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CURSO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL

DE INSTRUTOR DE YOGA
Londrina-PR

O CAMINHO DO YOGA ATÉ O MEU


CORAÇÃO – REFLEXÕES
LIMITADAS DE UMA YOGI

Ana Paula Lopes Bogas Perez


Londrina-PR
ESPAÇO UNIPAZ YOGA
2020

_________________________________________

Obra Prima
_________________________________________

Contato: anapaula.perez@hotmail.com
Nirvāṇa Ṣaṭkaṁ

Não sou mente nem razão; não sou ego nem memória;
Não sou audição, nem paladar, nem olfato nem visão.
Não sou espaço nem terra; não sou fogo nem ar.
Minha natureza é consciência e plenitude. Sou Ser, sou Ser. 1.

Não sou o que se conhece como prāṇa nem os cinco alentos;


nem os sete elementos do corpo físico, nem os cinco kośas.
Não sou fala, nem mãos ou pés; nem sexo nem eliminação.
Minha natureza é consciência e plenitude. Sou Ser, sou Ser. 2.

Não tenho apego nem aversão; nem ambição, nem ilusão;


orgulho e inveja não são meus; não tenho deveres,
nem objetivos, nem desejos, nem busco a libertação.
Minha natureza é consciência e plenitude. Sou Ser, sou Ser. 3.

Não sou virtude nem ação errônea; nem alegria nem sofrimento;
nem mantras nem lugares sagrados; nem escrituras nem rituais;
não sou prazer nem o que produz prazer, nem o desfrutador.
Minha natureza é consciência e plenitude. Sou Ser, sou Ser. 4.

Não sou morte nem medo; não tenho classe social;


nem pai, nem mãe, nem nascimento são meus;
não tenho parentes nem amigos; nem mestre nem discípulos.
Minha natureza é consciência e plenitude. Sou Ser, sou Ser. 5.

Sou livre de pensamentos. Sou livre de estrutura e forma;


Estou conectado com os sentidos, pois permeio o existente.
Não sou apegado nem condicionado, nem [busco a] liberdade.
Minha natureza é consciência e plenitude. Sou Ser, sou Ser. 6.

Śrī Ādi Śaṅkarācārya


AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço a Deus que tem se manifestado em minha vida de


diversas formas, hoje, mais madura consigo entender seu proposito em minha vida, e
o seu amor infinito.
Agradecer sempre a minha família por estar ao meu lado.
Meu companheiro Alexandre, que me apoia incondicionalmente.
Meus amigos, fonte inesgotável de inspiração.
E não menos importante, agradecer a UNIPAZ-PR por realizar essa formação
na cidade de Londrina. A professora Rosi Gomes, por seus ensinamentos, paciência
e amorosidade. A Janet Duprat, por despertar a turma para um renascimento na senda
do Yoga. A Luara enquanto focalizadora, que cuidou com tanto carinho de tudo para
que estivéssemos confortáveis. Ao Gero, que estava por trás de todos os tramites
burocráticos.
E também aos professores e professoras que compartilharam seus
conhecimentos, Maria Tereza Balarotti (Teté), Deo Marco, Abílio, Marcela Arantes,
Jéssica Kumagai, Luara Moreno, Rosi Gomes, Janet Duprat.
E a turma 1 e 2 da Unipaz-PR de Londrina que se tornaram amigos e parceiros
de profissão na qual compartilhamos um objetivo em comum, difundir a filosofia do
Yoga.
Nasmastê.
ॐ भूभभुवस्वः ।
तत् सववतभवुरेण्यं ।
भर्गो दे वस्य धीमवि ।
वधयो यो नः प्रचोदयात् ॥

Om bhur bhuvaha svaha


Tat savitur varenyam
Bhargo devasya dhimahi
Dhiyo yonah prachodayat

Gayatri Mantra
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.............................................................................................5
2. O QUE É YOGA............................................................................................7
3. ANGAS.......................................................................................................13
3.1 YAMAS.......................................................................................................15
3.2 NIYAMAS...................................................................................................17
3.3 ASANAS.....................................................................................................19
3.4 PRANAYAMA.............................................................................................21
3.5 PRATYAHARA, DHARANA, DHYANA, SAMADHI.....................................23
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................25
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................26
1. INTRODUÇÃO

O primeiro pensamento relacionado a feitura dessa obra-prima é como colocar no


papel a experiência vivenciada por através do Yoga. Nessa introdução pretendo
justificar o caminho trilhado na obra-prima, quais foram minhas escolhas e como o
trabalho está estruturado.
Minha experiência com o Yoga, foi uma tentativa de fuga daquilo que eu estava
vivendo, longos anos imersa dentro de um ambiente universitário, acadêmico, com
péssimas experiências interpessoais nestes ambientes, na qual eu estava longe da
minha essência, acometida de doenças psicológicas e psicossomáticas, eu estava ao
meu limite. Foi quando em uma crise de ansiedade eu decidi que precisava me
acalmar e busquei no youtube por músicas para acalmar a mente, descendo na lista
encontrei alguns mantras e um deles foi o mais marcante para mim e aos sentimentos
ali presente, o Gayatri mantra, por isso coloquei no início ele. Eu não sabia o que
significava, era a interpretação da Deva Premal e todo dia no serviço eu colocava para
ouvir, numa playlist no youtube que ficava repetindo, e foi assim que o Yoga aparece
na minha vida, pelo Gayatri Mantra, eu tenho muito amor por ele, e toda vez que
escuto é uma emoção diferente.
Com o tempo comecei a estudar o que era yoga, e comecei a ir em algumas
práticas pelo Projeto Yoga no Parque, quando a oportunidade de fazer o curso
apareceu. Para mim parecia perfeito, uma coisa que eu estava adorando que
envolveria uma nova formação, porque eu estava tão cansada de Sociologia, eu só
queria correr disso tudo, e embarquei nessa sem pensar.
Só que as vezes essa veia sociológica ligada a questão de ser professora e tornar
tudo didático não sai de mim, e esse trabalho tem tudo a ver com isso, apesar de
todas as tentativas de fugir disso. Eu vejo um cenário ocidental onde as práticas do
Yoga são muito baseadas somente em ásanas, não por que o professor não conhece
as bases filosóficas, mas sim porque os alunos não possuem interesses, porque
quando eles pensam que se aprofundar em questões filosóficas do yoga, serão
direcionadas as religiosidades como já ouvi por aí “eu gosto de yoga, mas não gosto
dessa questão que envolve deuses (sic) ”.
Então essa minha proposta de obra-prima é sintetizar alguns conceitos das bases
filosóficas do Yoga. Não foi nada muito aprofundado, foi o que possível realizar dentro

