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da colonialidade
amazonialatitude.com/2019/12/17/incorporacao-e-integracao-da-amazonia-perpetuacao-da-colonialidade/
Verde é a primeira cor que vem à cabeça quando falamos em Amazônia. Instantaneamente
nos vêm imagens mentais da grande floresta, sua imensidão, sua ermidade e etc. Mas ao
analisar os processos de construção histórica da Amazônia, das suas imagens e das suas
múltiplas dimensões internas, percebemos que o que parece natural na verdade não é tão
natural assim.
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da região amazônica. Euclides da Cunha, por exemplo, a partir da sua passagem pela
Amazônia no início do século XX, deixou uma significativa produção textual que ao mesmo
tempo em que refletiu uma percepção contemporânea sobre esta terra, também contribuiu
para criar paradigmas interpretativos sobre a região que influenciaram de alguma forma o
pensamento nacional sobre a Amazônia. Ao realizar um minucioso trabalho para
compreender a construção do imaginário popular brasileiro sobre a Amazônia, Magali
Bueno destaca a predominância das imagens da “grande floresta verde” ou do “lugar do
atraso” que nos rementem aos primeiros esforços de construção conceitual do Brasil e da
Amazônia. O fato é que a imagem (ou imagens) da Amazônia, mais do que uma
representação de uma realidade concreta, foram também uma construção – não linear,
unilateral e estática. E mais do que uma construção, elas são imagens vindas de fora para
dentro, que foram absorvidas pelos amazônidas e nós mesmos as reproduzimos com
naturalidade. Assim, a Amazônia virou a “grande floresta”, “pulmão do mundo”, de “fauna
e flora exuberante”. Mas a Amazônia não é isso mesmo?
Na verdade, o termo Amazônia surge mais como uma referência ao território do vale
amazônico do que ao bioma amazônico. O seu emprego generalizado e reconhecido faz
sentido a partir do momento em que o Grão-Pará deixa de existir, dando origem ao
Amazonas e ao Pará. O termo funcionou perfeitamente para denominar a região das duas
províncias, cortadas pelo Rio Amazonas, que em grande medida foi o caminho para a
formação da sociedade amazônida a partir de 1616. Durante o período das primeiras
expedições europeias pela região no século XVI, o rio foi rebatizado pelos espanhóis,
nomeadamente pelo frei Gaspar de Carvajal, que acreditaram ter visto uma nação de índias
guerreiras, as quais se atribuiu o epíteto de amazonas, em referência à mitologia grega.
Assim surgiu a denominação Río de las Amazonas, que mais tarde serviria como sinônimo
para denominar a terra do grande rio, o Grão-Pará.
Por esta razão não podemos reduzir o termo Amazônia à floresta equatorial. Na verdade,
esta conversão do significado aconteceu justamente a partir do momento da construção
conceitual da região no final do século XIX – talvez pelo perigo que o termo pudesse
representar. Mas mais do que uma referência ao território, nós precisamos ver a Amazônia
mais como um conjunto entre a terra e o povo, pois pensar em história da Amazônia só faz
sentido se considerarmos o fator humano, pois a mata e a fauna não possuem história
como as sociedades humanas – ao menos não existe ramo da história científica que faça
esse tipo de estudo. O que à primeira vista pode parecer óbvio, como dizer que a Amazônia
se trata mais do território do que do bioma, na verdade pode não ser tão óbvio assim se
considerarmos toda a carga de imagens e preconceitos construídos sobre a Amazônia que
ainda são capazes de fazer um indivíduo do século XXI se impressionar ao saber que existe
“civilização” na região.
