valor, a tipificar conduta no Relatório, que é no caso do crime de Trafico de Drogas,
vejamos o artigo abaixo:

Art. 52, Lei 11343/06 – Findos os prazos a que se refere o art. 51


desta Lei, a autoridade de polícia judiciária, remetendo os autos do
inquérito ao juízo: I – relatará sumariamente as circunstâncias do fato,
justificando as razões que a levaram à classificação do delito, indicando
a quantidade e natureza da substância ou do produto apreendido, o
local e as condições em que se desenvolveu a ação criminosa, as
circunstâncias da prisão, a conduta, a qualificação e os antecedentes
do agente; [...]

Somente a Lei de Drogas possui essa exceção, porque o Promotor possui uma grande
dificuldade em algumas situações em distinguir quando a droga é mantida para uso próprio e
quando é utilizada para o tráfico, nesse sentido, é o Delegado em contato com o fato de
maneira direta que terá maiores condições de analisar caso a caso e tipificar o agente, em
outras palavras, o legislador concede autoridade ao Delegado para dizer se é Tráfico ou Uso.

 Finalidade

O Relatório pode ser utilizado para: Indiciar; Representar prisões processuais;


Representar para medidas cautelares que o Juiz pode conceder como a Indisponibilização de
bens, ou seja, em outras palavras ele pode ser utilizado para que sejam tomadas medidas
constritivas referente ao patrimônio do acusado.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

A finalidade do Relatório é encerrar a investigação por parte do Delegado, no


entanto, a grande finalidade não é essa, mas sim informar o Ministério Público para que ele
exerça a opinio delicti (opinião sobre o crime).

O Promotor deverá formar sua opinião sobre a ocorrência ou não do delito. Nesse
sentido, ele poderá fazer uma opinio delicti positiva, no sentido de que a investigação permite
o acionamento da Ação Penal ou uma opinio delicti negativa, em que o Ministério Público
forma o juízo que não há delito e pedi o arquivamento do inquérito.

Existem situações em que o Promotor não forma opinio delicti positiva e nem opinio
delicti negativa, que é o caso do Relatório encerrar uma investigação insuficiente, mal feita,
frágil, inapta para que o Ministério Público forme sua opinião. O Promotor nestas situações
estará analisando a qualidade do Inquérito e pode solicitar a Complementação Investigatória.

 Complementação Investigatória (Art. 16, CPP)

Art. 16, CPP – O Ministério Público não poderá requerer a devolução


do inquérito à autoridade policial, senão para novas diligências,
imprescindíveis ao oferecimento da denúncia.

Dessa forma, autorizado pelo Art. 16, CPP o Promotor solicita ao Juiz que oficie o
Delegado para que ele complemente as investigações. O Ministério Público faz isso no próprio
Auto do Inquérito, sendo este ato denominado Cota Ministerial (Manifestação informal por
escrito com a assinatura do promotor, onde ele se reporta ao Juiz que se reporta ao Delegado).

A regra é que o Juiz não pode indeferir o pedido de complementação do promotor,


visto que, é ele quem analisa a qualidade da prova, ou seja, é ele quem decide se vai acusar ou
não. Nesse sentido, o Juiz aqui volta a cumprir apenas um papel burocrático, visto que ainda
não há Processo e, portanto, ele não esta exercendo jurisdição, mas sim uma mera função
burocrática de intermediar a comunicação com o Delegado propiciando melhores argumentos
para o oferecimento da denuncia.

Quando a Cota Ministerial solicita diligencias que envolvem restrição de direitos


fundamentais, como interceptação telefônica, busca e apreensão, infiltração de agente,
escuta ambiental, prisão, nestes casos há Cláusula de Reserva de Jurisdição, ou seja, a
autorização está condicionada ao exercício da Jurisdição em sentido estrito. Do contrário, se
não envolver a restrição de direitos fundamentais, o Juiz exercerá apenas um caráter
burocrático.

Não é permitido que o Juiz de ofício declare a complementação investigatória, pois ele
estaria ferindo os princípios do Sistema Acusatório, assumindo uma posição inquisitorial
agindo como um Delegado, nesse sentido, o Juiz sempre dependerá de um pedido.

TRANCAMENTO DO INQUERITO POLICIAL

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Trata-se do encerramento anormal atípico do Inquérito por ordem judicial, que


declara a ilegalidade da investigação ou a falta de justa causa.

 Falta de Justa Causa

Situação em que o Inquérito é utilizado abusivamente com desvio de poder, sendo


necessário que o Juiz realizando o controle de legalidade, execute o Trancamento.

 Justa Causa

Há três elementos cumulativos que justificam a instauração de um Inquérito e se faltar


um deles ele deverá trancado.

o Tipicidade

A tipicidade em abstrato, não é concreta porque ainda não se investigou, nesse


sentido, só se pode abrir uma investigação para apurar fato típico.

O Inquérito só pode ser instaurado com base em um objeto pré-definido que em tese
representa um fato típico. Se não for assim, o Inquérito é arbitrário/abusivo. Não se pode
manter uma investigação em caso de atipicidade, se não há fato típico não há conduta
proibida não há norma penal aplicável.

o Punibilidade

Para que exista Inquérito em curso deve haver uma possibilidade punitiva nos termos
da Lei Penal. Nesse sentido, o Inquérito só pode tramitar se não houver causas extintivas ou
de exclusão da punibilidade.

Se houver uma dessas causas o Inquérito deverá ser trancado, dessa forma, não se
pode investigar alguém encoberto pelas escusas absolutórias (Art. 181 e 182, CP) ou ainda se
tiver ocorrido a prescrição (Art. 107, IV, CP).

A Tipicidade e Punibilidade são elementos do Direito Penal Material.

o Viabilidade

É vedado o Inquérito Policial e Investigação Temerária, sem elementos mínimos de


comprovação, aquilo que a doutrina chama de adminículo de prova, o Inquérito não pode
nascer do nada. Por isso que denuncia anônima não justifica a abertura de Inquérito, sendo
necessário um depoimento, um documento, que sirva de início de prova.

Faltando um destes elementos da justa causa o Juiz deve trancar o Inquérito, que pode
ocorrer de ofício ou por provocação. Nesse sentido, o Trancamento pode ocorrer de ofício
porque se tratar de norma de ordem pública, no entanto, caso ele não realize de ofício o

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Habeas corpus é a ação utilizada para provocar o Trancamento do Inquérito, pouco


importando se o investigado está preso ou não. Caso o Inquérito não tenha sido distribuído
no Fórum, a autoridade coatora é o Delegado, por isso o Habeas corpus deve ser impetrado
em qualquer Vara Criminal, agora nos casos em que o Juiz já tenha tomado conhecimento do
Inquérito se o manteve em curso sem uma justa causa, significa que ele anuiu a ilegalidade e
ele se torna a autoridade coatora, visto que ele assume a responsabilidade pelo Inquérito e,
sendo assim, o Habeas corpus deverá ser impetrado no Tribunal de Justiça.

ARQUIVAMENTO

 Conceito

O Arquivamento é uma decisão administrativa que obsta a continuidade das


investigações e que é proferida tanto pelo Procurador Geral de Justiça como pelo Juiz. Mas
para que essa decisão administrativa ocorra depende sempre de um pedido do Promotor de
Justiça (Ministério Público).

 Controle Judicial

O pedido do Ministério Público deve ser fundamentado e, a princípio é realizado para


o Juiz. E deve ser bem fundamentado, porque quando o promotor faz o pedido de
arquivamento estará relativizando o seu dever legal de acusar que é a regra do Sistema
Processual Penal, em outras palavras ele estará relativizando o Principio da Obrigatoriedade
da Ação Penal, sendo assim o pedido estará sujeito ao controle judicial de legalidade.

Normalmente o Juiz homologa, ou seja, chancela o pedido de arquivamento fazendo


um relato breve simplesmente dizendo que o pedido possui fundamento.

 Princípio da Devolução (Art. 28, CPP)

Art. 28, CPP – Se o órgão do Ministério Público, ao invés de


apresentar a denuncia, requerer o arquivamento do inquérito policial
ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar
improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou
peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia,
designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou
insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz
obrigado a atender.

Nesse sentido, o Juiz pode não concordar e, portanto, não homologar o pedido do
Promotor, caso em que ele devolverá o Inquérito para a chefia do Ministério Público o
Procurador Geral de Justiça, que é o responsável por fazer uma última análise e decidir se será
caso de Arquivamento ou de propositura da Ação Penal.

Kleber Luciano Ancioto Página 62


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Aqui novamente o Juiz não esta exercendo jurisdição, mas sim cumprindo uma função
administrativa fazendo controle de legalidade do pedido de arquivamento, a rigor a rigor o Juiz
é fiscal do princípio da obrigatoriedade, ou seja, o Juiz fiscaliza o dever acusatório do
Ministério Público, aplicando o disciplinado no Art. 28, CPP e este ato é denominado de
Princípio da Devolução.

No caso do Procurador Geral de Justiça solicitar o arquivamento não restará caminho


ao Juiz, se não, acatar o pedido, em contrapartida se ele discordar de seu Promotor e formar
uma opinio delicte positiva, o próprio Procurador Geral de Justiça poderá oferecer a denuncia
ou delegar para que outro Promotor a ofereça. Neste caso, o Promotor não tem que querer
propor a Ação, mas sim atuar por delegação e propô-la, a doutrina utiliza a expressão que o
Promotor atua como longa manus (extensão do braço) do Procurador Geral de Justiça. Quanto
ao Promotor anterior que solicitou o arquivamento, ele não pode ser forçado a entrar com a
denúncia por causa da independência funcional e até porque ele seria um péssimo acusador.

 Espécies de Arquivamento

o Arquivamento Direto

Trata-se do arquivamento que acabamos de explicar acima, ou seja, aquele que


decorre de uma opinio delicte negativa do Promotor de Justiça fazendo com que ele requeira
o arquivamento ao Juiz.

o Arquivamento Indireto

Possui esse nome, mas não se trata de arquivamento e tecnicamente é um pedido de


reconhecimento de conflito de competência. Neste caso, o Promotor se auto declara inábil
para o caso, em outras palavras o próprio Promotor diz que ele não é o natural do caso e que
o Juiz também não é requerendo a remessa dos Autos para o juízo competente.

Assim, o promotor faz um parecer apenas suscitando o conflito, ou seja, ele não pede
para arquivar, não denuncia e não pede para complementar a investigação.

o Arquivamento Implícito

Também não se trata de arquivamento, sendo, na verdade, uma violação ao principio


da obrigatoriedade, onde o Promotor deixa de denunciar todos, alguns ou algum dos
coautores do crime ou deixa de denunciar todos, alguns ou algum dos crimes e também não
solicita o arquivamento em relação a esses autores e crimes não denunciados.

Nos casos de Arquivamento Implícito a ilegalidade é gritante e a vítima poderá se


valer da Ação Penal Privada Subsidiária da Pública, para que o agente sofra as punições
previstas na Lei.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

 Arquivamento Implícito Subjetivo

É o caso de termos concurso de agentes, mas o Promotor deixa de denunciar um ou


alguns dos envolvidos no crime, em outras palavras, o Promotor não denuncia, não pede para
completar as investigações e também não solicita o arquivamento, impedindo que o Juiz avalie
a legalidade do pedido podendo devolver o Inquérito a chefia do Ministério Público (Art. 28,
CPP).

 Arquivamento Implícito Objetivo

Aqui trabalhamos com os casos de concurso material de crimes, onde o Promotor


deixa de denunciar um, alguns ou todos os crimes praticados, sem também solicitar
complementação das investigações ou o arquivamento, dessa forma, o Juiz fica impedido de
fazer o controle de legalidade assim como explicado no item anterior.

31/03/2015

DESARQUIVAMENTO (Art. 18, CPP)

Art. 18, CPP – Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela


autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade
policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver
notícia.

O Desarquivamento existe porque a decisão de arquivar um Inquérito é administrativa,


nesse sentido, não faz coisa julgada material. Quando o Juiz homologa o arquivamento ele não
exerce Jurisdição em sentido estrito, ele não julga a causa, ele apenas concede uma decisão
administrativa que não encerra a discussão fática, não faz coisa julgada material.

Mas toda decisão administrativa, embora não faça coisa julgada material, sofre o que
chamamos de preclusão administrativa, no sentido de que ela dependerá de um fato novo
para justificar o seu desarquivamento, em outras palavras, se nada acontecer o Inquérito
deverá continuar arquivado.

O Desarquivamento, portanto, é o efeito de um fato novo, como a descoberta de


novas provas que renove o contexto fático de forma a autorizar a continuidade das
investigações. Estas provas devem ser substancialmente novas, ou seja, provas que avançam,
aperfeiçoam ou dão uma nova direção ao contexto fático, nesse sentido, não basta mais um
depoimento de uma testemunha que não viu nada ou um documento que não tem nada a ver
com o caso para justificar o Desarquivamento, a prova deve abrir campo para a continuidade
da investigação, sendo inclusive sumulado pelo Supremo na Súmula 524.

Súmula 524 STF – Arquivado o inquérito policial por despacho do


juiz, a requerimento do promotor de Justiça, não pode a ação penal ser
iniciada sem novas provas.

Kleber Luciano Ancioto Página 64


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Nesse sentido, se antes não havia testemunha, mas de repente aparece alguém que
viu, a investigação deve ser reaberta imediatamente, pois isso muda o contexto fático e passa
a ser possível descobrir a autoria do crime, por exemplo.

Há, no entanto, arquivamentos que não serão desarquivados nunca, pois pode
acontecer do Juiz ao determinar o arquivamento conceder uma Decisão Jurisdicional, que
fará Coisa Julgada Material. Neste caso, o Juiz estará prolatando uma sentença de mérito nos
Autos do Inquérito, sem que tenha ocorrido Procedimento, sem que tenha sido Proposta a
Denuncia, sendo possível nos casos em que ele aplica as regras do Direito Penal no crime, por
exemplo, quando o Juiz declara que o crime está prescrito.

Nesta mesma linha de raciocínio, quando o Juiz declara no arquivamento por


reconhecer uma das excludentes de ilicitudes ou atipicidade da conduta são situações em que
o Juiz prolata uma decisão Jurisdicional e ela possui força de Coisa Julgada Material, a doutrina
chama isso de Antecipação de Tutela Absolutória, sendo uma decisão absolutória pré
processual e uma vez passando o período recursal sem que o Ministério Publico impetrar
recurso, não há mais como desarquiva-lo.

PODERES INVESTIGATÓRIOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Tema muito controverso, visto que há instituições favoráveis e outras contra. E essa
divergência tem sentido, pois se procurarmos na Constituição não existe dispositivo que
autorize o Ministério Público a investigar e no mesmo sentido não existe Lei
Infraconstitucional. Mas, o Ministério Público está investigando e utiliza como base normativa
a Resolução 13/06 do Conselho Nacional do Ministério Público, portanto, ele utiliza como
base legal sua própria Resolução para investigar.

O Ministério Público nunca quis e não quer subtrair do Delegado de Polícia o Inquérito
Policial, o que discutimos aqui é o Poder Investigatório realizado através de instrumento
investigatório próprio.

 Instrumento Investigatório – P.A.C. ou P.I.C.

Por não existir Lei, há controvérsias inclusive quanto ao nome do procedimento, nessa
linha, há os que defendam a terminologia P.A.C. – Procedimento Administrativo Criminal e os
que defendem a terminologia P.I.C. – Procedimento Investigatório Criminal.

Habitualmente os membros do próprio Ministério Público denominam o procedimento


através das siglas: P.A.C.

 Atividade Investigatória e Direitos Fundamentais

Toda investigação, toda atividade investigatória restringe direitos fundamentais e só se


pode restringir direitos fundamentais através de Lei, pois essa é a base de um Estado de

Kleber Luciano Ancioto Página 65


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Direito, ou seja, somente o Legislador pode determinar quem ou quais Órgãos Públicos são
aptos a investigar crimes.

Além disso, toda Lei precisa se pautar em comandos constitucionais, com isso
independentemente dos posicionamentos favoráveis ou contras é necessário a existência de
uma Lei para que o próprio Ministério Público tenha um mínimo de base legal para
estabelecer um procedimento, pois, somente assim, com base nesse procedimento ele estará
se submetendo a sua função republicana, pautada pela legalidade, prestando contas daquilo
que faz e fundamentando suas decisões.

 Resolução n. 13/06 do CNMP

O Ministério Público investiga se pautando em sua própria Resolução, que como já


sabemos não é Lei, sendo apenas um ato administrativo normativo interna corporis, que se
presta para regulamentar uma Lei pré-instituída.

E foi para isso que a Resolução 13/06 inicialmente foi feita, para regulamentar o Art.
8° LC 75/93 e o Art. 26, Lei 8625/93.

Art. 8°, LC 75/93 – Para o exercício de suas atribuições, o Ministério


Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência: I -
notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de
ausência injustificada; II - requisitar informações, exames, perícias e
documentos de autoridades da Administração Pública direta ou
indireta; III - requisitar da Administração Pública serviços temporários
de seus servidores e meios materiais necessários para a realização de
atividades específicas; IV - requisitar informações e documentos a
entidades privadas; V - realizar inspeções e diligências investigatórias;
VI - ter livre acesso a qualquer local público ou privado, respeitadas as
normas constitucionais pertinentes à inviolabilidade do domicílio; VII -
expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e
inquéritos que instaurar; VIII - ter acesso incondicional a qualquer
banco de dados de caráter público ou relativo a serviço de relevância
pública; IX - requisitar o auxílio de força policial.

Art. 26, Lei 8625/93 – No exercício de suas funções, o Ministério


Público poderá: I - instaurar inquéritos civis e outras medidas e
procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los: a)
expedir notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em
caso de não comparecimento injustificado, requisitar condução
coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar, ressalvadas as
prerrogativas previstas em lei; b) requisitar informações, exames
periciais e documentos de autoridades federais, estaduais e
municipais, bem como dos órgãos e entidades da administração direta,
indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; c) promover inspeções e
diligências investigatórias junto às autoridades, órgãos e entidades a
que se refere a alínea anterior; II - requisitar informações e
documentos a entidades privadas, para instruir procedimentos ou

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

processo em que oficie; III - requisitar à autoridade competente a


instauração de sindicância ou procedimento administrativo cabível; IV
- requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito
policial e de inquérito policial militar, observado o disposto no art. 129,
inciso VIII, da Constituição Federal, podendo acompanhá-los; V -
praticar atos administrativos executórios, de caráter preparatório; VI -
dar publicidade dos procedimentos administrativos não disciplinares
que instaurar e das medidas adotadas; VII - sugerir ao Poder
competente a edição de normas e a alteração da legislação em vigor,
bem como a adoção de medidas propostas, destinadas à prevenção e
controle da criminalidade; VIII - manifestar-se em qualquer fase dos
processos, acolhendo solicitação do juiz, da parte ou por sua iniciativa,
quando entender existente interesse em causa que justifique a
intervenção.

Estes artigos autorizam que o Ministério Público investigue seus próprios membros,
isso porque eles possuem Foro por Prerrogativa de Função, só que, o campo de
regulamentação está adstrito aos seus próprios membros, não podendo ser estendido a todo e
qualquer cidadão, no entanto, a resolução estendeu a atuação sofrendo, portanto, de
inconstitucionalidade, visto que a resolução não pode ser contra legem ou extra legem.

Vejamos abaixo, argumentos favoráveis e contrários a possibilidade do Ministério


Público investigar, sendo todos constitucionais.

 Argumentos Favoráveis

1) O Ministério Público é parte Acusatória no Processo Penal

O Ministério Público possui o dever legal de alegar e provar o que alega, sob pena de
não respeitar o Devido Processo Legal Formal, caso deixe de cumprir essas funções. Nesse
sentido, como para provar é necessário investigar, surgiria dai a autorização para que o
Ministério Público possa investigar.

2) Ministério Público é Titular do Direito de Ação (Art. 129, I, CF)

Art. 129, CF – São funções institucionais do Ministério Público: I –


promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; [...]

O Ministério Público possui o poder dever de ingressar com a Ação Penal, nesse
sentido, existe a Teoria dos Poderes Implícitos (Implied Powers Doctrine) que diz que toda vez
que um Órgão possuir uma missão fim, presume-se que a Constituição concede todos os
instrumentos cabíveis para cumpri-la, em outras palavras, a autorização para investigar não
precisa estar expressa no texto constitucional, podendo ser extraída implicitamente do Art.
129, I, CF, nesse sentido, quando a Constituição normatiza que o Ministério Público deve
propor a Ação, normatizaria também que ele pode investigar para formar sua opinio delicti.

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3) Ministério Público pode Investigar Ilegalidades Cíveis (Art. 129, III, CF)

Art. 129, CF – São funções institucionais do Ministério Público: [...] III


– promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses
difusos e coletivos.

Dessa forma, a autorização para investigar ilegalidades esta expressa na Constituição,


por meio do Inquérito Civil.

