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ISBN: 978-85-7395-211-7
Neste contexto, surgem no cenário nacional, os romancistas José de Alencar
(1829-1877) e Joaquim Manoel de Macedo (1820-1888). De acordo com os literatos da
época, seus romances eram tidos como “água com açúcar”; destinadas a quem tinha
‘estomago fraco’, denotando falta de qualidade por parte destes. Mesmo com o
negativismo dos críticos, a qualidade dos escritores, “fica provada pelo fato de ainda
estimarmos os seus livros apesar do açucaramento, que acabou por dar engulhos ao cabo
de duas gerações.”2.
Apesar de Alencar e Macedo terem publicado na mesma época e trazerem
modelos semelhantes de escrita, de apresentarem “o amor romântico, como retificador
de conduta”3, a forma como a crítica os acolheu foi divergente. A Macedo coube a
aclamação e os aplausos, a Alencar as duras farpas da indiferença. Ao observar a
trajetória destes dois escritores, a pergunta que aqui caberia seria o porquê desta atitude.
Os
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que Alencar escrevesse “Benção paterna”, prefácio do romance Sonhos d’ouro e
Macedo escrevesse “Duas palavras”, também prefácio em A moreninha. Em ambos os
prefácios, os escritores agem como um pai que se despede de seu filho quando este
atinge a maturidade e segue para o mundo. O filho que, desprende-se de sua família
para enfrentar sozinho o olhar severo dos outros.
Desta maneira, Macedo tenta justificar as possíveis falhas de seu texto e assim,
minimiza ou até mesmo neutraliza a fúria da crítica. Percebemos que, a forma como este
texto foi escrito, traduz as angustias e incertezas do seu escritor. Macedo e Alencar
trazem em suas obras personagens semelhantes, a essência de seus enredos e medos se
alinham. Ao pensar desta forma o leitor questiona-se sobre o porquê de tamanho
paradoxo na recepção por parte dos críticos? Porque José de Alencar precisa abençoar
seu ‘filho’ enquanto Macedo despede-se com apenas ‘duas palavras’? Que paradoxo
separa os dos escritores?
Para uma melhor compreensão do processo de criação dos escritores e as
semelhanças dos textos, analisemos a escrita, de Alencar e Macedo, nos romances: A
viuvinha e A moreninha, respectivamente.
Nas duas obras, há uma propagação do amor ideal e regenerador, protagonizado
por uma mulher com gestos e costumes a frente de seu tempo e um homem indigno de
seu amor. José Alcides Ribeiro acredita que “os cortes com gancho são feitos em partes
que interrompem a intriga em pontos cruciais, provocando bastante suspense e
curiosidade no tocante à continuação da história”8.
A protagonista sempre escolhe seu amado e é ele quem tem que lutar pelo amor
dela. Até então, em geral as mulheres,
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Tentando livrar-se deste destino, as personagens apaixonavam-se, contudo,
apenas confiava seu amor àquele que havia provado ser merecedor deste. Seus corações
não eram entregue de imediato. Seus comportamentos não condiziam com a conduta da
época, mas nem por isso eram rechaçadas pela sociedade. Tinham acesso ao mundo
letrado, liberdade para falar o que pensavam e conversar a sós com o homem de sua
escolha, conseguindo impor o respeito e a admiração por parte de todos que as
circundavam. Quanto A moreninha, o escritor afirma que,
Entrou nos salões, porém com esse vestido preto, que devia lembrar-lhe a
todo o momento a fatalidade que pesara sobre a sua existência.
Excitou a admiração geral pela beleza. Não houve talento, posição e riqueza
que não rojassem a seus pés.11
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Serei incorrigível, romântico ou velhaco, não digo o que sinto, não sinto o
que digo, ou mesmo digo o que não sinto; sou enfim, mau e perigoso a vocês
inocentes anjinhos. [...] em toda parte confesso que sou volúvel, inconstante e
incapaz de amar três dias um mesmo objeto; verdade seja que nada há mais
fácil do que me ouvirem um ‘e vos amo’, mas também a nenhuma pedi que
me desse fé.12
Mesmo diante das mulheres, Augusto tenta enaltecer sua posição. O que o leitor
não sabia é que o protagonista guardava em seu íntimo um segredo, um porquê de agir
desta maneira. Ele cativa as leitoras ao confidenciar, a dona Ana, que tinha um amor de
infância a quem havia dado, não só o breve contendo seu camafeu, como também seu
coração. Buscava nas mulheres a imagem da sua esposa, uma doce menina que, junto a
ele, havia ajudado um moribundo. Augusto tenta encontra a sua moreninha,
guardando e beijando com desvelo o meu querido breve, que sempre comigo
trago, eu conservo a lembrança mais terna e constante de minha mulher: ela é
o amor do meu coração, enquanto todas as outras são divertimentos dos meus
olhos e passatempo da minha alma.14
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Eis um filho que herdou um nome sem mancha e uma fortuna de duzentos
contos de réis; e que, depois de ter lançado ao pó das ruas as gotas de suor da
fronte de seu pai amassadas durante trinta anos, atira ao desprezo, ao escárnio
e a irrisão pública esse nome sagrado, esse nome que toda a praça do Rio de
Janeiro respeitava como o símbolo da honradez. Diga-me, que título merece
esse filho?15
Após uma análise rápida destas duas obras, torna-se mais nítida a semelhança
dos moldes literários que agradava o público do século XIX. As obras eram semelhantes
quanto ao enredo de maneira que, retomamos a questão norteadora deste estudo: a
influência da crítica, frente aos escritores oitocentistas. Como citado anteriormente,
Alencar e Macedo escreveram prefácios que preparavam seus filhos, leia-se livros, para
a dura severidade dos críticos.