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O objetivo deste ensaio é empreender uma reflexão ampla sobre os processos de
incorporação e integração da Amazônia ao estado nacional brasileiro, assim como suas
implicações e significados. Abordaremos o processo de inserção da Amazônia na unidade
territorial do Brasil a partir da afirmação da ordem imperial em 1823 e da sua reafirmação
em 1840, com o encerramento da cabanagem. A incorporação (ou inserção) é o processo de
anexação do Grão-Pará, afirmação e reafirmação do poder do Império do Brasil sobre a
Amazônia. Já o processo de integração diz respeito aos processos de estabelecimento
institucional do estado brasileiro na Amazônia, de construção e infraestrutura de conexão
com as demais regiões, e da afirmação de uma relação de subalternidade e dependência
comercial e econômica que se desenrolam a partir da segunda metade do século XX. A
proposta aqui é fazer uma análise panorâmica, sem a intenção de esgotar qualquer assunto
aqui mencionado, de um processo que tem decorrido por quase duzentos anos e que,
apesar da evolução dos estudos acadêmicos na Amazônia, parece ser incompreendido ou
ignorado – inclusive pela comunidade acadêmica. Trata-se de um esforço preliminar para
desnaturalizar o que entendemos como natural, para combater os silêncios, para construir
uma perspectiva realmente amazônida sobre a Amazônia, sobre a colonialidade contínua a
que estamos imersos e, principalmente, para provocar a inquietação, sugerindo a
necessidade de construirmos uma nova perspectiva sobre o nosso passado, presente e,
sobretudo, sobre o nosso futuro.
Incorporação
A primeira coisa que precisamos dizer é que Amazônia também tem história – esta
afirmação simples pode causar espanto e dúvidas em muita gente. E mais do que ter uma
história, esta história não se confunde com a história do Brasil ou com a história das
nações indígenas da América. A história da Amazônia é ligeiramente diferente da história
do Brasil – talvez este seja um dos motivos que a faz ser ignorada ou abordada de forma
extremamente superficial no decorrer do estudo da História Nacional.
são ignorados pela larga maioria da população e pela sociedade oficial. A Amazônia, antiga denaturalizand
o-os,
colônia conhecida como Grão-Pará, foi um estado colonial português autônomo, sem ignorand-os,
relação política com Brasil durante toda a época colonial. Esses dois séculos de autonomia parece ignorar
Belém e a
em relação ao Brasil resultou em duas sociedades drasticamente diferentes na primeira importania do
Grao-Para
metade do século XIX. Isto demonstra que afirmações como “estamos no Brasil desde
1500” são infundadas e muito menos é possível pensar nacionalidade ou identidade
brasileira na Amazônia em 1823 – na verdade nem nas demais regiões do Brasil em grande
medida.
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Quando acontece a independência do Brasil e fundação do Império em 1822, o Brasil não
existia: nem como unidade territorial e muito menos como nação. Mesmo nas regiões que
compunham o estado colonial do Brasil a noção de unidade-identidade brasileira era muito
vaga ou inexistente. Após a fundação do Império se inicia um efetivo esforço para construir
a unidade territorial. Dessa forma, as demais capitanias ou comarcas que faziam parte do
Estado do Brasil passaram pelo processo de “adesão ao Império”, que na verdade na
maioria dos casos se tratou de uma anexação forçada. Mas existe uma significativa
diferença entre a “adesão” de uma região como a Bahia ou como São Paulo e a “adesão” do
Grão-Pará. As demais regiões faziam parte do Estado do Brasil praticamente desde o início
da construção da colônia, enquanto que o Grão-Pará era um outro Estado colonial, ao invés
de uma comarca ou capitania brasileira. E a ausência de vínculos era tão grande que
mesmo alguns anos após a anexação, o contato entre as cidades de Belém e Rio de Janeiro
permaneceu extremamente reduzido, quase inexistente se comparado com as relações que
existiam entre Belém e outros portos da Europa e da América, especialmente na região
caribenha. Curiosamente, existe uma tendência por parte da historiografia brasileira em
considerar que a unificação das duas colônias se deu em 1774, ou após a criação do Reino
Unido do Brasil, em 1815. Mas essa tendência parece ignorar o grau de desconexão
existente entre a Amazônia e o Brasil e a historiografia amazônida tem se esforçado para
superar a perspectiva unilateral brasileira convencional.
