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SEGURANÇA

'Minha procura pelo menino que aparecia em vídeo de


abuso sexual'

Imagem: Hello Emma/BBC

Lucy Proctor - BBC Stories


21/06/2020 09h47

Lucy Proctor ficou horrorizada quando recebeu pelo WhatsApp um


vídeo de abuso sexual infantil. E ela quis descobrir se o menino
estava seguro.

Um dia, logo depois que deixei meu filho na escola, recebi um vídeo horrível
no WhatsApp. Isso me fez questionar como imagens e vídeos de abuso
sexual infantil são criados e como eles podem circular abertamente pela
internet. E, acima de tudo, eu queria uma resposta: o que aconteceu com o
garoto que aparecia no vídeo?

Pode parecer estranho, mas a mulher que me enviou o vídeo era uma mãe
que eu conhecia dos portões da escola. Tínhamos montado um grupo no
WhatsApp para discutir calendário da escola, uniformes, doenças.

Então, certa manhã, do nada, uma dessas mães enviou um vídeo para o
grupo com dois emojis de rosto chorando embaixo.

Aparecia apenas uma imagem preta, sem thumbnail, e todas pressionamos


o play sem pensar. Talvez fosse um meme ou uma notícia. Talvez um dos
vídeos de alerta que algumas mães começaram a compartilhar.

O vídeo começa com uma foto de um homem e um bebê, com cerca de 18


meses, sentados em um sofá. O bebê sorri para o homem.

Não consigo descrever o resto.

Se eu contar o que vi nos 10 segundos necessários para entender o que


estava acontecendo e pausar o vídeo, você verá a imagem na sua cabeça
também. E você não quer ver isso. É um vídeo de abuso sexual infantil.
Dura nove minutos.

Eu gritei e joguei meu telefone do outro lado da sala. Estava cheio de


mensagens de membros do grupo que ficaram perturbados.

Imagem: Hello Emma/BBC

Levei meu celular para a delegacia, em Londres, e disse a eles o que tinha
acontecido. Eu disse que acreditava que a mulher havia nos enviado como
um alerta e que esperava que eles investigassem a origem do vídeo. Era
um novo vídeo ou um que eles já haviam encontrado? Este menino ainda
estava em perigo? Essa evidência poderia ajudar a salvá-lo ou encontrar o
agressor?

A polícia ficou com meu celular por duas semanas. Descobri no dia seguinte
que eles prenderam a mulher que o enviou e visitaram outros membros do
grupo. Depois, não ouvi mais nada sobre isso.

Mas uma pergunta permaneceu comigo: o que aconteceu com o menino do


vídeo? E assim, alguns meses depois, depois que consegui ler para os
meus filhos uma história para dormir sem pensar naquele vídeo e a vida
voltar ao normal, comecei a procurar respostas.

Comecei tentando falar com o policial que estava investigando o vídeo no


meu telefone. Mas, toda vez que eu ligava, diziam que ele tinha acabado de
sair.

Ele não queria nada comigo.

Imagem: Hello Emma/BBC

Eu falei com Alan Collins, um advogado especializado em casos de abuso


sexual de crianças, para ver se alguma das coisas que eu normalmente
faria para rastrear as pessoas funcionaria. Eu poderia, por exemplo, enviar
uma cópia do vídeo a ex-policiais para ver se eles o reconheceriam?

"Você pode estar diante de uma sentença de 10 anos de prisão", ele me


disse. O mesmo vale para tirar uma foto e enviá-la. Apenas possuir uma
imagem como essa no meu telefone poderia me levar à prisão.

Então liguei para um amigo de um amigo que já tinha trabalhado para a


polícia. Ele me disse que a delegacia teria enviado meu telefone para um
dos laboratórios forenses digitais espalhados pela cidade. Os laboratórios
listam todo o conteúdo ilegal e, quando se trata de abuso sexual de
crianças, eles o classificam: categoria A para os mais graves, além de B e
C. Este vídeo do WhatsApp era categoria A.

