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Arqueologia Social Cognitiva

Segundo Colin Renfrew (1998) a capacidade cognitiva do homem está vinculada a vida
social e aos objetivos (coisas), se observou que existe uma importância dos artefatos na
esfera dos assuntos humanos. O autor afirma que os artefatos tem um papel simbólico e
na ausência deles a vida social e intelectual não poderiam ter se desenvolvido.

Tanto a Arqueologia social cognitiva como a Arqueologia contextual lidam de maneira


mais aproximada das questões da mente e o mundo abstrato, através dos remanescentes
materiais. Renfrew afirma, de maneira entusiasmada, que Arqueologia cognitiva é uma
área das mais interessantes para se realizar pesquisas nos dias de hoje.

Na obra de Merlin Donald (1991), Origens da Mente Moderna, há um estabelecimento de


uma sequência muito ampla das fases cognitivas, divididas em Três grandes transições:

Primeira transição Cultura episódica Característica da cognição primata

Segunda Transição Cultura mimética Característica do Homo erectus

Terceira Transição Cultura linguística Característica do Homo sapiens

De acordo com Donald, a primeira transição começa com a cultura dos macacos e
austrolopithecineos ao Homo erectus, estabelecendo uma linha que envolve o
“surgimento do nível mais básico da representação humana, a capacidade de mímica ou
reencenar eventos”. A segunda fase se passa quando a cultura do Homo erectus chega ao
nível de Homo sapiens, onde o desenvolvemento biológico do homem moderno está
concluído, ele pensa, fala, a capacidade cognitiva de construção e decodificação
narrativa é completamento nova. Finalmente a terceira transição, nesse estágio não há
desenvolvimento biológico, os fatores mais pertinentes na construção cognitiva dessa
fase, são direcionados ao “surgimento da visão do simbolismo e a memória externa”
(Donald, 1991).

Apesar dos brilhantes esforços de Donald, inevitavelmente a ausência de evidências


físicas da teoria de transições cognitivas, assinalam senso espculativo por parte do autor,
sobretudo no que se refere às duas primeiras fases, o surgimento do comportamento
mimético e a fala respectivamente. Entre todas as transições, somente a terceira deixou
provas tangíveis que possam auxiliar na comprovação acertada da teoria de Donald.

Renfrew a partir do esquema de Donald sugere a inclusão de mais uma fase, afirmando
que as duas primeiras fases de transição são basicamente genéticas, onde há a mudança
do Homo erectus para o Homo sapiens. Veja a seguir como ficou o sistema revisto das
fases cogintivas:

Primeira transição Cultura episódica Característica da cognição


primata

Segunda Transição Cultura mimética Característica do Homo erectus

Terceira Transição Cultura linguística Característica do Homo sapiens

Quarta Transição Armazenamento simbólico Característica do início das


externo emprega cultura sociedades agrárias com
material simbólica. assentamentos permanentes,
monumentos e objetos de valor.

Estas fases podem ser comparadas a estágios de aprendizagem, onde cada etapa
representa um degrau acima de conhecimento a partir de cada transição. Por exemplo,
quarta fase está vinculada ao desenvolvimento d escrita, chegando ao clímax com o
desdobramento do alfabeto e seu uso pelos gregos, além correlacionamento com o
urbanismo.

O Simbolismo e Cognição

Colin Renfrew (1994) definiu o símbolo como algo representativo, um sinal visível de
uma ideia ou qualidade, daí o fato do simbolismo sobre os artefatos está vinculado ao
“sentido”. Portanto quando se descobre o que os símbolos representam, entende-se
também o sentido da ligação entre o artefato e a sociedade que o produziu.

Essencialmente os artefatos podem ser considerados símbolos, em geral, o arqueólogo


tende a procurar um significado especial nesses objetos, de fato quando se utiliza o temo
“símbolo” é por que há uma necessidade de inferir significados especiais. Esse interesse
vai variar de acordo com o tempo e o lugar, envolvendo assim o julgamento de valores
(Halle, 1993).
David Halle (1993) explora um lado da decisão particular, indicando que o arqueólogo é
que entende que o artefato pode ser simbólico ou deve ser rebaixado a artefato sem um
significado específico. Halle reitera na sua teoria que o termo “símbolo” pode ser usado
para designar o interesse especial em determinada classe de artefato e quem delegada o
significado especial é o profissional que o estuda.

