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MATERIAL COMPLEMENTAR

BACHARELADO EM DIREITO – 1º PERÍODO


INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO
Prof. Dr. Adriano Fábio (adrianofabio@hotmail.com)

AULA 5
DIREITO E MORAL
REALE Miguel. Lições Preliminares de Direito. 25ª Ed., São Paulo. Editora Saraiva, 2001.

A TEORIA DO MÍNIMO ÉTICO

A teoria do mínimo ética consiste em dizer que o sendo o maior o da Moral, e o círculo menor o do
Direito representa apenas o mínimo de Moral Direito. Haveria um campo de ação comum a ambos,
declarado obrigatório para que a sociedade possa sendo o Direito envolvido pela Moral.
sobreviver. Como nem todos podem ou querem
realizar de maneira espontânea as obrigações “Tudo que é jurídico é moral, mas nem tudo que é
morais, é indispensável armar de força certos moral é jurídico”.
preceitos éticos, para que a sociedade não afunde. A
Moral é cumprida de maneira espontânea, mas como Há que distinguir um campo do Direito que, se não é
as violações são inevitáveis, é indispensável que se imoral, é pelo menos amoral, o que induz a
impeça, com mais vigor e rigor, a transgressão dos representar o Direito e a Moral como dois círculos
dispositivos que a comunidade considerar secantes. Podemos dizer que dessas duas
indispensável à paz social. representações – de dois círculos concêntricos e de
dois círculos secantes – a primeira corresponde à
O Direito não é algo de diverso da Moral, mas é uma concepção ideal, e a segunda, à concepção real ou
parte desta, armada de garantias específicas. pragmática das relações entre o Direito e a Moral.
A teoria do mínimo ético pode ser reproduzida
através da imagem de dois círculos concêntricos,

DO CUMPRIMENTO DAS REGRAS SOCIAIS

A Moral é o mundo da conduta espontânea, do mesmo, e não pela interferência de terceiros. A Moral
comportamento que encontra em si próprio a sua deve contar com a adesão dos obrigados. Quem
razão de existir. O ato moral implica a adesão do pratica um ato, consciente da sua moralidade, já
espírito ao conteúdo da regra. Só temos, na verdade, aderiu ao mandamento a que obedece.
Moral autêntica quando o indivíduo, por um
movimento espiritual espontâneo realiza o ato A Moral é incompatível com a violência, com a força,
enunciado pela norma. ou seja, com a coação, mesmo quando a força se
manifesta juridicamente.
Só é possível praticar o bem, no sentido próprio,
quando ele nos atrai por aquilo que vale por si

DIREITO E COAÇÃO

O cumprimento obrigatório da sentença satisfaz ao Há três posições diferentes em face da relação entre
mundo jurídico, mas continua alheio ao campo o Direito e a força: uma teoria imbuída de eticismo
propriamente moral. Existe entre o Direito e a Moral, absoluto, que sustenta que o Direito nada tem a ver
uma diferença básica: a Moral é incoercível e o com força, não surgindo, nem se realizando graças à
Direito é coercível. O que distingue o Direito da intervenção do poder público. Haveria, segundo os
Moral, portanto, é a coercibilidade. adeptos dessa doutrina, no tocante ao Direito, a
mesma incompatibilidade que há com a Moral. Essa
Coercibilidade é uma expressão técnica que serve teoria idealiza o mundo jurídico, perdendo de vista o
para mostrar a plena compatibilidade que existe que efetivamente acontece na sociedade.
entre o Direito e a força.
Em campo oposto, tem uma teoria que vê no Direito
uma efetiva expressão de força. O Direito se reduz a

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“norma + coação” ao defini-lo como a “organização Na doutrina da coação há uma verificação da


da força”. compatibilidade do Direito com a força, o que deu
Segundo essa concepção, poderíamos definir o lugar ao aparecimento de uma teoria que põe o
Direito como sendo a ordenação coercitiva da problema em termos mais rigorosos: é a teoria da
conduta humana. coercibilidade, segundo o qual o Direito é a
ordenação coercível da conduta humana.
A coação é um conceito jurídico, dando-se a
interferência da força em virtude da norma que a Para uns a força está sempre presente no mundo
prevê, a qual pressupõe outra manifestação de força jurídico, é imanente a ele e inseparável dele. Para
e outra norma superior, até se chegar a uma norma outros a coação do Direito não é efetiva, mas
pura ou à pura coação. potencial.

DIREITO E HETERONOMIA

Podemos criticar as leis, mas devemos agir de Direito é heterônomo, visto ser posto por terceiros
conformidade com elas. Isto significa que elas valem aquilo que juridicamente somos obrigados a cumprir.
objetivamente, independentemente e a despeito da
opinião e do querer dos obrigados.

Os terceiros são o Estado e que o Estado é


Essa validade objetiva e transpessoal das normas constituído pela sociedade dos homens, estamos nos
jurídicas, as quais se põem acima das pretensões dos governando a nós mesmos.
sujeitos de uma relação, superando-as na estrutura
de um querer irredutível ao querer dos destinatários,
denominada heteronomia. Kant afirma ser a Moral
autônoma e o Direito heterônomo.
O Direito é a ordenação heterônoma e coercível da
conduta humana.