5
desse contexto que estamos vivendo, mas a minha realização foi que eu fiz as pazes
comigo mesma, e descobri através dessa obra-prima, que o caminho que trilhei até
não necessariamente tem que ser apagado, mas sim os sentimentos ruins sobre
essas experiências, foi como uma catarse dentro do meu novo caminho.
Também a feitura dessa obra-prima que auxiliou a juntar os conceitos e teorias
aprendidos ao longo do curso com a prática, e uma maior compreensão de como essa
ferramenta de autoconhecimento pode desempenhar um papel em minha jornada.

Prathamah patalah
A Existência é Una. Somente o Conhecimento (Jñana) é eterno. Ele não
tem início nem fim. Não existe nada fora ele. A aparente diversidade do
mundo é resultante da limitação dos sentidos. Quando esta limitação
desaparece, apenas o Conhecimento, e somente ele, resplandece. 1.
SHIVA SAMHITA – Primeiro verso – tradução Pedro Kupfer.

6
4. O QUE É YOGA?
Yoga, pode ser definido de modo arcaico, como uma prática de introspecção
disciplinada e de concentração meditativa associada a ritos de sacrifício. Segundo
Feuerstein (2006), os quatros primeiros vedas1, textos sagrados do hinduísmo podem
encontrar práticas de Yoga.
Essas quatros coletâneas de hinos contém o conhecimento revelado,
ou ‘sobre-humano’ da civilização arcaica da Índia, na qual se fala o
sânscrito. Essa civilização é chamada de civilização védica ou, em
tempos mais recentes, civilização do Indo e do Sarasvatî. Os ritos dos
sacerdotes védicos tinham de ser cumpridos com perfeita exatidão e
exigiam do sacrificante a máxima concentração; por isso, os
depositários do conhecimento tinham de submeter-se a uma disciplina
mental e rigorosa (FEUERSTEIN, p. 63, 2006).

Vemos que, esses quatros primeiros vedas, mais tarde – cerca de dois mil anos
depois, daria origem aos Upanishads2, como uma tecnologia da consciência, como
pontua Feuerstein (2006), sendo essas as raízes do Yoga. Essa prática denominada
Yoga nos Upanishads, percorreram o seu desenvolvimento junto a um conjunto
imenso de práticas ligadas a explicações acerca da transcendência da condição
humana. A forma de transmissão deste conhecimento era a transmissão oral, em
sânscrito 3– paramparâ.
Considerando o desenvolvimento do Yoga, surgem inúmeras escolas que
representam variadas tradições, com modificações e reformulações, o que nos leva a
dizer que o Yoga não é homogêneo. As práticas e doutrinas acabam por variar
considerando a escola, tradição ou mestre – guru (san).
Assim podemos observar que,
Quando falamos do Yoga, estamos falando de uma multiplicidade e
caminhos e tendências dotadas de estruturas teóricas e contratantes
e as vexes até metas divergentes embora todas sejam por meios de
libertação (FEUERSTEIN, p.64, 2006).
Na linha do hinduísmo seis grandes escolas ganharam destaque: Râja-Yoga,
Hatha-Yoga, Jnâna-Yoga, Bhakti-Yoga, Karma-Yoga e o Mantra-Yoga. Segundo

1 Os quatro vedas são: Ṛg Veda, Yajur Veda, Sama Veda e Atharva Veda. Eles são divididos em três
seções: Karma Kanda, Upasana Kanda e Jñana Kanda. A primeira fala sobre as ações, a segunda
sobre as meditações e a última sobre o Conhecimento.
2 A palavra Upanishad é o autoconhecimento de um determinado assunto, o autoconhecimento, assim

como as palavras física e biologia são nomes que denotam assuntos específicos.
3 O sânscrito ou língua sânscrita (transcrito saṃskṛtam em IAST) é uma língua ancestral da região do

Nepal e da Índia. Embora seja uma língua morta, o sânscrito faz parte do conjunto das 23 línguas
oficiais da Índia, porque tem importante uso litúrgico no hinduísmo, budismo e jainismo.
7
Feuerstein (2006), devemos acrecentrar o Laya-Yoga e/ou Kundalinî-Yoga, que estão
intimamente ligados ao Hatha-Yoga, mas são mencionadas como independentes.
Podemos comparar o Yoga a uma roda de muitos raios, sendo que estes raios
representam as diversas escolas do Yoga, o aro simboliza as exigências morais
comuns a todos os tipos, o cubo a experiência do êxtase, onde o praticante transcende
não só a sua própria consciência limitada como também a existência cósmica do um
todo.

Figura 1. A roda do Yoga


Vemos na figura 1, que não importa o caminho a ser tomado, mas que o objetivo
seja a transcendência da consciência, e que, o que cerca essa prática tenha seja os
preceitos e disciplinas éticas, que na tradição do Hatha-yoga são os Yamas e Nyamas.
De acordo com Desikachar (2018) o Yoga pertence a seis sistemas
fundamentais do pensamento indiano, que são conhecidos como darshana4, sendo
que este significa ponto de vista, ou visão. Deste modo, o autor afirma que o Yoga foi
sistematizado como uma darshana especial por Patañjali5 no Yoga-Sutra, sendo o
trabalho mais significativo texto do Yoga.

