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OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR DO ESTADO SOB A FORMA DE REMISSÃO DA

PENA ANTE A SITUAÇÃO DEGRADANTE NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO:


UMA ANÁLISE DA DECISÃO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 580.252 DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

VAGHETTI, Rafael Batista

Resumo: O presente artigo tem como objetivo principal verificar a viabilidade a


partir da análise do Recurso Extraordinário 580.252 do STF de se aplicar o
instituto da remição de pena como forma de reparar o dano causado ao detento
pelo Estado na sua falha de não proporcionar condições mínimas de existência
dentro do Sistema Prisional brasileiro.

Palavras- chave: Execução Penal. Remição. Sistema Prisional.


Responsabilidade Civil. Dano moral.

1 INTRODUÇÃO

Os problemas relacionados ao sistema prisional brasileiro não são


nenhuma novidade. Em demasia se ouve denúncias de violações de Direitos
Humanos ocorridos dentro dos presídios. Todavia, ao invés de o Estado
implementar políticas públicas de melhorias das condições carcerárias, o que
se vê é uma clara omissão estatal e uma quantidade grande de indivíduos
sendo largados nessas prisões, entregues e vulneráveis a todo tipo de afronta
e violação a sua dignidade humana e o pior, não há um movimento por parte
da sociedade e dos governantes no sentido de melhorar esta situação.
A previsão Constitucional é categórica ao estabelecer que “o preso
conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a
todas as autoridades o respeito a sua integridade física e moral”. (BRASIL,
1984) Também, nessa esteira, dispõe o art. 3º da LEP que ao condenado e ao
internado estão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou
pela lei.
Em vista disso, é fundamental que se respeite as garantias
constitucionais conferidas ao executado, de modo que se ocorrer o desrespeito
a essas normas e princípios incorrerá em consequências desastrosas no que
diz respeito as finalidades da pena e da execução que é tornar possível o
retorno do preso ao convívio social, portanto todo tipo de desrespeito, deve ser
evitado.
Verifica-se porém, que longe do ideial normativo a realidade dos
Presídios brasileiros impõem um modo de vida ao detento devastador, de
modo que este em situação de extrema vulnerabilidade por estar privado de
sua liberdade e que portanto não poder prover seus meios de substência,
meios que dependem inteiramente do Estado no caso de reclusão, fica
inteiramente a mercê das consequências da omissão do Estado em não lhe
proporcionar condições carcerárias mínimas de existência resultando em todo
tipo de violação aos seus direitos fundamentais.
Surge nessa toada, já que o Estado não cumpre com a sua obrigação, o
dever de indenizar o preso submetido a situação degradante advinda do
sistema prisional brasileiro.
O presente Artigo portanto se dedica a analisar a possibilidade de se
aplicar o instituto da remição da pena posicionamento na origem trazido melo
eminente ministro Luís Roberto Barroso, como forma de compensar o preso
pelos danos morais provocados pelo Estado em não lhe proporcionar um
ambiente com um mínimo de possibilidade de subsistência, isso a partir da
análise do Recurso Extraordinário 580.252 do STF que em posição majoritária
decidiu que o mais adequado seria a indenização pecuniária.

2 EXECUÇÃO PENAL E SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

Inicialmente é salutar, compreendermos alguns conceitos que envolvem


a execução penal para uma melhor compreensão dos desdobramentos que a
posteriori ocorrerão.
A execução penal diz respeito à fase processual, na qual o Estado
efetiva a pretensão executória da pena ao tornar efetiva a punição do agente,
buscando desse modo atingir as finalidades da sanção penal. É regulamentada
pela lei 7.210/84, que é um conjunto de regras que objetivam dar cumprimento
às disposições de sentença ou decisão proferida em juízo criminal, tendo como
escopo garantir condições mínimas necessárias ao condenado e internado de
modo a possibilitar sua reeducação e ressocialização, as quais representam
uma das finalidades da pena. (BRASIL, 1984)
A meta principal da execução penal indubitavelmente é tornar possível a
reintegração do preso à sociedade, mas para que tal aspiração se concretize,
requer que se proporcione ao condenado a possibilidade de trabalhar, e
atualmente, que deve ser o principal enfoque, estudar (NUCCI, 2018).
O rol de garantias fundamentais a Constituição Federal de 1988
assevera em seu art. 5º, inc. XLVII que o cumprimento de pena será em
estabelecimentos distintos, conforme a natureza do delito a idade e o sexo do
apenado e também prevê no inc. XLIX do artigo supracitado que aos presos se
deve assegurar o respeito à integridade física e moral. (BRASIL, 1988)
Sendo assim, quando o executado está sob a custódia do Estado, a este
incumbe prestar assistência àquele, conforme sejam as suas necessidades, de
modo a fornecer o que é mais básico e salutar, para que não ocorra afronta ao
princípio da dignidade da pessoa humana, por que limitado em sua liberdade, e
no exercício de certas garantias constitucionais em decorrência da privação de
sua liberdade o apenado, não pode por si, prover tudo o que é essencial para
sua subsistência, daí decorre o dever de o Estado ampará-lo e suportar o ônus
que desta relação jurídica se origina (MARCÃO, 2012)
Assim como o art. 5º, inc. XLIX, da CF/88 resguarda aos presos o
respeito à integridade física e moral o art. 38 do CP preceitua que “o preso
conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a
todas as autoridades o respeito a sua integridade física e moral”. (BRASIL,
1940) Também, nessa esteira, dispõe o art. 3º da LEP que ao condenado e ao
internado estão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou
pela lei.
Por esta razão, é fundamental que se respeite as garantias
constitucionais conferidas ao executado, de modo que se ocorrer o desrespeito
a essas normas e princípios incorrerá em consequências desastrosas no que
diz respeito as finalidades da pena e da execução que é tornar possível o
retorno do preso ao convívio social. Portanto, todo tipo de desrespeito, deve
ser evitado.