Sendo assim, o Ministério Público pode abrir um Inquérito Civil para apurar
ilegalidades praticadas por um Prefeito, como atos de improbidade administrativa, dano ao
patrimônio público, ao meio ambiente, etc., e se durante esse Inquérito observar a autoria e
materialidade de um crime ele pode propor a Ação Penal diretamente, ao passo que o
Inquérito Criminal é útil, mas dispensável para a propositura da Ação.

4) Instrumentos Pré-Concebidos são Dispensáveis para Ingressar com Ação Penal

Não existe nenhum comando Constitucional ou Lei que normatize que a atuação do
Ministério Público esta condicionado a algum instrumento investigatório pré concebido.

Nesse sentido, se até um particular pode investigar e através da Peça de Informação o


Ministério Público poderia propor a Ação Penal, porque a própria instituição não poderia
investigar? Por esse ângulo de visão, não haveria o porquê não permitir a atividade
investigatória do Ministério Público.

5) Poder Requisitório (Art. 129, VIII, CF) e Poder Notificatório (Art. 129, VI, CF)

Art. 129, CF – São funções institucionais do Ministério Público: [...] VI


– expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua
competência, requisitando informações e documentos para instruí-los,
na forma da lei complementar respectiva; [...] VIII – requisitar
diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial,
indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;
[...]

O Ministério Público possui Poder Requisitório, no sentido de poder requisitar


diligências investigatórias, além de possui o Poder Notificatório, ou seja, o Ministério Público
pode mandar que uma autoridade o informe sobre determinados atos.

Esse Poder Notificatório, muitas vezes evita uma Ação Penal, por exemplo, o
Ministério Público pode informar um Prefeito que ele esta agindo ilegalmente na aplicação da
verba da saúde e educação e o convidar a comparecer em sua sede para realizar um T.A.C.
(Termo de Ajustamento de Conduta) sob pena de ser proposta uma Ação Penal, caso não seja
possível uma solução administrativa.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Isso é o que chamamos de Ativismo Ministerial, pois, é uma forma extra judicial de
resolver conflitos.

Nesse sentido, se o Ministério Público já possui estes dois poderes, teria, também, o
Poder de Investigar.

6) Ministério Público é o Órgão Competente para Fazer o Controle Externo da


Atividade Policial (Art. 129, VII, CF)

Art. 129, CF – São funções institucionais do Ministério Público: [...] VII


– exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei
complementar mencionada no artigo anterior; [...]

A principal atividade policial é a investigação de crimes, o controle externo é aquele


que não é realizado pelas corregedorias da policia, mas sim pelo Ministério Público.

Na prática isso significa que o Ministério Público esta constantemente verificando a


qualidade, eficiência e a legalidade da investigação realizada pela Policia, até porque o
destinatário da investigação é ele próprio.

Dessa forma, se ele pode corrigir, se ele pode investigar a investigação da policia, ele
poderia investigar diretamente o crime, visto que a Sociedade não teria culpa de uma possível
inercia da Policia.

7) Ministério Público Investiga a Legalidade Investigatória

Ele pode investigar a Policia, nos casos em que ela esteja envolvida com o crime
organizado, ou seja, quando ela esta corrompida, mas principalmente para verificar se ela
(Polícia) não esta produzindo provas ilícitas, por isso o Ministério Público poderia realizar uma
investigação paralela pautada na legalidade, tornando-se uma fonte independente de prova.

8) Independência Funcional

O Ministério Público possui Independência Funcional e outras garantias que o


Delegado não possui, como a inamovibilidade, irredutibilidade de subsídios e vitaliciedade,
não tendo que prestar contas de suas convicções a superior hierárquico.

Dessa forma, por ter todas essas garantias ela não esta suscetível a politização da
investigação, o que não ocorre com a Polícia, que está diretamente subordinado a um superior
hierárquico político.

9) Cláusula Geral Aberta (Art. 129, IX, CF)

Art. 129, CF – São funções institucionais do Ministério Público: [...] IX


– exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação


judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.

Este inciso deixa em aberto, autorizando-o a cumprir qualquer função que tenha
relação com sua vocação institucional, dessa forma, investigar nos parece que estaria dentro
deste contexto.

 Argumentos Contrários

1) Sistema Acusatório

Estabelece separações de funções, entre as quais, investigar e acusar. Neste sentido,


permitir que uma instituição cumule ambas as funções estaríamos diante de uma super
afetação de poderes, o que gera um desequilíbrio processual.

Permitindo tal fato o Ministério Público formaria sua opinio delictio e depois iria buscar
provas para comprovar aquela convicção, situação essa que é chamada de Quadro Mental
Paranoico. Nesse sentido, ele não pode investigar, pois criaria um ranço inquisitivo.

2) Constituição Analítica (contrario de Sintética) não Compactua com Teoria dos


Poderes Implícitos.

A Teoria dos Poderes Implícitos foi criada nos EUA cuja Constituição é Sintética, nesse
sentido, lá ela se presta para compensar o caráter sintético da Constituição, mas aqui não faria
sentido aplica-la em uma Constituição Analítica, detalhista, como a nossa.

Se isso fosse permitido, estaríamos criando uma Fraude Constituinte, trazendo um


desequilíbrio interpretativo (questão de hermenêutica), neste caso, seria o mesmo de criar
poderes no espaço em que o constituinte não criou, posicionamento defendido por José
Afonso da Silva.

3) Assimetria Estrutural Proposital

Existe entre o inciso I e o III do Art. 129, CF uma assimetria estrutural, pois no inciso
III o legislador previu expressamente o Inquérito Civil + Ação Civil Pública, ao passo que no
inciso I ele previu apenas a Ação Penal.

Art. 129, CF – São funções institucionais do Ministério Público: I –


promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; [...]
III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção
do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros
interesses difusos e coletivos; [...]

Este silêncio é proposital, sendo na verdade um silêncio que fala, pois significa que o
constituinte quis excluir sim a investigação do Ministério Público, no que tange a Ação Penal.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

4) Expressamente há determinação para que a Polícia apure Infrações Penais (Art. 144,
§1°, I e IV CF)

Art. 144, §1°, CF – A polícia federal, instituída por lei como órgão
permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em
carreira, destina-se a: I – apurar infrações penais contra a ordem
política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da
União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim
como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou
internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;
[...] IV – exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da
União.

Neste sentido, estes dispositivos normatizam expressamente que quem deve


investigar crimes é a Polícia e mais que isso, disciplinam que cabe a polícia exercer com
exclusividade as funções da Policia Judiciaria da União, dentre as quais existe a função de
investigar. O PEC 37 que não foi aprovado devido as manifestações populares tinha em seu
texto algo mais agressivo, pois dizia que havia exclusividade da Polícia para investigar crimes,
não dando margens a dúvidas de que o Ministério Público não poderia investigar.

5) Poder Requisitório possui como Destinatário a Polícia e o Poder Notificatório é


adstrito aos Inquéritos Civis.

Ou seja, apensar do Ministério Público possuir o Poder Requisitório, ele não se presta
para autorizar para que a própria instituição investigue, mas sim para ordenar que outra
instituição o faça; já quanto ao Poder Notificatório, ele sempre estará adstrito aos Inquéritos
Civis.

6) Não há Órgão Constitucional para Controle do Ministério Público

E mais, não há lei disciplinando o Controle Externo do Ministério Público.

7) Ministério Público também é Passível de Erro / Estrutura Investigatória

Nesse sentido, o Ministério Público também pode praticar atos ilegais, e não haveria
quem julgar acerca da ilegalidade.

Por outro lado, mesmo que ele possua independência funcional, ele não possui
estrutura para investigar, dessa forma, se ele ficar investigando ele não cumpre sua função de
acusar.

8) Não há Lei e Nem Procedimento

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Portanto, há violação direta do Devido Processo Legal Substancial, visto que não há
exercício de um Poder Legitimo, sem procedimento não há controle de Poder, não há regime
de controle de arquivamento, enfim, não há controle de nada.

Se não tem Lei, não há a vontade geral do povo autorizando que o Ministério Público
investigue. O particular possui peças de informação e pode investigar, justamente porque ele
é particular, um Órgão Público aplica-se o princípio da legalidade estrita, podendo realizar
unicamente as funções determinadas por Lei.

9) Insegurança Jurídica

Isso porque o Supremo ainda não decidiu se é Constitucional ou Inconstitucional o


Ministério Público investigar, nesse sentido, se o Supremo declarar o ato como sendo
inconstitucional com efeito ex tunc, geraria um grande prejuízo para a sociedade, dessa forma,
será necessário a modulação do efeito. Por outro lado, no caso dele considerar constitucional
será necessário uma jurisprudência normatizadora estabelecendo as regras do procedimento
investigatório (súmula vinculante).

01/04/2015

TERMO CIRCUNSTANCIADO é mais um instrumento investigatório ao lado do P.A.C. e


do Inquérito Policial, mas antes de falarmos propriamente dito nele, é necessário fazermos
algumas considerações do sistema dos Juizados Especiais Criminais.

SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS - JECRIM

Sistema autônomo, que se distingue do Sistema Processual Penal Comum, por possuir
um fundamento constitucional próprio e princípios específicos que o norteiam, tratando-se de
uma jurisdição especializada para determinado tipo de delito, cujo grande propósito é a
despenalização e adoção de penas alternativas ao invés da pena privativa de liberdade.

 Fundamento Constitucional

Art. 98, CF – A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os


Estados criarão: I – juizados especiais, providos por juízes togados, ou
togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a
execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais
de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e
sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e
o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau; [...]

Aqui nós relativizamos vários dogmas processuais, mas com fundamento


constitucional, pois aqui o propósito é criar uma Justiça mais rápida e informal para casos de

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menor relevância. Para tal a Lei 9099/95 regulamentou o Sistema dos Juizados Especiais
Criminais e trouxe em seu Art. 62 quatro princípios que passamos a discorrer abaixo:

Art. 62, Lei 9099/95 – O processo perante o Juizado Especial


orientar-se-á pelos critérios da oralidade, informalidade, economia
processual e celeridade, objetivando, sempre que possível, a reparação
dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena não privativa de
liberdade.

o Informalidade

Os atos processuais do JECRIM não seguem o rigor formal imposto por Lei, pois existe
a ideia de desburocratizar o ato processual, facilitando-o e assim evitando nulidades no
processo.

o Celeridade Processual

Como os casos julgados não são tão relevantes, o Processo pode se dar ao luxo de ser
mais rápido, visto que eles não demandarão muito esforço.

o Oralidade

O JECRIM prima pelo diálogo, aproximação, humanização dos atos processuais, em


outras palavras ele torna o Processo mais humano e pessoal. A oralidade resolve muita coisa
por gerar espaço para consenso e acordos.

o Economia Processual

Mais resultados com menos atos processuais, atingindo um maior grau de eficiência.

o Consensualidade

É um princípio que não esta no Art. 62, mas esta na doutrina e para nós é o mais
importante. O JECRIM pretende resolver os litígios através da postura civilizada e
comunicativa das pessoas, ou seja, procura resolver os conflitos através do diálogo e acordos.

 Competência

Aqui definimos a matéria que pode ser levada a julgamento do JECRIM, que no caso
são as Infrações Penais de Menor Potencial Ofensivo, determinada tanto pela Constituição
como pela Lei que o regulamentou, nesse sentido, há dois grupos de infrações:

o Contravenções; e
o Crimes com pena máxima cominada de até 2 anos.
 Salvo os casos que possuam rito específico, como os crimes de injúria,
calúnia e os crimes funcionais.

O Art. 88 da Lei 9099/95 é muito importante para todo o sistema processual penal,
pois existe um crime que o JECRIM foi regulamentado de forma a conseguir resolve-lo sem

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

abarrotar o judiciário com processos, que é o caso da Lesão Corporal Leve, que ocorre toda a
hora na nossa sociedade.

Art. 88, Lei 9099/95 – Além das hipóteses do Código Penal e da


legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa
aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.

Este artigo transformou o crime de Lesão Corporal Leve que era de Ação Pública
Incondicionada para Ação Penal Pública Condicionada a Representação. A representação é
elemento da consensualidade, ou seja, representar ou não representar é o fator decisivo de
ter ou não formado um consenso. A negociação da culpa penal verifica-se através da
representação ou não para o crime.

O STF declarou o Art. 88, inaplicável à Lei Maria da Penha utilizando interpretação
conforme a Constituição Federal, nesse sentido, a Lesão Corporal, mesmo que Leve cuja vítima
seja a mulher no ambiente doméstico é crime de Ação Penal Pública Incondicionada.

TERMO CIRCUNSTANCIADO

 Conceito

Instrumento investigatório, que visa apurar e esclarecer infrações penais de menor


potencial ofensivo, com a finalidade de promover a aplicação de institutos despenalizadores,
ou para satisfazer a própria pretensão punitiva do Estado, em último caso.

 Estrutura
o Depoimento do Autor do Fato;
o Depoimento da Vítima;
o Depoimento de Testemunhas;
o Perícia caso seja necessário.

Dessa forma, é possível fazermos um Termo Circunstanciado em meia hora, não existe
relatório, indiciamento, mas pode acontecer de um Termo Circunstanciado se converter em
Inquérito Policial.

Acontecerá conversão do Termo Circunstanciado em Inquérito Policial quando o crime


for de autoria desconhecida, visto que o Termo Circunstanciado não possui espaço
procedimental para investigar a autoria e também quando o fato demandar alta
complexidade probatória, casos em que o Delegado poderá convertê-lo de acordo com sua
livre discricionariedade, sendo, no entanto, ideal que não ocorra.

 Finalidade

Remeter o autor do fato e a vítima para em audiência preliminar realizarem um ou


alguns acordos, imperando o princípio da consensualidade. Justamente por isso que se não

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

sabemos o autor do fato ou se o fato é de alta complexidade demandando investigação, será


necessária a conversão a Inquérito Policial.

É possível dar voz de prisão a qualquer um que pratique qualquer crime, mas, nos
casos de crimes de menor potencial ofensivo, ao chegar a Delegacia o Delegado não lavrará o
auto de prisão em flagrante se houver compromisso do autor em comparecer a audiência
preliminar e mesmo que o Delegado chegue a lavrar o auto ao remetê-lo ao Juiz certamente
ele não o converterá em Prisão Preventiva.

 Audiência Preliminar

o Reparação do Dano

Na audiência estarão presentes o Juiz, o Promotor, o Autor do Fato e a Vítima. O Juiz


inicialmente pergunta a Vítima se possui proposta para acordo e se ela disser que existe e
estipular um valor como reparação civil do dano decorrente do crime (Art. 75 da Lei
9099/95) e o autor concordar com o pagamento, o Juiz declarará imediatamente que o Autor
deve aquele determinado valor a Vítima e que a Vítima renuncia ao direito de representa-lo,
declarando a extinção da punibilidade, ou seja, cada um cede de um lado.

A Decisão que homologa a Reparação Civil do Dano serve como Título Executivo
Judicial Líquido e Certo, nesse sentido, o Juiz resolve dois problemas com uma única decisão,
pois serão dois processos a menos na prateleira, o da esfera penal e o da esfera cível. No caso
do não pagamento, só haverá a possibilidade de execução do Título, mas não de voltar atrás e
representa-lo.

Pode, no entanto, acontecer de não ocorrer Acordo e neste momento entra a atuação
do Ministério Público, fazendo uma proposta de Transação Penal.

o Transação Penal

Neste caso, teremos o Ministério Público propondo um acordo que deverá ocorrer
exclusivamente na esfera penal, ou seja, não serve para suprir o prejuízo da vítima. Nesse
sentido, o Promotor propõe para o autor que ele entregue determinado número de cestas
básicas a uma instituição de caridade como condição para que a Ação Penal não seja proposta,
ou seja, a Transação é pré-processual e ele concordando esta realizada a Transação.

A transação não gera reincidência, mas impede que o sujeito volte a utilizar o JECRIM
durante um período de 5 anos.

Quando o Promotor promove a Transação ele abdica do principio da obrigatoriedade,


mas o réu também abdica do direito a presunção de inocência, ou seja, como dissemos
inicialmente é um sistema que relativiza alguns dogmas sagrados do sistema processual.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Por essa razão que ele não pode ser aplicado para a Lei Maria da Pena, pois caso fosse
possível o marido se sentiria no direito de a cada 5 anos quebrar a cara da mulher visto que
não aconteceria muita coisa.

A sentença que homologa a Transação Penal não faz Coisa Julgada, porque ocorria do
indivíduo fazer a Transação e não cumprir com o compromisso que assumiu. Nesse sentido, os
Juízes e Promotores começaram a colocar uma condição suspensiva a coisa julgada. No
entanto, é proibido atos processuais sob condição, por isso o Supremo em Outubro de 2014
editou a Sumula Vinculante n. 35, que regulamenta o Art. 76 da Lei 9099/95 disciplinando
que a Transação Penal quando homologada, não faz Coisa Julgada Material e o não
cumprimento do acordo possibilita ao Ministério Público oferecer denuncia e, se necessário,
requisitar instauração de Inquérito Policial.

Súmula Vinculante 35, STF – A homologação da transação penal


prevista no art. 76 da Lei n. 9.099/1995 não faz coisa julgada material
e, descumpridas suas cláusulas, retoma-se a situação anterior,
possibilitando-se ao Ministério Público a continuidade da persecução
penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito
policial.

Art. 76, Lei 9099/95 – Havendo representação ou tratando-se de


crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de
arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação
imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na
proposta.

Se ocorrer de não haver acordo nem para a Transação Penal, o Promotor ditará a
denuncia oralmente no termo de audiência e o interessante é que o Autor do fato fica ouvindo
o Promotor relatar a denuncia, dessa forma, o Autor já sai da audiência preliminar citado,
tendo 10 dias para apresentar defesa escrita.

Mesmo proposta a Ação, o Promotor ainda pode oferecer mais uma chance ao agora
Réu no Processo, sendo possível a Suspenção Condicional do Processo.

 Suspensão Condicional do Processo

Aqui o Promotor oferece a possibilidade do Réu cumprir um período de prova que vai
de 2 a 4 anos (Art. 89 da Lei 9099/95) e passado este prazo sem que ela seja revogada,
extingue-se a punibilidade. Se revogada por algum motivo o processo volta a correr
normalmente e o Réu poderá ser condenado. As causas de revogação do SURSIS do Código
Penal revogam também a Suspensão Condicional do Processo.

Art. 89, Lei 9099/95 – Nos crimes em que a pena mínima cominada
for igual ou inferior a 1 (um) ano, abrangidas ou não por esta Lei, o
Ministério Público, ao oferecer a denuncia, poderá propor a suspensão
do processo, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que o acusado não
esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro

Kleber Luciano Ancioto Página 76


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

crime, presentes os demais requisitos que autorizam a suspenção


condicional da pena (art. 77 do Código Penal).

Neste caso, o Promotor esta relativizando o principio da indisponibilidade da ação, é


claro que autorizado por Lei. Por isso, a doutrina entende que o Juiz não pode estabelecer
essa ingerência, pois a Suspensão Condicional do Processo não é direito adquirido do Réu, mas
sim faculdade negocial do Ministério Público.

A lógica deste instituto é tão interessante que o Promotor também não pode oferecer
Suspensão Condicional em Crimes de Ação Penal Privada, visto que neste caso somente a
Vítima é Titular do direito de Ação.

Com isso podemos concluir que o Termo Circunstanciado é um instrumento


fundamental para que se possam aplicar esses institutos estudados acima, que visam a
reparação do dano e a despenalização de delitos de menor potencial ofensivo.

07/04/2015

FASE JUDICIAL DA PERSECUÇÃO PENAL

Há quatro institutos fundamentais dentro dos ramos processuais: Ação, Processo,


Jurisdição e Exceção. Este ano estudaremos Ação e Jurisdição, nesse sentido na aula de hoje
introduziremos o Instituto Fundamental Ação.

O regime de processamento da Ação no Processo Civil é diferente do Processo Penal. A


Ação na esfera civil é apenas um direito, uma mera faculdade processual, Juiz nenhum obriga o
particular a litigar, vigorando o Principio da Disponibilidade da Ação, só litiga quem quer ou
quem aguenta litigar, nesse sentido é o direito privado quem orienta o Direito de Ação, visto
que o particular não é obrigado a litigar. No Processo Penal isso muda completamente, aqui
mais que um direito é um dever, quando a Ação Penal é ajuizada o Ministério Público cumpre
um dever legal que lhe é imposto como Órgão Oficial de Litigância do Estado, e como tal
promove a Ação a Título de Poder Dever, dessa forma, o ajuizamento advém da vontade da
Lei e não de uma vontade pessoal.

 AÇÃO PENAL

o Conceito

Trata-se de um direito dever conferido ao Ministério Público para provocar a prestação


jurisdicional do Estado, fazendo aplicar o Direito Penal ao caso concreto com a finalidade de
solucionar os conflitos de interesses e alcançar a paz social.

