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FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE ITUVERAVA

FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS

Jordana Regina Pistore Ribeiro

HISTÓRIAS EM QUADRINHOS COMO FERRAMENTA PARA


INCENTIVAR A LEITURA

ITUVERAVA
2020
JORDANA REGINA PISTORE RIBEIRO

HISTÓRIAS EM QUADRINHOS COMO FERRAMENTA PARA


INCENTIVAR A LEITURA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Ituverava. Fundação Educacional de
Ituverava, para obtenção do título de
licenciado em Pedagogia.

Orientador(a): Profa. Dra. Lisângela A.


Guiraldelli

ITUVERAVA
2020
JORDANA REGINA PISTORE RIBEIRO

HISTÓRIAS EM QUADRINHOS COMO FERRAMENTA PARA INCENTIVAR A


LEITURA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Ituverava . Fundação Educacional de
Ituverava, para obtenção do título de
licenciado em Pedagogia.

Ituverava, 05 de dezembro de 2020.

Orientadora:________________________________________________
Profa. Dra. Lisângela A. Guiraldelli

Examinador(a):_______________________________________________
Profa. Ma. Thaís Silva Marinheiro de Paula

Examinador(a):_______________________________________________
Profa. Dra. Ana Maria Paulino Comparini
DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha família que me apoia em todas as minhas decisões e está

sempre junto comigo; ao meu parceiro de vida, Samuel; à minha querida sobrinha Pietra, que

tem todo o meu amor e meu propósito de luta. Dedico a todos os meus amigos que

diariamente ouviram meus relatos e que sonharam juntos comigo por este momento tão

esperado. E, por fim, mas não menos importante, a Deus, que meu deu forças diante de todos

os obstáculos.
AGRADECIMENTOS

Meus sinceros agradecimentos a minha orientadora, Profa. Dra. Lisângela Guiraldelli,

que trouxe luz a este trabalho. A minha querida madrinha Tânia, que me presentou com meu

instrumento de produção/trabalho. Aos meus pais, Irene e Jean, que sempre me apoiaram,

minhas adoráveis irmãs Jéssica, Jade, Manuela e Julia. E a todos os autores que me inspiram

diariamente a buscar um mundo repleto de leitura e escrita.


“A leitura é uma fonte inesgotável de prazer, mas, por incrível
que pareça, a quase totalidade não sente esta sede.”

Carlos Drummond de Andrade


RESUMO

Este estudo buscou mostrar a importância das histórias em quadrinhos para incentivar a
leitura e em como ela pode ser uma ferramenta de auxílio em sala de aula. A pesquisa teve
como foco aa trajetória dessas histórias em quadrinhos na educação e como pode ser usada
com os alunos. O trabalho foi baseado em pesquisas bibliográficas e em um questionário via
meios eletrônicos, devido ao contexto de pandemia, com professoras do 3º ano do ensino
fundamental. A pesquisa buscou conceitos de gêneros textuais, histórias em quadrinhos e sua
trajetória no Brasil e na educação, além da apresentação de uma proposta de atividade para
ser aplicada com a finalidade de incentivar a leitura e a escrita. Os resultados da pesquisa
foram satisfatórios, pois alcançaram os objetivos, que era comprovar que as histórias em
quadrinhos podem ser trabalhadas em sala de aula como incentivo para criar o hábito da
leitura e escrita.

Palavras-chave: História em quadrinhos. Educação. Escrita.


SUMMARY

This present study sought to show the importance of comic books to encourage reading and
how it can be an aid tool in the classroom. The research focused on the trajectory of these
comics in education and how it can be used with students. The work was based on
bibliographic research and a questionnaire sent via electronic means, due to the pandemic
context, to teachers from the 3rd year of elementary school. The research sought the concept
of textual genres, comic books and their trajectory in Brazil and in education, in addition to
presenting an activity proposal to be applied for the purpose of encouraging reading and
writing. he results of the research were satisfactory because they achieved the objectives,
which was to prove that comics can be worked in the classroom as an incentive to create the
habit of reading and writing.

Keywords: Comics. Education. Writing.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Exemplo de Rabicho/Apêndice............................................................................17


Figura 2: Exemplo de legenda e balão..................................................................................17
Figura 3: Onomatopeias........................................................................................................18
Figura 4: Linha demarcatória separando tempo passado/presente..................................20
Figura 5: Ação Narrativa......................................................................................................21
Figura 6: Exemplo de tempo em vinheta.............................................................................22
Figura 7: Imagem rupestre...................................................................................................26
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................................10

1 OS GÊNEROS TEXTUAIS E SUA DIVERSIDADE DE CARACTERIZAÇÃO........12

1.1 Gêneros Textuais..............................................................................................................12

1.2 Gêneros textuais e HQs....................................................................................................14

2 O SURGIMENTO DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS DESDE OS

PRIMÓRDIOS DA HUMANIDADE E SUA ORIGEM NO BRASIL.............................25

2.1 A Pré-História como precursora das histórias em quadrinhos...................................25

2.2 O surgimento das histórias em quadrinhos no Brasil e a influência estrangeira em

sua trajetória...........................................................................................................................28

2.3 As HQs no período do golpe militar brasileiro em 1964...............................................30

2.4 As editoras no Brasil e as HQs atualmente....................................................................31

3 AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ÂMBITO ESCOLAR.................................33

3.1 A marginalização dos quadrinhos na educação............................................................33

3.2 As histórias em quadrinhos como recurso para formar leitores e sua legitimação na

educação..................................................................................................................................34

3.3 Procedimentos Metodológicos.........................................................................................37

3.4 Análise...............................................................................................................................37

4 PROPOSTA DE TRABALHO...........................................................................................43

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................44

REFERÊNCIAS.....................................................................................................................45

APÊNDICE.............................................................................................................................46
10

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa busca utilizar as Histórias em Quadrinhos (HQs) como


ferramenta a ser aplicada em sala de aula, para desenvolver nos alunos a formação da
competência leitora e como efeito produzir um senso crítico para a interpretação de texto,
tudo isso por conta das características que apresentam uma história em quadrinhos, que
permite a leitura de elementos verbais e não verbais. Os objetivos deste estudo são:
observar o uso das histórias em quadrinhos na educação; pesquisar o uso das histórias em
quadrinhos como recurso didático; e analisar como as histórias em quadrinhos podem ser
utilizadas em sala de aula para incentivar a leitura. Essa análise foi feita por meio de
questionário com cinco perguntas abertas, elaborado e enviado a cinco professoras, do
terceiro ano do ensino fundamental, em que três são de escolas públicas e duas de escolas
privadas, da cidade de Ituverava-SP. Os questionários foram encaminhados via e-mail
devido à situação de pandemia em que se encontra o país.
Para alcançar os objetivos propostos, em um primeiro momento foi necessária a
busca por leituras que discorressem sobre os gêneros textuais e como as histórias em
quadrinhos se encaixam neles. Após essa busca, foi possível ver as principais
características que constituem as HQs e como elas podem variar, de acordo com o assunto,
o autor, a época e a intenção de cada história.
Já no segundo momento, foi preciso traçar uma linha do surgimento das histórias
em quadrinhos, sua trajetória em torno do mundo e sua ascensão. Depois, para introduzir o
tema seguinte, que é as histórias em quadrinhos nas escolas, foi preciso uma pesquisa dos
caminhos das HQs no Brasil, seus principais autores que contribuíram para sua
solidificação.
Os trabalhos existentes acerca desse tema são de extrema relevância para a
contribuição da problemática do presente trabalho, pois muitos autores afirmam sobre a
necessidade de utilização de novas estratégias para incentivar a leitura, já que vivemos em
uma sociedade vinculada às novas tecnologias, das crianças até os idosos, revelando um
déficit na leitura e, por consequência, tornando-se uma sociedade a mercê de celulares e
computadores, com uma visão pouco crítica e alienada e dando importância aos novos
meios tecnológicos que, muitas vezes, não são usados pedagogicamente em sala.
Esse estudo se justifica pela observação do crescente índice de falta de
interpretação de texto, a dificuldade dos alunos com a leitura, a falta de atenção. Observa-
se, no entanto, que as histórias em quadrinhos, utilizadas de maneira pedagógica e lúdica,
trazem inúmeros benefícios para os alunos, além de ser uma grande aliada em outros
11

processos na sala de aula. Por isso, a presente pesquisa buscou formas de utilizar as
histórias em quadrinhos dentro da sala de aula, junto com a colaboração de professores,
por meio de um questionário.
As histórias em quadrinhos despertam o interesse da criança por conta do conjunto
de imagens e pequenos textos que contém, além de outras características que chamam a
atenção como as onomatopeias, as histórias engraçadas, que representam o dia a dia dos
alunos, entre outros. Por conta deste despertar de interesse é que se faz necessário inseri-
las no contexto escolar
Para efetivar o hábito de leitura é preciso que a equipe escolar, em conjunto com a
família, motive o aluno a ler, além de buscar estratégias para que façam com que ele se
sinta interessado pela leitura. Analisando as utilidades das histórias em quadrinhos, o
Governo Federal incentiva a presença dos quadrinhos na escola, tornando-se política
educacional do país, estando presente nos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) e no
PNBE (Programa Nacional Biblioteca da Escola) e, atualmente, na BNCC (Base Nacional
Comum Curricular).
O presente trabalho se compõe de revisão bibliográfica e de materiais necessários
para elaboração do projeto. Após a leitura e coleta das fontes, e obtenção de dados para
contribuição no projeto, foi feita uma análise e organização dos materiais para facilitar a
escrita das seções I e II. Na terceira seção foi observada a relação que se estabelece entre
as histórias em quadrinhos e a escola, ou seja, o percurso das HQs na escola e como usá-
las para auxiliar na leitura; foi também elaborado o questionário e enviado às docentes
para então serem analisados os resultados e efeitos de como o tema proposto pode
contribuir na escola para o desenvolvimento da leitura e produção de textos. Devido à
situação de pandemia e isolamento físico em que nos encontramos, as atividades de campo
foram feitas via meio eletrônico. Depois da terceira seção foi proposta uma atividade que
consiste em uma adaptação de grandes obras literárias para quadrinhos, para efetivação do
hábito da leitura e inclusão desse conteúdo desde os primeiros anos do ensino
fundamental. E, por fim, e tendo em vista os aspectos observados, apresentam-se as
Considerações Finais.
12

1 OS GÊNEROS TEXTUAIS E SUA DIVERSIDADE DE CARACTERIZAÇÃO

Nesta seção foram abordadas algumas características dos gêneros textuais, seu
significado e suas principais funções, além de um gênero ter mais de uma finalidade,
dependendo de alguns fatores que interferem em sua forma e caracterização. A pesquisa se
aprofundou em um determinado gênero para melhor atingir os objetivos, tratando sobre as
Histórias em Quadrinhos, e foram vistos seu significado e seu contexto histórico.