Em seguida, o arquivo vai para a identificação da vítima, e meu caso foi


encaminhado ao Comando de Exploração Sexual e Abuso de Crianças da
Polícia. Um policial de lá, o sargento Lindsay Dick, concordou em conversar
comigo, mas não quis falar muito sobre as técnicas usadas para o caso de
ajudar os infratores a descobrir como evitar a captura.

Estima-se que 100 mil homens no Reino Unido assistem regularmente a


abuso sexual infantil

A polícia prende entre 400 e 450 pessoas por mês, principalmente


homens, por visualizar ou baixar esses arquivos

O WhatsApp destrói 250 mil contas por mês suspeitas de espalhar


material de abuso sexual infantil, com base nos nomes de grupos e fotos
de perfil

Ele me contou sobre um caso em que um policial pegou um telefone com


imagens de um garoto sendo abusado, juntamente com imagens do mesmo
garoto sem estar sendo abusado. Em uma delas, ele está parado em um
ponto de ônibus com uniforme escolar. Um policial reconheceu a região do
ponto de ônibus e fez uma ligação para a equipe local. Eles reconheceram o
uniforme da escola. O garoto foi identificado, seus pais, presos e os
serviços sociais assumiram os cuidados da criança. A polícia responsável
pela identificação de vítimas em todo o mundo depende de pequenas pistas
como essa.

Lindsay Dick não discutiu os detalhes do que eu tinha enviado, embora ele
tenha investigado o caso. Então, quando perguntei a ele sobre uma
sugestão de um editor para tirar uma foto do rosto do agressor, para ajudar
a identificá-lo, comecei a fica nervosa.

"Você ainda tem uma cópia desse vídeo?", ele me perguntou severamente.
"Não", respondi. Mas ele ainda estava em algum lugar no servidor do
WhatsApp e, como eu ainda era membro do grupo, ainda estava
aparecendo no meu telefone. Mesmo que eu não tivesse feito nada errado,
percebi o quanto a polícia levava esse tipo de coisa a sério.

No fim do ano passado, uma policial de Londres, Novlett Robyn Williams, foi
condenada a cumprir 200 horas de trabalho comunitário não remunerado
por não ter reportado um vídeo de abuso sexual infantil que sua irmã enviou
no WhatsApp. (A policial agora está apelando contra a condenação.)

A Polícia de Londres se recusou a me ajudar mais na minha busca pelo


garoto no vídeo. A certa altura, eles até disseram a oficiais em outra parte
do país, incorretamente, que eu tinha sido advertida por compartilhar o
vídeo.

Mais tarde, descobri pela mulher que me enviou o vídeo que ela tinha
recebido pena de três anos no registro de criminosos sexuais. No Reino
Unido, o registro de agressores sexuais contém as informações de pessoas
condenadas, advertidas ou libertadas da prisão por ofensa sexual.

Mas os investigadores locais não levaram o caso adiante. Eles não


prenderam a amiga que tinha enviado a ela e nem sequer tentaram
descobrir quem tinha enviado para a amiga dela. Nada foi feito para seguir o
caminho do vídeo.

A Polícia de Londres disse que "a escala de abuso infantil e exploração


sexual online aumentou nos últimos anos. Esse aumento demanda da
polícia, juntamente com a necessidade de acompanhar o avanço da
tecnologia e adaptar nossos métodos para detectar e identificar criminosos.
No entanto, continuamos comprometidos em levar à justiça aqueles que
cometem crimes de abuso infantil online e em proteger vítimas e jovens em
risco".

"Encorajamos qualquer pessoa preocupada com uma criança em risco de


abuso ou possível vítima a entrar em contato com a polícia imediatamente.
Qualquer pessoa que receber uma mensagem não solicitada que contém
abuso infantil deve denunciá-la à polícia imediatamente para que sejam
tomadas medidas. Imagens dessa natureza não devem ser compartilhadas
sob quaisquer circunstâncias."

Eu precisava de alguém que não estivesse envolvido no caso para me dar


mais algumas dicas de onde poderia ter vindo aquele arquivo. Então
comecei a pesquisar e me deparei com notícias sobre uma equipe em
Queensland, na Austrália, com reputação de se infiltrar em sites de
compartilhamento de vídeos de abuso infantil.