Muitas interpretações para a palavra yoga nos foram legadas com o


passar dos séculos. Uma delas é “juntar”, “unir”. Outro significado é
‘amarrar, juntar os cordões da mente’ [...] outro significado para a
palavra yoga é “atingir o que era antes inatingível”. O ponto de partida
para esse pensamento é que há algo que desejamos e não somos
capazes de fazer hoje, quando encontramos os meios para

4 Os seis darshanas são: Yoga, nyaya, vaishesika, samkhya,mimamsa e vedanta.


5 O assunto Yoga-Sutras de Patañjali será tratado na próxima seção.
8
transformar esse desejo em ação, esse passo é o yoga
(DESIKACHAR, p.43-44, 2018).
Assim, podemos observar que não há um consenso do significado da palavra
Yoga, mas sim, uma pluralidade de significados que foram sendo desenvolvidas
através dos séculos junto ao próprio desenvolvimento das linhagens do Yoga. O que
é relevante, que se torna uma prática volta para atenção, onde pode ser trabalhado a
consciência para o desenvolvimento de um estado mental de presença, pois,
Desikachar (2018) observa que também está relacionado com ações “Yoga também
significa agir de maneira que toda nossa atenção esteja dirigida à atividade que
estamos desenvolvendo no momento (p.44, 2018) ”.
Portanto, a consciência que é colocada no desenrolar de cada ação no
momento, onde podemos fazer um link com um conceito citado algumas linhas acima,
onde diz que o significado do Yoga é amarrar os cordões da mente, que assim, pode
está diretamente ligado ao direcionamento da atenção para que seja possível
desenvolver uma tarefa ou uma ação, e neste caso, trazendo para a nossa realidade,
uma prática de yoga onde colocamos uma atenção junto a uma intenção para que
possa ser desenvolvidos a prática física.
As contribuições do Yoga, se dão em vários aspectos: físico, mental, emocional
e espiritual, sendo este um dos mais importantes do desenvolvimento desse método
na Índia. Por estar sendo desenvolvido praticamente junto com o desenvolvimento da
humanidade6 junto as primeiras civilizações a questão espiritual torna-se uma das
mais versátil, pois, como observamos,
É difícil descobrir algum problema ou solução metafisica que já não
tenha sido concebido pelos sábios e pânditas da índia antiga ou
medieval os ‘tecnólogos sagrados’ da índia capitaram e analisaram
todo o espectro das possibilidades psico-espirituais desde os estados
paranormais até a iluminação permanente (chamada sahaja-samâdhi
ou êxtase espontâneo) passando pela consciência unitiva da
realização temporária de Deus (FEUERSTEIN, p. 26, 2006).
De acordo com Iyengar (2016), o pensamento indiano, na qual o Yoga está
inserido, compõe-se onde tudo é permeado pelo Espírito Universal Supremo
(Paramatma ou Deus), onde o espírito humano individual (jivatma) é um elemento,

6
Estudos arqueológicos apontam que há vestígios de Yoga com ilustrações de postura em uma
civilização antiga no vale do rio indo (hoje a região do Paquistão), datada de 6500 a.C, conhecida como
sociedade Harappeana ou Indus-Saraswati.

9
assim, se denomina Yoga, porque instrui os caminhos pelo quais pode se unir o
espírito humano individual ao Espírito Universal Supremo, e assim assegurar a
libertação (moksha).

Assim como um diamante bem lapidado tem muitas facetas e cada


uma reflete uma tonalidade diferente, a palavra yoga também encerra
diversas facetas, cada uma refletindo um matiz de significado e
revelando aspectos distintos de toda a gama de esforços humanos
para alcançar a paz e felicidade interior (IYENGAR, p.24, 2016).
O desenvolvimento de vários métodos e estilos de vida por esse conjunto de
filosofia ligados com a espiritualidade na Índia em um período de cinco milênios
direciona a um propósito similar, ajudar o ser humano a “romper com os hábitos da
consciência ordinária e realizar a nossa a identidade (ou pelo menos a nossa união
com a realidade perene (FEUERSTEIN, p. 26, 2006) ”. Tendo assim, uma meta de
libertação espiritual e do condicionamento convencional, sendo também este a
libertação do sofrimento, que é um fruto do condicionamento inconsciente.
Desta forma podemos observar que embora o Yoga esteja ligado ao
desenvolvimento do pensamento indiano, ele tem um conteúdo universal, que utiliza
de ferramentas para a realização de uma prática, com direcionamentos éticos e ações
dotada de intenção ligadas a um propósito que a libertação do sofrimento, podendo
ele ser físico, mental, emocional ou espiritual.
Em relação a pergunta “o que é yoga? ” e os textos sagrados que fundamenta
a filosofia do yoga, Iyengar (2016) em seu livro ‘Luz sobre o Yoga’, explica que o
Bhagavad-Gita7 mostra diferentes explicações para o que é o Yoga e traz uma ênfase
ao Karma yoga – o yoga por meio da ação. Já Feuerstein (2006), afirma que se deve
estudar o Bhagavad-Gita, pois se trata de dos textos antigos a tratar explicitamente
do Yoga, assim, por meio do estudo e prática yogi, se reafirma antigas verdades.
As epopeias antigas do mundo hindu, podem ser interpretadas em duas
linhagens de entendimento, a primeira como uma fonte inesgotável de histórias
instrutivas, com heróis, vilões, ascetas e yogins, que tem todas ações e situações que
já aconteceram e que poderá acontecer, onde destas podem tirar um entendimento

7 Bhagavad-Gita (Cântico do Senhor) é um diálogo entre Krishna – o Deus Vishnu encarnado, e seu
discípulo Arjuna – príncipe dos pândavas. Sendo um episódio do grande épico Mahâbhârata. No
ocidente se tornou muito popular, com a disseminação do seu texto por mestres yoguis, como
Paramahansa Yogananda, Swami Dayananda Saraswati, Mahatma Gandhi, entre outros, além de
figuras ocidentais famosas como: Hegel, Schopenhauer, Walt Whitman, Huxley, Rudolf Steiner e
Annine Besant. No Brasil, ficou popularmente conhecido pela canção ‘Gita’ composta por Raul Seixas
e Paulo Coelho.
10
e/ou um ensinamento, e a segunda como uma composição de crenças e costumes de
uma Era histórica de desenvolvimento intelectual do hinduísmo, cheia de simbolismos,
pois, como vemos,
Do ponto de vista histórico, o Bhagavad-Gita pode ser compreendido
como uma grande tentativa de integrar as diversas linhas de
pensamento espiritual que predominavam dentro do Hinduísmo na Era
Épica. Faz uma mediação entre o ritualismo sacrificial do sacerdócio
ortodoxo e os ensinamentos inovados que encontramos nas doutrinas
esotéricas dos primeiros Upanishds, e engloba também elementos das
tradições budista e jaina. (FEUERSTEIN, p. 243, 2006).