A ideia do Direito de Ação é provocar a jurisdição para se alcançar a paz social,


solucionar o conflito de interesse.

o Características

Kleber Luciano Ancioto Página 77


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

1) Trata-se de um Direito, conferido a um Titular, passível de ser exercício;


2) Direito Público, pois o Estado esta na relação jurídica. Ou seja, o Estado Juiz ocupa
uma das posições na Relação Jurídica Processual. O Autor quando exerce o direito
de Ação ele exerce em face do Estado, ou seja, ele exerce um direito oponível ao
Estado e este possui o dever de lhe dar uma resposta, nem que seja, para dizer que
o sujeito não possui o Direito de Ação, ou para dizer que o Direito de Ação está
mal instrumentalizado. De qualquer forma, alguma resposta o Estado Juiz deve
conceder e o que o Autor deseja é que a resposta seja a citação do Réu para que
ele venha ocupar seu lugar na e se defenda, triangularizando a Relação Jurídica
Processual;
3) Direito Público Subjetivo, pois identificamos com exatidão o sujeito de direito que
vai exercê-lo, seja o Órgão Especifico (Ministério Público) ou indivíduo específico
(Vítima);
4) Direito Público Subjetivo Processual, no sentido que o Direito de Ação não é
Direito Material, ou seja, existe independência cientifica e institucional que faz
com que o Direito de Ação não se confunda com o Direito Material;
a. O Direito de Ação é o responsável por formar o primeiro vinculo
processual entre o Autor e Juiz, então ele é um direito processual, que não
se confunde com o direito material que será debatido e integrará o mérito
da ação.
5) Direito Público Subjetivo Processual Autônomo, pois em regra o Direito de Ação é
exercido sem qualquer condicionante, sem qualquer complementação,
autorização de um terceiro, ou seja, o Titular do Direito de Ação não depende de
um terceiro para exercer o direito, sendo, portanto, um Direito Potestativo
Exercido Unilateralmente, haja vista que não se pergunta para o Réu se ele quer
ser processado;
6) Direito Público Subjetivo Processual Autônomo Abstrato, o que significa que ele
não se confunde com o direito material do caso concreto, ou seja, não depende da
concretude do mérito, não está vinculado ao caso concreto, não se vincula ao
mérito da demanda. O Exercício do Direito de Ação é independente da existência
ou não do Direito Material.

Teorias da Ação

I – Imanentista

Inicio do século XIX, na época do Código Napoleônico. Por esta teoria o Direito de Ação
era imanente ao Direito Material, ou seja, estava intrinsecamente ligado ao Direito Material,
não se reconhecendo o Direito Processual como uma ciência autônoma. Mas essa teoria não
durou, sendo contestada pelas Ações Declaratórias da Inexistência do Direito Material.

II – Concrestista (Giuseppe Chiovenda)

Esta teoria defendeu que o Direito de Ação é autônomo, mas ele só existiria se o
resultado da ação fosse favorável. Nesse aspecto, o Direito de Ação continuou atrelado ao
Direito Material.

Kleber Luciano Ancioto Página 78


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

III – Eclética (Enrico Tulio Liebman)

É uma evolução da concretista, mas não chegou a abstrata. Pela teoria eclética existem
dois resultados da Ação, uma em que o Juiz julga a Ação Sem Resolução do Mérito e outra Com
Resolução do Mérito, pouco importando se o resultado beneficia ou não o autor. Nesse
sentido, para essa teoria o Direito de Ação só existiria se o processo gerasse um julgamento
com resolução de mérito, pois se ele sair sem resolução de mérito, não se exerceu o direito de
ação, de modo que o doutrinador defende que as Condições da Ação são requisitos de
existência do Direito de Ação e não de validade.

Aqui, existindo uma Resolução de Mérito, o que significa que todas as condições da
ação estavam presentes, indicava o exercício do Direito de Ação, ainda que o resultado fosse
pela improcedência.

IV – Abstrata

Nesta teoria, há dissociação plena, pouco importa qual o tipo de julgamento, se com
ou resolução de mérito ou se o resultado fosse pela procedência ou improcedência do pedido.
Dessa forma, o que importa é se o sujeito foi ou não a juízo, nesse sentido, ele se confunde
com o Direito de Demandar, havendo uma desvinculação total do Direito Material Quem adota
essa teoria defende que as Condições de Ação, são requisitos de validade do Direito de Ação.

V – Asserção ou Prospecção

O apego a teoria abstrata criou uma deturpação no Sistema Processual brasileiro, pois
a discussão sobre as Condições da Ação passou a ser mais importante que o próprio Direito
Material, gerando injustiças e por isso surgiu esta última teoria equiparando a analise das
Condições de Ação ao Mérito.

Nesse sentido, quando o Juiz declara a impossibilidade jurídica do pedido ele esta
analisando o mérito, o mesmo ocorre com o interesse de agir e a legitimidade, com isso as
Condições da Ação são analisadas em profundidade com base no que está escrito na Petição
Inicial.

o Fundamento Constitucional

O Art. 5°, XXXV, CF normatiza o Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição, que


concede o monopólio da Jurisdição ao Poder Judiciário, mas ao mesmo tempo ele é inerte e
para que ele possa ser ativado depende da Ação, mas apenas o Juiz é titular da função de
resguardar direitos.

Art. 5°, XXXV, CF – a lei não excluirá da apreciação do Poder


Judiciário lesão ou ameaça a direitos;

No plano do Processo Penal o fundamento esta no Art. 129, I, CF, que disciplina que
cabe ao Ministério Público privativamente (e não exclusivamente) o exercício da Ação Penal.
Sendo, portanto, uma cláusula constitucional relativa, pois não só o Ministério Público pode
promover a Ação, visto que o ofendido também pode oferecer queixa.

Kleber Luciano Ancioto Página 79


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Art. 129, CF – São funções institucionais do Ministério Público:


I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma
da lei; [...]

o Diferenças Ação vs Processo

Ação é direito, Processo é instrumento para ambientar o exercício do direito. O Direito


de Ação é exercido em ambiente processual. O processo é instrumento de jurisdição.

Processo é fruto da junção de dois institutos jurídicos: procedimento + relação


jurídica processual, de modo que se faltar um desses elementos não há processo, podendo ser
uma sucessão de atos ou um ato isolado, mas não processo. Nesse sentido, inquérito não é
processo, mas sim um procedimento administrativo.

Procedimento é vinculo legal estabelecido entre atos processuais, previstos na


legislação processual. O procedimento é um fenômeno estático, sendo uma sucessão de atos
processuais inter relacionados que definem o ritmo do Processo e que vai obviamente
legitimar uma decisão final. Alguns dizem até que o procedimento é o aspecto extrínseco do
Processo, basta ler o Código para sabermos quais são os procedimentos, sendo, portanto,
estático e inerte, neste sentido um procedimento sem as partes na verdade não temos nada.

Relação Jurídica Processual é um vinculo entre sujeitos processuais, que exercem


direitos e deveres processuais que só são possíveis serem exercidos no Processo. É a Relação
Jurídica Processual que da vida ao Processo, pois é ela quem permite que as pessoas exerçam
os atos processuais impulsionando-o, ela coloca as pessoas em condição de alternância dentro
do processo exercendo direitos processuais de forma alternada.

O Direito de Ação é exercido em face do Estado Juiz pelo Autor e se tudo estiver certo
o Estado Juiz possui o dever de citar o Réu, pois ele também possui o direito de se defender. O
Juiz prolata uma decisão e Autor e Réu possuem o direito de recorrer, ou seja, há uma
distribuição de direitos processuais entre as partes durante todo o Processo. Em outras
palavras, a Relação Jurídica Processual permite que as partes exerçam direitos e deveres
alternando suas posições, o que permite que o processo se mobilize e ganhe vida e esses
direitos e deveres só ocorrem se houver Processo, visto que não é possível exercer qualquer
direito processual como o de produzir provas ou recorrer, sem a existência de um Processo.

Processo é procedimento animado pela Relação Jurídica Processual, é a Relação


Jurídica Processual que desenvolve o Processo no curso dos procedimentos.

Pode acontecer de termos uma Relação Jurídica Processual episódica sem ter
procedimento, que é chamada de produção antecipada de prova em contraditório na
presença do juiz que possui a função de coordenar as partes permitidos, por exemplo, que
elas perguntem o que quiserem a testemunha, esse procedimento ocorre principalmente
quando a testemunha esta morrendo.

o Classificação das Ações

 Legitimados Ativos

Kleber Luciano Ancioto Página 80


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

O Direito de Ação na sua essência é sempre Público, mas a Ação é chamada de Pública
ou Privada não em razão da sua essência, mas sim em razão do detentor do Direito de Ação,
em outras palavras, em razão dos legitimados ativos. Nesse sentido, se o Titular do Direito de
Ação é um Órgão Público (Ministério Público) a Ação Penal é Pública, ao passo que se o
legitimado for um particular a Ação Penal é Privada.

A Lei Penal estabelece como regra a Ação Penal Pública.

 Provimento jurisdicional

Quanto ao provimento jurisdicional teremos três ações: Ação Penal Condenatória,


Constitutiva e Declaratória.

Em geral, a Ação Penal é Condenatória, o Promotor pede para condenar o réu nas
penas da Lei, ou seja, impor uma sanção penal que significa restringir direito fundamental, que
pode abarcar uma restrição da liberdade ou do patrimônio.

As outras duas são muito raras de acontecer. A Ação Penal Constitutiva é aquela que
constitui ou extingue uma Relação Jurídica, por exemplo, a Ação de Reabilitação (Art. 93, CP),
que serve para suprimir os efeitos da reincidência, ou seja, neste caso a Ação possui o intuito
de desconstituir a situação de reincidência para uma situação primária. Outro exemplo é a
Ação de Extradição, que constitui em face do indivíduo uma nova autoridade judiciaria. Por fim
há a revisão criminal, que serve para desconstituir a coisa julgada na esfera penal.

Ação declaratória é aquela que atesta uma Relação Jurídica Relevante já existente com
intuito de sanar uma crise de incerteza e atribuir eficácia jurídica a isso. Ex. Habeas corpus é
uma Ação Penal Declaratória para atestar uma ilegalidade ou um abuso de poder do Estado,
ou seja, ela não cria nada servindo apenas para reconhecer uma situação já existente.

o Condições da Ação

As Condições da Ação devem ser analisadas no início do Processo, para verificar se o


Autor preenche as condições para o julgamento do mérito. E são matérias de ordem pública,
dessa forma, o Juiz pode tomar conhecimento sem que seja provocado pelas partes, visto que
quando ele analisa as condições ele esta sanando eventuais vícios do Processo para que ele
seja apto para um julgamento de mérito.

 Legitimidade “Ad Causam”

Aqui analisamos se a parte é ou não legítima para exercitar o Direito de Ação. O


Liebdman chama de pertinência subjetiva da causa, ou seja, aqui verificamos se aquela pessoa
pode exercer o Direito de Ação como autor (legitimidade ativa) e se a outra parte possui
condição de suportar na condição de réu (legitimidade passiva).

A legitimidade ativa é dada pela Lei Penal, nesse sentido, se ela não disser nada o
Ministério Público será o legitimado ativo, caso contrario, se ela disser algo isso muda. Já o
legitimado passivo será aquele que praticar a conduta típica, ou seja, o sujeito ativo do crime.
Em outras palavras, no polo passivo constará o autor ou sujeito ativo do fato típico.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

 Interesse de Agir

Aqui avaliamos o interesse jurídico de ir ao juízo, de exercitar o Direito de Ação, nesse


sentido analisamos se o Direito de Ação lhe serve, se ele é útil, necessário e se foi exercitado
adequadamente, essa são as perguntas que devem ser feitas no que tange o interesse de agir,
enfim, o autor possui interesse jurídico ou não em exercitar o direito de ação?

Nesse sentido o interesse de agir está pautado em um trinômio: necessidade,


utilidade e adequação.

 Necessidade do Direito de Ação

A Ação sempre será necessária no Processo Penal, nesse sentido, nunca


encontraremos uma Ação Penal com falta de interesse de agir por desnecessidade, já que só
se aplica a pena via Processo Penal. O Direto Penal depende do Processo Penal para se
materializar, pois ele nunca poderá ser aplicado diretamente ou por outros meios que não o
Processo Penal.

No civil, é possível entrar com uma Ação e ela ser extinta por existir uma via
extrajudicial mais rápida, agora no Penal, por ser via necessária, não veremos nunca uma Ação
ser extinta por desnecessidade.

 Utilidade do Direito de Ação

A Ação precisa possuir uma potencial probabilidade de solucionar o conflito, se isso


não existir, extinguisse também o Direito de Ação por inutilidade da demanda.

No civil seria o caso de entrar com uma Ação de cobrar uma dívida que já esta paga, no
Processo Penal o exemplo seria a prescrição virtual, que não é um fenômeno penal, mas sim
processual, pois ela não aconteceu, sendo um exercício de futurologia processual e nesse
sentido o Juiz extingue o Direito de Ação, visto que a ação será inútil.

 Adequação do Direito de Ação

A inadequação acontece quando se adota um procedimento equivocado frente ao


Direito de Ação. Por exemplo, exercer o Direito de Ação pela via do Habeas corpus para pedir a
condenação do réu, certamente, a via procedimental eleita é inadequada, equivocada e não
permite condenar ninguém. Alias este procedimento jamais legitimaria um resultado
condenatório válido

 Possibilidade Jurídica do Pedido

O pedido deve ser de acordo com o ordenamento jurídico vigente, de acordo com a
Lei.

No Civil, a possibilidade jurídica do pedido se baseia em poder realizar qualquer pedido


desde que a Lei não proíba, dessa forma, os pedidos juridicamente possíveis são obtidos por
exclusão. No Penal só há pedido juridicamente possível se houver tipicidade em abstrato para
a conduta aplicada, ou seja, aqui o parâmetro é o da legalidade estrita.

Kleber Luciano Ancioto Página 82


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Mas cuidado, pois falamos em abstrato e não em concreto, pois se fosse em concreto
ela se referiria ao próprio mérito da ação.

A possibilidade jurídica do pedido diz respeito ao pedido imediato, visto que o pedido
mediato refere-se ao mérito. Nesse sentido, o Juiz avalia o pedido imediato, pois o mediato é o
bem da vida, o mérito e se ele julgar estaria antecipadamente o resultado da lide. Nesse
sentido o juiz avaliará se é possível ou não a condenação a declaração ou a constituição do
direito, com base na existência ou não do tipo penal. Ninguém pode ingressar com um pedido
baseando-se em uma conduta atípica.

08/04/2015

Começaremos a falar o que as Ações Condicionada e Incondicionada possuem em


comum e posteriormente elencaremos as diferenças.

AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA

 Legitimidade  Ministério Público – Art. 129, I, CF

Art. 129, CF – São funções institucionais do Ministério Público: I –


promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; [...]

O Ministério Público possui legitimidade e autonomia para exercitar o Direito de Ação,


já que não sofre nenhuma condicionante legal. No caso da Ação Pública Condicionada só
retira-se a Autonomia do Ministério Público, pois ele ficara na dependência de representação.

 Peça Inicial (Art. 41, CPP)

o Denúncia

A peça inicial que deflagra ambas as Ações é a Denuncia, estando descrita no Art. 41
do CPP.

Art. 41, CPP – A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato


criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado
ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do
crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

 Requisitos

 Descrição do Fato Criminoso

É o requisito mais importante, pois a Denúncia só precisa descrever o fato criminoso e


capitular (classificar) a conduta em um tipo penal. Não há na denúncia um capítulo dos
fundamentos jurídicos como existe na Inicial Civil, isso porque o Promotor esta cumprindo um
dever legal de ofício, ele acusa de forma padronizada, com base em fatos descritos de forma
objetiva, sucinta, coesa.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Nesse sentido, o Ministério Público não abrirá um tópico para discutir a Teoria do
Crime, porque no Processo Penal não se adota a Teoria da Substanciação (necessidade de
estabelecer os fundamentos jurídicos para a pretensão). Alias, somente quando o Promotor
pede para Arquivar é que ele expõe os argumentos jurídicos de forma detalhada, visto que
nestes casos ele estará agindo de forma diferente da normal.

O Promotor se vale da Teoria Indiciaria do Tipo, que diz que todo fato típico é
presumivelmente ilícito e culpável, dessa forma, quem terá que provar a existência de uma
das excludentes de ilicitude ou culpabilidade é a defesa.

O Promotor quando oferece a Denúncia precisa descrever o fato criminoso


detalhadamente, de forma minuciosa, pormenorizada, sendo vedada a acusação genérica.
Isso porque a acusação genérica não traz elementos para a Defesa, não permite o
contraditório, a ampla defesa, atenta contra o próprio Processo, contra o Sistema Acusatório
sendo considerada uma atitude antirrepublicana, pois o indivíduo é acusado de algo que nem
ele sabe e não consegue contrapor pontualmente a acusação.

Denomina-se Acusação Kafkaniana (Frans Kafka – O Processo) ou Genérica, a


acusação que não possui o detalhamento do fato e que gera uma Denúncia Inepta,
imprestável para promover a Ação Penal.

Fazer uma descrição detalhada do fato inclui o Lugar, Tempo, Motivo, Meios de
Execução, Sujeito Ativo e Passivo, descrição se houve concurso e como ele ocorreu, qual o bem
jurídico penalmente tutelado e que foi atacado pela conduta, permitindo que o Réu possa se
defender pontualmente de cada afirmação.

 Rejeição da Denúncia (Art. 395, CPP)

Art. 395, CPP – A denuncia ou queixa será rejeitada quando: I – for


manifestamente inepta; II – faltar pressuposto processual ou condição
para o exercício da ação penal; ou III – faltar justa causa par ao
exercício da ação penal.

I – Inépcia

A Denúncia Genérica padece de um vício denominado de Inépcia. Denuncia Inepta


pode ser corrigida e aditada, pois a decisão de rejeição é processual, só faz Coisa Julgada
Formal e não analisa mérito, sendo perfeitamente possível corrigir a falha e reapresentar a
Denúncia.

O problema, no entanto, pode não estar na Denúncia, mas sim na Ação ou no


Processo, nesse sentido o Juiz pode rejeitar a Denúncia por:

II – Falta de Condições da Ação e Pressupostos Processuais

Por exemplo, no caso da propositura de uma Denúncia realizada pelo Ofendido acerca
de um crime de Ação Penal Pública, deverá ser rejeitada for falta de Legitimidade Ativa. Outro

Kleber Luciano Ancioto Página 84


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

exemplo seria no caso de não existir a representação que é um pressuposto processual nas
Ações Condicionadas a Representação.

Nestes casos a decisão também é meramente processual, podendo ser corrigida.


Nesse sentido, nos exemplos acima o Ministério Público poderá propor a Denúncia e o
pressuposto pode ser suprido.

III – Falta de justa Causa

Como já vimos há três elementos da justa causa: tipicidade, punibilidade e


viabilidade, ausente um destes elementos é sinal que o Juiz já deveria ter trancado o
Inquérito, mas se por algum motivo isso não ocorreu e o Promotor oferecer a denúncia com
falta de justa causa, o Juiz terá que rejeita-la.

Neste caso, falta de justa causa por tipicidade e por punibilidade faz Coisa Julgada
Material, ou seja, o Juiz declara a extinção da punibilidade pela falta de justa causa da ação.

Agora a falta de viabilidade na justa causa é o mesmo que insuficiência de prova,


então é possível suprir essa insuficiência, bastando que apareça uma prova nova que
acarretará o recebimento da Denúncia e não de rejeição.

 Princípios

o Obrigatoriedade

O Ministério Público é obrigado a propor a Ação, sendo um dever legal. Por isso que
este princípio também é denominado Princípio da Legalidade. A exceção aqui é a transação
penal, que é também chamada de Princípio da Discricionariedade Regrada, mas autorizado
por Lei.

o Indisponibilidade

O Ministério Público não pode desistir da Ação Penal que está em curso (Art. 42, CPP).
A exceção é a SURSIS Processual (Suspensão Condicional do Processo – Art. 89 do JECRIM).

Art. 42, CPP – O Ministério Público não poderá desistir da ação penal.

Art. 89, Lei 9099/95 – Nos crimes em que a pena mínima cominada
for igual ou inferior a 1 (um) ano, abrangidas ou não por esta Lei, o
Ministério Público, ao oferecer a denuncia, poderá propor a suspensão
do processo, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que o acusado não
esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro
crime, presentes os demais requisitos que autorizam a suspenção
condicional da pena (art. 77 do Código Penal).

o Intranscendência

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Limita o polo passivo da demanda apenas em relação aos que estão envolvidos com o
crime. Nesse sentido, só serão Réus aqueles indivíduos que estão relacionados com o crime,
do ponto de vista causal e volitivo, concepção essa ligada a Teoria Monista. Só pode responder
no Processo aquele que de alguma forma contribuiu com o crime.

Por isso, não há intervenção de terceiro, ou seja, não existe possibilidade de alguém
entrar como um terceiro no polo passivo da Ação Penal.

AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO

 Representação

Aqui o Promotor só pode representar no Processo quando ele é liberado pela


representação.

É um instituto legal criado para suprimir a autonomia do Direito de Ação conferido ao


Ministério Público, nesse sentido, ele depende da representação como ato liberatório para
poder exercitar o Direito de Ação que pertence ao próprio Ministério Público. O que acontece
é que a Lei Penal retira do Ministério Público a autonomia para exercitar um direito, mas a
legitimidade não é retirada e isso ocorre por uma questão de política criminal.