BILATERALIDADE ATRIBUTIVA

O pensamento jurídico contemporâneo, com mais relação ficam autorizados a pretender, exigir ou a
profundeza, não se contenta nem mesmo com o fazer algo.
conceito de coação potencial, procurando penetrar Esse conceito desdobra-se nos seguintes elementos
mais adentro na experiência jurídica, para descobrir a complementares:
nota distintiva essencial do Direito. Esta é a
bilateralidade atributiva.  Bilateralidade em sentindo social, como
intersubjetividade: sem relação que una duas ou
Moral se distingue do Direito pelo elemento mais pessoas não há Direito;
da bilateralidade atributiva ou intersubjetividade ,
dando a esses termos um sentido talvez equivalente  Bilateralidade em sentido axiológico:
ao que enunciamos com o acréscimo do adjetivo para que haja Direito é indispensável que a
atributivo. relação entre os sujeitos seja objetiva, insuscetível
de ser reduzida, unilateralmente, a qualquer dos
Há bilateralidade atributiva quando duas ou mais sujeitos da relação;
pessoas se relacionam segundo uma proporção
objetiva que as autoriza a pretender ou a fazer  Atributividade: da proporção estabelecida
garantidamente algo. Quando um fato social deve resultar a atribuição garantida de uma
apresenta esse tipo de relacionamento dizemos que pretensão ou ação, que podem se limitar aos
ele é jurídico. sujeitos da relação ou estender-se a terceiros.

Bilateralidade atributiva é uma proporção No caso de enlaces contratuais, nenhuma das


intersubjetiva, em função da qual os sujeitos de uma pessoas deve ficar à mercê da outra, pois a ação de
ambas está subordinada a uma proporção

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transpessoal ou objetiva, que se resolve numa Proporção objetiva – basta que a relação se estruture
relação de prestações e contraprestações recíprocas. segundo uma proporção que exclua o arbítrio (que é
o não-Direito) e represente a concretização de
interesses legítimos.
BREVES DADOS HISTÓRICOS

O Direito só deve cuidar da ação humana depois de Se o Direito cuida das ações exteriorizadas, somente
exteriorizada; a Moral, ao contrário, diz respeito aquilo que se projeta no mundo exterior fica sujeito à
àquilo que se processo no plano da consciência. O possível intervenção do Poder Público. A coação
Direito rege as ações exteriores do homem, ao passo somente surge no momento em que a atividade do
que as ações íntimas pertencem ao domínio especial indivíduo se proteja sobre a dos demais indivíduos a
da Moral. A Moral e o Direito ficavam totalmente ponto de causar-lhes dano.
separados, sem possibilidade de invasão recíproca
nos seus campos, de maneira que a liberdade de O Direito jamais cuida do homem isolado, em si e de
pensamento e de consciência recebia, através de per si, mas sim do homem enquanto membro da
doutrina engenhosa, uma tutela necessária. sociedade, em suas relações intersubjetivas, até
mesmo quando o que se quer tutelar é a
subjetividade individual.

CONFRONTO COM AS NORMAS DE TRATO SOCIAL

Há na sociedade outra categoria de regras que são dispensável aderir a seu conteúdo: nesse ponto, as
seguidas por força do costume, de hábitos regras de trato social coincidem com o Direito, no
consagrados, ou, como impropriamente se diz, em que este possui de heteronomia.
virtude de “convenção social”. São as normas de
trato social, que vão desde as regras mais As regras costumeiras são bilaterais, tanto como as
elementares do decoro às mais refinadas formas de da Moral, mas não são bilateral-atributivas, razão
etiqueta e de cortesia. pela qual ninguém pode exigir que o saúdem
respeitosamente: a atributividade surge tão somente
Esses tipos de regras ocupam uma situação quando o costume se converte em norma jurídica
intermediária entre a Moral e o Direito. As normas consuetudinária, ou então quando o ato de cortesia
convencionais compartilham da espontaneidade e se transforma em obrigação jurídica, como se dá com
incoercibilidade próprias da Moral. Quem desatende a a saudação militar ao superior hierárquico, que passa
essa categoria de regras sofre uma sanção social, tal ser “continência”.
como a censura ou o desprezo público, mas não
pode ser coagido a praticá-las. Podemos distinguir as notas distintivas dos três
campos da Ética:
Para que seja atendida uma norma de trato social
basta a adequação exterior do ato à regra, sendo

Quadro do Miguel Reale


Coercibilidade Heteronomia Bilateralidade Atributividade
MORAL - - + -
DIREITO + + + +
COSTUME + + + -

Quadro do Paulo Nader


DIREITO MORAL REGRAS DE TRATO SOCIAL PRECEITOS RELIGIOSOS
Bilateral Unilateral Unilaterais Unilaterais
Autônoma com ressalvas à Ética
Heterônomo Heterônomas Autônomos
Superior e à Moral Social
Exterior Interior Exteriores Interiores

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Coercível Incoercível Incoercíveis Incoercíveis


A sanção geralmente é
Sanção prefixada Sanção difusa Sanção difusa
prefixada.

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