Como o centro da mensagem do Bhagavad-Gita dada por Krishna ao seu


discípulo é o equilíbrio entre a atividade religiosa e ética no mundo, onde o Yoga se
compõe por: “a sabedoria na ação, viver em destreza em meios às atividades, com
harmonia e moderação (IYENGAR, p.24, 2016) ”. Assim, deixa-se claro que, para
alcançar a paz, felicidade, ou a iluminação, não é necessária uma vida de renúncias
onde essa, “está ligada ao ideal hindu de ‘ação sem ação’ ou inação na ação
(naishkarma-karman), fundamento do Karma-Yoga (FEUERSTEIN, p. 243, 2006) ”.
Em questões sobre a sistematicidade do Yoga, isso não é colocado no
Bhagavad-Gita, mas os principais elementos estão expostos no texto. Assim,
Para Krishna, a obra yogue consiste essencialmente, na conformação
total da vida cotidiana da pessoa ao Ser Supremo. Tudo o que se faz
deve ser feito à luz da divindade. A vida inteira deve se transformar-se
num Yoga contínuo [...] com a mente mergulhada no Supremo,
permanecem ativos no mundo, levados pelo puto desejo de promover
o bem-estar de todos os seres (FEUERSTEIN, p. 245, 2006).

Deste modo, o Yoga no Bhagavad-Gita traz um caminho de busca pela


iluminação, com disciplina espiritual - sendo este o Karma-Yoga. A contribuição do
Bhagavad-Gita para o legado do Yoga está relacionada à disciplina e a prática
espiritual, bem como um estado de comunhão com o divino e de desconexão com as
causas de sofrimento terrenas, mas sem abdicar de suas obrigações que essa
materialidade exige.
Das várias linhas de Yoga do hinduísmo encontrar-se o Hatha-yoga, essa
linhagem é uma das mais difundidas no ocidente. Segundo Hermógenes (2019), essa
linhagem é a antítese do ascetismo praticado a séculos atrás,
A sabedoria hindu, fundamento filosófico da Hatha-yoga, ensina que
espírito e corpo não são mais que aspectos diferentes de uma mesma
unidade essencial; por isso, não é o corpo menos digno de cuidados
e reverencia (HERMOGENES, p. 34, 2019).
11
O termo Hatha é composto por HA e THA, Ha significa Sol e Tha significa Lua.
São símbolos da natureza e de dois polos de energias opostas, sendo assim o
equilíbrio e essa interação que mantém a terra em funcionamento.
Assim, essa tradição está inserida dentro do Yoga produzido na era medieval,
onde o objetivo supremo é como os desenvolvidos nessa época a transcendência da
consciência egóica, o realizar do Si mesmo junto a realidade divina, onde
A tecnologia psicoespirutal do Hatha-Yoga gira especialmente em
torno do desenvolvimento do potencial do corpo, para que este seja
capaz de suportar a forca e o peso da realização transcendente
(FEUERESTEIN, p. 66, 2006).
Assim, as técnicas desenvolvidas no Hatha-Yoga foram criadas para facilitar a
manifestação da realidade suprema no corpo e na mente humana, Ainda Feuerstein
(2006) diz que, “ o Hatha-yoga expressa o ideal do Tantra, que é o do viver no mundo
a partir da plenitude da realização do si mesmo e não fugir da vida para chegar à
iluminação (p. 66, 2006). De acordo com tradições dizem que o deus Shiva 8, que em
um gesto bondoso passou os ensinamentos do Hatha-yoga a Deusa Parvati9.
Essa conjunção sol e lua na composição do nome Hatha-Yoga, é também
explicado por os aspectos dinâmicos entre corpo e mente. A força vital – prana, está
polarizada no eixo da coluna vertebral, assim, o polo dinâmico é representado pela
Shakti e se localiza na base da coluna e o polo estático é representado por Shiva, que
se localiza no topo da cabeça, sendo o objetivo final do yogi unir Shakti a Shiva.
Para o Hatha-Yoga, existe um sistema de desenvolvimento para que aconteça
o objetivo final da prática do yogi, sendo ligado aos fundamentos filosóficos do Yoga,
veremos ao desenvolvimento da obra-prima, os angas do Yoga que estão no Yoga-
Sutra de Patañjali.

8
Shiva é um dos principais deuses do hinduísmo, que juntamente com Brahma e Vishnu formam
trindade do hinduísmo. É chamado de "o Destruidor"' ou "o Transformador". Conhecido também como
o patrono do Yoga.
9 Parvati ou Mahadevi é a Deusa Mãe no Hinduísmo e, nominalmente, a segunda consorte de Shiva. É

a mãe de Ganesha e de Escanda. Ela é considerada como a Divina Shakti - a encarnação da energia
total do Universo.
12
ānando brahmeti vyajānāt | ānandāddhyeva 
 khalvimāni bhūtāni
jāyante | ānandena jātāni 
 jīvanti | ānandaṁ prayantyabhisaṁviśantīti ||
Conheceu assim, o Ilimitado como Felicidade, pois da Felicidade
todos os seres vivos surgem. Tendo nascido da Felicidade, são por ela
sustentados,
 movem-se [vivem] e absorvem-se na Felicidade.
Taittirīyopaniṣad, III:6.1

Visões do Yoga – Pedro Kupfer.

3. OS ANGAS DO YOGA – O QUE SÃO?


Para dar continuidade ao desenvolvimento desta obra-prima, vamos estudar os
preceitos éticos e morais do Yoga, deste modo, veremos brevemente o que são os
Yoga-Sutra desenvolvido por Patañjali; quem foi Patañjali e sua importância para a
filosofia do Yoga; veremos também os angas do Yoga, ou seja, as partes do Yoga, e
como são importantes para o desenvolvimento do Yogi para o objetivo maior dentro
do Yoga.