O que orienta uma Política Criminal nestes termos é o: Escândalo do Processo


(Streptus judicii), onde o Processo ao invés de proteger o bem jurídico ele amplia o dano pelo
escândalo que ele pode causar.

A representação também pode ser uma forma de se estabelecer um acordo através da


barganha, pois a vítima renúncia ao direito de representação com o intuito de conseguir a
reparação do dano.

 Natureza Jurídica

Condição de procedibilidade, ou seja, sem a representação, o Processo é nulo.


Podemos dizer que é quase um pressuposto processual.

 Forma

A forma é livre, mas deve ser realizada por escrito não sendo exigido nenhuma
formalidade específica. Precisa ser por escrito para que a representação fique
documentalizada nos autos. A representação é um ato jurídico de manifestação de vontade
em liberar o Ministério Público, para que ele ofereça a Denúncia. Uma simples cláusula no B.O.
(Boletim de Ocorrência) já supri a representação.

 Eficácia Objetiva da Representação

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

A representação é um ato indivisível, o que significa que ela ocorre em face de um


fato, não sendo possível escolher contra quem ira representar. Porque se pudesse escolher
poderia gerar uma quebra de isonomia.

Em outras palavras, não se pode escolher contra quem a persecução irá acontecer,
pois a persecução é padronizada, nesse sentido se representa em face de um fato e não das
pessoas.

 Co-titularidade do Direito de Representar (Art. 34, CPP)

A co-titularidade do Direito de Representar significa que o Direito de Representar pode


ser do ofendido e do seu representante legal.

Art. 34, CPP – Se o ofendido for menor de 21 (vinte e um) e maior de


18 (dezoito) anos, o direito de queixa poderá ser exercido por ele ou
por seu representante legal.

Temos que se interpretar o Art. 34, CPP sob a égide do Art. 5° do CC vigente, pois a
redação esta com base no CC/16.

Nesse sentido, antes de completar 16 anos apenas o representante legal pode


representar pelo ofendido, entre os 16 e 18 ambos podem representar e neste período é que
surge a hipótese de co-titularidade e após os 18 anos apenas o ofendido é que pode
representar.

Se entre os co-titulares houver divergência acerca da representação, bastará que um


deles queira representar para liberar o Ministério Público, ou seja, prevalece a vontade una de
quem deseja representar.

Sumula 594, STF – Os direitos de queixa e de representação podem


ser exercidos, independentemente, pelo ofendido ou por seu
representante legal.

 Prazo para Representação

Seis meses do conhecimento da autoria (alias esse é um folego que o Delegado possui
para investigar o crime). Deixando passar o prazo ocorre Decadência do Direito de
Representar com Extinção da Punibilidade, ou seja, o prazo é fatal, peremptório e
improrrogável.

Nesta situação, o Juiz rejeitará a Denúncia por falta de justa causa por extinção de
punibilidade, sendo, portanto, uma Decisão de Mérito.

 Retratação da Representação

Kleber Luciano Ancioto Página 87


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

A retratação é possível desde que seja anterior ao oferecimento da Denúncia (Art.


25, CPP), em outras palavras, com o oferecimento da Denúncia, preclui o direito da vítima de
se retratar, porque o Ministério Público esgotou o exercício de Direito de Ação.

Art. 25, CPP – A representação será irretratável, depois de oferecida a


denúncia.

 Retratação da Retratação

Equivale a uma nova representação e é possível desde que não tenha ocorrido a
Decadência.

14/03/2015

RETRATAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO NA LEI MARIA DA PENHA

 Lei da Violência Doméstica – Lei Maria da Penha

Art. 16, Lei 11340/06 – Nas ações penais públicas condicionadas à


representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a
renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denuncia e
ouvido o Ministério Público.

Dessa forma o artigo acima criou um procedimento judicializado para que a mulher
vítima de violência doméstica renunciasse ao direito de representar. Isto significa que a mulher
vítima de violência doméstica quando pretendesse se retratar da representação ou abdicar-se
do direito de representar deveria fazer na presença do Juiz em uma audiência designada para
tanto com a participação do Ministério Público.

Essa audiência pode ocorrer até o recebimento da Denúncia, ou seja, a Lei deu uma
etapa processual a mais para a mulher refletir se renunciaria ou não a representação. Se optar
por renunciar a representação o Juiz nem recebe a Denúncia, declarando extinta a
punibilidade, agora se ela decide mantê-la ele a receberá e o Processo prosseguirá
normalmente.

Porém desde 2006 verifica-se que o referido artigo não alcançou os objetivos
esperados e apenas tornou o Processo Penal mais burocrático, pois as mulheres continuaram
renunciando ao direito de representação, aumentando a impunidade o que começou a
perturbar o Ministério Público Federal.

Nesse sentido o MPF pelo então PGR ingressou com a ADI 4424-DF.

 ADI 4424-DF

Foi a primeira vez que o Supremo utilizou o Processo Penal como inclusão social da
mulher.

Kleber Luciano Ancioto Página 88


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

o Fundamentos

A ADI 4424-DF foi impetrada no STF buscando que o Art. 16 da Lei 11340/06 fosse
declarado inconstitucional, pois a regulamentação presente nesse artigo estava gerando
impunidade, como vimos acima e, portanto, ferindo a dignidade da pessoa humana do sexo
feminino que fica refém da violência doméstica e violando também a isonomia material, pois
exige da mulher uma postura pró-ativa que muitas vezes ela não consegue por questões
culturais e históricas, em outras palavras a mulher não consegue representar da mesma forma
como o homem.

Do ponto de vista Processual, há violação do devido processo substancial, como


postulado normativo processual, na sua perspectiva a vedação a infra-proteção ou proteção
deficiente, pois toda vez que uma norma processual é inefetiva para aplicar o Direito Penal ela
não guarnece os bens jurídicos de que deveria tutelar.

Essa Petição não foi julgada nem procedente e nem improcedente e o STF manteve o
Art. 16 da Lei 11340/06, porém conferiu uma interpretação a ele em consonância com os
dogmas constitucionais que acabamos de mencionar.

Nesse sentido, o Art. 41 da Lei da Violência Doméstica disciplina que não se


aplicam aos casos regulados pela referida Lei os elementos discriminalizantes da Lei 9099/95,
ou seja, ela proíbe expressamente a Transação Penal e o SURSIS do Processo, sendo uma trava
para a aplicabilidade dos institutos discriminalizantes para aquele que pratica lesão corporal
leve contra a mulher dentro de casa.

Só que a Lei da Violência Doméstica não mencionou nada sobre o Art. 88 da Lei
9099/95 que alterou a Ação Penal para o Crime de Lesão Corporal Leve de Pública
Incondicionada para Condicionada a Representação, cujo intuito é ser utilizado como barganha
para uma eventual reparação do dano a vítima.

Art. 88, Lei 9099/95 – Além das hipóteses do Código Penal e da


legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa
aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.

E para suprir a deficiência do Legislador, o Supremo determinou que a interpretação


dada ao Art. 41 da Lei da Violência Doméstica deve ser extensiva para também vedar a
aplicação do Art. 88 da Lei 9099/95 nos casos regulados pela Lei da Violência Doméstica e,
dessa forma, no que diz respeito ao Art. 16 da Lei da Violência Doméstica acabou ficando
sem aplicabilidade, visto que, o crime passou a ser de Ação Penal Pública Incondicionada.

Na prática, o Supremo tornou a Lesão Corporal Dolosa Leve, crime de Ação Penal
Pública Incondicionada, quase que legislando, pois ele modificou a legitimidade ativa do
Direito de Ação, dando ampla legitimidade ao Ministério Público e no Acordão o Ministro
relata que as Mulheres em sua grande maioria são pobres e dependentes do companheiro e,
portanto, não conseguem representar contra eles, nesse sentido, esperar da mulher uma
postura ativa é assumir uma postura discriminatória.

Kleber Luciano Ancioto Página 89


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

No entanto, essa decisão é válida apenas com relação a Lesão Corporal, o que significa
que se a mulher for estuprada dentro de casa, o crime ainda é de Ação Pública Condicionada a
Representação e é ela que deverá decidir se sua imagem será ferida ou não, aplicando-se a
regra geral do Código Penal.

Adendo: O Supremo assumiu o grau máximo de ativismo judicial, porque usou o


Processo Penal como elemento de inclusão social. Ele não figurou apenas como legislador
negativo, mas sim positivo, evoluindo enquanto jurisprudência, pois caberia a Lei Penal decidir
sobre a legitimidade ativa. O Supremo exerceu Jurisdição Constitucional Contra Majoritária,
porque assumiu a posição em favor de uma minoria social excluída que são as mulheres
pobres agredidas no ambiente doméstico, pois a democracia não pode ser uma ditadura da
maioria, que a pretexto de representar o povo, viola direitos fundamentais.

AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA A REQUISIÇÃO DO MINISTRO DA JUSTIÇA

Aqui o Ministério Público continua sendo o Titular do Direito de Ação, a peça continua
sendo a Denúncia e perdura os princípios da obrigatoriedade, indisponibilidade e da
intranscedencia vistos anteriormente, no entanto, ele (Ministério Público) depende de um ato
liberatório do Ministro da Justiça para que ele possa exercitar o seu Direito de Ação.

 Requisição

o Conceito

É condição de procedibilidade para que o Ministério Público ingresse com a Ação


Penal, semelhante a Ação Penal Pública Condicionada a Representação, mudando apenas a
forma como é realizado o ato liberatório.

o Forma

A requisição é pública, dessa forma, deve seguir a forma legal e expressar a vontade do
legislador.

 Eficácia

É liberatória, ou seja, libera o Ministério Público para ingressar com a Ação.

A requisição também é indivisível tal qual é a representação, liberando a Persecução


Penal para todos os autores.

o Hipótese de Cabimento

Quando a Lei Penal disciplinar que o crime depende de representação do Ministro da


Justiça, ou seja, dependente de um ato politico, estaremos diante desse tipo de representação.
Vejamos o exemplo abaixo:

Kleber Luciano Ancioto Página 90


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Art. 145, Parágrafo único, CP – Procede-se mediante requisição do


Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste
Código [...]

Art. 141, CP – As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de


um terço, se qualquer dos crimes é cometido: I – contra o Presidente
da República, ou contra chefe de governo estrangeiro; [...]

Dessa forma, crimes contra a honra do Presidente da República ou contra chefes de


Estados Estrangeiros, dependem de representação do Ministro da Justiça, sendo, portanto, um
ato público de natureza política.

Outro exemplo que podemos elencar são os crimes praticado por estrangeiros contra
brasileiros fora do país, que também dependem de requisição do Ministro da Justiça, sendo
está uma condição para aplicação da extraterritoriedade da Lei Penal brasileira.

Nestes casos a Lei Penal confere ao Ministro da Justiça o poder de avaliar a situação
política em face ao Processo, ou seja, há uma politização do Direito de Ação.

Não há prazo decadencial para que o Poder Público exerça seu Direito de
Representação, visto que, a decadência é algo que ocorre para o particular e nunca para o
Poder Público, nesse sentido, a requisição pode ser realizada em qualquer momento, salvo se
o crime estiver prescrito.

 Retratabilidade da Requisição

A primeira corrente do Tourinho, minoritária, diz que a Requisição é irretratável, pois é


um ato público que expressa a vontade da Lei e não haveria como voltar atrás, dessa forma
uma vez emitido o ofício requisitório não haveria retratação.

Por outro lado, a doutrina majoritária entende que é possível retratação, visto que é
possível revogar qualquer ato do Poder Público desde que exista interesse público. Nesse
sentido, também seria possível a retração da retratação, desde que não tenha ocorrido
prescrição do crime.

 Vinculação do Ministério Público

O Ministério Público é detentor do Direito de Ação, sendo este um direito soberano,


portanto, a Requisição é ato meramente liberatório tal qual é a representação, nesse sentido,
ele (Ministério Público) não fica vinculado e pode inclusive pedir o arquivamento, caso julgue
incabível a propositura da Ação Penal. Não é dado ao Ministro da Justiça o Poder de forçar o
Ministério Público a ingressar com a Ação Penal, ao passo que a Requisição não é ordem, mas
sim apenas um ato liberatório.

22/04/2015

AÇÃO PENAL PRIVADA

Kleber Luciano Ancioto Página 91


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

 Titularidade

Na Ação Penal Privada há uma mudança na Titularidade do Direito de Ação


(Legitimado Ativo), pois aqui a titularidade não é mais do Ministério Público, mas sim do
Ofendido ou seu Representante Legal, denominado Querelante.

Nesse sentido, é o querelante que ingressara com a Ação Penal, por meio da Queixa
Crime. O fundamento constitucional esta no próprio Art. 129, I, CF que normatiza que cabe ao
Ministério Público Privativamente e não Exclusivamente promover a Ação Penal, ou seja, a
Constituição não faz da Ação Penal um monopólio ao Ministério Público, mas apenas prioriza a
ele o Direito de Ação, o que permite por óbvio que a Lei Penal transfira o Direito de Ação
(Direito de Queixa).

Dessa forma, é o Legislador Penal quem escolhe para quais crimes conferira,
excepcionalmente, o direito de Ação ao ofendido e, nestes casos o Direito de Ação é
transferido integralmente ao particular, enquanto que na Ação Penal Pública Condicionada a
Representação, o Direito de Ação continua sendo do Ministério Público, retirando-lhe apenas a
autonomia para ingressar com a Ação.

O que leva a Lei Penal a criar categorias de crimes cuja Ação Penal é Privada é a Política
Criminal de buscar preservar a imagem da vítima, evitando o strepitus judicii (escândalo do
processo). Ou seja, o Processo pode, em vez de resolver problema, causar maiores danos a
vítima (prejudicando ainda mais sua imagem, honra, etc.), por isso os três crimes contra a
honra são de Ação Penal Privada, em outras palavras, o Legislador precisa dar ao Particular a
possibilidade de determinar se suporta ou não a Ação. Nesse sentido a Ação Pública
Condicionada a Representação possui o mesmo objetivo.

Outra razão é o caráter patrimonial do delito, sendo, portanto, disponível e nestes


casos o que pode interessar a vítima é a reparação do dano e se o indivíduo não quiser
apresentar queixa não haveria muito problema, podendo inclusive utilizar o direito de
representação ou de apresentar queixa como elemento de barganha para conseguir a
reparação.

 Substituição Processual (Legitimação Extraordinária)

A Ação Penal Privada é hipótese de substituição processual da parte por legitimação


extraordinária, já que o Particular ingressa em juízo para defender interesse do Estado.

Em outras palavras o Particular ingressa em juízo em nome próprio para defender


interesse de terceiro (Estado), visto que, é condição sine qua non para que o Estado exerça seu
direito de jus puniendi. Lembrando que a Legitimação Extraordinária só é possível quando a Lei
autoriza.

Já na Ação Penal Pública o Ministério Público é detentor tanto do Direito de Ação,


como do Direito de Punir do Estado, dessa forma, teremos uma situação em que o próprio
Ministério Público ingressa com Ação em nome próprio para satisfazer interesse próprio
(Legitimação Ordinária – que é a regra).

Kleber Luciano Ancioto Página 92


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

o Persecutio criminis in juditio

Dessa forma o persecutio criminis in juditio é transferido ao Particular que escolherá se


vai ou não exercer o Direito de Ação.

o Jus puniendi

Já o Jus puniendi, permanece com o Estado.

Resumindo a Lei penal transfere ao particular apenas o Direito de Ação e mais nada,
ou seja, não transfere o Jus puniendi por tratar-se de atividade Soberana, exclusiva do Estado.

O Jus puniendi não é concedido ao Particular nem por via reflexa, ou seja, nem que ele
queira influenciar ele não poderá.

A maior prova de que não é possível transferir o Jus puniendi é que não se permite a
negociação da aplicação da pena nas Ações Penais Privadas, ou seja, o Particular não pode
barganhar uma pena, porque ele não é detentor do poder punitivo, o que ele pode na melhor
das hipóteses é desistir da ação, mas não pode transacionar o direito do Estado em punir.

Já o Ministério Público pode transacionar quando a Lei permitir, como é o caso dos
casos levados ao JECRIM cujas Ações são Públicas Condicionadas a Representação, o que
permite inclusive que o Particular tente anteriormente barganhar seu direito de
representação.

Dessa forma, somente o Ministério Público pode barganhar o Jus puniendi quando a
Lei permitir, como no caso do Art. 76 do JECRIM.

Art. 76, Lei 9099/95 – Havendo representação ou tratando-se de


crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de
arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação
imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na
proposta.

 Princípios

o Oportunidade

O Direito de Ação conferido ao particular é uma mera faculdade processual, ou seja,


uma mera opção do ofendido ou do seu representante legal. Não há como forçar o Particular a
ingressar com a Ação, pois o princípio da oportunidade é um desdobramento da autonomia da
vontade, nesse sentido, não há ordem judicial alguma que o obrigue a exercer direitos, dessa
forma, ninguém é obrigado a litigar enquanto Particular.

Em contra partida, quando o Ministério Público ingressa com Ação Penal Pública ele
cumpre a vontade da Lei que lhe impõe o dever de acusar, que não pode ser transplantado
para a realidade do ofendido.

Kleber Luciano Ancioto Página 93


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Nesse sentido, se o Ministério Público propor a Ação no lugar do particular este


procedimento será nulo, pois ele não é Titular do Direito de Ação, o que significa que se o
Particular não exercitar seu Direito de Ação o Ministério Público não poderá fazer nada.

Em contrapartida, sempre que a Ação Penal Privada for proposta o Ministério Público
atuará como custos legis (guardião/fiscal da lei), ou seja, ele não será parte, mas será um
interveniente obrigatório. O Ministério Público precisa ficar atento, pois esta acontecendo a
potencial aplicação do Jus puniendi e ele possui a função de fiscalizar a concretização do Poder
de Punir do Estado.

Nesse sentido, o Particular necessita de um fiscal, porque ele pode tentar manipular o
Jus puniendi no ato de exercitar o Direito de Ação, que será explicado mais abaixo.

o Disponibilidade

O Particular pode cansar de litigar e desistir da Ação, podendo fazer isso


expressamente ou simplesmente abandonando-a, isso é possível porque se ele não é obrigado
a ingressar com a Ação, também não é obrigado a continuar com ela.

Nesse sentido, o Ministério Público não pode tomar o lugar do Particular porque como
já dissemos o Direito de Ação Não é dele, salvo uma exceção que é o caso da Ação Penal
Privada Subsidiária da Pública, porque neste caso o Ministério Público sempre foi o legitimado,
tendo sido assumido pelo Particular pela inércia do próprio Ministério Público.

O Querelante pode conceder Perdão se ele quiser, mas o Querelado não é obrigado
aceitar, pois às vezes ele vai querer provar categoricamente sua inocência, evitando a
possibilidade de ser processado posteriormente no campo cível, por um dano sofrido pelo
Autor, visto que a sentença penal faz coisa julgada no civil quando ela é de mérito.

Até este ponto, o regime aplicado a Ação Penal Privada é muito parecido com o
previsto para os procedimentos civis, mas eles se distanciam por conta do ultimo principio
estudado abaixo.

o Indivisibilidade

Para evitar a ilegalidade acusatória, a manipulação do Direito de Ação para fins e


interesses escusos ou particulares é que temos o principio da indivisibilidade da Ação Penal
Privada, fazendo às vezes do Princípio da Obrigatoriedade do Ministério Público para o
Particular. Nesse sentido, ele serve para padronizar o Direito de Ação nos termos da Teoria
Monista.

Dessa forma, no Processo Civil o Particular pode escolher o Réu enquanto que no
Processo Penal não, pois ele esta pautada na Teoria Monista (Art. 29, CP).

Art. 29, CP – Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide


nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

Nesse sentido, ou se move a Ação contra todos envolvidos no crime ou não se move
contra ninguém, não sendo possível fragmentar o Direito de Ação.

Kleber Luciano Ancioto Página 94


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

O princípio da indivisibilidade possui como fiscal o Ministério Público que o faz como
Custos legis. Nesse sentido, não é possível escolher o réu, pois se isso acontecer o Ministério
Público deve pedir a nulidade da Ação, pois não há violação apenas da Teoria Monista, mas
violação do Principio da Isonomia Substancial e a Ação Penal enquanto instrumento
republicano estaria sendo utilizada para satisfazer interesses particulares (Art. 48, CPP).

Art. 48, CPP – A queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará
ao processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua
indivisibilidade.

Nesse sentido, se o Ministério Público perceber a divisibilidade da Ação deverá opinar


para que o querelante adite o polo passivo da demanda para que ele venha a conter todos os
autores do crime, sob pena de nulidade.

 Peça Inicial

o Queixa Crime

Queixa crime é a peça inicial da Ação Penal Privada, tal qual a Denuncia é da Ação
Penal Pública e, portanto, guarda os mesmos requisitos legais, presentes no Art. 41 do CPP.