1.1 Gêneros Textuais

De acordo com Alves filho (2011), os gêneros textuais são o resultado de como se
escreve, ou seja, da forma, juntamente com o conteúdo, que é sobre o que se escreve, além
de outros elementos que se baseiam para designar os gêneros usados em textos como
situações, valores, ideologias entre outros.
Os gêneros textuais são tão antigos como a linguagem e já eram utilizados por
Aristóteles na Grécia Antiga. De acordo com Alves Filho (2011, p. 17), Aristóteles
utilizava os gêneros textuais como forma de organizar seus discursos. Com todas as
mudanças sociais, econômicas, políticas e educacionais que o mundo tem passado, desde
então, os gêneros textuais precisaram acompanhar essas transformações, já que eles
cumprem uma função social que denominam as diferentes formas de linguagens presentes
em um texto.
Bakhtin (1997) acredita que os gêneros são o resultado do uso comunicativo da
língua quando dialógica, de forma que quando esses indivíduos se comunicam não trocam
somente orações nem palavras, mas sim, enunciados ou gêneros discursivos com um
propósito:

Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam, estão
sempre relacionadas com a utilização da língua. Não é de surpreender que o
caráter e os modos dessa utilização sejam tão variados como as próprias esferas
da atividade humana, o que não contradiz a unidade nacional de uma língua. A
utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos),
concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da
atividade humana. O enunciado reflete as condições específicas e as finalidades
de cada uma dessas esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo
verbal, ou seja, pela seleção operada nos recursos da língua — recursos lexicais,
fraseológicos e gramaticais —, mas também, e, sobretudo, por sua construção
composicional. (BAKHTIN, 1997, p.279-280 )
13

Os gêneros textuais são diretamente ligados à linguagem, e ambos possuem as


mesmas características, a de serem mutáveis de acordo com o câmbio no tempo. Segundo
Marcuschi (2011, p. 18):

Mesmo assim, é inegável que a reflexão sobre gênero textual é hoje tão relevante
quanto necessária, tendo em vista ser ele tão antigo quanto a linguagem, já que
vem essencialmente envolto em linguagem.

O autor também observa o surgimento de novos gêneros desmembrando-se de


outros já existentes, de acordo com as mudanças, principalmente, das novas tecnologias,
que necessitam de uma evolução desses gêneros. Alguns foram destaques como Orkut,
Facebook e E-mail, que são ramificações de outras redes sociais com o intuito de
comunicação pela internet. De acordo com a necessidade de cada público vão surgindo
novos gêneros e, neste caso, o surgimento de gêneros em redes sociais.
Atualmente, depois de muitos estudos e diversas atualizações, vê-se o grande
progresso que esse tema produziu, conforme as necessidades da sociedade. Segundo Alves
Filho (2011, p.20), “Por isso podemos dizer que os gêneros são como os grupos sociais e
os seres humanos que os usam: mutáveis, variáveis, dinâmicos, às vezes, até mesmo
contraditórios e irregulares.”
Os gêneros textuais são categorizados de acordo com o conteúdo em si. Mas, essas
categorias de gêneros textuais variam e, por isso, não se deve julgar a forma de
classificação, nem determinar que estejam certas ou erradas, pois textos que são
semelhantes podem ser categorizados diferentemente, de acordo com quem utiliza e em
qual sociedade se vive. E para não ocorrer o julgamento, é preciso analisar de onde surgiu
essa classificação, como Alves Filho (2011, p.19) diz:

Caso encontremos classificações diferentes para grupos semelhantes de textos,


em vez de censurar ou negar este fato, parece mais adequado encontrar as
justificativas atrás de decisões diferenciadas para textos parecidos.

Os gêneros têm algumas restrições em que não podem ser livres e nem aleatórios,
mas seguem um padrão de acordo com sua categoria que varia, como já dito, conforme o
contexto que está inserido. Ainda sim, não se segue uma regra de um texto ser classificado
por somente um gênero, mas pode fazer parte de vários, diante da situação que se encontra.
Como diz Marcuschi (2011, p. 24), “a categorização não vem pela estrutura ou forma, mas
pela ação social e organização desse texto”. Os gêneros textuais organizam a comunicação
humana e suas formas de expressão, isso é chamado de dinamismo, que faz com que os
14

gêneros se adaptem à comunicação de cada contexto e é ele que contribui para as


mudanças ao longo período. De acordo com Marcuschi (2002, p. 20):

O enunciado ou discurso não e um ato isolado e solitário, nem na oralidade nem


na escrita. O discurso diz respeito aos usos coletivos da língua que são sempre
institucionalizados, isto é, legitimados por alguma instância da atividade humana
socialmente organizada.

Ainda dentro dos gêneros, eles possuem os propósitos comunicativos, que são as
finalidades para o uso de um tipo de gênero, podendo ser mais de uma finalidade como,
por exemplo, as histórias em quadrinhos que podem ser usadas para se aprende matemática
e outras matérias, incentivar a leitura ou somente entretenimento. Esses propósitos se
baseiam de acordo com o momento em que se está utilizando um gênero textual.

1.2 Gêneros textuais e HQs

Para apresentar o presente trabalho foi feito um percurso sobre as Histórias em


Quadrinhos contextualizando sua identificação e caracterização como um gênero textual,
ou seja, um breve resumo do surgimento dessas HQs e sua trajetória.
As Histórias em Quadrinhos, também conhecidas como HQs, são uma sequência de
quadros, no mínimo três, que possuem uma narrativa contendo introdução,
desenvolvimento e conclusão, em conjunto com desenhos que descrevem a história a ser
relatada. Em certas ocasiões, o texto é inexistente, contando apenas com as imagens ou
onomatopeias para descrever uma cena. Normalmente, os quadrinhos são dispostos de
forma horizontal, contendo o desenho e as falas em um balão.
Antes da criação das HQs, vários autores desenhavam histórias com algumas
pequenas frases. O precursor desse movimento foi Georges Colomb (1856-1945), que
desenhava para divertir seus filhos. Pouco tempo depois, alguns autores publicaram
revistas humorísticas que consolidaram a profissão de caricaturista, como a revista Le
Charivari, em Paris. Este marco ajudou a consolidar, em 1890, as características das HQs
que eram quadros em sequência para contar uma história, inicialmente de cunho político.
Passados poucos anos, as histórias em quadrinhos foram reconhecidas, segundo Ianonne e
Ianonne (1998, p.34):

Em 1897, Rudolph Dirks, jovem desenhista norte-americano da equipe do


Morning Journal, apresentou um modelo de expressão cômico-gráfica que
ficaria definitivamente conhecido como história em quadrinhos.
15

No Brasil, os desenhistas brasileiros faziam apenas uma releitura das obras


originais já existentes. O surgimento das HQs no Brasil foi marcado por famosos editores
e desenhistas; o principal editor foi Adolfo Aizem que desempenhou um papel muito
importante incentivando o desenvolvimento dos quadrinhos, de acordo com Ianonne e
Ianonne (1998). Uma renomada obra que marcou a história dos quadrinhos foi Turma da
Mônica, do autor Mauricio de Souza e Produções, que veio para revolucionar o mercado
das HQs e ter uma trajetória duradoura no Brasil. Apesar do sucesso da obra de Mauricio
de Souza, outros artistas enfrentaram problemas, pois não receberam apoio nacional, além
de perderem vendas para as HQs internacionais.
Segundo Iannone e Iannone (1994, p.48):

Acredita-se que a revista brasileira O Tico Tico tenha sido a primeira do mundo
a apresentar histórias em quadrinhos completas. Lançada em 1905, ela trazia
comics, contos textos informativos e curiosidades sobre assuntos destinados,
principalmente, às crianças.

As HQs são um gênero que apresenta inúmeras finalidades como humor, crítica,
conscientização, entre outros. As HQs apresentam características narrativas pela sequência
que ela estabelece, mas podem formar também sequências com características de outros
tipos textuais, como diz Mendonça (2005). Há também o cuidado de diferenciar outros
gêneros que se assemelham com as HQs, como a caricatura, a charge, o cartum e as tiras.
Na caricatura há uma deformação de características marcantes dos personagens ou
objetos para ilustrar um fato. Quando há o intuito de satirizar um fato então é uma charge.
Já o cartum se refere a desenhos humorísticos com críticas atemporais sobre política,
religião, futebol etc. As tiras são um subtipo de HQs, mas que possuem uma sequência
menor e podem ser isoladas quanto à continuação de uma narrativa. Nas tiras também
pode ocorrer a crítica como no cartum. Os famosos gibis reúnem histórias inteiras
diferentemente das tiras, que contam uma história curta. Esses gêneros textuais circulam
em revistas, jornais e gibis.
O principal meio de organização são os próprios quadrinhos, que também são
chamados de vinhetas. As vinhetas são formadas por um ou mais quadrinhos, e são eles
que formam a ação narrativa da história. A disposição que cada artista utiliza depende de
sua característica e de sua criatividade. Por exemplo, no Japão existem os mangás, que é
como são chamadas as histórias em quadrinhos, e devido às características do país, as HQs
são feitas de forma que a narrativa comece no último quadro, e prossiga da direita para
esquerda, conforme observam Iannone e Iannone (1994).
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Uma das características das HQs são os balões, que são usados para a comunicação
entre os personagens, expressão de opiniões e sentimentos, além de expressar
pensamentos. Quando há um pensamento expresso pelo personagem, este é chamado de
monólogo, representado pelo balão em forma de nuvem, mas quando esse personagem
conversa consigo mesmo em voz alta é chamado de solilóquio, representado pelo balão
padrão usado com frequência, proporcionando uma diferença simbolizada pelo formato
descrito que o balão tem nas diferentes situações, de acordo com Iannone e Iannone
(1994).
Os balões são uma característica que marca os quadrinhos como linguagem. Eles
surgiram antes das HQs, quando alguns autores tentavam reproduzir as falas de um
personagem ligando-as à imagem por um traço, ou até escrevendo em seu próprio corpo,
como aconteceu no desenho do The Yellow Kid, a partir de 1895 nos Estados Unidos.
Alguns anos depois, precisando aprimorar esse recuso, começaram a ser utilizados os
balões para as falas dos personagens.
Segundo Ramos (2010, p.32), “Uma das funções do balão é o mesmo de
representar as falas. É um formato tão conhecido que os italianos deram o nome de
“fumetti” aos quadrinhos, uma alusão ao molde de “fumacinha” do balão do pensamento.”.
Esses balões são separados com linhas, delimitando seu espaço de fala, possuem
diversos formatos de acordo com o autor e as características do personagem ou da situação.
Com a inovação da tecnologia, o balão tomou inúmeras formas com a facilidade de criação
que o computador fornece como, por exemplo, um pensamento do personagem tem a
forma de uma nuvem; quando algo é sussurrado ele fica pontilhado; pode também
expressar em um só balão a mesma fala de diferentes personagens; e até uma cena do
passado ser representada por um balão com fundo transparente.
Há também os quadrinhos que não possuem um balão, mas a fala do personagem é
ligada por um apêndice, que também é chamado de rabicho, pelo seu formato. O apêndice,
de acordo com Ramos (2010, p.43) “Trata-se de uma extensão do balão, que se projeta na
direção do personagem.”. Nas HQs que possuem o apêndice, geralmente, há uma ausência
de personagem quando ele representa uma legenda do narrador, não sendo uma regra, e,
quando têm personagens na cena, ele pode tomar formas de acordo com as situações e
autores, como formato de corações para uma cena de amor. O apêndice também pode
indicar uma legenda, que é feita por um narrador externo à ação, ou o próprio personagem
contando algum fato, muitas vezes que aconteceu no passado.
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Figura 1: Exemplo de Rabicho/Apêndice

Fonte: Imagem retirada do site:


https://www.extraclasse.org.br/humor/quadrinhos/2013/07/quadrinhos-rango-3/

A legenda possui semelhança com os contornos do balão, sendo representada por


um retângulo na maioria das utilizações. Nos dois casos, há a utilização da linguagem
verbal e, sobretudo, nos balões também é utilizada a linguagem visual. Iannone e Iannone
(1994, p. 73) dizem que “No quadrinho, a legenda desempenha o papel equivalente ao do
narrador da televisão, no rádio ou num filme. É a voz “exterior”, que descreve algum fato
ou informa algo importante.”