Yoga-Sutras10 são uma coleção de 196 sutras indianos sobre a teoria e a


prática do yoga. Não se sabe ao certo sua data, mas aproximam por volta do século
III a.C por Patañjali, que sintetizou e organizou o conhecimento sobre Yoga a partir de
tradições mais antigas. Logo, foi um compilado de aforismo reunido em um só texto,
assim,
Sua composição é, em princípio, um tratado sistemático que cuida de
definir os elementos mais importantes da teoria e da prática do Yoga.
Já houve um tempo em que a escola de Patañjali era muitíssimo
influente, como se pode deduzir das muitas referências ao Yoga-Sutra
e das muitas críticas a ele dirigidas nos textos de outros sistemas
filosóficos (FEUERSTEIN, p. 273, 2006).
Há muito mistério na figura de Patañjali e de quem foi esse mestre que compilou
uma série de ensinamento em aforismos. Não se sabe ao certo quem foi, e quando
viveu, há somente especulações em torno dessa figura mítica e tão importante para o
desenvolvimento do Yoga, onde deu à essa tradição a forma clássica, chamado

10 Sutra significa corda ou fio, deste modo, faz referência ao compilado de ensinamentos que alusiva
como um colar.
13
posteriormente por estudiosos, de Yoga clássico a linhagem seguida pelos seguidores
de Patañjali. A grande maioria das linhagens de yoga praticadas hoje em dia, seguem
os ensinamentos do Yoga-Sutra de Patañjali, como por exemplo o Hatha-yoga.
Vemos na figura abaixo (figura 2) a representação mítica de Patañjali,
representado por ser metade homem metade serpente com quatro braços cujas mãos
seguram os atributos do Deus Vishnu11: a concha e o disco e fazem o gesto da
oferenda, añjali-mudrá, abençoando aqueles que se aproximam dele procurando a
verdade do Yoga. As cabeças de serpentes simbolizam a infinidade ou a onipresença
de Vishnu, sua figura é associada a sabedoria, e mantras, danças e cânticos são
oferecidos a sua figura antes de rituais, cerimonias, aulas, etc.

(Figura 2. Representação de Patañjali)


Pode-se compreender que o Yoga-Sutra tenha um caráter universal em relação
a outros textos filosóficos que compõe o Yoga, pois, mantém o foco na mente, onde
fala quais são as qualidades, como influenciá-la, assim, o Yoga torna-se uma
habilidade de direcionar a mente sem distrações ou interrupções, temos uma
observação sobre esse caráter universal, vejamos que,
Outros textos de yoga referem-se a Deus, consciência e outros
conceitos que não são necessariamente aceitos ou relevantes para
todas as filosofias e religiões. Se eu entendo yoga como um caminho
acessível para todo ser humano, então é perfeitamente natural que
minha análise tenha como base o Yoga-sutra, precisamente porque
questões sobre as qualidades da mente são universais. Falar em
termos de Deus ou em um ser supremo muitas vezes perturba as

11Vishnu é um dos deuses principais do hinduísmo, responsável pela sustentação do Universo.


Juntamente com Shiva e Brahma, forma a trimúrti, a trindade sagrada do hinduísmo.
14
pessoas [...] Yoga-Sutra de Patañjali é excepcionalmente aberto, e é
isso que torna tão profundo (DESIKACHAR, p.47, 2018).

Brevemente podemos apontar sobre a citação acima, que, trabalhar o próprio


Yoga-Sutra de Patañjali em nossas aulas seja deveras interessante, pois, não
sabemos quais as crenças e ligações dos nossos alunos/as às religiões e a
religiosidade em geral. Como se trata de assuntos que se aprofundam em questões
da mente humana, suas agitações e como obter o controle de tal, passar
didaticamente aos alunos e estudantes da filosofia do Yoga seja uma maneira de
despertar um maior interesse ao aprofundamento do conhecimento até aqui produzido
do que somente a prática de ásanas.

3.1 YAMAS
Como vimos anteriormente, em Yoga-Sutras, o sábio Patañjali sintetizou em
aforismos meios apropriados para alcançar a libertação “kaivalya-pada” como
colocado por ele na última parte. Sendo que, ele enumera os meios como oito
etapas/membros ou angas (sân) do yoga, sendo eles:
1.Yama (mandamentos morais universais);
2.Niyama (autopurificação por meio das disciplinas);
3. Ásana (posturas);
4. Pranayama (controle rítmico da respiração);
5. pratyahara (recolhimento dos sentidos);
6. dharana (concentração);
7. dhyana (meditação);
8. Samadhi (êxtase ou estado de supraconsciência gerado pela meditação profunda).
Os três primeiros membros constituem na busca exterior, como por exemplo,
Yama e Niyama controlam as emoções, a disciplina moral das nossas atitudes frente
as situações. Os ásanas conservam um corpo saudável, forte e harmonizado com a
natureza. Já pranayama e pratyahara servem como ensinamento para o controle da
respiração e controle a mente, e liberar os sentidos frente à mundo exterior, já que
ambos são considerados como a busca interior. Dharana, dhyana e samadhi são os
membros que irão conduzir às profundezas de nossa alma, ao encontro do divino, o
Antaratma.

15
Os fundamentos do yoga se baseiam na ética universal, portanto, no Yoga-
Sutra o primeiro membro não se trata de posturas físicas nem de meditação e sim da
disciplina moral – Yama. Sendo composto por cinco comportamentos que devem ser
evitados, sendo:
1. Ahimsa: não-violência; não ferir, agredir ou matar qualquer ser;
2. Sathya: verdade/veracidade;
3. Asteya: não roubar;
4. Brahmacharya: controle sexual apropriado;
5.Aparigraha: não cobiçar, desapego.
Essas são diretrizes de comportamentos para as bases de várias religiões,
como as de origens judaico-cristã, mulçumanas, africanas, entre outras. Sua aplicação
à vida, devem ser colocadas em prática independente de lugar, tempo, circunstância
ou de posição social, pois considera-se que a integridade moral é um requisito
essencial para a prática do Yoga.
O princípio da não-violência – Ahimsa, tem como preceito a não praticar
violência em pensamentos e ações,
É mais do que um mandamento negativo para não matar, tem um
sentido positivo mais amplo, de amor. [...] a violência surge do temor,
da fraqueza, da ignorância ou da inquietação. Para deter a violência,
o mais importante é libertar-se do temor. A fim de se obter esta
liberdade, é preciso mudar o modo de ver a vida e reorientar a mente
(IYENGAR, p. 36, 2016).

