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Propagação e Radiação de Ondas Eletromagnéticas em

Ambientes Urbanos

Sérgio Daniel Dias Pereira

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

Engenharia Electrotécnica e de Computadores

Júri
Presidente: Prof. Doutor Fernando Duarte Nunes

Orientador: Prof. Doutor António Luís Campos da Silva Topa

Vogal: Profa Maria Emília Morais da Fonseca e Silva da Costa Manso

Fevereiro 2014
(Página intencionalmente deixada em branco)

II
À memória de familiares

que partiram cedo demais

“Nada na vida é mais belo e fascinante que o mistério. É a fonte fundamental de toda
a verdadeira arte e ciência. Aquele a quem é estranho este sentimento, é como se
estivesse morto: os seus olhos estão fechados.”

(Albert Einstein)

III
(Página intencionalmente deixada em branco)

IV
Agradecimentos

A entrega da Dissertação de Mestrado simboliza o fim de um longo e difícil capítulo na vida de


um estudante, repleto de altos e baixos, duvidas e incertezas, mas representa também uma importante
conquista e o começo de um novo capítulo. Estas linhas são a minha palavra de agradecimento às
pessoas que me acompanharam neste percurso e que deram um importante contributo para que fosse
possível levar o barco a bom porto.

Gostaria, em primeiro lugar, de expressar a minha profunda gratidão ao professor Dr. António
Luís Campos da Silva Topa pela confiança que depositou em mim ao ter aceitado orientar a minha
Dissertação de Mestrado. Gostaria ainda de manifestar o meu sentido agradecimento ao professor
António Topa, que na qualidade de orientador deste trabalho demonstrou sempre total simpatia,
paciência e disponibilidade para esclarecer as inúmeras dúvidas e problemas que surgiram na sua
realização. O seu contributo e disponibilidade foram fundamentais na realização deste trabalho e para
a minha formação académica.

Aos meus pais, Justina Pereira e Leonardo Pereira, a quem devo tudo o que sou, estiveram
sempre presentes e ajudaram-me a superar as maiores dificuldades que enfrentei. Estarei eternamente
agradecido por todo o amor, incansável dedicação e orientação que me deram em toda a minha vida,
e por toda a formação humana, educação, princípios, valores e sentido de responsabilidade que sempre
me transmitiram.

Aos meus tios, primos e avó Aurora também uma sentida palavra de agradecimento por todo o
carinho e incentivo que sempre me deram.

Ao meu amigo de sempre, Gonçalo Silva, que é como um irmão para mim e esteve sempre
presente nos momentos mais difíceis da minha vida.

Aos meus grandes amigos que tive o privilégio de conhecer no meu percurso académico, em
especial: Adélcio Rosa, Charles Maciel, Carlos Cheoo, Diogo Guerreiro, Elizângela Fernandes,
Guilherme Fernandes, Ivan St’Aubyn, Maria Taful, Ricardo Almeida e Sandro Neto. O meu muito
obrigado pela amizade, dedicação, sacrifício, camaradagem e espirito de união ao longo destes anos.
A minha profunda gratidão por tudo aquilo que me ensinaram, por todo o apoio e contributo que deram
para enfrentar as inúmeras batalhas que foram surgindo e por todos os momentos de convívio. Tudo o
que alcancei até hoje é graças a eles.

Por fim, dedico esta Dissertação à memória dos meus avós já falecidos, que nunca serão
esquecidos e que teriam certamente muito orgulho em presenciar o final deste importantíssimo capítulo
na minha vida.

V
(Página intencionalmente deixada em branco)

VI
Resumo

A área das comunicações móveis tem tido um grande crescimento nos últimos anos, e até à
data, a sua tecnologia encontra-se a ser difundida em todo o planeta a uma velocidade superior a
qualquer outro meio de comunicação. O ato de comunicar está no centro de todos os domínios da
atividade humana e para suportar o contínuo aumento do número de utilizadores deste serviço em todo
o mundo, os sistemas de comunicação móveis tornaram-se mais avançados e sofisticados.

Este trabalho consiste na investigação e análise de diversos temas relacionados com a


propagação de ondas eletromagnéticas em presença da terra e atmosfera. É realizado com base no
desenvolvimento de simulações em MATLAB®, que permitem uma melhor compreensão dos diferentes
fenómenos da radiopropagação em diversos ambientes.

As simulações abordam os seguintes temas: representação do campo elétrico com reflexão no


solo, representação do campo elétrico na vizinhança de obstáculos, traçado de raios numa atmosfera
estratificada horizontalmente, visualização dos efeitos de inversão do índice de refração na atmosfera
(miragens) e representação do campo elétrico em ambiente urbano no contexto das comunicações
móveis, segundo um modelo de propagação empírico e teórico.

Os modelos de propagação são indispensáveis para o desenvolvimento, projeção e análise de


novos sistemas de comunicação sem fios. São utilizados para prever os níveis de potência,
interferência e para analisar outras propriedades da ligação radio, com particular interesse em
ambientes urbanos, que são caracterizados por terem uma maior complexidade e elevada densidade
populacional.

Palavras-Chave

Radiopropagação; Radiação; Reflexão; Refração; Difração; Comunicações Móveis; Modelos de


Propagação;

VII
Abstract

In the last years the mobile communications industry has been growing dramatically, and up to
this day, wireless communication technology is diffusing around the planet faster than any other
communication technology. Communication is at the heart of human activity in all domains and to
support the continuously increasing number of mobile telephone subscribers around the world, mobile
communication systems have become more advanced and sophisticated in their designs.

This work consists on the investigation and analysis of some aspects related to electromagnetic
wave propagation in presence of the earth and atmosphere. To accomplish that, MATLAB® simulations
are developed to allow a better comprehension of the different radio wave propagation phenomena that
occur in certain environments.

The simulations are based on the following features: representation of the electric field
interference pattern due to ground reflection, representation of the electric field close to obstacles, ray
tracing in a horizontally stratified atmosphere, visualization of the effects caused by the inversion of the
refraction index in an atmosphere (mirages), and evolution of the electric field in an urban environment
(mobile communications scenario), according to an empirical and theoretical propagation model.

Propagation models are indispensable in the design and analysis of new wireless communication
systems. They are used to predict power, interference levels and analyze other properties of the radio
link, with a special interest in urban environments, which are characterized by having a higher complexity
and population density.

Keywords

Radio wave propagation; Radiation; Reflection; Refraction; Diffraction; Mobile radio; Propagation
Models;

VIII
Índice

Agradecimentos ...................................................................................................................................... V
Resumo .................................................................................................................................................. VII
Palavras-Chave ...................................................................................................................................... VII
Abstract ................................................................................................................................................ VIII
Keywords .............................................................................................................................................. VIII
Lista de Figuras ....................................................................................................................................... XI
Lista de Imagens ................................................................................................................................... XIV
Lista de Variáveis ................................................................................................................................... XV
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 1
1.1. Enquadramento histórico ............................................................................................................. 1
1.2. Motivação e objetivos ................................................................................................................ 12
1.3. Estrutura da dissertação............................................................................................................. 13
1.4. Contribuições principais ............................................................................................................. 15
2. RADIOPROPAGAÇÃO ........................................................................................................................ 17
2.1. Introdução .................................................................................................................................. 17
2.2. Propagação em espaço livre....................................................................................................... 19
2.2.1. Potência transmitida entre duas antenas ........................................................................... 19
2.2.2. Intensidade do campo ......................................................................................................... 22
2.2.3. Equação do radar ................................................................................................................ 23
2.2.4. Dipolo linear de meia onda ................................................................................................. 24
2.3. Reflexão no solo ......................................................................................................................... 27
2.4. Simulações .................................................................................................................................. 31
3. DIFRAÇÃO CAUSADA POR OBSTÁCULOS ....................................................................................... 43
3.1. Modelo Knife-edge ..................................................................................................................... 43
3.2. Simulações .................................................................................................................................. 47
4. REFRAÇÃO NA ATMOSFERA .......................................................................................................... 51
4.1. Índice de refração da atmosfera ................................................................................................ 52
4.2. Trajetória de um raio ótico numa atmosfera horizontalmente estratificada ............................ 53
4.2.1. Estratificação plana ............................................................................................................. 54
4.2.2. Estratificação esférica.......................................................................................................... 55
4.3. Raio de curvatura do raio ótico .................................................................................................. 56
4.4. Refratividade modificada ........................................................................................................... 57

