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A vida é entre: a experiência do pedal com as crianças no cotidiano da cidade.

Bicicleta: É um símbolo de autonomia, de equilíbrio, como se


fosse a evolução em marcha. Por ser um meio de transporte que
depende da força da própria pessoa para se deslocar já demonstra
uma necessidade de esforço pessoal. Além de que, seu equilíbrio
depende do movimento que o impulsiona para frente, expressando
assim uma caracterização de evolução da vida tanto exterior
quanto interior. ( Chevalier, Jean. Dicionário de símbolos)

Andando de bicicleta aprendi a encontrar as brechas, essas que a vida nos convida todo dia a
achar. Em um trânsito duro, violento, acelerado e hostil às mulheres, que traduz um modelo
de cidade pouco pensado à inclusão, uma lógica de espaço público masculina, rígida e
mecanizada, seguimos ao encontro do feminino e dos espaços para nos fazer presentes e
atuantes no mundo público. Sempre há vez para os gentis, sempre dá pra fazer liberdade em
meio a um grande congestionamento de motores, barulhos, celulares, fumaças, SUVs,
motocicletas, bueiros, buracos, cacos de vidro, galhos e lixos, sempre dá pra ser livre em meio
aos obstáculos e maldades.

A vida é assim, um grande entre, um convite para o trajeto, uma chance para a felicidade. É
nela que precisamos nos autorrealizar, encontrar sentido, significado, graça, leveza e coragem.
É exercício de resistência fazer liberdade, encontrar o seu espaço, ocupar, fluir, saber da
potência e dos limites do corpo e de sua intensa e imensa capacidade de expandir.

Pedalar na vida é ser água que flui, que acha caminhos. Pedalando, estou construindo uma
cultura de resistência, o corpo fica mais forte, a mente mais focada no presente, o espírito
mais leve e satisfeito com a simples condição de existir e transitar entre.

Com a bike as crianças aprendem que ocupar, resistir, existir, é ato cotidiano, corpo é política,
corpo é voz, corpo é limite e potência. Nossos corpos são lindos e fortes.

Entre subidas e descidas Theo e Bento crescem, pedalamos cantando, divertindo, fazendo arte,
música, graça, uma grande brincadeira. O encontro com a gente mesmo que o pedal
proporciona é uma chance de refletir sobre o próprio sentir e agir no mundo, é expansão de
consciência.

Escolhemos pensar, ter senso crítico, questionar se de fato os rumos que temos tomado são os
melhores. Escolhemos mudar de direção, apenas o possível. Somos a contramão de uma lógica
mecanizada, que nos distancia da nossa própria natureza, do nosso livre sentir, somos
respiração, suor e força. Todo dia é uma luta. Mas essa luta não desgasta, fortalece. Entre a
falta de graça e de fluidez do congestionamento, abrimos caminhos, pulsamos amor, vibramos
coragem.

Não há normas para nossos corpos, somos natureza que nutre, água que nos mata a sede, nos
dá vida, nos inspira. É urgente respeitar os corpos, primeira potência do ser. Só nos
reaproximando de nós mesmos poderemos ter alguma imunidade para agir com serenidade
diante de tamanha loucura. Existem outras possibilidades, existem outros caminhos, pode ser
diferente, pode ser inclusive melhor.

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