 Requisitos Legais (Art. 41, CPP)

Art. 41, CPP – A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato


criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificarão do acusado
ou esclarecimentos pelos quais se possa identifica-lo, a classificação do
crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

Ou seja, há necessidade da narrativa detalhada do fato, o que significa que não são
aceitas acusações genéricas e, caso isso ocorra a queixa será considerada inepta.

 Particularidades (Art. 44, CPP)

Art. 44, CPP – A queixa poderá ser dada por procurador com poderes
especiais, devendo constar do instrumento do mandato o nome do
querelante e a menção do fato criminoso, salvo quando tais
esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser
previamente requeridas no juízo criminal.

A diferença aqui é que a queixa crime é uma peça assinada por advogado e não pelo
Promotor. Dessa forma, ela é fruto da capacidade postulatória do advogado de ir a juízo
deduzir a pretensão punitiva (que é do Estado).

O Poder que o Promotor possui de elaborar a Denuncia decorre da Lei e o Poder que o
Advogado possui de elaborar a Queixa Crime decorre do contrato (Mandato), nesse sentido o
poder do Promotor é legal e do Advogado é contratual.

O vinculo contratual faz o advogado ficar mais vulnerável ao exercer sua função
acusatória, no sentido de poder ser responsabilizado se realizar uma acusação indevida, dessa

Kleber Luciano Ancioto Página 95


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

forma, o Art. 44 do CPP traz uma exigência formal em defesa do advogado ao exigir que na
procuração outorgada ao advogado há a necessidade de conter a narrativa do fato criminoso
em seu corpo, pois caso contrário a Queixa Crime é considerada nula, como se não existisse
um advogado assinando.

O advogado precisa se proteger para não responder por Denunciação Caluniosa e


assim estabelece-se um limite para o Poder Acusatório que lhe foi conferido. Alguns
advogados além dessa cautela também fazem com que o cliente assine junto com ela a Queixa
Crime, dando anuência de que a Queixa esta de acordo com o que ele relatou.

 Rejeição da Queixa (Art. 395, CPP)

Art. 395, CPP – A denuncia ou queixa será rejeitada quando: I – for


manifestamente inepta; II – faltar pressuposto processual ou condição
para o exercício da ação penal; ou III – faltar justa causa par ao
exercício da ação penal.

Desta forma, são as mesmas hipóteses de rejeição da denuncia: inépcia, falta de


condição de ação ou pressuposto processual e falta de justa causa.

 Decadência do Direito de Queixa

Tanto quanto na representação na queixa também ocorre a decadência. Nesse sentido


o prazo decadencial é de 6 meses para fulminar o Direito de Queixa, cujo termo inicial é o do
conhecimento da autoria.

Antes de vencer o prazo decadencial há a necessidade apenas do ajuizamento


(oferecimento) da queixa, ou seja, não há necessidade do recebimento.

Esse prazo decadencial é fatal, improrrogável e ininterrupto. Ocorrendo a decadência


o Juiz deverá rejeitar a Queixa Crime, por falta de justa causa por extinção da punibilidade.

Se não houver ocorrido a prescrição civil de 3 anos da data do fato, é possível ainda o
ajuizamento civil para a reparação do dano. Ou seja, a decadência não possui o condão de
enfrentar o mérito, ou seja, não há julgamento de mérito, apenas se declara a impossibilidade
de se punir, então uma decisão que reconhece a extinção da punibilidade não faz coisa julgada
na esfera civil podendo ser rediscutido judicialmente nesta esfera.

05/05/2015

MODALIDADES DE AÇÃO PENAL PRIVADA

Até agora estávamos estudando a Ação Penal Privada Propriamente Dita, que é a
regra, hoje vamos diferencia-la das outras duas.

 AÇÃO PENAL PRIVADA PROPRIAMENTE DITA

Kleber Luciano Ancioto Página 96


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Refere-se a regra em matéria de Ação Penal Privada caracterizando-se por possuir


ampla possibilidade do exercício do direito de queixa, o que significa que a queixa pode ser
proposta pelo ofendido ou seu representante legal, havendo também a possibilidade de
cotitularidade nos casos em que a vítima possua entre 16 e 18 anos e por fim a possibilidade
dos sucessores exercerem o direito de queixa, nas hipóteses em que a vítima venha a óbito,
para esta última possibilidade a ordem de invocação hereditária do direito de queixa é do
Cônjuge, Ascendente, Descendente e Irmãos (CADI), que esta prevista no Art. 31 do CPP.

Art. 31, CPP – No caso de morte do ofendido ou quando declarado


ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou prosseguir
na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

A Súmula 594 do STF aduz que quando houver coletividade ou continuidade do


direito de queixa ou representação prevalece a vontade do que querer ingressar com o direito
de Ação.

Súmula 594, STF – Os direitos de queixa e de representação podem


ser exercidos, independentemente, pelo ofendido ou por seu
representante legal.

Em resumo, há uma liberalidade da Lei para facilitar o Direito de Queixa, permitindo-se


inclusive a atribuição de procuração para que um terceiro exerça o Direito de Queixa em nome
da vítima.

 AÇÃO PENAL PRIVADA PERSONALÍSSIMA

Neste caso, há uma maior restrição legal do Direito de Queixa, pois aqui ele é
intrasferível, ou seja, somente o ofendido e mais ninguém pode exercê-lo, não existindo co-
titularidade. Por isso, nas hipóteses em que a vítima for menor, o termo inicial para a
contagem do prazo de decadência não será o do conhecimento da autoria, mas sim, o
momento em que ela completar 18 anos e possa ingressar com Ação Penal.

O que leva o Legislador a tomar esta precaução é a possibilidade de um Escândalo do


Processo ainda maior. Há apenas um único crime cuja Ação Penal Privada é Personalíssima,
previsto no Parágrafo único do Art. 236, CP que disciplina o crime de Induzimento Essencial
e Ocultação de Impedimento (matrimonial).

Art. 236, CP – Contrair casamento, induzindo em erro essencial o


outro contraente, ou ocultando-lhe impedimento que não seja
casamento anterior: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois)
anos. Parágrafo único. A ação penal depende de queixa do
contraente enganado e não pode ser intentada senão depois de
transitar em julgado a sentença que, por motivo de erro ou
impedimento, anule o casamento.

 AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA

Kleber Luciano Ancioto Página 97


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

A palavra subsidiaria deve ser vista como complemento e não como substituição. Esta
Ação, antes de tudo é Clausula Pétrea, estando prevista no Art. 5°, LIX, CF e Art. 29, CPP e
acaba por relativizar a regra do Art. 129, I, CF, tutelando o direito do indivíduo de não
conviver com a impunidade diante da inércia do Ministério Público.

Art. 5°, LIX, CF – será admitida ação privada nos crimes de ação
pública, se esta não for intentada no prazo legal.

Art. 29, CPP – Será admitida ação privada nos crime de ação pública,
se esta não for intentada no prazo legal, cabendo ao Ministério
Público, aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva,
intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova,
interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do
querelante, retomar a ação como parte principal.

Art. 129, CF – São funções institucionais do Ministério Público: I –


promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; [...]

Dessa forma, essa Ação é o mecanismo (remédio) constitucional do controle do


Principio da Obrigatoriedade, que pode ser exercido pela vítima do crime ou seu representante
legal.

Nesse sentido, após o Inquérito Policial ser relatado para o Ministério Público, se ele
ficar inerte por 15 dias sem se manifestar, ocorre uma ampliação momentânea da legitimidade
ativa da Ação Penal que perdura por 6 meses. Sendo assim, o termo inicial para a ampliação de
legitimidade é a cessação do prazo de 15 dias para que o Ministério Público tome alguma
providencia, comprovando sua inercia.

Resumindo:

Inquérito Policial  Ministério Público  Após 15 dias Inerte 


Legitimidade Ativa passa a ser do Ministério Público e do Ofendido
e/ou Representante Legal  Após 6 meses ocorre a decadência  E a
legitimidade volta a ser apenas do Ministério Público.

Dessa forma, não há uma substituição da legitimidade, havendo na verdade, uma


ampliação momentânea da legitimidade que dura 6 meses e depois decai. Para o Ministério
Público não há decadência, apenas Prescrição, dessa forma, o Ministério Público nunca deixa
de ser o legitimado ativo nos crimes cuja Ação Penal é Pública, visto que esta é uma
determinação constitucional.

E isso nos leva ao raciocínio subsequente de que o Ministério Público pode entrar na
Ação em qualquer fase do Processo, para praticar qualquer ato que ele praticaria se tivesse
ingressado com a Ação. E o Poder do Ministério Público é tanto, que ele pode inclusive
repudiar a Queixa Subsidiária e oferecer uma Denúncia Substitutiva, pode aditar a queixa, ou
ainda atuar em litisconsorte com o querelante, pois aqui continua vigorando o Princípio da
Obrigatoriedade e Indisponibilidade do Ministério Público. Nesse sentido, a qualquer tempo
dentro do Estado de Direito é bem vindo o cumprimento da Lei pelos Órgãos Públicos.

Kleber Luciano Ancioto Página 98


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Sendo assim, a Denúncia Substitutiva é aquela que repudia a Queixa Subsidiária na


Ação Penal Privada Subsidiária da Pública.

Com relação ao Ministério Público ficar inerte, significa que ele não fez nada, pois caso
ele peça o arquivamento, em regra, não caracteriza inércia, visto que, apenas o arquivamento
implícito (objetivo ou subjetivo) implica em inércia do Ministério Público. O arquivamento
implícito ocorre quando o Ministério Público deixa de acusar todos os crimes ou todos os
coautores do crime, mas também não pede para arquivar ou para realizar novas diligências,
dessa forma, nestes casos há a possibilidade da Ação Penal Privada Subsidiária da Pública. Em
outras palavras, no que se refere a parcela cujo Ministério Público permaneceu inerte, abre-se
a possibilidade da legitimidade ativa do ofendido e caso ele ingresse com a Queixa Crime o Juiz
mandará juntar os Processos, visto que haverá um litisconsorte passivo (réus) e unitário (pois
se condenar um condena-se todos).

A Lei 12850/13 buscando desarticular Organizações Criminosas, traz a hipótese de


beneficiar o colaborador (delator) de duas maneiras: com o perdão judicial ou através de um
acordo realizado com o Promotor de Justiça que deve ser homologado pelo Juiz. O principal
efeito do acordo, é que o Promotor deixa de oferecer denuncia, sendo uma das raríssimas
exceções ao Principio da Obrigatoriedade (Art. 4°, §4° da Lei das Organizações
Criminosas), ou seja, o Ministério Público estará barganhando o seu dever legal com o intuito
de desarticular a Organização Criminosa.

Art. 4°, §4° da Lei 12850/13 – Nas mesmas hipóteses do caput, o


Ministério Público poderá deixar de oferecer denúncia se o
colaborador: I – não for o líder da organização criminosa; II – for o
primeiro a prestar efetiva colaboração nos termos deste artigo.

Este acordo é muito semelhante à Transação Penal, no entanto, aqui o delito é de alta
periculosidade. Na elaboração do acordo mitiga-se o direito à autodefesa, já que a colaboração
precisa ser irrestrita, bem como o Princípio da Obrigatoriedade e caso o Juiz não concorde em
homologar o acordo ele aplica as normatizações que aduz o Art. 28 do CPP.

Art. 28, CPP – Se o órgão do Ministério Público, ao invés de


apresentar a denuncia, requerer o arquivamento do inquérito policial
ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar
improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou
peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia,
designará outro órgão do Ministério Público para oferece-la, ou
insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz
obrigado a atender.

 AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL

Em resumo a Ação Penal nos crimes contra a dignidade sexual era complicado o
Supremo descomplicou, no entanto, posteriormente a criação de uma nova Lei voltou a
complica-la.

Kleber Luciano Ancioto Página 99


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

o SISTEMÁTICA VIGENTE ANTES DA LEI 12015/09

 Pedação Antiga

No inicio da década de 90 o crime de estupro era de Ação Penal Privada quando


praticado contra mulher maior capaz. Por conta disso, na maioria das vezes as mulheres
vítimas desse crime por serem pobres e ficarem a margem da sociedade não tinham condições
econômicas e nem psicológicas para se dirigirem a uma Delegacia para registrar o Boletim de
Ocorrência e menos ainda para posteriormente contratarem um Advogado para ingressar com
a Ação Penal o que acabava por gerar altos índices de impunidade com relação a esse crime
(cifra negra).

O Ministério Público obviamente não estava contente com essa situação e os


Promotores começaram a ingressar com Ação Penal Pública Incondicionada em favor dessas
mulheres, mas obviamente que os Advogados dos réus começaram a impetrar Habeas corpus
alegando a ilegitimidade de parte do Ministério Público o que levava a carência da Ação.

Só que o detalhe era que o Ministério Público ingressava com a Ação somente quando
o Estupro deixava no mínimo pequenas escoriações no corpo da mulher (lesões leves), o que
na maioria dos casos ocorria, porque em 1995 o Art. 88 a Lei 9099 manteve a Lesão
Corporal Leve como crime de Ação Penal Pública Condicionada.

Art. 88, Lei 9099/95 – Além das hipóteses do Código Penal e da


legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa
aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.

Com isso os Promotores justificavam sua atuação dizendo que se nos crime de Lesão
Corporal Leve eles eram legitimados a ingressarem com a Ação, não havia sentido nos casos de
estupro em que houvesse Lesão Corporal eles não terem legitimidade. Bem verdade que lá a
Ação é condicionada a representação, mas para superar esse obstáculo eles argumentavam
que aqui havia o Estupro e a Lesão Corporal por isso ele estava ingressando com a ação.

Este fato chegou ao Supremo que editou a Súmula 608 que aduz que o Estupro com
Violência Real (qualquer Lesão Corporal por mais leve que seja) tratava-se de um crime de
Ação Penal Pública Incondicionada e certamente ele apenas não editou uma Súmula
Vinculante porque ela não existia na época.

Súmula 608, STF – No crime de estupro, praticado mediante violência


real, a ação penal é pública incondicionada.

Para chegar a esse entendimento o Supremo realizou uma interpretação extensiva do


Art. 101 do CP que aduz acerca da Ação Penal nos crimes complexos (crimes que possuem
mais de um crime em sua composição, como, por exemplo, o Roubo).

Art. 101, CP – Quando a lei considera como elemento ou circunstância


do tipo legal fatos que, por si mesmos, constituem crimes, cabe ação
pública em relação àquele, desde que, em relação a qualquer destes,
se deva proceder por inciativa do Ministério Público.

Kleber Luciano Ancioto Página 100


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Este artigo possui uma redação péssima, visto que, ele apenas normatiza que nos
crimes complexos quando um dos crimes for de Ação Penal Pública o complexo também será.
Sendo assim, no crime de Estupro temos o Constrangimento aliado a Conjunção Carnal e, o
Constrangimento é crime cuja Ação Penal é Pública Incondicionada, no entanto a Conjunção
Carnal não é crime, não podendo ser considerado um crime complexo. Assim o STF foi na
legislação italiana e percebeu que existem dois tipos de crimes completos, o crime complexo
em sentido lato e em sentido estrito e, sob esta nova análise o crime de estupro é um crime
complexo em sentido lato.

o SISTEMÁTICA APÓS A LEI 12015/09 – INCONSTITUCIONALIDADES

Este entendimento estava muito bem até chegar a Lei 12015/09 que foi muito boa
no aspecto penal, incluindo o homem como uma possível vítima do crime de Estupro bastando
que ele sofresse qualquer ato libidinoso em um de seus orifícios e não permitindo que
houvesse Abolicio criminis porque não se revogou o Atentado Violento ao Pudor.

No entanto, com relação ao aspecto processual a referida Lei foi muito mal elaborada,
primeiro porque que ela alterou o Art. 225, CP e transformou a Ação no crime de Estupro em
Ação Penal Pública Condicionada a Representação, passando a legitimidade ativa para o
Ministério Público, no entanto, não houve a estipulação de uma norma de transição e como
antes quem deveria propor a Ação era a própria vítima, levou as Ações em curso a sofrerem
uma anulação em massa.

Art. 225, CP – Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título,


procede-se mediante ação penal pública condicionada à
representação.

O correto nestes casos seria estabelecer uma norma de transição onde a vítima fosse
intimada a representar no prazo de 30 dias para que o Ministério Público continuasse o
processo daquele ponto para frente, no entanto, sem essa norma para corrigir o polo ativo da
demanda, tecnicamente um Habeas corpus anularia os atos praticados por ilegitimidade ativa.

Outro problema seríssimo do Art. 225, CP é que o crime de Estupro com resultado
morte, também possuía Ação Penal Pública Condicionada a Representação, dessa forma, se a
vítima não deixar parentes, não haveria legitimados para representar e o crime seria
impunível, em outras palavras, o indivíduo Estupraria, mataria e poderia sair impune.

Por conta destas situações que quando a Lei 12015/09 entrou em vigor,
imediatamente o Procurador Geral da República ingressou com à ADI 4301 no STF
apresentando a inconstitucionalidade da referida Lei no âmbito Processual Penal, fundando-se
nas seguintes razões:

1) A Lei 12015/09 ao mudar a Ação Penal nos crimes contra a Dignidade Sexual,
viola a Dignidade da Pessoa Humana, pois deixa desprotegida a liberdade de
opção sexual, em outras palavras, os maiores possuem liberdade de se
autodeterminarem a fazer sexo com quem desejarem e essa liberdade estava
sendo vilipendiada com o advento da referida Lei;

Kleber Luciano Ancioto Página 101


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

2) O mais grave, no entanto, é a violação do Devido Processo Legal Substancial pela


infra-proteção ou proteção insuficiente, que viola o Devido Processo Legal
Substancial, por deixar a Sociedade Desprotegida em face à ação de estupradores;
3) Por fim, a Lei ainda viola a Jurisprudência do Supremo e como consequência viola
a separação harmônica entre os Poderes, visto que o STF tinha estudado para criar
um sistema que fez surgir a Súmula 608. Nesse sentido, o legislador não pode
modificar a Jurisprudência do Supremo sob o pretexto de estar legislando.

Como a ADI 4301 não foi julgada, os Promotores continuam atuando com base na
Súmula 608, e é muito provável que a Ação seja julgada procedente e gere uma Súmula
Vinculante sobre o assunto.

As mulheres que por sua vez estavam com Ação em curso, aplica-se analogicamente o
Art. 91 do JECRIM que possui o propósito de corrigir o polo ativo da demanda, devendo ser
intimadas para que representem em 30 dias, sob pena de extinguir a punibilidade.

Art. 91 da Lei 9099/95 – Nos casos em que esta Lei passa a exigir
representação para a propositura da ação penal pública, o ofendido ou
seu representante legal será intimado para oferecê-la no prazo de 30
(trinta) dias, sob pena de decadência.

06/05/2015

EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NAS AÇÕES PENAIS

Pré Processo Curso Processo

Renúncia Perdão Ofendido Atuação Ofendido

Decadência Perempção Omissão Ofendido

Ação Penal Pública Condicionada Ação Penal Privada

Ação Penal Privada

Premissas

A Renúncia e a Decadência são pré-processuais ao passo que Perdão do Ofendido e


Perempção ocorrem no curso do Processo.

A Renúncia e o Perdão do Ofendido ocorrem devido a uma atuação (um fazer) do


ofendido, ao passo que a Decadência e a Perempção pela omissão (inércia) do ofendido.

A Renúncia e a Decadência se aplicam para a Ação Penal Pública Condicionada e a


Ação Penal Privada. O Perdão do Ofendido e Perempção só se aplica para Ação Penal
Privada.

Estes quatro institutos não se aplicam em hipótese alguma para as Ações Penais
Públicas Incondicionadas que só estão sujeitas a Prescrição e nada mais.

Kleber Luciano Ancioto Página 102


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

 Renúncia

É uma prerrogativa legal do ofendido ou de seu representante legal em abdicar-se do


Direito de Queixa ou de Representação em caráter unilateral (não receptício – independe de
aceitação do autor do fato) e pré-processual. A Renúncia serve como barganha para que a
vítima obtenha a reparação civil do dano, conforme previsto no Art. 74 da Lei do JECRIM
onde o Juiz ao homologar o acordo evita uma Ação Civil e põe fim a Ação Penal.

Art. 74 da Lei 9099/95 - A composição dos danos civis será reduzida


a escrito e, homologada pelo juiz mediante sentença irrecorrível, terá
eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.

 Decadência

É a perda do Direito de Queixa ou de Representação pelo decurso do prazo de 6 meses


contados do conhecimento da autoria até a data do ajuizamento da Ação ou da
Representação. Também é não receptício e pré-processual.

 Perdão do Ofendido

O Perdão do Ofendido nada mais é do que uma proposta formulada pelo Querelante
ao Querelado no sentido de dispor da Ação Penal Privada, em outras palavras é uma forma de
desistência da Ação Penal Privada motivada pelo Autor (Querelante). No entanto, este ato
processual é bilateral (receptício), dessa forma, ele só produz efeitos com aceitação do
querelado.

Caso o Querelado fique em silêncio por 3 dias após ter sido intimado acerca do perdão,
pressupõe que ele consente com o perdão (aceitação tácita). Sendo assim, se o Querelado não
quiser o perdão possuirá 3 dias após sua intimação para nega-lo expressamente.