IX
4.5. Propagação em Ductos............................................................................................................... 59
4.5.1. Condições necessárias para a formação de ductos ............................................................. 60
4.6. Traçado de raios ......................................................................................................................... 62
4.6.1. Modelo exato ...................................................................................................................... 62
4.6.2. Modelo aproximado ............................................................................................................ 64
4.6.3. Modelo analítico para a trajetória ...................................................................................... 65
4.6.4. Cálculo do ponto de indeterminação .................................................................................. 66
4.7. Simulações .................................................................................................................................. 68
4.7.1. Uma camada atmosférica.................................................................................................... 68
4.7.2. Ducto superficial e sobrelevado .......................................................................................... 73
4.8. Miragens ..................................................................................................................................... 76
4.8.1. Miragens inferiores ............................................................................................................. 76
4.8.2. Miragens superiores ............................................................................................................ 79
4.8.3. Simulação de miragens........................................................................................................ 80
5. MODELOS DE PROPAGAÇÃO EM AMBIENTES URBANOS.............................................................. 85
5.1. Cenário para o rádio móvel terrestre ......................................................................................... 88
5.2. Ambientes de macro-célula........................................................................................................ 90
5.2.1. Modelos empíricos .............................................................................................................. 90
5.2.1.1. Modelo Okumura ............................................................................................................. 91
5.2.1.2. Modelo Okumura-Hata .................................................................................................... 94
5.2.1.3. Factores de correção ........................................................................................................ 95
5.2.1.4. Extensão do modelo Okumura-Hata .............................................................................. 101
5.2.1.5. Campo total .................................................................................................................... 102
5.2.1.6. Simulações do modelo Okumura-Hata .......................................................................... 104
5.2.2. Modelos teóricos ............................................................................................................... 109
5.2.2.1. Modelo Walfisch-Bertoni ............................................................................................... 109
5.2.2.2. Efeito de multi-percurso................................................................................................. 110
5.2.2.3. Efeito de sombra e difração por filas múltiplas de edifícios .......................................... 112
5.2.2.4. Campo total .................................................................................................................... 114
5.2.2.5. Simulações do modelo Walfisch-Bertoni ....................................................................... 114
6. CONCLUSÃO ................................................................................................................................ 117
6.1. Principais conclusões................................................................................................................ 117
6.2. Perspetivas de trabalhos futuros ............................................................................................. 119
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................... 120

X
Lista de Figuras

Figura 2.1 – Potência radiada através da superfície fechada 𝑆 e coordenadas esféricas do campo
radiado na zona distante.

Figura 2.2 – Potência recebida por uma antena.

Figura 2.3 – Radar monoestático.

Figura 2.4 – Diagrama de radiação do dipolo de meia onda no plano 𝑧𝑦.

Figura 2.5 – Diagrama de radiação tridimensional do dipolo de meia onda.

Figura 2.6 – Reflexão em diferentes polarizações.

Figura 2.7 – Raio direto e raio refletido.

Figura 2.8 – Variação da amplitude do campo normalizado com a distância em PH, recorrendo a
aproximações.

Figura 2.9 – Variação da amplitude do campo normalizado com a distância em PH.

Figura 2.10 – Variação da amplitude do campo elétrico com a distância em PH.

Figura 2.11 – Variação da amplitude do campo elétrico com a distância, em unidades logarítmicas e
PH.

Figura 2.12 – Variação da amplitude do campo elétrico com a distância em PV.

Figura 2.13 – Variação da amplitude do campo elétrico com a distância, em unidades logarítmicas e
PV.

Figura 2.14 – Campo elétrico em espaço livre.

Figura 2.15 – Campo elétrico em espaço livre com um agregado de duas antenas e um agregado de
quatro antenas.

Figura 2.16 – Efeito do agregado de antenas

Figura 2.17 – Variação da amplitude do campo elétrico com reflexão no solo.

Figura 2.18 – Variação da amplitude do campo elétrico com reflexão no solo usando um agregado de
duas antenas.

Figura 3.1 – Geometria do Modelo Knife-edge.

Figura 3.2 – Elipsoide de Fresnel.

Figura 3.3 – Atenuação introduzida por um obstáculo do tipo Knife-edge, em função da penetração.

XI
Figura 3.4 – Modelo Knife-edge para 180 MHz.

Figura 3.5 – Modelo Knife-edge para 1000 MHz.

Figura 4.1 – Variação da refratividade com a altura.

Figura 4.2 – Geometria para estratificação plana.

Figura 4.3 – Geometria para estratificação esférica.

Figura 4.4 – Raio de curvatura de uma trajetória.

Figura 4.5 – Variação da refratividade modificada com a altura.

Figura 4.6 – Raio captado num ducto.

Figura 4.7 – Trajetória dos raios em atmosfera standard.

Figura 4.8 – Trajetória dos raios na presença de ducto superficial.

Figura 4.9 – Trajetória dos raios na presença de ducto sobrelevado.

Figura 4.10 – Geometria para o traçado de raios.

Figura 4.11 – Trajetória dos raios com 𝛼0 ≥ 0 e 𝑑𝑀 ⁄𝑑ℎ > 0.

Figura 4.12 – Trajetória dos raios com 𝛼0 < 0 e 𝑑𝑀 ⁄𝑑ℎ > 0.

Figura 4.13 – Trajetória dos raios com 𝛼0 < 0 e 𝑑𝑀 ⁄𝑑ℎ > 0, com reflexão no solo.

Figura 4.14 – Trajetória dos raios para diversos ângulos de partida e 𝑑𝑀⁄𝑑ℎ > 0.

Figura 4.15 – Trajetória dos raios com 𝛼0 ≥ 0 e 𝑑𝑀 ⁄𝑑ℎ < 0.

Figura 4.16 – Trajetória dos raios com 𝛼0 < 0 e 𝑑𝑀 ⁄𝑑ℎ < 0.

Figura 4.17 – Trajetória de 5 raios na presença de ducto superficial.

Figura 4.18 – Trajetória de 50 raios na presença de ducto superficial.

Figura 4.19 – Trajetória de 5 raios na presença de ducto sobrelevado.

Figura 4.20 – Trajetória de 50 raios na presença de ducto sobrelevado.

Figura 4.21 – Trajetória dos raios desde vários pontos do objeto até ao observador.

Figura 4.22 – Trajetória dos raios numa miragem inferior.

Figura 4.23 – Trajetória dos raios numa miragem superior.

Figura 4.24 – Plano vertical visto pelo observador.

Figura 4.25 – Deformação da imagem inicial tal como é vista pelo observador após alteração da
trajetória dos raios pelas alterações do índice de refração da atmosfera.

Figura 4.26 – Divisão da imagem nos dois planos ortogonais (vertical e horizontal).

Figura 4.27 – Esquema geométrico para cálculo dos limites da imagem.

XII
Figura 4.28 – Miragem superior.

Figura 4.29 – Miragem inferior.

Figura 5.1 – Clusters de sete células.

Figura 5.2 – Classes de células.

Figura 5.3 – Classes de células em meio urbano.

Figura 5.4 – Esquema para o cálculo da altura efetiva da antena da estação de base no modelo
Okumura.

Figura 5.5 – Terreno ondulado.

Figura 5.6 – Correção para a ondulação do terreno.

Figura 5.7 – Correção para a posição do recetor nas ondulações do terreno.

Figura 5.8 – Terreno inclinado.

Figura 5.9 – Correção para a inclinação média do terreno.

Figura 5.10 – Terreno misto terra/mar.

Figura 5.11 – Correção para terrenos mistos.

Figura 5.12 – Correção para orientação das ruas relativamente ao emissor.

Figura 5.13 – Correção para áreas suburbanas.

Figura 5.14 – Correção para áreas abertas e quase abertas.

Figura 5.15 – Modelo Okumura-Hata em diversos ambientes.

Figura 5.16 – Modelo Okumura-Hata em diversos terrenos.

Figura 5.17 – Modelo Okumura-Hata em ambiente urbano.

Figura 5.18 – Perfil típico numa macro-célula urbana.

Figura 5.19 – Geometria do multi-percurso (representação do alçado).

Figura 5.20 – Esquematização do ângulo de rua (representação em planta).

Figura 5.21 – Esquema para a atenuação devido a N+1 obstáculos.

Figura 5.22 – Modelo Walfisch-Bertoni para uma frequência de 600 MHz.

Figura 5.23 – Modelo Walfisch-Bertoni para uma frequência de 1800 MHz.

Figura 5.24 – Modelo Walfisch-Bertoni com índice de reflexão do edifício nulo.

XIII
Lista de Imagens

Imagem 1.1 – Esquema da experiência realizada por Hans Oersted.

Imagem 1.2 – Esquema do aparelho usado por Faraday.

Imagem 1.3 – Esquema da experiência de Faraday que demonstra a indução eletromagnética.

Imagem 1.4 – Configuração experimental do dipolo oscilante de Hertz.

Imagem 1.5 – Marconi com um sistema parecido com o que utilizou para a primeira transmissão sobre
o Atlântico.

Imagem 1.6 – Uma família a ouvir transmissões radio na década de 1920.

Imagem 1.7 – Professor Yagi com uma antena Yagi-Uda.

Imagem 1.8 – Iate Elettra usado por Marconi.

Imagem 1.9 – Radar alemão usado para detetar bombardeiros inimigos.

Imagem 1.10 – Sistema de comunicações via satélite.

Imagem 1.11 – Radiotelescópio Arecibo em Porto Rico e radiotelescópio ALMA no Chile.

Imagem 1.12 – Rede 4G.

Imagem 4.1 – Miragem inferior.

Imagem 4.2 – Miragem inferior.

Imagem 4.3 – Miragem superior.

Imagem 4.4 – Miragem superior.