Podemos observar que esse mandamento pode ser direcionado como um


princípio de cuidado, de gentileza e atenção com nós mesmo e com os outros, e em
cada situação, adotar uma atitude refletida sobre as ações.
Satya, o segundo Yama no Yoga-Sutra, que significa verdade, veracidade,
honestidade. Dizer a verdade, praticar a verdade mesmo que ela não seja confortável
as outras pessoas, porém deve ser considerado a maneira de dizer essa verdade para
que não machucarmos o outro, Desikachar (2018) diz que a verdade não deve estar
em conflito com o Ahimsa, e que se for machucar e causar dano a outro indivíduo não
devemos dizer nada.
O não roubar – Asteya, está ligado ao Ahimsa, pois o ato de se apropriar de
coisas sem autorização do proprietário é um ato de violência, porém, não se resume
somente a objetos físicos, mas também a questões relacionados ao ‘ser’, pois, nesse

16
sentido temos o fundamento de não acumular bens e sim adorar ao criador, junto a
libertação dos desejos terrenos permite ao yogi o afastamento das tentações.
Brahmacharya significa uma vida dedica ao celibato ao estudo religioso, o que
poderia considerar como um Yama controverso em vários contextos, principalmente
no ocidente, pois, são poucos casos de indivíduos que abandonam sua vida, com
família e emprego para dedicar-se integralmente a qualquer linha religiosa – isso
sendo mais comum em contextos hindu e budista. Porém, deve se aplicar o
Brahmacharya a nossa realidade de praticante de yoga, “isso não significa que a
filosofia do yoga é destinada apenas aos celibatários [...] não é necessário
permanecer solteiro e sem-teto (IYENGAR, p.39. 2016) ”. Neste fundamento, Patañjali
da ênfase a continência do corpo, da fala e da mente, direcionando um
comportamento responsável com relação as atitudes e objetivo.
Aparigraha - não-cobiçar ou desapego, é o último Yama defino como o cultivo
a simplicidade voluntária, segundo Iyengar (2016) trata-se de uma outra face do
Asteya, “assim como não se deve adquirir coisas que não sejam realmente
indispensáveis, tampouco se deve acumular ou colecionar coisas que não sejam
imediatamente necessárias (IYENGAR, p. 40, 2016) ”.
Os Yamas como vimos são o caminho moral para que um yogi possa seguir
dentro da ética do Yoga, assim, quando mais se pratica cada Yama, mas fortalecido
no caminho do Yoga se torna. Podemos observar também em relação ao Yoga-Sutra
que os Yamas são direcionamento para modificar a consciência em relação ao que
degrada o indivíduo, como caos, violência, falsidade, roubo, desperdício e cobiça,
assim praticando os Yamas o yogi se afasta do que ele próprio poderia produzir e se
aproxima de um caminho de bem-aventurança.

3.2 NIYAMAS
Os Niyamas se referem as normas de condutas da disciplina individual, já que os
Yamas são normas universais. Os cincos Niyamas definido no Yoga-Sutra por
Patanjali são:
1. Saucha (pureza);
2. Samtosha (contentamento);
3. Tapas (austeridade);
4. Svadhyaya (estudo);

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5. Ishvara-pranidhana (devoção ao Senhor);
A pureza – Saucha o primeiro Niyama, é uma das principais metáforas da
espiritualidade Yogi, como afirma Feuerstein (2006), pois, podemos distinguir a
limpeza interna da externa, “ a primeira se realiza por meios como banhos e
alimentação adequada, e a segunda é fruto de instrumento de meditação e
concentração (p.308, 2006) ”. Podemos considerar que a limpeza do corpo e da
mente também acontece com a prática de Ásanas e de Pranayamas que também são
angas do Yoga-Sutra.
Samtosha é o contentamento, sendo a prática e a modéstia de estamos contentes
com o que temos, aceitar o que nos é dado e oferecido. Uma mente descontente não
persevera na concentração, pois contentamento e tranquilidade são estados mentais,
portanto, é uma virtude a ser cultivada pelo yogi.
Tapas é o Niyama relacionado a ascese, disciplina e austeridade, significa um
esforço sob todas as circunstancia para a consecução de um objetivo, sendo que o
objetivo de um yogi é a libertação, o estado de êxtase, terá uma prática voltada a
desenvolvimento do autoconhecimento com disciplina ao que coloca em seu corpo e
sua mente. De acordo com o Yoga-Sutra, o produto dessa disciplina é o
aperfeiçoamento corporal, da mente e do espírito.
O quarto Niyama é svadhyaya, que significa o auto estudo, estudar-se, e não
somente a compreensão intelectual e sim uma autoanálise de suas atitudes mentais
e físicas, com o auxílio dos textos sagrados, pois, “quando progredimos em nossa
autoanalise, gradualmente, encontramos um elo com as leis divinas e com os profetas
que as revelaram (DESIKACHAR, p. 163, 2018) ”.
O quinto e último Niyama é Ishvara-pranidhana que significa a dedicação de
nossos atos a vontade do Senhor. Nesse Niyama cabe considerar que alguns
praticantes de yoga ao se deparar com questões relacionadas a uma devoção a Deus,
podem se sentir acuados, pois, pensam que pode haver uma prática de Yoga que não
envolve religiosidade. Entretanto, cabe questionar o dualismo das religiões judaico-
cristã, assim, a devoção proposta desde o Yoga clássico é a devoção ao Ser
transcendente, que “para o indivíduo não iluminado, é uma realidade, e uma forca
objetiva, mas que no ato de iluminação, é percebido como idêntico ao Si Mesmo
transcendente do yogin (FEUERESTEIN, p. 310, 2006) ”.

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Assim, os Nyamas em suas cinco formas, estão ligados aos esforços pessoais do
Yogi atingir o seu objetivo final, a auto realização em uma prática com bases de
disciplinas, ética morais sobre o si mesmo. Pensando em termos filosóficos, são
controles de emoções que dominam a personalidade egóica com o controle de ações
e emoções.