A Amazônia começa a fazer parte do Brasil em agosto de 1823, com o episódio que ficou
conhecido como “Adesão do Pará”. Tratou-se uma anexação negociada com a classe
política de Belém que foi coagida a aderir ao Império pela ameaça de bombardeio e
bloqueio. Logo, a “adesão” não foi realmente uma adesão. No Grão-Pará havia partidários
da adesão ao Brasil, mas a anexação aconteceu à revelia da vontade local. Estes partidários,
na verdade, almejavam mais a transformação social do que a participação do Império do
Brasil a priori, pois antes aderiram à revolução do Porto. Houve até mesmo quem
vislumbrasse adesão à revolução pernambucana de 1817. O trágico episódio da adesão
(anexação) ao Brasil precedeu uma série de outras tragédias a curto, médio e longo prazo
na região.
Ainda em 1823 uma revolta popular resultou num episódio que ficou conhecido como
Massacre do Brigue Palhaço. Foi uma revolta desdobrada da anexação onde os revoltosos,
que se levantaram contra os portugueses de Belém, foram aprisionados no porão de um
navio e mortos por asfixia com cal virgem. Forram estas 252 mortes que inauguraram a
ordem imperial brasileira na Amazônia. Este massacre gerou um grande trauma para a
população que ano após ano relembrava o acontecido – o mesmo ressentimento gerado
pelo episódio em questão acabou por ser vinculado à Cabanagem.
A reafirmação da ordem brasileira, após sua maior contestação, teve altos custos para a
população do Grão-Pará, com uma mortandade jamais vista e com prejuízos materiais e
imateriais incontáveis. Dessa forma, a Amazônia passou a fazer parte do Brasil. Desde a
Cabanagem, os amazônidas jamais puderam reunir forças para mais uma vez contestar a
ordem imposta de fora pra dentro. Pelo contrário, a partir daí se inicia a fragmentação e o
enfraquecimento empreendido pelo Estado através da divisão territorial e política. E
afirmação da ordem nacional brasileira também implica em afirmação moral e ideológica
sobre o povo amazônida, que tem suas implicações na cultura e na forma como o povo
percebe a si próprio. Assim se inicia o processo de imposição da nacionalidade brasileira na
Amazônia.
Ao contrário dos demais países da América, que surgiram através da luta intensa contra o
colonialismo, tendo ampla participação popular nas guerras e grandes movimentações
espaciais, o estado brasileiro independente surge mais como uma continuidade do que
como uma ruptura. Seu processo de independência não foi empreendido com a
participação da população e sua unidade não foi construída pela vontade dos povos
aglomerados na unidade nacional. O Brasil surge como uma costura de povos, somente a
partir do segundo reinado é que se inicia de fato o processo de construção da nação
brasileira, da nacionalidade que deveria promover a unificação e integração do país.
Para um amazônida do início do século XIX, a anexação ao Império pode ter sido sentida
de forma muito diferente do que o foi para um mineiro ou para baiano, em razão da longa
trajetória colonial. Na verdade nem a língua portuguesa era falada pela população comum,
que até a segunda metade do século XIX tinha o nheengatu (Língua Geral da Amazônia)
como língua franca e hegemônica. A língua portuguesa somente se torna hegemônica com
a chegada massiva de imigrantes nordestinos . Do ponto de vista político, a adesão a um
Império unitário significou uma significativa perda de poder político e sobre o território
para as elites locais, que passaram ver a província ser governada por “estrangeiros”
desconhecidos.
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Obras tiradas do famoso “Spix & Martius”. O botânico alemão Carl von Martius, o zoólogo J. B. von Spix,
são considerados uns dos maiores cientistas a explorar o Brasil no século XIX. Reproduzido nos livros
“Brasiliana Itaú”, à páginas 178-181.
De toda forma, a anexação do Grão-Pará ao Brasil não significou a ruptura com o
colonialismo e a superação das contradições sociais montadas pela experiência colonialista
– não foi, portanto, uma independência. A incorporação da Amazônia marcada pela
continuidade da condição colonial e pela conversão do colonialismo português pelo
colonialismo interno brasileiro. O episódio de 1823 significou uma troca de metrópole, de
Lisboa para o Rio de Janeiro. A continuidade desta condição colonial se traduz na lógica da
relação estabelecida entre a Amazônia e o Brasil, e posteriormente, na forma como o estado
nacional vai perceber e atuar sobre este território. Na verdade, mais do que uma troca de
metrópole ou conversão, o que ocorre é um acirramento da exploração colonialista, que
ganhou proporções muito maiores e trágicas na Amazônia nas últimas décadas do século
XX, a partir da ditadura militar. É justamente nestas últimas décadas que um estado
nacional, o estado brasileiro, consegue definitivamente implantar um regime de
exploração colonialista na Amazônia, em proporção muito maior que a sonhada pelos
portugueses.