XIV
Lista de Variáveis

𝑎 Raio da terra

𝐴𝑒𝑓 Abertura efetiva da antena

𝐴𝐸 (ℎ𝑒 ) Atenuação multi-percurso

𝐴(ℎ𝑒 ) Atenuação suplementar devido ao obstáculo

𝐴𝑁+1 Atenuação introduzida por difração em múltiplos obstáculos

𝐴𝜇 Valor mediano do excesso de atenuação (Modelo Okumura)

𝑐 Velocidade da luz no vácuo

𝐶( ) Função coseno do integral de Fresnel

𝑑 Distância entre antenas

𝐷 Diâmetro dos elipsoides de Fresnel a uma determinada distância do emissor

𝑑𝑎𝑛𝑡 Distância entre antenas do agregado

𝑑𝑒 Distância do emissor ao obstáculo

𝑑𝑛 Distância para o qual ocorrem os extremos do campo elétrico

𝑑𝑟 Distância do recetor ao obstáculo

𝐸 Campo elétrico total

𝑒 Tensão do vapor de água

𝐸1 Campo elétrico associado ao raio difratado que atinge diretamente a antena

𝐸2 Campo elétrico associado ao raio difratado que se reflete uma vez no obstáculo

𝐸𝑑 Campo elétrico do raio direto

𝐸𝑓𝑠 Campo elétrico em espaço livre

𝐸𝑟 Campo elétrico do raio refletido

𝑓 Frequência

𝑓𝐷 Fator direcional da antena

𝐹𝑑 Fator espacial do agregado para o raio direto

𝐹𝑟 Fator espacial do agregado para o raio refletido

𝐺𝐴𝑅𝐸𝐴 Fator de correção de ambiente (Modelo Okumura)

𝐺𝑒 Ganho da antena de emissão

𝐺(ℎ𝑟 ) Fator de correção da antena de receção (Modelo Okumura)

XV
𝐺(ℎ𝑡 ) Fator de correção da antena de emissão (Modelo Okumura)

𝐺𝑟 Ganho da antena de receção

ℎ Altura

𝐻 Campo magnético

ℎ1,2 Altura da antena de emissão/receção

ℎ𝑏 Altura da estação de base

ℎ𝑏𝑠 Altura da estação de base relativamente à superfície do mar

ℎ𝐸 Altura dos edifícios

ℎ𝑒 Altura equivalente

ℎ𝑒𝑓 Altura efetiva

ℎ𝑔𝑎 Altura média do terreno

ℎ𝑖𝑛𝑑 Altura para o qual o raio atinge a indeterminação

ℎ𝑚𝑎𝑥 Altura máxima que o raio pode atingir

ℎ𝑜𝑏𝑠 Altura do obstáculo

ℎ𝑜𝑚 Altura do terminal móvel relativamente à superfície do mar

ℎ𝑟 Altura do terminal móvel

ℎ𝑡 Altura efetiva da estação de base

𝐼𝑀 Intensidade máxima da corrente ao longo da antena

𝐽(ℎ𝑟 ) Fator de correção da altura da antena de receção (Modelo Hata)

𝑘 Número de onda

𝐾𝑎𝑐 , 𝐾𝑎𝑙 Fatores de correção para a orientação das ruas relativamente ao emissor

𝐾ℎ𝑝 Fator de correção relativo à posição do recetor no terreno ondulado

𝐾𝑚𝑝 Fator de correção relativo a trajetos mistos terra/mar

𝐾𝑜𝑎 Fator de correção para área aberta

𝐾𝑞𝑜 Fator de correção para área quase aberta

𝐾𝑠𝑝 Fator de correção relativo à inclinação do terreno

𝐾𝑠𝑢 Fator de correção para área suburbana

𝐾𝑡ℎ Fator de correção relativo à ondulação do terreno

𝐿 Comprimento do dipolo

𝐿𝑓𝑠 Atenuação em espaço livre

XVI
𝐿ℎ Comprimento horizontal de cada intervalo do campo

𝐿𝑃 Valor mediano das perdas de transmissão

𝐿𝑣 Comprimento vertical de cada intervalo do campo

𝑀 Refratividade modificada

𝑚 Índice de refração modificado


𝑑𝑀
Gradiente refratividade modificada
𝑑ℎ

𝑛 Índice de reflexão do solo em relação ao ar

𝑁 Refratividade

𝑁0 Número de obstáculos que penetram no elipsoide de Fresnel

𝑁𝑎𝑛𝑡 Número de antenas do agregado

𝑁𝑒𝑑 Número de edifícios


𝑑𝑁
Gradiente refratividade
𝑑ℎ

𝑝 Pressão atmosférica

𝑃𝑒 Potência emitida

𝑃𝑟 Potência recebida

𝑟 Distância do centro do dipolo ao ponto onde se calcula o campo

𝑟𝑑 Raio direto

𝑟𝑟 Raio refletido

𝑆( ) Função seno do integral de Fresnel

𝑆𝑃 Densidade do fluxo de potência (intensidade do vetor de Poynting)

𝑇 Temperatura

𝑤 Espaçamento entre edifícios (largura da rua)

𝑥̅ Altura acima do obstáculo para se considerar o feixe como desimpedido

𝑥𝑒 Altura do emissor em relação ao topo do obstáculo

𝑥𝑟 Altura do recetor em relação ao topo do obstáculo

𝑍0 Impedância característica de onda em espaço livre

𝑧ℎ Posição do raio no plano horizontal

𝑧𝑖𝑛𝑑 Distância para o qual o raio atinge a indeterminação

𝑧𝑚𝑎𝑥 Distância máxima que o raio pode atingir

𝑧𝑣 Posição do raio no plano vertical

XVII
ℇ0 Constante dielétrica do ar

ℇ𝑟 Constante dielétrica relativa do solo

ℇ′𝑠 Constante dielétrica complexa do solo

Δℎ Altura da ondulação do terreno

Δ𝜙 Diferença de fase entre raio direto e raio refletido

Δ𝑟 Diferença de trajetos entre raio refletido e raio direto

𝜃 Colatitude

𝜃𝑑 Colatitude do raio direto

𝜃𝑖 Inclinação média do terreno

𝜃𝑟 Colatitude do raio refletido

𝜎 Área equivalente do alvo do radar

𝜎𝑠 Condutividade do solo

𝜎𝑠𝑢 Desvio padrão para área suburbana

𝜎𝑢 Desvio padrão para área urbana

𝜓𝐵 Ângulo de Brewster

Γ Coeficiente de Fresnel

𝛼 Ângulo de saída do raio relativamente à horizontal

𝛽 Relação entre a superfície aquática e a distância entre as antenas

𝛿 Diferença de fase entre as correntes das antenas num agregado

𝜆 Comprimento de onda

𝜇 Gradiente refratividade modificada

𝜌 Raio de curvatura do raio ótico

𝜑 Azimute

𝜓 Ângulo de chegada ao solo

𝜙 Ângulo de rua

XVIII
1. INTRODUÇÃO

1.1.Enquadramento histórico

Radiopropagação é o comportamento que as ondas rádio manifestam quando são transmitidas


ou propagadas de um ponto da terra para outro entre várias partes da atmosfera. As ondas rádio são
afetadas por fenómenos de reflexão, refração, difração, absorção, despolarização e dispersão. Sendo
uma forma de radiação eletromagnética, como as ondas de luz, as ondas radio compõe-se de um
campo elétrico e magnético, que autossustentando-se, oscilam perpendicularmente entre si e à direção
de propagação da energia.

A descoberta das ondas eletromagnéticas foi, sem dúvida, o mais belo acontecimento da física
no século XIX.

A história sugere que as primeiras observações de fenómenos elétricos e magnéticos remontam


aos antigos gregos, cerca de 700 A.C. Crê-se que os gregos identificaram pedaços de rocha natural
(magnetitas) que tinham a capacidade de atrair ferro, e descobriram que pedaços de âmbar friccionados
adquiriam capacidades atrativas. Atualmente sabe-se que as magnetitas representam um mineral
magnético formado por óxidos de ferro, cuja formação química é 𝐹𝑒3 𝑂4 . O termo magnetismo nasceu
em virtude do nome da cidade onde foram descobertos na antiga Grécia (Magnesia). [3]

Em 1600, William Gilbert adotou o termo “eletricidade” da palavra grega para âmbar (elektron),
como uma referência às suas propriedades atrativas, e descobre que a eletrificação não estava limitada
ao âmbar, sendo este um fenómeno geral. Foi também a primeira pessoa a usar os termos força
elétrica, polos magnéticos, atração elétrica e o primeiro a explicar o funcionamento de uma bussola
magnética. Os frutos da sua investigação e experiências ao longo de muitos anos constituíram a base
para uma nova ciência. [4]

Experiências conduzidas por Charles Augustin de Coulomb um século mais tarde resultaram na
Lei de Coulomb, publicada em 1785, que descreve a interação eletrostática entre partículas
eletricamente carregadas. Esta lei foi essencial para o desenvolvimento da teoria do eletromagnetismo.
[5]