O chefe de identificação das vítimas, o ex-detetive da polícia de Manchester


Paul Griffiths, me disse que o arquivo que eu havia recebido provavelmente
tinha surgido em um desses sites.

"O que costuma acontecer é que, quando um arquivo é produzido dessa


maneira, ele geralmente fica oculto, circulando por uma rede pequena e
estreita. Muitas vezes, as pessoas sabem que precisam mantê-lo escondido
e não distribuí-lo amplamente", disse ele.

Essas redes de pedófilos usam a


chamada dark web, uma parte da internet
que não é indexada prontamente por
mecanismos de busca como o Google.
Eles acessam sites por meio de uma
conexão chamada TOR ou roteador de
Imagem: Hello Emma/BBC
cebola (em camadas). Eles usam um
endereço IP falso, conectado a vários
outros servidores espalhados pelo mundo, o que torna sua localização não
rastreável.

Os membros dos sites na dark web são como colecionadores de selos


doentes - publicam miniaturas do que têm em fóruns online sobre o tema e
procuram concluir séries, geralmente de uma criança em particular.

Alguns deles são "produtores" - abusam das crianças ou as filmam sendo


abusadas.

Há alguns anos, a equipe de Paul Griffiths estava acompanhando um site


chamado Child's Play. Eles tinham informações de que dois dos líderes do
site estavam se encontrando nos EUA. Os policiais os interceptaram,
prenderam e pegaram suas senhas.

Agora eles podiam ver cada vídeo e podiam começar a trabalhar para
encontrar crianças e abusadores. Eles fizeram centenas de prisões em todo
o mundo e 200 crianças foram salvas até agora.

"É coisa de Sherlock Holmes, é seguir pequenas pistas e ver o que você
pode juntar para tentar encontrar uma agulha no palheiro", diz Griffiths.

A grande preocupação agora é a transmissão ao vivo desse tipo de


imagem, em que os adultos podem pagar para assistir às crianças sendo
abusadas em tempo real. É ainda mais difícil de detectar, porque nenhum
arquivo contendo pistas circula e as plataformas são todas criptografadas.
Ao mesmo tempo em que a polícia e a tecnologia melhoram para encontrar
vítimas em fotos ou vídeos, outra ameaça surge.

"Há uma história famosa e muitas vezes é contada em relação a essa área
do crime. É a figura da jovem caminhando em uma praia cheia de estrelas
do mar. Ela está pegando as estrelas do mar e as colocando de volta no
mar e o cara diz a ela: "Menina, o que você está fazendo? Você nunca será
capaz de salvar todas essas estrelas do mar". E ela diz: 'Não, mas eu vou
salvar essa'. E é exatamente isso que estamos fazendo", diz Griffiths.

"Estamos salvando os que conseguimos salvar. E se alguma solução


mágica aparecer em algum ponto do futuro que salvará todos eles, para
impedir que isso aconteça, será maravilhoso. Mas enquanto isso, não
podemos simplesmente nos sentar e ignorar o que sabemos que está
acontecendo."

Paul Griffiths faz parte de uma pequena rede de pessoas que viajam pelo
mundo para reuniões e conferências sobre o que fazer com o grande
número de vídeos e imagens que circulam online.

Ele me disse para entrar em contato com Maggie Brennan, professora de


psicologia clínica forense da Universidade de Plymouth, que estuda material
de abuso sexual infantil há anos. Entre 2016 e 2018, ela vasculhou as
imagens de abuso infantil em um banco de dados da Interpol, para criar um
perfil de vítimas.

Ela encontrou um padrão assustador que sugeria que a idade do garoto no


vídeo que eu vi não é tão incomum.

"Existe uma proporção substancial - pequena, mas importante - de imagens


que retratam bebês e crianças pequenas. E encontramos um resultado
significativo em termos de associação entre formas muito extremas de
violência sexual e crianças muito pequenas".

Como o garoto no vídeo que recebi, a maioria das crianças no banco de


dados é branca - provavelmente um reflexo do fato de que as forças
policiais que contribuem com esse banco de dados são de países
majoritariamente brancos.