3.3 ÁSANAS

O terceiro anga do Yoga, segundo o Yoga-Sutra de Patañjali é ásanas. Os


ásanas levam os esforços de um praticante de Yoga ao nível corporal, mas não
somente. Muitos alunos buscam o yoga, pelo que é visto que são posturas e uma
prática com movimentos corporais.
Ásanas traz firmeza, saúde e leveza aos membros. Uma postura
estável e agradável confere equilibro mental e evita a inconstância da
mente. Os ásanas não são meros exercícios de ginastica, são
posturas [...] com a prática, a pessoa desenvolve agilidade, equilibro
resistência e grande vitalidade. (IYENGAR, p. 44, 2016).

Conhecemos que no Yoga-Sutra proposta por Patañjali associarmos o ásanas


à posição firme e confortável -sthira sukham ásanam, porém, a prática de ásanas é
composta em conjunto com técnicas respiratórias, os pranayamas, uma ação mental,
contrações que são os bandhas e mudrás que são gestos.
O desenvolvimento de ásanas dentro da prática de yoga são encontradas em
textos mais recentes datados com a Era medieval junto ao surgimento do Hatha-Yoga,
entre outras linhas que surgem junto ao Tantra-Yoga. Em referências mais antigas,
como o Yoga Clássico proposto por Patañjali no século III a.C, vemos que as
referências de ásanas tratava de posturas internas relacionadas com meditação, e
ações da mente, como transcendência.
As posturas mais citadas eram posturas sentadas para meditação, e de ações no
corpo sutil do praticante, porém,
Quando surgiu o Hatha-Yoga que elevou a utilização dos ásanas
dentro do Yoga à um patamar inédito, ampliando a diversidade de
opções, ao codificar trinta e duas posições no Geranda Samhita,
dando maior ênfase às técnicas corporais, influenciando grande parte
das escolas de Yoga posteriores. Essa influência pode ser verificada
consultando os shastras anteriores e posteriores a este período. Esse

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processo prosseguiu até os dias de hoje, o que permitiu chegar ao
grande número de técnicas codificadas (TACCOLINI, p. 10, 2004).

Há uma gama de tipos de ásanas com suas variações e adaptações, podendo ser
usadas levando em conta cada estrutura biológica e características especificas,
porém, o seu objetivo maior dentro dos angas do Yoga é treinar a disciplina da mente
junto ao corpo, pois este é um instrumento de realização.
A nomenclatura dos ásanas são significativos e evolutivos com o desenvolvimento
dos ásanas, como vemos na figura 3, elaborei um sequência de ásanas para ilustrar
os nomes: tadasana – postura da montanha; b) vrikshasana – postura da arvore; c)
virabhadrasana II– postura do herói/ guerreiro II; d) pashimottanasana- postura da
pinça; e) padmasana – postura da lótus; f) Adho Mukha shivanasana – cachorro de
cabeça para baixo; g)ardha Matsyendrasana –postura da torção do sábio matsyendra;
h) sarvangasana – postura da vela; i) shavasana – postura do cadáver.
Vemos que os nomes variam em nomes de animais, plantas, sábios importantes
para o yoga, seres míticos ligados ao panteão hindu, e algumas posturas, conforme a
evolução da prática ao longo do século, levam o nome da parte do corpo que está se
movendo os alcançando, como por exemplo Janushirshasana – postura da cabeça no
joelho.

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Ao praticar os ásanas o yogi reproduz a forma que se assemelha. Além dessa
questão ligada a natureza, há categorias dos ásanas como: posturas em pé,
estabilizações, abertura de quadril, torções, extensões flexão lateral, flexão para
frente, equilíbrios e invertidas, que servem para trabalhar uma série de sistemas
corporais físicos e também ligado ao corpo energético12.

3.4 PRANAYAMA

Prana palavra sânscrito significa 'força vital' ou 'energia vital', Ayama significa
‘extensão’ ou ‘expansão’, assim, Pranayama significa controle da respiração.

12 Os corpos sutis são locais onde moram, além do próprio corpo físico, a nossa mente, alma e
espírito, e podem ser trabalhados pela prática do Yoga. A menção às estruturas sutis do ser humano é
encontrada nos Tantras, filosofia que traz a descrição e a constituição dos cinco Koshas, e as outras
estruturas sutis, como o Prana, os Nadis e os Chakras.

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Portanto, é um método pelo qual o yogi procura influenciar a energia dentro do corpo
para o controle dos sentidos, e através desse controle da respiração associando a
concentração o yogi redireciona a força-vital,
Em geral é dirigida para a cabeça ou mais precisamente, para os
centros energéticos do cérebro [...] o prana é o veículo da ascensão
da atenção dentro do corpo, da concentra dessa atenção no eixo do
corpo até chegar ao cérebro (FEUERSTEIN, p. 331, 2006).

Desta maneira, afirma-se que nosso estado mental está ligado a qualidade do
prana que temos dentro de nós, a qualidade da respiração influência o estado mental,
conforme influenciamos pela respiração o fluxo de prana. O ritmo da respiração
fortalece o sistema respiratório, acalma o sistema nervoso e controla a ansiedade.
Algumas técnicas simples de Pranayamas:
Respiração completa: Sente em postura fácil e confortável com as pernas
cruzadas, mantenha a coluna e pescoço ereto. Exale todo o ar, usando o abdômen
para auxiliar. Inale profundamente, puxando o ar pela expansão do abdômen.
Mantenha inalando até preencher de ar a região superior do pulmão e a região da
garganta. Retenha por alguns segundos, e observe para manter o rosto relaxado.
Exale lentamente, primeiro o ar da parte inferior, depois superior dos pulmões e
finalmente o ar que estiver na região da garganta. Contraia o abdômen até forçar todo
o ar para fora. Observação: com o tempo de prática, vá aumentando gradualmente o
tempo de cada fase de inspiração - retenção - expiração, e mantenha o ciclo de
maneira natural.
Bhramari-Pranayama: Sente em postura fácil e confortável com as pernas
cruzadas, mantenha a coluna e pescoço ereto. Faça uma inspiração profunda, e exale
todo o ar dos pulmões, concentre em contrair os músculos abdominais para expulsar
todo ar. Inale pelo do nariz fazendo um som de zunido, como uma abelha. Faça uma
retenção de segundos pelo tempo que se sentir confortável, mantenha a concentração
da energia vital do ar no plexo solar - Chakra Manipura. Faça uma exalação pelo nariz,
fazendo um som de zumbido. Observações: com o tempo de prática, vá aumentando
gradualmente o tempo de cada fase de inspiração - retenção - expiração, e mantenha
o ciclo de maneira natural. E, o zumbido é o som produzido pelo ar passando entre as
cordas vocais.

