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1.

Domínio da Psicologia Social


O que é a Psicologia Social?
Para responder à questão “o que é a psicologia social?”, podemos avançar uma definição formal do campo, fazer uma
lista dos tópicos investigados pelos psicólogos sociais, comparar a psicologia social com campos conexos ou,
finalmente, situar os seus níveis de análise.
Tentativa de definição
Definir formalmente a psicologia social é uma tarefa complexa, não só devido à diversidade do domínio, mas também
à sua rápida taxa de mudança. De entre a multiplicidade de definições avançadas na literatura, destaca-se a de Allport,
para quem a psicologia social tenta “compreender e explicar como os pensamentos, sentimentos e comportamentos
dos indivíduos são influenciados pela presença atual, imaginada ou implicada de outros”. De facto, pode-se conceber a
psicologia social como uma relação de entradas para o indivíduo, que correspondem às presenças atuais, imaginadas
ou implicadas de outras pessoas, e de saídas do indivíduo, isto é, pensamentos, sentimentos e comportamentos. A
definição de Allport ressalta o facto de que as outras pessoas podem influenciar-nos mesmo sem estarem fisicamente
presentes, ou seja, a presença imaginada ou implicada de outras pessoas afeta o comportamento. A psicologia social
recorre a fatores individuais e sociológicos. Os processos intrapsíquicos desempenham um papel determinante no
comportamento da pessoa, o contexto social desse comportamento fornece-lhe estímulos. Erros fundamental da
atribuição: atribuir exclusivamente a fatores pessoais, deve-se também considerar fatores situacionais, há que ter em
conta toda a situação (pormenores pessoais e ambientais – centrar.se me dados isolados pode alterar a perceção das
circunstâncias ----visão completa e holística da situação e a aprofundar a compreensão durante o processo de
mudança).
Tópicos da psicologia social
A psicologia social cobre um vasto domínio, já que os psicólogos sociais abordam uma ampla gama de
comportamentos humanos. Segundo uma revisão das publicações nas principais revistas de psicologia social dos
Estados Unidos, verifica-se que os temas mais investigados são a atribuição (perceção das causas do comportamento
dos outros), as atitudes e mudança de atitudes e os processos cognitivos (categorização das características da
personalidade dos outros). Apesar da diversidade de focos de investigação, as áreas do comportamento estudadas
podem dividir-se em três grupos: fisiológico, referindo-se às mudanças fisiológicas e consciência do corpo em
contexto social; cognitivo-atitudinais, ou seja, atitudes, opiniões, crenças, valores, sentimentos e representações
sociais; realização, isto é, habilidade em realizar tarefas após experiências sociais.
Relações com outros campos
A psicologia social tem uma relação próxima com a sociologia e a psicologia, distinguindo-se de ambas pela mesma
característica: tem como objeto de estudo uma relação ternária sujeito individual  sujeito social  objeto, e não uma
relação dual (sujeito individual ou social  objeto). A psicologia é o estudo científico do indivíduo e do
comportamento individual, e aborda os processos internos, nem sempre dentro do contexto social, já que o
comportamento não é necessariamente social. A sociologia é o estudo científico da sociedade humana, e enfatiza as
normas que guiam o comportamento, resultado de pressões externas. A psicologia social, como campo
interdisciplinar, estabelece a ponte entre psicologia e sociologia. De facto, os psicólogos sociais explicam o
comportamento tanto a partir de fatores individuais, isto é, processos intrapsíquicos, como sociológicos, estímulos
sociais, motivos, objetivos.

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Entre os fatores que influenciam as atividades de um indivíduo em relação a outro, ou causas do comportamento
social, são de referir: o comportamento e características das outras pessoas; a cognição social (pensamentos e
recordações acerca das outras pessoas); variáveis ecológicas (influências do meio físico); o contexto sociocultural em
que ocorre o comportamento social; e aspetos da natureza biológica.
Níveis de análise
Encontram-se duas variantes principais em psicologia social: a psicologia social sociológica e a psicologia social
psicológica, as quais diferem no foco e nos métodos de investigação, apesar de partilharem ambas o mesmo objeto
de estudo, o comportamento social. Contudo, segundo Lewin, não importa tanto aos psicólogos sociais donde vêm
as suas ideias, mas sim se funcionam bem para explicar o pensamento e o comportamento social. É importante
proceder ao estudo de ambas as psicologias sociais, já que não só fornecem informação complementar acerca dos
mesmos problemas, mas também as forças de uma contrabalançam as fraquezas da outra. Por exemplo, a limitação
dos métodos experimentais em situações sociais controladas é compensada pela focalização em meios sociais
naturais. Além disso, as duas abordagens convergem na tentativa de compreensão dos indivíduos no seu contexto
social, reconhecendo ambas a influência recíproca do indivíduo e da sociedade na construção social da realidade, e
acentuando a importância do meio percecionado pelo indivíduo e não tanto o meio real.

psicologia social psicológica psicologia social sociológica

objecto comportamento social

foco indivíduo grupo/sociedade

compreender o comportamento social compreender o comportamento social mediante


modus operandi mediante a análise de estímulos, estados a análise de variáveis societais como estatuto
psicológicos e traços de personalidade social, papéis sociais e normas culturais

devida a diferente interpretação dos


variação no devida a diferentes estímulos e contextos
estímulos sociais e a diferentes
comportamento sociais
personalidades

objectivo predição do comportamento descrição do comportamento

inquéritos
método experimentação em laboratório observação participante (o investigador está
inserido no grupo)

Em psicologia social recorre-se a diferentes níveis de análise, não só devido à diversidade do comportamento humano,
mas também às causas diversas que podem originar um só comportamento. Segundo Doise, distinguem-se quatro
níveis de análise: estudo dos processos intra-individuais, o modo como o indivíduo organiza a sua experiência do
mundo social; estudo dos processos inter-individuais, as dinâmicas que ocorrem entre indivíduos; estudo das
diferenças de posições, as interações devidas a diferentes estatutos sociais; estudo das crenças ideológicas
universalistas, que induzem representações e condutas diferenciadoras. Em conclusão, diferentes níveis de análise
interagem uns com os outros, apesar de cada um se associar a fenómenos diferentes, o que revela a existência de
vários processos psicológicos numa só situação social.
Esboço histórico da Psicologia Social

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Passado do pensamento sociopsicológico
A psicologia social é resultado de uma evolução progressiva, tornando-se centro de interesse científico em finais do
séc. XIX e inícios do séc. XX. Os filósofos gregos são os primeiros teóricos em psicologia social, ao investigarem a
relação psiquismo-vida coletiva, sem serem contudo psicólogos sociais. A psicologia social pré-científica caracteriza-
se pela defesa duma perspetiva unívoca: os autores ou defendem que o indivíduo transforma as instituições, ou que
estas transformam o indivíduo. De entre os autores que afirmam que as disposições psicológicas individuais produzem
as instituições, podemos apontar Platão, Aristóteles, Hobbes e Fourier.
Platão . visão utilitária da interação humana, o indivíduo não é autosuficiente, especialização de tarefas
. sociedade equilibrada organiza-se em torno de 3 atividades (artesanal, guerreira, magistratura)
. indivíduo equilibrado possui 3 virtudes, análogas à tríade de Allport (comportamentos, sentimentos
e pensamentos)
Aristóteles . interação social é fundamental para o ser humano, animais políticos, instinto gregário
Hobbes . estado natural do homem é a guerra, o homem é o lobo do homem
. análise dos processos psicológicos que levam o homem a socializar, procura as bases da sociedade
nas bases do comportamento
. precursor do estudo do homem em sociedade
Fourier . sociedade ideal Falanstério (comunidade autónoma de tipo cooperativo com base numa organização
social favorável à plena realização da natureza humana) dá livre curso às paixões humanas, harmonia psicológica
Outros autores defendem que as condições sociais determinam o comportamento humano, tais como Rousseau e
Marx.
Rousseau . análise da influência das instituições sobre a psicologia humana
. a natureza não destina o homem à vida em sociedade, ciências e artes corrompem-no
Marx . comportamento social é determinado pelas condições económicas, mudança nas instituições
económicas permite mudar o padrão psicológico das pessoas
Origens da Psicologia Social
A psicologia social surge na confluência de duas correntes de pensamento filosófico e sociológico, uma francesa,
constituída por autores como Comte, Tarde, Le Bon e Ringelmann, e uma anglo-saxónica, representada por Triplett,
Ross, McDougall e Allport.
Comte inventou o termo “sociologia” e fez muito por situar as ciência sociais na família das ciências e o primeiro
autor a conceber a ideia de Psicologia Social e, segundo Allport, pode ser considerado o fundador desta disciplina. O
autor da lei dos três estádios (Teológicos, Metafísico e Positivo) e da hierarquia das ciências abstratas procura uma
“verdadeira ciência final”, edificada simultaneamente na biologia e na sociologia. Comte cria assim a Moral Positiva,
a qual procura estudar de que forma os indivíduos combinam influências biológicas e societais, A Moral Positiva
considera, por um lado, os fundamentos biológicos do individuo segundo o enfoque da moderna psicofisiologia e, por
outro, aborda o indivíduo num contexto cultural e social, o que constituiu a perspetiva da psicologia social. Assim, a
psicologia social é fruto da união entre a sociologia e a moral e da psicologia fisiológica deriva da biologia e da moral.
Serão, contudo, Tarde e Le Bon a desenvolver verdadeiramente a psicologia social. Segundo Tarde (discípulo de
Durkheim), os fenómenos sociais baseiam-se em dois fenómenos psicológicos, a invenção, que assegura progresso, e
a imitação, que garante a estabilidade social. Para este autor, a ciência social é uma interpsicologia, pois deve
evidenciar as diferentes formas de interação entre as pessoas. Além do importante conceito de imitação, Tarde avança

