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25/07/2019

A TRANSFERÊNCIA NA CLÍNICA
PSICANALÍTICA

TEORIA E PRÁTICA

Profa. Dra. Rosana Coelho

A pré-história da Psicanálise

• Hipnose
- Charcot se diferencia da psiquiatria do
século XIX e admite que pode haver uma
doença sem lesão anatômica aparente,
o que o leva à “descoberta” da histeria.
- No inverno de 1885, Freud vai a Paris e
assiste ao curso de Charcot. Adere, de
forma entusiástica, ao modelo fisiológico
oferecido por ele para a histeria.

- Charcot postula que o sistema nervoso pode ser


dotado de uma predisposição hereditária para, em
decorrência de um trauma psíquico, produzir um
estado hipnótico que torna a pessoa suscetível à
sugestão.
- O trauma formaria um estado hipnótico
permanente, que poderia se manifestar no corpo
por uma paralisia, uma cegueira ou qualquer outro
sintoma.
- O estado hipnótico que o médico produzia na
clínica seria algo parecido, só que temporário.
Nele, o papel da sugestão é idêntico ao
desempenhado na situação traumática, com a
diferença apenas de não ser permanente.

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- Na medida em que o trauma em questão não é de


ordem física, surge a necessidade do paciente
narrar a sua história pessoal para que o médico
possa localizar o momento traumático responsável
pela histeria. O que Charcot não esperava é que
nessas narrativas surgissem sistematicamente
histórias cujo componente sexual desempenhasse
um papel preponderante.
- Freud adere ao tratamento por hipnose formulado
por Charcot e introduz duas modificações:
1 - O paciente deve ser afastado do convívio
familiar, considerado por ele como o gerador
de crises, e internado em um hospital;

2 - Como as causas do trauma são


inconscientes, o método para eliminar os
sintomas consiste em dar ao paciente, sob
hipnose, uma sugestão que remova o distúrbio.
Mas, como esse procedimento apenas elimina os
sintomas e não remove a causa do trauma, Freud
propõe que se utilize um método elaborado por
Breuer, que consiste em fazer o paciente
remontar, sob efeito hipnótico, à pré-história
psíquica da doença, a fim de que possa ser
localizado o acontecimento traumático que
originou o distúrbio.

- Mais tarde, Freud dá mais ênfase ao método


utilizado por Breuer  colocando o paciente
sob hipnose, Breuer utilizava o método
catártico, o qual produzia uma descarga do
afeto que originalmente estava ligado à
experiência traumática.
- A função da hipnose, quando utilizada com o
método catártico, era a de remeter o paciente
ao seu passado de modo que ele próprio
encontrasse o fato traumático, produzindo-se,
em função disso, a ab-reação, ou seja, a
liberação da carga de afeto.

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• Freud acrescenta uma novidade à técnica de Breuer:


enquanto este permanece passivo diante da torrente
de fatos narrados pela sua paciente, não procurando
influenciá-la em nada, Freud passou a empregar a
sugestão como meio terapêutico. Assim, Freud
identificava os fatos traumáticos e usava a sugestão
para eliminá-los ou pelo menos para debilitá-los em
sua força patogênica.
• A prática da sugestão foi abandonada
posteriormente por Freud, que passou a privilegiar o
método mais investigativo de Breuer.

• Em 1895, Freud e Breuer publicam “Estudos sobre


a histeria” e formulam a noção de defesa
psíquica.
• Freud abandona a hipnose e alicerça a teoria
psicanalítica no conceito de recalque.
• Ao pedir aos pacientes para se lembrarem dos
fatos traumáticos, Freud percebe que tanto sua
insistência quanto os esforços do paciente
esbarram em uma resistência (de natureza
inconsciente) que impede que as ideias
patogênicas se tornem conscientes.

• A natureza destas ideias eram aflitivas, capazes


de despertar emoções de vergonha, de
autocensura e de dor psíquica.
• A defesa é uma forma de censura por parte do
ego do paciente à ideia ameaçadora, forçando-a a
manter-se fora da consciência. "O „não saber‟ do
paciente histérico seria, de fato, um „não querer
saber‟” (Freud, [1895] 1976, p. 265).
• O recalque é o mecanismo psíquico pelo qual a
carga de afeto, ligada a uma ideia aflitiva, se
“desliga” desta e se “liga” a outra ideia que seja
passível de se tornar consciente, ou seja, uma
ideia que seja suportável para o ego.