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3.5 PRATYAHARA, DHARANA, DHYANA, SAMADHI
O próximo anga é Pratyahara, sendo o quinto membro do Yoga, segundo
Patañjali. A palavra ahara significa ‘nutrição’ assim, pratyahara é afastar-se daquilo
que nutre os sentidos. Essa etapa funciona como um elo entre os aspectos externos
do yoga (Yama, Niyama, ásana e pránáyáma) e o interno (dháraná, dhyána e
samádhi).
Nessa fase, os sentidos do yogi devem ser sessados pelos estímulos externos,
para começar a observação total da mente pelo ser, “em pratyahara, é como se as
coisas estivessem espalhadas com todos os seus atrativos diante dos nossos
sentidos, mas fossem ignoradas (DESIKACHAR, p.172, 2018).
Dharana, é o sexto anga do Yoga-Sutra, onde o corpo passou pelo processo
dos ásana, a mente refinada pelo pranayama, os sentidos domados pelo pratyahara,
chega a concentração em um único ponto, mantendo a atenção em uma direção, “pois
a mente é um instrumento que classifica, julga e coordena as impressões do mundo
exterior, assim como as que surgem dentro do indivíduo por isso é preciso pacificar a
mente para atingir esse estado de completa absorção (IYENGAR, p.52, 2016) ”.
Dhyana é o sétimo anga do Yoga-Sutra e se refere a meditação, nesta etapa
de rigoroso técnica de concentração que vai se refinando com o tempo e desligando
dos sentidos, das coisas exteriores. O objetivo é de esvaziar a mente sem perder o
estado de alerta, diferente de pegar no sono, que faz o indivíduo chegar a um estado
letárgico, a meditação faz com que o yogi permaneça em um estado de alerta, esse é
o paradoxo da meditação, permanecer alerta, mas desligados dos estímulos e
sentidos, mas com a mente concentrada.
Samadhi é o oitavo e último anga do Yoga-Sutra, no fim desse caminho, no
ápice da meditação ele encontra o estado de Samadhi onde o corpo e os sentidos
estão em repouso, mas a mente encontra seu objeto de meditação e se funde com
ele, “no momento em que o samadhi ocorre, nada mais existe, nada nos separa do
objeto da nossa escolha, pelo contrário, nos misturamos e nos tornamos uma unidade
(DESIKACHAR, p. 174, 2018) ”.
Vemos na figura 4, representando uma metáfora aos Angas do Yoga-sutra de
Patañjali, onde a raiz da árvore do yoga é composta pelo ‘Yama’ os fundamentos
éticos: Ahimsa, Satya, Asteya, Brahmacharya, Aparigraha. O tronco são os 5
Niyamas, que controlam os sentidos: Saucha, Samtosha, Tapas, Svadhyaya, Isvara-

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pranidhana. Os ramos são compostos pelo ásanas, as folhas são o Pranayama, o
caule é o Pratyahara, que deixar passar a seiva e leva ao Dharana, este permite o
germinar das flores que são Dhyana, esse caminho leva aos frutos que é o Samadhi.

Figura 4. A árvore do Yoga.

ekaṁ sadviprā bahudhā vadanti ||


A Verdade é Una. Os sábios irão ensiná-la de diferentes maneiras.
Ṛgveda, I:164.46
Visões do Yoga – Pedro Kupfer

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nessa obra-prima trouxe reflexões acerca das bases filosóficas para uma
prática de Hatha-Yoga, com apoio de algumas leituras e autores que tive acesso.
Nesse processo de escrever, pude observar o quão inesgotável são essas bases. Por
isso essa parte chama considerações finais, e não uma conclusão, pois não tenho
nenhuma pretensão de concluir e sim de abrir um caminho de leituras e reflexões.
Ainda hoje, ouvi uma reflexão que disse que algumas pessoas acham que o Yoga é
um processo de alienação, mas ao contrário, o Yoga deve abrir o nosso olhar para
viver um mundo melhor, menos desigual. Eu me questiono diariamente, como ser uma
yogi, onde eu, enquanto mulher, estou margeada de questões desiguais (gênero,
raça, sexualidade, classes sociais). Enquanto uma praticante ocidental de Yoga,
professora de yoga e de Sociologia pretendo empenhar os meus esforços para que
esse se torne um instrumento acessível a um número de pessoas que eu consiga
levar, através das ferramentas que disponho.
Como vimos, o Yoga é uma ferramenta tecnologia de autoconhecimento
milenar, e através de tantos séculos sobrevive, sendo modificado, aprimorado de
acordo com os mestres do seu tempo. Porque não agora uma nova geração,
baseados em textos sagrados, possam utilizar essa ferramenta de autoconhecimento,
para modificar parte do status-quo? Faço um questionamento de como tornar
acessível o Yoga a todas/os? Nessa minha proposta é tornar mais acessível os textos
filosóficos junto ao entendimento do que é Yoga, e o que fundamenta a prática do
Hatha-yoga, embora esse trabalho seja somente, uma pequena pincelada, uma
pequena consideração em minha visão limitada dentro da amplitude do que é o Yoga
e suas bases.
Lokah Samastah Sukhino Bhavantu
Shanti Shanti Shanti
Hari OM

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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

DESIKACHAR, T.K.V. O coração do yoga: desenvolvendo a prática pessoal. 2ed.


São Paulo : Mantra, 2018.
FEUERSTEIN, Georg. A tradição do yoga: história, literatura, filosofia e prática. São
Paulo : Pensamento, 2006.
HERMOGENES, José. Auto perfeição com Hatha-Yoga. Rio de Janeiro: BestSeller,
2019.
IYENGAR, B.K.S. Luz sobre o yoga: yoga dipika. São Paulo: Pensamento, 2016.
KUPFER, Pedro. As visões do Yoga. 2018. Acesso pelo acervo do Site
<www.yoga.pro.com.br>
TACCOLINI, Marcos. Manual de Hatha Yoga - 108 ásanas. 1ª edição 2004.

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