2.1 A EXECUÇÃO PENAL E A SUA FUNÇÃO INVERSA APONTADA PELA


DOUTRINA
Tendo em vista o que já fora discorrido no presente artigo acerca
da execução penal resta superado o entendimento de que o objetivo principal
da Execução Penal é tornar viável o retorno do infrator da lei penal ao convívio
social. Todavia, a doutrina aponta inadequações da Execução Penal no Brasil,
constatando que ao contrário do ideal normativo que estabelece um mínimo de
condições de subsistência e dignidade à vida do preso no estabelecimento
prisional, o que se vê na realidade é uma falha gravíssima por parte do Estado
por não fornecer uma estrutura que possibilite uma vida pelo menos mais digna
ao apenado levando em consideração que este, em razão de sua privação de
liberdade, portanto em extrema vulnerabilidade, não tem condições de prover
seus meios de subsistência e acaba por encontrar-se refém dessa omissão do
Estado quanto a sua vida na prisão.
Alessandro Baratta em sua obra Criminologia e Crítica do Direito Penal,
faz interessante análise demonstrando através de exames clínicos realizados,
os efeitos nefastos do encarceramento na vida dos apenados. Conclui-se a
partir dessas análises que um longo período de encarceramento e
distanciamento da sociedade é ineficaz em termos de a pena possibilitar a
transformação de um delinquente violento altamente perigoso em alguém
sociável, adaptável ao meio social etc. e que a pena não atinge seu ideal de
ressocialização ou educação. (BARATTA, 2002, p.184)
Nessa toada verifica-se na verdade conforme Baratta que há uma
desculturação e a aculturação do indivíduo preso. Desculturação na definição
do autor significa desadaptar o indivíduo para a vida em sociedade, pois
suprime dele a noção de realidade formando assim uma realidade ilusória. Já a
aculturação tem o significado de estar o indivíduo preso a subcultura carcerária
tornando-o um educado para ser criminoso e também para ser um bom preso.
Nas palavras de Baratta (2002, p.185) portanto constitui o verdadeiro objetivo
da prisão:

A educação para ser um bom preso ocorre, em parte,


também no âmbito ta comunidade dos detidos, dado que a assunção
de um certo grau de ordem, da qual os chefes dos detidos se fazem
garantes frente ao staff (em troca de privilégios), faz parte dos fins
reconhecidos nesta comunidade, esta educação ocorre, ademais,
através da aceitação das normas formais da instituição, e das
informais postas em ação pelo staff. Em geral, pode-se dizer que a
adaptação a estas normas tende a interiorizar modelos exteriores de
comportamento, que servem ao ordenado desenvolvimento da vida
da instituição. (Baratta, 2002, p. 185)
Nessa esteira, Baratta (2002, p.186) demonstra a incoerência, vez que
se propõe a reinserção social do indivíduo através da exclusão, afirmando
ainda que o cárcere é o reflexo da própria sociedade: “antes de mudar os
excluídos, é preciso mudar a sociedade excludente, atacando assim na raiz o
mecanismo de exclusão”. (Baratta, 2002)
Diante disso, tendo em vista o tratamento o tratamento conferido por
parte da sociedade ao egresso, há a tendência de se rotular o encarcerado
tornando-o marginalizado e excluído de seu meio social.
Para gerar um melhor entendimento acerca das finalidades da Execução
Penal necessário se faz abordar um dos temas mais palpitantes e importantes
do Direito Penal que é a Teoria da Pena e suas finalidades.

2.2 ORIGEM DAS PENAS

Percebe-se que desde a antiguidade, até especificamente no século


XVIII as penas possuíam um aspecto de provocar uma extrema aflição e dor ao
agente punido, uma vez que seu corpo é quem pagava pelo mal por ele
praticado. (GRECO, 2015)
Uma mudança radical no sistema de aplicação das punições veio a
ocorrer no período iluminista, principalmente no século XVIII, pois o
pensamento dessa época fora um marco inicial para uma transformação na
mentalidade concernente à cominação das penas. As ideias de Beccaria na
sua obra intitulada “Dos delitos e das penas”, ressoaram em tom de indignação
acerca de como os seres humanos estavam sendo tratados pelos seus
próprios semelhantes, em nome da legalidade e da justiça (GRECO, 2015)
Verifica-se atualmente que, nos países ocidentais, há uma
conscientização maior com a integridade física e mental dos seres humanos.
Com o advento da Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada
pela Assembleia-geral- das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948
momento posterior ao final da segunda guerra mundial, consagrou-se o
princípio da dignidade da pessoa humana, o que causou um afastamento de
boa parte dos ordenamentos jurídicos, os tratamentos degradantes e cruéis a
exemplo da Constituição Federal brasileira de 1988.
Nas palavras de Alexandre Greco (2015) o sistema de penas não está
sendo conduzido em direção ao progresso, pois através de discursos políticos
oportunistas com vistas a angariar votos, popularidade e aceitação do povo, se
prega a violência contra os que cometem crimes bem como se defende a
criação de pena cruéis dando ao discurso o sentido de que se adotada tais
medidas boa parte dos problemas relacionados a violência serão efetivamente
resolvidos, senão vejamos:

O sistema de penas, infelizmente, não caminha numa escala


ascendente, na qual os exemplos do passado deviam servir tão
somente para que não mais fossem repetidos. A sociedade,
amedrontada com a elevação do índice de criminalidade, induzida
pelos políticos oportunistas, cada vez mais apregoa a criação de
penas cruéis, tais como a castração, nos casos de crimes de estupro,
por exemplo, ou mesmo a pena de morte. (GRECO, 2015, p. 536).