Além das perdas materiais e das perdas humanas, a incorporação da Amazônia ao Brasil
também se traduz em perda cultural, especialmente a partir do segundo reinado, quando a
intelectualidade brasileira se propõe a construir o Brasil, a imagem do país e da
nacionalidade – marcada pelo eurocentrismo e pelo racismo – e a própria história
nacional. E é esta ideologia da nação brasileira que começa a ser irradiada do centro, do
Rio de Janeiro, para as periferias. Para além da imposição da nacionalidade, o processo de
repressão à Cabanagem e de enquadramento da população amazônida tiveram um efeito
traumático que resultou também desmoralização da sociedade formada por índios,
mestiços e negros. Estes processos e a divisão do Grão-Pará em duas províncias –
Amazonas e Pará – contribuíram igualmente, sobretudo no ocidente, para a perda do
vínculo com o próprio passado. Logo, sem a consciência histórica, a consciência cultural e a
autoconsciência do povo enquanto povo ficam gravemente comprometidas.
Integração
Como vimos, a Amazônia foi anexada ao Brasil em 1823. O Estado do Grão-Pará passou a
ser uma província de um império unitarista, onde o poder central tem um poder muito
maior sobre suas subdivisões do que num regime federalista. Desta forma o próprio
imperador do Brasil articulava o governo das províncias através dos presidentes que eram
nomeados para exercer o cargo em qualquer província. Assim o Grão-Pará passou a ser
governado diretamente por brasileiros de outras províncias e às vezes até mesmo por
portugueses.
Vale lembrar que as noções de identidade ainda são significativamente vagas para este
período. Logo os adjetivos como “brasileiro” ou “amazônida” são usados neste momento
mais como uma referência geográfica do que identitária. Além disso, no Grão-Pará, assim
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como nas regiões da colônia brasileira, os homens que participavam do jogo politico da
sociedade se consideravam portugueses da América – ou portugueses do Pará ou
portugueses de Belém e assim sucessivamente.
A divisão teve um significado ambíguo para a Amazônia, pois ao mesmo tempo em que a
elevação da comarca à condição de província teve resultados relativamente positivos,
também serviu para impedir a formação de uma consciência amazônida de identidade,
história e cultura comum e compartilha. A cisão da província dividiu um povo que estava
em formação há mais de duzentos anos (sem considerar a herança indígena milenar), que
tinha uma língua própria, o nheengatu, e que tinha na guerra da Cabanagem
experimentado uma unidade de luta para enfrentar as forças estrangeiras – a guerra
também constrói identidades. Essa divisão teve consequências mais trágicas (em termos de
consciência) no Amazonas, ao passo em que a quebra do vínculo com o Pará não foi
somente política: o amazonense desvinculou-se do próprio passado. Essa ruptura com o
passado determina a forma como um amazonense (ou depois um roraimense) se enxerga e
como enxerga a Amazônia.
Dentro do regime republicano, o Estado Novo instaurado por Getúlio Vargas pode ser
entendido como uma ruptura com o federalismo da primeira república, retomando
características unitárias – como no período imperial. Com o objetivo de empreender uma
verdadeira unificação da nação – que após cem anos da independência ainda se encontrava
fragmentada – Vargas promove uma intensa campanha para construir e fortalecer a
nacionalidade brasileira e combater as identidades regionais. É neste período que a
ideologia nacional se instala efetivamente na Amazônia – período, portanto, de integração
ideológica. Ainda durante a vigência do Estado Novo, no contexto da segunda guerra
mundial, acontece nova fragmentação territorial na Amazônia com a criação dos territórios
federais do Amapá, Rondônia e Rio Branco (Roraima) em 1943. Estes territórios passaram
a ser administrados diretamente pelo governo federal.
