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Da Divina comédia chamada Pan

Por Victor Wagner

“ Por que a letra Bet é fechada em todos os lados e aberta na frente?


Isso nos ensina que ela é a Casa (Bayit) do mundo. Deus é o lugar do
mundo, e o mundo não é o Seu lugar. Não leia Bet, mas Bayit (casa).
Assim está escrito (Provérbios, 24:3), “Pela sabedoria se edifica uma
casa, pela inteligência é (firmemente) estabelecida, e pelo conhecimento
são suas câmaras recheadas com riquezas e preciosidades”

- Nehunya ben HaKanah


“Este Alcorão nada mais é que uma embrulhada de sonhos confusos
e incoerentes. Não é inspiração provinda de Deus, mas criada pelo autor.
Maomé não é profeta, é um homem que faz versos. Que se apresente com
algum sinal revelador do seu destino, como os antigos profetas”. Talvez
digam de mim o que disseram do criador de Alá. Diferença cabal entre
nós dois: Maomé apresentava-se como profeta; julguei mais conveniente
apresentar-me como louco.”

- Mário de Andrade

“Uma grande diferença entre os processos Químicos e os Alquímicos


é que a Alquimia só emprega um calor gradual contínuo, mas,
cuidadosamente aumentado, sem começar com um calor violento.”

- Israel Regardie

“Comunicar com Marte, conversar com os espíritos,


Relatar o comportamento do monstro do mar,
Descrever o horóscopo, ler nas entranhas ou no cristal, [...]
Explorar o ventre, ou o túmulo, ou os sonhos; tudo isso são usuais
Passatempos e drogas, e assuntos de imprensa:
E sê-lo-ão sempre, alguns especialmente
Quando há tristeza nas nações e perplexidade
Quer nas costas da Ásia ou em Edgware Road.”
- T. S. Eliot

“Minha poesia consistirá, só em atacar, por todos os meios, ao homem,


esta besta selvagem,(...)”

- Baudelaire

“Multipliquei-me para me sentir, / para me sentir, precisei sentir tudo,


transbordei, não fiz senão extravasar-me, / despi-me, entreguei-me, e há
em cada canto da minha alma um altar a um deus diferente. “

- Álvaro de Campos

“A 10 de abril de 1934, em plena “ocultação” de Vênus pela Lua


(fenômeno esse que só acontecia uma vez por ano), almoçava eu num
pequeno restaurante, situado, bastante desagradavelmente, à entrada
de um cemitério. (...) A criada é muito bonita: ou melhor, poética. Nessa
manhã de 10 de abril trazia ela, sobre uma gola branca salpicada de bolas
vermelhas, muito a condizer com o vestido preto, um finíssimo cordão
donde estavam suspensas três límpidas gotas de água como que feitas
de pedra lunar, gotas redondas sobre as quais se destacava, na parte de
baixo, um crescente da mesma matéria, engastado do mesmo modo.
Pude apreciar, uma vez mais, a coincidência entre a jóia e o eclipse. Como
tentasse situar a rapariga, tão bem inspirada para aquela ocasião, ouvi, de
repente, a voz do lavador de louça: “Ici l’Ondine!”, e a resposta estranha,
infantil, quase ciciada, perfeita: “Ah,! Oui, on le fait ici, l’On dîne!”. Que
cena poderá haver de mais comovente? [...] A beleza convulsiva terá que
ser erótico-velada, explodente-fixa, mágico-circunstancial, ou não será
beleza.”

- André Breton

“O surrealismo vai introduzir você na morte que é uma sociedade


secreta. Ele vai enluvar sua mão, sepultando aí o “M” profundo por onde
começa a palavra Memória. Não deixe de tomar felizes disposições
testamentárias; por minha parte, peço que eu seja conduzido ao cemitério
num carro de mudança. Que meus amigos destruam até o último
exemplar, a edição do Discurso sobre o Pouco da Realidade.”

- André Breton

“Se quiseres não serei para ti senão um traço. “

- André Beton

“No Oriente,ás vezes os poetas são presos – uma espécie de elogio, já


que sugere que o autor fez algo tão real quanto um roubo, em estupro
ou uma revolução. Aqui, os poetas podem publicar qualquer coisa que
quiserem – o que em si mesmo é uma espécie de punição, uma prisão
sem paredes, sem eco, sem existência palpável – reino de sombras do
mundo impresso, ou do pensamento abstrato – um mundo sem risco ou
Eros.”

- Hakim Bey
“O caminho para o Paraíso é uma proposta – anterior à mente e não
in- duzida por ela. O desejo, acima das ações, deve estar em não ousar
alcançá- lo: portanto, creiam SIMBOLICAMENTE – ou corram os riscos.”

- Austin Osman Spare


Dedicatória; ao Aleph Rofer,um terrível gnóstico.
0.Introdução ou Alice caminha por entre os girassóis gigantes do país
das maravilhas

“O homem tornou-se pouco a pouco um animal fantástico que mais


que qualquer coisa tem de preencher uma condição existencial: é preciso
que imagine de tempo em tempo que sabe a razão pela qual existe. A sua
espécie não pode prosperar sem uma confiança periódica na vida! Sem
acreditar na razão da vida!”

- Nietzsche

“Que milagre é o homem!? Que sonho, que sombra?! Mas existe o


homem?!

- Carlos Drummond de Andrade


“Mágicos de todo o mundo, uni-vos”

- William Burroughs

Justifico esse livro com um pouco de filosofia neoplatônica; nas


novas teologias galiléias, o neopalamista Yannaras corretamente
aponta que o ser-aí (Dasein) se funda em uma “relação extática” com
uma transcendência supraessencial, ou seja, o ato de ser no mundo é
a realização de uma relação de êxtase divino, sendo a constituição da
existência esse êxtase. A realidade mais profunda do humano não seria
a “essência humana” enquanto una, mas sua multiplicidade hipostática
que o constitui enquanto “pessoa”, ressoando a doutrina dos padres
capadócios da precedência das pessoas divinas em relação à essência
divina, uma doutrina não tão distante da teologia pagã de Proclo da
precedência das hénadas ou Deuses não só em relação ao Ser, mas
também Vida e Intelecto. Talvez a influência pagã porfiriana na doutrina
capadócia da trindade (apontada por John Dillon) possa apontar para
algum elo nesta direção.
De qualquer modo, se lermos essa constatação verdadeira a respeito
da existência humana, percebemos que o prisma politeísta se enriquece
quando pensamos no “Ser-aí” como algo que se realiza não como mero
acidente de uma essência e sim como algo anterior que se revela e se
expressa através da essência. Se a “causa ontológica” de uma existência
não é a essência, mas se expressa através da essência, retornamos aqui ao
plano pagão de Plotino que concebe o Uno como fonte de singularidade
e de Leila Vitória de Oliveira que relê a “suidade” zubiriana como a
revelação de uma “henofania”, e portanto do ato de existência como
relação extática com o fundamento último de toda a realidade.
Essa relação extática que funda cada existência singular envolve
necessariamente o estabelecer de corealização (Mitvollzug) onde a
emergência da singularidade não é um monolito estático e sim uma fonte
extática cuja poder reune céu e terra em um entrelaçamento único e
irrepetível, tal como o raio de Zeus que fundira a carne de Dioníso com a
dos Titãs. Ao estabelecer que a “causa ontológica” procede de um plano
pré-ontológico, a estrutura existencial humana se torna um espelho das
divindades, onde propriamente “humano” é um ser-com (Mitsein) em
relação ao campo do Universal, um receptáculo de uma realidade que
o antecede e que surge do modo como esta se reveste de uma essência
(tal como a humanidade); essa relação gnóstica representado pela lei da
analogia é uma definição filosófica altamente lógica-realista da divina
comédia chamada Pan.
Talvez, ao iluminarmos tal espelho poderemos encontrar sentido nas
palavras de Heráclito:
“Os imortais são mortais; os mortais, imortais; vivem reciprocamente
sua morte e morrem reciprocamente sua vida”

Inspirado por esse pensamento hermético; eu sempre escrevi de forma


alquímica; não será hoje que mudarei esse fato.; quando o vento move os
teus cabelos ou a água molha teus olhos; eu também preciso ser vento
ou chuva.
Nisto eu tento me aproximar ao máximo do athanor surrealista dos
tratados de alquimia medieval,pois a Arte irá sobreviver,mas não os
artistas.
Também apresento uma certa doutrina cabalista; a ideia de que o mal
se alimenta do bem como uma casca vazia,por isso o Inferno de Dante
Alighieri era descrito a semelhança do paraíso.
Com esse livro eu continuo a “Ventania” delirante apimentada &
inspirado pelo o gênio de William Blake - que expôs genialmente essa
idéia de que o céu & o inferno estão casados na mente do homem - ; esse
escrito é a minha mais sincera homenagem a este ser andrógeno que
acorda-me pela manhã acertando a minha cabeça com o caduceu de
Hermes.
Seguindo a mesma linha desde “Ventania” ,lhes apresento um milk-
shake recheado com o chocolate & a baunilha de minha irônica &
arrogante filosofia iniciática-hermética; esse é um escrito d’um mago, um
poeta maldito ou um daimon.
Consegue por acaso uma serpente andar em linha reta? Não é ela por
acaso,filho do Mercúrio,do Enxofre & do Sal?
Nesse sentido,meuspoemas mostram claramente as diferentes fases
de putrefação,calcinação,sublimação & fermentação do mundo & de si
mesmo; pelas as minhas pegadas deixadas,aquele que tiver interesse no
ofício de poeta poderá arrombar as portas do umbral & subir a escada de
Jacó em direção a um sonho do mundo aquático-aéreo. Algo sintetizado
na famosa frase de Jung de que “quem olha pra fora sonha”.
Todas as metafísicas tradicionais partem do seguinte princípio.
o mundo manifestado é uma tentativa de restaurar as energias do
caos.No hinduísmo Purusha é desmembrado e três ordenadores são
estabelecidos sobre o mundo (Brahma,Shiva,Visnu); e a reencarnação
não é uma forma de “purgar pecados” ou “evoluir” é apenas o processo
da natureza em sua regeneração e restauração da energia espalhada no
caos; é o que o Senhor Krishna quer dizer com “o sábio não se lamenta
pelos vivos(despertos) e nem pelos mortos(dormentes)” pois o mesmo
aprendeu que tanto o mais opulento como o mais doente e miserável
estão no mesmo jogo da “natureza que reforma a Natureza” como dizia
uma antiga parábola alquímica.
Numa tentativa frustada de ser elegantemente trágico ; esse livro
tratará do psicótico erotismo blakeano/dantesco & encerrarei o mesmo
com um evangelho gnóstico inventado por mim & um livro de aforismos
bobos.
O gnosticismo é um sentimento & rastro de neon no fundo de olhos
perdidos na floresta. Esse sentimento sempre me acompanhou; me fixei
na solidão do abismo aquático & na formas de Eros,me fixei no caos do dia
a dia & em seu erotismo simbólico-infernal advindo de Dionísio & Afrodite
; essa é estrada de tijolos dourados para todo aquele que deseja ser poeta.
A minha obra, em todo seu caos , é a própria representação do
paradoxal caos alquímico & organizado das fatias que formam o
mundo; aquele que compreende a minha postura irá aprender a tomar
formas ígneas, aquosas ou aéreas & viajar pelas camadas superiores &
inferiores do mundo; ele se abrigará no céu & será um trovão entre os
abutres,ele se abrigará no mar junto com os peixes-estrelas,ele verá as
pessoas como portas & o inverno como a paixão do meio dia; digo isso
porque os poetas lêem uns aos outros, aprendem entre-si e têm, como
qualquer outra unidade de trabalho, suas tradições de aprendizado, suas
palavras-de-passe e seus símbolos e códigos de iniciação; embora essa
sociedade milenar seja talvez tão antiga quanto a vivência humana os
seus escritos expressam uma única regra e formulação onírica de que
todos os poetas de todos os tempos e lugares sempre deixou implícita
em teus escritos; Krafka, um grande poeta que embora tenha ocupado
os graus mais altos dessa iniciação (embora também tenha também
quebrado o rigoroso sigilo da arte ), expressou esse segredo nas seguintes
fórmulas que escreveu no seu livro Er no ano de 1924; “ O fato de que
não existe nada senão o mundo dos espíritos tira nós a esperança & nós
dá a certeza.” & “Não é necessário que você saia de casa. Fique junto á
sua mesa e escute. Nem mesmo escute, só espere. Nem mesmo espere,
totalmente em silêncio e sozinho. O mundo irá oferecer-se a você para o
próprio desmascararmento, não pode fazer outra coisa, extasiado ele irá
contorcer-se a seus pés.”.

Justifico também que quis escrever em letra rosa,pois isso é algo que o
agridoce William Blake faria,além de combinar com a doçura da toca do
coelho.

Esclareço também que a arte na capa desse livro é a pintura “Saudade”


do surrealista Renê Magritte de 1940 & encerro essa introdução com uma
citação do prefácio do diário de São João de Aleister Crowley;

“O Universo da Magick está na mente de um homem; o cenário é


apenas Ilusão, mesmo para o pensador.
A humanidade progride; antigamente, os homens viviam em regra
no mundo exterior; nada menos que gigantes e sarracenos, homens de
armas e donzelas em perigo, vampiros e súcubos, podiam distraí-los. Seus
Magistas evocavam Demônios da fumaça de sangue, e faziam ouro de
metais mais grosseiros.
Nisto eles tiveram sucesso: pessoas perspicazes notaram que o ouro e o
chumbo são apenas nuances do pensamento. Tornou-se provável que os
elementos sejam todos isômeros de um elemento; a matéria concebida
como nada mais que uma modificação da mente; ou, pelo menos, as duas
coisas, matéria e pensamento, devem ser conjugadas antes que qualquer
das duas se torne inteligível. De um lado, todo conhecimento nos vem
através dos sentidos; por outro lado, é só através dos sentidos que nos
vem o conhecimento.
Portanto, nós prosseguimos com nossa conquista da matéria; e estamos
nos tornando peritos. Levou mais tempo para aperfeiçoar o telescópio
que o automóvel. E se bem que, naturalmente, existem limitações, nós
sabemos o suficiente para podermos predizê-las. Nós sabemos em que
progressão o coeficiente de velocidade possível a um barco a vapor
aumenta – e assim por diante.
Mas em nossa conquista da Natureza, que estamos efetuando
principalmente através da inteligência racional, nós estamos nos tornado
cônscios do mundo da mente; tanto assim que homens educados passam
nove décimos de seu estado de vigília naquele mundo, e descem dele
apenas para comer, vestiram-se, etc., quando imperativamente chamados
pela sua constituição física.
Ora, para nós que assim vivemos, o mundo da mente nos parece quase
tão selvagem e inexplorado quanto o mundo físico parecia aos gregos
antigos.”