Até princípios do século XIX, físicos e cientistas estabeleceram que a eletricidade e o


magnetismo são, de facto, fenómenos relacionados. Em 1820, Hans Christian Oersted descobriu que
as correntes elétricas originam campos magnéticos, ao observar o movimento da agulha de uma
bussola, relativamente ao norte magnético, na proximidade de uma corrente elétrica (Imagem 1.1). Mais
tarde Oersted publicou os resultados da sua investigação, revelando que a corrente elétrica produz um
campo magnético circular, ao fluir num fio condutor. A descoberta de Oersted não deixou indiferente a
comunidade científica, os seus resultados influenciaram outros físicos da época, nomeadamente,
André-Marie Ampère que desenvolveu a fórmula matemática que relaciona a corrente elétrica em

1
regime estacionário com os campos magnéticos que esta produz (Lei de Ampère), Michael Faraday,
James Clerk Maxwell e Heinrich Hertz. [6]

Imagem 1.1 – Esquema da experiência realizada por Hans Oersted. (Fonte: [23])

Após as descobertas de Hans Oersted, Michael Faraday iniciou em 1831 a sua grande série de
experiências que culminaram com a descoberta da indução eletromagnética. Faraday elaborou um
aparelho constituído por duas bobines de fio de isolamento em torno de um anel de ferro (Imagem 1.2),
descobriu que, passando uma corrente por uma bobine, uma corrente momentânea era induzida na
outra bobine. Este fenómeno é conhecido por indução mútua. Em experiências seguintes, Faraday
descobriu que, se um íman fosse movido através de um fio em anel, uma corrente elétrica iria percorrer
esse fio (Imagem 1.3). As suas demonstrações estabeleceram que um campo magnético variável no
tempo produz um campo elétrico. Faraday também estabeleceu que o magnetismo poderia afetar raios
de luz e que existia uma relação entre os dois fenómenos. [6] [7]

Imagem 1.2 – Esquema do aparelho usado por Faraday. (Fonte: [24])

2
Imagem 1.3 – Esquema de uma das experiências de Faraday que demonstra a indução eletromagnética. A bateria
química (à direita) envia corrente elétrica através da bobine pequena (A). Quando esta é movida para dentro ou
para fora da bobine grande (B), o seu campo magnético induz uma corrente momentânea na bobine (B), que é
detetada pelo galvanómetro (G). (Fonte: [25])

James Clerk Maxwell, em 1864, estabeleceu um conjunto de equações que expressavam


matematicamente tudo o que era conhecido até à altura, sobre eletricidade e magnetismo. Através
destas equações, Maxwell sumarizou essencialmente o trabalho de Hans C. Orstead, Karl F. Gauss,
Andre M. Ampère, Michael Faraday, entre outros, e acrescentou o seu conceito radical de “corrente de
deslocamento” para completar a teoria. Em 1865, Maxwell concluiu através das suas equações que
qualquer perturbação elétrica ou magnética criada em espaço livre podia ser propagada através do
espaço como uma onda eletromagnética. Estabeleceu ainda que a velocidade dessa onda seria
aproximadamente a velocidade da luz, concluindo que a própria luz é uma perturbação eletromagnética.
A teoria de Maxwell e as suas previsões revolucionárias, viriam a ser provadas anos mais tarde por
Heinrich Hertz. [8] [9]

Na preocupação de evidenciar a existência das ondas eletromagnéticas implícitas nas equações


de Maxwell, em 1887 Heinrich Hertz concebeu e levou a bom termo uma série notável de experiências,
que se pode considerar perfeita e completa, uma vez que, além da indispensável deteção, estudou e
estabeleceu as propriedades fundamentais de ondas que ele próprio conseguiu gerar de modo eficiente
e seguro à escala de laboratório.

3
Durante as suas experiências para transmitir ondas rádio, Hertz usou um esquema como
indicado na Imagem 1.4 (dipolo oscilante de Hertz). O esquema consiste em duas placas metálicas
(condensadores) conectadas, através de fios de cobre, a uma abertura orientada a faísca, constituída
por duas esferas metálicas. Utilizando uma bobine de Ruhmkorff1 DC-AC de alta voltagem, as placas
metálicas são carregadas alternadamente e uma elevada diferença de potencial é aplicada na abertura
entre as esferas. Devido à elevada diferença de potencial, o ar existente na abertura fica ionizado e
disponibiliza uma ponte para a descarga das placas. O resultado foi uma faísca na abertura com cargas
elétricas a oscilar a uma elevada frequência, dando origem a radiação de ondas eletromagnéticas
transversais. Para detetar as ondas emitidas, Hertz usou um fio de cobre em anel com duas esferas
nas pontas a formar uma abertura bastante estreita. As ondas eletromagnéticas induziam uma corrente
no fio, o que daria origem a uma pequena faísca neste instrumento. A experiência de Hertz representou
a primeira transmissão e receção de ondas eletromagnéticas, feita pelo homem.

Em experiências mais avançadas, Hertz revelou que as ondas eletromagnéticas podiam ser
produzidas por diferentes materiais e mediu a velocidade da radiação eletromagnética, descobrindo
que as ondas moviam-se à velocidade da luz. Demonstrou também a reflexão das ondas em certos
materiais, a refração, polarização e interferência. Outras experiências feitas por Hertz provaram que
enquanto o comprimento das ondas de luz variava na ordem das centenas de nanómetros, o das ondas
eletromagnéticas variava entre alguns milímetros e centenas de quilómetros. [2] [8] [10]

Imagem 1.4 – Configuração experimental do dipolo oscilante de Hertz. (Fonte: [10])

1
Uma bobine de Ruhmkorff, ou também designada bobine de indução, é um transformador elétrico usado para
produzir impulsos de alta voltagem a partir de uma fonte de corrente DC de baixa voltagem. De modo a criar as
alterações de fluxo necessárias para induzir a voltagem na bobine secundária, a corrente DC no primário é
interrompida repetitivamente por um interruptor.

4
Adivinhando-lhes utilidade para as comunicações, Guglielmo Marconi repetiu as experiências de
Hertz, estudou as conclusões matemáticas de Maxwell e em 1895 desenvolveu um sistema de telégrafo
sem fios, usando ondas rádio como meio de comunicação. Em 1901, Marconi transpôs o espaço de
laboratório e instalou uma estação de transmissão sem fios em sua casa, em Wexford, com o objetivo
de estabelecer uma ligação entre Poldhu, Cornwall, e Clifden, Galway. Encorajado pela experiência,
Marconi iniciou a investigação sobre a possibilidade de comunicação transatlântica. Em dezembro de
1901 anunciou que usando uma antena de 152.3 metros para receção, conseguiu estabelecer uma
ligação entre a Europa (Poldhu) e o Canadá. É coberta uma distância de 3500 km. Este anuncio
levantou e continua a levantar muito ceticismo. O teste foi efetuado durante o dia, tendo o sinal um
comprimento de onda na proximidade dos 350 metros. Atualmente sabe-se que para sinais com este
tipo de comprimentos de onda, uma comunicação de longa distância durante o dia não é possível,
devido à grande absorção das ondas na ionosfera. Marconi defendeu que na sua experiência conseguiu
com sucesso ouvir, esporadicamente, a letra S em código Morse. Sentindo-se desafiado pelos céticos
e tendo como objetivo provar as suas experiências, Marconi viajou a bordo do navio SS Philadelphia
desde Inglaterra, recebendo diariamente os sinais enviados pela estação em Poldhu e guardando os
resultados. Os testes resultaram numa receção do sinal até 2496 km e uma receção de áudio até 3378
km. Estas distâncias foram alcançadas durante a noite, mostrando pela primeira vez que as ondas radio
de comprimento médio e longo viajam maiores distâncias à noite do que durante o dia. Durante o dia
as distâncias de receção eram significativamente menores, cerca de 1125 km, menos de metade da
distância afirmada pelos testes realizados no Canadá. Marconi não conseguiu provar em absoluto as
suas primeiras afirmações, mas provou que as ondas rádio podem ser transmitidas até grandes
distâncias. [2] [11]

A partir desse momento as ondas eletromagnéticas entraram no domínio da engenharia, através


do problema formulado por Marconi: o das Radiocomunicações.

Imagem 1.5 – Marconi com um sistema parecido com o que utilizou para a primeira transmissão sobre o
Atlântico. (Fonte: [26])

5
Uma das indústrias da época que mais beneficiou com os resultados do trabalho de Marconi foi
a indústria naval. Operadores de radio enviavam mensagens em código Morse em casos de
emergência, e esta poderia ser a única possibilidade para contactar navios de salvação.