Figura 2: Exemplo de legenda e balão

Fonte: Imagem retirada do site: http://parcimoniadna.blogspot.com/2014/04/recursos-


textuais-das-historias-em.html.

A prosódia (acento e entonação) das Histórias em Quadrinhos também varia de


acordo com o contexto, autores e a história em si. O que modifica é a letra usada, sua cor,
a ênfase que é dada como, por exemplo, quando é utilizado o negrito, o personagem pode
estar falando mais alto, com mais emoção, ou é apenas um destaque para a fala. Tem letras
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neutras, escritas de maneira linear. E há também diferenciação nas falas de personagens


estrangeiros e de quando um personagem está escrevendo algo em uma carta ou internet.
Uma característica predominante é a alternância de turno dos balões para mostrar a
comunicação entre os personagens. De acordo com Ramos (2010, p.63), “A quantidade de
palavras sugere se o turno é simétrico (troca de fala proporcional entre os falantes) ou
assimétrico (predomínio de uso da fala por um dos falantes)”. Em alguns quadrinhos
existem personagens que sofrem interrupções, marcando suas falas com reticências, a
gagueira é representada pela repetição da consoante, e o silêncio pode ser representado por
balão vazio, ou o quadrinho sem balão. No entanto, há diversas características que marcam
a conversação dos personagens, podendo ter recursos como a onomatopeia “bzzzzz” para
representar um diálogo sussurrado.
As onomatopeias são expressões que reportam aproximadamente algum tipo de
som nas histórias em quadrinhos, reproduzindo o som de um animal, de uma briga, de um
carro como “bam” que geralmente é conhecido por tiros nas HQs, ou pela palavra que
representa o som, por exemplo, de um soco para expressar um personagem em uma briga.
Essa variação depende do autor e das características que ele usa, além de sua nacionalidade
interferir também, pois geralmente se usa o que é mais comum em seu país. De acordo
com Iannone e Iannone (1994, p. 75), “A onomatopéia não traduz necessariamente um
ruído. Às vezes, pode ser um vocábulo expresso por um dos personagens. Enfim, são
incontáveis as possibilidades, mesmo porque o uso de onomatopéias depende muito da
situação e da criatividade do autor.”
Figura 3: Onomatopeias

Fonte: Mauricio de Souza Produções


19

Esses sons têm um perfil diferente das letras usadas nos balões de fala e
frequentemente se destacam com cores e formas evidentes. Nas histórias de American
Flagg,!, criadas por Howard Chaykin e citadas por Ramos (2010), as onomatopeias
abrangeram um novo sentido, quando Chaykin usou as onomatopeias para indicar uma
trajetória, como o último percurso de um carro antes dele bater. Nesse caso, ele também
utiliza as cores para dar mais ênfase no acidente, deixando um rastro branco para indicar
por onde o carro passou.

Conforme diz Ramos (2010, p. 84):

A cor é um elemento que compõe a linguagem dos quadrinhos, mesmo nas


histórias em preto-e-branco. O uso de duas cores, a preta e branca, vem desde o
início dos quadrinhos e permanece até hoje, por limitação de recursos
tecnológicos, por economia de custos (caso de muitos jornais pequenos do
interior do Brasil) ou por outra opção estilística.

As cores também indicam movimento, com em voos, corridas e saltos. Com os


avanços da tecnologia, as cores vêm sendo mais utilizadas nas HQs. Ainda assim, há
muitos autores, como Frank Miller, que têm a característica marcante de quadrinhos em
preto e branco, e só utilizam cor para dar ênfase em alguma história ou referência em
particular.
Quando todas essas características das Histórias em Quadrinhos tomam forma, o
resultado é chamado de cena narrativa, que é o conjunto de personagens, lugares,
acontecimentos e o tempo, formando um quadrinho, como cita Ramos (2010). O aspecto
que a sequência de quadrinhos forma varia de acordo com a intenção de cada autor. O
aspecto pode tomar a aparência de um círculo, quando se usa um recurso para aproximar a
imagem para que o leitor veja em detalhes, ou diversas vinhetas, e até representar
sensações dos personagens, como se uma sequência de quadrinhos estivesse estremecida
por conta do personagem que está tendo essa sensação.
As bordas que aparecem nas HQs também possuem suas funções. Ramos (2010)
designa duas funções para o que ele chama de linha demarcatória. Uma de suas funções é
separar graficamente as cenas narrativas, podendo utilizar a mais comum, que é a linha
reta. A segunda função é indicar o tempo em que se passa naquela história, tendo como
exemplo a reta que é usada para tempos atuais, e quando o autor quer se remeter ao
passado ele usa uma linha ondulada. A linha ondulada também serve para mostrar sonhos
dos personagens. No entanto, a linha demarcatória não é uma regra, o autor pode inovar e
utilizar sua criatividade sem as retas. Um recurso muito utilizado são as sequências de
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quadrinhos que formam uma mesma cena sem retas e só mudam o personagem de local,
trazendo uma nova perspectiva para as HQs.

Figura 4: Linha demarcatória separando tempo passado/presente.

Fonte: https://inspiradanacomputacao.wordpress.com/2014/05/16/fundamentos-do-
software-livre-em-quadrinhos-como-voce-nunca-viu/

Segundo Iannone e Iannone (1994, p. 61):

No início, as histórias em quadrinhos costumavam ser apresentadas de uma


forma que poderíamos chamar de “comportada”. Hoje, o desenhista dispõe as
vinhetas de acordo com o destaque que deseja dar a determinado personagem ou
com a ação (movimento) que pretende imprimir à cena. Evidentemente, essa
“liberdade” depende da criatividade do artista, que sempre leva em conta a
disponibilidade de espaço.

O enredo das histórias em quadrinhos está em volta de um ou mais personagens


principais. As ações desses personagens desencadeiam a trama e conduzem ao desfecho.
As histórias possuem os vilões e os heróis e para diferenciá-los os autores utilizam da
postura que esses personagens tomam e os traços da fisionomia mais marcantes.
Frequentemente, os heróis são másculos, bonitos e justos. Já os vilões são trapaceiros e
sorrateiros, além de características corporais exageradas, ou seja, ou são demasiado
corpulentos ou magros demais. Esses personagens têm suas características marcadas para
que o leitor possa distingui-los. Esse perfil está deixando de ser um padrão para os
desenhistas, já que com o desenvolvimento da sociedade esse modelo perfeito deixa de ser
o exemplo de herói ou vilão, e personagens com características mais próximas da realidade
tomam conta cada vez mais dos quadrinhos. (IANNONE e IANNONE, 1994)
Na ação narrativa, esses personagens precisam ser expressivos para contribuir para
a imaginação do leitor. Os autores recorrem aos olhos, às sobrancelhas, à boca e à
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linguagem corporal para maior expressão dos personagens. O desenhista Kevin Maguire
utiliza como principal marca a aproximação dos seus desenhos com o perfil humano e
movimenta nariz e bochecha para ter um resultado mais próximo da realidade.

Figura 5: Ação Narrativa

Fonte: https://www.espacoeducar.net/2009/04/descobrimento-do-brasil-com-turma-
do.html

Para manifestar expressões e sentimentos, algumas HQs possuem as metáforas


visuais, elas são imagens que acentuam o semblante do personagem. São chamadas de
metáforas visuais porque seu significado é diferente para a finalidade a qual foi usada,
tendo como exemplo a lâmpada que tem a função de conceder luz, mas que é usada nas
HQs para mostrar que o personagem teve uma ideia. As metáforas visuais podem possuir
mais de um significado como no caso da gota, que pode representar preocupação,
desespero, entusiasmo e muito esforço físico, dependendo do contexto da cena. (RAMOS,
2010).
Conforme Iannone e Iannone (1994, p.68):

Nada acontece por acidente nos comics. A rigor, eles não têm movimento, som e
dimensão: essas sensações são apenas sugeridas e nisso residem o desafio e a
arte do desenhista. No cinema ou diante da televisão, o público é o espectador.
Já os quadrinhos exigem maior envolvimento do leitor, que precisa interpretar e
co-participar da ação, como se houvesse uma interação com o artista.

As Histórias em Quadrinhos também possuem a indicação de tempo. Para poder


mostrar o tempo, são usadas as linhas cinéticas, que é um recurso gráfico utilizado nas
HQs para dar a sensação de movimentos aos personagens e objetos. O autor das histórias
22

em quadrinhos precisa fazer o enquadramento da imagem, para que elas transmitam a


sensação de ação e para que facilitem a compreensão do leitor.
Quanto maior o número de quadrinhos e balões maior é o tempo utilizado. Os
personagens também são utilizados para marcar o tempo, mais precisamente quando sua
aparência se modifica nos quadrinhos e vão ficando com traços mais velhos; mesmo em
uma tira curta dos quadrinhos o autor consegue fazer essa modificação. Outro efeito de
tempo que o autor pode fazer nos quadrinhos é prolongar uma cena, como o exemplo que
Ramos (2010) cita em sua obra intitulada A leitura dos quadrinhos, que se usa pelo menos
dez vinhetas para poder mostrar um personagem sacando uma arma e atirando, causando
uma tensão e prolongando esse tempo. Outro prolongamento de tempo é quando um autor
desenha uma vinheta maior que as demais, e a sensação é que se passou mais tempo dentro
dessa vinheta, enquanto as outras usam um tempo menor, pois são menores.