Brennan diz que há uma pressão constante para quantificar o número de


imagens ou vídeos existentes e o número de vítimas que estão sendo
exploradas sexualmente. Mas é impossível. Os bancos de dados contêm
apenas as imagens encontradas por meio de batidas policiais ou relatórios.
Quem sabe quantos estão circulando por aí?

Paul Griffiths diz que é preciso apenas uma pessoa para trazer um vídeo
das profundezas da dark web e divulgá-lo na população em geral.

"Cedo ou tarde, chega a alguém que não sabe como mantê-lo seguro e
oculto, ou não se importa. E eles o espalham mais amplamente. Pode levar
algumas horas e está por toda a internet."

Falei com um homem que cumpriu sete meses de prisão por visualizar
imagens de abuso infantil. Ele recebeu os arquivos pelo Skype durante um
encontro sexual online adulto. Ele abriu o primeiro arquivo, viu que era de
uma criança - e continuou abrindo todos os 20. Depois, tentou compartilhá-
los com outra pessoa. Eventualmente, o homem que enviou os arquivos
enviou-os a alguém que contou à polícia. Mas é um exemplo revelador da
facilidade com que arquivos como aquele para o qual fui enviado se
espalham, das profundezas da dark web, para plataformas como o Skype e
depois para os telefones das pessoas.

Apesar da falta de ação tomada no meu caso, a resposta policial do Reino


Unido às imagens de abuso sexual infantil é uma das mais robustas do
mundo.

O banco de dados de imagens de abuso infantil (CAID, na sigla em inglês)


registrou um enorme investimento nos últimos cinco anos. Quando os
detetives recebem o telefone ou laptop de um suspeito, eles podem
executar imagens nele, através de um software de ponta que verifica se as
imagens são novas ou já conhecidas pela polícia. Todas as forças policiais
estão ligadas e o banco de dados se comunica com outros ao redor do
mundo.

Nos anos 90, o Ministério do Interior realizou um estudo sobre a proliferação


de imagens impróprias de crianças. Havia menos de 10 mil imagens em
circulação na época. Agora, existem quase 14 milhões de imagens no
banco de dados do Reino Unido.

Os níveis de depravação em vídeos e imagens estão piorando, diz o chefe


de polícia Simon Bailey. Ele é o líder do Conselho Nacional de Polícia
Nacional nas investigações de proteção e abuso infantil há cinco anos.

Espero um personagem hostil quando vou entrevistá-lo em seu QG. O que


encontro é um homem exausto.

Imagem: Hello Emma/BBC

"Continua crescendo, crescendo e crescendo", diz ele. "E há um elemento


de 'esses números são tão grandes que simplesmente não podem estar
certos.' Bem, confie em mim, estão certos. E se eu tenho um
arrependimento significativo em relação à minha liderança e nossa resposta
a isso é que tivemos dificuldades de mostrar ao público a verdadeira escala
do que estamos enfrentando, os horrores disso. Eu gosto de pensar que a
maioria das pessoas ficaria horrorizada por esse tipo de abuso estar
ocorrendo."

No ano passado, Simon Bailey pediu um boicote a empresas de tecnologia,


como Google e Facebook, até investirem em tecnologia para filtrar e
bloquear essas imagens e vídeos. O público, inclusive eu, prestou pouca
atenção a isso.

No ano passado, os robôs que o Facebook implementou para examinar seu


serviço Messenger relataram 12 milhões de postagens contendo imagens
de abuso infantil ao Centro Nacional de Crianças Desaparecidas e
Exploradas, que administra o banco de dados dos EUA.
Por isso, os ativistas por proteção infantil criticam a decisão do Facebook de
começar a criptografar o Messenger nos próximos meses, porque isso
significa que a plataforma ficará efetivamente "obscura" e os agressores
poderão compartilhar material com impunidade.

Ele se tornará mais parecido com o WhatsApp, onde criptografia de ponta a


ponta significa que ninguém, exceto o remetente e o destinatário, sabe
alguma coisa sobre o que está em uma mensagem.

