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UNIDADE 04: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

1. DELIMITAÇÃO DO TEMA
- “A responsabilidade extracontratual do Estado corresponde à
obrigação de reparar danos causados a terceiros em decorrência de
comportamentos comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos, lícitos ou
ilícitos, imputáveis aos agentes públicos”. (Di Pietro)
- “A responsabilidade civil do Estado diz respeito à obrigação a este imposta
de reparar danos causados a terceiros em decorrência de suas atividades ou
omissões – por exemplo: atropelamento por veículo oficial, queda em buraco
na rua, morte em prisão” (Medauer).
- “O Estado goza de prerrogativas na sua atuação em virtude da supremacia do
interesse público em face dos interesses privados. No entanto, a imposição da
atuação imperativa do ente público perante o cidadão também enseja uma série
de limitações na atividade administrative e um maior rigor no que tange ao
tratamento dos danos causados pelo Estado, em suas atividades” (Carvalho)
- Outros nomes desta matéria: Responsabilidade Patrimonial do Estado,
Responsabilidade Extracontratual do Estado, Responsabilidade Civil da
Administração, Responsabilidade Patrimonial Extrancontratual do Estado.

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO


a) Teoria da Irresponsabilidade do Estado: Esta teoria foi adotada na época
do absolutismo. Baseava-se na idéia de que o Estado (personificado no rei)
jamais poderia lesar seus súditos (“The king can do no wrong”, em inglês, e
“le roi ne peut mal faire”, em francês). Os agentes públicos não eram
responsáveis por seus atos, uma vez que, na qualidade de atos do rei, não
eram considerados lesivos aos súditos. Esta doutrina encontra-se totalmente
superada, sendo que os últimos países que a abandonaram foram a Inglaterra
e os Estados Unidos.
b) Responsabilidade com previsão legal: A primeira ocorrência de
responsabilidade estatal se deu com o “Caso Blanco” na França, em que uma
garota foi atropelada por um vagão de trem. Surge a responsabilização do
Estado em casos pontuais.
c) Teoria da Responsabilidade Subjetiva: Influência do liberalismo. Por meio
desta teoria, caberia o Estado indenizar somente quando ficasse
demonstrada a culpa de seus agentes. Posicionava o Estado como se fosse o
particular e o ônus da prova recaia sobre o particular lesado. Como era bastante
complicado que as vítimas comprovassem a culpa do Estado, esta teoria evoluiu
para a teria da culpa do serviço.
d) Teoria da Culpa do Serviço ou “faute du service”: Para responsabilizar o
Estado, bastava comprovar que o serviço foi mal prestado ou prestado de forma
ineficiente ou com atraso, não sendo necessário apontar o agente causador
(culpa anônima). Posteriormente, evoluiu para a responsabilidade objetiva.
e) Teoria da Responsabilidade Objetiva: “a responsabilidade objetiva é a
obrigação de indenizar que incumbe a alguém em razão de um procedimento
lícito ou ilícito que produziu uma lesão na esfera juridicamente protegida de
outrem” (Bandeira de Melo). Consiste na recomposição de prejuízos causados a
particulares em decorrência de ações ou omissões imputados a agentes
públicos no exercício de suas funções e possui as seguintes características:
- conduta (lícita ou ilícita) praticada por agente público
- dano
- nexo de causalidade entre a conduta praticada pelo agente e o dano sofrido
pela vítima.
Observe que não há necessidade de prova do requisito subjetivo (culpa) do
agente para responsabilizar o Estado. O Estado é automaticamente responsável
se houve conduta do agente, este, todavia, poderá não responsabilizado se
provar que agiu com dolo. É a teoria adotada pelo nosso ordenamento.
3. PREVISÃO LEGAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO:
- Art. 37, § 6º, CF e art. 43, CC
4. RESPONSABILIDADE OBJETIVA
4.1. A quem se aplica?
- Aplicável sobre todos aqueles que prestem serviços públicos.
- aplica-se às pessoas jurídicas de direito público da administração direta, as
autarquias, as fundações públicas de direito público. Em relação à administração
indireta (empresas públicas e sociedades de economia mista) só vai se aplicar
se estas entidades foram criadas exclusivamente com o fim de prestação de
serviço público.
- Não se aplica às empresas estatais que exploram atividade econômica. Ex:
banco do Brasil
- Aplica-se às concessionárias e permissionárias de serviços públicos, que
prestam serviço público por delegação. A responsabilidade da concessionária é
objetiva e a do estado é subsidiária e objetiva.