Ressalte-se que integra o ordenamento jurídico de países que se


denominam desenvolvidos e cultos, podendo dar-se o exemplo dos Estados
Unidos da América, a pena de morte na forma de cadeira elétrica, injeção letal
etc. constituindo desse modo, uma afronta aos pactos de direitos humanos
firmados com a ONU.

2.3 FINALIDADE DA PENA

Há farta discussão, atualmente acerca das funções que devem ser


atribuídas às penas. O Código Penal brasileiro, no seu art. 59, prevê que as
penas devem ser necessárias e suficientes a reprovação e prevenção do crime.
Sendo assim, à luz da legislação penal pátria, fica claro que a pena deve
reprovar o mal praticado pela conduta criminosa do agente, como também
prevenir futuras infrações penais (GRECO, 2015)
Leciona Nucci que a pena tem vários fins comuns e não excludentes a
saber: retribuição e prevenção. Destaque-se que as teorias tidas como
absolutas defendem a tese da retribuição e as teorias relativas a prevenção.
(NUCCI, 2018)
2.3.1 A retribuição

Esta finalidade, em geral contenta mais a sociedade, porque traz em si o


sentido de pagamento ou compensação ao condenado pelo crime que
cometeu, desde que, claro, a pena seja privativa de liberdade, caso contrário,
se, por exemplo, ao condenado for aplicada uma pena restritiva de direitos ou
de multa, iria gerar para a população uma sensação de impunidade, porque
isso é um fato, o homem ainda se alegra com o sofrimento do infrator no
cárcere. (GRECO, 2015)
À luz das teorias absolutas, constitui a função da pena ser meramente
retributiva como um fim em si mesmo, que é a consequência jurídica do delito,
cuja noção está próxima da ideia de vingança. Entre tais teorias existem as
ideias de sanção penal como retribuição divina, estética, moral e jurídica.
Para retribuição divina, arguida por Sthall, a pena é um mal e o Estado,
como um representante de Deus tem o direito de punir. (Bissoli Filho, 2010)
Fernando Capez aduz que a retribuição dentro da teoria absoluta,
significa que a finalidade da pena é impor uma punição ao autor. A pena é a
recompensa do mal injusto praticado pelo criminoso, pelo mal justo preceituado
no ordenamento jurídico (Capez, 2012)

2.3.2 Prevenção

Destaque-se ainda as teorias relativas, utilitárias ou preventivas que, ao


contrário das absolutas, consideram na sanção penal o papel da prevenção,
como um papel extrínseco de impedirem o delito, de punir “para que não se
volte a delinquir.
O caráter preventivo da pena leciona Guilherme Nucci, constitui-se em
dois lados: a) geral, subdivido em outros dois: a;1) preventivo positivo: a
aplicação a aplicação da pena tem por finalidade reafirmar à sociedade a
existência e a força do Direito Penal; a.2)preventivo negativo: a pena
consumada fortalece o poder intimidador do Estado alertando desse modo a
toda sociedade, destinatária da norma penal; b)especial, se subdivide em dois
aspectos: b.1) preventivo positivo: se refere a natureza reeducativa e
ressocializadora da pena, com vistas a preparar o condenado para uma nova
vida, lhe trazendo a consciência de dever respeitar as regras impostas no
ordenamento jurídico. (NUCCI, 2018).

2.4 SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

Conforme já dito muitos são os problemas relacionados as prisões no


Brasil. A superlotação carcerária, desestruturação das penitenciárias, não
reeducação do apenado faz com que em termos jurídicos nos permita definir tal
situação como “estado inconstitucional de coisas”, o cenário em comento foi
reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal em decisão liminar no julgamento
da ADPF 347, na qual o eminente Ministro Marco Aurélio deixa enfatizada a
precariedade estrutural dos presídios brasileiros, bem como, a situação
degradante e desumana em que se encontram os presos que ocupam esses
locais. Nas palavras do Min. Marco Aurélio:

As penas privativas de liberdade aplicadas em nossos presídios


convertem-se em penas cruéis e desumanas. Os presos tornam-se
lixo digno do pior tratamento possível, sendo-lhes negado todo e
qualquer direito à existência minimamente segura e salubre. (Brasil,
2018)