Dentre todos os aspectos num sítio arqueológico com características de sepultamento, a


religião dos grupos humanos, é o que traz maior complexidade, pois é ela que
intrinsecamente leva uma enorme carga de subjetividade. Segundo Boyer (et al 1994 ) a
religião é um campo notoriamente complicado de definir, embora a busca de vestígios
arqueológicos ligados a atividades religiosas impliquem em diversos problemas, os arqueólogos
podem procurar cinco características de maior relevância:

1° A crença em seres não-físicos

2° A ideia que a pessoa pode ter uma vida após a morte

3° Determinados membros da sociedade possuem a capacidade de comunicação


com seres não-físicos (deuses e espíritos)

4° Certos rituais podem alterar a ordem do mundo natural

5° O uso de materiais simbólicos

Essas características são ilações que os arqueólogos alegam ser importantes, Collin
Renfrew (1985) discute sobre essas questões religiosas e seu alto grau de complexidade,
explorando a quantidade de problemas que o profissional pode enfrentar ao tentar fazer
inferências sobre as ideias religiosas da pré-história.

Normalmente, nos dias de hoje se concorda que distingue-se mais claramente a espécie
humana das demais formas de vida no planeta, através do uso contínuo do seu intelecto
e na capacidade de utilizar os símbolos. Pois bem todo discurso coerente e lúcido é
baseado em símbolos, não por acaso as próprias palavras os são e nelas mesmas os sons
ou letras são representados por sinais gráficos que representam aspectos do mundo real.

Em geral se atribui um significado de um símbolo concreto de uma forma arbitrária,


muitas vezes o que acontece é que não tem nada que indique que uma palavra específica
representa um objeto em lugar do outro. Os autores dão exemplo da bandeira dos
Estados Unidos com desenhos de barras e estrelas, que se conhece o sentido histórico,
contudo não tem nada que deixa explícito que nação está representada nessa bandeira,
como muitos símbolos ela é arbitrária.

Interessante observar que o significado atribuído a um símbolo é particular, ou seja, é


específico para cada tradição cultural. Quando se estuda os petróglifos pré-históricos na
Escandinávia, a mente externa àquela visão cultural traduz as figuras como se fosse um
bote ou mesmo um trenó, dados a essa região fria, mas certamente as pessoas que
gravaram essas figuras não sentiriam dificuldades para interpretar seu significado.

Em primeiro lugar quase sempre, tornar-se impossível inferir o significado de um


símbolo de quaisquer que sejam as culturas somente estudando as formas e os objetos.
Ao menos tem que observar como se utiliza essa forma e analisá-la num contexto com
os demais símbolos, assim a arqueologia cognitiva é obrigada a ser criteriosa e muito
cuidadosa a respeito do contexto específico da descoberta: é o conjunto, grupo o que
importa e não o objeto individual estudado isoladamente.

Em segundo lugar é importante admitir que as representações e artefatos não nos


revelam diretamente o seu real significado, um do fundamentos do método científico é
que o observador e o investigador tem de proporcionar a interpretações. Partem deles as
iniciativas para avaliar as possibilidades e assim inferir ações interpretativas.

Um dos arqueólogos mais conceituados dentro da arqueologia processual, Lewis


Binford, defendia que estudar os pensamentos do homem do passado não era útil, ele
afirmava que era as ações o que importava e não os pensamentos, isto, no entanto não
faz parte da filosofia de abordagem na Arqueologia cognitiva.

Para pesquisar as práticas funerárias é imprescindível abordar os aspectos simbólicos, já


que os objetos estão intrinsecamente vinculados a esse mundo abstrato, para alguns
autores a arqueologia cognitiva pode auxiliar nessa tentativa de compreensão do
simbolismo cultural.

Para Renfrew e Bahn (op. Cit.) a Arqueologia cognitiva é a forma de pensamento do


passado considerando os remanescentes materiais, ela procura obter informações através
dos fatores simbólicos e cognitivos, já que as sociedades constroem sua própria
realidade social e leva consigo uma ideologia ativa oriunda inclusa nos artefatos. A
Arqueologia cognitiva contempla a capacidade criativa do homem sem ferir o
subjetivismo, entendo que não é indicado propor leis gerais ou regularidades para
Arqueologia.