- Agente público é todo aquele que age em nome do Estado.
4.2. Quais são os requisitos para sua aplicação?
A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das
prestadoras de serviços públicos não depende de comprovação de elementos
subjetivos ou de ilicitude, baseando-se somente em três elementos, quais seja,
conduta do agente público, dano e nexo de causalidade.
- Conduta: deve ser atribuída a um agente público que atue nesta qualidade ou,
ao menos, se aproveitando da qualidade de agente, para causar o dano.
Doutrinariamente, entende-se que a conduta deve ser comissiva e, em caso de
omissão, deverá ser objetiva.
- Dano: quaisquer espécies de danos, inclusive dano moral. Pode decorrer
também de ato ilícito do ente estatal. Teoria do Duplo Efeito dos atos
administrativos (o mesmo ato administrativo pode vir a causar um dano
específico/anormal para determinada pessoa e para outra não causar dano
passível de indenização).
- Nexo de causalidade: Deve haver um liame entre a conduta estatal e o dano
sofrido pela vítima e deve se atentar a situações que interrompem o nexo causal.
Ex: preso morto no presídio durante uma rebelião.
4.3. Desdobramentos da Teoria da Responsabilidade Objetiva
4.3.1. Teoria do Risco Administrativo: é a teoria adotada pelo ordenamento
brasileiro, segundo a qual o ente público é responsabilizado, objetivamente,
pelos danos que seus agentes causarem a terceiros, admitindo-se a exclusão da
responsabilidade em determinadas situações em que hajam excludentes de
responsabilidade (caso fortuito, força maior e culpa exclusiva da vítima).
4.3.2. Teoria do Risco Integral: esta teoria posiciona o ente público como
garantidor universal e, por ela, a simples existência de dano e de nexo causal já
é suficiente para que surja a obrigação de indenizar, não se admitindo qualquer
excludente de responsabilidade. O ente público acaba sendo responsabilizado
mesmo que a conduta contribua remotamente para a ocorrência do dano. A
doutrina aponta a aplicação desta teoria nas seguintes situações: danos
decorrentes de atividades nucleares exercidas pelo estado ou por ele
autorizadas, danos ao meio ambiente, acidente de trânsito (seguro DPVAT),
crimes ocorridos a bordo de aeronaves que estejam sobrevoando o espaço
aéreo brasileiro e danos decorrentes de ataques terroristas).
4.4. Responsabilidade por Omissão
Por mais que haja divergência doutrinária (José dos Santos Carvalho Filho), na
omissão do agente público a regra que prevalece é a da responsabilidade
subjetiva. A responsabilidade subjetiva aqui, no entanto, não é a tradicional que
conhecemos do direito civil, ou seja, não depende da demonstração de dolo ou
culpa, mas sim decorre da culpa anônima.
Culpa anônima: a má prestação do serviço ou a prestação ineficiente geraria a
responsabilidade subjetiva ao estado, não havendo necessidade de comprovar a
culpa do agente, mas apenas a má prestação de serviço ou a prestação
ineficiente/atrasada do serviço. Devem ser estar presentes os seguintes
requisitos: comportamento omissivo ilícito do estado (ausência de cumprimento
de deveres pelo agente, legalmente estabelecidos), dano, nexo de causalidade e
culpa do serviço público.
O Estado não será responsabilizado por fatos da natureza, atos de terceiros ou
atos de multidões. Deve se demonstrar que era possível ao ente público evitar o
dano e ele não o fez (dano evitável).
Risco Criado (risco suscitado): ocorre quando o estado cria situações de risco
que levam a ocorrência do dano. Por meio de um comportamento positivo,
assume um grande risco de gerar prejuízo (dano) a particulares e responde,
portanto, objetivamente mesmo que não se demonstre conduta direta de um
agente público. Ex: guarda de pessoas ou coisas (carro apreendido dentro do
DETRAN), presidiário que foge e assalta a vizinhança logo após a fuga,
4.5.Indenização
Decorre da responsabilidade extracontratual do estado, não deve ser confundida
com a decorrente dos contratos administrativos ou a decorrente das formas de
intervenção do estado na propriedade.
4.6. Excludentes de Responsabilidade do Estado
Caso fortuito, força maior e culpa exclusiva da vítima (ou culpa concorrente)
4.7. Responsabilidade do Agente Público
A responsabilidade do estado é objetiva perante a vítima e a responsabilidade
do agente público perante o estado é subjetiva.
A vítima deve acionar o Estado e não o agente diretamente (princípio da
impessoalidade/teoria do órgão/teoria da imputação volitiva).