A transmissão sem fios de código Morse era certamente bastante útil, contudo, em 1906 Reginald
Fessenden provou que era possível transmitir outros sons, como voz. Além de ter sido o primeiro a
transmitir voz através da radiodifusão de ondas eletromagnéticas, viria a desenvolver a modulação em
amplitude (AM). Começavam a surgir os primeiros aparelhos radio pessoais (Imagem 1.6). AM era uma
técnica para transmissão de um sinal de voz e música superior em relação às tecnologias existentes
até essa altura. O grande problema do AM era o elevado ruido na receção, proveniente do equipamento
e de fontes externas na atmosfera (relâmpagos por exemplo). Anos mais tarde, o engenheiro Edwin H.
Armstrong desenvolveu a modulação em frequência (FM), que viria a melhorar a qualidade áudio do
sinal recebido, ao realizar um melhor controlo sobre o ruido proveniente do equipamento e da atmosfera
terrestre. [12] [13] [14]

Imagem 1.6 – Família a ouvir transmissões radio na década de 1920. (Fonte: [27])

Devido a limitações do equipamento, os primeiros aparelhos rádio operavam na baixa


frequência (LF) e média frequência (MF) do espectro de radiofrequência (RF). Estas bandas ofereciam
boas comunicações de voz e mensagens, mas a distância de transmissão estava limitada pela baixa
potência de emissão disponível na época. [9]

Em 1920 foram feitas as primeiras comunicações em alta frequência (HF), quando o primeiro
sistema de rádio foi instalado na Europa. Marconi instalou a primeira estação para comunicações
transatlânticas sem fios na Irlanda. O desejo de ir para altas frequências deveu-se à necessidade de
se obter comunicações com um maior alcance e circuitos de maior capacidade. Até ao HF, as
comunicações transatlânticas eram feitas por cabo ou correio. Os sistemas por cabo eram bastante
limitativos e enviar mensagens era extremamente dispendioso. O correio era lento. Com a chegada do
HF, as comunicações transatlânticas tornaram-se mais rápidas, com maior capacidade e mais baratas.

6
Na década de 1920 foi desenvolvida a antena Yagi-Uda (Imagem 1.7) por Shintaro Uda e
Hidetsugu Yagi, uma das antenas mais brilhantes alguma vez criadas. De simples construção,
permitem obter um ganho superior a 10 dB e é possível observa-las ainda hoje nos telhados de
inúmeras casas. [9] [15]

Imagem 1.7 – Professor Yagi com uma antena Yagi-Uda. (Fonte: [28])

Em Junho/Julho de 1923, Marconi fez uma longa viagem através do oceano Atlântico a bordo do
Elettra (Imagem 1.8), um iate convertido em um laboratório flutuante, realizando experiências com
sistemas de onda curta. Viajou até à ilha de Cabo Verde, permanecendo em constante comunicação
com a estação de Poldhu. No final da experiência, Marconi anunciou que, apenas usando ondas curtas,
o problema de comunicações a longas distâncias podia ser resolvido tanto racionalmente como
economicamente. Deste ponto até à atualidade, as tecnologias rádio cresceram dramaticamente.

Imagem 1.8 – Iate Elettra usado por Marconi. (Fonte: [29])

7
A segunda guerra mundial teve um impacto fundamental no uso do espectro de radiofrequência.
A necessidade, devido à guerra, de realizar comunicações com maior capacidade levou a um grande
avanço nas comunicações sem fios, nomeadamente no desenvolvimento de sistemas de alta
frequência. Nesse período surgiram os primeiros refletores parabólicos, cornetas eletromagnéticas e
os agregados. O radar foi desenvolvido. [9]

Imagem 1.9 – Radar Norte-americano e Alemão usados para detetar bombardeiros inimigos. (Fonte: [30] [31])

Os progressos durante a guerra levaram ao desenvolvimento de sistemas rádio VHF (very high
frequêncy) e UHF (ultra high frequêncy). Com estes sistemas surgiu a ideia de sistemas de micro-ondas
em linha de vista e sistemas de dispersão troposférica. Descobriu-se que o uso destas altas frequências
provocava um alcance mais reduzido, em comparação com os sistemas HF. Até 1950 as comunicações
de longa distância eram feitas na banda HF. [9]

Com o advento do programa espacial, os engenheiros rádio observaram que era possível obter
comunicações de longo alcance em muito alta frequência usando satélites como estações de
retransmissão de rádio. Assim, deu-se o desenvolvimento dos sistemas de comunicação via satélite.
Hoje em dia, praticamente todas as comunicações de longo alcance são feitas através de satélites. [9]

Imagem 1.10 – Sistema de comunicação via satélite. (Fonte: [32])

8
Os físicos que contribuíram para fazer deste revolucionário meio de comunicação uma realidade,
provavelmente nunca imaginariam que as suas descobertas seriam a base para o desenvolvimento de
grandes indústrias na primeira metade do século XX, nomeadamente, os serviços de informação
(difusão de radio e televisão), telefonia, navegação marítima, transportes aéreos, comunicação via
satélite, sistemas de radar e conquista espacial. A capacidade para mover informação à velocidade da
luz, trouxe também consigo a expansão e integração dos mercados, através da redução dos custos de
transação e de fácil movimento de capitais. A humanidade ficou mais próxima, eliminaram-se fronteiras
e o mundo tornou-se mais pequeno.

As comunicações rádio evoluíram e modificaram-se significativamente ao longo do século


passado. A radioastronomia é uma área que tem evoluído bastante desde a segunda guerra mundial e
tornou-se uma das ferramentas mais importantes para a observação astronómica. Depois da segunda
grande guerra, muitos cientistas começaram a construir maiores e melhores antenas para estudar o
universo. Hoje em dia, temos radiotelescópios tão grandes quanto o Arecibo (Imagem 1.11) em Porto
Rico, constituído por um refletor parabólico de 305 metros de diâmetro. Em 1946 surgiu a técnica da
interferometria. Esta técnica ótica utilizada em astronomia tornou-se mais sofisticada ao longo dos
anos, e consiste em combinar a luz proveniente de diferentes telescópios ou antenas de radio, para
obter uma Imagem de maior resolução. Um bom exemplo é o ALMA (Atacama Large
Millimeter/submillimeter Array) (Imagem 1.11) no deserto Atacama, Chile. Trata-se de um projeto
revolucionário que é composto por um conjunto de 66 antenas de elevada precisão e sensibilidade
espalhadas no deserto, a trabalhar com comprimentos de onda entre 0.3 e 9.6 milímetros. O
radiotelescópio principal é constituído por 50 refletores parabólicos, cada um com 12 metros de
diâmetro. Existe um conjunto complementar mais compacto de 4 antenas de 12 metros de diâmetro e
12 antenas com um diâmetro de 7 metros. Este radiotelescópio permite uma resolução angular 10
vezes superior à do Hubble. [16] [17] [18]

Imagem 1.11 – Radiotelescópio Arecibo, Porto Rico (à esquerda), e radiotelescópio ALMA, Atacama-Chile (à direita).
(Fonte: [17] [33])

A evolução no campo da radioastronomia tem sido responsável por grande parte do


conhecimento que o homem tem do universo. Foi através da radioastronomia que surgiram os primeiros

9
indícios do Big Bang, com a descoberta em 1964 da radiação cósmica de fundo em micro-ondas, por
Arno Penzias e Robert Woodrow Wilson. A radioastronomia tornou possível o estudo da formação,
composição e das interações existentes no universo, bem como a deteção de emissões radio
provenientes de planetas como Júpiter e de objetos longínquos compostos por partículas energéticas
tais como estrelas, pulsares, quasares, galáxias, entre outros. [19]

Após um período relativamente silencioso no universo das comunicações terrestres, veio a


revolução digital. Na década de 1970 surgem as antenas impressas, que podem ser impressas
diretamente num circuito e são bastante usadas nos dispositivos móveis do presente. As comunicações
sem fios entram novamente numa era de esplendor, sendo a década de 1990 marcada pelo nascimento
da internet. O crescimento do sector das telecomunicações despertou um aumento dramático na
procura por dispositivos eletrónicos pessoais associados aos serviços de comunicações móveis, e tem
sido a grande força do século XXI responsável pela contínua investigação na área da radiopropagação
por parte de diversas instituições espalhadas em todo o mundo.

Embora se pense nos smartphones, tablets ou laptops como invenções modernas, a verdade é
que as redes e tecnologias em que estes aparelhos se baseiam vêm do início de 1930. Foi em Março
de 1930 que a revista Science anunciou a primeira comunicação móvel entre um navio e a costa, e que
possibilitou aos cidadãos americanos realizar chamadas telefónicas para os passageiros do navio em
pleno oceano Atlântico.

Desde o ano 1930 até à era digital, os sistemas de comunicações móveis têm vindo a sofrer
grandes avanços tecnológicos, o que culminou com os sistemas de primeira geração (1G) na década
de 1980, 2G na década de 1990, a seguir veio o 3G e mais recentemente o 4G. A era digital nas redes
de comunicações móveis foi iniciada com o 2G. Como resposta ao crescente aumento de subscritores
e trafego nas redes dos últimos anos, foram desenvolvidos os sistemas 4G. Os primeiros sistemas 4G
começaram a ser usados em 2010. A quinta geração (5G) dos sistemas de comunicação móvel tem
entrada prevista no mercado em 2020. [20] [21]

O 4G, sistema de quarta geração, é caracterizado pela mudança de tecnologia de comutação de


pacotes para um sistema baseado integralmente em soluções IP, adquirindo um aumento na velocidade
de transferência de dados na rede de cerca de 10 vezes, relativamente às redes 3G. O objetivo dos
sistemas 4G é o aumento da capacidade da rede, oferecer acesso a um grande conjunto de
informações e serviços, e permitir o trafego de enormes volumes de informação (dados, fotografias,
vídeos, entre outros), através de velocidades entre os 100 Mb/s e 1 Gb/s. [21]

Algumas das aplicações do 4G são [22]:

 Presença virtual: fornecer serviços ao utilizador em todos os momentos, mesmo que o utilizador
se encontre fora do local de cobertura;

 Navegação virtual: fornecer navegação virtual ao utilizador, sobre a qual se pode aceder a uma
base de dados das ruas, edifícios, etc.;

10
 Aplicações de Tele-Geoprocessamento: combinação de GIS (Geographical Information System)
e GPS (Global Positioning System) no qual o utilizador pode obter a sua localização;

 Gestão de crises naturais: desastres naturais podem provocar a suspensão temporária dos
sistemas de comunicação. Nas gerações anteriores, seria necessário esperar dias ou semanas
para restaurar o sistema, mas no 4G é expectável que o restauro seja feito em poucas horas;

 Jogos de alta qualidade: possibilidade de jogar jogos de alta qualidade com outros utilizadores,
através da internet;

 Controlo remoto de aparelhos domésticos: o utilizador tem a possibilidade de programar e


controlar aparelhos domésticos através de um terminal móvel (telemóvel, tablet);

 Multimédia – Serviços de vídeo:

 Entrega eficiente de serviços multimédia a elevadas velocidades;

 Dois tipos de serviços de vídeo - bursting e streaming:

 Streaming é realizado quando o utilizador pretende um serviço de vídeo em tempo


real, onde o servidor entrega o conteúdo continuamente a um ritmo de playback.