Parte I; A Fogueira rosa devora as tripas extravagantes dos corpos de


doçura violenta

1.Torre de Babel

慾火焚身/ o fogo da paixão é tão intenso que consome o corpo/the fire of


passion is so intense that it consumes the body/le feu de la passion est
si intense qu’il consume le corps/il fuoco della passione è così intenso da
consumare il corpo/огонь страсти настолько силен, что поглощает тело
2. Tempo,espaço & orgasmo
(Em homenagem a Aleister Crowley & Wilhelm Reich)

Ontem,
Teve ela um orgasmo,
mas não foi como qualquer fogaréu & canibalismo,
foi uma foda cósmica;
talvez semelhante apenas ao podre estado de morte &
dissolução da consciência.

Ela segurou a cama de veludo que flutuava entre nebulosas,estrelas


& buracos negros &,em órbita, quase esqueceu o caminho de volta. Ela
sentiu os pés formigarem & o mundo lá fora ficou em úmido & uterino
silêncio. O único som que ecoava era o de sua respiração, que viajava de
forma acelerada e fora de ritmo do blues da anima-mundi.
Susupirou no ouvido de alguém e não teve pressa de aterrizar de volta
em seu corpo abraçado pelo o frio da manhã.
3.Inferninho地獄

“Neste momento Izanami disse;


“Ó meu amado marido, se fizer assim, eu vou estrangular todos os dias
até a morte um milhão de filhos teus.”

- O Kojiki

“Pelo Terceiro Ângulo eu viajei, lançando à frente os chacais do tempo e


cantando com os homens que saltaram dentro do Mundo dos Horrores.”

- H. P. Lovecraft

Quando o blues era um shinigami do pesadelo & o anzol do céu


amargo fisgava minha alma-peixe,
estava em posição de lôtus sentado no banco da praça enfeitada pela
estátua de Azevedo
& invocava em minha conversa as palavras da doutrina de Budha de
que “ tudo é dor; pois a dor surgiu do desejo”;
,voava no céu o dragão Yamata no Orochi que rompia as nuvens
negras,
& O brilho das estrelas partia em vagão de luxo de um trem oriental na
voz do riso de tormento de Izanami;
o reino do inferno de Enma-Daioh florescia perante meus olhos de
carmesim,
atormentados os mortos dançavam em sofrimento por entre a fumaça
dos cigarros;
vi os fantasmas de guerreiros mortos transformados em lagartixas
& grandes gatos assassinos que dançavam,tocavam trombetas &
incendiavam um ônibus,
vi baleias fantasmagóricas que copulavam no ar & esqueletos gigantes
que cortavam o horizonte,
vi guardas-chuvas que possuíam olhos enquanto onis vermelhos
acertavam o crânio dos que lá estavam com seus cassetete pontiagudos
enferrujados & os pescoços de belas mulheres se alongavam como
serpentes-girafas & meninas-raposas que me aterrorizavam com suas
nove caudas,
vi correr uma roda em chamas com um rosto decepado de um senhor
feudal preso nela & vi uma mulher-caracol atravessar a rua lentamente,
vi as vulvas das mulheres amarem os tentáculos dos polvos que
saltavam do negrume do abismo & as apertavam contra as paredes
enquanto pessoas ferviam nos caldeirões de Yama &
Tsukuyomi,a lua,jogava sobre a terra escorpiões dourados para se
vingar das nuvens de sangue & sêmen ejaculadas pelas as chaminés
dos prédios escondidos nas sombras que manchavam a visão dele do
firmamento.

4. Filosofia do sangue
Preciso fugir para aonde
a violência seja açucarada;
trovão do silêncio da manhã,
homem feiticeiro
de membrana plasmática,
alquimia beatnik
& Fedeli di amore,
solidão no submarino do oculto,
sabedoria ferroviária do sangue
aristocrata dos palhaços venenosos
a declamar poesia & cabala
em picniks de sarcasmo
& degladiarem em coliseus-ordálios
de chamas de sabedoria & tolice.

Blavatsky & Pico Della Mirandolla


dizem que
talvez as mulheres & coelhos
sejam férteis & felizes
quando lêem a bíblia
ao contrário;
talvez a matéria seja má,
& talvez teu ouro seja bosta,
& talvez Abraão tenha prosperado
vendendo o corpo de Sarai,
& talvez ETs monitoram
os canais de comunicação
de ferro-velho com
extermínio & alienação,
& talvez o Mickey Mouse
trabalhe para FBI,
& talvez a torta de maçã
não tenha maçã,
talvez o céu seja azul.

Só sei que enfeitiçado


pela a vareta de cordão,
fujo para além do azul prússico
nos vastos motores da lua &
do nascimento das bestas
giratórias que copulam
caos no caos.

Sou gnóstico da rua de ferro


com a desgraça d’um anjo,
pois para ser herético
é preciso aprender com
Giordano Bruno;
o prazer de blasfemar touros
& atirar flechas nos arcanjos.

Sem direção?
Há direção ?

Em direção a alameda
do meus sonhos
& bater de asas nos tortos
espelhos & pianos de nova era
tocando melodias de
escorpiões de decadências
& efervescências de bruxaria
alquímica & saxofone num
deserto de almas tão vazias;
em direção a grande obra
em direção a summa iniciação,
em direção a supresa & desespero,
em direção
ao hospital no horizonte,
em direção para
o além do véu de Ísis.

5.Olhar
Os olhos do anjo
contemplam o vazio
da tarde de quarta-feira
&
o vento farfalha
as folhas de outono
& o silêncio abraça
as casas de madeiras
abandonadas
ao doce nihilismo macabro
dos estranhos sinais de Saturno.

As memórias verdes-mar
dos sorrisos pescadores
atormentam a mente
de um anjo solitário
que flutua sobre
o céu da tarde.

6.Os olhos azuis do místico Tolo

A maré queria
engolir o sol
numa águia de água,&
nasceu desse casamento uma
súcubo terrível que
deu veneno ao coração do homem;
ele bebeu,& morreu,& se fez tolo,
& vestiu-se de verdes trapos velhos
como um Deus da primavera.

(& a justiça clamou-me


em doçura em direção
ao horizonte terrível
do desapego).

7.A ferida aberta da manhã no céu

Enquanto as corujas guardam as portas do horizonte


chovem dados das nuvens violetas & brancas
carros de ferro movidos a óleo & sangue corta a pétalas dos olhos de
quem caminha pela a avenida,
o chacal do pesadelo desfila pelas as fumaças,
os olhos dos mortos se incendeiam em paixão enquanto o lagarto da
manhã engole o escaravelho da madrugada,
as árvores crescem rasgando a placenta da terra enquanto o relógio do
mundo é colocado no congelador da melancolia,
as estrelas explodem em manchas de sangue sobre a lona azul do
firmamento & meu peito estoura em sangue enquanto carrego a chuva na
ponta dos meus olhos;
nesta manhã o mundo foi cuspido pelo o anûs da morte em diarréia de
fogo & enxofre.

8.Corpos vestidos da madrugada

“O seu hálito faz ascender carvão com a chamas de vossos lábios.”

- Jó 41,2

Ó,Menina meia andrógina & azul


de curto & cacheado
cabelo dourado
& olhos vermelhos de névoas
do leite das estrelas,
como um trovão de dor & prazer
tu estava assentada sobre o
vulcão do meu sétimo delírio &
segurava a serpente do meu
desespero,
pois você moldou o meu coração
na lama d’um estranho amor
feitas das preces do inferno.

9.Madimi
(Em homenagem a John Dee & Aleister Crowley)

Eu em uma certa ocasião sonhei com o mesmíssimo doutor John


Dee, astrólogo da corte de Isabel e o maior matemático de seu tempo,
constantemente associado com espíritos e anjos segundo suas próprias
demandas; e Dee lhe oferecia «o bago da distração», um fruto mágico que
conferia imortalidade.
«Tomem e comam da árvore a toda pressa», dizia Dee, mas o fruto
cheirava a excremento e será desagradável de ver e tocar, e quando Eu
tentava rechaçá-lo, uma segunda figura, feminina e excitantemente
nua; embora com cabeça de vaca, aparecia a costas do Dee e declamava
solenemente « DAEMON DEUS INVERSUS EST”», enquanto todos eles
se encontravam de novo subitamente ante as portas de uma imensa e
insectóide capela coberta pela a sombra da manhã.
10.Trilha no bosque negro

Solidão é uma
choupana coberta
por um tecido
do verde musgo do pântano,
iniciação ao meu nihilismo místico
& trono aristocrático dos
hereges modernos.

Meus olhos doces


desenhavam
flores negras
no peitoral do tempo,
sou a alma fecal contra a
ditadura da razão;
em três conjurações para renascer
represento a irmandade dourada
& nesta barca de Ísis
sou alucinação na ponta
dos seus olhos vestidos
de gaivotas & maré baixa;
a arte vem da guerra,mas,
nem vossa guerra & nem vossa paz,
mas a crueldade cristal do
sigilo do céu no ciclone
do meu peito.
11.Voyeurismo
(Em homenagem a Aleister Crowley)

Morte em amor de mel em rosada caveira risonha


- figura por entre as cortinas vermelhas o duende da morte dançante (
de um voyeurismo de um poeta solitário);

Dentro da janelinha do apartamento ao lado


um jovem dança dentro duma moça-nuvem de vulva rosada
- usando sua calcinha chiclete como um cisne amarrado
& tragado ao abismo do mar - ;

ela - com seus lábios de flor de saliva - urra em prantos de mashmellow,


enquanto ele acerta o disco voador de sua carne em sangrento nocaute
elétrico
& caí sobre seus olhos redondos de abismo profundo em dança
cósmica;
vejo ela rebolar sobre ele tocando o paraíso de silvestres morangos de
sangue,
vejo a lança & o Santo Graal ,
vejo doçura em perfume de suor de açúcar,
vejo a violência de um sagrado inferninho que espanca a carne da
morte & extraí luz das lágrimas de Belzebu;
vejo trovoadas & furações.

12.A química das cores do tempo

Seduzido
pelo o horror da nostalgia,
atravessei a borda do mundo
& naveguei no mar dos sonhos perdidos;
nos escritos dos poetas alquimistas.

13.Anjo-azul
(Ou delírio místico & homoerótico)

“Num torpor lúcido, pesadamente incorpóreo, estagno, entre um sono


e a vigília, num sonho que é uma sombra de sonhar. Minha atenção
bóia entre dois mundos e vê cegamente a profundeza de um mar e a
profundeza de um céu; e estas profundezas interpenetram-me, misturam-
se, e eu não sei onde estou nem o que sonho.”
- Fernando Pessoa

Lucifer flutua
sobre o céu de diamante;
O anjo andrógeno e seu sexo de fogo,violetas,e de bombons antigos
nada na piscina azul do infinito céu;
Ele se parece com uma mulher assassinada num beco frio,
Ele se parece com estátuas de mármore,
Ele parece com um rato ( & o mundo é o seu queijo dourado),
Ele se parece com um palhaço,
Ele se parece com um delírio,
Ele se parece com o machado d’um lenhador & se parece com um
adolescente que se masturba,
Ele se parece com um astronauta de mármore,
Ele se parece com um vaso d’água,
Ele se parece com um espelho,
Ele se parece com o tigre de Blake.

14.Juízo Final

Poucos sabem disso,mas,


no juízo final no fim dos tempos;
somente Deus será condenado
ao fogo do inferno.
Naquele dia final
uma multidão de bons homens
olharam para o céu &
condenaram Deus,dizendo;

- de que cor é a mão que escreve


a narrativa na qual
os bons protagonistas
da inocência
são exterminados
no final da decadência ?

15.Light and darkness,Robert Fludd

Eu sou o olho que penetra,


Eu sou a forma que é vista,
sou o falo & o útero,
sou o céu & o inferno,
sou o conhecido & o desconhecido,
sou o cristal de vômitos,
sou a fala,
sou cor-ação,
sou a águia & o escaravelho,
sou a fórmula matemática
1 + 1 = 0 = 1 = 2 = 3 = 1 = 0.

Eu sou aquele que não aguenta


guardar tanto Eus no corpo,
Eu sou a minha prisão,
Eu sou o tzimtzum,
Eu sou o revolucionário,
Eu sou o que sente
& o que é gelado,
Eu sou a luz sobre o nada
& o nada sobre a luz,

16.O Soneto da Marca de Caim

Eu pensei que
sobre o cristal de minha pele
tinha uma ferida
antiga & invisível,
que feria-me como uma farpa
sobre a maré dos meus olhos.
Ó,fluam minhas lágrimas!
Pois hoje sei que sou eu
a minha temida ferida de enxofre !

Em verdade sei que minha


carne é o túmulo dos meus sonhos!
Em verdade sei que o mundo
é o meu pesadelo!
Em verdade sei que
o pecado espetou-me &
errante caminho à beira do abismo.

Mais sei que na antiga residência


numa alta montanha
mora o eterno menino vestido
com a aurora & que ele carrega
o mais eterno-devir.