Figura 6: Exemplo de tempo em vinheta

Fonte: imagem retirada do site: http://gustavoinfol.blogspot.com/2013/01/quadrinhos-do-


garfield-passaros.html.

No entanto, o tempo pode aparecer de algumas maneiras nas histórias em


quadrinhos, como em uma comparação de antes e depois que pode ocorrer entre duas
vinhetas ou em um só quadrinho. Outra maneira é a representação do momento histórico
vivido pelos personagens por meio de roupas e cenários e também ao utilizar o dia e a
noite para mostrar essa passagem de tempo, e clima como chuva ou sol representado pelo
cenário ou situação que se encontra o personagem. Há o tempo de narração que mostra o
presente enquanto é lido; o tempo de leitura, que se compõe pelo presente em que o leitor
está lendo, pelo passado que já foi lido, e pelo futuro que o leitor ainda não leu. Mas, nem
todas as histórias em quadrinhos vão ter todas essas indicações de tempo de uma vez; isso
varia de acordo com a finalidade do autor.
O tempo de relato narrativo, que é a duração de uma cena, tem relação direta com o
tempo de leitura, já que pode existir um tempo médio para ser feita essa leitura. Quanto
mais balões e falas, maior é o tempo para concluir uma leitura, e quanto menor o número
23

de balões e falas, menor é esse tempo de leitura. Portanto, a cena narrativa deve fazer jus a
essa leitura. Por exemplo, a revista Mad faz paródias de filmes e em seus quadrinhos
utiliza vários personagens e sequências de diálogos em uma só vinheta, com isso o leitor
tem a sensação de uma duração de tempo maior da cena narrativa. Uma legenda nesses
quadrinhos aumenta ou encurta o tempo de leitura, mas não interfere no tempo da ação
dessa cena.
Com relação ao espaço criado nas HQs, há os cenários, os personagens e suas
ações, que promovem a visão da distância, da proporção e do volume. O autor também
pode utilizar as vinhetas para variar no espaço como, por exemplo, personagens vão descer
uma escada e o autor coloca essas escadas divididas nas vinhetas, promovendo a percepção
do espaço que utiliza as escadas.
Segundo Ramos (2010, p. 138), existem os planos de visão no qual ilustram os
personagens em diferentes espaços. A Visão geral é quando na vinheta está englobado o
personagem, o cenário e o tempo; no Plano total o personagem é representado de maneira
mais próxima e inteiramente; no Plano americano o personagem é exibido do joelho para
cima; já no caso do Plano médio é da cintura para cima; no Primeiro plano o foco está dos
ombros para cima, mais precisamente nas expressões faciais; no Plano de detalhe a
essência está nos detalhes do rosto ou de objetos; e, por último, o plano em perspectiva que
é a junção de diferentes planos. Esses planos são vistos por diferentes ângulos pelos seus
leitores, como afirma Ramos (2010). Por isso, faz-se referência a três tipos de ângulos que
o leitor pode encontrar nos quadrinhos. O primeiro é de visão média que ocorre quando a
cena está na altura dos olhos; o segundo é de visão superior, quando é visto de cima para
baixo (tendo como exemplo um personagem olhando de cima de um prédio); e o terceiro
de visão inferior, ou seja, de baixo para cima.
Levando em considerações esses aspectos, ainda existem os hiatos, conhecidos
também como elipses, que são as divisórias das vinhetas, eles podem indicar uma
sequência de acontecimentos em um curto espaço de tempo ou em um grande espaço de
tempo. Os hiatos também podem ser utilizados para adicionar uma legenda do narrador
enquanto se passa certo tempo. A elipse recorta as cenas com maior importância, para dar
sentido à leitura.
Ramos (2010 p.148) conclui que:

Pode-se deduzir, que, entre as vinhetas, há um processo de economia de imagens


(colocam-se as cenas mais relevantes) e de inferência de informações.
24

Independentemente do corte feito ou de a elipse ser pequena ou grande, haverá


um seqüência narrativa entre um antes e um depois. É o que nos parece mais
relevante nessa discussão.

Após demostrar as principais características das histórias em quadrinhos, como


elas são organizadas e os aspectos necessários dentro de cada uma das etapas que as
constituem, as próximas seções apresentam a trajetória das HQs e como elas evoluíram
da pintura rupestre para o que hoje chamamos de HQs, e quais as condições que
levaram as histórias em quadrinhos a serem usadas como instrumento de estudo nas
escolas, apesar de serem excluídas das escolas, como diz Ramos (2015).
25

2 O SURGIMENTO DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS DESDE OS


PRIMÓRDIOS DA HUMANIDADE E SUA ORIGEM NO BRASIL

Desde os primeiros seres humanos habitantes desta Terra, utiliza-se algum tipo de
comunicação. Antes do surgimento das letras e palavras, o ser primitivo usava os desenhos
e gravuras para poder representar os acontecimentos de sua vida. Essas pinturas ficaram
conhecidas como pinturas rupestres e, além de serem conhecidas como obras de arte, têm
um importante papel no estudo para descoberta do desenvolvimento do ser humano.
Iannone e Iannone (1994) dizem que essas formas são as precursoras das histórias em
quadrinhos, tomando sua forma desde a era pré-histórica. Nesta seção abordamos o
surgimento das histórias em quadrinhos e para que finalidade foram criadas.

2.1 A Pré-História como precursora das histórias em quadrinhos

Esta forma de comunicação por meio dos desenhos utilizada desde a Pré-História é
também produtora de cultura e foi se desenvolvendo de acordo com o incremento da
sociedade, para uma melhor comunicação de acordo com o contexto histórico e social da
época. Por isso, os sumérios, por volta de 3500 a.C., usavam signos para poder representar
suas trocas comerciais, além de leis políticas, econômicas e religiosas, assim dizem
Iannone e Iannone (1994). Os autores também citam o surgimento dos hieróglifos,
desenvolvidos pelos egípcios e os ideogramas criados pelos chineses, que são símbolos que
serviram de base para outros sistemas de escritas. E foram os romanos que, através de uma
simplificação do alfabeto greco-fenício, criaram o alfabeto latino, utilizado até os dias
atuais mas, além de todo o desenvolvimento do sistema de escrita e comunicação, ainda se
enfrentava um grande problema para copiar o que era gravado, então surgiu a primeira
prensa, que foi criada entre 1440 e 1450 por Johann Gutenberg, dando início à história da
imprensa.
26

Figura 7: Imagem rupestre

Fonte: Versloot, 2008.

Segundo Rahde (2005, p.103):

É possível acreditar que, destes primeiros artistas que exercitavam ludicamente


as próprias mãos, as quais aparecem muitas vezes superpostas aos desenhos das
cavernas, nasceram as primeiras seqüências de imagens, que permitiram aos
antropólogos maior conhecimento das culturas primitivas, pela sua iconografia.
Foi assim que a História da Arte encontrou possibilidades de identificação e
descoberta de elementos de continuidade cultural, a partir do estudo da arte da
Pré-História.

Os autores Topffer e Busch (apud Iannone e Iannone, 1994) são reconhecidos


como destaques na criação das histórias contadas por desenhos, mas foi Georges Colomb
identificado como o inventor das características que configuram uma história em
quadrinhos, com sua obra intitulada A Família Fenouillard.
Rahde (2005) salienta a evolução das HQs quando se tem a junção de imagens e
textos para contar as histórias, fazendo o uso de balões para representação das falas dos
personagens. De início as histórias em quadrinhos surgiram com o objetivo de promover
piadas, e eram denominadas comics, termo usado atualmente até para histórias que não
possuem caráter cômico. Segundo Iannone e Iannone (1994), as HQs nasceram nos
Estados Unidos, e logo surgiram suas versões como as tiras de aventuras que tiveram seu
sucesso com o lançamento de Tarzan, em 1929, de Harold Foster. Os livros cômicos, que
eram HQs em livros de capa dura, não obtiveram êxito no mercado, e Iannone e Iannone
(1994, p. 24) observam que: “Apesar dessa tentativa fracassada, o sucesso das adventure
strips acabou dando origem às revistas com histórias completas (republicação das tiras
seriadas e lâminas dominicais).”
27

Com a aparição das histórias completas em quadrinhos, antes publicadas somente


em tiras de jornais como pequenas histórias, houve a consagração de livros de HQs que
passaram a dominar o mercado de comics. Com isso, os temas foram criando uma
diversidade além de humor e aventura, como críticas políticas que marcaram a profissão de
cartunistas que, segundo Iannon e Iannone (1994), confeccionavam cartoons, que são tiras,
na maioria das vezes, publicadas em jornais; e também o grande mercado de histórias em
quadrinhos sobre heróis que marcou diversas gerações e revolucionou o mercado de
quadrinhos. Esses livros de HQs também são conhecidos como revistas, gibis no Brasil,
mangás no Japão e tubeos na Espanha.
Segundo Iannone e Iannone (1994, p.34):

Em 1987, Rudolph Dirks, jovem desenhista norte-americano da equipe do


Morning Journal, apresentou um modelo de expressão cômico-gráfica que
ficaria definitivamente conhecido como histórias em quadrinhos.

Muitos personagens foram importantes para consagrarem as histórias em


quadrinhos como, por exemplo, os heróis que foram lançados principalmente na época da
Segunda Guerra Mundial, como símbolo de esperança para o povo e para vender uma boa
imagem dos Estados Unidos. The Yellow Kid ou “O garoto amarelo” revolucionou o
mercado, trazendo características que seriam comuns das histórias em quadrinhos, como
personagens regulares e falas em balões, e Happy Hooligan, um personagem criado por
Frederick Opper em 1899, “[...] deu um bom impulso nos comics e exerceu notável
influência sobre os desenhistas da época.”, conforme Iannone e Iannone (1994, p.36). Com
o desenvolvimento da sociedade, as HQs traziam suas novas tendências e personagens para
inovação, como Krazy Kat, criada por George Herriman, que inovou no enredo dos seus
quadrinhos, trazendo uma história cheia de entusiasmo e paixão. E mesmo com toda
inovação, os donos de jornais pressionavam os autores para a criação de novas direções
para as vendas aumentarem. Dessa forma, as tiras cômicas voltaram para os jornais, com
capítulos publicados semanalmente para que criassem um mistério e o público comprasse o
jornal para descobrir o desfecho da história.
Na Europa, as HQs enfrentavam um grande problema. Com a guerra e a falta de
materiais, os desenhistas europeus se perduravam a copiar as séries dos Estados Unidos,
tendo como única série original e de sucesso as Aventuras de Tintin, criada pelo belga
Georges Rémi em 1929, que promoveu uma renovação nos quadrinhos europeus, até a
estagnação voltar durante a Segunda Guerra Mundial.
28

Iannone e Iannone (1994, p. 47) dizem que “Em 1949, o personagem Pogo, de Walt
Kelly, marca o início da renovação dos quadrinhos, com a volta à fantasia e ao lirismo do
estilo anterior.” E, assim, as histórias em quadrinhos se tornam marcantes, como um
gênero textual que foi se expandindo pelo mundo, com seu desenvolvimento e suas
características marcantes de cada autor que faz a criação das histórias.
Seu surgimento no Brasil não tardou e acompanhou a evolução dos outros países,
além de revelar inúmeros artistas nacionais que deram às suas obras visibilidade e caráter
mundial, como Mauricio de Souza, por exemplo. A trajetória no Brasil será mais explorada
a seguir.