A criptografia do WhatsApp funciona porque seu telefone e o telefone da


pessoa para quem você está enviando mensagens geram os códigos e as
chaves de criptografia. Quando a mensagem sai do seu telefone, ela viaja
pelos servidores do WhatsApp - mas eles não têm as chaves para
descriptografar. A única maneira de os robôs ou a inteligência artificial
poderem rastrear a mensagem seria se ela fosse criptografada depois de
sair do telefone. Mas daria a policiais ou as próprias empresas de tecnologia
uma janela para nossas mensagens. O WhatsApp pensa que perderia
usuários como resultado.

A solução é fazer o rastreamento em nossos telefones.

Uma maneira de fazer isso seria fazer o download de um software com uma
lista de todos os códigos exclusivos de todas as imagens e vídeos de abuso
infantil conhecidos. Mas isso ainda suscitaria preocupações com
privacidade. As empresas de tecnologia poderiam mexer na lista de códigos
para incluir outros itens que não fossem imagens de abuso infantil -
censura, em outras palavras.

Portanto, seria melhor se os telefones pudessem executar um algoritmo


para gerar os próprios códigos, de forma completamente independente de
qualquer governo ou empresa de tecnologia. Esta é a parte complicada, no
entanto. Ninguém inventou esse algoritmo ainda.

Um especialista com quem falei disse o seguinte: "Eu não chamaria isso de
impossível, diria que hoje não sabemos como fazer". Seria necessário uma
quantidade enorme de pesquisa e desenvolvimento - mas provavelmente
poderia ser feito.

O fracasso da Big Tech em investir nisso irrita Simon Bailey.

"Eles detêm a chave de muito disso. O dever deles de cuidado com as


crianças, penso eu, eles se eximiram completamente disso."

"A reação é sempre: 'bem, estamos fazendo o nosso melhor.' Não, você não
está. Você precisa fazer mais. Você está ganhando bilhões de libras em
lucro. Invista. "

Existem grandes esperanças em relação ao White Harms Online do


governo britânico publicado em abril de 2019 - uma proposta radical de
legislação que levaria as empresas de tecnologia a serem responsáveis
pelos danos que causam. Ele propõe um novo regulador e os ativistas
esperam que o projeto de lei inclua relatórios obrigatórios de qualquer
abuso sexual infantil. Os resultados de uma consulta pública devem chegar
em breve.

No momento, as empresas de tecnologia escolhem o que nos dizer.


Ninguém sabe, por exemplo, quanto Facebook ou WhatsApp gastam em
proteção infantil. O Facebook diz que possui a melhor inteligência artificial
do mercado, tentando bloquear e filtrar mensagens. Mas a empresa não
revela como funciona ou quanto custa.

John Carr, que assessora governos sobre segurança infantil online, diz que
essa falta de transparência deve acabar.

"Eu trabalho com pessoas nessas empresas o tempo todo, elas concordam
comigo na maioria das coisas, se preocupam apaixonadamente em proteger
as crianças, mas não tomam as decisões. São seus chefes, normalmente
na Califórnia, que decidem o que acontece. Pessoas em altos cargos
nessas empresas precisam sentir o calor, precisam sentir que seus pés
estão sendo levados ao fogo ".

Pedi, claro, para falar com o WhatsApp. Eles dizem que não.

Em um dia de verão, finalmente consegui avançar na minha busca pelo


garoto no vídeo. O assistente de Simon Bailey me coloca em contato com
um policial sênior que abre algumas portas, e eu recebo uma ligação.

Disseram que o garoto está vivo. Ele é uma das minorias sortudas que
foram identificadas e resgatadas.

O vídeo que recebi é antigo, dos EUA. Já existem três versões no banco de
dados CAID do Reino Unido - quatro, com a minha versão. A polícia não
pode me dizer onde ele está ou qual é o nome dele. Mas eles me dizem que
o agressor está cumprindo uma longa pena de prisão. É a notícia que eu
estava esperando.

E estou feliz em deixar por isso mesmo. Há uma palavra que ficou em
mente ao longo dos meses que tentei descobrir mais sobre esse caso:
"revitimização". Cada vez que alguém assiste ou compartilha um vídeo de
uma criança sendo abusada, ela é revitimizada. E à medida que me
aproximo de encontrar o garoto, percebo que poderia acabar fazendo uma
ligação telefônica para dizer a ele, do nada, que vi o vídeo dele. Ele seria
lembrado do horror. Ele seria humilhado. Eu deveria apenas deixá-lo em
paz.