Mais sei que no fundo do oceano


existe um peixe feito de ouro
quem em suas veias corre
o elixir da longa vida.

Orei pois ao altíssimo para


ascenda um sol negro
no interior do mundo;
que assim ele ferva o oceano,
& cozinhe os peixes,
& asse a carne dos animais do vale,
& derreta os metais,
& transforme tudo em um único
OURO.

17.O Rio

A cidade é atravessada por um rio,


como uma rua
é passada por cachorro,
como o pavão do arco-íris
atravessa o céu pós-chuva,
como uma faca corta uma maçã.

O rio ora lembrava a salvação


& ora lembrava a perdição;
flutuava em suas águas rosas
os esqueletos do cemitério
juntamente com os peixes,polvos
caranguejos,sereias & barcos.

Perguntei aos cidadãos da cidade


se aquele rio era ácido,
ou era esgoto,
ou era sangue de unicórnio,
ou era fonte da vida;
mas ninguém quis responder
tal terrível pergunta.
18.Duas criações

No início dos tempos


surgiu um diamante de luz
em meio às águas negras.

No início dos tempos


surgiu um espaço vazio
em meio a alma da luz.

No início dos tempos


as formas primitivas engoliam
os peixes que eram fagulhas de luz,
enquanto a luz copulava
com a Sombra.

No início dos tempos


toda voz era semelhante ao silêncio.

No inícios dos tempos


existia o fogo da cólera de Deus.

No início dos tempos


as vozes líquidas
não se contradiziam,
mas eram doçura.

No início dos tempos


sofriam Adão & Eva
num jardim cujas as árvores
& frutos estavam podres.

19.A forma da luz

Ó,Velho ancião dos Dias,


tua sedução é
a mesma duma bela & grande casa.

Ó,sim!
Ó,Ancião de olhos-trovões,
Tua sedução é a mesma do silêncio
d’um deserto de sal.

Ó,ancião dos dias que governa os céus em seu trono de diamante,


tua sedução é a mesma duma folha em branco.

Ó,senhor do Amor,
a sedução de tua luz inefável é a
mesma que a de uma amante.

Ó,senhor que sofres em meu peito


- pois estou no reino negro da blasfêmia que governa em seu trono de
diamante negro no limbo do esquecimento -
a tua sedução é a mesma que a liberdade do sol & do ar livre.

20.As Flores do mal

Brotam maçãs verdes das macieiras


por entre o silêncio da noite,
súcubos & fadas carnívoras voam
por entre
a desolação do jardim sanguinário.

Rios de sangue,fogo & enxofre


adubam a terra melada de mel
que sente uma fome & uma sede
insaciável.

Um vulto solitário d’um


homem feito da terra grita em dor;
com violência o Velho Tolo
- que o criou -
lhe arrancou as costela.

Tola quanto o homem


dança Eva por entre o jardim;
& dos seus amantes do bosque
a serpente é o veneno de Deus.

Ó,como a mulher gostaria


de voar entre as nuvens douradas
& se libertar dos grilhões de ferro
em teus pés!

Ó,como o homem gostaria


de beijar o despertar
& na fúria da dor
apunhalar o peito
do seu miserável criador!

21.A invenção de Orfeu

Um dia,quando o silêncio da madrugada for seco como a areia do


deserto, Morfeu irá visitar o teu sonho em um bailar pelo o ar; nesse dia
você sonhará com floridos campos vestidos de rosa & uma camponesa
com estranhos olhos de inocência virá lhe oferecer flores - enquanto
brilho do sol vai queimar tua pele & ofuscar teus olhos num clarão
reluzente -.
Debaixo de uma sombra de um carvalho,vocês conversaram a sós,
enternecidos & apaixonados, & com certeza um boi vai mugir ao longe (na
quase beirada do infinito).

Nesse sonho o tempo irá passar devagarzinho &


e nada poderá salva-lo da imensidão do mundo; e neste momento tú
terás encontrado a pedra filosofal.

22.Amor-fati & milkshakepeariana


(Para Erika)

“Sustentai-me com uvas passas & confortai-me com maçãs,porquê


desfaleço de amor.”
- Cantares 2;5

“Se fossem postos juntos dois objetos Se fossem postos juntos dois
objetos diferentes: Crátilo e a imagem de Crátilo, e uma divindade não
imitasse apenas a tua figura e tua cor, como fazem os pintores, mas
formasse todas as entranhas iguais às tuas, emprestando-lhes o mesmo
grau de ductilidade e calor, além de movimento, alma e raciocínio, tal
como há em ti; em uma palavra; tudo exatamente como és, e colocasse ao
teu lado essa duplicata de ti mesmo: tratar-se ia de Crátilo e uma imagem
de Crátilo, ou de dois Crátilos?”
- Platão

Eu quero emoldurar teus olhos


nas brancas chamas da eternidade,
eu quero ejacular
dentro do teu crânio,
quero te ver dançar sobre
meu útero,
quero apunhalar o teu peito
com toda a minha força,
quero te ver odiar o mundo,
quero murchar o orvalho dos
seus lábios,
quero sentir o
sangue rosa de sua pele,
quero atormentar tua mente
com as minhas loucas alucinações
de nihilismo de botequim,
quero ver o gosto do paraíso
em tua pele de primavera,
quero moer teus ossos
& com o pó de tua alma fabricar
a substância enlouquecida
dos meus versos de Amor.

(Som de Bach ao fundo).


23.Amor-fati & milkshakepeariana II
(Para Erika)

“ (...) & caddi come corpo morto cade(...)”

- A Divina Comédia; Canto V; Verso 140.

“aos deuses mais cruéis/juventude eterna/ eles nos dão de beber/na


mesma taça/o vinho, o sangue e o esperma.”

- Paulo Leminski

Um ácido-doce-cítrico perfume
& um filminho gravado
-num nervo da massa cefálica -
vem entre a bruma & o laranja
da manhã de frio
(enquanto ouço Johann Sebastian Bach na hora cósmica do búfalo em
que o tédio se mistura ao mistério ) ;
A flor de seda está aberta
& eu estou boquiaberto em frente a memória do enigma do corpo
alheio
( em esfinge do céu
velada em mel & fel ?)
que é semelhante a solar mulher reclinada que Egon Schiele pintou em
1917;
& então na hora cósmica do búfalo percebo;
amantes são como que fantasmas vivos;
eu não tenho medo de fantasmas,
tenho medo de mulheres de branco
que nos assombram em relâmpagos.

24.Á São João da Cruz

Na janela sombria dos meus dias,


danço tango com meus demônios
& escuto o desabrochar do tufão.

Aqui, em meu quarto,


me sinto preso
em meu sangue & vísceras ,
sou o vinho do meu pesadelo,
sou a espingarda & o leopardo;
& rasguei meus lábios em gritos
envenenados clamando
pelo socorro do menino Jesus!

25.Furacão

Num eterno-retorno;

Despedaçado eu vi brilhar
no alto de minha montanha
de solidão;

a infinitude,
o abismal,
& o Não Ser.

26.Aprendiz de feiticeiro
Um galo que vê a aurora tece
o silêncio da noite com suas tripas;
& ele se chama Abraxas.

O relógio derrete & grita;


entre um segundo
& outro segundo,
descansa a eternidade.

Pequenos grifos pousam


na madeira de minha janela,
sereias nadam no abismo
da piscina de meus olhos,
o jazz é um Exu africano,
imagens dançam
em meu esqueleto trêmulo,
inúmeros espíritos desaparecem
no ar
& as velas se apagam com
o sopro dos anjos da madrugada.

27.Passageiro de algum trem

Poesia & filosofia


é fogo rosa descido do céu:
pra falar de ambos
é necessário
abrir a gira
invocando Exu tranca-rua
ou
Dionísio
como
trapézios de Mercúrio;
Platão era um grande místico
& Virgílio um xamã.

Filósofos são carros de fogo


& espíritos honrados presos
as folhas brancas dos livros,
poesia é vertigem elétrica
de Antonin Artaud condenado
ao manicômio &
febre de primavera de
Dante Alighieri & Beatrice.

Poetas são ilhas


& televisores bêbados
num caldeirão & caldo
de chuviscos & imagens
nas medulas dos olhos.

Banquete que te habita,


arte que te imita;
bacon dentro do
misto-quente de tédio & mistério;
ideogramas negros (agora rosa)
gravados em fogo branco
no fundo & mais fundo
no centro da galáxia
do passageiro solitário.

28.2001,Apolo XI & Solaris

O astronauta
liga os metais
entre horizontes;
vestido de crua-lua
voa o anjo-andrógeno
carregando o mundo
no útero de sua costela.

forte será sua potência somente se ele deixar o orgulho de sua altura &
for convertido em um pequeno poeta.
29.DaÁgua dos filósofos

Enquanto o fogo
é a terra que melhor absorveu
o sol,(isto é a Vontade);
a água é o selo da terra
que muito foi beijada
pela a lua (isto é o insconsciente).

No dilúvio Noé construiu


uma barca & se salvou;
isto é, pegou-uma moça apaixonada
secou-a em teu fogo &
tornou-a macho em si
(pois integra é a potência
da água somente
se for transformada
em terra).

30.Salamandra

O fogo ou enxofre
é o espírito do vinho
que oculto debaixo do ossos,
anima a carne & a joga
ao abismo;
o mundo queima & dança,
o ferro de nosso sangue tinge-se
de um laranja terrível
dum tigre selvagem.

O fogo é fome & a sede


que sentimos desde do ventre
de nossas mães ;
é o veneno da serpente &
do pelicano que devora
sua própria carne.

O jardim de Deus queima


em inúmeras pétalas de fogo;
esse jardim é uma rosa
guardado no fundo do teu coração.

31. Gaia & Tiamat

A terra é o chumbo pesado


onde Asar desmembrou-se
& foi enterrado;
é a mãe do pesadelo
& a prisão de nossos ossos.

Não se engane,pois
a matéria é má.

32.Xamanismo Urbano

Um xamã moderno
observa dragões
no alto dos prédios públicos.

Em verdade vos digo que


aquele que não vê dragões
no alto dos prédios
em decomposição;
ainda não entendeu nada
sobre a grandeza do mundo.

33.A solidão é uma ninfa de cabelo rosa


A solidão é uma
ninfa de cabelo rosa;
uma titãs de
olhos de ciclones &
um ramo esquerdo
da macieira do paraíso.

Seu lábios
de flor encharcada
de saliva
& pele-café-claro-delicada-
com-gosto-do-orgasmo-da-morte;
é a janela espumante da noite de
quartos sem tetos,amores azuis &
negras máquinas de escrever
tocadas pelas sombras como um
piano desafinado
pelos dedos finos de
Giorgio de Chirico.

34.Mares negros

O mundo é uma ilha de destroços;


plantas em flor de carne crescem
no iceberg de índios canibais.
No silêncio da madrugada
eu sou navio jogado ao esotérico;
cego andarilho clemente
no deserto de Paracelso,
Eliphas Levi,Boehme,
Scholem & Mircea Eliade.

Nos livros de musgo verdes


salpicada por esqueletos
de monstros do pântano;
Netuno me encontra na canção
d’um Velho marinheiro;
explode o
coração vinho-tinto
do pirata gnóstico plantado
na aventura
em busca do Santo Graal.

35.Andanças

Ando pelo mundo


como Dante Alighieri que
convidado por
Beatrice & São Bernardo
ás 9;09
no dia 9 do 9
dum sábado de aleluia
de 1300,
entrou com Virgílio
na lamborghini filosófica
de São Tomás numa
viagem alucinada
pelo o purgatório,inferno
& o paraíso
(a lá Orfeu & Pistis Sophia).

36.Em memória de William Blake

Blake era mais que um garoto,


Era um anjo de vento devasso
amando sobre a terra nua,
era a inocência com garras a mostra,
era o amigo de todos os Deuses,
era os cochichos das almas presas,
era névoa de insetos deliquentes
a devorar os morangos silvestres;
as árvores lhe ensinaram a dançar
no crepúsculo,as putas
a verem Deus
& os anjos & profetas de
Swenderborg lhe ensinaram
a escrever poesia.

37.Ilusões

Um poeta observando quão bela a nudez uma folha branca é,se


questiona e indaga;
Se fadas e homens existem. Onde termina poesia e começa vida? onde
termina o espírito e começa a carne? Onde termina folha branca e começa
a minha mente?

39.O grito do papel

Anjo negro grita socorro


por entre a lagosta da noite;
coração partido
entre ossos humanos &
janela quebrada sem fôlego.

Poesia cospe o sangue da laranja,


lida com estrelas de
dimensões não humanas,
com tempestades de orgônio,
com profecias,
com totens,
ferrugem dos olhos
& espíritos dos bosques.

Alguns fingem ateísmo


& modéstia,
mas todo poeta;
tem como meta
ser um louco profeta a
pregar o fim do mundo
em seus versos obscenos.

40.Noites no meandros de rosa

Poesia se escreve num quarto


saído do mar;
sangue onde trafegam
piratas da gnose
& estrelas-tufões turvas
em bosques caleidoscópios.

Um pequeno sol
pousou sobre meu ombro
era Horús
numa ave de olhos-negros
& eu só creio na geleia
da metafísica;
no céu tem uma fila de
meteoros predispostos
a caírem em cima de mim
no bailar duma noite sem fim.

41.Pedra do sono & vazio da manhã

O vento beija os sinos


de abelhas domésticas
no jardim enfurecido,
guardado pela bruxaria
da manhã consumida
nas brancas chamas
do sol de aspirina.

A psicologia da composição
parece um antiode
contra a profundidade
deste momento;
o sol nesta manhã é branco
& leve como uma folha de papel.
As casas flutuam num deserto
de sal,luz branca & sombras,
a estática do rádio
parece constrastar
com a visão da minha janela;
clarão branco do sol entre
nuvens nubladas.

Nesta manhã de outubro


eu mergulho
no instante do big-bang.

42.Dança & treva


(Em homenagem a Hermann Hesse)

“Demian é um livro deliciosamente macabro.”

