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Santana Castilho *
Tudo se passa entre a luz e a tela. É lá que se manipulam os bonecos, no teatro de sombras. O
espectador, sentado passivamente diante da tela, vê as sombras.
Comecemos pelo primeiro acto, a moção de censura. Por definição, é um instrumento parlamentar de
derrube do Governo. Mas com os bonecos manipulados por trás e por baixo, como se faz no teatro de
sombras, deu belos efeitos: demitiram-se uns de uma coisa que já não é Bloco; vitimizou-se outro de
outra coisa que já não é Governo; e comprometeu-se a terceira coisa, a Oposição, que vai manter um
Governo paralisado. Eis a realidade do que vai ser chumbado para além da tela. Intestinamente
impedido de votar a favor qualquer censura proposta pelo PSD ou CDS, o número do Bloco fez sentido e
valeu o risco da apalhaçada pirueta de Louçã: quando chegar a hora de uma moção de censura séria, o
Bloco já se pode abster sem que o acusem de ajudar o Governo; marcou terreno antes do PCP e
esclareceu que o apoio a Alegre foi tão-só erro de “casting” e nada de estratégico quanto ao PS. Este
acto teve fim moralizante: o Bloco demonstrou que existe para não existir.
O segundo acto do nosso grande teatro de sombras foi à cena no Centro de Congressos da Alfândega, no
Porto, sob a epígrafe “Os Colaboracionistas Protestam”. Na tela iluminada o título foi diferente: I
Encontro Nacional de Dirigentes de Escolas Públicas. As sombras representaram quatro cenas das trevas
das escolas: a recorrente avaliação do desempenho dos docentes, o garrote que aperta a preparação do
próximo ano lectivo, a dita ou desdita (consoante a perspectiva dos protagonistas) dos agrupamentos
escolares e os novos procedimentos reguladores dos contratos públicos. Dos anúncios feitos ao acto, na
imprensa, pelo presidente da novel Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas
Públicas, retirei frases fortes, que cito: “…a avaliação de docentes está a contribuir para uma grande
instabilidade nas escolas…”; “…pretendemos exigir ao Ministério da Educação que se promova uma
discussão séria sobre o processo de avaliação de docentes, que não é justo nem exequível…”; “...poupar
em tempo de crise é fundamental, mas em nome dessa poupança não se pode destruir a escola
pública…”; “…há uma grande angústia sobre a possibilidade de se perderem entre 25 a 30 por cento dos
recursos humanos das escolas no próximo ano lectivo…”; “…queremos fazer uma chamada de atenção
ao Ministério da Educação e também à opinião pública sobre os riscos que corre a Educação…”.
Na Finlândia, mais de 25 por cento dos alunos do sistema têm apoios complementares e 8,5 por cento
são objecto de educação especial. É isso que explica a baixa taxa de retenções. Quanto à Noruega,
socorro-me da publicação oficial “Facts About Education in Norway, 2010”. Na página 11 verifica-se que
só 56 por cento dos alunos do secundário completaram o respectivo ciclo de estudos no tempo previsto.
Houve 26 por cento de abandonos ou chumbos, 12 por cento que necessitaram de mais tempo e 6 por
cento que ainda o tentavam concluir no momento da recolha dos dados.
Quando são confrontados com os factos, julgam que os “pedabobos” mudam de ideias? Não! Mudam os
factos através da tela onde projectam as sombras.
* Professor do ensino superior. s.castilho@netcabo.pt