2.2 O surgimento das histórias em quadrinhos no Brasil e a influência estrangeira em


sua trajetória

No Brasil o surgimento das histórias em quadrinhos foi marcado por várias


influências de artistas de outros países. Os primeiros autores começaram com o humor
gráfico, que criticava a situação do governo brasileiro, no século XIX. Diversos artistas
não se identificavam com a situação vigente, pois o governo da época era autoritário e não
permitia críticas. Mesmo com tanta influência cultural de outros países, o mercado de HQs
no Brasil sofreu limitações econômicas, além da tensão que havia pela necessidade de os
artistas se expressarem ao mesmo tempo em que precisavam alcançar as exigências deste
mercado.
Vergueiro (2017) ressalta a censura que a imprensa sofria durante o período da
Regência, mas, com a proclamação da República a liberdade começou a surgir, o que
ocasionou o aparecimento de novos artistas. Esses períodos foram marcados por momentos
de completa liberdade e outros de severa censura. Além de novos artistas, surgiram novas
revistas como a Revista Ilustrada, que lançou o seu grande destaque intitulado O Malho,
lançou os maiores artistas de sua época e ainda publicou a primeira história em quadrinhos
brasileira chamada As aventuras de Zé Caipora.
Segundo Vergueiro (2017), o autor que se destacou na produção das séries em
linguagens gráficas, com características semelhantes às histórias em quadrinhos, foi
Angelo Agostini (1843-1910). A primeira obra de Agostini foi publicada em 1897 e o
autor ficou conhecido por muitos como o pioneiro das HQs no Brasil.
Porém, o que marcou o surgimento das histórias em quadrinhos no Brasil foi a
revista O Tico-Tico, que era voltada para diversas publicação como contos infantis e até
29

poemas, além da grande divulgação de novos autores. A revista permaneceu por muito
tempo sendo publicada e sendo considerada de grande importância para o destaque que as
histórias em quadrinhos conquistaram no Brasil. De acordo com Sainderbeg (1980, p.11):

O Tico-Tico seria um marco histórico. Seu primeiro número foi lançado a 11 de


outubro de 1905 e seus primeiros colaboradores foram: Vasco Lima (Histórias
Avulsas), Cícero Valadares (Histórias Avulsas) e Alfredo Storni (Histórias
Avulsas). Logo em 1906 surgia J. Carlos, com a personagem “Trapisongas”,
também publicada em O Malho. J. Carlos seria considerado o maior desenhista
de quadrinhos e cartunista de sua geração.

Em 1907, segundo Vergueiro (2017), surgia a publicação da Suplemento Juvenil,


que contribuiu com a popularidade das HQs fazendo com que muitos artistas brasileiros
publicassem em suas páginas. A Suplemento também publicava matérias que tinham a
finalidade cultural e educativa para o público que o consumia.
O sucesso da Suplemento ficou conhecido com a “Época de Ouro” dos quadrinhos
no Brasil, como afirma Sainderbeg (1980), que cita algumas obras dessa época, tais como:
O Enigma das Pedras Vermelhas (Fernando Dias da Silva, 1938) e Macarrão e Talharim
(Queiroz, 1934).
Com o aumento do consumo, o mercado deu início aos lançamentos concorrentes,
voltados para publicações infantis, e uma grande variedade surgiu para o deleite dos
leitores. A principal concorrente da Suplemento Juvenil era O Globo, que lançou a revista
Gibi. Vergueiro (2017, p.40) diz que:

Criada em 1939, a revista Gibi se tornou tão popular no Brasil que acabou sendo
utilizada para designar qualquer revista de história em quadrinhos, prática que
permanece até hoje. Nos últimos anos, no entanto, leitores mais seletivos e
exaltados passaram a repudiar essa denominação, entendendo que ela tem forte
conotação pejorativa, com sua aplicação generalizando o meio com material
impresso destinado exclusivamente ao público infantojuvenil.

Depois de algum tempo os personagens da Suplemento Juvenil acabaram sendo


vendidos para O Globo Juvenil, que assinalou o seu fracasso daí em diante, pela falta de
personagens mais atraentes ao público.
Outro marco destacado por Sainderbeg (1980, p.17) foi a impressão em cores; ele
ressalta os métodos fotoquímicos que começaram a surgir em 1900 e revolucionaram o
mercado. De acordo com o autor, “O clichê a cores iria surgir em 7 de julho de 1907, na
Gazeta de Notícias, em papel acetinado, em máquinas rotativas, constituindo-se numa total
inovação em matéria de imprensa diária sul-americana.[...]”. E mesmo que os autores
brasileiros começassem a se destacar, suas maiores inspirações de personagens ainda eram
30

estrangeiras, como destaca Vergueiro (2017) com o caso do jornal A Gazeta, quando em
seu momento mais produtivo publicava muitos quadrinhos norte-americanos.
Mas foi com a Segunda Guerra Mundial que os artistas brasileiros puderam ter
espaço para se expressarem, já que os norte-americanos publicaram menos nesse período.
Artistas como Arcindo Madeira (Guri e História da Independência, 1941 – Suplemento
Juvenil) e J. Nelson (Compadre Coelho, 1945; Era Uma Vez.) tiveram destaque, como
observa Sainderbeg (1980).

2.3 As HQs no período do golpe militar brasileiro em 1964

Durante seu surgimento no Brasil, as HQs tiveram grandes nomes de artistas que se
destacaram, e se destacam até os dias de hoje, como é o caso de Mauricio de Souza,
criador da Turma da Mônica e Produções, e Ziraldo Alves Pinto, com o personagem
Pererê, além de outros diversos autores. Esses artistas, segundo Sainderbeg (1980),
estiveram presentes em uma expedição com outros autores ao até então Presidente Jânio
Quadros (1961), que apoiava à época os artistas, para pedir uma lei que amparasse as
histórias em quadrinhos nacionais.
Com o apoio que os artistas receberam do presidente, iniciou-se a “Segunda Época
de Ouro” dos quadrinhos, porém, com uma duração curta, pois com a renúncia de Jânio
Quadros e, tempos depois com a queda de Jango, em 1964, os militares tomaram o poder,
e com o golpe militar essa época de ouro teve seu fim decretado, já que os principais meios
de comunicação e críticas ao governo foram censurados. Sainderbeg (1980, p.39 ) diz que:

Mas não nos podemos esquecer dos artistas que lutaram pela nacionalização e
que conseguiram, em 1963, através de um decreto-lei de João Goulart, que
pretendia um mínimo de 20% de HQs nacionais em revistas e jornais, numa
escala percentual crescente que atingiria os 100% em 1970.

O golpe militar fez com que muitas editoras fechassem e muitos desenhistas
ficassem desempregados por suas posições políticas. Os decretos daquele período eram
temíveis para quem se posicionasse, mas em 1969 surge O Pasquim, criado por Sérgio
Cabral, Henrique de Souza Filho, Paulo Francis, Tarso de Castro, Ivan Lessa e outros, que
sentiam o mercado de trabalho fechado pelo Golpe Militar e sentiam que precisavam
inovar. Sainderbeg (1980, p.44) afirma que O Pasquim era “[...] um semanário humorístico
de fundo político [...]”.
31

O autor ainda destaca que mesmo com o AI-5 e outros decretos, os artistas
continuavam sua luta, como Ziraldo e outros autores que publicaram em O Pasquim.
Foi só no início dos anos de 1980 que os quadrinhos brasileiros começaram a ter
um pouco mais de liberdade. De acordo com Sainderbeg (1980), na obra A história dos
quadrinhos no Brasil, o futuro dos quadrinhos, das tiras, das charges e dos artistas é
analisado e deseja-se que as HQs brasileiras tenham um destaque tão grande quanto as
estrangeiras, já que grandes nomes considerados pelo autor fazem parte da construção
dessa história no Brasil.

2.4 As editoras no Brasil e as HQs atualmente

Certas editoras tiveram mais contribuição para o fortalecimento do mercado de HQs no


país, do que outras. Com a variedade de HQs o público começou a sentir o entusiasmo para
começar a prática de colecionar e, com isso, as editoras independentes viam uma oportunidade
de lucro. De acordo com Vergueiro (2017), duas editoras tiveram papel fundamental na
expansão do mercado das HQs: a Editora Brasil-América LTDA (EBAL), que foi fundada por
Adolfo Aizen em 1945, que visava à popularização dos quadrinhos no país e o agrado do
público. A editora foi responsável por inúmeros marcos como apresentar personagens da
Marvel e a propagação de heróis norte-americanos, além de contribuir para muitos artistas
brasileiros publicarem suas histórias. Apesar de terem fechado para o mercado de trabalho dos
quadrinhos por crises econômicas, a editora foi muito importante para a disseminação dos
quadrinhos no Brasil.
E também a Rio Gráfica e Editora (RGE), que é mais um setor das organizações O
Globo, e principal concorrente da EBAL. Suas principais publicações eram de menores
editoras norte-americanas. A RGE não priorizava artistas brasileiros e sim o que o
mercado precisava, fazendo até modificações de histórias norte-americanas sem
autorização, com autores brasileiros, que só tiveram sua chance em outros momentos.
As histórias em quadrinhos passaram por diversos momentos atribulados no Brasil,
mas que foram superados pela criatividade e vontade dos artistas brasileiros, que
conseguiram se consagrar nessa trajetória árdua. Ainda hoje, as HQs enfrentam grandes
desafios em outros planos como, por exemplo, nas escolas, como diz Ramos (2015).
Muitos professores acreditam e as usam como uma ferramenta de trabalho para auxiliar em
sala de aula. Algumas pessoas na sociedade afirmam que é apenas um método para
32

distração. O percurso das HQs na escola e como usá-las para auxiliar na leitura serão
discutidos na próxima seção.
33

3 AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ÂMBITO ESCOLAR

O terceiro capítulo tem enfoque em como as histórias em quadrinhos partiram de


um caminho em que alguns autores acreditavam, como Cecilia Meireles em sua obra
Problemas da literatura Infantil de 1951, que eram um perigo para as crianças, e no
percurso das HQs no âmbito escolar, apoiado em documentos como a BNCC (Base
Nacional Comum Curricular). Esta seção aborda um questionário realizado com cinco
professoras de escolas públicas e privadas que lecionam no terceiro ano do ensino
fundamental, para observar se, mesmo com documentos escolares que visam a aplicação
das HQs como uma ferramenta para leitura e escrita, a visão de que são de má qualidade
ou com conteúdo inferior, como observa Paulo Ramos (2015), ainda perpetua. E para
finalizar, uma proposta de trabalho usando as HQs para incentivar a leitura e a escrita de
jovens.