- Comentário de um amigo.

Dedos de sombras negras


tocam o violino da madrugada;
tripas & peixes regam o
romance Demian
com o clima terrível
onde se levanta
os Deuses andrógenos dos
planetas & ausências.

As imagens de Hessee crescem


numa dor pontiaguda & estranha;
Demian saí do livro & me
observa ao fundo
como um espírito do limbo.

As dúvidas se levantam
& no silêncio complexo,vejo
o olhar terrível dos anjos-demônios
me olharem com-paixão.

43.Porquê Homero é tão atual?

Física & metafísica


cobre a miragem em abismo
do qual tecido de sonhos & enganos
é feito o circo-pega-fogo dos dias;
os Deuses tecem mantos
de odisseias
de tragédia & amores
para que não nós falte assunto
no tédio da essência.

44.Triângulo do pitagorismo

Orfeu nos subúrbios das galáxias


canta Perséfone,
a danadinha da avenida;
& seus olhos abrem em alto mar,
mesmo amando o
imperador devorador do espaço
num triângulo amoroso pitagórico
pintado por
Botticelli & Roberto Ferri.

45.As Confissões, ou porquê puta é uma virgem Maria


(Ou mito romântico
do Padre Antônio Viera
Vs o satanismo de
Kanashimi no Belladonna de 73)
Faço poesia com as quimeras
de Nabucodonosor &
querubins de reino abstrato
de Xanadu,
sou inclinado a me perder
para sempre no mundo
na psicologia & alquimia
do segredo da flor de ouro oriental
& cruzes sagradas do catolicismo.

Exceto quando
o não-ser de Santa Afrodite
se encarna num vestido
& num sorriso adornado
por olhos de marfim.

Ó,isto não é uma confissão,


pois sagrada é a transgressão
em direção ao centro da doçura,,,
tão sagrada que todo prazer
é pouco porquê grita a eternidade.

sou um animal ou um anjo?


Isto é uma blas-FÊMIA
ou glória in excelsis dei?

46.Eclipse
Eclipse da razão
nos devaneios &
tornados do mundo,
a lua cheia atravessa as
dimensões do meu esôfago,
caso com a frieza da
própria solidão
& rasgo a miragem
do meu crânio,
André Breton desfila & brilha
por entre
os campos devastados
pela a pestilência de
ângulos tortos
& Bafhomet brilha no
neon das manhãs tortas
& sorridentes.

47.Leveza

Flechas lançadas pelos


profetas da Mesopotâmia
atravessaram o tempo
& acertaram o meu crânio
em cheio.
O fogo & a lua
me possuíram num
escorpião esverdeado
que brotou como flor
na calçada,
o jazz é um Exu
que ferre o meus ouvidos
com a sua explosão atômica
de melancolia,
navios atravessam o
oceano negro dos meus
cabelos;
as vozes de minha esquizofrenia
são brancas e meigas
como trapos de nuvens.

48.A Divina comédia chamada Pan

As nuvens sob o
tórax do oceano de Lethes
me lembram
o esquecimento
cuspindo touros de fogo
dos arcanjos de enxofre
que se decompõem nos baldes-
ferrovias do capital;
nuvem negra de
fumaça anterior ao mundo
em Osíris desmembrado,
cheia de ninfas,minotauros,
cobras,titãs,escorpiões,
aranhas,relógios,etc
em gigantes melodias
desalinhadas em líquidos
compassos da divina comédia
chamada Pan.

49.O amor é destrutivo

“O andrógino primordial, especialmente ao andrógino esférico descrito


por Platão, correspondem, no plano cósmico; o ovo cosmogônico &
antrocósmico primordial.”

- Mefistofeles e o andrógino,Mircea Eliade

Masculino &
feminino,
quente &
doce anatomia,
sorvete &
abrigo na tempestade,
arranhões &
beijos,
doçura &
crueldade,
William Adolphe Bouguereau
& anjos,
inferno &
paraíso.

50.Como ser um poeta

Como um anjo que


desconhece a misericórdia,
erga-te para cima
na forma duma
pilastra de orgônio
para além do
céu azul
& veja caldo alquímico
desse caldeirão de pântano
onde nadam as almas
imersas em Zos.

Abra-te
o teu útero
para o mundo & na
simplicidade da consciência
entenda que poesia é
relacionamento caótico
entre palavras apaixonadas
que ditam o horizonte;
é um pequeno caos ou
um microcosmo
que ascende ao
coração do mundo &
cria milhões de universos
em peles,amores,guerras & coxas.

51.A mulher no insconsciente

Mergulhada entre brumas


de silêncio
está ela com seus
olhos de estrelas de abismo,
sua pele-primavera,
suas feições de anjos
seus lábios de inferno;
sereia das águas amargas
do nosso insconsciente,
açúcar da tarde.

52.Sou um cão andaluz

Na porta da minha casa


se ajuntam borboletas no alto de
duas árvores de folhagem
dourado-rosa & verde que
se entrelaçaram.

Às vezes penso que


a minha cidade foi pintada
por Chirico & Renê Magritte,
que minhas amadas foram
inventadas
por André Breton & Dante,
que o terrorismo do meu tempo
veio de Spare & Dali,
& que tudo é um sonho
dentro de um sonho
em que
esta sociedade é uma gaiola alada
dum pesadelo
de “A Nightmare on Elm Street”.

53.Lua cheia

No momento em que minha


saliva goteja mel,
Rasgo o meu corpo fervendo
&
beijado pelo vento frio
&
Abro a flor do meu
útero arrebentado em calor atômico
&
Minha alma esfaqueada
Pela luz da lua se contorce
em vertigem;
Me afogo & explodo
na morte de um grito
de doçura.
54.Ode a Aurora

São como um cristal;


As flores da primavera
Algumas, um punhal que corta meu peito em cores;
Me faz perdido mata adentro,
Num incêndio.

Memórias são cristais do orvalho;


As flores navegam pelo o ar azulado,
Desamparadas,inocentes,
Filhas de Eva no vale de lágrimas.

Secretas caem em prantos dos corpos das nuvens


- musas aladas de translúcida misericórdia- ;
Morrem ao tocar o útero do chão e renascem com o Sol no horizonte

55.Luz no fim do Túnel


“Que é a vida? Um frenesi./Que é a vida? Uma ilusão,/uma sombra, uma
ficção;/o maior bem é tristonho,/porque toda a vida é sonho/e os sonhos,
sonhos são.”

- Calderón de la Barca

“Me conte o que você viu”, dizia o sacerdote à ninfa que parecia
uma espuma de róseo suavemente branco com hematomas escalartes
na pele,ninfa esta que lutava pra balbuciar algum sentido entre as
convulsões causadas pela overdose de ópio; “Era como um turbilhão…”,
contava, e enquanto contava, contia o pranto, “… formado inteiro de
almas, que no topo pareciam suaves e puras, e conforme caíam aos
beirais tornavam-se densas, auferiam formas quase sólidas e choravam,
imploravam condolência e misericórdia divina… Ao alcançar o fim do
redemoinho, passavam então por um buraco estreito, onde jaziam
entalhadas - numa língua que não era falada mas ao invés disso, ouvia-
se direto na mente - as palavras: ‘ao entrar no jardim da meia noite,tente
não esquecer tua origem acima dos planetas e elementos. Lamente,ó
almas que deveriam governar sobre as estrelas dançantes,por caírem ao
leve sopro do abismo. E já humanoides só tinham tempo de implorar,
pela última vez, com os bracinhos estendidos tanto quanto podiam: ‘Oh
Lúcifer, por favor, segure minha mão!’”. “E então…”, insistia o sacerdote,
“… o que acontece depois?”, “Depois de descerem até as profundezas do
abysmo, viam uma luz, e de repente percebiam-se sendo puxados pra fora
do útero”.

56.O Arco-íris além do Jardim

“Então eu estava com ele, e era sua arquiteta; era cada dia as suas
delícias.”
- Provérbios 8,30
“ Eu estava preso. Embora eu não ligasse para isso. Eu não fui
reconhecido & tudo estava sendo dissolvido,tantas as coisas terrenas
quanto às celestiais.”

- O Evangelho de Maria Madalena

“Quando ele descobrir quem ele é, o que poderá consolá-lo?[...] porque


na Terra, todos que vivem, vivem em um sonho.”

- Calderón de la Barca

Um sonho me marcou profundamente; no meio da escuridão da


penumbra tingida por uma lua monótona e dolente,eu vi o esguio e
vigoroso corpo duma mulher cujo olhar amêndoado era a faísca da meia
noite,seu corpo aberto era uma mancha de luz e a nudez de seu peito
sensível era como um iceberg ou a neve d’uma cinzenta alameda nos dias
de frio.

- Na solidão; Deus caiu no oceano & Hegel grita desesperado socorro


numa montanha da Alemanha.
Sou exageradamente uma criança a forjar uma armadura de diamante e
sarcasmo; sou a glória & o tempo que se chama Sabedoria.
Te alerto ó homem de pequena fé de que tudo que vê no mundo é
símbolo & sonho - símbolo é tudo aquilo que acredita te & sonho é tudo
aquilo que erronamente deseja - o multiverso inteiro de que somos partes
pelo castigo & erro de Adão & Eva é uma única alegoria que lhe foge o
sentido & se desdobra na face ensaquentada de Cristo.
- disse-me a sapientia mulher de luz no meio do silêncio da noite,do
sonho & do jardim do Bem & do mal.

56.1. Se nossos conceitos tendem ao estático e a realidade é dinâmica;


o vício do pensar se mostra apenas como um eco distante do centro,de
forma que as nossas percepções & opiniões são reflexos e sombras
de uma realidade fundamentalmente imaterial e dialética; de forma
que absolutamente toda a narrativa será apenas um recorte irracional,
perecível e tênue de uma realidade objetiva perfeita e agradável exterior
( somente nesse sentido que deve ser compreendido a afirmação de que
Deus haveria se arrependido de criar o homem em Gênesis 6; 7). Nos
mitos gnósticos a Santa Sofia irônicamente tem a decisão errada de cair
em aeons inferiores após ser enganada pelo o filho dela gerado; uma
serpente com cabeça de leão chamada Yaldabaoth; essa representação
mitológica possui justamente o significado da solidão existêncial gerada
pela a reflexão da Sabedoria (que é semelhante a beber água salgada para
matar a sede).

57.Oceano de vozes

Num mundo onde o sono me tomou por louco e decapitei o outono


na beleza de sua janela amadeirada,encontrei uma dúzia de tênues
fantasmas assombrando o meu quarto.

Quem são vocês? -Perguntei aos homens.


Eles me responderam em uníssono;
- Éramos a sua realidade, as suas falsidades íntimas,
Éramos tuas máscaras, mas fomos deixados para trás
Fazíamos parte de vocês, até você nós trocarem por outras mentiras
que você chamará de verdade até alguma tarde de alguma primavera sem
fim.
58.Beijos de enxofre

Tenho cidades dentro de mim;


Arcanjos gritam pelas luzes e nuvens de enxofre que sair da janela dos
apartamentos,dizendo; “ O cidade fria de olhos trêmulos & expressão
vazia,quem encontrará abrigo em teu rosto amargo e teus beijos ácidos?

Tenho cidades dentro de mim;


Encontrei o crânio de São João da Cruz largado na avenida da minha
casa,daquele momento garotas magras eram levados pelo vento laranja
do crepúsculo do entardecer.

Tenho cidades dentro de mim;


Verdes-garota-serpentes espreitam as árvores rosadas do parque
enquanto Miguel & Satã namoram escondidos num arbusto brindando a
ironia do silêncio

Tenho cidades que morrem e crescem em meu peito, prédios crescem


da terra como árvores frondosas cortam o útero da mesma e renascem
em sangue; A carne viva dos prédios vomitando pessoas é a melancólica
visão do meu jardim de girassóis de fogo.

Tenho cidades dentro de mim;


Arranquei o crânio do titã e o seu esqueleto de vozes inundaram a
minha alma e a acoitaram em seu calabouço íntimo.

59.Gnose de subúrbio
O muro marrom em frente a minha residência está pinchado em cor
rosa neon ( & assinado por Dante Alighieri);

- Lasciate ogni speranza voi che entra-te.

60.Os lábios apodrecidos

Depois de procurar em desespero por detrás das túnicas das


civilizações perdidas ou vivas; descobri que em minha terra vivia a
Verdade,que ela habitava em uma casa simples e confortável no centro
de minha cidade. E eu voltei ao local em que nasci,como um filho pro
chorando a minha ingenuidade.
Ao chegar me falaram que um homem de semblante escuro havia
atravessado o mar de ferro,e na praia do pudor ele havia avisado -
como um profeta louco - que seus irmãos bestas vindo da montanha
vermelha de flores mortas se preparavam para nós invadir; e que eles
iriam apunhalar os nossos corações, saltear nossas muralhas, incendiar
nossas casas,assassinar a doçura de nossas mulheres e ferir a dignidade
de nossos sábios e guerreiros. Eu não acreditei, e enquanto todos se
preparavam para resistir aos bárbaros eu dormia na rede de frente ao mar;
ao acordar encontrei-me de frente com tal pesadelo; enquanto eu dormia
eles vieram,a cidade estava em chamas. Ouço lendas de que a Verdade
fugiu pelo o horizonte enquanto os homens nobres foram mortos; talvez
tal musa tenha sido sequestrada.Meus lábios apodreceram antes que
eu jogasse o meu corpo ao mar e visse a morte beijar-me; debatia- me
tentando agarrar a espuma do mar que escapava aos meus dedos frágeis.