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TRANSFERÊNCIA: PRINCIPAIS CONCEITOS


PSICANALÍTICOS
• Freud formula um narcisismo primário e normal
(autoerotismo).
• Há uma superposição do narcisismo primário e o
secundário (megalomania).
• O narcisismo secundário é induzido pelos objetos
• O narcisismo infantil é moldado pelo narcisismo
dos pais (papel da repressão no estabelecimento
dos critérios narcísicos).

TRANSFERÊNCIA: PRINCIPAIS CONCEITOS


PSICANALÍTICOS
• O ego se mede por um ideal, o qual, por sua vez,
opera na repressão: “Esse ego ideal é agora o alvo
do amor de si mesmo desfrutado na infância pelo
ego real” (Freud, [1914] 1976, p. 111, grifei).
• “O que o ego projeta diante de si mesmo é o
substituto do narcisismo perdido de sua infância,
no qual ele era o ideal” (Freud, [1914] 1976, p.
111).
• A idealização é um processo que diz respeito ao
objeto, mas é possível tanto na esfera do ego
quanto na do objeto (o ego também é um objeto).

TRANSFERÊNCIA: PRINCIPAIS CONCEITOS


PSICANALÍTICOS
• A formação de um ideal aumenta as exigências do
ego e constitui o fator mais poderoso a favor da
repressão.
• O ideal do ego/superego é a instância que vigia o
ego e o compara constantemente com o ideal.
• O ideal do ego impõe padrões aos objetos pelos
quais eles são amados ou rejeitados.
• “Aquilo que possui a excelência que falta ao ego
para torna-lo ideal é amado” (Freud [1914] 1976,
p. 118).

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TRANSFERÊNCIA: PRINCIPAIS CONCEITOS


PSICANALÍTICOS
• O ideal do ego não é só individual, mas também
social, pois constitui o ideal de uma família, uma
classe, uma nação (Freud [1914] 1976, p. 118).
• Por isso a culpa é o sentimento que predomina
quando o Ego não atinge o ideal.
• “A identificação é conhecida pela psicanálise como
a mais remota expressão de um laço emocional
com outra pessoa” (Freud, [1921] 1976, p. 133,
grifei).

Transferência e sugestão
Psicoterapia da Histeria (1895)
• Freud utiliza ainda a sugestão como método de
tratamento e análise, mas utiliza pela primeira vez o
conceito de transferência.
• O principal obstáculo ao tratamento decorre da
relação da paciente com o médico, em três casos
principais:
a) Quando há uma desavença pessoal entre o médico
e a paciente;
b) Quando a paciente é tomada pelo medo de ficar
dependente do médico;

Transferência e Sugestão
c) Quando a paciente se assusta ao perceber que está
transferindo para a figura do médico as representações
aflitivas que emergem do conteúdo da análise.
• A transferência é uma ocorrência comum à análise, e
toda a reivindicação em direção à figura do médico é
uma transferência.
• O mecanismo da transferência supõe:
a) no passado, o recalcamento de um desejo;
b) no presente e na relação com o médico, o despertar
do mesmo esforço que fez com que esse desejo
fosse recalcado (falsa ligação).

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Sobre o amor transferencial


• O amor transferencial traz consigo a perda do
interesse no tratamento, o “abandono” do sintoma,
e afirmações de que não precisa mais de análise.
• Acarreta a perda de toda a compreensão do
tratamento e todo o interesse nele.
• A paciente não falará ou ouvirá a respeito de nada
que não seja o seu amor, e exige que seja
retribuído.
• A resistência utiliza o amor a fim de inviabilizar a
continuação do tratamento, desviar todo o seu
interesse do trabalho analítico e colocar o analista
em posição de impotência.