Assim como o art. 5º, inc. XLIX, da CF/88 resguarda aos presos o
respeito à integridade física e moral o art. 38 do CP preceitua que “o preso
conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a
todas as autoridades o respeito a sua integridade física e moral”. (BRASIL,
1984) Também, nessa esteira, dispõe o art. 3º da LEP que ao condenado e ao
internado estão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou
pela lei.
Em vista disso, é fundamental que se respeite as garantias
constitucionais conferidas ao executado, de modo que se ocorrer o desrespeito
a essas normas e princípios incorrerá em consequências desastrosas no que
diz respeito as finalidades da pena e da execução que é tornar possível o
retorno do preso ao convívio social, portanto todo tipo de desrespeito, deve ser
evitado.
Muito embora seja um dos maiores sistemas do mundo, o sistema
carcerário brasileiro está longe de ser um modelo a ser seguido. Muitos autores
se debruçam sobre o tema, entre os quais pode-se citar Wacquant, que fala em
seu livro prisões da miséria acerca das condições estruturais dos presídios
brasileiros, o qual demonstra muito bem, o claro abismo entre o ideal normativo
e a realidade prática, pois se percebe que nessas instituições destinadas ao
cumprimento da pena há uma evidente violação aos direitos humanos e às
garantias fundamentais postas na Constituição Federal brasileira, haja vista
serem locais, em sua maioria, de total insuficiência estrutural, traduzida na falta
de tratamento de esgoto, higiene nas celas, na forma como é servida a
alimentação, local adequado para acomodação dos presos, que por muitas
vezes, por falta de espaço, acabam dormindo um por cima dos outros,
tornando evidente a situação degradante em que se encontram.
Para Eugenio Raul Zaffaroni, a prisão consiste em uma verdadeira
máquina deteriorante, haja vista que ao preso são impostas condições de vida
incompatíveis com a vida de um adulto, sua autoestima é afetada de todas as
formas imagináveis, pois faz parte da sua rotina, falta de privacidade, falta de
higiene, alimentação precária, superlotação, etc. (ZAFFARONI, 1991).
Salo de Carvalho por sua vez faz a comparação de um apenado à um
apátrida, pois, ao receber uma sentença condenatória, seus direitos políticos
são temporariamente suspensos, com isso lhe seria retirada a chamada
cidadania formal que é uma previsão constitucional e fora conquistada pela
humanidade depois de um período de grandes batalhas contra déspotas
opressores (CARVALHO, 2003)
Há muito tempo, já se afirmava que o Sistema Penitenciário Brasileiro
constituía-se como o pior do terceiro mundo. Em seu livro as prisões da miséria
Loïc Wacquant afirmava que este estigma que o Brasil carrega de ter as piores
cadeias do mundo se deve ao fato dentre outros fatores à indiferença dos
políticos e da própria sociedade, que de algum modo simpatizam e se mostram
favoráveis aos excessos cometidos no campo correcional.

Os estabelecimentos carcerários do Brasil padecem de doenças que


lembram os calabouços feudais. Seus prédios são tipicamente decrépitos e
insalubres, com concreto desmoronando por toda parte, pintura descascando,
encanamento deficiente e instalações elétricas defeituosas, com água de
esgoto correndo pelo chão ou caindo pelas paredes – o fedor dos dejetos era
tão forte na cadeia “modelo” de Lemos de Brito (Rio de Janeiro) na primavera
de 2001 que um dos bens mais apreciados pelos presos era o desinfetante
perfumado que borrifavam em suas celas na tentativa de combater a sufocante
pestilência. A extrema ruína física e a grotesca superlotação criam condições
de vida abomináveis e uma situação catastrófica em termos de higiene, diante
da total falta de espaço, ar, luz, água e muitas vezes comida (WACQUANT,
2001).
Diante deste relato, depreende-se que a situação nos presídios do Brasil
é gravíssima e que há uma falha descomunal por parte do Estado em não
conseguir atingir os ideais normativos previstos da Constituição Federal,
afrontando desse modo princípios basilares de um Estado Democrático de
Direito como a dignidade da pessoa humana.
Nessa falha gravíssima do Estado de oferecer condições precárias aos
que cumprem pena nos estabelecimentos prisionais brasileiros, não há como
não reconhecer que o mesmo pratica ato ilícito contra os apenados, uma vez
que estes estão submetidos à toda espécie de tratamento desumano, gerando
desse modo o dever do Estado de indenizar pelos danos morais causados a
estes.
A lei de execução penal, por sua vez, no seu art. 23 prevê a
possibilidade de remição da pena, a qual fora defendida no recurso
extraordinário 580.252 pelos eminentes Ministros do STF Luís Roberto
Barroso, Luiz Fux e Celso de Mello como a melhor maneira de compensar o
preso pelos danos causados por parte do Estado em não lhe fornecer estrutura
adequada para o seu cumprimento de pena.
O referido recurso extraordinário 580.252 do Supremo Tribunal Federal,
o qual será objeto de análise do presente artigo, trata da discussão do dever
do Estado de indenizar o preso que está submetido a situação degradante e
desumana. No julgamento do referido recurso, houve dois diferentes
posicionamentos: o majoritário entendeu que a melhor forma de compensar o
preso exposto a situação degradante no sistema prisional é indenizá-lo em
dinheiro, o minoritário por sua vez, proposto pelo eminente Ministro Luís
Roberto Barroso e seguido por Luiz Fux e Celso de Mello é de que se
substituísse a indenização em dinheiro pelo instituto da remição da pena.

2.4 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

A dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos do Estado


Democrático de Direito, tal princípio encontra-se consagrado na Constituição
Federal Brasileira em seu art. 1º inc. III. (BRASIL, 1988). É uma fonte da qual
todos os demais preceitos e normas deverão ser interpretados, devendo
manter-se em estrita observância aos valores dela emanados.
Os tratados internacionais e as constituições acolhem e proclamam o
princípio da dignidade da pessoa humana. Este princípio está consagrado em
todas as declarações e tratados internacionais sobre direitos humanos em
nada mais nada menos que 149 constituições nacionais, das 194 que hoje
estão em vigor. Também é reconhecida a sua eficácia em países cijas
constituições não contém menção expressa ao princípio, como a França e os
Estados Unidos. (Sarmento, 2016).
Constitui, no entanto grande desafio conceituar este princípio dado à sua
abrangência e complexidade uma vez que é questionável a viabilidade de se
alcançar um conceito que o possa definir de forma exaustiva, pois afinal de
contas, dignidade é uma palavra que possui diversos significados, mas
normalmente associada a merecimento ético em razão de um status social ou
de condutas baseadas na honestidade e honradez. Dignidade é atribuída a
quem seja merecedor.
O eminente doutrinador, Ingo Wolfgang Sarlet, objetivando conceituar
com máxima afinidade possível em uma concepção multidimensional, aberta e
inclusiva de dignidade da pessoa humana, conceitua tal princípio nesses
termos:

Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e


distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do
mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da
comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e
deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e
qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe
garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável,
além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável
nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os
demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres
que integram a rede da vida. (SARLET, 2011, p. 38)

Historicamente o direito penal tem como primordial função, garantir a


ordem econômica e social, a proteção dos bens indispensáveis à subsistência
da vida humana e da vida em sociedade , esta que, exerce grande influência
para que o legislador possa determinar e selecionar quais bens jurídicos são
de maior valor e importância e devem ser protegidos pelo poder estatal através
da lei penal.
Fazendo uma retrospectiva através da historia, chegamos ao
conhecimento do fato de que houve um longo período de trevas na maneira
como o direito penal tipificava os crimes bem como a maneira desumana e
cruel de aplicar as punições, desrespeitando deliberadamente o que
atualmente é um dos fundamentos do estado democrático de direito em nossa
carta magna no seu artigo 1º e no inciso III “a dignidade da pessoa humana”.
(BRASIL, 1988)
Neste período histórico onde a ciência penal, criminal e processual não
era avançada, a pena para os crimes graves era executada de maneira severa
impetuosa e desproporcional ao crime cometido em que condenado era
submetido a uma sequência de atos sistemáticos que tinha por finalidade
causar sofrimento físico e psicológico e também de emitir a mensagem:
“estamos aqui, essa é a conseqüência para os que enveredam para este
caminho desrespeitando as regras”. (Focault, 1987)
A execução da sentença contava com a presença da expressiva platéia,
esta, assistia perplexa ao espetáculo que misturava gritos de dor do
sentenciado e as partes do seu corpo que tecnicamente era despedaçado por
cavalos que puxavam as tenazes presas ao seu corpo (mamilos, braços, coxas
e barriga da perna) expurgando “efetivamente” o mal causado a outrem e à
sociedade. (Focault, 1987)
Trata-se de uma maneira arcaica e descomunal de o direito penal
regular as relações humanas e também de exercer controle social onde
prevalecia o principio “olho por olho, dente por dente” sem total consideração à
pessoa humana do condenado.
Chega-se a conclusão, portanto que tinha o direito penal em outras
épocas, finalidades que se diferenciam das de hoje, pois o atual direito penal
está assentado sobre um ordenamento jurídico bem estruturado fundamentado
em princípios democráticos o qual estabelece pelo princípio da intervenção
mínima limites ao poder do estado de punir e de legislar em matérias penais.
Atualmente, com o surgimento dos direitos humanos, o conceito de
dignidade humana ocupa papel fundamental em nosso ordenamento jurídico
cujo conceito aduz que todo ser humano, sem distinção, possui dignidade, pois
lhe é inerente a sua natureza, sendo este princípio de valor universal, que
existe pelo simples fato da existência do ser humano, fazendo este jus a ser
respeitado de modo igualitário por seus semelhantes.

3 ATO ILICITO

3.1 CONCEITO

Na esfera do direito civil existe o instituto do ato ilícito que consiste em


uma conduta praticada por um agente contra o direito, de forma voluntária ou
não, ocasionando um dano a outrem, podendo formar-se de ato único, ou de
série de atos, ou de conduta ilícita.

Quando o agente pratica o ato volitivo, quer especificamente para


atingir efeitos jurídicos, ou não, estaremos no campo já estudado dos
negócios jurídicos.
Se o agente dos negócios e atos jurídicos, por ação ou omissão,
pratica atos contra o Direito, com ou sem intenção manifesta de
prejudicar, mas ocasiona prejuízo, dano a outrem, estamos no campo
dos atos ilícitos. O ato ilícito pode constituir-se de ato único, ou de
série de atos, ou de conduta ilícita. (VENOSA, 2002, p.571)

O Código Civil atual no seu art. 186 refere-se ao dano moral, nesses
termos: “Art. 186 Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito” (BRASIL, 2002).
Também, o Código Civil no seu art. 927 preconiza que “aquele que, por ato
ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. (BRASIL, 2002)
É cediço que em se tratando de responsabilidade civil, o agente que
cometeu ato ilícito tem a obrigação de reparar o dano patrimonial ou moral
causado, com vistas a reparar o prejuízo, de modo que se restaure o status
quo ante, obrigação esta que se não for mais possível, é transformada no
pagamento de uma indenização (de natureza pecuniária) ou de uma
compensação (na hipótese de não ser mensurável patrimonialmente este
dano), enquanto que pela responsabilidade penal ou criminal, deve o agente,
sofrer a aplicação de uma cominação legal, que pode ser privativa de
liberdade, restritiva de direitos ou mesmo pecuniária.

3.2 RESPONSABILIDADE CIVIL

A palavra responsabilidade tem sua origem na raiz latina spondeo,


através da qual se vinculava o devedor, solenemente, nos contratos verbais do
direito romano. Existem várias acepções do termo, algumas fundadas na
doutrina do livre-arbítrio e outras em motivações psicológicas, ressalte-se a
noção de responsabilidade como aspecto da realidade social.
Todo acontecimento que gera prejuízo, traz consigo, como fato social, o
problema da responsabilidade. Destina-se portanto a responsabilidade a
restabelecer o equilíbrio moral e patrimonial causado pelo autor do dano.
Pelo fato de as atividades humanas serem múltiplas, inúmeras são as
formas de responsabilidade, que englobam todos os ramos do direito e
ultrapassam os limites da vida jurídica, conforme leciona Carlos Roberto
Gonçalves:

Pode-se afirmar, portanto, que responsabilidade exprime a idéia de


restauração e equilíbrio, de contraprestação, de reparação de dano.
Sendo mutliplas as atividades humanas, inúmeras são também as
espécies de responsabilidade, que abrangem todos os ramos do
direito e extravasm os limites da vida jurídica, para se ligar a todos os
domínios da vida social (Gonçalves, 2012, p. 19)

O instituto da responsabilidade civil integra a do direito obrigacional,


posto que a principal consequência da prática de um ato ilícito é a obrigação
que acarreta para o seu autor de reparar o dano causado, obrigação de
natureza pessoal que se resolve em perdas e danos. (Gonçalves, 2012)
3.3 DIFERENÇA ENTRE OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE

Obrigação se refere ao vínculo jurídico que dá ao credor, sujeito ativo da


relação contratual, o direito de exigir do devedor, sujeito passivo da relação, o
cumprimento do que fora acordado no contrato. Tem caráter transitório e
constitui uma relação de natureza pessoal, de crédito e de débito, cujo objeto
consiste numa prestação economicamente mensurável. (GONÇALVES, 2012)
Leciona Paulo Nader (2014) a palavra obrigação pode ser empregada
subjetiva e objetivamente, e que sob o primeiro aspecto, diz respeito ao sub-
ramo do Direito Civil, que trata acerca das relações jurídicas entre credor e
devedor, sendo que a partir dessa relação nasce um vínculo de natureza
patrimonial, tendo por finalidade justiça e segurança vejamos:

A palavra obrigação – centro de nossas atenções neste


livro – pode ser empregada objetiva ou subjetivamente.
Sob o primeiro sentido, refere-se ao sub-ramo do Direito
Civil , que disciplina as relações jurídicas entre credor e
devedor. Tais vínculos são de conteúdo patrimonial, mais
especificamente de crédito. Como toda ramificação da
árvore jurídica, o Direito das Obrigações é reunião de
princípios e de normas de conduta social que tem por
causa final os valores, justiça e segurança. (Nader, 2014,
p.3)

Desse modo a obrigação poderá passar a exisitir a partir de diversas


fontes e tem de ser cumprido de maneira livre e espontânea, caso contrário
sobrevém o inadimplemento, gerando assim a responsabilidade. Portanto não
podem se confudir, obrigação e responsabilidade, haja vista que esta só terá o
seu surgimento caso o devedor não cumpra de forma voluntária aquela.

4 ANÁLISE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 580.252 DO STF


4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O recurso que ora será analisado, diz respeito a um acórdão recorrido pela
Defensoria Pública do estado do Mato Grosso do Sul, em favor de um
condenado a 20 anos de reclusão, que se encontrava submetido a situação
degradante devido as condições sanitárias e estruturais do presídio e também
a superlotação carcerária, em Corumbá. A decisão da suprema corte
estabeleceu que o preso em situação degradante e de superlotação, tem direito
a indenização por parte do Estado por danos morais. O valor da indenização no
caso em tela foi fixado em R$ 2.000,00
Todavia, cumpre ressaltar que, no julgamento do referido recurso, houve
dois diferentes posicionamentos: o majoritário entendeu que a melhor forma de
compensar o preso exposto a situação degradante no sistema prisional é
indenizá-lo em dinheiro, o minoritário por sua vez, proposto pelo eminente
Ministro Luís Roberto Barroso e seguido por Luiz Fux e Celso de Mello é de
que se substituísse a indenização em dinheiro pelo instituto da remição da
pena. Destarte, verificar-se-á entre as duas posições a forma de aplicar que
melhor atende aos princípios constitucionais ante ao dever do Estado de
indenizar o preso submetido a situação desumana e degradante no sistema
prisional brasileiro.

4.2 REMIÇÃO DA PENA

Diz respeito ao desconto da pena do tempo relativo ao trabalho ou


estudo do condenado, conforme a proporção prevista em lei. Trata-se de um
incentivo dado ao condenado permitindo que o mesmo possa desenvolver uma
atividade laborterápica ou ingresse em curso de qualquer nível, de modo que
possa melhorar a sua formação, objetivando desse modo atingir uma das
finalidades da pena qual seja a reeducação, pois é incontroverso que trabalhar
ou estudar são fortes instrumentos para tanto além disso, o trabalho constitui
um dos deveres do preso. (NUCCI, 2018)

A remição somente é viável quando o sentenciado estiver nos regimes


fechado e semiaberto, pois, nessas hipóteses, como regra, deve trabalhar ou
estudar no estabelecimento penitenciário em que estiver cumprindo pena.
É contado o tempo remido pela “razão de um dia de pena por três de
trabalho (Art. 126, § 1º, II, da LEP) ou à razão de um dia por doze horas de
estudo, dividias por no mínimo três dias (art. 126, § 1º, I, da LEP).

Ressalte-se que no regime aberto, não cabe remição pelo trabalho, pois
é obrigação do condenado, como condição para permanecer no mencionado
regime, a prática de exercício de atividade laboral honesta, art.39 LEP.
Todavia, A Lei 12.433/2011, sancionou a remição em regime aberto, pelo
estudo, como forma de incentivo ao sentenciado para tal atividade. (BRASIL,
2011)

Os requisitos para remição são os seguintes a) três dias de trabalho ou


de estudo, à razão de 6 horas de trabalho por dia e 4 horas de estudo; b)
atestado de trabalho ou frequência escolar apresentado pela direção do
presídio, que goza de presunção de veracidade; c) exercício de trabalho ou
estudo reconhecido pelo estabelecimento prisional. (BRASIL, 1984)

Vale ressaltar também que as regras relacionadas à remição por trabalho e por
estudo são aplicáveis, sem restrições aos condenados por crimes hediondos
ou equivalentes.