61.Sóis roubados
Entre as nuvens de mármore de pleromai vivia um vaidoso querubim
enfeitado de ouro,diamantes,lápis-lazulis,safiras & ornamentos de glória
& beleza; um anjo de olhos azuis claros & cabelos longos cor-de-neve
chamado Luxialu que com teus lábios rosados & teus olhos de lagoa-azul
conquistou a paixão até mesmo do arcanjo que guardava o sol; Miquel
confiou ao seu amor o fogo que embelezada e dava vida ao azul do
céu; o designou como ‘portador da luz’,em latim Lucifer. Um dia, Lucifer
traindo teus votos de confiança & amor fez um ato terrível; roubou o sol
enquanto os anjos estavam distraídos,e se escondeu com ele na caverna
mais profunda. Lá em seu esconderijo ele ficou supresso em ouvir os
passos dos anjos do Senhor e aterrorizado gritou que não fora ele o autor
do furto; que sempre fora o mais lírio de inocência a brotar das molhadas
nuvens celestes. Mas os anjos ignoraram teus murmúrios até que Lucifer
perguntou-lhes;

- Porquê não creem em mim que sou o mais belo filho do Altíssimo?!

_ Ó idiota,como posso acreditar em você se às suas costas está o brilho


intenso do sol que alumia? - respondeu um dos anjos na caverna.

62.Microcosmo

Numa manhã & casa qualquer; uma pequenina menina loira desenha
as letras do seu nome perdido na vidraçaria úmida de uma janela cor-de-
chumbo enquanto observa os lírios & a grama do quintal do lado de fora
se banharem em densa chuva.

Enquanto isso, umas milhares de pessoas nascem & morrem lá fora

62.Nirvana
- Não,meu amor, eu não vivi. Nunca vi o sol ou a lua,nunca andei pelas
as estradas em direção à algum lugar, nunca falei,nunca senti o calor do
café queimar minha língua ou a água da chuva molhar meu corpo,nunca
amei & nunca um homem conheceu-me. - disse-me a garota de azuis-
olhos-faíscas-pavões & pálpebras mornas segurando uma xícara quente
de café - uma moça de olhos nus que fitava o branco dos meus olhos
com o saturno negro dos seus - enquanto se reclinava sobre a cadeira
amadeirada da cozinha vestida um suéter cor-de-vinho amarrotado.
E essa mesma mulher sempre me foi sincera, de forma que eu não creio
que ela tenha mentido...

63.O ovo da serpente

A luz da aurora podia ser visto nos olhos amendoado da alma da garota
que caia no poço,no fundo dele estava um ovo & uma varinha mágica.

O ovo disse;

- Você ê a tese formulando a Antítese.

A garota sentou-se sobre o ovo & uma coroa de rosas & espinhos
brotou de sua cabeça.
64.Livros-serpentes

“A poesia é a mais fascinante forma de orgia ao alcance do homem.”


- André Beton

O que há de belo no poeta; é que ele não tem compaixão de seus


leitores.
Ele venda os olhos dos seus leitores com seus delírios
& amarra-os em uma pilastra de signos & sentidos
& despe-os de suas mantas & suas coroas de flores
& apalpa-os com suas mãos de trêmulas até que o corpo do outro
dance em amor & abrace o vento
& os beija-os roubando-lhes o ser em gosto de saliva & sangue
& controlam a respiração de seus pulmões apodrecidos
& mordem a carne de suas coxas como uma besta de delicadeza
& sussurra segredos em gemidos...

64.1. (Um fato assustador; garotos-poetas possuídos por espíritos


das grutas ainda vagam pelo o mundo cinza; - talvez possuídos pelos
os vultos alienígenas antigos que vagam pela a lua em suas formas
flutuantes de moluscos negros procurando renovar o vigor da carne &
de substâncias perdidas. Talvez,por anjos de mármore (mortos pelo o
atual ciclo sócio-econômico & por trovões do Iluminismo) esperando
sobre as nuvens de nossas cabeças as portas da percepção se abrirem.
Talvez por fantasmas de neon dos mortos nos manicômios e dos antigos
poetas perdidos no umbral. Talvez pelos os Deuses dos sonhos que
aparecem seminus nas estátuas gregas. Ou talvez por tudo anteriormente
mencionado junto -. )

65.O Julgamento

Assim diz o anjo no alto d’uma nuvem;

- tinha que ser carne/


tinha que ser dor/
tinha que ser fogo/
tinha que ser pedra/
tinha que ser paixão./
enterra & encerra.

66.Os dias do ancião

Lá vem o trêmulo nonagenário por entre os campos & montes/


carregando um pequeno ( porém pesado) sol em sua mão;/
como é possível que ele nunca tenha deixado a fagulha de luz do seu
pequeno sol se apagar ?/
como ele nunca foi tragado pela a pestilência do vento frio da
madrugada?/
como ele cuidou de alimentar o filhote de sol,mesmo estando fraco &
abatido?/
como ele não foi devorado pelos os ursos da meia noite?/
como ele não foi encontrado por Júpiter ao escapar do monte
Cáucaso?/

67.Abelardo & Heloísa; Osíris & Ísis

“Tudo aquilo que é profundo,ama a máscara.”

- Nietzsche

As asas do anjo tremem no ar, juntamente com os dedos de sua mão


direita, que faz um sinal ; destes dedos alguma coisa se transmite à
Virgem mortal mas a advertência hipnótica está sendo praticada com
um doce olhar de um olho cor de ouro que irradia uma paixão ardente
e estonteante. Quase me atreveria a dizer que o anjo terrível faz entrega
do Cristo à Virgem Santa com o olhar; ele a transpassa, a engravida. Ela,
assustada, infantil, recebe a mensagem e a advertência em sua doce mão
esquerda, enquanto apóia a sua mão direita sobre o texto sagrado, as
profecias e o Destino. E diz: “Estava escrito.”

67.1.Maria é pois o ovo divino semeado pelas as mãos do Arquiteto


& a água celeste que desce do sétimo céu,
sendo pois o templo de vivo pilares
onde flutuam os fogos de sons,cheiros e cores;
sendo ao mesmo tempo virgem e prostituta,
pois a natureza luta contra a natureza,
pois a natureza fere a natureza,
pois a natureza domina a natureza,
pois a natureza é um vendaval que ecoa em memórias
os versos perdidos de um outono distante de uma natureza perdida,
pois a natureza é a rainha que foi destituída de seu reino e
foi enterrada & perdida pela a iniqüidade de Babel.

E No teu peito ó homem está oculto a força & resplendor anterior a


criação ( como disse o próprio Eterno a Jó enquanto ele estava nesse vale
de lágrimas) - pois a eternidade do mundo é o manto da rainha celeste - ;
descobrir o teu interior será abrir a cortina das estrelas. Pois o infinito é a
raiz de tudo; sem diferenciação.

68.De Pan

9 da manhã; o sol se desdobra por entre as frestas das nuvens de


algodão do firmamento penetrando o quarto turquesa por uma janela de
madeira preta a esquerda;
envolto por uma toalha o vigoroso corpo de mármore duma mulher
loira que acabou de sair do banho atravessa o vão entre a porta do
quarto,a estante & a cama e vai em direção a janela.

Olhos amendoados fitam o fundo das janela onde flutuam um grupo


de borboletas azuis;
pensativos,os lábios rosados pensam em voz de sussurro;

- Porquê sinto que sou uma borboleta ao mesmo tempo que estou
aqui? Como se eu fosse apenas um ângulo do olho de Deus? Como se eu
fosse apenas uma cena com uma moldura & nada acontecesse depois
dessa cena ? Como se uma única roda perdida por entre as brumado
do esquecimento ligasse todas as coisas & se desvanecesse no meio do
abismo como uma pétala de rosa jogada ao vento?

69.De cabeça p/baixo


( ou “O mundo destruído por água,Doré,1866”)

“Dante/conhecia a gíria/da Malavita/ senão/como poderia escrever


sobre Vanni Fucci? Quando nossos poetas vão cair na vida?/Deixar de ser
broxas/para serem bruxos? “

- Roberto Piva

“Nel mezzo del cammin di nostra vita / Mi ritrovai per una selva oscura /
Che la diritta via era smarrita”

- Dante Alighieri

Borbulha vinho & sangue por entre o asfalto fervente/


Miséria & desemprego dançam por essas vielas perdidas/
Atravesso a rua como um corvo negro/
& então o fantasma de Virgílio diz-me;
“Deixai a esperança
& veja tudo como um filme projetado no seu crânio;
verás que há alguma beleza mesmo no pantanal mais obscuro;
desde que reconhecemos o evangelho de Dionísio em que inferno,céu
& purgatório são um único lugar./

70.A Mensagem das estrelas

Uma criança olhava o alumiar azul de uma grandiosa estrela no escuro


do céu que resplandecia sobre o quintal de sua casa,seu pai que estava
atrás dele comentou com a sua amorosa mãezinha;

- As estrelas são clarões de mundos que se findaram a muito


tempo,talvez sejam o reflexo da ultima esperança de mundos que
sucumbiram ao apocalipse.

71.Abstracção

Rabisquei no quadro qualquer coisa parecida com uma àrvore, um sol e


uma flor.
- Isto é um desenho que é concreto - disse, virando-me para os vinte
e cinco pares de olhos que me seguiam com atenção - parece-se com
alquma coisa... representa objectos, pessoas, animais, paisagens... o que
quisermos.
Por debaixo da casinha, escrevi CONCRET0 e sublinhei. Entre parentesis,
ainda escrevi representa o real.

Em seguida, desenhei com o giz branco uma aglomeração de figuras


geométricas. Quadrados e triângulos que se sobrepunham, linhas que
se entrecruzavam, circunferências juntinhas como se de pontuação se
tratasse.
- E isto, meus meninos, este desenho, não representa nada que se
pareça com aquilo que conhecemos. É uma brincadeira com as formas,
com as figuras geométricas, e serve para exprimir a imaginação pura. A
este tipo de desenhos e de pinturas chamamos de obras abstractas.

Por debaixo dos triângulos, escrevi ABSTRACTO e sublinhei. Entre


parentesis, ainda escrevi não representa o real.

Tinha dito aos meus meninos que tinham de fazer uma composição
gráfica com figuras geométricas, o que é uma forma muito complicada
de fazer um desenho. Estava a explicar-lhes a diferença entre concreto e
abstracto porque, como lhes disse, eram perfeitamente livres de desenhar
o que quisessem. A única regra deste desenho era utilizarem réguas para
desenharem qualquer forma. Podiam desenhar paisagens, animais, naves
espaciais, monstros, enfim, tudo aquilo que a imaginação lhes sugerisse.

Voltei a olhar para os alunos. Sentindo os olhos fixos em mim, lá fiz a


pergunta que todos os professores costumam fazer.
- E então, quem é que sabe qual é a diferença entre um desenho
concreto e um desenho abstracto?

Surgiu um mar de dedinhos no ar. Muitos responderam, e bem. Fiquei


satisfeito. A maioria dos alunos tinha aprendido a lição. Para terminar,
virei-me para um daqueles alunos que ainda não tinha o dedo no ar.
- E então, amigo, qual é para ti a diferença entre um desenho concreto e
abstracto?

Silêncio. Repeti a pergunta, apontando para os exemplos que havia


esboçado no quadro negro. Novamente silêncio.
Fixei o olhar de pânico da cara do jovem rapaz, enquanto a turma se
agitava em gritos e murmúrios.

72.A Sombra da eternidade

Na frente de Enoque estava a grandiosa árvore; cujos os galhos infinitos


tocava o abismo negro acima das estrelas. Uma massa de madeira que se
contorcia em cores fosforescentes que variavam entre os tons neons de
roxo e rosa, dobrando-se e vincando-se a padrões selvagens que agitavam
os seus galhos em ondas e redemoinhos de formas indescritíveis; havia
dez frutos brilhantes de cores violentamente brilhantes que agarrados a
árvore cortava a visão celeste do anjos na formas de luzes no firmamento
a semelhança de planetas; este era o coração daquele lugar, o centro da
Beleza.

A figura de Enoque repousava sentando sobre uma montanha imensa


de grama; fitando o quão brilhante era a aquela árvore que iluminava
como um sol particular do reino dos anjos. Se ele olhasse para trás; veria
as silhuetas opacas de inúmeros anjos que brincavam sobre nuvens de
ouro num horizonte imensamente distante.

Um oceano imenso de cor anil brilhava abaixo dele; e apenas uma


ponte de madeira branca rasgava o oceano profundo e conduzia-lhe até a
imensidão da árvore da vida.

Os olhos famintos de Enoque se perdiam na claridade e glória daquele


momento enquanto ele observava as letras do alfabeto hebraico escritas
nos galhos da árvore.; suas lembranças da vida pairavam em sua mente
sobre as rotas que a sua alma traçava nas formas de sua casca e, no
entanto, ele sentia que nada daquilo era realmente importante.

Ao lado dele estava uma alada figura andrógena de cabelos


castanhos cacheados; uma figura severa, vestida com um traje vermelho
arrebatador, com uma cúpula branca polida formando um rosto. Segurava
um livro debaixo de um braço.

O anjo ficou em pé em silêncio enquanto ele chorava.

- Não se preocupe; o seu passado não está perdido; pois o Eterno


sempre pensa em tudo o tempo todo. - disse o anjo.

- Você sabe o que pensa o Eterno ? - perguntou Enoque.

- Eu sei parte daquilo que ele pensa. Eu sou a memória do


Entendimento. Pois é isso que eu sou. - disse ele virando a sua face
inexpressiva em direção a Enoque. - Eu sou Raziel. - continuou.

Enoque aceitou isso. O conhecimento do Criador estava diante dele


encarnado. Isso o fez se sentir pequeno e obscuro. Havia tantas perguntas
e, no entanto, ele não sabia o que perguntar. Ele desejou que seu irmão
tivesse sido escolhido em seu lugar. Israel havia estudado a escritura. Ele
já sabia os nomes desses anjos; a forma deste lugar; ele poderia fazer as
perguntas que teriam significado para essa busca.

“O que eu devo fazer agora?” Enoque se perguntou. Sua mente


estava muito ocupada percorrendo uma lista de arrependimentos para
reconhecer plenamente a situação como estava.