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também a importância dos meios de comunicação de massa na formação de opinião pública. Já Le Bon tornou-se
célebre pelo estudo da psicologia das multidões, afirmando que a multidão modifica o indivíduo, ao dotá-lo de uma
“alma coletiva” que faz com que os indivíduos, na situação da multidão, sintam, pensem e ajam de forma distinta do
que se estivessem cada um isoladamente. Com este estudo, Le Bon abre as portas da investigação sobre o
comportamento coletivo. Finalmente, Ringelmann irá investigar a influência da presença de outros no desempenho
individual, descobrindo o fenómeno da preguiça social: a realização individual diminui quando se trabalha em grupo.
No lado anglo-saxónico, Triplett efetua um estudo experimental sobre os efeitos da competição no desempenho
humano, verificando que o desempenho individual é melhor em situação de competição, o que deu origem a variada
investigação sobre a facilitação social. No início do séc. XX, Ross publica a obra “Psicologia Social”, considerando
que esta disciplina tem como objeto as interrelações psíquicas entre o homem e o meio que o rodeia. Já McDougall
pretende demonstrar como é que os factos sociais se alicerçam na psicologia e como o comportamento social resulta
de um pequeno número de tendências inatas ou instintos imutáveis, o que abre uma abordagem individualista na
psicologia social.
Ao escrever o primeiro livro de base da disciplina, é, finalmente, Allport o autor que mais se aproxima da psicologia
social contemporânea. Para ele, o comportamento social é influenciado por muitos fatores, entre os quais a presença
de outros e suas ações. O livro discute investigação que já tinha sido realizada, em tópicos que ainda hoje são alvo de
discussão : reconhecimento de emoções mediante expressões faciais, conformidade social e o impacto do público na
realização de tarefas..
Evolução da Psicologia Social
Após a publicação de Social Psychology de Allport houve um rápido crescimento desta disciplina. Nos anos 30
começa a publicação de autores como Moreno, Sherif e Lewin. Enquanto que Sherif desenvolve o primeiro programa
experimental, investigando as normas sociais, Lewin formula a sua teoria do campo, na qual explicita que o
comportamento é função das características individuais em interação com o meio. Este autor, considerado pai da
psicologia social, tem uma perspetiva interaccionista, que combina a psicologia da personalidade e a psicologia social
contemporânea. Uma parte do seu trabalho focou-se em aplicar os princípios teóricos da psicologia social à resolução
de problemas sociais, como no estudo das técnicas de persuasão mais eficazes para a contribuição no esforço de
guerra.
Nos anos 40 e 50, a tendência de investigação inclina-se para a influência dos grupos sobre o comportamento
individual, para a relação entre traços de personalidade e comportamento social e para a mudança de atitudes.
Festinger propõe a teoria da dissonância cognitiva (os seres humanos não gostam de inconsistências), afirmando que
numa situação de incoerência entre pensamentos e comportamento as pessoas tendem a alterar quer um, quer outro.
Nos anos 60, a psicologia social expande-se acentuadamente, surgindo investigação sobre a autoridade, julgamento
acerca dos outros, resolução de conflitos, e levantando-se o debate acerca das questões éticas da experimentação
laboratorial. Nos anos 70 e 80 surge investigação sobre a atribuição, papéis sexuais e discriminação sexual,
encontrando-se duas tendências fortes: a influência da perspetiva cognitiva, que estuda como a informação se integra
em processos sociais complexos, e a ênfase na psicologia social aplicada, que segue o mote de Lewin “o mundo é o
meu laboratório”. Como novas tendências do aproximar do novo milénio, podemos apontar a interação entre afeto e
cognição, o impacto da cultura no comportamento social e a sensibilidade à variabilidade no tempo e no espaço.
Artigo: Richard, One Hundred Years of Social Psychology Quantitatively Described
. qual a magnitude e variabilidade dos efeitos observados em psicologia social no sécXX?

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os efeitos variam em magnitude e a sua distribuição apresenta assimetria positiva
cerca de 25% dos resultados têm um efeito pequeno, 50% um efeito médio e 25% um efeito grande
tópicos com maiores efeitos médios: processos de grupo, atitudes e liderança
efeitos situacionais são semelhantes em grandeza aos efeitos pessoais
diferenças devidas ao género são pequenas
Artigo: Sherif, Experiments in Group Conflicts  Estudo da Caverna dos Ladrões
Sherif efetuou um elaborado estudo de campo, no qual procurou investigar as relações intergrupais, recorrendo a
jovens sujeitos de investigação, rapazes com 10 e 11 anos a frequentar um campo de férias. Os rapazes foram
distribuídos por dois grupos, sem saberem da existência do outro grupo. Numa primeira fase, os investigadores
examinaram a formação de grupos, isto é, o desenvolvimento de coesão do endogrupo (as pessoas em geral mantém
contatos mais intensos com os membros do próprio grupo, o que faz com que desenvolvam uma visão mais complexa
a respeito dos que grupos em que transitam do que sobre os grupos externos), a criação de uma hierarquia, de normas
de comportamento e de símbolos de identificação do grupo. Seguidamente, os grupos souberam da existência um do
outro, o que levou ao sentimento de competição intergrupal e a interações competitivas. Verificou-se que a
competição fortalece os laços do grupo e a hostilidade em relação ao outro grupo, a qual gera, por sua vez,
estereótipos negativos relativamente ao exogrupo (no caso dos grupos externos, os contatos são mais reduzidos e,
consequentemente, a representação disponível sobre o grupo ou sobre os membros do grupo tende a ser menos
complexa, o que propicia a formulação de julgamentos mais extremados). Numa segunda fase, os investigadores
testaram várias técnicas para reduzir o conflito, verificando-se que a mais eficaz é a introdução de objetivos que o
grupo só consegue realizar com a ajuda do outro grupo (eg, restabelecimento da água para o campo). Este estudo
combinou níveis de análise psicológicos e sociológicos e chamou a atenção para as mudanças de atitudes e
comportamentos dos sujeitos em relação aos membros do endogrupo e do exogrupo.

Psicologia Social como Ciência


A psicologia social investiga as ações dos indivíduos e dos indivíduos dentro de grupos, sendo assim uma ciência
comportamental e social, e utilizando o método científico. Ciência é um corpo organizado de conhecimentos que
advêm da observação objetiva e da testagem sistemática. No âmbito das ciências, as teorias são uma descrição de
relações entre símbolos que representam a realidade, e consiste em formar regras gerais com base em observações
específicas. Os psicólogos sociais tentam apreender os padrões da vida social e criar termos para que as pessoas
possam comunicar sobre eles, e são as teorias que permitem comunicar esta compreensão aos outros.
Teorias em Psicologia Social
Entre as principais posições teóricas em psicologia social figuram as teorias da aprendizagem, as teorias cognitivas e
as teorias das regras e dos papéis, as quais diferem nas suposições acerca da natureza humana e na conceção daquilo
que provoca mudança no comportamento.
Teorias da aprendizagem
As teorias da aprendizagem têm origem nos princípios do behaviourismo e devem a Bandura a sua aplicação ao
comportamento social. O núcleo destas teorias é a ideia de que o comportamento de uma pessoa é determinado pela
aprendizagem anterior. Baseiam-se na ideia que a pessoa aprende mediante mecanismos de aprendizagem social:
associação ou condicionamento clássico; reforço, isto é, recompensa ou castigo; imitação a partir da observação do

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comportamento dos outros. Segundo estas teorias, existe mudança de comportamento quando os padrões de reforço
são alterados.
Teorias cognitivas
As teorias cognitivas baseiam-se nos princípios da gestalt (categorização de objetos e lei figura-fundo) e têm como
ideia principal que o comportamento de uma pessoa depende do modo como perceciona a situação social. Assumem
que as pessoas agem com base nas suas cognições e emoções, e focalizam-se na cognição social, ou seja, nos
processos cognitivos subjacentes às perceções e julgamentos acerca de pessoas, de situações sociais e de grupos. Para
as teorias cognitivas, a mudança de comportamento resulta da alteração de crenças e atitudes e do
esforço para resolver inconsistência entre cognições.
Teorias das regras e dos papéis
As teorias das regras e dos papéis evidenciam que os pensamentos e comportamentos do indivíduo resultam do seu
papel social e das expectativas que lhe são inerentes. Afirmam que as pessoas se comportam de acordo com as
expectativas que os outros têm acerca do seu papel social, que é a posição que uma pessoa ocupa num determinado
contexto social. O papel social é guiado não só pelas expectativas dos outros, mas também pelas normas sociais
internalizadas durante o processo de socialização. Trata-se de uma abordagem sociológica que vê o indivíduo como
um produto da sociedade, assumindo que as alterações de comportamento apenas acontecem quando há mudança no
papel da pessoa.
Psicologia Social contemporânea
. cognição e comportamento  interacção complexa e íntima entre comportamento social e pensamento social; não há
uma verdadeira divisão entre o agir e o pensar numa situação social
. neurociências sociais  relaciona a actividade cerebral com o pensamento e comportamento sociais
. processos implícitos  comportamentos sociais não conscientes (p.ex. tendência a reconhecer melhor os rostos do
nosso próprio grupo étnico do que os rostos de outros grupos)
. diversidade cultural  importância de factores culturais; resultados podem ou não generalizar-se a outras culturas

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2. Preconceitos e Discriminação
Definições
Preconceito
O preconceito pode ser definido como uma atitude favorável (os negros são muito atléticos) ou desfavorável em
relação a membros dum grupo, baseada sobretudo na pertença a esse grupo e não necessariamente em características
individuais dos membros desse grupo. Os mais variados grupos podem ser alvo de preconceito, tal como diferentes
raças ou etnias, religiões, homossexuais, deficientes, doentes mentais, prisioneiros, entre outros. E acordo com
Allport, as pessoas justificam a sua hostilidade em relação a certos grupos com base em diferenças percebidas, reais
ou imaginárias. Allport define ainda que o preconceito étnico é uma antipatia (atitude negativa) baseada na
generalização errada e inflexível, que pode ser sentida (dimensão afetiva) ou expressa (dimensão comportamental).
Para Allport a diferença entre o “preconceito” e um simples “pré-conceito” é o seu grau de resistência à mudança:
quando confrontado com nova informação, o indivíduo é capaz de retificar os seus julgamentos erróneos e essa ideia
preconcebida é alterada; os preconceitos são mais resistentes a qualquer evidência desconfirmatória.
Os termos endogrupo e exogrupo são úteis para se tratar do preconceito. O endogrupo, grupo ao qual a pessoa
pertence e com o qual se identifica, e o exogrupo, grupo ao qual a pessoa nem pertence nem com o qual se identifica,
são grupos psicológicos definidos em função do nós e do eles. Estes conceitos resultam do processo de categorização,
utensílio cognitivo que nos permite organizar o meio físico e social, mas que também dá origem a comportamentos
com sérias implicações no bem-estar da sociedade. Segundo Jones, o preconceito é uma generalização errada da
categorização de um grupo (estereótipo) para um membro individual, independentemente da veracidade do estereótipo
ou da aplicabilidade do estereótipo ao indivíduo.
O preconceito é um tipo especial de atitude, isto é, uma forma de pensar, sentir ou agir em relação a pessoas, objetos
ou ao meio circundante. Pode ser uma avaliação quer positiva quer negativa e apresenta três componentes: afetivo, ou
sentimentos e pensamentos preconceituosos em face dos membros do grupo, cognitivo, ou crenças e expectativas
acerca dos membros desse grupo, e comportamental, ou ações de discriminação.
Discriminação
Discriminação é a manifestação comportamental do preconceito, que leva a que membros de um grupo particular
sejam tratados de modo positivo ou negativo por causa da sua pertença a esse grupo. Muito embora as atitudes
preconceituosas estejam muitas vezes associadas a comportamentos discriminatórios, o preconceito nem sempre leva à
discriminação e a discriminação nem sempre surge do preconceito. De facto, as pessoas podem discriminar membros
de uma determinado grupo devido a pressões sociais, apesar de não sentirem preconceito em relação a esses membros.
O comportamento discriminatório pode assumir diferentes formas, desde expressões subtis, passando por antilocução
(conversa hostil) e evitamento, até à exclusão, ataque físico ou mesmo extermínio.
Discriminação -----preconceito----estereótipos (três reações ao grupo) sendo uma relação biunívoca entre
discriminação e preconceito. Estereótipos não discriminam

Estudo experimental sobre a discriminação


Um estudo experimental teve como objetivo apreender as reações das agências imobiliárias de Paris perante fenótipos
diferentes. A situação era a seguinte: uma agência imobiliária recebe as visitas de três clientes-atores, um francês, um
português e um antilhano, todos com as mesmas características socio-profissionais, os quais requisitam o mesmo tipo

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de apartamento. Os resultados revelam que existe uma grande distinção entre o português e o francês, por um lado, e o
antilhano, por outro, o qual é muito mais discriminado.
Grupos minoritários
Grupo minoritário refere-se a um sector subordinado da sociedade, que possui traços físicos e culturais pouco
apreciados, ou menosprezados, pelos grupos dominantes. Distingue-se do grupo maioritário pelo poder relativo que
exerce, e não pelo seu tamanho, podendo mesmo ser maior em número do que o grupo maioritário (caso do apartheid
na África do Sul). O grupo minoritário está consciente do seu estatuto e tende a transmitir normas que encorajam a
afiliação.