 Bursting consiste num download de um ficheiro para um buffer, realizado a uma


velocidade elevada aproveitando toda a largura de banda disponível.

 Video-on-demand: o utilizador tem a possibilidade de alugar ou comprar um vídeo através


do telemóvel para posterior visualização.

 Conferências de vídeo.

 Transmissões de múltiplos canais de televisão.

Em geral, esta é uma descrição de algumas aplicações, funcionalidades e benefícios da mais


recente tecnologia de comunicações móveis. Uma representação da rede dos sistemas 4G é
apresentada na Imagem 1.12.

Imagem 1.12 – Rede 4G. (Fonte: [34])

11
A comunicação, desde os primórdios, é um instrumento de integração, instrução, troca mútua e
desenvolvimento entre as pessoas em quaisquer atividades. A descoberta das ondas eletromagnéticas
permitiu compreender melhor a ciência por trás do universo em que vivemos e conduziu a inúmeras
invenções que marcam a história da humanidade. Contudo, o universo é ainda visto como um grande
enigma, cheio de segredos e mistérios por revelar, pelo que a investigação continua e irá continuar no
futuro, na área do eletromagnetismo.

É no contexto de crescimento da indústria do sector das comunicações móveis e comunicações


a longa distância que se insere a presente Dissertação de Mestrado, mais especificamente no estudo
de modelos de propagação, que representam as características da radiopropagação e caracterizam o
comportamento e desempenho das ondas eletromagnéticas, num dado ambiente.

1.2.Motivação e objetivos

Desde a proliferação de dispositivos sem fios na década de 1990, o estudo da propagação de


ondas radio em ambientes urbanos tem recebido uma atenção especial. Atualmente, produtos e
serviços que incorporem tecnologia sem fios são vistos como um bem essencial para os consumidores
a nível global. O crescimento da indústria das comunicações móveis tem sido fortemente conduzido
pelo aumento na oferta de serviços e avanços tecnológicos, incrementando a capacidade e
funcionalidade dos dispositivos, e tornando-os cada vez mais pequenos, leves, baratos, fieis e de fácil
utilização. Hoje em dia os smarphones e tablets são os dispositivos mais usados, que possuindo
imensos recursos, permitem aceder à internet, realizar chamadas voz e vídeo, enviar mensagens,
utilizar inúmeras aplicações úteis como GPS, aceder a serviços meteorológicos e trânsito nas estradas,
entre outros. Assim, para suportar este crescente fluxo de informação, novos sistemas móveis têm
vindo a ser desenvolvidos ao longo do tempo (1G, 2G, 3G, 4G), oferecendo novos serviços e com
capacidade para satisfazer todos os pedidos.

A extrema beleza da comunicação sem fios deve-se ao facto da informação ser transportada por
uma onda eletromagnética que se propaga no espaço e tem o potencial de alcançar qualquer lugar em
qualquer direção ou distância. Esta forma de comunicação proporciona uma vantagem em termos de
mobilidade e acessibilidade, em relação à comunicação com fios. Tal flexibilidade tem um preço: a
comunicação sem fios envolve a propagação de ondas eletromagnéticas dentro de ambientes
complexos, diversificados e que apresentam grandes desafios:

 As ondas que se propagam nestes ambientes não se encontram confinadas num guia como
acontece em linhas de transmissão;
 Estes ambientes costumam conter inúmeros obstáculos que interagem negativamente com
a onda, como por exemplo, edifícios em área urbana, árvores, colinas ou montanhas em
áreas rurais, chuva proveniente da atmosfera, entre outros;
 Interferência co-canal entre utilizadores no mesmo ambiente.

12
De modo a ultrapassar estes constrangimentos, é necessário um conhecimento profundo sobre
o comportamento das ondas ao propagarem-se em ambientes complexos. Assim, a radiopropagação
e os modelos de propagação em ambientes urbanos, suburbanos e rurais continuam a ter um interesse
de estudo muito elevado, vital para o desenvolvimento e projeção de novos e mais sofisticados sistemas
de comunicações móveis e de longa distância.

O objetivo desta dissertação é investigar e observar o modo como as ondas rádio podem ser
afetadas quando se propagam em ambientes complexos e com relevância não só para as
comunicações móveis, mas também para outros sistemas de comunicação via radio. Para tal, modelos
de propagação teóricos e empíricos são usados para realizar simulações em MATLAB®, que permitem
a visualização de diversos fatores característicos da radiopropagação e conduzem a uma melhor
compreensão dos diferentes fenómenos de propagação, com especial ênfase para a reflexão, refração
e difração de ondas eletromagnéticas em ambientes macro-célula e em serviços de comunicação de
longa distância.

1.3.Estrutura da dissertação

Este trabalho encontra-se organizado em seis capítulos, quatro dos quais abordando aspetos da
propagação de ondas eletromagnéticas. Cada um desses capítulos contém uma explicação teórica e
resultados experimentais.

No capítulo 1 é feito o enquadramento do trabalho no contexto da radiopropagação com base


numa breve síntese da evolução tecnológica, e são delineados os objetivos do trabalho.

No capítulo 2 aborda-se o tema das reflexões das ondas no solo. A onda refletida vai interferir
com o raio direto, provocando oscilações do campo elétrico em torno do valor do campo elétrico em
espaço livre. O efeito da polarização, da altura da antena de receção, da distância entre antenas e da
utilização de um agregado, é demonstrado ao longo deste capítulo.

Todos estes parâmetros vão influenciar o campo elétrico na receção. A polarização vai influenciar
a intensidade máxima e mínima do campo elétrico, enquanto a altura da antena de receção e a distância
entre antenas irão influenciar a distância e a altura à qual os máximos e mínimos do campo elétrico se
manifestam. O agregado de antenas vai influenciar a intensidade do campo.

No capítulo 3 são demonstrados os efeitos da difração causada por obstáculos. É simulado o


modelo Knife-edge, que consiste no cálculo de uma atenuação suplementar para o raio direto e raio
refletido a aplicar na expressão do campo elétrico, devido à presença do obstáculo.

Neste modelo consideram-se duas situações: antes do obstáculo utilizam-se os resultados


obtidos para a reflexão no solo, e após o obstáculo utiliza-se, então, o modelo Knife-edge para calcular
a atenuação suplementar. Esta será maior logo após o obstáculo, diminuindo tanto em altura como em
distância. À imagem do caso da reflexão no solo, este modelo é calculado variando a distância entre

13
as antenas e a altura da antena de receção. Também o efeito da frequência é demonstrado neste
capítulo.

O capítulo seguinte aborda o efeito da atmosfera no traçado de raios através do índice de


refração. Neste capítulo são demonstradas as trajetórias das ondas eletromagnéticas durante a
propagação pela atmosfera, sendo esta representada como um conjunto de camadas com índice de
refração diferente.

A primeira análise incide sobre o andamento dos raios em atmosfera com uma camada,
atmosfera padrão, sendo posteriormente demonstrado o comportamento dos raios na presença de
condições especiais (ductos – atmosfera com duas ou três camadas).

Ainda no capítulo 4, utilizou-se a função do traçado de raios para representar uma imagem
captada pelo olho humano, com origem num fenómeno natural provocado por uma atmosfera
caracterizada por diferentes índices de refração. Este tipo de fenómeno é mais conhecido por miragem.
Assim, dependendo do tipo de atmosfera, o utilizador tem hipóteses de visualizar uma miragem superior
ou uma miragem inferior.

Por último, para a simulação do campo elétrico em ambiente urbano, no capítulo 5 demonstra-
se o funcionamento de um modelo empírico e um modelo teórico, modelos Okumura-Hata e Walfisch-
Bertoni, respetivamente.

No caso do modelo Okumura-Hata, o valor médio do campo elétrico à receção é calculado para
ambientes urbanos, bem como para outro tipo de ambientes, terrenos e percursos, com o auxílio dos
respetivos fatores de correção do modelo, que dependem de parâmetros como a inclinação do terreno,
a altura da ondulação do terreno, orientação das ruas, entre outros.