O que chama a atenção nestes prefácios é a forma como estes dois foram escritos
e como cada escritor percebia/recebia a opinião da crítica. José de Alencar sempre foi
ignorado ou muito criticado. O romancista em vida mal foi citado – ou elogiado- pela
crítica, não se sabe o motivo exato deste silêncio durante a publicação de seus primeiros
folhetins. José Aderaldo Castello acredita que com essa ausência, esse silêncio,
“definia-se uma carreira que desde então seria marcada pela crítica e autodefesa, na
literatura e na política”17. Viana Filho afirma que “na verdade a parcimônia da crítica o
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amarguraria por toda a vida. Jamais ele conseguiria ouvir integralmente os aplausos que
ambicionava e não entendia porque tão parcos”. 18
Após a publicação de suas primeiras obras, José de Alencar sabia como seria a
recepção de seu livro, por parte dos leitores e, principalmente, da crítica literária. Com
receio ou mesmo sendo irônico ele escreve Benção paterna. O título é simbólico, a
benção designa o desejo da proteção divina em prol do outro. Ao pensar como um pai,
Alencar despede-se de seu filho, mas antes, alerta-o contra os males do mundo. Prepara-
o para as adversidades de quem irá recebê-lo mais adiante. “Ainda romance! Com
alguma exclamação, nesse teor, hás de ser naturalmente acolhido pobre livrinho, desde
já te previno”.19
Kátia Mendes Garmes, em seu texto A influência da atividade política de José
de Alencar na recepção crítica de seus romances, on line, afirma que em “Benção
Paterna”,
Alencar demarca seu projeto literário de âmbito nacional, e bem expressa sua
opinião a respeito da crítica, é publicado como prefácio de Sonhos d’ouro,
em 1872. É uma resposta a estes ataques, que objetivavam cobrir de ridículo,
tanto o político como o literato. Configurado como a benção do escritor ao
“seu livrinho”, temos os conselhos do escritor para que a obra pudesse
melhor defender-se dos ataques inevitáveis.20
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sobre dois pontos, teu peso e tua cor”22. O pai prepara o filho para rebater, reagir,
responder a altura. Já sabe de antemão em que aspectos será ferido. Antes mesmo que as
chagas sejam abertas, o pai cura o filho. Ensina-o a defender-se e não calar-se perante o
que lhe seria dito.
Macedo, mas pacato, ou mesmo, por saber que mais uma vez será aclamado,
aconselha sua filha a calar-se diante das palavras que seriam recebidas. A comportar-se
como uma típica moçoila do século XIX. O escritor não incita sua cria a rebater, pelo
contrário, ela deve calar-se
E tu, filha minha, vai com a benção paterna e queira o céu que ditosa seja;
nem por seres traquinas te estimo menos e, como prova, vou, em despedida,
dar-te um precioso conselho: recebe, filha, com gratidão, a crítica do homem
instruído; não cores se com a unha marcarem o lugar em que tiveres mais
notável senão, e quando te disserem que por esse erro ou aquela falta não és
boa menina, jamais te arrepies.23
Macedo tinha consciência da sua qualidade literária e mesmo que a face de sua
Moreninha fosse arranhada pela rudez dos literatos, esta jamais deveria reagir. Há aqui
a parcimônia por parte do romancista: jamais reagir, o que diverge da postura
alencariana. Enquanto o primeiro considera o crítico um homem instruído, sábio, o
segundo afirma
Os críticos, deixa-me prevenir-te, são uma casta de gente, que tem a seu
cargo desdizer de tudo neste mundo. O dogma da seita é a contrariedade.