Categorias de preconceito e discriminação


Racismo
Racismo refere-se à intolerância com base na cor da pele ou na herança étnica, isto é, qualquer atitude, ação ou
estrutura institucional que subordina uma pessoa por causa da sua cor. Assim, o racismo envolve preconceito e
discriminação, e pode ser individual, como a violência contra não brancos ou o menosprezo dos costumes não
brancos, cultural, como a limitação do acesso à educação e ao trabalho, ou institucional, como a discriminação no
empréstimo bancário ou a brutalidade policial.
Apesar do conceito racismo derivar da conceção do século passado da existência de três raças humanas, o termo raça
não se pode aplicar aos seres humanos, pois não existem mais diferenças genotípicas entre pessoas de diferentes etnias
do que entre pessoas da mesma etnia (mais diferenças intraindivíduos não faz sentido falar em raça). Contudo, a
ideologia racista é um instrumento político que legitima o tratamento desigual entre grupos sociais.
Muitas vezes, as distinções baseadas na cor da pele têm mais a ver com distinções entre grupos étnicos. Um grupo
étnico é um grupo de pessoas que partilha antepassados comuns pertencentes a uma dada cultura, bem como
sentimentos de identificação com um grupo distinto. O preconceito com base em distinções étnicas denomina-se de
etnocentrismo, isto é, as pessoas acreditam que o seu grupo étnico é superior aos outros grupos. Faz-se a suposição
que a pessoas etnocêntrica tem preconceitos contra todos os que são estrangeiros ou diferentes dele.
Atitudes em relação à cor e à etnia em crianças
Com o fito de observar as atitudes em relação à cor e à etnia em crianças, Neto (2016) entrevistou uma amostra de
crianças portuguesas entre os 5 e os 11 anos acerca das suas atitudes relativamente ao seu endogrupo português e aos
exogrupos cabo-verdiano e brasileiro. Os resultados revelam que as crianças atribuem mais atitudes positivas (traços
de personalidade, avaliação afetiva) ao endogrupo do que aos exogrupos, revelando assim preferências, mas não
preconceito. Observa-se também variabilidade das atitudes negativas consoante a idade das crianças, mas não
diferenças ao nível do género.

Sexismo
O sexismo é uma forma de preconceito que pode afectar um em cada dois seres humanos, definindo-se como
preconceito e discriminação com base no género. Ocorre sempre que homens e mulheres são colocados em
desvantagem por causa do seu género, mas têm sido as mulheres a sofrer mais os seus efeitos. Os estereótipos sexuais
suscitam diferentes expectativas sobre homens e mulheres e podem diminuir a sua autoconfiança na realização de
papéis sociais. A discriminação sexual é muitas vezes subtil, como no caso de representações visuais nos meios de
comunicação. De facto, nos anúncios publicitários verifica-se que o homem é geralmente representado focando-se o

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seu rosto, enquanto que a mulher é mais retratada com todo o seu corpo, o que leva à sugestão de que se enfatiza a
vida mental dos homens (faceismo) e a aparência física das mulheres.
Heterossexismo
O heterossexismo refere-se ao preconceito contra a homossexualidade, caracterizando-se por um sistema de crenças,
valores e hábitos que exalta a heterossexualidade e estigmatiza qualquer forma não heterossexual de comportamento e
identidade. É preferível ao conceito de homofobia, visto que este implica que o preconceito contra homossexuais seja
um medo irracional. As pessoas que exprimem atitudes contra a homossexualidade tendem a ser mais do sexo
masculino, a pertencer a organizações conservadoras, a ter amigos que têm o mesmo modo semelhante de atitudes
negativas e a ter tido pouco contacto pessoal com homossexuais.

Idadismo
O idadismo refere-se ao preconceito pessoal e institucional relativamente às pessoas idosas, tratando-se de uma
desordem psicossocial (preconceito institucional e individual contra os seniores, estereótipos, elaboração de mitos,
aversão e/ou evitamento). Nos últimos anos, tem-se assistido a uma profunda transição demográfica caracterizada pelo
envelhecimento populacional, o que tem suscitado problemas relacionados com a economia, a saúde e os papéis na
família e na sociedade. O modo como os jovens percecionam os idosos tem implicações importantes, na medida em
que eles terão eventualmente de tratar dos problemas dos idosos e que eles próprios se tornarão idosos.
A face mutante do preconceito
Segundo alguns investigadores, preconceito e discriminação estão em declínio na nossa sociedade, enquanto que para
outros, eles simplesmente têm mudado de forma. Assim, por exemplo, o racismo já não é aceite de modo aberto e a
maior parte das pessoas tenta combatê-lo. Contudo, os membros do grupo maioritário podem estar a dissimular o seu
preconceito e a manifestá-lo de forma mais subtil (racismo simbólico). Os brancos têm sentimentos positivos em
relação aos negros, mas estes sentimentos estão também misturados com sentimentos negativos, mas, em função das
circunstâncias , os sentimentos positivos ou negativos vêm á tona e amplificam-saborde (teoria da ambivalência-
amplificação).
Teste de Associação Implícita
Muitas vezes as cognições sociais operam implicitamente, afetando julgamentos e comportamentos e sendo
introspetivamente inacessíveis. O preconceito pode ser detetado sem que se façam perguntas diretas, através de
medidas implícitas como o tempo de reação. O Teste de Associação Implícita, por exemplo, permite avaliar cognições
sociais implícitas para as quais as medidas explícitas são inadequadas, pois, experimentalmente, verifica-se
discrepância nos resultados segundo a medida, implícita ou explícita, que se use.
O Teste de Associação Implícita recolhe os tempos de latência em tarefas de julgamento, partindo do pressuposto de
que julgamentos congruentes são feitos mais rapidamente do que os incongruentes. Num laboratório virtual, os
sujeitos devem associar rapidamente o rosto de membros quer de um grupo maioritário, quer de um grupo minoritário,
a palavras com uma carga positiva (bom) ou negativa (mau).
Esta prova permite evidenciar incontrolabilidade de atitudes e automaticidade de estereótipos, já que num teste que
utiliza medidas implícitas se torna difícil controlar a desejabilidade social. Os resultados revelam informação que não
estava consciente, sendo muitas vezes uma completa surpresa para os próprios sujeitos. Verifica-se também a
universalidade dos fenómenos de atitudes e estereótipos implícitos, cujo enviesamento se pode revelar tão cedo quanto
aos 4 anos de idade.

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Génese do preconceito e da discriminação
A compreensão da origem do preconceito e da discriminação é necessária para encontrar técnicas que permitam
erradicá-la. Assim, levantam-se questões como:
. de onde provêm os preconceitos contra grupos minoritários?
. porque tendemos a percecionar mais positivamente os membros do nosso grupo do que os de outros grupos?
. que fatores determinam que as relações intergrupais evoluam para relações conflituosas?
Podemos encontrar explicações em diferentes níveis de análise, desde causas sociais amplas (abordagens históricas,
socioculturais) até causas individuais específicas (abordagens psicodinâmicas e cognitivas).
Abordagens históricas e socioculturais (são mais antigas)
Quer as abordagens históricas quer as socioculturais focam-se em fatores e forças sociais que levam ao preconceito.
Por um lado, é necessário analisar o contexto histórico dos conflitos intergrupais para compreender a origem dos
preconceitos em profundidade, como se verifica no caso do preconceito contra os negros nos EUA (com nos aponta
Allport), cujas raízes se encontra na escravatura e no fracasso da reconstrução do sul nos EUA, depois da Guerra
Civil. O preconceito contra as mulheres também pode ser compreendendo pela relação histórica de profissões
consideradas mais apropriadas para homens. Por outro lado, existe evidência do impacto de fatores socioculturais
como o aumento da urbanização e da densidade populacional, a mobilidade de certos grupos e a competição por
empregos. Por exemplo, numa cidade ruidosa, competitiva e acossada por desemprego e violência, as pessoas tendem
a sofrer tensões psicológicas e a responsabilizar um determinado grupo minoritário pelos problemas que enfrentam.
As relações impessoais das grandes cidades colocam os seus habitantes em posições de insegurança e incerteza. Os
fatores económicos, como salientou Karl Marx, podem propagar o preconceito, por força das classes dominantes que
tentam assim explicar a exploração da força trabalhadora
Abordagens situacionais
As abordagens situacionais examinam os fatores do meio imediato da pessoa, como por exemplo a conformidade às
opiniões dos outros, causada pelo desejo de aprovação social, e a interiorização de preconceitos durante a infância,
através de modelagem, através de reforço direto, em contacto com os pais. Estas atitudes preconceituosas são
aprendidas relativamente cedo. Mudanças que ocorrem ao longo do tempo nos estereótipos são também reflexo de
fatores situacionais, como no caso de um país que, quando necessita de mão-de-obra, considera os seus migrantes
como trabalhadores sérios e poupados, e que, numa situação de muito desemprego, os considera já pessoas
indesejáveis.
Abordagens psicodinâmicas (individuais)
As abordagens psicodinâmicas afirmam que o preconceito resulta dos próprios conflitos e desadaptações da pessoa,
sobressaindo duas explicações: o preconceito está enraizado na condição humana, já que deriva da frustração (as
pessoas são vistas como semelhantes ma medida em que a frustração é um característica inevitável da vida quotidiana)
; o preconceito resulta de um tipo de personalidade (procuram-se as diferenças nas personalidades das pessoas). Trata-
se de teorias psicológicas. Ambas as explicações baseiam-se na premissa da externalização, isto é, de que as pessoas
consideram que a causa dos seus problemas se encontra fora delas, projetando assim as suas próprias tensões noutros
indivíduos ou grupos. As pessoas não reconhecem que a causa do problema está dentro delas. Para se modificar o
preconceito e a discriminação devemos focalizar-nos na pessoa com preconceitos.