É importante considerar todas as variáveis necessárias para alcançar uma interpretação


mais próxima da realidade do que foram as práticas funerárias, é crucial observar todas
possibilidades para que os objetivos pré-estabelecidos sejam alcançados e que os
resultados possam obter níveis aceitáveis de credibilidade no meio científico .

Para Newton (1987) a cultura material é um fenômeno dividido em duas faces, a


primeira na mente do artesão (quem manipula o objeto) caracterizando o mundo
particular e a segunda é a forma tangível do objeto, permitindo atingir os aspectos
cognitivos e comportamentais.

Esses autores são incisivos quando falam que cada homem tem seu mundo interior e vê
o mundo externo a sua maneira, liberando uma estrutura inter privativa, uma espécie de
mapa cognitivo. Pensando assim indivíduos que vivem juntos em comunidades tendo as
mesmas experiências atreladas tendem a observar mundo a mesma visão ou um mapa
cognitivo comum. (Sene, 2003)

No estudo das práticas fúnebres, devem-se direcionar os esforços em alguns indicadores


arqueológicos: (a) o os rituais podem acontecer em lugares com características naturais,
(b) de forma alternativa em lugares artificiais (igrejas e templos), (c) a estrutura e
equipamentos móveis e fixos, (d) a área é possivelmente rica em simbólicos que se
repetem, (e) as figuras de animais e símbolos que remetem ao status e poder, (f) é
comum no ritual ter danças, gestos, manifestação de dor, músicas que podem estar
refletidos na cultura local, (g) sacrifício de animais, (h) comida e bebidas podem ser
depositadas ou queimadas, (i) outros tipos de acompanhamentos que podem se
fragmentados ou integrais, (J) a riqueza em os equipamentos se apresentam, oferendas
feitas no local (cf. Renfrew, Bahn, op. cit.).

A abordagem cognitiva quando enfoca as práticas funerárias, defende os mesmos como


base para interpretações socioeconômicas com a intenção de estabelecer o grau de
influência na sociedade, ou seja, o status, especialmente nas sociedades mais
segmentárias. Essas associações entre os membros do grupo e as oferendas demonstram
corresponder a uma parte das atividades simbólicas.
O processo de uso dos objetos representa “princípios gerais” que são mapas cognitivos
de concepções ideológicas e de ação social. Nesse sentido esses mapas de ação social
são eficazes no momento de formular estratégias de identificação social, portanto a
cultura material é fundamental para traçar o papel central na representação das relações
sociais. (Conkey, 1989, p.151 apud Wright, 1993, p.247).

No contexto das práticas fúnebres, os objetos são importantes para a arqueologia, pois
representam a cultura material e algumas vezes são preparados exclusivamente para as
cerimônias mortuárias, constando que eles apresentam de maneira corriqueira teor
simbólico. (cf. Newton, op.cit.).

É natural que os acompanhamentos mortuários tivessem significado social, contudo


estão também estão repletos de implicações sobre maneira como a sociedade concebia
sua própria mortalidade, mostrando mais um ponto importante do mapa cognitivo.
(Renfrew, Bahn op.cit., p.394).
Referencias bibliográficas

Donald, M. Origins of the Human Mind: Three Stages in the Evolution of Culture and
Cognition. Ambridge (MA): Harvard University Press. 1991.

Halle, D. Inside Culture: Art and Class in the American Home. Chicago (IL): University
of Chicago Press, 1993.
Bar-Yosef, O., B. Vandermeersch, B. Arensburg, A. Belfer- Cohen, P. Goldberg, H.
Laville, L. Meignen, Y. Rak, J.D. Speth, E. Tchernov, A-M. Tillier & S. Weiner, The
excavations in Kebara Cave, Mt Carmel. Current Anthropology 33, 497–551. 1992.
Boyer, P. Cognitive constraints on cultural representations: natural ontologies and
religious ideas, in Hirschfeld & Gelman (eds.), 391–411.1994.
Mithen, S.The Prehistory of the Mind: a Search for the Origins of Art, Science &
Religion. London: Thames & Hudson. 1996.
Renfrew, C. The Archaeology of Cult; the Sanctury at Phylakopi. London: The British
School of Archaeology at Athens. 1985.
Vandermeersch, B. Une sépulture moustérienne avec offrandes découverte dans la
grotte de Qafzeh. Comptes Rendus Hebdomadaires des Séances de l’Académie des
Sciences 270, 298–301. 1970.

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