3.1 A marginalização dos quadrinhos na educação

Depois de visualizar todo o percurso da criação das HQs, é preciso compreender


seu caminho na educação para alcançar o objetivo dessa pesquisa que é usá-las para
incentivo à leitura e à escrita. A marginalização acontece pelas inverdades pregadas a
cerca das HQs, que diziam que elas distanciavam os alunos de leituras adequadas, como
afirmam Silvério e Rezende (s. d.).
As HQs tiveram um percurso difícil por conta de serem consideradas, muitas vezes,
apenas como distração para as crianças. Ramos (2015, p.7) traz em uma de suas obras
intitulada “Literatura e quadrinhos: O cisne e o (censurado) patinho feio” a trajetória e os
problemas que as HQs enfrentaram, e afirma que em uma determinada época:

[...] Os quadrinhos, por outro lado, passaram a ser vistos como produção infantil
e de massa e, por isso, por ser infantil e de massa aos olhos coletivos, seriam,
por si sós, de má qualidade ou com conteúdo inferior. Por mais que
configurassem um campo próprio, esse campo não encontrava condições sociais
e acadêmicas de reconhecimento.

O autor observa, com relação ao percurso das HQs, que os quadrinhos eram
marginalizados pela Igreja, pelo Governo, pelos jornais e revistas, desqualificando os
quadrinhos em suas extensas publicações, fazendo com que a sociedade excluísse as HQs,
com a motivação de ser uma rasa fonte de conhecimento e que os quadrinhos estrangeiros
34

“poria as crianças frente a um processo de alienação dos valores nacionais”. (RAMOS,


2015, p.8).
No Brasil, os quadrinhos eram excluídos como ferramenta a ser utilizada na escola,
pois seu conteúdo era intitulado como impróprio para as crianças e que poderia motivá-las
a serem violentas. Com isso, os autores da época começaram a se autocensurarem por
conta das críticas. Essa censura tomou conta das escolas e bibliotecas públicas também.
Esse preconceito contra as HQs chegou até os cursos superiores e outros campos,
como a Literatura, de acordo com Ramos (2015). Acreditava-se que os quadrinhos eram
uma “baixa cultura” e, por isso, não deveriam estar nos cursos de Letras e Pós-Graduação
de Língua e Literatura.
Apesar de em um determinado período, as HQs terem sido marginalizadas do
ambiente escolar, pelo preconceito da junção de imagens e textos, e que se tornaram aos
olhos da sociedade algo de má qualidade para as crianças, e de terem sido criticadas e
censuradas, atualmente, com os documentos e ensino conseguem comprovar como são
importantes e necessárias dentro da sala de aula para auxílio do professor e incentivo à leitura
e à escrita.

3.2 As histórias em quadrinhos como recurso para formar leitores e sua legitimação na
educação

As histórias em quadrinhos surgiram para divertir as pessoas, distrai-las, contar


histórias engraçadas através desenhos coloridos que fossem consumidos pelo público.
Tempos depois a importância cultural das histórias em quadrinhos foi reconhecida, de acordo
com Rahde (1996, p. 106):

Nesta perspectiva, a história em quadrinhos começou a ultrapassar o espaço do


divertimento de massa para, a partir daí, influenciar os leitores em esferas
psicológicas e sociais, porque era uma forma de leitura alternativa. Nascia uma
literatura de comunicação visual da cultura de massa. Estudos e avaliações da
história em quadrinhos indicaram que o novo meio, que então surgia, possuía e
ainda possui um efeito positivo para a educação da leitura e da cultura da imagem.

A leitura é muito importante, pois estimula a criatividade, trabalha a imaginação,


exercita a memória, contribui com o crescimento do vocabulário e melhora a escrita. O
educador tem um papel fundamental nesse processo de ensino e aprendizagem e precisa
utilizar metodologias que incentivem os alunos a construir o hábito de leitura. De acordo com
Silvério (2012, p.17), a leitura:
35

No contexto educacional, ela pode contribuir para o acesso à edificação do saber, na


medida em que, por meio dela, ao educando é possibilitado não somente construir
conhecimentos, mas ampliá-los e aprimorá-los continuamente, bem como aplicá-los
com mais discernimento dentro e fora dos muros escolares diante dos múltiplos
fatos que ele vê e ouve no desenrolar da temporalidade, compreendendo clara e
competentemente as entrelinhas que fazem parte da composição de seu cotidiano.

O professor tem que desenvolver em seus alunos a competência leitora, pesquisadora


e formar um cidadão capaz de questionamentos. E é por isso que existe a necessidade de uma
formação profissional completa e continuada por parte dos educadores e da equipe gestora,
para que sejam competentes para lidar com as adversidades que vão encontrar em sala de
aula. Pessoa e Utsumi (s.d.) afirmam que o professor constrói sua identidade docente de
acordo com as experiências vividas no estágio e dentro da escola, colaborando para lidar com
situações e metodologias que o professor possa usar em sala de aula, atentando-se à ideia de
que o professor deve se atualizar e estudar o material a ser utilizado. Os autores também
afirmam como pesquisas e estudos mostram como os jovens e crianças são seduzidos pelas
HQs transformando o hábito da leitura em algo prazeroso e espontâneo.
Além do prazer e do estímulo à leitura e escrita, é importante ressaltar que as HQs
também são usadas para aquisição de conhecimento e método de inovação em outras
matérias, como matemática, geografia, biologia, história, língua portuguesa. Silvério e
Rezende (s.d.) citam como a inserção das HQs na escola, em vestibulares, nos livros didáticos
e em provas como o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) mostra que esse tipo de
leitura não se restringe apenas ao público infantil, mas ao evidenciar seu valor demonstra
como sua aplicação e uso são importantes como recurso para construção do conhecimento em
diversas faixas etárias.
Com o passar dos anos foram elaborados documentos que colocaram as HQs em
evidência no âmbito escolar como, por exemplo, os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCNs, 1998), que citam que as HQs podem ser trabalhadas em atividades em sala de aula,
e o Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), que forma acervo de livros em
escolas, e passou a incluir os quadrinhos no ensino de 2006 até o final do programa em
2014.
Em 2017 foi homologado pelo Ministério da Educação (MEC) o documento da
Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2017) que tem por objetivo determinar as
competências gerais e específicas, habilidades e aprendizagens necessárias que todo
aluno/a deve desenvolver durante a educação básica em cada etapa. Esse documento serve
para nortear as equipes pedagógicas na elaboração dos currículos de cada escola. A BNCC
inclui as HQs de forma que precisam ser usadas como material em sala de aula.
36

Durante a leitura, as habilidades operam de forma articulada. Dado o


desenvolvimento de uma autonomia de leitura em termos de fluência e
progressão, é difícil discretizar um grau ou mesmo uma habilidade, não
existindo muitos pré-requisitos (a não ser em termos de conhecimentos prévios),
pois os caminhos para a construção dos sentidos são diversos. O interesse por
um tema pode ser tão grande que mobiliza para leituras mais desafiadoras, que,
por mais que possam não contar com uma compreensão mais fina do texto,
podem, em função de relações estabelecidas com conhecimentos ou leituras
anteriores, possibilitar entendimentos parciais que respondam aos
interesses/objetivos em pauta. O grau de envolvimento com uma personagem ou
um universo ficcional, em função da leitura de livros e HQs anteriores, da
vivência com filmes e games relacionados, da participação em comunidades de
fãs etc., pode ser tamanho que encoraje a leitura de trechos de maior extensão e
complexidade lexical ou sintática dos que os em geral lidos.

A BNCC mostra em suas habilidades o uso das HQs para atingir os objetivos
propostos anteriormente pela base, colocando para os professores a importância de usá-las
em sala de aula como ponto de partida para o trabalho com a leitura e escrita, além de
intensificar seu convívio com os alunos, pois é um material de fácil acesso e que em
muitos casos já faz parte da rotina dos estudantes. Com esse uso as HQs possibilitam aos
professores e alunos um trabalho mais abrangente considerando a diversidade cultural,
utilizando de produções e formas de expressões diversas, podendo ter momentos de
apreciação em conteúdos como literatura juvenil, cultura das mídias, literatura periférico-
marginal, entre outras. De acordo com as habilidades apresentadas pela BNCC, pode-se
observar como e porque devem ser usadas as HQs, mostrando que elas podem ser
utilizadas como procedimentos para que o aluno leia e compreenda de forma autônoma.

(EF67LP28) Ler, de forma autônoma, e compreender – selecionando


procedimentos e estratégias de leitura adequados a diferentes objetivos e levando
em conta características dos gêneros e suportes –, romances infantojuvenis,
contos populares, contos de terror, lendas brasileiras, indígenas e africanas,
narrativas de aventuras, narrativas de enigma, mitos, crônicas, autobiografias,
histórias em quadrinhos, mangás, poemas de forma livre e fixa (como sonetos e
cordéis), vídeo-poemas, poemas visuais, dentre outros, expressando avaliação
sobre o texto lido e estabelecendo preferências por gêneros, temas, autores.
(BRASIL, 2017)

Portanto, o que tornam as HQs uma aliada para incentivar a leitura são suas
características, citadas na primeira seção, como as onomatopeias, e que podem ser usadas
como um atrativo para o leitor. As HQs são um conjunto de imagens, gírias, ações, enredos e
objetivos que cativam o leitor justamente por trazer temas atuais, literaturas adaptadas, em
uma linguagem que chama a atenção, que é mais acessível a todos os públicos. Sousa (2011,
p.4) afirma como as histórias em quadrinhos podem iniciar os jovens no hábito da leitura e
aquisição de conhecimento, além de introduzir obras literárias mais complexas.
37

3.3 Procedimentos Metodológicos

Esta subseção aborda os procedimentos metodológicos organizados, a partir dos


objetivos traçados, que ajudaram na investigação do problema apresentado. As professoras
foram contatadas via whatsapp e se disponibilizaram para responder o questionário, após uma
breve explicação do tema, dos objetivos e do conteúdo. Foi enviado um questionário via e-
mail, devido a atual situação de pandemia no mundo, contendo cinco questões abertas,
interrogando sobre o uso/importância das HQs. Cinco professoras receberam o questionário,
sendo duas delas de escolas públicas e três de escolas privadas da cidade de Ituverava, todas
ministram aula no terceiro ano do Ensino Fundamental I. O terceiro ano foi escolhido, pois é
uma turma que já se alfabetizou e esta em fase de leitura mais avançada e constante; portanto,
é preciso o trabalho contínuo para que esses alunos não percam o hábito da leitura.
A pesquisa buscou relacionar a prática das professoras com a problemática, se em
seus trabalhos didáticos e em seus métodos pedagógicos, elas utilizam as histórias em
quadrinhos, como previsto pela BNCC, como ferramenta para incentivar a leitura e a escrita,
ou se em suas práticas as HQs se restringem a mero passa tempo para os alunos.

