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UNIVERSAIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS

Departamento de Artes – Teatro

Resenha entregue pelo acadêmico Jorge


Alessandro ao professor Carloman Bonfim
para obtenção de crédito na disciplina
Laboratório II

Resenha apontando semelhanças e diferenças entre os processos criativo e


colaborativo, com base na leitura dos textos:

NICOLETE, Adélia. Criação coletiva e Processo colaborativo: Algumas semelhanças e


diferenças no trabalho dramatúrgico.
SANTOS, Clóvis Domingos dos. A Cena Invertida e a Cena Expandida: projetos de
aprendizagem e formação colaborativas para o trabalho do ator

Ao longo de muitos séculos da vida teatral, o texto dramático ocupou um espaço


privilegiado e central, pois reunia em si o conteúdo, a forma e o sentido da representação
teatral; uma espécie de bússola a guiar diretores, encenadores e equipe técnica na busca pela
melhor performance. Observa-se que neste processo, o ator estava submetido a uma dupla
submissão, uma vez que o texto subjugava o olhar do diretor e este, por sua vez, determinava
os caminhos do ator como intérprete.
A autonomia do ator para a descoberta e elaboração participativa de uma dramaturgia
é uma conquista de pouco mais de meio século. Ora, é na década de 60, contemporâneo a
muitas outros fenômenos de amadurecimento de processos artísticos, como a Pop art, a Body
art, o Novo Realismo francês e a arte conceitual, que o teatro encontrou também as
possibilidades de experimentar novas linguagens, redesenhando o seu objeto artístico.
A segunda metade do século XX assistiu a um vertiginoso aumento dos grupos de
teatro, esta célula criativa que conquistou seu espaço na contramão das grandes companhias
de atores e atrizes e os elencos efêmeros. O Teatro de Grupo se apresentou, cada vez mais,
como espaço privilegiado para a construção de uma obra coletiva, onde o ator assume uma
posição de autoria, redefinindo de uma vez por todas o seu papel criativo.
Tornou-se possível falar, portanto, de uma dramaturgia do ator. Uma dramaturgia que
não chega pronta das páginas do texto teatral, mas que se concretiza no ensaio, espaço de
criação e espaço pedagógico, onde se aprende e se experimenta, onde aprendizados são
trocados num ambiente de formação contínua.
Clóvis Domingos dos Santos, em sua dissertação, estabelece uma conexão entre este
ambiente de democracia e liberdade festejado pelas bandeiras políticas nos anos 60 e 70 e a
noção de autonomia consagrada por Paulo Freire no livro Pedagogia da autonomia (1996).
Para Freire, a consciência do homem como ser inacabado, sujeito que só se completa e se
liberta quando está em permanente movimento de busca de sua voz, está na base desta
transformação.
Também é importante lembrar que, no Brasil dos anos 60 e 70, o ambiente da ditadura
e da repressão social apressou o desejo de democratizar os meios culturais, o que contribuiu
para a ritualização do teatro coletivo. Grupos como o Asdrúbal Trouxe o Trombone (1974), o
Pod Minoga (1972), União e Olho Vivo (1972) são importantes expressões desta lavra artística.
Vivendo num ambiente impositivo e opressor, onde as relações de poder se impunham
de cima pra baixo, não é de estranhar que os grupos de teatro suscitassem um ambiente de
igualdade e horizontalidade das relações hierárquicas.
Neste primeiro momento, a Criação coletiva representa saída a todo autoritarismo: o
autor será sumariamente abolido e substituído pelo ator-autor. Não que esta função se
desenvolva de modo autônomo, mas em pé de igualdade com todos os componentes do
trabalho criativo. O ator-autor se soma a todos os outros atores, autores como ele, resultando
no trabalho do grupo-autor. Segue-se um rodízio de funções no qual o ator se converte em
elemento central do processo e, como produto de suas improvisações, pode nascer, além do
texto, ideias de cenários, figurinos, luz, etc.
Este processo coletivo envolvia uma natural informalidade. Não havia prazos, muitas
vezes os objetivos eram nebulosos e se a experimentação criativa era vigorosa, não havia uma
experiência acumulada que pudesse fixar a própria trajetória do processo. Era, ainda, uma
abordagem da criação totalmente empírica que se resumia, muitas vezes, em experimentação
sobre a experimentação.
No começo dos anos 90, no Brasil – mais especificamente em São Paulo – grupos de
encenação e pesquisa se multiplicavam na cena teatral e retomavam a prática coletiva por
meio do Processo Colaborativo. São desse período, montagens importantes de Gerald Thomas,
Ulysses Cruz, Bia Lessa, Gabriel Vilella, entre outros. No entanto as características da criação
coletiva dos anos 70 são retomadas com considerável transformação: cada função artística é
preservada, principalmente as funções desta tríade de criadores: diretor, dramaturgo e atores.
O que se o processo colaborativo requer é o diálogo constante no ato criativo, um
lugar democrático para que as ideias sejam fomentadas e, assim, se complementem. Na
colaboração, importa muito como cada ator se coloca diante do tema escolhido para a
montagem e como este ator concebe a melhor estética para a cena. O ato criador exige o
corpo e presença do ator e ao mesmo tempo, a atenção e envolvimento do pesquisador: o
ator toca, dança, representa, cria textos e personagens, pesquisa, treina e assina o próprio
trabalho.
Um conceito que se destaca é o de Ator propositivo. Nas palavras de Silva, o ator
propositivo “é um ator que já não é o ator da marca, mas um ator que pensa, que discute os
rumos do trabalho. Esse é um ator ligado ao conceito e discussão do trabalho como um todo”
No Processo Colaborativo, cria-se um espaço para a circulação de conceitos, materiais
e procedimentos, mantendo-se respeitadas as funções de cada profissional da cena, em vista
ao melhor resultado estético, constantemente afinado pelo grupo-autor. Neste processo, a
figura do dramaturgo é destacada; ele deverá intervir com ideias, transformar as sugestões,
elaborar a síntese e conferir unidade ao texto. É ele quem assina o arranjo criado em
colaboração com todos os envolvidos.
Na Criação Coletiva, vimos a quase obrigatoriedade de se conservar todo o material
individual angariado nos exercícios criativos. Num processo colaborativo, o diretor deve
conservar ambiente propositivo, mas “sem democratismos”, uma vez que o alvo estético deve
ser perseguido com rigor e método, evitando a colagem prolixa e caótica.

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