Mas eu ouvi sobre um grupo de campanha nos EUA composto por vítimas
(pessoas filmadas por agressores) que querem ser encontradas e ouvidas.

James Marsh, advogado que representa vítimas de abuso sexual de


crianças há 14 anos, liderou recentemente uma mudança na lei nos Estados
Unidos que dá às vítimas o direito a uma compensação mínima de US$ 3
mil de todos os condenados por assistir ou compartilhar um vídeo de seus
abusos.

Chama-se Lei de Assistência às Vítimas de Pornografia Infantil Amy, Vicky e


Andy de 2018, Leva o nome de três jovens vítimas que a apoiaram
escrevendo declarações para os tribunais.

"Só muito recentemente as vítimas se tornaram mais empoderadas para


recuperar esse espaço, tentando realmente afirmar que este não é um
crime sem vítimas, que essas não são fotos inofensivas e que têm vozes
que merecem ser ouvidas", ele diz.

Princípios voluntários

Um conjunto de "princípios voluntários" para a indústria de tecnologia,


projetado para combater a exploração e abuso sexual infantil online, foi
publicado pelos governos do Reino Unido, EUA, Austrália, Canadá e Nova
Zelândia, após consultas com seis empresas líderes de tecnologia.

Uma carta anexa reconheceu os esforços do setor, mas disse que "havia
muito mais a ser feito para fortalecer os esforços existentes". Acrescentou
que a iniciativa visa "impulsionar a ação coletiva".

Os princípios incluem a prevenção da disseminação de material sobre


abuso sexual infantil.

Recentemente, uma jornalista experiente o chamou para saber o que


aconteceu com um de seus clientes. Ela esperava ouvir que o abuso
envolvia fotos nuas. Quando ele contou a realidade do conteúdo desses
filmes - o estupro de uma criança pequena - ela ficou horrorizada e não
publicou os detalhes.

"Acho que, como jornalista, você está desligando seus leitores dessas
descrições gráficas. E, no entanto, de que outra forma você pode relatar
com precisão o que está acontecendo para provocar mudanças
significativas?"

Ele diz que seus clientes, à medida que envelhecem, ficam frustrados com
esse escrúpulo. "Esta é a nossa experiência vivida", dizem eles. "Enfrente
isso."

Pergunto-lhe se ele acha que o jovem Andy (do Amy, Vicky e Andy Act)
estaria disposto a conversar comigo. Ele concorda em nos conectar pelo
Facebook Messenger.

E, com isso, eu encontrei um garoto em um vídeo. Alguém que sofreu o


mesmo destino terrível que o garoto no vídeo que recebi.

O que quer que eu queira perguntar a esse garoto, posso perguntar a Andy.
Ele tinha um lugar seguro para dormir à noite? Ele conseguiu ficar seguro?

Andy tem uma voz calorosa. Ele está ansioso para conversar, sincero e
extremamente agradável. É estranho, mas nossa conversa não é miserável.

Ele me diz que está com 20 e poucos anos. Ele está fora da prisão há seis
meses, o mais longo período que ele consegue desde criança. Briga,
principalmente, e roubo. Quando ele era mais jovem, ele usava drogas -
metanfetamina, heroína e maconha. Ele está se saindo bem agora. E ele
tem dois filhos, que ele adora.

Mas ele vive em uma espécie de prisão.

"Sou uma pessoa chata. Realmente não


saio muito, fico em casa, moro apenas
com meus filhos, e é isso."

Imagem: Hello Emma/BBC


Andy vive com medo constante de que
alguém o reconheça de um dos vídeos
que o agressor fez dele, pois o abuso continuou até os 13 anos. Se alguém
o olha na rua, ele se preocupa.

Sua história começa com o divórcio de seus pais. Sua mãe queria uma
figura masculina em sua vida e, assim, quando Andy tinha cerca de sete
anos, ela o enviou para um programa para jovens. O "mentor" alocado pela
organização preparou Andy e sua família por alguns meses e levou Andy
em viagens a Las Vegas.