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Segundo a explicação da frustração, o preconceito é uma forma de agressão, que resulta da frustração. Assim, a
agressão deslocada por parte do grupo maioritário, frustrado por exemplo pelas suas condições socioeconómicas,
vitima os membros do grupo minoritário, o qual se torna um bode expiatório.
Segundo a explicação da personalidade, determinados tipos de personalidade aderem mais ao preconceito do que
outros. De acordo com Adorno, a personalidade autoritária, caracterizada por admiração do poder, hostilidade
recalcada, intolerância rígida aos outros e dominação sobre os fracos, tende a manifestar mais preconceitos sobre os
diferentes grupos minoritários, tende a projetar sobre os outros tendências que não aceite para ele, está muito
preocupado com a pureza da sua consciência. Apesar das limitações metodológicas patentes na escala F de Adorno, é
um facto que as pessoas autoritárias apresentam um estilo rígido de pensamento, tendo assim mais dificuldade em
libertar-se de estereótipos.
Abordagens cognitivas
Os preconceitos podem também resultar de processos cognitivos, isto é, da forma como processamos a informação
social: categorização social, estereótipos, processos atribucionais e crenças sociais.
Categorização social
A categorização social refere-se ao facto de dividirmos o mundo em duas categorias, nós, ou aqueles que
pertencem ao nosso grupo, e eles, aqueles que não pertencem, sendo capazes de fazer esta distinção com base em
características subtis do comportamento. Impressões que são categorizadas e fazem criar falsas expetativas
(conduzem ao estereótipo) relativamente a determinada pessoa. Atribuímos características de grupos sociais. No seu
paradigma do grupo mínimo (método de investigação das condições mínimas requeridas para a ocorrência de
discriminação entre grupos), Tajfel demonstrou que basta um sentimento de pertença a um grupo, na ausência de
competição real, para surgir discriminação intergrupal, ou seja, tratamento favorável face aos membros do endogrupo
(pertença, partilha de mesmos objetivos e normas o que nos leva a tomar atitudes semelhantes) e tratamento
desfavorável face aos membros do exogrupo (diferem de nós devido a determinadas características). A categorização
social é suficiente para suscitar a discriminação social
Os efeitos da categorização social explicam-se pelo facto das pessoas percecionarem mais semelhanças entre
si e os membros do endogrupo e mais diferenças relativamente aos membros do exogrupo (a categorização social
acentua diferenças entre grupos e semelhanças dentro dos grupos). Por outro lado, o viés do endogrupo serve também
para manter uma autoimagem positiva, já que as pessoas retiram aspetos da sua autoimagem de categorias sociais e
assim criam uma identidades social positiva.
Estereótipos
Estereótipos (etimologicamente “chapa tipográfica”) são um conjunto de crenças associadas a grupos sociais
(étnicos, sexuais, etários), as quais são excessivamente generalizadas e frequentemente erradas. Pode explicar-se os
estereótipos a partir da homogeneidade do exogrupo, isto é, da tendência para assumir que há maior semelhança entre
membros de um exogrupo do que dentro de endogrupos.
Os estereótipos surgem mediante correlações ilusórias, que consistem na perceção duma relação que não
existe entre a pertença a um grupo e o facto de possuir certos traços. Por exemplo, num estudo de Hamilton,
apresenta-se uma lista de comportamentos de indivíduos de um grupo A, maioritário, e de um grupo B, minoritário,
tendo ambos a mesma proporção de comportamentos desejáveis e indesejáveis; contudo, as pessoas sobreavaliam os
comportamentos indesejáveis do grupo B, visto que associam ilusoriamente o raro surgimento de um elemento B e de
um comportamento indesejável. Assim, os mecanismos cognitivos que levam a correlações ilusórias podem colocar

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minorias em desvantagem, na forma como são retratadas em estereótipos, fenómeno que é exponenciado pelos meios
de comunicação social.
Além disso, existe evidência de que os estereótipos são mais facilmente confirmados do que infirmados,
possivelmente devido ao facto de relembrarmos mais facilmente a informação que confirma os nossos esquemas
mentais, categorizando a informação contraditória como exceções. Também o efeito da autorrealização de profecias
favorece a estabilidade cognitiva dos estereótipos, visto que a nossa própria atitude face a um membro do exogrupo
pode levá-lo a reagir conforme as nossas expectativas.
Processos atribucionais
O pensamento estereotipado pode distorcer a atribuição, isto é, os processos de explicação do comportamento
dos outros. A rotulagem enviesada refere-se à descrição do mesmo comportamento de modo favorável para o
endogrupo e desfavorável para o exogrupo. O erro irrevogável da atribuição indica que, quando as pessoas veem o
alvo do preconceito a executar uma ação negativa, a atribuem a traços do grupo minoritário (e não a características
individuais). Por outro lado, quando um membro do grupo minoritário é visto a executar uma ação positiva, ela não é
atribuída a disposições internas, mas sim a fatores situacionais ou excecionais.
Crenças sociais
Alguns preconceitos são baseados em ideologias religiosas ou políticas, existindo evidência da correlação
entre ideologias conservadoras e certas formas de preconceito. A ligação religião-preconceito desaparece todavia
quando a religião é encarada em termos de compromisso ético. Já a crença num mundo justo refere-se à crença de que
quem sofre merece o seu sofrimento, o que levar a censurar a vítima.
Redução do preconceito e da discriminação
Os psicólogos sociais têm desenvolvido vários métodos para tentar reduzir o preconceito e combater os seus efeitos
negativos: a tomada de consciência, a hipótese de contacto e o contacto vicariante dos meios de comunicação social.
Tomada de consciência
A tomada de consciência da pertença a um grupo minoritário tenta mostrar à pessoa que sofre algum tipo de
opressão, que este é devido à sua pertença um grupo social, e não a características individuais; esta tomada de
consciência leva à reacção ao sistema social e ao aumento do sentimento de competência e de igualdade. A tomada de
consciência de distinções tenta treinar as pessoas a adoptar um estado de atenção activa face ao outro, para ultrapassar
as distinções prévias do pensamento. O assimilador cultural é uma técnica de sensibilização que ensina acerca das
normas e modos de vida de outro grupo, com o intuito de efectuar atribuições certas sobre o comportamento desse
mesmo grupo.
Hipótese de contacto
A hipótese de contacto baseia-se na ideia de que o grau de contacto entre diferentes grupos pode reduzir o preconceito,
a partir do desenvolvimento de uma nova identidade grupal. Com o aumento de contacto, o exogrupo deixa de parecer
tão ameaçador e homogéneo, e a discriminação pode ser reduzida. Contudo, devem estar presentes quatro condições:
. igualdade de estatuto social, pois o contacto entre pessoas com papéis sociais distintos pode manter o preconceito;
. intimidade do contacto, face-a-face e duradouro, pois este permite individualizar o membro do grupo;
. cooperação intergrupal, a partir da partilha de objectivos em comum, que requerem uma acção interdependente;
. normas sociais que favoreçam a igualdade, pois as pessoas tendem a seguir as directrizes dos seus líderes.
Esta técnica não está isenta de limitações: a ansiedade intergrupal pode criar dificuldades nestes encontros, quer
devido às atitudes do grupo minoritário, quer devido ao receio do grupo minoritário acerca de como agir.

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Contacto vicariante dos meios de comunicação social
Ao longo dos anos, os meios de comunicação têm, intencional ou inadvertidamente, mantido estereótipos e
preconceitos, quer retratando os grupos minoritários através de determinadas características psicológicas, quer
omitindo a sua existência. Por outro lado, é possível utilizar os meios de comunicação para modificar a atitude das
pessoas relativamente aos grupos minoritários, particularmente através de uma exposição prolongada.
Técnica do quebra-cabeças
Aronson foi incumbido de tentar diminuir a tensão interracial nas escolas recentemente de-segregadas dos EUA.
Verificando que a dinâmica psico-social da sala de aula era semelhante à descrita por Sherif, desenvolveu uma técnica
de aprendizagem denominada por técnica do quebra-cabeças. Os alunos foram agrupados em grupos interrraciais de
seis elementos, e cada um tinha de aprender uma parte da lição diária; seguidamente, cada um devia ensinar aos outros
membros a sua lição. Para além de mostrarem uma diminuição no preconceito e um aumento em gostar uns dos
outros, os alunos aumentaram o gosto pela escola, a sua auto-estima e os seus resultados escolares. Em conclusão, o
contacto cooperativo interdependente permite não só aumentar a harmonia interracial, mas também generalizar a
redução do preconceito ao grupo minoritário como um todo.

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3. Relações Íntimas
Relações íntimas
As diversas relações constituem para a maior parte das pessoas um aspecto fulcral das suas vidas, aparecendo sob
diversas formas. Entre a multiplicidade de encontros que temos, só um número muito reduzido vai desembocar em
relações interpessoais, e um número ainda menor entre estas se transforma em relações íntimas. As relações íntimas
são experienciadas na família, na amizade e nas relações românticas. A intimidade pode ser considerada uma
necessidade, oscilando de pessoa para pessoa; também pode ser definida como uma capacidade pessoal de certo modo
estável, perante outra pessoa e em aceitar os sacrifícios e os compromissos associados à manutenção dos mesmos; é
perspetivada muitas vezes como um processo em que duas pessoas tentam aproximar-se uma da outra, conhecer-se
profundamente; tem elementos característicos ou seja abertura ao outro, honestidade, autorevelação recíproca (revelar
factos, sentimentos íntimos e tem papel fundamental nas relações íntimas), o estar tocado pelo parceiro/a e
demonstrar-lhe afeição. Numa meta-análise reunindo 205 estudos publicados refere que as mulheres tendem a auto-
revelar-se ligeiramente mais do que os homens. Todavia, esta tendência é moderada por vários fatores importantes.
Muito particularmente a autorevelação pelos dois sexos ocorre mais a uma mulher que a um homem. Além disso,
quando a pessoa alvo tem uma relação com a pessoa que se autorevela, as mulheres autorevelam-se
significativamente mais; no entanto os homens autorevelam-se mais que as mulheres a uma pessoa estranha. Não há
grandes diferenças entre género. Há sim diferenças culturais.
Dificuldades e importância do estudo do amor
O estudo científico do amor tem se deparado com algumas barreiras, pois até há algum tempo era considerado como
estando fora do âmbito da psicologia social. De facto, pensava-se que o amor era demasiado misterioso e intangível
para ser estudado cientificamente, ou considerado como tabu. Por outro lado, surgem dificuldades práticas no estudo
de um assunto tão complexo: o amor não pode ser facilmente manipulado no laboratório e as suas causas e
consequências não se isolam facilmente. Contudo, nas últimas décadas os psicólogos sociais avançaram algumas
teorias para explicar o amor.
A compreensão do amor tem uma importância decisiva para a sociedade, na medida em que desempenha um papel
relevante nas relações íntimas das pessoas e tem influência no casamento e no divórcio. Segundo os investigadores, o
principal preditor de bem-estar será a vida amorosa, a qual tem um impacto considerável na vida quotidiana da maior
parte das pessoas. Outra investigação demonstrou que a maioria dos homens e das mulheres não casaria sem amor,
mesmo que o potencial noivo/a tivesse todas as características que ele/a desejasse. Em países não ocidentais porém o
casamento sem amor tem mais relevância, dando-se importância a factores como a castidade, a boa disposição e o
desejo de ter filhos.
A experiência do amor
A investigação põe em evidência diversos pensamentos, sentimentos e comportamentos associados ao amor
romântico, que divergem de acordo com as culturas e as épocas históricas. Ms a maior parte da informação advém de
estudos feitos com jovens adultos americanos e essa experiência amorosa é diferente noutras culturas e noutras
épocas históricas. Segundo Prentice, três categorias de comportamentos aparecem sistematicamente correlacionados
com o amor romântico: o romance tradicional (dizer amo-te, beijar), comportamento sexual e actividades rotineiras
feitas em conjunto. Para a maior parte das pessoas, estar apaixonado é uma experiência muito positiva, estando
associada a sentimentos de bem-estar, dificuldade em concentrar-se e a estar nas nuvens.
Variedades de amor

