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A descrição do

símbolo
Aula 4 e 5. Introdução aos sistemas
simbólicos
Sobre não saber e não entender...
O símbolo como possibilidade de dizer
o mistério.

ADIVINHA
(Orides Fontela)

O que é impalpável
mas
pesa
o que é sem rosto
mas
fere
o que é invisível
mas
dói
Etimologia do símbolo

• (do grego sum-ballo, ou sym-bailo), o símbolo refere-


se à união de duas coisas

• Prefixo syn-, que indica a ideia de encontro ou união


O verbo ballein, que se refere a lançar, arremessar

• Era um costume grego que, ao se fazer um contrato,


fosse quebrado em duas. partes um objeto de
cerâmica, então cada pessoa levava um dos pedaços.
Uma reclamação posterior era legitimada pela
reconstrução ("pôr junto" = symballo) da cerâmica
destruída
Os símbolos e seus vastos campos de
investigação
• Os símbolos pertencem a diversos campos de investigação
• Psicanálise – símbolos oníricos
• Literatura e as artes – imagens privilegiadas que dominam um obra
• Cultura – os códigos que delimitam e significam uma cultura
• Religiões – a imagens que manifestam a experiência sagrada
Um animal simbólico
Ernest Cassirer (1874 -1945)
• Os seres humanos produziram um percurso marcado por uma atitude
condutora de sua existência: conhecer, dar sentido...

• Todo progresso humano em pensamento e experiencia é refinado por


uma rede de símbolos que media sua relação com o mundo

• Em vez de lidar diretamente com as coisas, um ser humano produz


sentidos sobre elas.
O símbolo faz mediação do ser humano
com o mundo
• Os seres humanos envolveram-se de tal forma com formas de linguagens ,
imagens artísticas, símbolos míticos, ritos religiosos, que não conseguem ver
ou conhecer coisa alguma sem a interposição desses sistemas artificiais, aos
quais denominamos sistemas simbólicos.

• Os seres humanos não vivem num mundo de fatos nus e crus, mas sim vivem
suas fantasias e construções de sentido sobre os fatos.
• Os sistemas simbólicos (linguagem, arte, ciência e religião) constroem essa
realidade humana que media sua relação com o mundo.
“A Traição das
Imagens” - 1929

René Magritte
O duplo sentido: fundamento do símbolo
sagrado
• no símbolo estão presentes dois elementos
que de alguma forma se inter-relacionam.
Mas devemos manter-nos no nível do
sentido, não no das coisas em si mesmas.

• O ser humano ultrapassa o sentido


imediato das coisas e vê um segundo
sentido. A partir de sua experiência sensível
e percepcional, capta o cosmos pelas
malhas de seus afetos, anseios, fantasias,
produzindo significados humanos para as
coisas.

O Gigante adormecido, Botucatu-SP


• O pôr-do-sol, uma flor, um pássaro que voa são
realidades profanas, mas podem chegar a ser
simbólicas: elas têm um "segundo sentido",
captado por meio do primeiro no cotidiano.
(CROATTO, P. 86)

• o "segundo sentido" não está objetivado nas


coisas, mas é uma experiência humana e
singular em cada ser humano.
O símbolo transignifica
• “O símbolo é, então, um elemento desse mundo fenomênico (desde uma coisa até uma
pessoa ou um acontecimento) que foi "transignificado", enquanto significa algo além de
seu próprio sentido primário. A abóbada celeste é símbolo de transcendência e de
soberania. Tal sentido está por trás do que o céu é para o olhar humano.” (CROATTO, p.
87)

• “Por isso podemos descrever o símbolo como "remissivo"; envia para outra realidade
que é a que importa existencialmente. O Sol, como símbolo, remete à máxima energia
vital, que se expressa como Ser Supremo.”(P. 87)
EXPRESSÃO DO
SAGRADO
• “Na experiência do homo religiosus, o
transcendente que o símbolo convoca
não é objetivável nem definível em
palavras. Percebe-se como mistério,
como claro-escuro, por isso é preciso a
mediação das coisas de nossa
experiência comum” (P. 87)
Da analogia ao símbolo
• O sentido simbólico constitui-se no e
pelo sentido literal, o qual opera a
analogia. (RICOEUR apud CROATTO, p.
88)

• É a maneira de se manifestar ou a forma


de um objeto, e a maneira de agir de
um ser vivente (uma árvore, um animal
ou um ser humano) o que conduz a um
ou outro aspecto do sagrado,
manifestado justamente sob essa
dimensão. (CROATTO, P. 88)
Por que a vivência do sagrado realiza-se por meio
das coisas e não diretamente? E por que sua
expressão ou participação não se faz com um
discurso lógico?

• O transcendente é inobjetivável, por sua própria essência e


precisa de uma mediação.