3.4 Análise

Para atingir os objetivos da pesquisa, foram analisadas e relacionadas as respostas


dadas pelas professoras, que foram divididas em Professora A, B, C, D e E (sendo A e B, de
escola pública e C, D e E de escola privada). As respostas obtidas foram as seguintes.

Questão 1: Qual a importância das Histórias em Quadrinhos para você enquanto


professor? E enquanto leitor?

Professora A: As Histórias em Quadrinhos são pequenos textos que estimulam a


imaginação e o raciocínio dos alunos. Suas imagens chamam a atenção e fazem com que o
aluno queira ler mais e mais, com isso consigo ampliar o repertório de leitura deles, fortalecer
a leitura de imagens, estimular o entrosamento entre imagem e texto, além de conseguir
trabalhar diferentes recursos linguísticos.

Professora B: As HQs são um recurso valioso em sala de aula, pois aumentam o


engajamento dos alunos nas atividades de leitura e interpretação de textos, já que esse gênero
é bem recebido principalmente pelos alunos no ensino fundamental e médio. Enquanto
leitora, eu particularmente leio poucos quadrinhos, mas foi através deles, na infância, que me
apaixonei pelo hábito de leitura.
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Professora C: As histórias em quadrinhos contribuem para despertar o interesse pela


leitura e pela escrita nas crianças e para sistematizar a alfabetização, e enquanto leitora, a
ludicidade desperta um prazer maior.

Professora D: A leitura de gibis é uma atividade lúdica para as crianças, que


naturalmente se identificam com a linguagem dos quadrinhos e, muitas vezes, estabelecem
uma relação afetiva com seus personagens, estimulando o hábito da leitura. A sequência de
imagens dos quadrinhos permite que a criança compreenda o sentido da história antes mesmo
de aprender a ler. Ao fazer isso, ela organiza o pensamento, exercita a capacidade de
observação, interpretação e desenvolve a criatividade. Na fase de pré-alfabetização, o contato
com os gibis também ajuda o aluno a se familiarizar com as letras, auxiliando no processo de
aprendizagem. O que demonstra ser um meio de comunicação poderoso e influente é o
conhecimento público, a relevância das HQs em todo o mundo e o sucesso inerente às
histórias. Apesar do advento da internet, de outros meios de comunicação, as mesmas não
param de conquistar fãs e nem de sair do topo de vendagens de revistas. A durabilidade do
sucesso das HQs só reforça o quanto interferem na vida das pessoas, seja afetiva ou
culturalmente.

Professora E: A importância das Histórias em Quadrinhos é incentivar e estimular o


aluno, fazer com que este tenha gosto e prática pela leitura, contribuindo para o seu
desenvolvimento. Para o leitor o incentivo das Histórias em Quadrinhos desenvolve a prática
de leitura e a escrita.

Pode-se observar que as respostas da questão 1 seguem um padrão em que as


professoras reconhecem a importância do uso das HQs em sala de aula para influenciar a
leitura, já que seu uso estimula os alunos pelas imagens e conteúdos interessantes. E como a
professora D ressaltou, mesmo com tanta tecnologia as HQs continuam conquistando espaço
com seu conteúdo inovador e relevante tanto para crianças como para adultos. Como diz
Silvério e Rezende (s.d, p.16):

Diante de tantas novidades tecnológicas pelas quais os estudantes têm demonstrado


interesse, as HQs possibilitam o encontro do leitor com a leitura, o qual no decorrer
do tempo e as modificações sociais descobre com essas obras leituras dinâmicas e
motivadoras. Assim, quando o docente expressa em seus métodos pedagógicos e
principalmente em sua performance de leitor a prática assídua da leitura,
gradualmente ele estimula o desejo pelo ler junto ao aluno; um formador de leitor
que, enquanto forma outros leitores, ensina lendo e lendo, ensina.

Questão 2: De acordo com a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), as HQs


devem ser usadas em sala de aula. Como é seu trabalho dentro da sala de aula com as
histórias em quadrinhos? E se não usa, justifique o motivo.

Professora A: O trabalho em sala de aula requer um planejamento das atividades para


estabelecer uma estratégia mais didática como, por exemplo, estabelecer um dia para a leitura
das HQs deixando os alunos terem acesso a vários gibis com livre escolha. Neste momento o
39

aluno tem a oportunidade de ler por prazer e não para responder questões. Ao decorrer da
semana apresento uma tirinha e trago reflexões sobre a mesma, assim consigo iniciar a
formação dos meus alunos como leitores críticos. Com o uso das Histórias em Quadrinhos na
sala de aula tenho a oportunidade de:
• Utilizar das histórias em quadrinhos como incentivo à leitura dos alunos;
• Trazer o aluno para o universo da leitura;
• Ampliar a compreensão de conceitos;
• Ter momentos de reflexão dentro da sala de aula;
• Auxiliar no desenvolvimento do hábito de leitura.

Professora B: Geralmente trabalho com HQs tanto para expor estruturas gramaticaiss
de forma contextualizada, quanto para interpretação, propondo para o aluno descrever os
efeitos de humor trazidos por esse gênero.

Professora C: As HQs devem ser usadas na sala de aula como recurso didático visual,
que também auxilia no interesse do aluno ao ler e ver imagens.

Professora D: As histórias em quadrinhos (HQs) são recomendadas pela BNCC para


incentivar a leitura, e isso permite que o professor utilize esse gênero literário na sua prática
pedagógica, como forma de trabalhar as diversas linguagens. As histórias em quadrinhos são
boas ferramentas de incentivo à leitura, seja lá qual for a idade do leitor, os alunos amam!
Sempre trabalho, independente da série. A associação de textos e imagens torna o ato de ler
mais atraente e os elementos gráficos (como os balões e as expressões faciais dos
personagens) facilitam a compreensão da trama. Como abordam variados temas: aventuras
espaciais, convivência entre animais etc., permitem que professores de diferentes áreas
trabalhem com um amplo leque de informações. Enredos de ficção científica, por exemplo,
podem ser o ponto de partida para o debate de assuntos relacionados à disciplina de Ciências.
O importante para usá-los corretamente é criar a estratégia adequada, combinando as
especificidades do conteúdo, o tema da história e as características dos estudantes (a faixa
etária, o nível de conhecimento e a capacidade de compreensão). Na disciplina de Língua
Portuguesa há diversos temas a explorar, diálogos, pontuação, interjeições, onomatopeias,
metáforas visuais (expressões, sentimentos, emoções) entre outros. Enfim, é um material
muito atraente e útil.

Professora E: As Histórias em Quadrinhos são usadas em leitura de gibis, estudo de


onomatopeias, os tipos de balões e nas produções de texto que trabalho bastante.

Na questão 2, as professoras mostraram que todas seguem a BNCC para utilizar as


HQs em sala de aula e até fazer conexões com outras matérias, utilizando um planejamento
que contribui também para a interdisciplinaridade. Além dos inúmeros outros benefícios de
sua utilização, como cita a professora A. Silvério e Rezende (s.d, p.16) observam que:

Nessa direção, o professor, quando conhecedor do papel da leitura, busca que seu
alunado não apenas queira ler, mas que, ao ler, possa questionar, debater, refutar
numa interação real em que a leitura seja vivenciada em toda sua plenitude. O
gênero discursivo HQs, muito mais do que páginas multicoloridas e humorísticas,
propõe leituras que exploram signos diversificados, contribuindo para que o aluno
possa ampliar e aprofundar aquilo que lê, ou seja, dar sentido à leitura.
40

Questão 3: Como você vê a produtividade do trabalho com HQs? Como são os


resultados desses trabalhos quando se usa Histórias em Quadrinhos?

Professora A: Ao utilizar das Histórias em Quadrinhos em sala de aula com os alunos


consigo despertar o interesse pela leitura e pela escrita nas crianças e sistematizar a
alfabetização, pois a alfabetização vai muito além de saber ler e escrever, mas ter uma melhor
compreensão do mundo e da sociedade em que vive para que possam atuar de maneira
consciente.

Professora B: Eu percebo que as atividades realizadas através dos quadrinhos são bem
recebidas pelos alunos, tanto pela linguagem simples, quanto pelo teor crítico e humorístico.
Eles se mostram mais participativos e na maioria das vezes promovem discussões para além
do pedido nos exercícios.

Professora C: As Histórias em Quadrinhos (HQ) estimulam e incentivam o leitor a


buscar também outros tipos de leitura, uma vez que, juntamente com os livros, são
instrumentos saudáveis para estimular a imaginação e o raciocínio de jovens e crianças.

Professora D: Apesar dos anos as HQs não perdem forças, ao contrário, ganham
diferentes ideias, novas estruturas, personagens modernas e sofisticadas, capítulos inéditos e
fãs cada vez mais fanáticos, garantindo dessa forma, o sucesso, a influência e a produtividade
necessária. Quando os quadrinhos são usados em sala de aula, os sorrisos ficam estampados
nos rostos. É uma festa! Os alunos pedem para levar para casa, eu deixo, aproveito a
oportunidade para trabalhar a responsabilidade e o zelo. Com resultados satisfatórios,
realizados diversos tipos de atividades, pois é um material rico a ser explorado, além de não
deixar de ser um aprendizado lúdico e divertido.

Professora E: A produtividade do trabalho em HQs são [sic] de suma importância


para o aluno. Os resultados são visíveis, pois o aluno desperta a curiosidade, a imaginação
despertando assim o interesse pela leitura e escrita.

As respostas da questão 3 mostram como a produtividade dos alunos em sala de aula


aumenta com a utilização dos quadrinhos nas atividades e no cotidiano dos alunos. Com uma
linguagem simples, com conteúdo inovador e acessível, além de abrir caminhos para leituras
mais complexas, as HQs trazem resultados satisfatórios para o desenvolvimento dos alunos.
De acordo com Sousa (2011, p. 3):

Quando os alunos percebem e sentem que estudar também é prazeroso, eles


participam das atividades escolares com espontaneidade e gozo, a exemplo das
atividades relacionadas à leitura. Além disso, o estudante se identifica com uma
história, a qual lhe marcou, por dialogar com sua realidade ou com seu gosto.
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Questão 4: Você conhece a importância das Histórias em Quadrinhos no processo de


ensino-aprendizagem? Ou usa as HQs como passa tempo?