4.2.1 As espécies de remição

4.2.2.1 A remição pelo trabalho

A remição em razão do trabalho encontra-se prevista na Lei de


Execução Penal, e prevê um dia de pena a menos a cada três dias de trabalho.
É um direito que só tem aquele que cumpre pena em regime fechado ou
semiaberto. No mês de maio do ano 2015 , a 3ª seção do Superior Tribunal de
Justiça decidiu que o trabalho externo pode ser contado para a remição da
pena e que não precisa ser necessariamente o trabalho ser exercido no âmbito
do estabelecimento prisional
Ressalte-se a princípio que, a idéia de que um condenado trabalha para
pagar uma dívida que este contraiu para com a sociedade em decorrência do
crime cometido já está a muito superada.

Adeildo Nunes (2016), preconiza ser um direito do preso o trabalho


prisional, e que o Estado tem por obrigação garantir o trabalho no período de
cumprimento de pena do condenado.
O referido autor à luz do art. 28, caput, da Lei de Execução Penal,
defende que o trabalho constitui um dever social do preso, pois exalta a sua
dignidade humana e que tem a capacidade de promover uma atividade
educativa para o apenado. (Nunes, 2016)

4.2.2.2 A remição por estudo

Diz respeito ao direito do condenado que cumpre no regime fechado ou


semiaberto de remir a sua pena por meio do estudo. A cada 12 horas de
frequência escolar pode remir 1 dia da pena, caracterizada por atividade de
ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, superior, ou ainda de
requalificação profissional. (Brasil, 2013)
De acordo com a recomendação n. 44 do CNJ, para fins de remição por
estudo deve ser considerado o número de horas que corresponde a efetiva
participação do condenado nas atividades educacionais, independente de
aproveitamento, com exceção de quando o apenado for autorizado a estudar
fora do estabelecimento prisional, caso em que deverá comprovar,
mensalmente por meio da instituição a que compete, tanto a frequência, quanto
o aproveitamento escolar. (Brasil, 2013)
O artigo 126, § 6º, da Lei de Execução Penal, também concede o direito
de remissão aquele que se encontre sob livramento condicional, também, o §7ª
do referido artigo inclui os presos cautelares, ficando a possibilidade de
abatimento condicionada a uma possível futura condenação. (Marcão, 2016)

4.2.2.3 A remição pela leitura

A remição pela leitura já é possível em diversos presídios do país e a


Recomendação n. 44 do CNJ, diz que a remição de pena sob a forma de leitura
deve ser estimulada como forma de atividade complementar, especialmente
aos apenados que não tem condições de trabalhar ou aos quais não há o
fornecimento das condições para a educação formal e qualificação profissional.
É necessário que haja a elaboração de um projeto pela autoridade
penitenciária estadual ou federal objetivando a remição pela leitura e
garantindo que exista uma biblioteca com um bom acervo de livros e que seja
de forma voluntária a participação do preso nas atividades de leitura. (Brasil,
2013)
A norma preceitua que o preso deve ter o prazo de 22 a 30 dias para a leitura
de uma obra, apresentando no findar do prazo uma resenha sobre o assunto
contido no livro. A comissão organizadora do projeto irá avaliar. Cada obra lida
da o direito de 4quatro dias de pena remida a cada doze meses (Brasil, 2013)

4.3 A A REMIÇÃO DA PENA COMO FORMA DE INDENIZAR O PRESO


EXPOSTO A SITUAÇÃO DEGRADANTE NO SISTEMA PRISIONAL
BRASILEIRO

A questão que suscitou a possibilidade e a necessidade de


indenizar o preso pelos danos morais sofridos no degradante ambiente da
maior parte das penitenciarias do Brasil foi o Recurso Extraordinário 580.252
de relatoria do ex ministro do STF Teori Zavascki, de saudosa memória.
O referido recurso envolve ação de reparação de danos morais
proposta pela Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso do Sul, pleiteando
contra o Estado a sua condenação ao pagamento de um salário mínimo
mensal ao condenado recorrente, enquanto este permanecesse submetido a
superlotação e ao tratamento desumano.
Na origem, o Juiz a quo, julgou a demanda improcedente e
posterior acórdão do egrégio tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul
reformou a sentença, condenando o Estado ao pagamento de dois mil reais,
pelos danos morais causados ao apenado.
Todavia, o acórdão fora reformado quando oposto embargos
infringentes, pelo Ministro Teori Zavascki com os seguintes fundamentos:

[...] Desta forma, uma vez reconhecido o direito do autor, pelo


princípio da isonomia, todos os detentos deveriam ser indenizados, o
que geraria um dispêndio vultuoso aos cofres do Estado.
[...]
Certo é que não podemos desprezar os direitos constitucionalmente
garantidos ao autor, pois é óbvio que o caso exige prestação positiva
do Estado. Porém, tal prestação deve respeitar os limites econômicos
que derivam do fato de que certas prestações hão de situar-se dentro
da ‘reserva do possível’, das disponibilidades do erário.
[...]
Sem sombra de dúvida que o autor, na qualidade de preso, reserva
integralmente seus direitos individuais fundamentais, à exceção da
liberdade e da privacidade. Também é notório que situação do
sistema penitenciário sul-mato-grossense tem lesado direitos
fundamentais seus, quanto à dignidade, intimidade, higidez física e
integridade psíquica.
Ademais, em razão de ser custodiado pelo Estado, tem este o dever
integral de conservar o preso condições dignas e saudáveis.
[...]
Ademais, não podemos acolher a alegação de que a omissão do
Estado é ilícita, uma vez que a ação positiva do Estado-
administrador, praticada de acordo com o orçamento votado pelo
Estado-legislativo, a coloca, dogmaticamente, na esfera da licitude
dos atos públicos, tal qual determinada pela doutrina da ‘reserva do
possível’. Desta forma, não há falar em dever de indenizar.
[...]
Não estamos com isso negando o direito do autor em ver ressarcido
seu sofrimento. Apenas entendendo que, se o objetivo principal da
ação é obrigar o Estado a dar melhores condições de vida e
dignidade aos detentos que cumpre pena nos estabelecimentos
prisionais sul-mato-grossenses, não obterá êxito intentando ação
indenizatória de danos morais.

