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EREMITA 2020
Escrituras colectivas

MANIFIESTO

Andarilhando em busca do invisível,


o sangue,
a escuta e as vozes para além de si
as curvas,
os atalhos,
a terra afundada em ecos e tantos e futuros possíveis e passados também.
Ele aparece como pausa,
suspensão,
decanto sensível de mundos,
de olhos e vísceras,
de orelhas e silêncios,
de tempo,
de escuro,
de tempo,
de luz
e de tudo
e de todo.

Sou um eremita
porque preciso me conhecer
para conhecer o outro,
pra mergulhar
nas entranhas escuras
pra buscar o silêncio
pra escutar o escuro
pra estar com as estrelas

para entender o outro,

por conseguinte,
me entender neste macrocosmo,
constituído de corpos,
Sou um eremita
porque o corpo não nos pertence,
não pertence a somente um.
Somos um corpo,
um único movimento com trocas e conexões,
respiramos o mesmo ar,
vivemos ou morremos em breve ou mais tarde...
Este ar está virilizado para todos os corpos,
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corpos que se conectam.

Sou um eremita
pra estar abraçada ao cosmos
pra sentir o redondo da terra
pra caminhar devagar
devagar pra dentro
cada vez mais profundo
cada vez mais escuro
cada vez mais só
e só cheia de cosmo
juntos,
experimentando a troca,
marcando a memória coletiva
e seguindo com ela.

Eu estava muito bem por lá...


na caverna
¿Pra que voltar ao mundo?

Para partilhar
compartilhar
por lealdade
por compaixão
por pura saudade
Porque sozinho já nos conhecemos pelos intercâmbios e trocas,
nossa memória é coletiva,
façamos uma boa trama de mútua colaboração.

Experiências e vivências transformadoras para um futuro melhor,


para contribuir para um mundo melhor e que nos habita.
Nós não habitamos no mundo, ele nos habita.

Seguimos pra saborear a solitude

Carta para Eremita:

Querido Eremita,
Não quero evitar a viagem - essa se faz inevitável.
Não quero evitar a solidão - essa é há muito desejada.
Não quero saber dos segredos do silencio, pois anseio escutá-lo.
Só quero te pedir que me empreste, por um sopro de tempo,
uma faísca da tua escura luz.
04 de dezembro de porque nasci com cheiro revelador da minha sensação de
orfandade.
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Sem conexão com as estrelas.


Esqueci.
Simplesmente, esqueci da minha condição estelar.
E Júpiter deu meia volta, rasgando o meu meio do céu.
Um aviso em cartografia.
E a terra me engoliu.
Engoliu para me lembrar.
Fui mastigada pela boca da terra como rolete de cana-de-açúcar, entre dentes
terrosos, mais uma vez.
Até que me auto cuspi.
Me (des)encavei.

Eu estava muito bem por lá...


na caverna
¿Pra que voltar ao mundo?
Escolho crescer.
Seguir.
Emerjo da terra.
Costurando meu passado, no cruzo do presente.
Salivando sobre as cicatrizes,
as minhas e as das que vieram antes.

Querido Eremita,
agradeço-te pelos solavancos, cortes, mortes.
Arrancastes as pontas secas da minha cabeleira.
E como dói, me curar de mim!
Acessar minhas águas irrigadoras de alma.
Quase me afogo em lágrimas.
Tão escuro e molhado.
Tudo escorrega no teu ventre-caverna.
Ah, meu querido ...
sei bem que és também querid(a).
Embaixo dessa barba se esconde uma velha sábia.
Esperanço que, como eu, outras tenham se (des)encavado.
Prometo honrar nosso encontro.
Daqui para frente me juntarei,
caminharei junto,
compartilhando,
e sorrindo,
e respirando,
e amando,
e sonhando em ação,
enlaçada com o chão e sob o sol.
Até quando me for permitido.

De nada sou dona, essa lição eu aprendi


¿Pra que voltar ao mundo?
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¿para entender o outro?


¿para um futuro melhor?
para contribuir
para um mundo melhor
Nós não habitamos no mundo
ele nos habita.

Querido Eremita
volte para o mundo e troque comigo
assim mudaremos o mundo.
Esqueci.
Simplesmente,
esqueci da minha condição estelar.
Prometo honrar nosso encontro.
Daqui para frente me juntarei,
caminharei junto,
compartilhando,
e sorrindo, e respirando, e amando,
e sonhando em ação, enlaçada com o chão e sob o sol.

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