Professora A: As Histórias em Quadrinhos no processo de ensino-aprendizagem são


extremamente importantes, por isso, utilizo esta ferramenta para motivar meus alunos a
ingressarem não somente na leitura como também na escrita, aprenderem a relacionar
imagens e palavras interpretando recursos gráficos como os balões e as onomatopeias, além
de ser uma leitura acessível e adequada para o desenvolvimento das habilidades e
competências leitoras.

Professora B: Esse gênero é muito importante no processo de ensino-aprendizagem


nas minhas aulas, pois ajuda a tratar de temas vistos como chatos, como gramática, por
exemplo.

Professora C: Este tipo de "literatura" muito contribui para a formação de leitores


competentes, pois sua linguagem (ação narrativa) empolga e satisfaz as crianças, não cansa,
como acontece muitas vezes nas leituras obrigatórias e, ao adaptar-se ao seu nível intelectual
e ao seu interesse, rompe as barreiras que existem contra a prática de leitura, sendo um
eficiente instrumento para despertar o gosto por ela.

Professora D: A utilização de HQs como recurso didático, na sala de aula, pode ser
uma ferramenta fundamental uma vez que a mesma apresenta uma combinação de
comunicação visual e verbal. No contexto atual, em que é necessário reinventar aulas mais
contextualizadas e estimulantes que garantam a aprendizagem significativa, a história em
quadrinhos pode representar uma solução, pois apresenta alguns destes requisitos como
recurso didático. Podendo ser uma ferramenta para trabalhar diversas disciplinas.
Combinando linguagem verbal e não-verbal, a história em quadrinhos combina imagens e
textos escritos, de fácil compreensão, articulando conteúdo com o cotidiano.

Professora E: As HQs Tem um importante papel no processo – aprendizagem das


crianças, além de estimular a leitura, estimula a escrita e com isso o aluno começa a despertar
seu interesse, não só parte a verbal e também visual.

Na questão 4, as professoras não utilizam as HQs somente como passa tempo, mas
aproveitam seu uso como uma ferramenta pedagógica para ministrar suas aulas e diversos
conteúdos, além de leitura e escrita. O professor deve ser o mediador da metodologia de uso
dessas HQs para que os alunos despertem interesse para a leitura e a escrita e para os
conhecimentos que são passados por cada história. Como cita Pessoa e Utsumi (s.d., p.5):

Além dessas competências e habilidades, é necessário, ainda, o domínio da


narrativa gráfica, a inserção do balão como elemento de intersecção entre palavra e
imagem e dos quadros que se estabelecem como divisores temporais dentro da
história. Cabe, também, ao professor, orientar o sentido da leitura de uma página de
história em quadrinhos, propor ao aluno relacionar sons e efeitos por meio das
onomatopéias, bem como fazer com que o aprendiz entenda o design de uma revista
de história em quadrinhos nos seguintes aspectos: logotipo, tipografia, dimensões de
uma revista, montagem de uma edição e como ela pode ser disponibilizada na
Internet.
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Questão 5: Os materiais que você usa em sala de aula apresentam com bastante
frequência as HQs? E como professor você inclui as HQs na rotina de seus alunos?

Professora A: O material didático utilizado em sala de aula apresenta com certa


frequência as Histórias em Quadrinhos, porém, procuro ampliar ainda mais essa apresentação
permitindo que os alunos tenham um contato livre pelo menos uma vez por semana durante a
leitura espontânea.

Professora B: Dos três livros que uso de base para preparar minhas aulas, apenas em
um é bastante frequente o uso das HQs.

Professora C: Sim, é de grande valia introduzir na aprendizagem dos alunos


conteúdos que os estimulem e despertem sua curiosidade em conhecer e aprender.

Professora D: O nosso material, especificamente as apostilas, possui textos e


atividades com Histórias em Quadrinhos. Além desse conteúdo contamos com a biblioteca,
provida de livros, revistas e gibis diversificados, os quais ficam disponíveis para o uso dos
alunos e professores (inclusive levar para casa aos finais de semana). A “Roda da leitura” é
rotina em minha sala, uma vez por semana, o aluno tem a liberdade de escolher o conteúdo a
ser lido, inclusive HQs, desde que, o mesmo esteja de acordo com sua capacidade de
interpretação.

Professora E: Uso com frequência gibis, livros que apresentam HQs. As HQs são
incluídas de acordo com o material apresentado a cada série.

Na questão 5 podemos perceber que, apesar da utilização das HQs em sala de aula,
algumas professoras ainda não conseguem ver em materiais didáticos os quadrinhos com
muito frequência, como relatou a professora B, que de três livros usados, somente um
apresenta com frequência as histórias em quadrinhos.
Contudo, observa-se que os resultados desta pesquisa mostram que podemos trabalhar
as HQs em sala de aula para ampliar o repertório de leitura, utilizando-as, por exemplo, com
tempo para uma leitura livre; também se pode utilizar para familiarização de letras e
relacionar imagens com texto, assim influenciando o aluno em fase de alfabetização;
contextualizar a rotina do aluno e instigá-lo à interpretação de histórias e para abordar temas
transversais para que os alunos se interessem. Ou seja, as HQs são uma ferramenta muito
produtiva para o incentivo à leitura e à escrita. Observa-se a qualidade desse gênero
discursivo para o trabalho em sala de aula, de maneira que o professor precisa saber trabalhar
com esse material e usar todas as suas ferramentas para o incentivo à leitura em outras
disciplinas também.
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4 PROPOSTA DE TRABALHO

Ao longo dessa pesquisa, foi possível adquirir uma compreensão da importância das
histórias em quadrinhos para incentivar a leitura e a escrita, e em como podem ser usadas em
sala de aula para atingir os objetivos aqui propostos. Sousa (2011) afirma que as HQs podem
abrir portas para leituras mais complexas, como literatura brasileira.
Pensando em tornar a leitura e a escrita um hábito para os alunos, além de incluir
literatura em sua rotina, a proposta de trabalho aqui elaborada sugere a organização e
adaptação de obras literárias brasileiras em histórias em quadrinhos, como já existem com
algumas obras. Este trabalho pode ser visto como uma forma de contribuir para o processo de
ensino-aprendizagem dos alunos.
Sugere-se, primeiro um planejamento escolar sobre os conteúdos que os alunos devem
aprender durante o ano letivo, depois a distribuição de tarefas, como separação de conteúdos
atuais que podem ser introduzidos e conectados com algumas obras literárias e quais delas
podem ser utilizadas nesse processo. Na sequência, um estudo sobre as histórias em
quadrinhos, suas origens, estrutura e características. Em seguida, a confecção dessas obras em
forma de histórias em quadrinhos, fazendo os alunos participarem da elaboração do projeto
que seria a adaptação das obras para uma linguagem acessível aos alunos, a elaboração dos
desenhos e a organização dos quadrinhos, considerando sempre a essência das histórias, mas,
aproximando-as da rotina dos alunos e do contexto histórico, social e político que estão
vivendo, para que eles possam também se interessarem pelas obras originais, conhecerem a
importância dos quadrinhos e desenvolverem o hábito da leitura e escrita.
Essa proposta de trabalho pode ser aplicada com qualquer ano do Ensino Fundamental
ou do Ensino Médio, pois as histórias em quadrinhos são atemporais e não perdem sua
importância, independente do público-alvo. Por isso, essa proposta pode se estender até o
final do Ensino Médio, para que todos os alunos possam ter contato com esse material, pois
os jovens também precisam construir e manter um hábito de leitura. Todo o trabalho
envolvendo as HQs se baseia na metodologia e nos objetivos que os professores terão em sala
de aula, para envolver o aluno na bagagem cultural que as histórias em quadrinhos trazem.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho apresentou o conceito de gêneros textuais, as principais características


que compõem as histórias em quadrinhos, sua origem, sua trajetória em outros países, seu
surgimento no Brasil e como se consolidou na educação. O principal objetivo deste estudo foi
analisar como as HQs desenvolvem a competência leitora e o senso crítico nos alunos para
que possam interpretar e escrever textos, levando em contas suas características de instigação.
Com a análise do questionário respondido pelas professoras, as respostas obtidas
atingiram um resultado satisfatório diante dos objetivos. As professoras contribuíram para
afirmar como as histórias em quadrinhos são importantes e necessárias como ferramenta
pedagógica para se utilizar em sala de aula como incentivo e estímulo à leitura e à escrita.
Os alunos precisam cada vez mais ser impulsionados a ler e a escrever para se
tornarem críticos. E esse trabalho tem a intenção de contribuir para que as histórias em
quadrinhos sejam reconhecidas em diversas circunstâncias por professores, para que sejam
utilizadas em sala de aula como um material que faz com que os alunos se sintam
interessados em desenvolver o hábito da leitura e escrita, além de as HQs poderem ser
aplicadas em conteúdos interdisciplinares.
Os quadrinhos são importantes na interdisciplinaridade, pois é um material que alia a
linguagem textual e visual, trazendo uma relação lúdica e uma diversidade de temas e
conteúdos. Com essas características, as HQs possibilitam ao leitor um conhecimento de
vários assuntos como, por exemplo, uma história que mostra ambientes rurais e as diferenças
com ambientes urbanos; e com as HQs, o aluno tem acesso a conteúdos de diversas
disciplinas como Língua Portuguesa, Geografia pelos locais, Ciências, se o professor remeter
à fauna e flora, história se abordar êxodo rural. Portanto as HQs têm inúmeras possibilidades
se o professor se atentar aos métodos que ele vai utilizar e aos conteúdos de cada ano.
E para uma contribuição mais efetivas das HQs em sala de aula, o professor pode usar
atividades como, por exemplo, a proposta elaborada aqui, para trabalhar as HQs e inovar seu
uso. Essa proposta inclui obras literárias adaptadas para quadrinhos para que, desde criança, o
aluno tenha contato com um material repleto de conhecimento para aprimorar a
aprendizagem.
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REFERÊNCIAS

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560x550.jpg&imgrefurl=https://franquia.piticas.com.br/colecao/turma-da-
monica/&h=550&w=560&tbnid=XmhexJMwXcLPXM&tbnh=222&tbnw=227&usg=
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47

APÊNDICE

Identificação: Jordana Regina Pistore Ribeiro


Instituição: FFCL- Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ituverava
Curso: Pedagogia

Questionário

1) Qual a importância das Histórias em Quadrinhos para você enquanto professor? E


enquanto leitor?

2) De acordo com a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), as HQs devem ser usadas
em sala de aula. Como é seu trabalho dentro da sala de aula com as histórias em
quadrinhos? E se não usa, justifique o motivo.

3) Como você vê a produtividade do trabalho com HQs? Como são os resultados desses
trabalhos quando se usa Histórias em Quadrinhos?

4) Você conhece a importância das Histórias em Quadrinhos no processo de ensino-


aprendizagem? Ou usa as HQs como passa tempo?

5) Os materiais que você usa em sala de aula apresentam com bastante frequência as HQs?
E como professor você inclui as HQs na rotina de seus alunos?

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