Raziel permaneceu imóvel por um momento e depois centrou seu


olhar cego de volta para a Árvore como se estivesse considerando uma
resposta.
- Eu não escolhi vir aqui. Eu não queria isso. - implorou Enoque.

- Eu sei - disse Raziel.

- Neste lugar, eu sou como um fantasma e ainda não sei se estou morto.
- retrucou Enoque.

- Você não está morto. Na verdade nunca esteve mais vivo. - disse Raziel

- Este lugar é carregado de significado e ainda não consigo decifrar


nada disso. O conhecimento do Infinito está diante de mim e tudo o que
posso ver são mistérios. Eu não sou bom para ninguém aqui, é como se eu
não existisse. - reclamou Enoque.

- É verdade, você não existe. Mas ser nada é ser infinito. O Infinito é o
céu sem limites & o grão de mostarda em um. O que é tudo, não pode
ser descrito, pois toda palavra e todo silêncio o descreve. Sua falta de
compreensão não enriquece nem diminui. Você pensa nisso de modo
negativo porquê o mundo da criação em que vivia esbarra facilmente
com o outro lado; a vida dos homens é comparável a morte. - respondeu
Raziel

Enoch caiu dizendo - Eu não entendo.

- Essa árvore é feita de madeira, né? - perguntou Enoque.

- De quê seria feito uma árvore, senão de madeira? - retrucou Raziel.

- Pensei nisso como uma metáfora. - disse Enoque.

- Está certo. Mais toda metáfora tem um corpo. - respondeu o anjo.

- Mais isso não deve ser feito de madeira comum. - retrucou Enoque.
- Não mesmo,essa árvore foi regada com a dor e o sangue do Intelecto
do altíssimo. - respondeu Raziel.

- Tem uma porta dourada no tronco da árvore! - falou Enoque.

- Todas as árvores são apenas portas; e apenas sombras da verdadeira


árvore que nem mesmo os anjos são capazes de imaginar.
Dentro do tronco dessa árvore; estão os respectivos tronos do Filho
coroado,do Pai grandioso e da Mãe amorosa. - respondeu o anjo.

- Daonde surgiu a árvore? - perguntou Enoque.

- Do lugar aonde havia mais madeira; ou talvez não havia nada; ou


talvez havia todas as coisas. - respondeu Raziel

- A forma dessa árvore não é aleatória. - Enoque observou.

- Essa árvore assim como todas as coisas possuí uma alma. Há nela uma
vontade. - Enoque continuou a sua observação.

- Quando dizemos que algo possuí uma alma; estamos dizendo que
as coisas visíveis são reflexos e sombras de outras coisas coisas mais
gloriosas; estamos dizendo que uma flor morre ao nascer. - interrompeu
Raziel.

- Uma flor morre ao nascer? - perguntou Enoque.

- Uma flor morre ao nascer. - respondeu Raziel.

- Porquê ela morre? - perguntou Enoque.

- A flor é apenas um vaso que recebe algo mais sublime. - respondeu o


anjo.

- Não te compreendo. Como posso aprender aquilo que você diz? -


perguntou Enoque que estava assustado com a sua insignificância e
ignorância.

Nesse momento um longo silêncio pendurou por alguns


segundos,encerrando a conversa de ambos; Raziel virou-se para Enoque
e rindo estendeu o livro que ele estava carregando; & lhe ensinou a
cabala.

73.Mel & Medo

“Com aquela medida que o homem usa para medir a si mesmo, mede
todas as coisas.”
- Dante Alighieri

“Terceira Hora: As serpentes do Caduceu de Hermes se entrelaçam três


vezes, Cérbero abre sua tríplice goela e o fogo canta os louvores de Deus
pelas três línguas do raio.”

- Nuctemeron,Apolônio de Tiana.

Prólogo

Os vultos d’uma multidão apavorada - & recém-chegada ao inferno -


abandonou a visão lânguida do lago borbulhante & viscoso de sangue
& sêmen em que os danados mergulham com peixes,leviatãs & ninfas
carnívoras, enfrentou a ira dos homens-chifrudos-vermelhos,do caronte
& das bocas das aves de rapina que rasgavam a carne dos debilitados,
& então os atormentados pelas as bestas negras da floresta escura se
reuniram no portão fechado em frente à saída do inferno,clamando ao
altíssimo por piedade & misericórdia; estavam com medo dos vultos
sanguinários dos olhos de Deus que dançavam com suas asas alvas
sobre as nuvens manchadas de sangue e feriam homens como corvos
feiticeiros,dos lagartos gigantes com dentes afiados como lâminas de
metal,das sombras gigantes devoradoras de homens, & de outros seres
terríveis do inferno.

No final do inferno estava um grandioso portão de sete metros cuja


a flavescente graciosa de seu mármore celeste misturava tons de lápis-
lázuli,roxo claro & dourado numa mandala semelhante à uma supernova;
sentada sobre o portal estava uma dupla de nuas mulheres aladas - que
pareciam ter sido desenhadas por Botticelli - observando a multidão
amedrontada que gemia em prantos; uma delas possuía um cabelos
anil & a outra um cabelo loiro-sol-alaranjado,ambas tinhas asas de cristal
& o corpo marcado com uma tatuagem de uma serpente-dragão que
perscrutava suas coxas de marfim até os seus ombros atravessando sua
pele de seda.

Cena I

- Diga-nos sobre aonde nós leva o final do caminho dessa cárcere


escuro? Sobre de onde viemos & para aonde iremos. - disse um velho
ancião carregando uma lamparina apagada & enferrujada.

A anjo loira de rosto aristocrático disse fez o seguinte comentário;

- Além do portão há o oceano capaz de tornar alvas suas vestes sujas do


sangue do cordeiro blasfemado & curar as feridas da tua alma; o símbolo
cristão do Ichthys mostra que todo aquele que servem ao altíssimo
também são Peixes renegados ao terreno fértil do oceano da anima-
mundi; são pequenos homúnculos de Cristo cujo o destino é nadarem
no fértil lugar sagrado onde os deuses do sonho vivem em harmonia, ou
seja voltarem ao o cadinho da fagulha divina presa dentro do coração &
retomarem a ser apenas um pensamento daqueles além da beleza & do
abismo no pleroma do santo reino; além do inferno está o oceano onde
o Sol & a Lua banham-se para recuperarem a sua juventude,pois a coroa
está na pedra angular do reino,além de suas cascas.

Cena II
- Declare a gênese do inferno; quero que você conte-nós sobre a
formação desse lugar horrendo! Diga-nos o forma loira que sentada
sobre a doce porta para mundo dos sonhos; olha o nosso pranto com
amendoado olhar de diamante a enfeitar sua fria feição de indiferença! -
clamou-lhe uma mulher que gemia em dores de parto.

A alada mulher solar respondeu novamente a verdade por meio de


seus enigmáticos versos & a doçura de sua história fez com que a mulher
grávida chorasse;

Eu & minha irmã fomos condenadas pelo o Altíssimo a vigiar a porta


entre o sonho & o inferno porquê somos responsáveis pelo o nascimento
do mesmo; no início éramos uma só pessoa sem sexo chamada Alostrael
que estava encarregada pelo o Altíssimo a vigiar o mundo dos homens.
Nesse aeon vivia uma moça chamada Letícia & uma árvore considerada
proibida & maldita cujo os seus doces frutos podres cresciam em formato
de crânios pulsantes; ela comeu o fruto é foi condenada a morte por isso,
porém eu encantada pela a beleza da mesma para salvá-la do julgamento
de Miguel a transformei-a em uma serpente de fogo á semelhança
daquela que vi declamar versos no paraíso,a serpente porém em fúria &
gula começou a devorar os animais & os homens enquanto crescia em
gigantismo; pouco tempo depois ela já era tão grande a ponto de engolir
o oceano adquirindo a cor azul & apagando a sua chama.
Vê o céu azul banhado de estrelas??!!!
Pois eu digo-te que a serpente azulada engoliu a cidade de ouro &
montou-se no firmamento além das nuvens do céu!!!!

Agora pois,os anjos,serafins ,querubins,arcanjos,tronos & tempos


vagam pelo o universo sem lugar para repousar suas cabeças cansadas &
o inferno agora é o paraíso engolido pela a gula da víbora do pesadelo!

Miguel vendo a paixão perdida de seus passados não esquecidos no


meu desejo proibido,dividiu a carne da minha alma com sua espada
flamejante & prendeu-me na forma da mulher que amei; a doçura do
amor deu a luz a mulher azul ao meu lado,enquanto eu sou o ódio que
guardo, eu & ela porém não somos dois seres mais apenas um - assim
como teus olhos são partes do teu rosto num tudo todo que é teu corpo;
& somos partes do corpo do salvador que é a videira da eternidade -.

Cena III

- Conte-nós sobre como o universo surgiu do acaso tendo Deus-o


gerado pela a sua infinita misericórdia! Já que sobre o Verdadeiro Deus
oculto nada pôde-se dele ser dito- gritou os danados enquanto viam os
sete selos das porta se rasgarem lentamente.

A graciosa anja cuja a anil face lânguida era adornada com um sorriso
infernal & olhos de inocência,lhes contou alguns versos de sabedoria;

- Falarei com meus lábios a multidão de danados, narrando as primeiras


horas da criação ( lembrando que o uso de horas aqui está em sentido
figurado pois esses momentos duraram por zilhões de anos).

Na primeira hora o grande templo estava em ruínas;


era como um vaso estilhaçado em milhões de pedaços;
as dez palavras Não eram
& os peixes do zodíaco dançavam & lutavam.

A fagulhas das estrelas partiam em vagão de luxo no fundos dos olhos


dos dragões luxuriantes & abismais que copulavam nas trevas; tudo era
um porão escuro cheio de falsos Eus.
(...)

Na segunda hora as quentes-nuvens-doces-famintas rompiam com


o véu da penumbra das profundezas cuspindo uma floresta de anjos
,serafins,querubins,arcanjos,tronos & tempos;

tudo isso era mui belo,


embora fosse apenas sonho.

(...)

Na terceira hora o sorriso da nuvem negra era a faca que separa em


saudade;
uma flor morre ao nascer, logo Deus é amor.

Na terceira hora a luz casou-se com a sua sombra como um Narciso


primordial,
se tornando ossos esbranquiçados cobertos pela a argila negra do
pesadelo.

(...)

Na quarta hora a luz se tornava uma rosa trancada pelo os


setes selos dos príncipes das trevas; pronta para desabrochar em
luxúria,sangue,lua,sonho & mel; sobre o limiar da penumbra cantava
um pequeno vale a espumar clarões ao vento , estendido sobre as relvas,
ao relento branco em seu leito verde onde a luz cresce numa árvore-
trovão que toca a chave do primeiro momento & canaliza-o de forma que
palavras sobre palavras montavam uma torre para chegar ao coração do
céu em que a letra S se rastejava em fogo de glória.

(...)

Na quinta hora o querubim andrógeno chamado Zilah chora quando


vê a letra S rastejar pela a bruma da cidade santa & dizer que A perfeição
não está em si; ele pula no abismo espelhado & encontra a irmã-morte lá
embaixo.

(...)

Na sexta hora os outros querubins sentem saudades daquele que caiu;


o Altíssimo anda pelos os jardins das nuvens contando cada gota de
chuva que caiu dos olhos febris dos homens alados na grama verde do
paraíso & começa a indagar se a letra S não estava certa... & decide ceder
o paraíso a irmã Dúvida; logo após na sétima hora - seguindo o conselho
d’uma coruja - a Irmã Dúvida decide esmagar com seu pé a cabeça da
serpente; mais tem uma dúvida.

Tudo que acontece após isso,os habitantes do céu guardam em


segredo.
74.O Sermão da Meia-noite

“E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como
a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade.”
João 1;14

“A doçura vem do amargo & o remédio vem do veneno.”

- Paracelso

Pensais, sem dúvida que o beberrão Cristo, tendo bebido demais na


última Ceia, atordiu os discípulos com vã tagarelice?”

- Lutero
“A Visão do Cristo que tu vês,
É a maior inimiga da minha visão.”

- William Blake

“ Salomé disse: “Quem és tu homem, que ... dormiste em minha cama e


comeste à minha mesa?””

- O Evangelho de Tomé

“Um arco-íris estranho


olha o poço sombrio,/
Umbral do velho caos
de onde o nada é o feitio,/
Espiral, que
devora os Mundos e os Dias!”

- Nerval
“Para além do ígneo sol e do éter que há nos ares, Para além dos confins
dos tetos estrelados
Flutuas, meu espírito, ágil peregrino [...]
E bebes, qual licor translúcido e divino,
O puro fogo que enche o espaço transparente.”

- Baudelaire

“O tema da morte de Deus é um tema romântico. Não é um tema


filosófico, mas religioso. Para a razão, Deus existe ou não existe. No
primeiro caso, não pode morrer, e no segundo, como pode morrer alguém
que nunca existiu? [...]”

- Octavio Pax

“Nós dispensamos os tesouros da imaginação. Figurar a esfinge como


um leão com cabeça de mulher pode ter sido poético outrora. Espero que
unia verdadeira mitologia moderna esteja em formação”

- André Breton
“Além de Almon, o pescador, a quem ninguém dava ouvidos porque
todos debochavam dele, não havia ali em toda a aldeia alguém que
ensinasse as crianças que a realidade não é apenas o que o olho vê e não
somente o que o ouvido escuta e o que a mão pode tocar, mas também o
que se esconde do olho e do toque dos dedos e se revela às vezes, só por
um momento, para quem procura com os olhos do espírito e para quem
sabe ficar atento e ouvir com os ouvidos da alma e tocar com os dedos
do pensamento. Mas quem aqui afinal queria dar atenção a Almon? Ele
era um homem velho, falador e quase cego, que sempre ficava discutindo
com seu medonho espantalho.”