Andy não contou a ninguém quando o abuso sexual começou, porque ele
não queria incomodar sua mãe.

"Eu não sabia como minha mãe agiria. Eu não queria que ela se
envergonhasse porque algo tinha acontecido comigo. Eu não sabia se isso
era normal. Foi assim que ele fez parecer."

Como buscar ajuda

No Brasil, quem perceber alguma atitude suspeita de abuso infantil pode


fazer uma denúncia pelo Disque 100 ou acionar diretamente a polícia pelo
190.

A Secretaria Municipal da Educação de São Paulo criou o site do Núcleo de


Apoio e Acompanhamento para a Aprendizagem para que estudantes
possam ter atendimento psicológico à distância durante a quarentena. O
portal é interativo e o aluno poderá ter acesso, gratuitamente, a informações
e até conversar com psicólogos e psicopedagogos de diversas escolas da
cidade.

Dependendo da conversa com os especialistas, o estudante poderá


inclusive ser encaminhado para outras áreas e até mesmo fazer denúncias.

Quando Andy cresceu o suficiente, ele confrontou seu agressor, que logo
depois fugiu para o México. Então, um dia, o FBI apareceu na escola de
Andy e bateu na porta da sala de aula. O agressor enviou um vídeo para
alguém que não conhecia, que o denunciou. "E então eles me dizem que
existem centenas de milhares de vídeos e fotos minhas na web."

Até aquele momento, Andy não fazia ideia de que seu abuso fora
compartilhado, muito menos com milhares de pessoas. Mas, apesar das
notícias chocantes e da dificuldade de dizer a verdade à mãe, Andy
concordou em ajudar o FBI a atrair seu agressor de volta à fronteira.

"Nós o convencemos a voltar com uma festa de aniversário minha. Foram


três meses inteiros, até o meu aniversário. Conversei com ele por telefone,
como se nada estivesse errado. Ele me enviou alguns pacotes."

Os oficiais do FBI mostraram a Andy o caminho que eles achavam que o


agressor seguiria e o local da prisão planejada.

"Foi muito legal. Eles o pegaram a alguns quarteirões da casa da minha


avó, o puxaram e o prenderam."

Foi um dos melhores momentos da vida de Andy.

Como outras vítimas identificadas nos EUA, Andy recebe uma carta toda
vez que alguém é condenado por assistir ou compartilhar um vídeo dele. Ele
tem milhares delas.

Ele está fazendo o possível para reconstruir sua vida. Quando ele pode
pagar a terapia, as coisas são melhores. Seus advogados estão
trabalhando em alguns casos grandes, o que deve lhe trazer mais
compensação. Mas é difícil.

"Trabalhar é realmente difícil para mim. E não é porque sou preguiçoso ou


algo assim. É principalmente a mentalidade de não poder confiar em
alguém. Então, sou realmente antissocial."

Andy, como todas as vítimas, teve uma infelicidade de cair nas mãos de um
agressor. Se não tivesse acontecido isso, ele imagina que já seria o CEO
dos negócios de seu pai.

Ele está encontrando propósito e consolo em seu envolvimento com a lei de


Amy, Vicky e Andy. Os três jovens ativistas esperam encontrar-se
pessoalmente em breve. No futuro, Andy quer desistir do anonimato e
frequentar as escolas para ensinar as crianças a permanecerem seguras e
como contar a alguém se não estiverem seguras. Ele sente a obrigação de
fazer isso. "Sabe, eu quero que as pessoas conheçam minha história."

Eu nunca vou falar com o outro garoto que apareceu no vídeo. Espero que
ele esteja bem. Espero que ele possa reconstruir sua vida, ainda que lenta e
imperfeitamente, como Andy.

Consegui lhe dar um final feliz. Andy e o garotinho no vídeo que recebi
foram identificados e seus agressores estão na prisão.

Mas isso não acontece sempre. A maioria dos meninos e meninas nos
vídeos não será resgatada. E sem uma reforma radical na maneira como
gerenciamos a tecnologia e a privacidade, vídeos como o que eu vi
continuarão circulando e novas crianças serão abusadas para alimentar
essa demanda.

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