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Definir o amor é uma tarefa complexa e os cientistas sociais não têm ainda uma só definição que seja amplamente
aceite. Perante a diversidade de experiências específicas do amor, os psicólogos sociais têm duas abordagens:
distinguir o amor de outros estados, como a amizade, e identificar os diversos tipos de amor – o amor apaixonado e o
amor companheiro, os estilos de amor, o modelo triangular do amor e a vinculação emocional.
Amor vs amizade
Amor está relacionado com amizade, mas também parecem ser diferentes. Rubin estudou de forma rigorosa a
semelhança e as diferenças entre os dois conceitos, encarando o amor como uma atitude tida por uma pessoa em
relação a outra pessoa, envolvendo predisposições a pensar, sentir e comportar-se de certa forma em relação a essa
pessoa. Assim, o amor é mais do que um sentimento, é uma atitude, tal como a amizade é uma atitude. Rubin
desenvolveu duas escalas, uma de amor e outra de amizade, para medir as atitudes relativamente ao parceiro amoroso
e aos amigos. A sua investigação sugere que o amor e a amizade são experiências que se relacionam, apesar de haver
diferenças qualitativamente importantes entre os dois.
Para Rubin, os três componentes do amor seriam a vinculação a uma pessoa, a preocupação com ela e um sentimento
de exclusividade. A vinculação é a dependência em relação a uma pessoa, que se exprime pela necessidade dela. A
preocupação inclui predisposição para ajudar mesmo à custa de um grande sacrifício. Finalmente, o sentimento de
exclusividade é um sentimento de fusão, partilha de intimidade e autorevelação.
Por outro lado, as principais componentes da amizade seriam a tendência a percepcionar a outra pessoa como sendo
parecida consigo e a avaliação positiva da outra pessoa em várias dimensões (inteligência, julgamento, a maturidade),
correspondendo a sentimentos de respeito e de admiração.
Amor apaixonado vs amor companheiro *
Na cultura ocidental, o amor romântico emergiu historicamente como pilar fundamental do casamento. Todavia, nem
sempre o amor apaixonado está subjacente ao casamento, que pode ser arranjado pela família ou considerado como
uma troca. O amor apaixonado seria demasiado fatigante numa relação a longo termo, e nos casamentos bem-
sucedidos evolui para uma forma mais estável e menos intensa. Foi assim feita uma distinção entre amor apaixonado,
intenso e implicando a necessidade sexual da outra pessoa, e amor companheiro, que se desenvolve gradualmente no
compromisso com outra pessoa.
No amor apaixonado as emoções desempenham um papel central, pois as pessoas são arrebatadas por paixões
incontroláveis que as arrastam de forma irresistível para a pessoa amada. Essa experiência inclui forte activação
fisiológica, idealização do parceiro e atracção sexual apaixonada. Mas há evidência de que o período de tempo dos
envolvimentos apaixonados é moderado, sendo o aborrecimento a principal razão da dissolução dos relacionamentos
amorosos entre estudantes.
O amor companheiro é definido como a afeição que sentimos por aquelas pessoas com quem as nossas vidas estão
profundamente entrelaçadas. A tonalidade emocional do amor companheiro é mais moderada, o valor e a afeição são
mais comuns do que as paixões extremas. O amor companheiro pode fornecer os alicerces para as relações a longo
termo, já que as pessoas têm uma relação íntima e intensa, mas são também bons amigos. As relações permanentes
entre casais evoluem tipicamente do amor apaixonado para o amor companheiro, que se desenvolve devagar à medida
que duas pessoas constroem uma relação satisfatória. De acordo com alguns investigadores, o amor romântico estará
negativamente correlacionado com a duração do casamento, enquanto que o valor da escala de amizade não diminui
com o tempo.
Teoria dos dois componentes

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A teoria dos dois componentes (todos os nossos sentimentos são compostos por duas fatores: uma excitação corporal e
cognitiva) explica o amor apaixonado: as pessoas experienciam amor romântico quando ocorrem duas coisas
simultaneamente  activação fisiológica intensa e informações situacionais que indicam que amor é o rótulo
apropriado para os sentimentos experienciados. Quando estados fisiológicos como excitação ou mesmo emoções
negativas são considerados como sendo devidos à paixão, a experiência é rotulada como amor romântico. Esta teoria
explica assim porque que é que uma pessoa pode ser rejeitada por outra e mesmo assim sentir-se
apaixonada.
A teoria dos dois componentes também sugere uma explicação para o efeito romeu e julieta: pares que experienciam
uma forte interferência dos pais no seu relacionamento tendem a ter mais amor um pelo outro do que pares onde há
pouca interferência. Em consonância com esta teoria, a interferência dos pais aumenta o nível de activação entre os
amantes, o que é então rotulado como sendo devido ao aumento de paixão um pelo outro.
Estudo sobre a activação fisiológica
Existe evidência de que a activação fisiológica pode levar à intensificação da atracção. Num estudo, mediram-se as
reacções a uma entrevistadora atraente por homens que atravessavam uma de duas pontes: uma assustadora ponte
suspensa, oscilando a 70 metros da superfície, e uma ponte vulgar. Quando os sujeitos se encontravam a meio da
ponte, eram abordados ou por um homem ou por uma mulher, que lhes pedia que preenchessem um questionário e
lhes fornecia o seu número de telefone, caso pretendessem mais informações. Os resultados revelam que os sujeitos
contactaram significativamente mais a entrevistadora quando tinham sido abordados na ponte perigosa, sugerindo que
a activação fisiológica intensificou a atracção sentida.
Estilos de amor *
A dicotomia amor apaixonado-amor companheiro pode ser demasiado simples para dar conta de todos os sentimentos
projectados em relação à pessoa amada. Lee propõe uma tipologia constituída por seis estilos de amor, três primários e
três secundários, que incluem também amor apaixonado e companheiro. Entre as suas vantagens contam-se a sua
abordagem multidimensional e a possibilidade de transpôr outras teorias uni- ou bifactoriais para um ou mais estilos
de amor.
Estilos primários
Os estilos primários são Eros, amor apaixonado, Ludus, amor como um jogo, e Storge, amor baseado na amizade,
estando respectivamente associados às cores vermelho, amarelo e azul. As pessoas com amor Eros enfatizam a beleza
e atractividade física do parceiro, são particularmente sensíveis aos seus defeitos físicos e procuram um companheiro
ideal. As pessoas com amor Ludus namoram muito, não assumem compromissos e param a relação quando deixa de
ser engraçada, desprendendo-se facilmente. As pessoas com amor Storge crêem que o amor surge da amizade, que os
parceiros devem partilhar interesses semelhantes e suportam longas separações sem sentir que o relacionamento está
ameaçado.
Estilos secundários
Os estilos secundários são transformações qualitativas da combinação dos estilos primários: Pragma, amor prático
deriva de Storge e Ludus, Mania, amor possessivo deriva de Eros e Ludus, Ágape, amor altruísta deriva de Eros e
Storge. As pessoas com amor Pragma consideram que uma relação tem de funcionar, baseada no planeamento e na
avaliação das características do parceiro, que deve coincidir com as expectativas para a relação. As pessoas com amor
Mania são ansiosas, obsessivas e possessivas, podendo desenvolver doenças para chamar a atenção do parceiro. As

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pessoas com amor Ágape dão sem expectativas de reciprocidade, expressando capacidade de sacrifício, paciência e fé
na pessoa amada.
Love Attitude Scale
Hendrick e Hendrick validaram a teoria de Lee através da medição do perfil quantitativo de amor em estudantes,
dando origem à Love Attitude Scale. Observaram que os casais tendiam a ser semelhantes nos seus estilos de amor, e
que os pares cujas definição de amor romântico diferia eram menos susceptíveis de manter a sua relação. Os estilos de
amor estariam correlacionados com a satisfação com a relação, Eros de modo positivo e Ludus de modo negativo.

Estudo: Semelhanças e diferenças interculturais nos estilos de amor


Levanta-se a questão de saber se este modelo de estilos de amor é encontrado em culturas não ocidentais. Neto
procurou responder a esta questão, investigando uma amostra de indivíduos de diferentes nacionalidades: africanos,
asiáticos, sul-americanos e europeus. Colocou também a hipótese de que algumas atitudes em relação ao amor são
mais afectadas por variações interculturais do que outras. Especificamente, factores envolvendo sentimentos pessoais
fortes, como Mania, Eros e Ágape, deveriam estar livres de influências culturais, e factores envolvendo normas sociais
estritas e, consequentemente, menos afectos, como Ludus, Storge e Pragma, seriam dependentes de influências
culturais. Os resultados demonstram que o modelo de Lee, validado por Hendrick e Hendrick numa amostra
americana, se aplica também em diferentes culturas. Além disso, existe variação intercultural nos valores médios de
Ludus, Storge e Pragma, ao contrário do que ocorre com os outros três estilos de amor. Ao nível do género, os homens
apresentam scores mais elevados em Ludus, efeito que se encontra universalmente, e em Ágape.
Estudo: Variações intergeracionais nos estilos de amor
Neto investigou os estilos de amor presentes em mulheres de três gerações diferentes, para saber de que forma as
orientações amorosas mudam durante o ciclo de vida. Partiu-se de uma amostra constituída por jovens adultas (filhas),
adultas de meia-idade (mães) e adultas idosas (avós) da mesma família. Partiu-se das hipóteses propostas na literatura
de que existem semelhanças nas atitudes entre gerações, devido à transmissão de atitudes na família, mas de que há
também diferenças nas atitudes entre gerações, devido às influências do grupo de pares. Verifica-se, no entanto, que a
continuidade intrafamiliar pode não ser aparente até uma certa altura da vida, ou seja, que as mães e as avós pouco
diferem nas suas atitudes, mas que apresentam uma diferença acentuada relativamente às filhas. Além disso, e ao
contrário da maioria da investigação nesta área, que afirma que a paixão declina ao longo dos anos, este estudo
conclui que o envelhecimento não diminui o estilo erótico, que acompanha o ciclo vital. Não é um fenómeno
circunscrito às idades mais novas, apesar do envelhecimento afectar a expressão sexual.
Modelo triangular do amor
Sternberg propôs um modelo triangular para conceptualizar as semelhnças e as diferenças entre diferentes espécies de
amor, que seria composto por uma componente emocional, a intimidade, uma componente motivacional, a paixão, e
uma componente cognitiva, a decisão/compromisso, formando o vértice de um triângulo. A intimidade refere-se aos
sentimentos de proximidade e de união, a paixão aos impulsos que levam ao romance, e a decisão/compromisso aos
elementos cognitivos envolvidos no compromisso potencial a longo termo. Sternberg identificou oito espécies
diferentes de amor, dependendo da presença e da ausência de cada componente. Por exemplo, uma relação que
envolve compromisso, mas não intimidade nem paixão é descrita como amor vazio, enquanto que uma relação com as
três componentes é chamada de amor perfeito e pode encontrar-se não só nalgumas relações amorosas de adultos,
como também em algumas relações entre pais e filhos.