Percebe-se, que o ministro desconsidera o argumento da reserva


possível, vez que a configuração do dano é matéria incontroversa e que por
essa razão o dever do Estado de indenizar é incontestável.
O que fica claro para o eminente ministro diante das circunstâncias
fáticas trazidas na referida causa é que há uma evidente violação a dignidade
da pessoa humana e que a isso se impõe ao detento um dano moral e que
nesse contexto já está presumido.
Por fim, o recurso foi provido em favor do recorrente, com fulcro no § 6º,
do art.37 da Constituição Federal de 1988, aduzindo que é obrigação do
Estado, ressarcir os danos, inclusive morais, quando este falhar em não
fornecer condições estruturais mínimas de existência aos encarcerados.

4.3.1 Posicionamento do Ministro Luís Roberto Barroso no RE n. 580.252

No julgamento conforme já anteriormente mencionado houve diferentes


posicionamentos acerca da demanda. O eminente ministro Luís Roberto
Barroso em voto vista, apresentou outra opção como forma de indenizar o
preso submetido ao cárcere degradante alternativa a indenização pecuniária a
saber a indenização sob a forma de remição de pena. (Brasil, 2017)
O ministro verifica que se o detento recebe uma compensação
pecuniária ele ainda assim permanece nas mesmas condições degradantes da
vida e sem poder fazer uso da quantia arrecadada. Já na remição de dias o
tempo de sua exposição às condições do cárcere é menor, ou seja, é diminuído
o tempo de prisão e com isso minora as violações de sua dignidade. (Brasil,
2017)
Considera o ministro mencionado que a indenização pecuniária é
ineficaz para reparar o dano sofrido pelos detentos em condições de vida
degradantes no tempo de cumprimento de pena (Brasil, 2017)
Ainda, ressaltando os benefícios da remissão o ministro aduz que além
de reduzir o tempo de prisão e por consequência o tempo de exposição a todo
tipo de sofrimento físico e psíquico, a remissão reduz a superlotação dos
presídios, permitindo que os presos conquistem a liberdade antes do
determinado. Sendo assim, a remição reduziria em muito um dos grandes
problemas do sistema carcerário, a saber, a superlotação. (Brasil, 2017)
Por fim, cumpre ressaltar que a remição no campo da Responsabilidade
Civil trata-se de hipótese não prevista em lei e que portanto diz respeito a
instituto diverso, porém em relação ao qual, o ministro Barros argumenta que
há a possibilidade de aplicação da remição no campo da Responsabilidade
Civil, considerando que o direito processual penal tem admitido a remição da
pena em hipóteses não contempladas pela LEP. (Brasil, 2017)

5 CONCLUSÃO

O presente artigo teve por objetivo principal verificar qual dos


posicionamentos tendo em vista o Recurso Extraordinário 580.252 que melhor
se alinham aos Direitos e Princípios constitucionais previstos na Constituição
Federal de 1988.
Para tanto fora necessário analisar primeiramente, conceitos da
execução bem como a função da pena, finalidades basilares e como ela se
desenvolve dentro do Direito Penal pátrio, verificando seus ideais e como isso
acontece no caso concreto, também, evidentemente fora apresentado de
maneira quase que exaustiva o atual estado calamitoso das penitenciárias
brasileiras, e tudo isso por meio de estudos doutrinários e pesquisas de
Legislação e Jurisprudência.
Diante disso, evidenciou-se sobremaneira a gravidade em que se
encontra a realidade estrutural dos presídios brasileiros, o que torna uma
barreira para se concretizar a unidade entre ideial normativo e a realidade. Ao
contrário dos fins da pena que precipuamente tem o condão de ressocializar,
reeducar e preparar o apenado para o convívio social, a realidade das
penitenciarias no Brasil atualmente submetem todos aqueles que estão
cumprindo pena ou presos provisoriamente a situações deveras degradantes
tendo um efeito contrário, devastadando vidas violando direitos e princípios
básicos da Constituição Federal como dignidade da pessoa humana o que com
certeza acaba que refletindo no aumento da criminalidade e tudo isso em razão
de uma grave falha estatal de não instituir melhores políticas públicas de
melhoria das condições carcerárias e também a inércia em relação a melhorias
das condições estruturais dos presídios.
A pesquisa constatou que há a possibilidade de a remição da pena ser
aplicada em razão do dano moral sofrido pelo detento submetido a situação
degradante sendo uma alternativa a indenização pecuniária (que gera muita
onerosidade para o Estado), pois ficara bem demonstrado que além de a
remição diminuir o tempo de prisão e por consequência o tempo de violação à
dignidade do preso, ela também vai refletir positivamente na questão de
superpopulação carcerária no país, podendo haver uma expressiva redução do
Estado calamitoso das prisões.
REFERÊNCIAS

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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil:


promulgada em 5 de outubro de 1988.

BRASIL. Lei de Execução Penal. Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984.

BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Recomendação nº 44. Brasília,


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