A não aceitação do perdão justifica-se quando o Querelado deseja lutar por uma
Sentença Absolutória Categórica, pela Declaração da Inocência no Mérito, em outras palavras
o Querelado não aceita o perdão, porque na verdade ele sabe que não praticou nada contra o
Querelante e quer provar isso, até porque a sentença que reconhece o perdão extingue a
punibilidade, mas não declara a inocência e os fatos podem ser rediscutidos no campo cível
através de uma Ação de Reparação de Danos e com uma Sentença Absolutória Categórica o
Querelado poderá opô-la contra o Querelante pelo resto da vida.

Uma última observação importante é que o Querelante quando for vítima de um crime
praticado em concurso de pessoas, por conta do Princípio da Indisponibilidade, não pode
propor o perdão para um e não propor para os demais. Já no polo passivo não há
indivisibilidade no que tange a aceitação do perdão, dessa forma, um Querelado poderá
aceitar e o outro não sem nenhum problema. A aceitação, portanto é divisível, no entanto a
proposição é indivisível.

Perempção

Art. 60, CPP – Nos casos em que somente se procede mediante


queixa, considerar-se-á perempta a ação penal: I – quando, iniciada

Kleber Luciano Ancioto Página 103


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo


durante 30 (trinta) dias seguidos; II – quando, falecendo o querelante,
ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para
prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias,
qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no
art. 36; III – quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo
justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou
deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais; IV –
quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem
deixar sucessor.

A Perempção é uma modalidade de sanção processual imposta ao Querelante no


curso da Ação Penal Privada em razão de sua inércia, omissão ou desídia injustificada na
pratica dos atos processuais.

As hipóteses descritas nos incisos do Art. 60 do CPP são muito simples:

Inciso I – Paralisia do Querelante por mais de 30 dias no curso do Processo, ou seja,


nos casos em que ele deixar de praticar atos de impulso processual por mais de 30 dias o Juiz
proclamara a perempção, colocando fim ao Processo.

Inciso II – No caso de morte do Querelante, se no prazo de 60 dias nenhum dos


herdeiros assumir o Processo, ocorre perempção.

Inciso III – Diante de qualquer ausência injustificada do Querelante para a prática de


atos processuais e também quando o Querelante não pedir a condenação nas alegações finais,
leva a extinção do Processo por perempção.

Nesse sentido, se o Querelante pedir para absolver no mérito ao invés de pedir para
condenar o Juiz declarará a Ação Perempta, porque o Querelante conforme normatização legal
só possui a premissa de pedir a condenação.

Inciso IV – Quando ocorre a dissolução da Pessoa Jurídica (Autora da Ação) sem deixar
sucessor, pela desconstituição da Personalidade Jurídica extingue-se a capacidade de estar em
juízo e, portanto, não haveria mais ninguém litigando, o que torna a Ação Perempta.

AÇÃO CIVIL “EX DELICTO” (Arts. 63 a 68 do CPP)

 Introdução

Trata-se da Ação Civil decorrente do crime e para entendermos o porque de existir


uma Ação Civil regulada dentro do Código de Processo Penal, precisamos partir da premissa de
que todo crime gera danos na esfera civil, ao passo que todo crime é um ato ilícito que lesa
bem jurídico, gerando a necessidade de repara-lo. Dessa forma, a principal razão de existir
uma Ação Civil no Código de Processo Penal é o Aproveitamento e Economia Processual
gerada pela Ação Penal, visto que a ela pode perfeitamente gerar resultados que podem ser
aproveitados na esfera civil.

Kleber Luciano Ancioto Página 104


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Mas para entender a relação da Ação Penal com a Civil há necessidade de


entendermos do Instituto Prejudicialidade.

 Prejudicialidade Externa

Este conceito é complexo, porque envolve outros conceitos, pois para entender o que
é prejudicialidade externa temos que entender o que é prejudicialidade interna, para entender
o é prejudicialidade interna temos que entender o que questão controversa, para entender a
questão controversa temos que entender o que é ponto controvertido e para entendermos o
que é ponto controvertido temos que entender o que é ponto.

Ponto é toda afirmação no Processo, nesse sentido, o Autor vai ao juízo e faz uma
afirmação e o Réu vai a juízo e afirma outro ponto. Todo ponto pode ter um contraponto, visto
que o processo é dialético discutido em contraditório, quando isso acontece nós temos o
chamamos de questão. Quando o ponto não possui um contraponto é um ponto incontroverso
ou pacifico (não gera questão). Os Juízes adoram os pontos pacíficos, pois diminui as
quantidades de questões que ele tem que resolver, visto que a vida do Juiz é dirimir questão,
verificar quais pontos devem prevalecer no Processo e os efeitos dessa prevalência.

Quando os pontos tratam de afirmação fática o Juiz depende de prova, já com relação
as questões de direito não demandam prova pois o Juiz conhece o direito (Exercer a jurisdição
= dizer o direito), em outras palavras a questão de direito é dirimida pela convicção do Juiz.

Pode acontecer de uma questão refletir na outra e ter uma relação de anterioridade
lógica em relação a outra, quando isso ocorre e trata de direito material estamos diante do
que chamamos de questão prejudicial.

A questão prejudicial se subdivide em questão prejudicante e questão prejudicada, ou


seja, a questão prejudicante condiciona o resultado da prejudicada. Por exemplo, é ou não é
pai, pois se for pai tem que pagar alimentos; é ou não é insano, pois se for não há crime; é ou
não é proprietário da coisa, se não for há o crime de furto; o casamento é ou não válido, se
não for válido não há crime de bigamia.

Nesse sentido, há uma relação de anterioridade lógica sob pena de nulidade da


decisão, em outras palavras ela precisa ser decidida anteriormente, pois a questão
prejudicante trata de direito material e, portanto, condiciona a decisão de mérito.

Dessa forma, existe uma questão de prejudicialidade entre a Ação Penal e a Ação Cível,
visto que quando o Juiz Penal declara que fulano é autor do crime de homicídio do qual ficou
comprovada a materialidade, ninguém vai rediscutir o fato na esfera cível, sendo verificado
nesta última esfera apenas o valor da indenização.

Ninguém rediscute o caráter fático da Ação Penal, porque a sentença penal traz mais
confiança e certeza, ao passo que tem policia investigando, prova robusta sendo produzida, a
busca da verdade real, a lide é indisponível, o Promotor acusa com base na Lei, a Defesa é
realizada com base na Lei, a lide é programada pelo ordenamento jurídico ao passo que por
outro lado a sentença cível é muito mais baseada em presunções, não há uma investigação
profunda do fato, visto que tudo que o Autor afirmou e o Réu não contestou é verdade

Kleber Luciano Ancioto Página 105


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

independente de ser provado e isso ocorre porque o direito é disponível. No Processo Penal o
direito é indisponível, a verdade deve vir a tona no seu nível máximo de certeza.

 Jurisdição Una

Sendo assim, a Sentença Penal obviamente reverterá na esfera civil, porque a


jurisdição é una, e o que um Juiz diz o outro não pode desdizer. A sentença é imutável.

 Independência entre Instâncias

Além do Princípio da Jurisdição Una, em que a Jurisdição deve ser harmônica e não
contraditória, há ainda o Princípio da Independência entre as Instâncias Cíveis e Criminais.

Este princípio aduz que cada fato possui um tipo de resposta estatal. Mas esta
independência não é absoluta, encontrando um limite, que é a causa de pedir fática (o que
aconteceu de fato), pois o que aconteceu, aconteceu para o Juiz criminal e para o Juiz cível, ou
seja, a base fática é a mesma, só por isso que o principio da independência entre as instancias
não é absoluto.

SENTENÇA ABSOLUTÓRIA

A sentença absolutória possui dois tipos: a Dubitativa e a Categórica.

 Dubitativa

Também chamada de non liquet (ausência de solução concreta para o caso). Esta
sentença é baseada na insuficiência de provas da autoria ou materialidade do crime. Aqui o
Juiz absolve de forma sucinta, pois não há muito o que valorar, o que analisar e nem pena para
dosar, é uma sentença vazia de conteúdo jurídico, por conta disso, não faz coisa julgada no
cível, visto que ela não decide sobre o fato por não existir provas para declara-los.

 Categórica

A sentença absolutória categórica se baseia no juízo de certeza da inocência. O Juiz


afirma que o Réu é inocente, que o Réu não praticou o crime, que o crime não ocorreu ou
ainda pode declarar que embora o fato típico tenha ocorrido, não houve crime por conta de
uma excludente de ilicitude. Essa sentença faz coisa julgada na esfera cível para proteger o
Réu contra a responsabilização civil pelo dano, ou seja, ela livra o Réu do dever de indenização
pecuniária.

SENTENÇA CONDENATÓRIA

Esta sentença só pode ser prolatada com base no juízo de certeza acerca da culpa do
agente e da materialidade do crime. A sentença penal condenatória possui dois capítulos: o
capitulo do fato e o capítulo da pena, onde no primeiro o Juiz descreve o fato e as provas e no
segundo ele dosa a pena pelo sistema trifásico.

EFICÁCIA CIVIL DA SENTENÇA

Kleber Luciano Ancioto Página 106


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

O Art. 91, I, CP normatiza acerca do dever de indenizar o dano em decorrência do


crime. Esse efeito refere-se à eficácia civil da sentença penal condenatória que serve como
Título Executivo Judicial.

Art. 91, CP – São efeitos da condenação: I – tornar certa a obrigação


de indenizar o dano causado pelo crime;

Este Título é certo e exigível, no entanto é ilíquido, não sendo possível a execução
direta. Dessa forma, faz-se necessário uma Ação de Liquidação (Art. 475-N, II do CPC), pois a
sentença traz a certeza da dívida, mas não a quantifica, em outras palavras ela fornece o an
debeatur, mas não o quantum debeatur. Por fim, a execução esta prevista no Art. 475-J do
CPC.

Art. 475-N do CPC - São títulos executivos judiciais: [...] II – a


sentença penal condenatória transitada em julgado; [...]

Art. 475-J do CPC – Caso o devedor, condenado ao pagamento de


quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de
quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no
percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado
o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de
penhora e avaliação.

 Limites Subjetivos da Coisa Julgada (Art. 472, CPC)

Art. 472, CPC – A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é
dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas
relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo,
em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz
coisa julgada em relação a terceiros.

Desta forma, somente pode se beneficiar de uma sentença quem participou do


Processo em contraditório, sendo este o dogma da Proteção Judicial Individual.

Sendo assim, imaginemos uma situação de legítima defesa com Aberratio ictus, onde
“A” estando armado ataca “B” que começa a se defender em legitima defesa, toma a arma de
“A” e atira contra “B”, mas atinge “C” que não tinha nada a ver com a história. Neste caso, “B”
será Réu no processo e uma vez comprovando que estava agindo em legitima defesa será
absolvido através de uma sentença absolutória categórica que reconheça a legitima defesa,
mas, como “C” não participou da Ação Penal que foi promovida pelo Ministério Público, não
poderá utilizar a sentença em seu favor e entrar diretamente com uma Ação de Liquidação
contra “A”, sendo necessário que ele ingresse com uma Ação Cível contra “B” que deverá
regressar contra “A”.

12/05/2015

JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA

Kleber Luciano Ancioto Página 107


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

A ciência Processual possui 4 institutos fundamentais: Ação, Exceção, Jurisdição, e


Processo.

JURISDIÇÃO

 Conceito

A palavra jurisdição significa dizer o direito, afirmar o direito no caso concreto. O


Judiciário possui o monopólio para dizer o Direito.

Na Jurisdição técnica o que vale é a aplicação do direito, nesse sentido, a Jurisdição é


um dos poderes soberanos do Estado que tem por função fazer aplicar o direito ao caso
concreto com o intuito de solucionar conflitos de interesses reafirmando a autoridade da
norma vigente e pacificando a sociedade.

Sendo assim, o propósito da Jurisdição é pacificar a sociedade, mas sua função não se
resume a isso, pois ela possui um papel fundamental que é servir de pilar para o Estado de
Direito, visto que nada adiantaria criar Leis caso elas não fossem aplicadas, por isso o Judiciário
tem a função de fazer valer a norma.

Sabendo disso, precisamos distinguir a Jurisdição pela perspectiva dos poderes:

o Poder Legislativo

Se fossemos criar um Estado o primeiro poder a ser criado seria o Legislativo, pois é
através de Leis que o Estado se auto organiza, concretizando a vontade do grupo. Por isso há a
necessidade de existir um grupo de pessoas representando a coletividade que ditam as
normas do Estado.

É o Legislativo que possui o papel de edificar, estruturar a Ordem Jurídica para que os
outros dois poderes apliquem o ordenamento.

o Poder Executivo

O Executivo aplica a Lei em situação de paz e a aplica sem ser provocado, ou seja,
agindo de ofício. Fazendo isso ele estará cumprindo seu dever legal sem existir conflitos de
interesse.

O Executivo aplica as Leis de forma parcial, com o intuito de atingir seus próprios
objetivos, que é administrar o Estado, no entanto, as vezes ao aplicar a Lei ele viola direitos,
justamente por visar seus próprios interesses.

Fato é que todo ato do Poder Executivo deve ser pautado em Lei, pois ele deve agir
em nome do povo e o povo se faz representar pelas Leis.

o Poder Judiciário

O Poder Judiciário quando exerce Jurisdição aplica a Lei tendo como pressuposto um
conflito de interesses, sendo assim, o Judiciário aplica a Lei para solucionar o conflito e tutelar
a ordem jurídica, protegendo direitos que é a grande meta do judiciário.

Kleber Luciano Ancioto Página 108


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

O Poder Judiciário só atua mediante provocação para preservar sua imparcialidade,


sua independência, pois o Judiciário deve aplicar a Lei em função da Justiça e não do interesse
público. Vale ressaltar que as decisões do Legislativo são para o futuro, as decisões do
Executivo para o presente, enquanto que as do Judiciário se reportam ao que passado.

Como dissemos acima, o Executivo aplica as Leis, as vezes passando por cima do
direitos, por isso que a maioria das Ações no Judiciário envolvem o Poder Executivo que
embora execute atos pautados na Lei muitas vezes são contrários a Justiça.

O Poder Judiciário é o único poder que profere suas decisões com caráter de
definitividade e imutabilidade quando esta exercendo Jurisdição, isso significa, que o que
aconteceu no passado predomina sobre o que acontecer no futuro, tendo uma lógica
totalmente inversa dos outros dois poderes. Por exemplo, em se tratando do Legislativo se
hoje esta em vigor uma Lei A e amanha entra em vigor uma Lei B contrária a Lei A, em regra a
Lei A deixa de ter validade; no mesmo sentido em se tratando do Executivo se hoje esta em
vigor um Decreto C e amanha entra em vigor um decreto D contrário ao Decreto C, em regra o
Decreto C deixa de ter validade; por fim o Judiciário se uma decisão transitou em julgado hoje,
se posteriormente for impetrado uma nova Ação idêntica a anteriormente julgada, essa nova
Ação será extinta e permanecerá vigendo a decisão anterior. O Judiciário possui a prerrogativa
de produzir decisões com eficácia imutável e definitiva, porque é o único Poder que exerce
Função Estatal Contramajoritária.

 Jurisdição  Função Estatal Contramajoritária

Contramajoritária significa que o Juiz é o único detentor de um Poder Soberano que


não depende da vontade da maioria democrática, que não depende de aprovação de opinião
pública, que não depende de vontades políticas, que não depende do apoio de segmentos
sociais, dessa forma, o compromisso que o Juiz possui não é com maioria democrática como os
demais Poderes possui, caso contrário quebraríamos o Sistema de Freios e Contrapesos, pois a
maioria de hoje pode ser a minoria de amanha e vice versa, sendo necessária essa alternância,
pois ela é própria do Estado Republicano. Dessa forma, o Juiz é a única autoridade republicana
que pode decidir em favor das minorias, tendo independência, mantendo-se neutro.

Nesse sentido, o Juiz pode defender grupos minoritários, promover inclusão social,
pois o compromisso que o Juiz possui é com os Direitos Fundamentais, protegendo negros de
quilombolas, as mulheres espancadas no lar, o nascituro, os índios, dessa forma, ele pode
estabelecer compromissos com grupos minoritários que não possuem condições para se
organizarem politicamente para conseguirem representatividade no Congresso Nacional.

Esta característica contramajoritaria na cúpula do judiciário brasileiro é mitigada, pois


a forma de se colocar um ministro no STF atualmente depende da maioria majoritária, pois o
Presidente é quem indica o nome e ele é eleito pela maioria democrática e os Senadores
também eleitos pela maioria são os que o sabatinam, em contrapartida, os Juízes em 1° grau
são os que mais possuem essa característica tão importante.

Em resumo, o compromisso do Juiz não é com maiorias, mas sim com as minorias que
tem seus direitos vilipendiados.

Kleber Luciano Ancioto Página 109


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

 Princípios

o Inércia

O Judiciário depende de provocação e é provocado pelo Direito de Ação para preservar


sua imparcialidade e dependência.

o Investidura

O poderoso não é o Juiz, mas sim o Estado que confere o seu poder ao Juiz, o Estado
sim é poderoso o Juiz é apenas exercente do Poder, isto porque o Poder Judiciário é
Republicano, sendo concedido ao Juiz a possibilidade de exercê-lo, no entanto ele deve prestar
contas do Poder que exerce. O Poder do Juiz é instrumental, ou seja, serve para que ele
trabalhe e não para abusar, por isso os Juízes são controlados pelo próprio Judiciário através
das vias recursais.

A investidura se dá de duas formas: a mais comum e conhecida é a administrativa pelo


concurso público da magistratura de provas e títulos. Para disputar o concurso é necessário
ser bacharel em direito e comprovar 3 anos de atividade jurídica contados da colação de grau;
mas existe também a investidura política que ocorre por indicação institucional, que é o caso
dos Ministros do Supremo, que são indicados pelo Presidente da República e sabatinados pelo
Senado Federal e há também o chamado quinto constitucional, onde 1/5 das vagas dos
Tribunais Regionais e Tribunais Superiores (exceto o Supremo) são destinadas a membros do
Ministério Público e da Advocacia como uma forma de democratizar a jurisprudência, evitando
a endogênia destes Tribunais.

o Indeclinabilidade

Não pode haver pretexto para não julgar. Nenhum Juiz pode se furtar (deixar) a julgar
as causas que lhe compete. O Juiz possui o dever processual de prestar jurisdição, de julgar a
demanda. O pior Juiz não é o que julga mal, mas sim o que não julga, pois para o que julga mal
há o recurso, agora contra os que não julgam não há o que fazer.

o Indelegabilidade

O Poder do Juiz não é dele é do Estado e o Juiz é investido do Poder por força da
Constituição, dessa forma, ele não pode delegar esse poder a ninguém, por ato de vontade
própria, visto que, como já dissemos ele não é dono do Poder e o Estado só pode conferir esse
Poder com base na Lei, portanto, o Juiz somente poderá transferir o Poder Jurisdicional para
outro Juiz nas hipóteses em que a Lei autorizar.

o Improrrogabilidade

O Juiz não pode modificar seu campo decisório, seu âmbito de poder de modo a
aumentar sua abrangência ou reduzi-la e, por outro lado também não pode ter o seu Poder
usurpado por outro Juiz. A decisão que recai nessa margem de usurpação de poder é nula
porque viola o Principio da Improrrogabilidade.

Kleber Luciano Ancioto Página 110


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

o Unidade

A Jurisdição é um Poder uno e indissolúvel, porem divisível por regra de competência.


O Poder é um só na sua essência, ao passo que todo Juiz julga e o ato de julgar é único (decidir
acerca do direito do próximo/semelhante). Dessa forma, um Ministro do Supremo não possui
mais poder que o Juiz de 1° instancia, pois ambos julgam, a única diferença são as
competências, visto que cada possui o Poder para julgar dentro de sua esfera legal de poder.

o Jurisdição Necessária

Coloca a Jurisdição como via exclusiva para aplicação do Direito Penal, ou seja, só se
aplica o Direito Penal na vida das pessoas pela Jurisdição, não existindo outro caminho, não
existindo substituto processual. Direito Penal é direito de coação indireta, não é auto aplicável,
ou seja, sempre dependerá da Jurisdição para acontecer na vida das pessoas.

COMPETÊNCIA - DIVISÃO DA JURISDIÇÃO

Competência é o limite da Jurisdição, é a divisão do Poder Jurisdicional dado a cada


Juiz com base na Lei. É a divisão da Jurisdição entre todos os Juízes existentes que faz
concretizar o Princípio do Juiz Natural que é Clausula Pétrea.

 Fundamentos

A necessidade de se dividir a Jurisdição por regras de competência em um primeiro


momento existe para se evitar o abuso do Poder, permitindo que os Juízes se autocontrolem e
se autofiscalizem no Poder em um mesmo patamar hierárquico ou em um patamar superior.