• O símbolo sagrado não é pura linguagem ou pura


representação, é vivência; uma vivência humana e histórica
• O símbolo expressa a percepção do transcendente
mediante uma de suas manifestações cósmicas (uma
hierofania).
Heterogeneidade da
experiência sagrada
• A infinita variedade das coisas ajuda a visualizar o
sagrado de muitas formas, sem que nenhuma delas o
esgote. A heterogeneidade dos símbolos é uma
amostra de sua múltipla riqueza, ainda que cada
hierofania concreta parcialize e fragmente o símbolo.
(p. 91)

• Totalizar a experiência sagrada não é possível para o


ser humano, nem tem muito sentido; todas as suas
situações e vivências são limitadas e concretas e nelas
se deve viver também o Mistério transcendente.
(p.91)
Símbolo ≠ Metáfora
DA POESIA
Um
• A força do símbolo está na coisa gato tenso
nomeada pela palavra (em um texto) tocaiando o silêncio
(Orides Fontela)
ou contemplada (na arte), não na
proposição que esclarece ou
predicação ("Deus é como o Sol"). “Chegou por vezes de alcançar o sotaque
das origens.
Se admirava de como um grilo sozinho, um
• A metáfora é uma predicação, o só pequeno
símbolo uma hierofania grilo, podia desmontar os silêncios de uma
noite!”
(Manoel de Barros)
Alegoria é um recurso didático para explicar uma
ideia já pré-concebida, a partir de imagens.

A alegoria traduz uma ideia, um ensinamento, uma


moral já o símbolo é manifestação do sagrado.

Símbolo ≠
alegoria Alegoria é uma representação de um pensamento a
partir de uma forma figurada

Alegoria da caverna

Narrativas das parábolas cristãs recorrem às alegorias


Para que uma coisa seja signo, deve ser signo de algo conhecido.

o segundo sentido, ao qual o signo remete, é anterior (no


conhecimento) à sua formalização (na linguagem, na arte, nos
gestos etc.).

Signo
a nuvem, como signo da chuva; a fumaça como sinal de fogo; a
campainha como sinal da chegada de uma pessoa.

Também são "signos" os chamados “símbolos lógicos",


matemáticos, químicos, por serem convencionais e suporem uma
aprendizagem anterior ao seu uso.

O uso do signo na vida cotidiana (no plano profano) é muito


mais comum que o uso do símbolo. A linguagem em códigos —
sejam eles códigos de escritura, de gestos, da sinalização de
trânsito etc
• “O símbolo diferencia-se do
signo, tanto quanto da
metáfora e da alegoria, por
"remeter" a algo
desconhecido em si, mas que
entretanto se faz presente
em algo visível.” (p. 98)
A densidade significativa do símbolo

1. Polissemia
A água pode ser destrutiva (inundação), mas também regeneradora (bebida), fecunda (chuva) ou purificadora (serve
para lavar-se). Essas quatro significações, experimentadas na ordem profana, também são expressões de vivências
sagradas.

Essa polissemia de muitos símbolos não se atualiza toda de uma vez. A experiência religiosa é sempre concreta,
qualificada, específica. No momento da vivência do sagrado, o símbolo deixa de ser polissêmico para manifestar
apenas um aspecto de sua plurivalência de significações

Quando deixa de ser polissêmico e passa a ser apenas um, o símbolo aparece como sintético, pois serve para
expressar o que se chama de coincidentia oppositorum
2. Relacional

A Pelo símbolo o homo religiosus solidariza-se


com o cosmo, com os outros seres humanos
e especialmente com o Mistério.

densidade 3. Permanente
A água, o Sol, a terra, este ou aquele animal

significativa etc. terão sempre os mesmos valores


simbólicos através dos séculos. Mesmo
depois de sua exploração científica, a Lua
continua tendo as mesmas ressonâncias

do símbolo simbólicas que os humanos sempre


encontraram nela.
A 4. Universal

densidade • O símbolo também é universal. Os mesmos


símbolos, com os mesmos significados,
podem aparecer, ao mesmo tempo, em

significativa culturas isoladas entre si; ou em outras


separadas pelo tempo, sem conexão
histórica entre elas.

do símbolo
• 5. Pré-hermenêutico

A densidade • O símbolo ainda não é um texto. É um


objeto, um acontecimento, uma pessoa,
uma realidade experimentável que está

significativa carregada de uma transignificação. Ele é


evocativo e orientador.
• ao dizer que o símbolo é pré-hermenêutico,
dos símbolos sublinha-se sua condição de signo "aberto"
e sugestivo, cuja significação, posta nele por
seu produtor, é captada mediante um ato
posterior de interpretação.
• 6. interpretação e explicação

A densidade • “É necessário diferenciar entre

significativa interpretação e explicação. Quando o


símbolo é interpretado, é sua reserva de
sentido que emerge em forma de relato,

dos símbolos cuja função não é "explicar", mas "dizer" a


experiência vivida. Caso contrário, deixa de
ser símbolo e converte-se em logos”
Onde surgem os
símbolos?
• 1) nas hierofanias
(cósmicas ou históricas),
em referência ao sagrado;
• 2) nos sonhos, que
exploram vivências
profundas da pessoa;
• 3) na poesia
Função social do símbolo
• O objeto simbólico não é somente o receptor de uma hierofania. A vivência
da hierofania verbaliza-se, faz-se palavra que a "comunica" a outros, os
quais, por sua vez, podem entrar na mesma esfera numinosa. O símbolo,
portanto, é gerador de um vínculo entre os seres humanos.
• Durkheim, considera-se o simbolismo como um acontecimento social,
assim como todo fato religioso ( "as coisas sagradas são coisas sociais"
Quando o • Pelo conceitualismo (que afirma o logos) e o
positivismo. O último (século XIX,
especialmente) busca "explicar" tudo a partir da
símbolo é experiência comum, do concreto e verificável.
• Outra forma de anular o símbolo é a leitura
anulado de seu historicista da Bíblia ou de qualquer outro texto
religioso.

valor sagrado • Outras vezes a imagem simbólica torna-se


esclerosada em dogma.

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