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Vinculação emocional
Hazan e Shaver analisaram o amor segundo a perspectiva da teoria da vinculação de Bowlby e Ainsworth, segundo a
qual as crianças desenvolvem fortes laços emocionais em relação às pessoas que cuidam delas, laços que lhes dão um
importante sentido de segurança. Hazan e Shaver propõem que as relações amorosas dos adultos são semelhantes às
vinculações infantis, isto é, os estilos de envolvimento romântico dos adultos podem ser seguros, inseguros-evitantes
ou inseguros-ambivalentes. Assim, as primeiras relações amorosas com os pais influenciam o modo como se aborda
os envolvimentos românticos adultos.
Os adultos com vinculações românticas seguras sentem ser fácil obter relações íntimas com outras pessoas, e
descrevem a sua relação amorosa actual como feliz, amistosa e digna de confiança; tendem a ser altos em Eros e
Ágape. Os adultos com vinculações românticas inseguras-evitantes sentem-se desconfortáveis na obtenção de
intimidade, descrevendo a sua relação amorosa actual como medrosa e ciumenta; tendem a ser baixos em Eros e
Ágape. Os adultos com vinculações românticas inseguras-ambivalentes procuram intimidade, mas preocupam-se que
o outro não manifeste reciprocidade, descrevendo a sua relação amorosa actual como obsessiva, carnal e ciumenta;
tendem a ser altos em Mania.
A investigação sobre vinculação denota que a procura e o evitamento da intimidade tem as suas raízes na história do
desenvolvimento da pessoa. Estas experiências de vinculação podem, por sua vez, modelar os autoconceitos da pessoa
na sua capacidade e desejo consciente de contacto social íntimo.
Sexualidade: variações segundo gerações e culturas
Na nossa sociedade, a sexualidade constitui um dos comportamentos sociais mais importantes, apesar do seu estudo
científico ter sido considerado tabu até há pouco tempo. O comportamento sexual e as reacções à sexualidade variam
segundo as gerações e as culturas, e no mundo ocidental ocorreram mudanças no sentido de maior liberdade e
tolerância, no que ficou conhecido por revolução sexual. Esta afectou sobretudo as mulheres e caracteriza-se por
permissividade das atitudes e dos comportamentos sexuais, bem como por representação explícita da sexualidade.
Todavia, nos anos 80 as atitudes relativamente à sexualidade começaram a inflectir, em resultado de factores de saúde
e de mudança para valores mais conservadores.
O comportamento sexual é um acto biológico que está imbutido na cultura, visto que perpetua o grupo cultural, e
assim os seus padrões variam grandemente à volta do mundo. Por exemplo, beijar é um comportamento que
acompanha relações íntimas em muitas culturas, havendo no entanto algumas em que nunca se utiliza. Em muitas
culturas, a homossexualidade e a masturbação são comportamentos considerados normais.
Atitudes em relação ao uso do preservativo *
Apesar do uso adequado do preservativo constituir um dos modos mais eficazes de protecção contra a gravidez não
planeada e contra doenças transmitidas sexualmente, as atitudes negativas em relação ao preservativo podem
desencorajar o seu uso por parte dos jovens. A escala norte-americana da UCLA parte do princípio que a decisão de
usar preservativo não é uma escolha unidimensional, muito menos estritamente racional, sendo afectada por questões
interpessoais altamente emocionais. A multidimensionalidade das atitudes em relação aos preservativos reveste-se de
complexidade, encontrando-se os seguintes factores: a fiabilidade e eficácia atribuída aos preservativos; o prazer
sexual associado ao uso dos preservativos; os sentimentos de embaraço em relação à compra de preservativos; os
sentimentos de embaraço acerca da negociação a propósito da utilização do preservativo com o parceiro sexual; a
imagem social negativa (estigma) ligada aos utilizadores de preservativos.

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A partir da escala da UCLA, Neto efectuou a validação intercultural da Escala Multidimensional das Atitudes em
Relação à Utilização do Preservativo, cujos resultados evidenciam quatro aspectos. Primeiro, emerge uma estrutura
factorial que revela a multidimensionalidade das atitudes face ao preservativo, pondo em causa qualquer tipo de
análise que tenha em conta apenas uma dimensão. Segundo, exceptuando o factor de sentimentos de embaraço acerca
da negociação, há diferenças em função género nas atitudes em relação ao preservativo: os homens acreditam mais na
sua eficácia, mas admitem maior embaraço na sua aquisição, enquanto que as mulheres associam o preservativo é a
mais prazer sexual e a uma imagem social mais positiva. Terceiro, a posição perante a religião influencia as atitudes
em relação preservativo, pois os crentes praticantes revelam atitudes mais negativas do que os não crentes. E
finalmente, as pessoas mais igualitárias na ideologia do papel de género manifestam atitudes mais positivas, quer
sejam homens ou mulheres.
Sociosexualidade
A sociosexualidade refere-se às diferenças individuais na propensão em enveredar em relações sexuais
descomprometidas. A sociosexualidade pode ser avaliada pelo Inventário de Orientação Sociosexual (SOI), construto
unidimensional que permite discriminar entre os indivíduos com mais restrições e aqueles com menos restrições. Os
indivíduos com mais restrições tendem a ser mais introvertidos, agradáveis e de vinculação segura, iniciando a vida
sexual mais tarde com um parceiro com quem estão comprometidos. Os indivíduos com menos restrições tendem a ser
mais extrovertidos, impulsivos, desagradáveis e de vinculação insegura, iniciando a vida sexual mais cedo, com maior
número de parceiros e menos nível de compromisso.
Tanto homens e mulheres apresentam preferências para Ludus e Pragma.
Ao nível do género, os homens tendem a ter menos restrições do que as mulheres, sendo que aquelas que têm menos
restrições apresentam maior desajustamento psicológico, tal como solidão romântica e afecto negativo. Este resultado
intrigante pode dever-se ao facto destas mulheres se sentirem culpadas por romperem o padrão de comportamento que
é esperado delas, pois o duplo padrão sexual vigente é mais permissivo para os homens do que para as mulheres.
Dúvidas relativamente à unidimensionalidade do SOI e à sua consistência interna levaram à criação do SOI Revisto,
que apresenta três dimensões: comportamento sexual, atitudes face ao sexo descomprometido e desejo sexual. Os
resultados do SOI revisto confirmam que a sociosexualidade não é um construto unitário, mas tem várias facetas. Os
resultados apontam que os scores de sociosexualidade são superiores à medida que a idade avança, bem como nas
mulheres de esquerda; por outro lado, as mulheres religiosas têm valores mais baixos.

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4. Solidão
Definição
A solidão é uma experiência dolorosa que se tem quando as relações sociais não são adequadas, sendo um fenómeno
espalhado e um tema central na literatura. Trata-se de um fenómeno frequente na população geral, pois 15 a 30% das
pessoas admitem sentimentos persistentes de solidão, isto é, sentem-se sós sempre ou a maior parte do tempo. A
investigação sobre a solidão aumenta a partir dos anos 70, sendo até essa altura negligenciada: por um lado devido ao
estigma social associado aos investigadores que se interessavam pelo tema, por outro devido à dificuldade de
manipulação laboratorial.
De entre a multiplicidade de definições avançadas pelos investigadores, há acordo nos seguintes aspectos: a solidão é
uma experiência subjectiva desagradável, que pode não estar relacionada com o isolamento objectivo, e que deriva de
algum tipo de relacionamento deficiente. Salientamos a definição de Perlman e Peplau, que definem a solidão como
uma experiência desagradável que ocorre quando a rede de relações sociais de uma pessoa é deficiente nalgum aspecto
importante, quer quantitativa quer qualitativamente. O âmago da solidão é a insatisfação em relação ao
relacionamento social, e, por isso, pode ser sentida quando se está rodeado de outras pessoas. Finalmente, solidão
distingue-se dos conceitos objectivos de isolamento social, que se refere a não possuir elos com outras pessoas, e de
viver só, que pode ser medido pelo tamanho do lar.
Formas de solidão *
Têm sido utilizadas várias tipologias para distinguir diferentes formas de solidão. Pode distinguir-se entre ansiedade-
solidão, de carácter aversivo e resultante da alienação entre as pessoas, e ansiedade existencial, que permite o
autocrescimento e faz parte da experiência humana. Pode também ser classificada relativamente à sua duração: a
solidão-traço refere-se às pessoas solitárias com historial de sentimentos crónicos de solidão, enquanto que a solidão-
estado se refere a curtas experiências de solidão, sentidas em momentos específicos da vida. Os indivíduos que
apresentam a solidão como traço de personalidade tendem a generalizar o sentimento de solidão para novos contextos
de vida, sendo muitas vezes incapazes de travar novos contactos sociais. É também possível fazer uma distinção ao
nível do défice social implicado, existindo solidão social, devida à falta de uma rede social de amigos e conhecidos, e
solidão emocional, devida à falta de uma relação pessoal íntima, e sendo esta a forma mais dolorosa.
Sentimentos da solidão
Diferentes pessoas em diferentes situações sentem a solidão de forma distinta, estando assim associada a uma vasta
gama de sentimentos. A partir dum estudo em que se pediu às pessoas para indicar o que sentiam quando estavam sós,
Rubenstein determinou quatro dimensões de sentimentos: desespero, depressão, aborrecimento impaciente e
autodepreciação. Outro estudo efectuado com pessoas viúvas ilustra a abundância de sentimentos que acompanham a
experiência de solidão, que incluem desejo do passado, frustração com o presente e medo acerca do futuro.
Abordagens teóricas
As diferentes concepções teóricas sobre a solidão diferem ao nível da evidência em que se baseiam, da natureza da
solidão e das suas causas. Modelo psicodinâmico: perceciona a experiência de solidão como uma força dinâmica,
provocadora e patalógica e atribuem a solidão a experiências da infância. A maior parte das teorias estão ligadas ao
trabalho clínico ou à teoria existente. Os autores vêem normalmente a solidão como uma experiência desagradável,
excepto a abordagem existencialista, e como um fenómeno experienciado por uma grande parte da população. A
maior parte das abordagens salientam os factores correntes como causas, excepto a dinâmica, que defende os