Relativamente ao modelo Walfisch-Bertoni, a simulação compreende três zonas distintas para a


representação do campo elétrico na receção: a zona por cima dos edifícios, que vai desde a antena de
emissão até ao último edifício, onde apenas o raio direto tem contribuição no valor do campo elétrico;
a zona entre os edifícios corresponde à segunda zona, onde é usado o modelo Walfisch-Bertoni e são
consideradas as contribuições do efeito do multi-percurso e da difração no topo dos edifícios; a terceira
zona está compreendida entre o ultimo edifício e a distância máxima simulada, onde se usa o modelo
Knife-Edge para representar o campo elétrico. Na simulação do modelo Walfisch-Bertoni, é possível
observar a contribuição de alguns parâmetros importantes para a determinação da amplitude do campo
elétrico, como o coeficiente de reflexão dos edifícios e a frequência.

O capítulo 6 contém as conclusões e considerações finais do trabalho, bem como algumas


sugestões de trabalho futuro.

14
1.4.Contribuições principais

Este trabalho vem na extensão das matérias abordadas nas cadeiras de Radiopropagação,
Sistemas de Comunicações Móveis, Propagação e Radiação de Ondas Eletromagnéticas e Antenas.
Obtém-se um conjunto de simulações, cuja visualização gráfica e análise no contexto teórico têm
interesse a nível pedagógico e de projeto. A nível académico este trabalho permite uma melhor
compreensão sobre alguns dos fenómenos que ocorrem durante a propagação de ondas
eletromagnéticas em ambientes urbanos, através da simulação de alguns modelos de propagação. A
nível de projeto, os resultados obtidos da simulação dos vários modelos contribuem para o
dimensionamento de um sistema de comunicações de longa distância ou de um sistema de
comunicações móvel urbano.

15
16
2. RADIOPROPAGAÇÃO

2.1.Introdução

A transmissão de sinais entre dois pontos pode fazer-se por ondas guiadas, apoiando-se num
suporte físico – linhas, cabos, guias de onda – ou por ondas livres (ondas em espaço livre). Neste
segundo caso, salvo determinadas circunstâncias exóticas tal como por exemplo a comunicação via
satélite, a propagação faz-se sempre total ou parcialmente dentro da atmosfera terrestre. Seguem-se
alguns exemplos de serviços que fazem uso deste tipo de transmissão:

 Sistemas de ajuda à navegação em onda longa (10 a 100 KHz);

 Radiodifusão em onda média (~0.5 a 1.5 MHz);

 Comunicações ponto a ponto em onda curta (3 a 30 MHz) em que a camada ionizada da


atmosfera (ionosfera) intervém como refletor;

 Radiodifusão da televisão em bandas que se estendem do VHF até ao UHF (100 a 1000
MHz);

 Feixes Hertzianos utilizados para a transmissão ponto a ponto de sinais na rede de transporte
de televisão (entre os centros de produção e os principais emissores; ligação aos estúdios
móveis), na rede telefónica interurbana (embora a perder peso para a fibra ótica), em
ligações entre estações de base e centros de controlo nas redes telefónicas móveis, sobre
distâncias curtas (da ordem das dezenas de km) e em que se utilizam frequências superiores
a 1 GHz (SHF);

 Sistemas de comunicação via satélite, com o mesmo fim e na mesma banda que os
anteriores, mas cobrindo distâncias muito superiores (em geral maiores que 1000 km), neste
caso o sinal atravessa a atmosfera e a ionosfera por duas vezes;

 Sistemas de comunicação móvel, sendo a transmissão de sinais entre estações de base e


terminais móveis nas redes de telefonia móvel atuais, feita principalmente nas bandas de
frequência de 900 MHz e 1800 MHz (GSM), 2100 MHz (UMTS) e 2600 MHz (LTE). As
estações terrestres do serviço podem servir áreas com dimensões entre 100-200m até às
dezenas de quilómetros, consoante a densidade de tráfego.

No caso geral a propagação não se pode considerar como sendo em espaço livre, i.e., simples
onda esférica divergindo da antena emissora e intercetada pela abertura da antena recetora. Algumas
considerações mostram que o processo de propagação é efetivamente mais complexo:

i) Muitas vezes as antenas estão situadas junto ao solo – um caso típico é o da radiodifusão em
onda média; ou o trajeto entre as antenas emissora e recetora pode não estar desimpedido de

17
obstáculos, i.e., elevações de terreno, árvores ou edifícios, ou simplesmente porque a distância
é tal que as antenas estão para além do horizonte uma em relação à outra. Por estas razões,
a propagação faz-se em presença da terra, o que lhe altera as características.

ii) A atmosfera é um meio com uma estrutura complexa e a primeira aproximação que consiste
em considerá-la como um meio constante no tempo, uniforme, homogéneo e isotrópico, com
índice de refração 𝑛 = 1, só muito excecionalmente é suficiente para o estudo de problemas
de propagação. Na realidade o índice de refração da baixa atmosfera é pouco maior que a
unidade, mas na ionosfera o índice de refração é o de um plasma, que não se pode considerar
sem perdas (𝑛 complexo). Mesmo na baixa atmosfera, o índice de refração varia com a altura
e essa variação dá origem a um encurvamento dos raios que ao fim de alguns quilómetros tem
que ser tomado em consideração. Para além desta variação, ainda se observam variações
locais que se alteram ao longo do tempo, em correlação com as condições meteorológicas e
que tem por efeito causar flutuações do sinal recebido, uma vez que os diferentes raios que o
compõem vão seguir trajetos ligeiramente diferentes uns dos outros. Finalmente, a existência
na atmosfera de partículas – gotas de chuva, poeiras, etc. – e de zonas de turbulência, dá
origem à dispersão de energia em detrimento do raio direto e pode causar interferência em
serviços próximos.

Conclui-se assim, que no estudo de um problema de propagação pode considerar-se que


intervêm dois tipos de fenómenos: por um lado a influência da Terra e por outro a variabilidade da
atmosfera. Em geral, haverá interação entre estes dois fenómenos. Outro aspeto que não se pode
deixar de considerar é o da variabilidade no tempo dos fenómenos atmosféricos, o que associa
considerações estatísticas ao estudo do problema de propagação.

Verifica-se assim, que a fenomenologia envolvida num processo de propagação é, na grande


generalidade dos casos, extremamente complexa. Por esta razão, para se poder chegar a resultados
úteis, há que decompor o processo em fenómenos separados e de tratamento mais simples. Estes
fenómenos, por sua vez, são esquematizados de forma a poder dar-se-lhes um tratamento matemático
apropriado. Muitas vezes não é claro que todo este procedimento conduza efetivamente a uma
descrição quantitativa que constitua uma boa representação do processo de propagação. Esta
incerteza resulta não só da complexidade do processo, como também de um conhecimento em geral
incompleto da fenomenologia, pelo que os modelos matemáticos pelos quais se pretende representar
os fenómenos intervenientes, poderão estar mal ligados à realidade.

Um engenheiro de telecomunicações preocupa-se fundamentalmente com o cálculo das perdas


suplementares de transmissão, i.e., perdas para além da atenuação que se deve à simples expansão
da onda esférica correspondente à propagação em espaço livre. Este cálculo tem de ser rigoroso: um
pequeno erro de que resulte um aumento de 3 dB obriga a duplicar, por exemplo, a potência no emissor,
o que é sempre dispendioso e pode ser muito difícil de gerir em determinadas circunstâncias.

18
Um cálculo rigoroso, ou a simples discussão da sua viabilidade e rigor, só pode fazer-se com um
bom conhecimento dos aspetos físicos primordiais dos fenómenos de propagação, do grau de validade
dos modelos que se aplicam e das suas limitações.

2.2.Propagação em espaço livre

Uma antena pode ser utilizada nos modos de emissão e receção. Para obter as expressões que
permitem calcular a potência transmitida entre duas antenas e a intensidade do campo em espaço livre,
i.e., fora da presença de quaisquer obstáculos e num meio uniforme, homogéneo e isotrópico, é
necessário ter em consideração os parâmetros que caracterizam o comportamento das antenas.
Nestas circunstâncias admite-se que se tem uma onda esférica TEM centrada na antena emissora
(está-se assim na zona distante da antena).

2.2.1.Potência transmitida entre duas antenas

Seja 𝑃𝑒 a potência emitida pelo emissor. Se um emissor for envolvido por uma superfície fechada,
𝑆, a radiação de energia eletromagnética implica que haja um fluxo de energia através e para o exterior
de 𝑆 (ver Figura 2.1).

𝑃𝑒 𝑃

𝜃
𝑟
Dipolo
0
𝑦

𝜑
𝑆
𝑥

Figura 2.1 – Potência radiada através da superfície fechada 𝑺 (à esquerda). Coordenadas esféricas do campo
radiado na zona distante (à direita). (adaptado de [2])

19
Em termos de potência radiada isso significa que o valor médio da potência radiada através de
𝑆 será dado por

(𝐸̅ × 𝐻
̅ ∗ )𝑛
𝑒
𝑃𝑒 = ∫ 𝑅𝑒 𝑑𝑆 (2.1)
𝑆 2
em que

1
𝑆𝑃𝑐 = (𝐸̅ × 𝐻
̅∗) (2.2)
2

é o vetor complexo de Poynting e 𝑛𝑒 a normal externa de 𝑆.