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O nacionalismo brasileiro, na medida em que possui uma face progressista diante do
contexto internacional quando assume um caráter anti-imperialista, também possui uma
face reacionária diante das contradições e desigualdades regionais internas do Brasil. A
própria construção e manutenção da unidade territorial foi conquistada através da
repressão violenta de todas as tendências e forças centrífugas da América portuguesa, junto
da imposição da ideologia da nação brasileira, igualmente teve caráter autoritário sobre os
povos periféricos do Brasil, visando suprimir as identidades regionais. Como este tipo de
processo sempre pesa mais para o lado mais fraco, a Amazônia foi a região que mais sentiu
o peso da construção da unidade nacional – para não falar dos povos indígenas, muito mais
frágeis do que o estado e o povo amazônida.
Significados da brasilidade
Como foi dito no início, trata-se de um esforço para desnaturalizar noções e imagens que
temos como naturais por termos, na Amazônia, uma consciência histórica muito vaga ou
totalmente inexistente (o que tem mudado gradualmente). Uma dessas naturalizações diz
respeito à presença da Amazônia na unidade territorial e nacional brasileira. Mas como
ficou claro, a Amazônia só passa a fazer parte do Brasil em 1823 a partir da sua anexação
imperial. Outra naturalização diz respeito à nacionalidade brasileira na Amazônia. Sem
que se tenha uma compreensão básica sobre os processos de anexação e integração a
tendência é que um amazonense, por exemplo, entenda a nacionaidade brasileira na
Amazônia como natural e perene, como uma herança direta da colonização portuguesa, ou
como se fôssemos brasileiros desde 1500. Na verdade, como vimos brevemente neste
trabalho, a nacionalidade brasileira é também uma construção histórica (como toda
nacionalidade), mas a sua expansão para a Amazônia foi significativamente diferente do
que foi a expansão para as outras regiões que faziam parte do estado colonial brasileiro.
O que aconteceu com a sobreposição da nacionalidade brasileira na região foi também uma
amputação cultural e identitária. Além da absorção de uma identidade nacional forjada de
fora pra dentro, houve a progressiva negação do que vinha da própria terra. Talvez o caso
mais significativo seja o abandono da Língua Geral, onde um dos fatores para o declínio da
língua foi justamente a negação do que vinha da própria terra e remetia ao passado
indígena, que deveria ser esquecido. Por outro lado a fragmentação do Grão-Pará reduziu a
cultura e a identidade amazônida, que já estavam em formação há mais de duzentos anos
em culturas e identidades provinciais/estaduais. E uma das consequências mais
lamentáveis dessa amputação são as rixas e rivalidades entre amazonenses e paraenses,
populações que compartilham a mesma unidade histórica, linguística, cultural e etc.
Felizmente isso não é algo generalizado (mas realmente existe, como uma consequência da
divisão).
Este é o preço que pagamos pela adesão ao Império. E é o preço que continuaremos a pagar
enquanto não houver uma verdadeira descolonização da Amazônia. Caso contrário,
permaneceremos a pagar muito caro pela continuidade da nossa condição de
subalternidade, afogados na colonialidade e incapazes de reagir e reverter esta situação de
forma efetiva.
Considerações finais
Propor uma abordagem humanizada e descolonial sobre a Amazônia não significa negar as
questões ambientais. Mas é antes de tudo um combate aos graves estigmas produzidos pela
relação endocolonialista estabelecida no processo de anexação da Amazônia e integração à
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nação. Contudo, falar em descolonização da consciência histórica e cultural popular na
Amazônia demanda antes de tudo de um esforço da própria comunidade acadêmica para
construir novos parâmetros interpretativos para Amazônia. Isto para que a Amazônia seja
cada vez mais amazônida (e não amazônica), compreendida de dentro pra fora e não ao
contrário, como tem sido desde o século XIX. Construir uma amazonidade pode ser a única
alternativa realmente eficiente para a superação real e definitiva dos paradigmas da
subalternização e do colonialismo – para que também a floresta amazônica sobreviva.
Falar em amazonidade é vislumbrar novas possibilidades no horizonte, mesmo que
distante, que estejam além da perpetuação da colonialidade.
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