- Amós Oz

Cena I; Da manifestação do Espírito Santo

Era meia-noite de Domingo; os discípulos estavam sentados sobre


a mesa aonde Jesus há poucos dias antes havia ensinado a sagrada
eucaristia.
Enquanto conversavam sobre todo o enigma,o mistério e a melancolia
que pairava sobre a trajetória daquele divertido beberrão que fora
injustamente condenado a morte; o silêncio & a amargura dos uivos da
mortandade,do desespero & do deserto que batiam sobre as portas &
as janelas foi se desfazendo,um intenso amor parecia flutuar sobre ar
como uma nuvem de incenso enquanto as prosas dos que ali estavam
acaloravam como chamas de fogueiras no açúcar de seus pulsantes
corações serpentinos. Enquanto comiam os pães e bebiam o vinho da
eternidade; os que ali estavam sentiram em suas bocas primeiramente um
doce gosto de mel,depois o gosto amargo & enferrujado do sangue no
qual o pão & o vinho milagrosamente se transformou.

- Não sentem isso,ó malditos & benditos? Ó anjos surdos que


percorrem o vento da madrugada tingindo seus olhos com lágrimas
d’ouro; não sentem esse fogo que pulsa ? Esse amor que escorre sobre
o ferro do sangue na forma duma serpente enrolada em teu útero ?
Essa felicidade advinda do Espírito Santo? Essa melancolia? Não sentem
como se o mundo despencasse do mais alto desfiladeiro em direção
ao silêncio deste momento? Como se aquele que foi julgado no lugar
de Barrabás,tivesse um conhecimento que não viesse da tradição,do
Egito ou do saber dos anjos,porém do próprio altíssimo que habitava
em sua carne? - disse Maria de Magdala,a mulher de cabelo ruivo
ferrugem,amendoados olhos brilhantes atordoados pela a tristeza &
lábios - rubros como rosas -manchados de vinho; ela era o esqueleto da
lua sobre o frio do que seria a aristocracia do um novo tempo que berrava
para nascer.

Os que ali estavam disseram que os setes demônios havia retornados


para o carne de Maria de Magdala,é que por isso ela estava falando coisas
estranhas & confusas.João porém os repreendeu em sua astúcia dizendo;

- Vós estão loucos em repreender a mulher que ungiu os pés de Jesus.


Não sabeis-vos que Jesus contou-lhe os segredos do céu? Não sabeis-vos
que Jesus confiou a ela os segredos anteriores a mundo & as profecias dos
fins dos tempos?

A doçura & a espontaneidade da voz-vinho de Maria de Magdala; havia


despertado um leve sentimento de ódio & fúria em Pedro que amava o
Filho do homem secretamente.
Pedro dissimulando sua irratibilidade,tentou responder a Santa
Meretriz & argumentar que já havia dito para o Sábio Poeta que ele era
filho do Altíssimo inominável,mas antes que ele abrisse a boca algo
inesperado aconteceu; uma pomba semelhante à que desceu sobre o
batismo de Jesus por João Batista apareceu sobre uma mancha de fumaça
& caiu sobre a forma duma maçã que brilhava nas cores borbulhantes das
estrelas.

- Algo está escrito nessa maçã,lê-se;


“Norea vestirá o mundo como o seu corpo; o mundo será Virgem no
finais dos tempos. A prostituta já foi Virgem & voltará a ser,pois toda
prostituta já foi Virgem uma vez & a essência da doçura do sal terrestre
nada pode corromper.” - Falou a voz de João; que admirava as cores de
ouro,lápis lázuli,esmeralda, topázio e tantas outras que brilhavam no
suave fruto translúcido que ele segurava em sua mãos trêmulas.
A maçã-pedra de luz colorida atravessou as mãos do jovem João &
afundou-se no piso do chão.

- Vi sair da maçã das estrelas um grandioso touro segurando uma


espada em seus lábios escarlates; no musgo de sua pele florescia rosas
vermelhas encharcadas de sangue. Alguém mais viu?
- disse Lucas.

Todos ficaram em silêncio,exceto Marcos que quebrou o frio singelo


daquele lugar ao descrever algo que tinha visto;

- Vi pular da esfera de luzes o alado leão de fogo da tribo de Judá; e


ele portava em seus braços um escudo com a resplandecente estrela da
manhã da geração de Davi que fora pintada com um sangue que era mais
escalarte que o brilho das estrelas.

- Pois eu vi um pequeno anjo andrógeno que habitava dentro da


esfera que João segurava. Alguém mais prestou atenção nisso? - falou
Matheus,em um tom de voz rouco.

“ O céu lhe tomou por assalto nessas visões abstratas de signos &
selos,ó Lucas,Marcos & Matheus. Pois o resto viu somente uma pomba
branca manchar o ar & se transformar num fruto cuja a tintura era a luz
das estrelas. - Disse João,com um sorriso amável.

Maria,a mãe de Jesus,estava mergulhada em seu olhar de fel amargo


contemplando o rostos dos demais que ali se encontravam; o orgulho
de sua fé cabia na negritude de sua alma; sentia seu peito arranhar na
dor dum cântico de desespero que ecoava pelas o silêncio do deserto
& as estrelinhas solitárias sobre a solidão do manto escuro do céu. Ela
disse,abrindo um livro;

- Esse acontecimento que vemos diabetes de nossos olhos é o


cumprimento de uma profecia; vejam a visão de Ezequiel da merkavah;

“Distinguia-se no centro a imagem de quatro seres que aparentavam


possuir forma humana. (...) Quanto ao aspecto de seus rostos tinham
todos eles figura humana, todos os quatro uma face de leão pela direita,
todos os quatro uma face de touro pela esquerda, e todos os quatro uma
face de águia.”

Cena II; Da aparição de Cristo

Em meio a ferrugem da noite apareceu um homem que brilhava com o


sol do oriente & a brilhante estrela da manhã,impressionando todos que
ali estavam.
- Porquê me negaste,ó Pedra que escolhi para edificar a minha igreja? -
disse o filho do homem para Simão Pedro.

- Porquê tive medo,ó Mestre! - respondeu Pedro, assustado com a visão


de Cristo.

- Não devais temer aqueles que fazem padecer o corpo,mais aquele que
faz com que a alma padeça no inferno.
- respondeu o Cristo com um olhar de misericórdia.

- Ó,meu filho querido! Como chorei ao ver te pendurado no madeiro! -


disse a mãe do filho de Deus.

- Bendito seja o vosso pranto,pois será consolada pela a tua fé.


Bem aventurados os que sofrem,mais ai dos que dormem devorados
pelos o estômago da alegria de falsas propriedades,pois eles estão
mortos. - respondeu o homem que brilhava. Dez segundos de silêncio
prosseguiram-se,até que o filho do homem voltou a falar;

- Vistes a semente de minha fé que João segurou? É chegado momento


de jubilo! Em verdade,vós digo que eu sou a semente que padeceu sobre
a terra fértil para frutificar o corpo de Adão como a primazia dos que
dormem em Abel & Noé. Em verdade,vós digo que nasci para semear esse
fogo no mundo. Gostaria tanto que esse templo estivesse nas chamas da
arquiteta da criação; pois a Fé é a substância das coisas que estão além
dos olhos dos homens,pois os olhos dos homens são cegos para o que há
além de seu sonho de morte.

- Diga-nos sobre as leis da gnose do Bem & do mal.Como devemos viver


sobre a terra? - perguntou Simão Pedro.

- A lei foi dada a Moisés,e era boa.Mas,maldita se tornou! Nos dez


mandamentos estava a aliança entre o que estava encima & o que estava
abaixo,mas esse pacto foi quebrado. Pois as sete letras não se conectavam
com a coroa,nem com o discernimento,nem com a sabedoria; pois o
conhecimento havia sido roubado & transformado em Egito. Sim,pois eu
larguei a casa do meu pai em busca dessa ovelha desgarrada. Como a lei é
do mal,sou para ela um falso Messias & um espírito de enganação.
- disse o grandioso homem que resplandecia sobre a luz.

Simão Pedro não entendia as falas de Cristo,e perguntou-lhe;

- Não compreendo o que me disse. Devemos seguir a lei de Moisés?

- Dois mandamentos lhe dou; amem a Elohim acima de todas as


coisas & ao próximo como a ti mesmo. Pois,toda lei se resume nesses
ordenamentos. Não sabeis-vos que a lei é anterior ao mundo & que
passará céus & terras; sem que ela padeça? Em verdade vós digo que
por causa da idolatria ao bezerro de ouro,as tábuas da lei se partiram em
Babel. - Disse Cristo a Simão Pedro & os demais que ali estavam.

Cena III; Da morte de Jesus Cristo

- Aonde esteve quando o seu corpo padeceu na gruta ? Conte-


nós sobre a morte! - disse os homens fitando os olhos naquele que
resplandecia como o sol do oriente.

O cordeiro de Deus respondeu;


- Morri como a semente de Adão,para fertilizar o útero de Eva. Da
mesma maneira que Moisés levantou a serpente no deserto, assim
também era necessário que o Filho do homem fosse erguido na
ressurreição como primazia dos que dormem. Deixe-me portanto
contar-lhes sobre quando padeci sobre a meu na gruta escura da noite
pura,envolvido nas brasas de Satã; deixei de lado os pensamentos que
dão corpo ao espírito & flutuando vi a minha carne dilacerada pelo
gozo da morte. Abraxas abriu sua tripla boca perante os planetas,os
elementos,os arcanjos,os serafins,os séculos,os tempos,os demônios & os
espíritos dos justos aperfeiçoado; restou o pleroma que brilhou acima das
chamas do inferno. Estive aonde a mais aguda agonia e a mais intensa
alegria deixam de se contradizer em suas estações de pranto ou gozo no
jardim da carne – onde os gemidos de prazer são acompanhados pelos
gritos de desespero; visitei novamente o Éden.

Um silêncio dominou os discípulos que seguiam escutando a


experiência do filho de Deus. Continuou pois o ressurrecto a narrar como
as coisas aconteceram;

- Acordei do sono que as dores da Cruz me tragaram em tornado


sangue & de desespero;
& enquanto eu flutuava pelo o ar vi pois o meu cadáver embalsamado
& as flores da primavera que cresciam do meu corpo em putrefação.
E quando a lua & as estrelas enfeitaram o céu; surgiu o príncipe das
trevas que é aquele que adorado pela a Israel segundo a carne,que é
chamado pelo os seus adoradores de Satã,Diabo,Azazel,Beliel,Onze ou
Mammon; ele era agudo & frio como uma nuvem negra & gelatinosa de
enxofre,mas transformou-se na forma dum anjo que tocava lira sentado
sobre meu cadáver & zombava de que eu não havia cedido a tua tentação
de ser rei de Israel segundo a carne.
O anjo negro de olhos carmesim estava salivando em fome & sede
por saber que o meu corpo era a luz imaculada anterior a criação do
mundo,pois em Verdade é fato de que eu nasci de Maria que fora
concebida em sagrado matrimônio pelo o Espírito Santo.
Em verdade vós digo,o Diabo não poderia ter percebido que aquilo era
uma armadilha & que eu morri para que ele também padeça,pois ele não
possuía a gnose daquilo que era superior a sua ilusão - de que ele era o
Altíssimo -.
Ele se transformou em uma grande serpente de negrume & fogo;
escancarou sua boca com dentes afiados & me engoliu numa nuvem
tormento & morte; meu olho-serpente estava fixo nos olhos dele de
labaredas, quando o meu ser foi sugado para o útero da besta - tal como
Jonas -. Como Satã é a junção daquelas chagas que foram amaldiçoadas
a não terem corpos pelo o descanso do Uno no sétimo dia,ele rodeia o
mundo & procura roubar a sua luz,em especial a luz daquilo que é a soma
de todos os nomes divinos; mais ele não consegue porquê o vaso de seu
corpo é trincado em um milhão de estilhaços & seu sangue são piscinas
de tormento que misturaram-se com enxofre em um milhão de pétalas
de fogo ácido. & então eu vi de dentro da boca dele se formar uma longa
caverna feita de estrelas & o meu Cristo derramado estava caindo sobre o
vazio terrível,como o pôr-do-sol que padece dentro do cadáver putrefato
de Lilith -que é a mãe da multidão mista-. & no fim do chão da caverna
enfeitada com crânios eu contemplei o abismo; vi o universo, como lascas
de ouro sopradas por espirais d’uma tempestade. & o véu do abismo se
estendeu-se sobre mim; vi na negra de águas rodopiantes ou ares firmes
de fumaça as cidades solitárias, & os homens solitários, & os planetas
solitários,& os animais solitários,& os amantes solitários,& os anjos
solitários & o tempo como grande solidão & exílio. Naquele momento eu
vi a minha morte na cruz & meus feitos em vida,assim como eu também
vi o meu corpo sendo devorado pela a besta. Sim,dentro de Satanás
estavam reunidas todas as coisas, & as cores,& os números & letras; mais
meu olho não se deixou-se prender pela a beleza da estrela alva que
caiu do céu. Mas a minha luz era semelhante a ácido para o ventre da
besta & sua carne corroendo explodiu-se em um milhão de flagelos que
mancharam o céu & pereceram em segundos; porém o coração do Diabo
fugiu-se da minha luz & se refugiou-se na forma duma pequena minhoca
que se escondeu sobre a terra. E eis que no finais dos tempos um Anjo de
Elohim virá & esmagará com seu pé a pequenina minhoca que é a alma da
terra.

Cena IV; Do Ágape

Enquanto Cristo falava seu coração brilhava em um forte coloração


rósea; os olhos dos discípulos brilhavam em amor & esperança; em
especial os de João,de Felipe,de Salomé,& das três Marias. Cristo então
disse-lhes;

- Satã perguntou-me no deserto a quem eu amava,dentro da boca


da Besta respondi que amava as ovelhas desgarradas que vieram da
casa do Pai. Enquanto eu morria & padecia. Dentro de vós está uma
substância superior a todo o universo - & do qual todo o universo é uma
casca apodrecida -; em verdade vos digo, que existe uma substância
além daquela em que é composta as cidades,& monstros,& árvores,&
montanhas, & as pequenas chamas, & o oceano; está é a fé que está em
vossos corações. Esse é o reino do céus; a raiz de tua vida encontra a
árvore da eternidade.