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antecedentes da infância. Apesar da diversidade das abordagens, existe consenso sobre a dimensão temporal da
solidão: pode ser sentida em relação ao passado, ao presente ou ao futuro.
Avaliação
A abordagem unidimensional de avaliação da solidão encara-a como um fenómeno unitário que varia sobretudo em
intensidade, o que pressupõe que uma mesma escala geral seja sensível à experiência de diferentes pessoas em
diferentes situações. O instrumento unidimensional mais utilizado é a Escala de Solidão da UCLA, que recorre a uma
avaliação indirecta para diminuir o efeito da desejabilidade social. Através da sua adaptação à língua portuguesa, Neto
demonstrou a existência de uma correlação negativa entre solidão e autoconceito, e uma correlação positiva entre
solidão e ansiedade social. Já a abordagem multidimensional considera a solidão como um fenómeno multifacetado
que não pode ser apreendido por uma só medida global, e tenta diferenciar entre vários tipos de solidão. A SELSA é
um instrumento multidimensional que avalia tanto a solidão social como a solidão emocional, romântica e familiar.
Factores
Factores sociodemográficos *
Há certos grupos de pessoas mais vulneráveis à solidão do que outros, e é possível desenhar uma cartografia social
dos factores sociodemográficos que mais influenciam a solidão: ser jovem ou idoso de idade avançada, ser viúvo ou
divorciado, ser pobre, ter pais divorciados, independentemente de ser homem ou mulher.
Relativamente à idade, e apesar da diversidade de resultados dos estudos realizados, podemos dizer que a curva de
solidão desenha um U, sendo superior nos jovens e nos idosos comparativamente aos adultos. Contrariamente aos
estereótipos, as pessoas idosas não são o grupo que mais sofre de solidão, possivelmente porque possuem expectativas
mais realistas acerca das relações sociais. Nalguns estudos, a média de solidão dos jovens é o dobro da dos idosos,
talvez devido à sua maior necessidade de relações sociais. A solidão poderá diminuir ao longo do ciclo vital, à medida
que a vida social do adulto se estabiliza.
Ao nível do sexo, não se encontram diferenças na solidão sentida por homens e mulheres, caso se recorra a medidas
indirectas de avaliação, isto é, caso não se questione directamente os sujeitos se se sentem sós. Neste tipo de
avaliação, os homens expressam a sua solidão de modo mais livre do que em inquéritos com questões directas. De
facto, quando se recorre à avaliação directa, os homens indicam sentir menos solidão do que as mulheres, o que se
pode dever a auto-censura, para corresponder aos estereótipos sexuais.
Relativamente ao estado civil, observa-se que as pessoas casadas são menos sós do que as não casadas. Dentro deste
grupo, as pessoas divorciadas ou viúvas são mais sós do que as solteiras. O grau de solidão destas não difere
comparativamente às pessoas casadas, o que sugere que a solidão poderá ser mais determinada pela perda da relação
conjugal do que pela sua ausência. Entre as pessoas casadas, são as mulheres as mais sós, mas entre as pessoas viúvas
ou divorciadas são os homens.
Verifica-se ainda que as pessoas mais pobres são mais sós do que as ricas (apesar desse resultado não ter sido
encontrado em Portugal), possivelmente porque tempo e dinheiro permitem manter mais facilmente relações sociais.
Pessoas cujos pais se divorciaram antes de terem 18 anos sentem-se mais sós na idade adulta, e muito especialmente
se o divórcio ocorreu antes de terem 6 anos. Dentro do grupo de risco encontram-se também cuidadores,
desempregados, emigrantes e pessoas cuja visão ou audição é deficiente.
Solidão nos idosos: estudo meta-analítico
Uma meta-análise sobre a solidão nas pessoas idosas aponta para a existência duma curva em U entre a idade e a
solidão, pois na meia-idade as pessoas tendem a ter uma rede social estável, enquanto que nos idosos há perda de

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relações. Verifica-se que os principais factores de risco associados à solidão em idosos são: reduzida qualidade dos
contactos sociais, estando a qualidade mais fortemente associada do que a quantidade; a baixa frequência dos mesmos;
institucionalização, pois idosos a residir em lares são mais sós do que os que vivem em casa; limitações nas
competências quotidianas; e baixos rendimentos, que apresentam uma associação mais forte do que a instrução. As
mulheres afirmam sentir mais solidão, possivelmente devido à viuvez, mas também devido a serem mais capazes do
que os homens a admitir sentimentos negativos.
Factores situacionais e pessoais
Para além de características sociodemográficas, a interacção entre factores situacionais e pessoais também causa
solidão. Alguns determinantes externos que reduzem a quantidade e qualidade de interacções sociais são menos
contacto social, perda de relações, redes sociais inadequadas, novas situações e fracassos. Por exemplo, a entrada para
a universidade associada a mobilidade geográfica pode criar perturbações nas redes sociais, conduzindo ao surgimento
desses factores e, consequentemente, à experiência da solidão.
A predisposição para a solidão não causa necessariamente essa experiência, mas torna as pessoas mais vulneráveis a
factores situacionais. Certas pessoas são mais susceptíveis de experienciar solidão do que outras, particularmente
quando possuem características como depressão, autoconceito negativo, baixa autoestima, timidez, falta de
habilidades sociais e são diferentes. Estas características influenciam a solidão, quer reduzindo a desejabilidade social,
quer condicionando o comportamento do próprio. Assim, é possível traçar um quadro compósito das pessoas
solitárias: são pessimistas, tímidas e diferentes.
Atribuições causais da solidão
De forma a prever e aliviar a solidão, as pessoas procuram perceber os motivos por que se sentem sós. O modelo de
Weiner permite observar quatro tipos de explicação da pessoa relativamente à sua solidão, os quais se baseiam na
combinação de duas dimensões: locus de causalidade (interno vs externo) e estabilidade (estável vs instável). Segundo
Peplau, os sentimentos mais severos de solidão surgem quando se faz atribuições internas e estáveis, isto é, quando se
acredita que não se tem relações satisfatórias devido às suas próprias qualidades permanentes e indesejáveis. Quando
fazemos atribuições internas e instáveis somos capazes de controlar o estado de solidão, o que ajuda a diminuir
sentimentos de malestar.

Estratégias de confronto *
As pessoas diferem nas acções específicas que realizam para lidar com a solidão, que podem ser organizadas em
quatro tipos principais. Dois são positivos e construtivos: o contacto social, como chamar ou visitar um amigo, e a
solidão activa, como estudar ou tocar música. Um é negativo e potencialmente autodestrutivo, a passividade triste,
como dormir ou comer em demasia. Um é ambíguo, gastar dinheiro, que pode tornar-se uma actividade positiva ou
negativa, consoante a pessoa.
Segundo Perlman e Peplau, observa-se três estratégias globais de confronto com a solidão. As pessoas podem reduzir
a sua necessidade de contacto social, envolvendo-se em actividades que são agradáveis de fazer sozinhas. Também
podem vencer a solidão aumentando os seus contactos sociais, iniciando conversas com outras pessoas e associando-
se a clubes. A inscrição numa universidade sénior é exemplo desta estratégia, existindo evidência de que reduz a
solidão e aumenta a auto-estima. A terceira abordagem refere-se a reduzir o fosso entre o nível desejado e realizado
de contacto social, reduzindo expectativas e ajustando-se à realidade da situação.

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5. Influências Sociais
Influências sociais
A influência social envolve o exercício de poder social por uma pessoa ou grupo, para mudar as atitudes ou o
comportamento de outras pessoas numa determinada direcção. Existem diferentes modalidades de influência social:
condescendência, normalização, conformidade, odediência e inovação.
Condescendência
A condescendência ocorre quando as pessoas concordam em comportar-se de acordo com um pedido directo de outro
sujeito ou grupo. Contudo, as pessoas podem concordar ou discordar em privado com a acção com que se
comprometeram ou podem ter ou não opinião sobre o assunto. É um dos modos mais básicos que se utilizam para
influenciar as pessoas. Existem quatro estratégias para se obter condescendência: a associação de um pedido com
situações positivas ou bom humor (quando é feito um pedido muito rapidamente as pessoas condescendem quando
estão de bom humor; muitas vezes dizem-se coisas agradáveis sobre a pessoa antes de fazermos o pedido); a norma de
reciprocidade em que é feito um pedido após se ter prestado um favor (utilizar um pequeno favor para obter uma

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concessão muito maior, ou a técnica 'Não é tudo'- situação em que o sujeito acredita numa redução súbita de preços -,
ou técnica da porta na cara – primeiro faz-se um grande pedido que as pessoas podem bater com a porta e depois um
mais pequeno, sendo muito utilizada nas negociações políticas e sindicais); a criação de compromisso, muitas vezes
levando uma pessoa a concordar primeiro com um pedido inicial mais pequeno (técnica do pé na porta) ou sob
condições falsas (técnica do favor disfarçado); o recurso à reactância psicológica, tornando o objecto um fruto
proibido ou escasso ( as pessoas sentem ameaçada a sua liberdade de escolha, experienciam ativação desagrável –
retactância – que as levas a restaruar a sua liberdade).
Normalização
Paradigma experimental de Sheriff *
Sheriff elaborou uma experiência para investigar o processo de normalização, isto é, de elaboração conjunta de uma
norma colectiva que considerou ser o protótipo do processo psicológico da formação de uma norma no grupo. A
normalização implica uma influência recíproca dos elementos de um grupo em situações em que não existe consenso
da maioria sobre uma resposta correcta, estando os indivíduos incertos quanto às suas respostas.
Na situação experimental, os sujeitos deviam observar uma pequena fonte luminosa imóvel, que parecia mover-se
aleatoriamente em diferentes direcções (efeito autocinético), na obscuridade total e que parecia mover-se de forma
mais ou menos caótica. Os investigadores mediam a amplitude do movimento percebido pelos sujeitos. Há duas
condições experimentais: numa, o sujeito efetua primeiramente a experiência individualmente e depois em grupo;
noutra, efectua primeiramente a experiência em grupo e de seguida só. Nesta situação experimental, os sujeitos devem
dar uma resposta incerta num contexto físico ambíguo, numa situação nova sem normas colectivas, onde não
conhecem os outros sujeitos, e com pouco compromisso pessoal.
Os resultados mostram que, na primeira condição, surge um efeito de funil ao longo das sessões, isto é, as respostas
individuais dadas na situação individual tendem a convergir para uma norma colectiva durante situação em grupo. Já
na segunda condição, a norma comum surge desde a primeira sessão em grupo e é mantida pelos sujeitos quando
passam para a situação individual, o que demonstra que ocorreu interiorização da norma colectiva. O estudo de Sheriff
chama a atenção para o facto de que, quando se está numa situação de incerteza, é-se susceptível de efectuar
julgamentos sob influência de outros, e de continuar a usar a perspectiva do grupo mesmo na sua ausência. A
influência do grupo é implícita, não há pressões sobre o indivíduo-alvo, também não são consideradas boas ou más
respostas, todas são incertas e não existem normas previamente formadas antes da experiência.
Replicação de Postmes em contexto de internet *
Postmers efectuou um estudo experimental para tentar saber se ainda ocorre convergência de atitudes individuais para
a norma colectiva quando o grupo interage na internet. Neste sentido, organizou-se um debate virtual acerca de três
tópicos: legalização de drogas, monarquia e homossexualidade. Os sujeitos pertenciam a duas nacionalidades, ingleses
e holandeses, e foram distribuídos por duas condições: individualizada, na qual estão identificados pelas suas iniciais e
nacionalidade, e despersonalizada, na qual não estão identificados. Os resultados indicam que o efeito de formação de
normas colectivas ocorre na condição individualizada, mas não na condição despersonalizada. Pode concluir-se que,
quando os participantes conhecem os membros do novo grupo, as suas atitudes tendem a convergir para uma norma
colectiva. Porém, quando não conhecem os membros do novo grupo, recorrem às normas comuns do seu endogrupo,
neste caso, do seu país.
Conformidade e independência
Definição