A Constituição dividiu e escalonou o Poder Judiciário para não haver abusos, aliás a
Constituição faz isso com todos os Poderes e não só com o Judiciário, por exemplo, no
Legislativo Federal temos o Senado e a Câmara dos Deputados e dentro delas as Comissões
Temáticas, além da divisão do Legislativo nas três esferas do Poder (Federal, Estadual e
Municipal) que também ocorre com o Executivo.

O sistema recursal é, portanto, um mecanismo de autocontrole do próprio Poder


Judiciário permitindo um aperfeiçoamento das decisões.

As regras de competência existem para que os Juízes deem conta de resolver os


conflitos da sociedade, no sentido de dividir o trabalho, pois há situações em que os Juízes
possuem a mesma competência material na mesma área de Jurisdição e a competência se
dará em razão do fluxo de trabalho.

Outra razão da divisão de competência é de especializar a Jurisdição, nesse sentido, há


Juízes que só julgam matérias específicas. Esta especialização temática é importantíssima, pois
o Juiz se transforma em um especialista, julga bem e julga rápido, o problema, no entanto,
começa a acontecer quando ele começa a julgar de forma padronizada.

Kleber Luciano Ancioto Página 111


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Por isso, temos receio com Justiças Especializadas, pois, em regra, são Justiças de
aplicação do Direito Material pronto, por exemplo, o que é uma Vara do Trabalho se não uma
vara especializada em condenar o empregador, nesse sentido, a Justiça padronizada tenderia a
um Tribunal Exceção.

13/05/2015

 Competência Abstrata / Concreta

Competência abstrata refere-se às regras de competência no plano normativo,


prevendo potencialmente qual Juiz irá julgar a causa. Já a competência concreta ocorre
quando um caso concreto é designado para um determinado Juiz, também denominada
competência estabilizada. Dessa forma, enquanto não houver a competência concreta,
teremos apenas as regras de competência abstrata.

O Fenômeno da concretização da competência vem do plano constitucional para o


infraconstitucional até que o Juiz efetivamente tome conhecimento da causa.

 Competência na Constituição Federal

Com relação as regras de competência presentes na Constituição Federal, a primeira


analise se pauta em reconhecermos em qual das esferas de Justiça que o caso se encaixa e
para isso tomamos como norte (guia) os Tribunais de Superposição (TST, TSE, STM e STJ).

Como não há crime trabalhista, excluímos o TST e ficamos com apenas 3 tribunais,
nesse sentido, se o crime não for militar ou eleitoral trata-se de crime comum e, portanto,
sujeita-se ao STJ que esta acima dos Tribunais Regionais.

Em sendo comum, temos que analisar se a competência é da Justiça Comum Federal


ou Estadual e para isso há necessidade de analisarmos o Art. 109, CF, pois ele elenca o rol de
causas que são de competência da Justiça Federal e por exclusão, tudo que não for de
competência da Justiça Comum Federal será da Justiça Comum Estadual.

Kleber Luciano Ancioto Página 112


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Dessa forma, ao estabelecermos que o crime não é eleitoral ou militar e que ele não é
de competência da Justiça Federal, tratar-se-á, por exclusão de um Crime Comum Estadual e o
próximo passo será analisar se há foro por prerrogativa de função.

O único critério que interfere no foro por prerrogativa de função previsto na


Constituição é o da Especialização, nesse sentido, se o Prefeito de Presidente Prudente é pego
comprando votos na Bahia ele é julgado no TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo, se
comete um homicídio no Pará, responderá o Processo perante o TJ (Tribunal de Justiça) de São
Paulo.

Por fim, o último critério no âmbito Constitucional é verificar se o crime é doloso


contra a vida, pois caso seja, será de competência do Tribunal do Júri (Federal ou Estadual),
dessa forma, se o Prefeito comete homicídio auxiliado por um “capanga”, o Prefeito
responderá frente ao Tribunal do Júri no TJ de São Paulo, enquanto o “capanga” será
submetido ao Júri Comum na comarca onde houve a pratica do crime.

 Competência no Código de Processo Penal

A quarta analise a ser realizada encontra-se no Código de Processo Penal e diz respeito
a Competência Territorial.

Art. 69, CPP – Determinará a competência jurisdicional: I – o lugar da


infração; II – o domicílio ou residência do réu; III – a natureza da
infração; IV – a distribuição; V – a conexão ou continência; VI – a
prevenção; VII a prerrogativa de função.

Os critérios de competência do CPP podem ser gravados com a frase mimemônica:


Ludona di coco prepre, que são as sílabas iniciais dos incisos do Art. 69 elencado acima,
estando ordenados nesta mesma ordem do Art. 70 ao 75 do CPP.

Antes de adentrarmos na análise do Art. 69 do CPP, faz-se necessário algumas


considerações iniciais:

o Prorrogação de Competência

Prorrogar a competência é ampliar a competência de um Juiz em prejuízo de outro.


Isto porque, não há lacuna em matéria de competência, o sistema é hermético e fechado,
para que não existam causas sem Juiz, dessa forma, sempre que um Juiz prorrogar sua
competência inevitavelmente estará invadindo a esfera de competência de outro. O exemplo
mais fácil de visualizarmos é o IDC – Incidente de Deslocamento de Competência que quando
julgado procedente o Juiz Federal prorroga sua competência e a retira do Juiz Estadual, sem
caracterizar, no entanto, uma usurpação ilegal, porque toda prorrogação precisa ocorrer nos
moldes da Lei.

Nesse sentido, temos duas hipóteses de prorrogação:

A primeira é chamada de prorrogação legal ou necessária, sendo, portanto,


obrigatória, pois é imposta por Lei em prol do interesse da Justiça, sendo tão forte que
modifica até mesmo a competência absoluta. Ex. IDC, Conexão e Continência.

Kleber Luciano Ancioto Página 113


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

A segunda é denominada prorrogação voluntária e caracteriza-se por modificar a


competência por vontade das partes. Na esfera civil a prorrogação voluntária é observada
quando as partes ao celebrarem um contrato elegem um foro de eleição. Na esfera penal, no
que diz respeito a Ação Penal Privada, o querelante possui a prerrogativa de optar para
ajuizamento da Ação entre o foro do domicílio do Réu ou o lugar da infração, tratando-se,
portanto, de prorrogação voluntária explicita, pois o querelante escolhe explicitamente o foro
que julgará a causa.

Há também, a prorrogação voluntária implícita, que ocorre quando a parte não opõe
exceção de incompetência relativa nos casos onde caberia essa exceção, concordando com o
“equívoco” no ajuizamento e, fazendo isso, preclui a possibilidade dessa alegação no futuro.
Nesse sentido, no caso de um crime praticado e consumado em Pirapozinho que o Ministério
Público promova Ação em Prudente, caso o Advogado de defesa não diga nada, a
incompetência territorial relativa é sanada pela prorrogação voluntaria implícita e o foro de
Prudente passa a ser absolutamente competente.

o Delegação de Competência

É possível que o Juiz transfira o Poder Jurisdicional para outra pessoa, desde que a Lei
autorize. A Delegação pode ocorrer para alguém dentro do próprio Judiciário ou para alguém
que esta fora dele.

 Delegação de Competência Interna

Aqui o Juiz transfere o Poder Jurisdicional para outro Juiz. Ex. Carta precatória ou
substituição automática pelo Juiz substituto.

 Delegação de Competência Externa

Quando o Juiz constitui um conselho de sentença (Júri) pratica Delegação Externa,


pois ele transfere o Poder de Julgar dele para outros cidadãos, mas sempre autorizado por Lei.

 Competência – Lugar da Infração (Art. 70, CPP – Teoria do Resultado)

O lugar da infração é o primeiro critério de competência territorial, no entanto, ela é


relativa e prorrogável por vontade das partes, sendo assim, se ela for violada o Processo não
é considerado nulo, salvo se houver prejuízo comprovado da parte. Perceberemos, portanto,
que as regras se complementam.

Art. 70, CPP – A competência será, de regra, determinada pelo lugar


em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em
que for praticado o último ato de execução.

A regra para o lugar da infração encontra-se no Art. 70 do CPP elencado acima que
nos aduz a Teoria do Resultado, ou seja, o lugar para se ingressar com a Ação será onde o
crime se consumou, nesse sentido, se o crime for formal, de mera conduta ou teve seu
resultado no mesmo local da conduta será muito fácil determinar o lugar da infração. O
problema aparecerá nas situações seguintes:

Kleber Luciano Ancioto Página 114


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

o Crimes à Distância

Crimes à distância é gênero, dos quais os delitos plurilocais e de espaço máximo são
espécies.

 Delitos Plurilocais

A conduta acontece em uma comarca e o resultado em outra comarca, dentro do


território brasileiro.

 Delitos de Espaço Máximo

A conduta acontece em um país e o resultado ocorre em outro país, podendo ser de


dentro para fora ou de fora para dentro.

Nesse sentido, aqui há uma fragmentação do iter criminis, dessa forma, quando o
resultado é consumado fora do Brasil, o foro competente será onde for praticado o último ato
de execução dentro do Brasil.

No caso dos crimes cibernéticos, o lugar da infração será onde estiver localizado o IP,
caso ele não seja localizado, será o do domicilio do Réu que é considerado foro subsidiário.

Por fim, quando o crime começa a ser executado no exterior e se consuma no Brasil, o
foro competente será o do local de consumação ou onde ele deveria ter se consumado no caso
do crime tentado.

o Tentativa

Como não há consumação, o foro competente será o lugar do último ato de execução.

o Exceções Jurisprudenciais a Teoria do Resultado

As exceções que trataremos são todas para delitos plurilocais.

 Crime de Homicídio

Mesmo que o resultado se de em outra comarca, o júri será realizado no local onde foi
praticado a conduta, por uma questão probatória e para que se de exemplo, legitimando
democraticamente o Júri, visto que os próprios cidadãos daquele local é que vão decidir acerca
do futuro do Autor do crime.

 Aborto

O lugar da infração não será onde o feto for expelido, mas sim no local onde for
realizada a manobra abortiva. Alias depois dessa pacificação a jurisprudência estendeu esse
entendimento para todos os crimes dolosos contra a vida (Art. 121 a 124 do CP), sendo
assim, em todos eles adotaremos a teoria da conduta e não do resultado.

 Estelionato com emissão dolosa de cheque sem fundo

Kleber Luciano Ancioto Página 115


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Também adota a teoria da conduta, pois se fossemos adotar a teoria do resultado o


lugar do crime seria onde ele se consumou, que neste caso seria o local em que o cheque foi
recusado e devolvido.

 Falso Testemunho por carta Precatória

No caso de um falso testemunho por carta precatória, embora o crime se consume no


juízo que requereu a carta precatória, visto que ele utilizará as informações falsas passadas
pela testemunha, o Autor do crime responderá junto ao juízo do local onde prestou
depoimento, portanto, neste caso também se adota a teoria da conduta.

 Uso de documento falso

Neste caso o crime se consuma no local onde o indivíduo faz uso do documento falso,
no entanto, o juízo competente será o do local onde a falsificação foi realizada, sendo mais
uma exceção a teoria do resultado.

o Incerteza quanto aos limites de Jurisdições

Quando houver incerteza quanto aos limites de Jurisdições, não havendo um marco
exato diferenciando-as ou mesmo por não conseguirmos definir exatamente onde ocorreu a
conduta e onde ocorreu o resultado, ou seja, o crime ocorrer em um espaço indefinido será
competente o Juiz que primeiro tomar conhecimento do fato.

A prevenção não é fixada pelo ajuizamento da Ação no Penal, mas sim pelo
conhecimento do fato junto ao Juiz. Nesse sentido, o primeiro Juiz que tomar conhecimento
do flagrante, determine busca e apreensão, será considerado prevendo, sendo assim, a
prevenção se da com a distribuição do inquérito sem haver se quer Ação.

Art. 75, Parágrafo único do CPP – A distribuição realizada para o


efeito da concessão de fiança ou da decretação de prisão preventiva
ou de qualquer diligência anterior à denúncia ou queixa prevenirá a da
ação penal.

o Crimes Continuados e Permanentes

Nestes casos, também aplicamos a prevenção, ou seja, o Juiz que primeiro tomar
conhecimento da cadeia continuativa do delito será o competente, dessa forma, mesmo que o
Réu venha tentar uma prorrogação de foro dizendo que estava em outra comarca não obterá
sucesso.

 Competência - Domicílio do Réu (Art. 72, CPP)

Art. 72, CPP – Não sendo conhecido o lugar da infração, a


competência regular-se-á pelo domicílio ou residência do réu.

o Foro Subsidiário

Nas hipóteses em que não sabemos o local da infração, o domicilio do Réu será o foro
subsidiário/complementar a ser utilizado.

Kleber Luciano Ancioto Página 116


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Nas hipóteses que o Réu tiver mais de um domicilio, utilizaremos a prevenção. E caso o
Réu seja um andarilho, sem domicilio, o foro competente será o do local onde ele for
localizado.

o Foro Optativo

Ao lado do foro subsidiário temos o foro optativo previsto no Art. 73, CPP que é
próprio das Ações Penais Privadas.

Art. 73, CPP – Nos casos de exclusiva ação privada, o querelante


poderá preferir o foro de domicílio ou da residência do réu, ainda
quando conhecido o lugar da infração.

Em outras palavras, o querelante nas Ações Penais Privadas possui a opção de


ingressar com a Ação no domicilio do Réu ou no local da infração, escolhendo segundo sua
mera conveniência.

No caso do foro optativo, como já elencamos anteriormente ocorre uma prorrogação


voluntaria explicita, pois as regras de competência relativa existem para atender o interesse
das partes e aqui o individuo possui a liberalidade de explicitamente retirar a competência de
um Juiz e passar para outro segundo suas próprias razões.

19/05/2015

COMPETÊNCIA PELA NATUREZA DA INFRAÇÃO

Trata-se de competência absoluta, funcional e que se baseia na especialização da


Jurisdição. Especializamos a Jurisdição com base em determinados tipos de crime, alguns
doutrinadores a chamam de Competência Material em Sentido Estrito, onde há uma
especialização da função de julgar.

Esta competência encontra-se delimitada na Constituição, quando ela trata das


Justiças Especializadas.

O primeiro grupo de crimes que possuem competência pela natureza da infração são
os Crimes Dolosos Contra a Vida, que são julgados pelo Tribunal do Júri, além dele existe
ainda os Crimes Eleitorais que são julgados pela Justiça Eleitoral, os Crimes Militares que são
julgados pela Justiça Militar, e os Crimes de Menor Potencial Ofensivo cuja competência é do
JECRIM, sendo estas as justiças especializadas.

O Crime de Latrocínio, não vai a Júri Popular porque não é considerado Crime Doloso
Contra a Vida, mas sim Crime Contra o Patrimônio, conforme prevê a súmula abaixo.

Súmula 603, STF – A competência para o processo e julgamento de


latrocínio é do Juiz singular e não do Tribunal do Júri.

COMPETÊNCIA POR DISTRIBUIÇÃO

Kleber Luciano Ancioto Página 117


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Art. 75, CPP – A precedência da distribuição fixará a competência


quando, na mesma circunscrição judiciária, houver mais de um juiz
igualmente competente.

Distribuição é o critério de fixação de competência para dividir tarefas entre Juízes


dotados de Jurisdição de mesma categoria em uma mesma comarca. A Competência por
Distribuição, portanto, só tem sentido se houver uma comarca com no mínimo dois Juízes, que
vão dividir tarefas que se distribuem por critério de sorteio ou alternância. Em outras palavras,
caso a vara seja única, não se distribui os processos, ao passo que eles simplesmente chegam
para o Juiz.

Art. 75, Parágrafo único, CPP – A distribuição realizada para o efeito


da concessão de fiança ou da decretação de prisão preventiva ou de
qualquer diligência, anterior à denúncia ou queixa prevenirá a da ação
penal.

A Distribuição ocorrerá pela pratica de qualquer Ato Jurisdicional ainda que durante o
Inquérito Policial. Qualquer Juiz que praticar um Ato Jurisdicional no Inquérito se torna
Prevento, pouco importando, inclusive, se foi violada a Competência Territorial em razão do
local da infração.

COMPETÊNCIA POR CONEXÃO E CONTINÊNCIA

Art. 77, CPP – A competência será determinada pela continência


quando: I – duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma
infração; II – no caso de infração cometida nas condições previstas nos
arts. 51, §1°, 53, segunda parte, e 54 do Código Penal.

 Conceito / Fundamentos

Não são critérios de fixação de Competência, mas sim de modificação. Em outras


palavras, ocorrendo a conexão ou continência o Juiz cuja Competência sobre o Processo já
havia se concretizado, poderá perder o poder sobre o Processo. Nesse sentido, não há como
falarmos em conexão e continência se não houver dois ou mais Juízes que já estejam firmados
com sua Competência em concreto.

A Conexão e Continência caracterizam-se por elos, vínculos legais que unem delitos e
pessoas e, nestes casos, teremos que analisar qual dos Juízes vai exercer Prorrogação de
Competência sobre o outro. Nesse sentido, o foro mais forte é denominado Foro Prevalente.

Uma premissa importantíssima é que as regras de Conexão e Continência estão no


plano infraconstitucional, portanto, são formas de prorrogação de Competência Legal ou
Necessária, por estarem previstas em Lei e, por isso, conseguem modificar Competências
Absolutas previstas em Lei, mas não possuem o condão de modificar Competências Absolutas
Constitucionais, em outras palavras os foros Constitucionais não são prorrogáveis por
conexão e continência. O IDC (Incidente de Deslocamento de Competência) possui o condão
de modificar uma Competência Absoluta Constitucional, porque sua previsão esta no próprio

Kleber Luciano Ancioto Página 118


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

texto Constitucional, mas a Conexão e Continência não possuem essa “moral” toda por
estarem previstas apenas no plano Infra Constitucional.

Nesse sentido, caso um Crime Eleitoral e um Crime Doloso Contra Vida estiverem
conexos, nenhum dos dois prorrogará sua Competência, havendo cisão e cada um será julgado
pelo foro competente conforme previsto na Constituição Federal.

A Conexão e a Continência só serão aplicadas se os Processos ainda não tiverem sido


julgados, porque se um deles já tiver sido julgado não há porque conecta-lo a nada, visto que a
conexão se presta para haver um julgamento só, uma sentença “in simultaneus processos”.

A grande vantagem destes procedimentos esta na racionalização da Justiça, pois ao se


agrupar duas ou mais demandas se evita decisões conflitantes em caso similares, portanto,
evita-se o desprestigio da jurisdição e insegurança jurídica, mais do que isso, ao juntarmos as
demandas há economia processual, celeridade, e efetividade da jurisdição. Com estas
vantagens, podemos perceber que estas regras atendem interesse da Justiça e não das partes
e justamente por isso que é possível a modificação de Competências Absolutas.

 Conexão Penal

Art. 76, CPP – A competência será determinada pela conexão: I – se,


ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao
mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou por várias pessoas em
concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pessoas,
umas contra as outras; II – se, no mesmo caso, houverem sido umas
praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para conseguir
impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas; III – quando a
prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias
elementares influir na prova de outra infração.

A Conexão Penal se baseia nos componentes da Relação Jurídica de Direito Penal, ou


seja, basicamente nos seus sujeitos do crime: Sujeito Ativo do Crime; Sujeito Passivo do
Crime, e por óbvio a própria estrutura do delito.

Só haverá conexão em qualquer de suas modalidades se tivermos no mínimo duas ou


mais infrações penais, onde os crimes serão jungidos e julgados em um processo único.

o Intersubjetiva (Art. 76, I, CPP)

A Conexão Penal Intersubjetiva aproxima os delitos em razão de seus sujeitos.

 Por Simultaneidade ou Ocasional

A palavra ocasional é muito boa, pois lembra o chavão popular “que a ocasião faz o
ladrão”. E é mais ou menos isso que ocorre na Conexão Penal Intersubjetiva por
Simultaneidade ou Ocasional, por exemplo, cada um dos indivíduos que furtam a carga de um
caminhão lotado de latinhas de cerveja logo após um acidente, estarão interligados por esta
Conexão.

Kleber Luciano Ancioto Página 119


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Nesse sentido, essa conexão não se baseia na Teoria Monista, no plano conjunto do
crime, pois cada um pratica seu crime individualmente, com suas particularidades, por
exemplo, no caso do caminhão acidentado acima teve um que furtou só uma latinha, outro 4
caixas, teve outro que furtou o toca fitas do caminhão. Sendo assim, o Juiz individualizara a
pena para cada um, só que todos serão autuados no mesmo Processo, o Promotor formara
uma única denuncia narrando todos os fatos e o Juiz proferirá uma sentença com vários
capítulos condenatórios individualizando a pena para cada um dos participantes. A razão disso
é o aproveitamento processual, visto que todos estarão envolvidos em um único contexto.

 Por concurso de agentes

Neste caso a Conexão é baseada na Teoria Monista, no consílio de vontades, no liame


subjetivo dos coautores.

Suponhamos que ao invés do acidente (ocasional), três indivíduos se uniram para


furtar caminhões tendo cometido dois ou mais crimes com tudo planejado, não havendo nada
de ocasional. Dessa forma, temos dois ou mais crimes em que os coautores planejam os
delitos e todos responderão conjuntamente por cada um dos crimes separadamente.