Como os antigos sofistas, e os reitores de meia-idade, são avoengos,
deleitam-se em negar a verdade. Ao meio-dia contestam o sol, à meia-noite
impugnam a escuridão.24
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folhetins. A Alencar pouco importava a opinião da crítica, uma vez que este, ao
abençoar seu filho, afirmava
estes volumes são folhetins avulsos, histórias contadas ao correr da pena, sem
cerimônia, nem pretensões, na intimidade com que trato meu velho público,
amigo de longos anos e leitor indulgente, que apesar de todas as intrigas que
lhe andam a fazer de mim, tem seu fraco por sensaborias.25
Alencar não se importava com a recepção dos críticos, ou melhor, fingia não se
importar, pois sabia o que seu público queria e era lhe fiel, o leitor não se deixava
intimidar pela opinião da crítica. A provocação não atingia seus leitores. O público
aclamava o escritor e corria em busca de seus textos, compravam seus folhetins e
volumes encadernados.
Apesar de toda “não” receptividade as obras alencarianas, a divergência com que
os textos deste e de Macedo eram recebidos, fica evidente nos trechos acima. Os
escritores escreveram seus prefácios seguindo o conhecimento que lhes foi dado ante a
recepção de trabalhos anteriores. Assim como José de Alencar, Joaquim Manoel de
Macedo afirma que ouve os elogios e é aclamado pelo seu público leitor,
A moreninha não é a única filha que possuo: tem três irmãos que pretendo
educar com esmero, e o mesmo faria a ela; porém esta menina saiu tão
travessa, tão impertinente, que não pude mais sofrear no seu berço de carteira
e, para ver-me livre dela, venho depositá-la nas mãos do público, de cuja
benignidade e paciência tenho ouvido grandes elogios.26
4º Encontro Nacional de Pesquisadores de Periódicos Literários, 4., 2010, Feira de Santana. Anais. Feira de Santana: Uefs, 2013.
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Ao que consta nos livros e revistas científicas, os críticos não conseguiram
apagar a qualidade literária de José de Alencar. Ao contrário, este, ao passar dos anos,
cravou e firmou seu nome no mesmo patamar que Joaquim Manoel de Macedo.
NOTAS
______________________
1
Abreu, 2008, p.19.
2
Candido, s/d, 232.
3
Coelho, 1982, p.33.
4
Mendes, 1965, p. 9-10.
5
Nitrini, 1997, p. 160.
6
A desorientação ocorre quando, por questões particulares ou mesmo políticas os
folhetins/romances são diretamente atacados, sem que se considere o valor estético e
literário da obra.
7
Macedo, 2007, p. 13.
8
Ribeiro, J., 1999, p.1082.
9
Peres, 1999, p.757.
10
Macedo, 2007, p. 34.
11
Alencar, 1999, p. 57.
12
Macedo, 2007, p. 19-20.
13
Macedo, 2007, p. 50.
14
Macedo, 2007, p. 74.
15
Alencar, 1999, p. 20.
16
Alencar, 1999, p. 64.
17
Castello, 2004, p. 262.
18
Viana Filho, 1979, p. 69.
19
Alencar, 2000, p. 11.
20
Garmes, p. 4, on line.
21
Macedo, 2007, p. 13.
22
Alencar, 2000, p. 13.
23
Macedo, 2007, p. 14.
24
Alencar, 2000, p. 12.
25
Alencar, 2000, p. 14.
26
Macedo, 2007, p. 14.
27
Alencar, 2000, p. 14.
RESUMO
4º Encontro Nacional de Pesquisadores de Periódicos Literários, 4., 2010, Feira de Santana. Anais. Feira de Santana: Uefs, 2013.
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críticos. Desta maneira o estudo perpassará pela estética da recepção observando-se a
relação autor/obra/público.
ABSTRACT
The present study aimed at comparing the prefaces: "Benção Paterna" of the novel
Sonhos D’ouro from José de Alencar and "Duas Palavras" in the novel A moreninha by
Joaquim Manuel de Macedo. Both are spelled paternal preparing his "children" to the
receptivity of criticism. There is concern on the part of writers, for work / reader and
how they are influenced by critics. Thus the study will pass by reception aesthetics
observing the relationship author / work / public.
REFERÊNCIAS
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e XIX. Campinas, SP: Mercado das Letras, 2008.
______ Benção paterna. In: ALENCAR, José de. Sonhos d’ouro. São Paulo: Ática,
2000.
EL FAR, Alessandra. O livro e a leitura no Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahad, 2006.
MACEDO, Joaquim Manoel de. A moreninha. São Paulo: Martim Claret, 2007.
MENDES, Oscar. José de Alencar: Romances urbanos. Rio de Janeiro: Agir, 1965.
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NITRINI, Sandra. Intertextualidade e Da influência a recepção. Em: ______.
Literatura comparada: história, teoria e crítica. São Paulo: Edusp, 1997, p. 157-182.
PEREZ, Tânia Maria de Mattos. Lucíola, a dupla repressão da mulher cortesã. In:
REIS, Lívia de Feitas. Mulher e literatura. Seminário Nacional Mulher e literatura.
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VIANA FILHO, Luis. A vida de José de Alencar. Rio de Janeiro: José Olimpio, 1979.
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