- As responsabilidades civil, penal e administrativa são cumulativas e, ao
mesmo tempo, independentes (lei n. 8112/90):
Art. 125. As sanções civis, penais e administrativas poderão
cumular-se, sendo independentes entre si.
- Pode haver responsabilidade administrativa sem que haja
responsabilidade civil.
- Pode haver responsabilidade administrativa e civil, sem que haja penal.
- se houver condenação penal do servidor, automaticamente haverá
reconhecimento de responsabilidade administrativa e civil.
- Se houver absolvição penal por negativa de autoria ou inexistência do fato, a
responsabilidade civil e administrativa anterior torna-se sem efeito.
- Se houver absolvição por mera insuficiência de provas ou ausência de
culpabilidade penal ou, por qualquer outro motivo, não há interferência nas
demais esferas.
4.7.1. Denunciação à lide (art. 70, CPC) do agente público
A doutrina majoritária entende que, uma vez acionado o Estado, não é possível
que haja denunciação à lide do servidor, o que traria prejuízo à vítima, haja vista
que o Estado poderá, posteriormente, propor ação regressiva em face do
agente.
Não há entendimento jurisprudencial consolidado sobre o tema.
4.8. Prescrição
- Art. 1º do Decreto 20.910/32 e art. 1º-C da Lei 9494/97: 05 anos
- Porém, há quem defenda o prazo de 03 anos (art. 206,§ 3º, V, CC)
- Questão não pacificada porque há quem defenda que lei geral (Código Civil)
não pode alterar Lei Especial.
4.9. Espécies de Responsabilidades
4.9.1. Responsabilidade por Obra Pública
4.9.1.1. Má execução da obra
Se forem danos causados por culpa de quem executa (culpa do
executor), dependerá do executor: Se Administração diretamente, será
responsabilidade objetiva da Administração, sem prejuízo da ação regressiva
em face do agente público que causou o dano por meio de má execução; se
for particular contratado, o particular responderá pelo dano de forma subjetiva
(art. 70, 8666/93).
4.9.1.2. Fato da obra
Se for somente pelo “fato da obra”, independe de quem está executando
(particular contratado ou Administração), a responsabilidade da Administração
é objetiva. Ex: rachaduras nas casas próximas a construção de galerias do
metrô.
4.9.2. Responsabilidade por atos legislativos
Regra geral, atos legislativos não geram responsabilidade ao Estado, porém a
doutrina e jurisprudência destacam duas hipóteses em que podem ocorrer:
4.9.2.1. Leis de efeitos concretos
Edição de leis de efeitos concretos: são leis somente no sentido formal,
visto que possuem caráter normativo apenas do ponto de vista formal
(porque se originam do legislativo), são dotadas de generalidade,
impessoalidade e abstração, materialmente análogas aos atos administrativos.
Ex: Leis que criam um Município (art. 18, §4º) e leis orçamentárias (art. 165)
são ótimos exemplos constitucionais para ilustrar o conceito de lei de efeitos
concretos, pois não possuem a abstração necessária para se repetirem em
infinitas situações.
4.9.2.2. Leis em sentido formal e material
Edição de leis inconstitucionais: após a declaração de
inconstitucionalidade da lei, o particular poderá ingressar com pedido de
indenização pela aplicação desta lei.
4.9.3. Responsabilidade por atos jurisdicionais
Sobre os atos jurisdicionais, a regra geral é a da irresponsabilidade do
Estado, porém:
- sobre os atos não jurisdicionais praticados por juízes e órgãos de apoio do
Poder Judiciário (escrivães, oficiais de justiça, motoristas, etc), há
responsabilidade na modalidade objetiva (risco administrativo);
- O art. 5º, LXXV, CF estabelece a responsabilidade por erro judiciário e prisão
além do tempo, independente de dolo ou culpa do magistrado (frise-se que
este dispositivo somente tem aplicação na área criminal).
- Por fim, o juiz cível é responsável pessoalmente quando praticar
condutas dolosas, nos termos do art. 133 do CPC, excetuando-se erros
decorrentes de culpa (negligência, imprudência e imperícia), ainda que
acarretem danos às partes.
Art. 133. Responderá por perdas e danos o juiz, quando:
I - no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude;
II - recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar
de ofício, ou a requerimento da parte.
o
Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no n II
só depois que a parte, por intermédio do escrivão, requerer ao juiz que
determine a providência e este não Ihe atender o pedido dentro de 10 (dez)
dias

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