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A conformidade ocorre quando os indivíduos modificam os seus comportamentos ou atitudes para aderirem às normas
sociais existentes, isto é, às regras que indicam o comportamento adequado em situações específicas, em resultado de
pressões físicas ou simbólicas por parte de um líder ou grupo. A conformidade diferencia-se da condescendência
(concordar em comportar-se de acordo com um pedido directo) em dois aspectos: envolve uma mudança de
comportamento em relação ao grupo e deriva de pressão e não de um pedido.
Paradigma experimental de Asch *
Asch investigou sistematicamente em que medida os indivíduos resistem ou se conformam às pressões de grupo,
quando este tem um ponto de vista contrário à evidência. No seu estudo original, os grupos experimentais eram
compostos por oito sujeitos: um sujeito ingénuo, o único a ser testado, e restantes sujeitos compadres, que davam uma
resposta pré-programada. Dizia-se aos sujeitos que a experiência tinha como objectivo testar a sua percepção visual e
pedia-se que julgassem qual de três linhas era igual em comprimento a uma linha padrão. Os sujeitos compadres
davam unanimemente respostas erradas em dois terços dos ensaios, colocando assim o sujeito ingénuo em posição
minoritária. Esta situação experimental possui um carácter constrangedor, pois o sujeito ingénuo tem de fazer um
julgamento público, e sente uma contradição entre a experiência perceptiva, que só apresenta uma resposta correcta, e
a unanimidade do grupo.
Os resultados mostram que trabalhando a sós, os sujeitos raramente cometiam erros de julgamento perceptivo.
Contudo, após os compadres darem respostas erradas, cerca de um terço dos sujeitos dava também essa resposta, isto
é, conformava-se. Se, por um lado, cerca de 10% dos sujeitos se conformaram dez ou mais vezes, por outro, cerca de
um quarto nunca se conformou. Este estudo evidencia o poder dos outros em influenciar-nos, ao ponto de imitarmos
um julgamento que sabemos ser contrário aos factos. Todavia, verifica-se também uma considerável percentagem de
indivíduos que mantiveram a sua independência e capacidade de estar acima da pressão grupal.
Paradigma experimental de Crutchfield
O paradigma experimental de Asch apresenta o inconveniente de ter de recorrer a sujeitos compadres, pelo que
Crutchfield recorreu a um aparelho de sinalização eléctrica para recolher simultaneamente respostas de vários sujeitos.
Na sua situação experimental, os sujeitos encontram-se em cabinas contíguas, utilizando botões para dar respostas
que, crêem, serão apresentadas aos outros sujeitos. Os resultados são semelhantes aos de Asch, mas o nível de
conformidade é ligeiramente mais baixo, possivelmente devido ao isolamento e anonimato. De facto, esta situação
experimental é menos pública e intimidadora do que a de Asch, contudo a situação de grupo é bem menos realista.
Factores situacionais *
Podemos indicar cinco factores situacionais, ou características do contexto social, que explicam o processo de
conformidade: tamanho, unanimidade, coesão, estatuto e compromisso público prévio. Embora o tamanho do grupo
seja uma variável importante, a conformidade não aumenta regularmente com o tamanho. Na verdade, atinge-se o
máximo de conformidade quando a maioria é de três ou quatro pessoas. Se por um lado, um grupo maioritário
unânime pressiona a pessoa a conformar-se, por outro, um grupo desunido reduz bastante a conformidade.
Psicologicamente, a existência de um dissidente demonstra que é correcto discordar da maioria. A coesão refere-se ao
grau de comprometimento dos membros com o grupo, e quanto mais elevada for, maior a pressão para a
conformidade. Verifica-se que as pessoas que se mantêm mais independentes sob pressão social são as que possuem
elevado ou baixo estatuto, visto que ambas têm menos a perder em termos de posição social. Por outro lado, as
pessoas mais conformistas pertencem à classe média. Finalmente, é mais fácil resistir a uma maioria se uma pessoa já
possui um compromisso público prévio com uma opinião contrária.

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Factores pessoais
Crutchfield encontrou dois tipos de características pessoais ao nível da conformidade: os conformistas e os
independentes. Os conformistas tendem a ser autoritários ou submissos, a possuir valores conservadores, necessidade
de aprovação social, medo de rejeição e baixa auto-estima. Por outro lado, os independentes têm scores F mais baixos,
são mais estáveis emocionalmente e assertivos. Todavia, verifica-se que a relação entre personalidade e conformidade
é fraca e inconsistente, pois as características pessoais interagem com os diferentes factores situacionais.
Relativamente ao género, não se encontram diferenças no grau de conformidade e independência de homens e
mulheres.
Factores culturais *
Segundo o paradigma ecocultural, a conformidade é produto de condições culturais e uma característica estável dos
estereótipos: certos grupos têm indivíduos conformistas e outros condescendentes, enquanto que outros necessitam de
indivíduos independentes e assertivos. Verifica-se que sociedades com elevada acumulação alimentar (comunidades
agrícolas) enfatizam a obediência e a responsabilidade, enquanto que sociedades com baixa acumulação alimentar
(comunidades de caçadores e pescadores) acentuam a independência e a realização individual. Relativamente aos
valores culturais de individualismo-colectivismo, verifica-se que a conformidade é maior nas culturas colectivistas,
onde é vista positivamente como sinal de autocontrolo e maturidade, do que nas individualistas. No caso da cultura
japonesa, as pessoas são muito conformistas quando se encontram com membros do seu grupo, ao passo que se
mantêm independentes na presença de pessoas estranhas. Pode concluir-se que, quanto mais interdependentes forem
as vidas das pessoas, maior a probabilidade de ocorrer conformidade.
Obediência
Paradigma experimental de Milgram *
A obediência ocorre em situações em que as pessoas mudam o seu comportamento em resposta a ordens directas dos
outros, os quais têm autoridade legítima para influenciar o seu comportamento em certas situações sociais. O estudo
experimental paradigmático acerca da obediência é o de Milgram, que colocou a seguinte pergunta de investigação:
até que ponto as pessoas comuns obedecem cegamente às ordens de uma figura investida de autoridade?
Nesta situação experimental, dois sujeitos desempenhavam os papéis de aluno (sujeito compadre) e professor (sujeito
ingénuo). O professor devia colocar perguntas ao aluno e administrar-lhe choques eléctricos progressivamente mais
fortes (de 15 a 450 volts) sempre que as respostas dadas estivessem erradas. Ao longo da sessão, o professor escuta
uma pré-gravação em que o suposto aluno se queixa de dores causadas pelos choques e afirma querer abandonar a
experiência. O professor vê-se numa situação que exige que tome uma acção: acatar as ordens do experimentador, que
o incita a continuar apesar dos protestos do aluno, ou recusar-se a continuar e abandonar a sala.
Contrariamente a todas as expectativas, todos os sujeitos, independentemente do género, obedeceram até aos 300 volts
e 65% obedeceram até ao final de 450 volts, apesar de mostrarem agitação e protestos verbais. Os resultados das
experiências de Milgram demonstram o assustador consentimento das pessoas em inflingir dor a vítimas inocentes
devido a ordens de figuras investidas de autoridade.
Factores situacionais e pessoais
Identificaram-se os seguintes factores situacionais do nível de obediência: proximidade da vítima, proximidade da
autoridade, pressão do grupo, contexto institucional e características pessoais do sujeito. Relativamente à proximidade
física, os sujeitos obedecem menos quando estão mais perto da vítima e quando a figura de autoridade se encontra
longe ou dá ordens pelo telefone. Já quando se encontram em grupo, os sujeitos obedecem mais na presença de

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colegas obedientes e menos na presença de colegas rebeldes, o que revela pressão à conformidade. Variando o
contexto institucional, observou-se que a obediência se mantinha num grau elevado mesmo numa instituição com
pouco prestígio.
Apesar de não se encontrar diferenças entre homens e mulheres nos níveis médios de obediência, estes variam em
função de características de personalidade. Por exemplo, os sujeitos submissos tendem a ver o aluno como responsável
pelo sucedido têm características autoritárias mais pronunciadas e um tipo de pensamento moral menos avançado.
Questões suscitadas
O procedimento experimental de Milgram para estudar a obediência é um dos mais criticados relativamente aos
problemas éticos que coloca. Para alguns investigadores, a experiência coloca em risco a saúde emocional, a
dignidade e a auto-estima dos participantes, apesar de Milgram ter efectuado um debriefing com cada participante,
explicando o procedimento e promovendo o diálogo acerca do sucedido. Demonstrou também que a maioria dos
participantes julgavam a experiência positiva e consideravam ter aprendido algo importante acerca de si próprios.
Outra questão suscitada é a capacidade de generalização dos valores médios de obediência à vida real. Alguns
investigadores consideram que nesta situação experimental não havia uma alternativa racional à obediência, ao que
Milgram respondeu indicando a considerável percentagem de pessoas que desobedeceu.
Replicação parcial de Burger *
Burger propôs-se a replicar parcialmente o estudo de Milgram, desenhando um procedimento experimental, a 150 volt
solution, que apresenta condições éticas específicas e tem como tecto de intensidade dos choques eléctricos uma baixa
voltagem de 150 volts. Burger efectuou um processo rigoroso de selecção dos participantes, que foram assegurados
várias vezes de que podem sair do estudo a qualquer momento e mesmo assim receber a recompensa monetária. A
experiência foi conduzida por um psicólogo clínico, que se assegurava do bem-estar do participante ao longo da
sessão.
Burger colocou como hipótese de investigação que encontraria poucas diferenças relativamente aos resultados de
Milgram, já que os factores situacionais são semelhantes em ambos os estudos. Os resultados indicam que, na
condição base, 70% dos sujeitos foram até ao fim (83% no estudo original), o que permite generalizar que
continuariam até aos 450 volts. Numa segunda condição, na qual um sujeito compadre, que finge ser também
participante, se recusa a continuar, houve apenas uma ligeira redução de sujeitos obedientes, para 63%. Relativamente
a diferenças individuais, não foram encontradas diferenças de género, mas há indícios da influência de
traços de personalidade como empatia e desejo de controlo.
Concluindo, o estudo de Burger demonstra dois aspectos significativos. Por um lado, é possivel replicar o estudo de
Milgram tendo em conta os padrões éticos actuais, com certas salvaguardas e em determinadas situações. Por outro, as
pessoas continuam a obedecer hoje em dia, o que Burger explica pelos seguintes factores, que tendemos a
desvalorizar: obediência à autoridade como aprendizagem social, aumento gradual de exigência, pouca informação
sobre esta nova situação e responsabilidade difusa ou não assumida.
Inovação
Processos psissociais que explicam a influência efectiva das minorias *
A inovação refere-se ao processo de criação de novas normas com o intuito de substituir as existentes. Se bem que a
inovação possa vir de cima, em resultado dos que possuem crédito, poder e autoridade para impô-la, o mais frequente
é que proceda de indivíduos ou grupos minoritários que carecem de toda a competência social. As minorias nem
sempre estão desprovidas de poder perante as maiorias, podendo fazer prevalecer os seus pontos de vista. Dois

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processos psicossociais explicam a influência efectiva das minorias: o estatuto e poder das minorias e o seu estilo de
comportamento.
Segundo Hollander, as pessoas que possuem posições de elevado estatuto e poder sobre os outros podem utilizar esses
recursos para tornar maioritário um ponto de vista inicialmente minoritário. Para a influência ser efectiva, os
indivíduos devem primeiramente acumular crédito idiossincrático, isto é, demonstrar que se conformam às normas do
grupo e que possuem elevada competência. Caso demonstrem desde cedo inconformidade às normas colectivas, o seu
ponto de vista minoritário não terá influência efectiva.
Já Moscovici demonstrou que a minoria é mais influente quando apresenta um estilo de comportamento consistente,
sendo persistente e lógica. Perante uma minoria consistente, a maioria pode deixar-se influenciar, repensando as
questões e adoptando a resposta ou ponto de vista minoritário.

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