Sobre o amor transferencial


• É tão desastroso para a análise que o anseio da
paciente por amor seja satisfeito, quanto que seja
suprimido.
• O analista tem de tomar cuidado para não se
afastar do amor transferencial, repeli-lo ou torná-lo
desagradável para a paciente; mas deve,
igualmente, recusar-lhe qualquer retribuição.
• Deve manter a compreensão de que ele é uma
repetição, na relação com o analista, das relações
amorosas que fazem parte da vida da paciente, para
que possa manejar a transferência de forma a
remontar o amor transferencial às suas origens
inconscientes.

Sobre o amor transferencial


• Quanto mais claramente o analista permite ao
paciente perceber que ele está à prova de sucumbir
à sedução do paciente, mais prontamente poderá
extrair da situação o seu conteúdo analítico.
• Manejando a transferência nessa posição, a
paciente se sentirá segura para falar de suas
fantasias, seus desejos sexuais, das características
de seu estado amoroso. Ao falar sobre isso, “ela
própria abrirá o caminho para as raízes infantis de
seu amor” (Freud, *1914+ 1969, p. 216).

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Transferência e Resistência
• Na análise, a transferência surge como a resistência
mais poderosa ao tratamento.
• Se as associações de um paciente faltam, é
indicativo de que ele está dominado por uma
associação relacionada com o próprio médico ou
com algo a este vinculado.
• Essas características da transferência, não devem
ser atribuídas à psicanálise, mas sim à própria
neurose.

Transferência e Resistência
• O manejo da transferência precisa ter como foco a
liberação do conteúdo que foi recalcado, o que é,
de longe, a maior fonte de resistência.
• “A resistência acompanha o tratamento passo a
passo. Cada associação isolada, cada ato da pessoa
em tratamento tem de levar em conta a resistência
e representa uma conciliação entre as forças que
estão lutando no sentido do restabelecimento e as
que se lhe opõem” (Freud, *1912+ 1969, p. 138)

Transferência e Resistência
• À medida em que um tratamento analítico progride e o
paciente se dá conta de que as deformações do
material da análise não podem, por si próprias,
oferecer qualquer proteção contra sua revelação, mais
sistematicamente faz ele uso de um tipo de
deformação que obviamente lhe concede as maiores
vantagens : a deformação mediante a transferência.
Então, todo conflito tem de ser analisado na esfera da
transferência.
• “A transferência, no tratamento analítico,
invariavelmente nos aparece, desde o início, como a
arma mais forte da resistência, e podemos concluir que
a intensidade e persistência da transferência
constituem efeito e expressão da resistência” (Freud,
[1912] 1969, p. 139).

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Referências
• FFREUD, S. & BREUER, J. (1893). Sobre o mecanismo
psíquico dos fenômenos histéricos: uma conferência.
Obras Completas Standard Edition, Volume II. Rio de
Janeiro: Imago, 1988.
• FREUD, S. (1893-1895). Estudos sobre a histeria. Obras
Completas. Standard Edition, Volume II. Rio de Janeiro:
Imago, 1988.
• Freud, S. (1912). A dinâmica da transferência. Obras
Completas. Standard Edition. Volume XII. Imago: Rio de
Janeiro, 1969.
• Freud, S. (1912). Recomendações aos médicos que
exercem a psicanálise. Obras Completas. Standard
Edition. Volume XII. Imago: Rio de Janeiro, 1969.

Referências
• FREUD, S. (1914). Sobre o narcisismo: uma
introdução. Obras completas. Volume XIV, Standard
Edition. Rio de Janeiro, Imago, 1976.
• Freud, S. (1914) Observações sobre o amor
transferencial. Obras Completas. Standard Edition.
Volume XII. Imago: Rio de Janeiro, 1969.
• FREUD, S. (1915). O Inconsciente. Obras completas.
Volume XIV, Standard Edition, Rio de Janeiro:
Imago, 1976.
• FREUD, S. (1915). A pulsão e suas vicissitudes.
Obras Completas. Standard Edition, Volume XVII.
Rio de Janeiro: Imago, 1974.

Referências
• FREUD, S. (1921). Psicologia das Massas e Análise
do Eu. Obras completas. Volume XVIII, Standard
Edition, Rio de Janeiro, Imago, 1976.
• FREUD, S. (1923-1925). O Ego e o Id. Obras
completas. Volume XIX, Standard Edition, Rio de
Janeiro, Imago, 1976.

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