Neste sentido, quando temos dois ou mais crimes interligados pelo concurso de
agentes, estaremos diante de uma conexão intersubjetiva por concurso de agentes.

 Por Reciprocidade

É a hipótese mais rara de acontecer, pois aqui os Sujeitos Ativos e Passivos do crime
são ao mesmo tempo Autores e Vítimas, por exemplo, o Crime de Rixa ou Lesão Corporal
Recíproca. Agressor e vítima responderão conjuntamente pelos crimes em um só Processo.

o Objetiva (Art. 76, II, CPP)

Na Conexão Penal Objetiva a relação de conexão não ocorre entre os sujeitos, mas sim
entre os crimes, inclusive, neste caso, podemos ter um único agente praticando mais de um
crime e estes crimes serem conexos.

Sendo assim, a Conexão Objetiva está ligada aos Delitos quando um crime está
conectado ao outro. No entanto, ela não se aplica aos Crimes Consuntivos ou Progressivos,
justamente por não existir a prática de dois crimes nestas situações, por exemplo, em um
Crime de Homicídio não há o Crime de Agressão Corporal em conexão, temos um crime só,
com lesões progressivas a um bem jurídico.

Art. 121, §2°, CP – Se o homicídio é cometido: [...] V – para assegurar a


execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: [...]

No dispositivo acima temos a sequência Consequencial do Crime de Homicídio, ou


seja, a qualificadora se presta para majorar a pena abstrata do indivíduo que é homicida e
pratica outros crimes conexos e por isso tudo será julgado no mesmo Juízo (Tribunal do Júri),
dessa forma, se o indivíduo mata e oculta o cadáver (consequencial), ou se ele furta, mas
percebe que alguém o viu e decide matar a testemunha (consequencial), todos os crimes serão
julgados pelo Tribunal do Júri.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Sabendo disso, podemos separar a Conexão Objetiva em duas modalidades:

 Teleológica ou Finalística

O verbo aqui é facilitar, ou seja, pratica-se um crime com a finalidade de facilitar outro
crime, o crime anterior é facilitador do posterior, mas não há relação de crime meio e crime
fim.

Por exemplo, o indivíduo que mata o marido com a finalidade de estuprar a mulher, os
dois crimes terão Conexão Objetiva Teleológica, por essa razão ele é qualificado e o Tribunal
do Júri atrai a competência de ambos.

 Consequencial

Na Conexão Consequencial teremos um crime como consequência de outro e o verbo


aqui é ocultar o primeiro crime ou obter impunidade ou vantagem.

Por exemplo, imaginemos um indivíduo que esta praticando um furto e é visto por
uma testemunha e para garantir a impunidade resolve matar a testemunha.

 Conexão Processual / Instrumental / Probatória (Art. 76, III, CPC)

Ate agora as Conexões levavam em consideração o Direito Penal e a partir daqui


veremos os casos de Conexão Processual, onde se leva em conta a racionalização da instrução
criminal ou em outras palavras, o melhor aproveitamento da instrução criminal em nome da
economia e celeridade do Processo.

Neste sentido, se em um depoimento uma testemunha gera instrução para dois


delitos, não há porque ouvi-la duas vezes.

Esta Conexão comumente ocorre quando os crimes estão intrinsicamente ligados,


como é o caso de crimes acessórios ou parasitários, que são crimes praticados em cima do
proveito do produto de outro crime. Por exemplo, o Crime de Receptação, se ficar provado o
crime anterior que gerou o produto receptado, prova-se por consequência a própria
receptação, visto que, comprovamos a existência do objeto material do Crime de Receptação,
no mesmo sentido, se provar o Crime de Tráfico, prova-se que houve o Crime de Lavagem de
Dinheiro, quando o traficante comprou um imóvel e colocou-o no nome do filho. No mesmo
sentido, nos Crimes de Favorecimento Real e Pessoal, ao provarmos a existência do primeiro
crime fica também comprovado o segundo.

Sendo assim, não faria sentido nos crimes onde há Conexão Processual serem julgados
em processos independentes, cada um tendo que fazer provas de suas constatações, visto que
é mais viável fazer uma única instrução e toca-los juntamente.

 Continência

Art. 77, CPP – A competência será determinada pela continência


quando: I – duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma

Kleber Luciano Ancioto Página 121


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

infração; II – no caso de infração cometida nas condições previstas nos


arts. 51, §1°, 53, segunda parte, e 54 do Código Penal.

Continência significa uma coisa que contém outra, portanto, teremos uma única
infração penal, no entanto, há contida nela mais de um agente ou mais de um resultado lesivo.

Em outras palavras, temos uma única conduta típica podendo ser desdobrada para
vários coautores e/ou com vários resultados lesivos.

o Por cumulação subjetiva (Art. 77, I, CPP)

Nada mais é que o concurso de agentes na hora de praticar um delito. Por exemplo,
João e José em conluio quebram a janela do veículo e furtam o cd player, ou seja, temos um
único crime, praticado em concurso de agentes.

o Por cumulação objetiva

É possível cumular objetivamente em um só crime os seus vários resultados lesivos,


nesse sentido, teremos essa cumulação em três situações: Concurso Formal, Erro na Execução
(aberratio ictus) ou Erro quanto ao Bem Jurídico Lesado (aberratio criminis).

 Concurso formal

É o caso, por exemplo, de um atropelamento de duas ou mais pessoas, pois neste caso,
não haverá um Júri para julgar cada morte, mas sim um único Júri para julgar todos os
resultados lesivos.

 Erro na execução

Nesta hipótese temos o exemplo do indivíduo que atira no desafeto matando-o, no


entanto, acerta também outro indivíduo que estava próximo a ele, levando-o a óbito, neste
caso teríamos o agente respondendo por homicídio doloso e culposo, ou seja, aberratio ictus
em unidade complexa (além do terceiro o pretendido também foi atingido).

 Erro quanto ao bem jurídico lesado

Aqui temos o caso do agente que quer atingir a integridade física de alguém, mas
acaba atingindo o patrimônio ou vice versa.

O aberratio criminis em unidade simples (quando somente ocorre o resultado não


pretendido), não interessa para continência. Já em unidade complexa (quando o bem
pretendido e o não pretendido são atingidos) é o que interessa, pois nestes casos ambos os
delitos serão julgados em um único processo por cumulação objetiva.

20/05/2015

FORO PREVALENTE – CONEXÃO E CONTINÊNCIA

Kleber Luciano Ancioto Página 122


DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Art. 78, CPP – Na determinação da competência por conexão ou


continência, serão observadas as seguintes regras: I – no concurso
entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum,
prevalecerá a competência do júri; II – no concurso de jurisdições da
mesma categoria: a) preponderará a do lugar da infração, à qual for
cominada a pena mais grave; b) prevalecerá a do lugar em que houver
ocorrido o maior número de infrações, se as respectivas penas forem
de igual gravidade; c) firmar-se-á a competência pela prevenção, nos
outros casos; III – no concurso de jurisdições de diversas categorias,
predominará a de maior graduação; IV – no concurso entre a jurisdição
comum e a especial, prevalecerá esta.

Conforme as regras dispostas acima, veremos qual Juiz fará prevalecer sua Jurisdição
sobre a do outro, ou seja, as regras servem para identificarmos o foro mais forte denominado
prevalente, no entanto, em alguns casos haverá cisão, pois se o conflito ocorrer entre dois
foros constitucionais, mesmo que haja conexão ou continência, estas regras não prevalecem
por tratar-se de regras infraconstitucionais.

Inciso I – Júri vs Justiça Comum

O Júri é o foro mais atrativo que temos no Sistema Processual, portanto, comumente
absorve crimes conexos, pois além de ser um foro constitucional é cláusula pétrea e o rito é o
mais solene que existe, possibilitando discutir a fundo qualquer crime. Por fim vale ressaltar
que o Tribunal do Júri, se vale da Plenitude de Defesa, o que acaba por ampliar a possibilidade
de Defesa para todos os crimes.

Dessa forma, o Júri é prevalente sobre a Justiça Comum, portanto, caso o agente
tente ou consuma qualquer outro crime conexo ao doloso contra a vida, quem julgará ambos
será o Tribunal do Júri.

O Júri, apenas não terá força atrativa contra foros constitucionais, dessa forma, se o
crime doloso contra a vida tiver conexão com crimes militares ou eleitorais, não serão atraídos
pelo Tribunal Júri, por exemplo, caso o fiscal eleitoral autue um candidato e ele o mata em
razão disso, o crime eleitoral será julgado para na Justiça Eleitoral e o doloso contra vida pelo
Tribunal do Júri. O mesmo ocorre com os foros por prerrogativa de função, dessa forma, caso
um Prefeito que possui foro por prerrogativa mata alguém em conluio com um capataz, o
Prefeito será julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado e o capataz pelo Tribunal do Júri.

 Foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela


Constituição Estadual.

Súmula 721, STF – A competência constitucional do Tribunal do Júri


prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido
exclusivamente pela Constituição Estadual.

É possível que a Constituição Estadual crie foros por prerrogativa de função para suas
autoridades, por tratar-se de uma norma simétrica, nesse sentido, o Estado Membro possui a
liberdade para se auto organizar e determinar quais autoridades serão julgadas pelo seu

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Tribunal. No entanto, o foro por prerrogativa de função previsto exclusivamente na


Constituição Estadual não prevalece sobre o Tribunal do Júri, nesse sentido, caso um indivíduo
que se enquadre nessa prerrogativa cometa um crime doloso contra a vida, será julgado pelo
Tribunal do Estado, no entanto, se ele praticar o crime em conluio com alguém que não possua
essa prerrogativa, ambos vão para o Tribunal do Júri.

Em resumo, quando o indivíduo (com prerrogativa) comete o crime sozinho ele possui
o foro dele, dessa forma será julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado, no entanto, quando
ele comete o crime com outro cidadão (sem prerrogativa) ele é puxado por conexão porque o
Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa estadual.

Vale ressaltar que o foro por prerrogativa é especializado, dessa forma, caso um
Prefeito pratique um Crime Eleitoral, será julgado pelo TRE (Tribunal Regional Eleitoral), já se o
Crime for Federal, será julgado pelo TRF (Tribunal Regional Federal) de seu Estado.

Sendo assim, caso um Prefeito em conluio com um capataz cometa um crime doloso
contra vida com o objetivo de encobrir um crime eleitoral, pelo homicídio o Prefeito será
julgado pelo Tribunal de Justiça enquanto que o capataz pelo Tribunal do Júri, já em relação ao
crime eleitoral o Prefeito será julgado pelo TRE e o capataz pela Justiça Eleitoral em 1°
Instância, não havendo conexão ou continência, pois estas situações já foram pacificadas pela
jurisprudência do Supremo.

Inciso II – Jurisdição de mesma categoria

Neste caso foros de Juízes que possuem competência territorial em 1° instância, por
exemplo, um indivíduo que rouba em Presidente Prudente – SP e leva o produto do crime para
um receptador em Pirapozinho – SP, em um primeiro critério de verificação do foro
prevalente, pelos crimes possuírem Conexão Instrumental, deverão ser julgados onde houve a
prática do crime com pena maior.

No entanto, se ambos possuírem a mesma pena, verificaremos em qual localidade


houve a prática de mais crimes. Por fim, se a pena for igual e a quantidade de crimes também,
será competente o foro prevento, ou seja, o que primeiro que tomar conhecimento.

Vale ressaltar, no entanto, que se houver violação das regras de prevenção não
caracterizará nulidade do Processo, ou seja, caso o juízo prevento seja o de Pirapozinho – SP,
mas o Ministério Público optar por ajuizar a Ação Penal em Presidente Prudente – SP, se o
advogado dos Réus não impetre Exceção de Incompetência, o juízo de Presidente Prudente
será o competente para julgar o caso.

Súmula 706, STF – É relativa a nulidade decorrente da inobservância


da competência penal por prevenção.

III – Jurisdição Especial vs Jurisdição Comum

A Jurisdição Especial se sobrepõe a Comum, neste sentido, se o agente falsifica um


documento para comprar votos, ambos os crimes serão julgados pela Justiça Eleitoral
(Especial).

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Só não haverá sobreposição quando ambos os crimes se referirem a Justiças Especiais,


pois se tratando de foros constitucionais ocorrerá a cisão e não a prorrogação de uma
competência sobre a outra.

Justiça Federal é considerada Justiça Comum, no entanto, se houver conflito entre a


Justiça Estadual Comum, prevalecerá a Federal, conforme prevê a Súmula 122 do STJ.

Súmula 122, STJ – Compete à Justiça Federal o processo e julgamento


unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não
se aplicando a regra do art. 78, II, a, do Código de Processo Penal.

Sendo assim, a Súmula acima trata a Justiça Federal como sendo um pouco mais
especializada que a Estadual, por isso ela atrairia as demandas conexas.

Em casos de crimes conexos envolvendo a competência da Justiça Eleitoral e da Justiça


Federal, teoricamente a Justiça Eleitoral prorrogaria sua competência sobre a Federal, no
entanto, a previsão da Justiça Federal é constitucional também, sendo assim, haverá cisão.

Em resumo, em que pese a Justiça Federal fazer parte da Justiça Comum sua
competência é definida pela Constituição, dessa forma, respeita-se a regra de que não haverá
prorrogação da competência de um foro constitucional sobre outro também constitucional. O
mesmo ocorre com o JECRIM que também possui competência definida na Constituição.

Inciso IV – Jurisdição de Categoria Superior vs Jurisdição Comum

Sumula 704 do STF – Não viola as garantias do juiz natural, da ampla


defesa e do devido processo legal a atração por continência ou
conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de
um dos denunciados.

Jurisdição de categoria superior puxa de categoria inferior, ou seja, o foro por


prerrogativa atrai a inferior.

SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA

Aqui mesmo que exista conexão, haverá cisão porque o Código determina e o principal
motivo dessa determinação é a divergência de rito que altera inclusive a sentença.

Justiça Comum vs Justiça Militar

Separamos a Justiça Comum da Militar porque esta última possui Código próprio
especializado em definir e julgar somente Crimes Militares (Art. 125, §4°, 1° parte, CF), no
entanto, conforme prevê a segunda parte do §4° do Art. 125 da CF, caso um militar
pratique um crime doloso contra a vida de um civil a competência será do Tribunal do Júri e
não da Justiça Militar.

Art. 125, §4°, CF – Compete à Justiça Militar estadual processar e


julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e
as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal


competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e
da graduação das praças.

Quem possui o Poder para deliberar se o crime é ou não doloso contra a vida é o
Tribunal do Júri. Dessa forma, se o policial dispara contra um civil e mata, o delegado deve
abrir o Inquérito para o Tribunal do Júri e não para a Justiça Militar, pois embora esta última
Justiça também seja especializada, deverá ceder espeço para que o Tribunal do Júri defina se
ele é o competente para julgar o caso ou não.

Justiça Comum vs Justiça da Infância

Partindo da premissa que criança não pratica crime, caso um adulto pratique crime em
conluio com uma criança, não haverá conexão, mas sim cisão, pois cada um terá um rito
diferente de julgamento.

Superveniência de Doença Mental

No mesmo sentido, caso um dos autores de um crime seja acometido por doença
mental superveniente, tornando-o inimputável, o Processo Criminal para este agente é
suspenso e o Juiz lhe nomeia um curador, enquanto para os demais, cuja sanidade mental
permanece intacta, o Processo corre normalmente. Isso ocorre porque o rito em relação ao
“louco” será outro, pois haverá necessidade de perícia (incidente de insanidade mental) e a
sentença neste caso será absolutória imprópria.

Revelia de Corréu

Caso um dos Réus não apareça na audiência, ele não será mais intimado para as
praticas de atos processuais (ou seja, não será mais comunicado dos atos processuais) e o
Processo e o Prazo Prescricional em relação a ele ficará suspenso.

Em resumo, os réus não revéis continuarão no Processo e haverá uma cisão com os
réus revéis.

SEPARAÇÃO FACULTATIVA

Aqui é o Juiz quem escolhe se vai ocorrer a cisão ou não, havendo três situações que o
Juiz possui a liberdade de cindir ou não o Processo de acordo com o interesse da Justiça.

Art. 80, CPP – Será facultativa a separação dos processos quando as


infrações tiverem sido praticadas em circunstâncias de tempo ou de
lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo número de acusados e
para não lhes prolongar a prisão provisória, ou por outro motivo
relevante, o juiz reputar conveniente a separação.

 Circunstâncias de Tempo e Lugar Diversos

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Suponhamos que temos dois crimes conexos, no entanto, um ocorreu na capital e


outro no interior, seis meses depois do primeiro, nestes casos o Juiz pode estabelecer cisão,
pois pode ser que se o primeiro esperar o segundo para ser julgado ocorra à prescrição.

 Excesso de Acusados

Como vimos acima a cisão pode ser determinada quando houver disparidade
temporal grande, mas também quando houver excesso de acusados, pois no rito ordinário
cada Réu pode arrolar até 8 testemunhas o que tornaria o procedimento muito demorado
incorrendo novamente no risco de ocorrer a prescrição. No mensalão, por exemplo, houve
cisão, onde a “plebe” foi distribuída por outros critérios de competência e o STF julgou apenas
a cúpula política.

 Motivo Relevante

Se houver qualquer outro motivo relevante fica a livre discricionariedade do Juiz cindir
o Processo ou não.

FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO

Foro privilegiado diz respeito a um privilegio pessoal, sendo, portanto, errado essa
utilização.

O foro por prerrogativa privilegia a função e não o indivíduo, existindo para preservar a
dignidade do cargo público, preservando a hierarquia administrativa, impedindo que quem
esteja em um patamar inferior julgue alguém de um patamar superior.

O foro por prerrogativa ocorre apenas na esfera criminal e só quando a autoridade


estiver no polo passivo da demanda. Por fim, é importante ressaltarmos que ele só pode estar
destacado no texto constitucional, sendo proibido qualquer Lei instituir ou modifica-lo.

Antes da CF/88 tínhamos a Sumula 394 do STF que instituía foro para ex ocupantes de
cargos públicos, ou seja, se o indivíduo tivesse sido uma vez na vida Prefeito de uma cidade ele
sempre seria julgado no Tribunal de Justiça do Estado, esta súmula, no entanto, foi cancelada
pela Súmula 451 do STF que aduz que a prerrogativa é do cargo e não pessoal, defendendo
uma posição mais republicana.

Súmula 394 do STF – Cometido o crime durante o exercício funcional,


prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda
que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação
daquele exercício.

Súmula 451, STF – A competência especial por prerrogativa de


função não se estende ao crime cometido após a cessação definitiva
do exercício funcional.

 Lei 10628/02

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

A Lei 10628/02 foi aprovada pelo Congresso em 24 de dezembro, na ocasião o


Fernando Henrique Cardoso tinha apenas mais uma semana da Presidência da República e a
Lei foi uma tentativa de proteger os membros do PSDB contra possíveis futuras tentativas do
PT de desmoralizar os membros do partido. Em outras palavras essa Lei tinha o condão de
blindar as autoridades tucanas, pois ela incluía dois parágrafos ao Art. 84 do CPP, onde no
primeiro ressuscitava textualmente a Súmula 394 do STF diferindo apenas quanto a
especificação que o foro por prerrogativa seria utilizado apenas com relação a Crimes Contra a
Administração Pública, ou seja, as referidas autoridades estavam deixando a Administração
Pública, no entanto, queriam continuar gozando da prerrogativa de função, através de um
mecanismo que a eternizava, no segundo parágrafo foram mais longe e deram foro por
prerrogativa de função para o julgamento de improbidade administrativa que é da esfera cível
e, portanto, não há prerrogativa respondendo as autoridades na Justiça Comum.

Art. 84 do CPP – A competência pela prerrogativa de função é do


Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos
Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do
Distrito Federal, relativamente às pessoas que devam responder
perante eles por crimes comuns e de responsabilidade.

Art. 84, § 1° do CPP - A competência especial por prerrogativa de


função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que
o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do
exercício da função pública. (Vide ADIN nº 2.797-2)

Art. 84, § 2° do CPP - A ação de improbidade, de que trata a Lei no


8.429, de 2 de junho de 1992, será proposta perante o tribunal
competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou
autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício
de função pública, observado o disposto no § 1o." (Vide ADIN nº 2.797-
2)

Em 2004 STF julgou a ADI 2.797-2, proposta pela CONAMP (Confederação Nacional do
Ministério Público) e a considerou procedente, declarando a inconstitucionalidade dos §§ 1° e
2° do Art. 84 do CPP, fundamentando que os referidos dispositivos violam:

1) O Princípio Republicano, criando foro privilegiado para ex ocupante de cargo;


2) O Princípio da Isonomia Material, visto que o ex ocupante volta a ser um cidadão
comum;
3) O Princípio da Impessoalidade, pois cria um foro para pessoa e não para o cargo
(Art. 37, CF);
4) Por fim, o grande fundamento foi que tal atitude violava o Princípio da Separação
de Poderes, pois o Legislativo usou a Lei para modificar um entendimento
jurisprudencial do Supremo (Sumula 451 que revogou a Súmula 354).

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