75.A Morte do mundo

“Não serei outra senão quem sou; minha posição me proporciona


demasiado contentamento; estou sempre sendo acariciada.”

- Jovem bruxa francesa,c. 1660

“Navegar é preciso; viver não é preciso”.

- Fernando Pessoa
“ [Juro] pelo róseo crepúsculo da manhã;/pela noite e quanto
envolve;/e pela Lua quando cheia:/passareis de plano a plano.”

- Alcorão Sagrado: IV, 16-19

Parte I

0.Esse livro está em seu fim. Embora nunca se termina de se ler um livro.

1-2. Ó,minha alma amada; alfinetei a rosa aréola de seus seios como
uma agulha que prendia uma borboleta que se contorcia; sua carne era
de doce & você sangrou mel. Enfiei minhas mão em tua boca & masturbei
seu coração enquanto você engasgava em vômitos de amor. Já dizia
Georges Bataille; “Em matéria de arrancar o homem de si mesmo, há o
Surrealismo e mais nada. “
3.Tudo permanece intocável onde foi deixado,as lembranças & paixões
queimam até alcançar o esquecimento no último suspiro do coiote
banhado de estrelas.

4. A batalha é noética, não ideológica. Ideologia é mera


instrumentalidade. A exploração também é doença.

5. Quando digo Sagrado, não quero dizer exatamente “religioso”, mas a


praxe de significar toda a atividade humana como algo a mais, seja qual
for; desde o sexo até a forma como você olha uma colher de arroz antes
de comê-la.

6.O veludo vermelho é a sombra d’um oceano de cores perdidas. Cada


pequeno ponto do mundo está abandonado ao frio orgasmo do existir.

7. O homem é uma estrela cadente formada dos quatro elementos;


uma estrela perdida no limbo; entre os quatro reinos do inferno.

8. Não finja que os Deuses não estão loucos.

9. A perca de identidade; também é uma forma de identidade.

10. Somos signos de nós mesmos. Fique de boca aberta,em frente ao


enigma.

11. No porão há tantos Eus!

12. Espelhos mentem. Todo amante é um vampiro vestido de rosa.


13. Há vida antes da morte?

14. O céu é um simulacro de teu coração.

15. O amor é uma solidão existencial em comum.

16. O poema é um predador de espaço,que grita “ flor” em cristais de


fezes.

17. A serpente & o poeta guardam a mesma maldição; não poder andar
em linha reta.

18. Deus conta cada lágrima de cada alma; & assim nasce a cabala.

19. Ossos sob a terra; escrevem um kanji.

20. Segundo a lei de Moisés,todo poeta vai para o céu. O mergulho se


dá em pureza & nudez.

21. O mundo é feito de vapores.

22. Ó,Erika,eu poderia lhe amaldiçoa-la por toda a eternidade; lhe


escrevendo uma carta de amor.

23. Pouco importa quão rico seja um burguês,no portal dos sonhos ele
lá chegará; cego,nu & andrógeno.
24. O tempo é a medida de intervalos sucessivos? Ou é o eco do
passado? Ou a sedenta lambida de Eu na ferida de suas amadas ?

25. Em volta d’um pequeno pedaço de queijo; os ratos são muitos.

26. O mundo sempre foi uma projeção tua.

27-28. Sem os mitos gregos & o cristianismo; talvez não existiria humor
negro.

Minto! Embora o surrealismo-trágico greco-cristão tenha uma quase


abusiva alta dosagem de ironia & humor negro; toda religião está
fundamentada nesse sarcasmo.

29. Paracelso já dizia que o caos existe para purificar o coração do


homem & da mulher. Um homem que tem excesso de razão é doente. Por
acaso, existe alegria sem caos?

30. Um animal é tudo aquilo que fala uma linguagem inacessível ao


espírito do verbo humano; um anjo,um gnomo,um gato,uma fogueira,um
cometa,etc. A poesia é única forma de falar com tais criaturas; que estão
dentro & fora de nós.

31. Estava numa grande crise existencial & entrei numa livraria; entre
os livros em destaque estava “Animais fantásticos & onde habitam” da J.K
Rowling. Juro que não consigo ler o título desse livro,sem imaginar uma
grande interrogação na capa.

32. Ó,Erika,assim como Nietzsche não sabia se amava ou odiava o


Wagner; também não sei se te amo ou te odeio. Provavelmente ambos.
33. Muitos me perguntam a minha opinião sobre Nietzsche. É um
pergunta tola; pois Nietzsche nunca existiu.

34. Já viram algum retrato de Kafka? Ele não parecia uma grande &
sábia barata?

35. O universo inteiro está parado agora. Portanto um mínimo


movimento,ainda que mais leve que uma pena; destruiria todas as coisas.
É triste portanto,que para esse leve movimento; o universo nunca tenha
existido.

36. As estrelas são recheadas de infinitas possibilidades,assim como a


imaginação. O homem é portanto uma sombra entre esses dois mundos.

37. Se Deus criou todas as coisas do nada,contra todas as leis da razão &
da natureza; logo todas as leis da razão & da natureza são más & decaídas.
Toda sistematização & ordenação do universo é a lógica duma prisão.

38. Os raios emanado das estrelas são duplos ( uns são sensíveis &
luminosos,outros são segredos do universo).

39.O casamento é entre o sol & a lua; entre o consciente & o


insconsciente. É uma dança. As pálpebras estão descidas. Justamente
nisso se consiste toda magia.

40. É pensar que chamam essa bagunça de criação! Que criação terrível
a nossa!

41. Sucumbo em mim.

42. A alma é uma forma de gravidade; algo essencialmente amorfo que


parece estar além mesmo da simples consciência ou ser. É um sal que
salga & emana nossas vivências particulares; nosso rio de eterno-devir.
Será talvez essa a origem do eterno-retorno?

43.As casas riem dos homens. As cidades riem das mulheres. Todo
mulher é uma casa & todo homem uma cidade.

44. Ateus afirmam a Deus quando tentam negá-lo. Como São Pedro,
religiosos negam a Deus tentando afirma-lo; só soube o que era
fé,quando-a perdi.

45. Teu horizonte se parece com um beco escuro.

46. Às vezes,é necessário desaprender.

47.Andarei apoiado no ar.

48-49. Um dia rasguei & sangrei o meu dedo enquanto folheava o nú


frontal de um poema. Numa noite,eu vi a bela lua se jogar no mar. Porquê
havia desejo em mim; esses dias foram circunstanciais.

50.A vida é crua,visceral & enferrujada; mas,tem sete faces.

51.Porquê o sapo está acorrentado a águia? Não é óbvio que ele não
sabe voar?

52. Coloque uma interrogação no mundo & em si mesmo.

Parte II
1-2-3. Maquiagem! Máquinas! Debaixo do sol! Um vai & vem,infernal! &
os mares se cansam!

4. O conhecimento de si mesmo é luz; mesmo que pareça trevas.


Devore-si,como um ouroboros,no final,não sobrará nada.

5. Nuvens & Harpas

Foi no amor que sonhou as esferas


que nasceu o crepúsculo da natureza;
harpa caída além
enquanto a lua doura o suor da fronte,
doce gosto do veneno na couraça podre do sonho.
Atravessa a alma como uma flecha,
um rio ou fantasma no silêncio;
ventos vindo do negro mar
que é a mente pensante do céu.

II

O poeta vê uma passageira ave presa em papel,


e ele ajuda a ave a encontrar a existência & seu amor torna-se
escuridão.
Anda o poeta pelas ruas das noite & caí sobre a pó de Jerusalém.
III

Nas horas errantes em que os mortos saíram das tumbas,


cresceu tal radiante rosa cujo o vermelho aterrador
era iluminado pelo o clarão da lua que flutuava sobre o céu de Israel;
fertilizada pelo o riacho de sangue que jorrava,
a rosa pequena e singela cresceu aos pés da cruz.

6. “Naquele dia levantará uma voz dizendo; não posso ser médico,nem
tampouco há em minha casa pão ou veste alguma; não me coloque como
príncipe do povo.”
- Isaías 3; 7

7. Perdeu-se no mundo.

6. “ Os montes saltaram como carneiros & os outeiros como cordeiros.”


- Salmos 114; 4

7. Perdeu-se nas constelações de dias.

8. Somos menos reais que o Mickey Mouse.

9. O sangue que faz carne & o pensamento; & as palavras & mentiras.

10. Porquê o tempo grita?

11. As árvores estudam geometria?

12. O menino teme o escuro; esse menino é Deus.


13. Tudo aquilo que é belo,também é terrível. Nada será belo sem antes
ser terrível.

14. Durante um debate com um amigo católico eu disse;

A heresia é versão mais límpida do dogma. A concepção católica


de pecado,mostra-nos que Eu & você; ambos somos gnósticos. Sim,a
moralidade é gnóstica.

15. Não há nada mais violento do que a eternidade. Pessoas podem


ferir & violar a tua carne; Shiva irá violar a tua alma em êxtase & violência.

16. Sou uma coluna de fogo & fumaça.

17. A criança sabe que os anjos estão mortos.

18. A ordem dos eventos futuros; alteram o passado. O tempo não é


linear.

19. Mastigue a dor como um chiclete velho que você esqueceu na


gaveta.

“Você nunca vai parar de se ver. Você não pode fazer nada, você não
pode escapar de si mesmo, você não pode escapar do seu próprio olhar,
você nunca será capaz de: mesmo se você caísse num sono tão profundo
que nenhum choque, nenhum grito, nenhuma dor ardente poderia
despertar você. Mas,ainda seria esse olho, seu olho, que nunca fechará,
que nunca dormirá.
Você se vê, vê a si mesmo vendo a si mesmo, observa a si mesmo
observando a si mesmo. Mesmo se você acordasse, sua visão
permaneceria a mesma, imutável. Mesmo se você conseguisse crescer
milhares, bilhões de pálpebras extras, ainda haveria esse olho, por trás,
que veria você. Você não está dormindo, mas o sono nunca mais voltará.
Você não está acordado e nunca acordará. Você não está morto e até a
morte nunca poderia libertá-lo. “
- Georges Perec, Un Homme qui dort

20.Deus fez um ninho. Ele vai chocar um ovo. O ninho é o universo.

21. Sete também são quatorze.

22. Quero pular o número 22.

23. Viver é um tipo de metáfora.

24. O relativismo é a casca do objetivismo. Deus não mora nas


periferias,mas tem um quintal no centro da cidadela.

25.Guarda-me em ti.

26.”Não é o medo da loucura que nós fará largar a bandeira da


imaginação.”

- Andre Breton,Manifesto surrealista

27. “Então o Senhor deixará calvas as cabeças das filhas de Sião, e a


lei virá desde Sião e a palavra do Senhor de Jerusalém. Nesse dia sete
mulheres apoderar-se-ão de um homem e dirão: «comemos nosso pão
e nos cobrimos com nossas próprias roupas, por que não defende você
nosso sangue que se derrama como a água em Jerusalém?». E receberam
a resposta divina: «Esperem ainda um pouco até que o número de nossos
irmãos seja completo, e o que então ficará em Jerusalém será salvo e a
imundície das filhas de Sião será lavada pelo espírito da sabedoria e da
penetração. Dez acres de vinhedos darão um cubo cheio de vinho, e as
trinta medidas de trigo, três bushels».”
- São Tomás de Aquino (no Aurora Consurgens)

28.Como é dito pelos sábios de hebreus:


“Contra tua vontade nascerás, contra tua vontade viverás e contra tua
vontade morrerás”

29.Quem é Dionisío sem o vinho? Quem tem medo de André Breton ?

30. Toda rua é Andrômeda; todo lugar é o universo.

31.Quem há de escalar a árvore guardada pelas feras da noite?

32. A visão de Ezequiel, do vale coberto de esqueletos, é resquício da


adoração dos ossos dos mortos praticada nas cavernas pelos os antigos.
Os cultos ligados às plantas --como o da árvore do bem e do mal-- datam
do início do período agrário, quando o homem dominou o milagre da
morte e a ressurreição das sementes; o xamanismo é tão antigo quanto
a imaginação humana e se revestiu em inúmeros cultos diferentes,hoje
ele é mais comumente chamado de poesia,arte ou literatura; selvagem &
sagrado

33.A presença de contradição não é sintoma necessariamente de


mentira e a presença de coerência não é sintoma necessariamente de
verdade.
Se assim fosse, teríamos um critério infalível para a verdade sempre, o
que quase nunca acontece.
As flores murcham, o céu enevoa-se, a beleza cobre-se de rugas e
apodrece; o pasto é para os vermes que se alimentam nas campas.

34. Porquê um poeta não está perdido em sua contemplação do


mundo. Mas o mundo é que está perdido na contemplação do poeta.

35. A política não permite que coisa alguma exista sem ser digerida e
rotulada na putrefação e quentura de cosmovisão infernal.
36. A náusea me acompanhava como anjos invisíveis tocando
violino debaixo da chuva aos pés do meu ouvido, estava cansado desse
mundo em névoa de fumaça,em vômitos de sangue,em suas fábricas
abandonados e seus ensinamentos baratos e caretas;podia ouvir o grito
enlouquecido do cimento dos prédios abandonados na penumbra,
das árvores transfiguradas em bruxas velhas e ninfas nuas, dos lábios
trêmulos e rosas das garotas vomitando vinho, da lua flutuante feito uma
bigorna no céu em respiração ofegante de cansaço e suor,podia ouvir o
urrar das nuvens borradas de sangue sendo violentamente ejaculadas
pra chaminés eretas das fábricas em orgasmo; tudo busca a morte & a
redenção além do véu, além de universo que é o excremento de um Deus
bestial & perdido,que é um túmulo do verdadeiro Deus.

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