Conclui-se, assim, que a potência radiada obtém-se por integração da densidade de fluxo de
potência através de uma superfície esférica, na zona distante.

O valor médio, no tempo, do vetor de Poynting é dado por

1
〈𝑆𝑃 〉 = 𝑅𝑒 {𝑆𝑃𝑐 } = 𝑅𝑒 { (𝐸̅ × 𝐻
̅ ∗ )} (2.3)
2

Sabendo que a área da superfície esférica na receção à distância 𝑟 é 4𝜋𝑟 2 , e se a potência for
emitida isotropicamente, o módulo do valor médio do vetor de Poynting, na direção radial, é dado por

1 1
𝑆𝑃 (𝜃, 𝜑) = 𝑃𝑒 2
= 𝐸𝐻 [𝑊 𝑚−2 ] (2.4)
4𝜋𝑟 2

onde 𝐸 e 𝐻 são respetivamente as amplitudes do campo elétrico (𝑉 𝑚−1 ) e do campo magnético (𝐴 𝑚−1 )
da onda esférica TEM.

Nas condições anteriores, a potência recebida por uma antena recetora de abertura
𝐴𝑒𝑓 (𝜃, 𝜑) [𝑚2 ] será

𝐴𝑒𝑓 (𝜃, 𝜑)
𝑃𝑟 = 𝑃𝑒 [𝑊] (2.5)
4𝜋𝑟 2

em que 𝐴𝑒𝑓 (𝜃, 𝜑) é a abertura efetiva da antena recetora na direção (𝜃, 𝜑). Admite-se que a polarização
da onda incidente é concordante com a da antena de receção.

20
𝑆𝑃,𝑖𝑛𝑐𝑖𝑑𝑒𝑛𝑡𝑒 (𝜃, 𝜑)
𝑃𝑟

Recetor

Figura 2.2- Potência recebida por uma antena de abertura 𝑨𝒆𝒇 .

A potência na receção é proporcional à intensidade do vetor de Poynting incidente (Figura 2.2).


A constante de proporcionalidade designa-se por área efetiva da antena, 𝐴𝑒𝑓 (𝜃, 𝜑).

O conceito de área, ou abertura, efetiva de uma antena na direção (𝜃, 𝜑) é especialmente útil no
modo de receção, permitindo determinar, em condições de adaptação de polarizações, a potência
disponível na receção a partir do conhecimento da intensidade do valor médio local do vetor de
Poynting, 𝑆𝑃 , associado à onda que incide segundo a direção (𝜃, 𝜑).

Seja agora 𝐺𝑟 o ganho da antena de receção em relação a uma antena isotrópica, segundo a
direção (𝜃, 𝜑) do emissor. Sabe-se que

𝐴𝑒𝑓 (𝜃, 𝜑)
𝐺𝑟 (𝜃, 𝜑) = 4𝜋 (2.6)
𝜆2

pelo que a potência recebida será

1 𝜆 2
𝑃𝑟 = ( ) 𝑃𝑒 𝐺𝑟 (2.7)
(4𝜋)2 𝑟

Se o emissor não for isotrópico, mas tiver um ganho 𝐺𝑒 na direção (𝜃, 𝜑) da antena recetora,
será

1 𝜆 2
𝑃𝑟 = 𝑃𝑒 𝐺𝑒 𝐺𝑟 ( ) (2.8)
(4𝜋)2 𝑟

onde se introduz o conceito de perdas de espaço livre, 𝐿𝑓𝑠 , dado por

4𝜋𝑟 2
𝐿𝑓𝑠 =( ) (2.9)
𝜆

21
e 𝑃𝑒 é agora a potência entregue pelo emissor à respetiva antena. Em dB vem

4𝜋𝑟
𝑃𝑟 [𝑑𝐵𝑊] = 𝑃𝑒 [𝑑𝐵𝑊] +𝐺𝑒 [𝑑𝐵𝑖] + 𝐺𝑟 [𝑑𝐵𝑖] − 20𝑙𝑜𝑔 ( ) (2.10)
𝜆

No caso de haver uma atenuação suplementar 𝐿𝑃 , vem

𝑃𝑟 [𝑑𝐵𝑊] = 𝑃𝑒 [𝑑𝐵𝑊] +𝐺𝑒 [𝑑𝐵𝑖] + 𝐺𝑟 [𝑑𝐵𝑖] − 𝐿𝑓𝑠 [𝑑𝐵] − 𝐿𝑃 [𝑑𝐵] (2.11)

2.2.2.Intensidade do campo

Nas condições anteriores o fluxo de potência é dado, para um ganho de 𝐺𝒆 na direção (𝜃, 𝜑) do
recetor, por:

𝑃𝑒 𝐺𝑒 (𝜃, 𝜑) 1
𝑆𝑃 (𝜃, 𝜑) = = 𝐸𝐻 (2.12)
4𝜋𝑟 2 2

Como entre 𝐸 e 𝐻 existe a relação:

𝐸 = 𝑍0 𝐻 (2.13)

em que 𝑍0 = (𝜇0 ⁄𝜀0 )1⁄2 = 120𝜋 [Ω] denota a impedância característica de onda em espaço livre (meio
com índice de refração “absoluto” 𝑛 = 1), substituindo (2.13) em (2.12) o valor eficaz e o valor máximo
do vetor de Poynting vêm, respetivamente, dados por:

𝐸2
𝑆𝑃 = (2.14)
2𝑍0

𝐸2
𝑆𝑃 𝑚á𝑥 = (2.15)
𝑍0

Vindo a amplitude do campo elétrico à distância 𝑟, devido a um emissor de potência 𝑃𝑒 e ganho 𝐺𝑒 ,


dada pela seguinte expressão:

1 𝑍0 𝑃𝑒 𝐺𝑒
𝐸= √ (2.16)
𝑟 2𝜋

O que para a baixa atmosfera (𝑍0 ≈ 120𝜋 [Ω]) se pode escrever muito aproximadamente:

22
√60𝑃𝑒 𝐺𝑒
𝐸= (2.17)
𝑟

Analogamente:

1 𝑃𝑒 𝐺𝑒
𝐻= √ (2.18)
𝑟 240𝜋

Ao produto 𝑃𝑒 𝐺𝑒 que aparece em (2.17) e (2.18) é usual chamar-se “potência aparente” ou a


“potência equivalente radiada isotropicamente” (EIRP) do emissor.

2.2.3.Equação do radar

Uma aplicação comum da teoria explicada anteriormente é o sistema de radar. O radar é um


dispositivo destinado fundamentalmente à localização de objetos distantes por meio de ondas refletidas
nesses objetos. Na sua forma mais elementar, o emissor envia um impulso curto por intermédio de uma
antena muito diretiva. O impulso é refletido pelo alvo, sendo o eco captado pela mesma antena que
entretanto foi ligada a um recetor (radar monoestático). A orientação da antena fornece as coordenadas
angulares do alvo (azimute e altura), enquanto o tempo que decorre entre a emissão do impulso e a
receção do eco dá a distância do alvo.

i ALVO

Figura 2.3-Radar monoestático. (adaptado de [1])

23
A equação do radar é dada pela seguinte expressão:

𝑃𝑟 1 1 𝐺 2 𝜎𝜆2
= . 𝐺(𝑒). 𝜎. . 𝐴 (𝑒) = (2.19)
𝑃𝑒 4𝜋𝑟 2 4𝜋𝑟 2 𝑒𝑓 (4𝜋)3 𝑟 4

𝜆2
onde, 𝐺 representa o ganho da antena, 𝐴𝑒𝑓 = 𝐺 a abertura da antena, 𝜎(𝑖, −𝑖) a área equivalente do
4𝜋

alvo (depende da direção de incidência e de reflexão), e 𝑟 a distância do alvo.

Esta equação estabelece a relação entre a potência recebida no eco (𝑃𝑟 ) e a potência fornecida
à antena pelo emissor (𝑃𝑒 ).

2.2.4.Dipolo linear de meia onda

Neste trabalho, os resultados de simulação são obtidos através de simulações em que se utilizam
antenas de comprimento 𝐿 = 2𝑙 = 𝜆⁄2, ditas abreviadamente antenas ou dipolos lineares de 𝜆⁄2.

Considere-se a expressão do campo de uma antena retilínea na zona distante [2]:

𝑍0
𝐸̅𝜃 = 𝑗 𝐼 ̅ ℎ 𝑒 −𝑗𝑘𝑟 𝑓𝐷 (𝜃) (2.20)
2𝜆𝑟 𝑀 𝑒𝑓

em que, 𝐼𝑀̅ é a corrente aos terminais da antena (corrente de entrada, que no caso da antena de 𝜆⁄2
corresponde ao máximo da corrente), ℎ𝑒𝑓 é a altura efetiva, 𝑓𝐷 (𝜃) designa-se por fator direcional
relativo ou simplesmente fator direcional, 𝑘 é a constante de propagação, 𝑟 é a distância, 𝜆 é o
comprimento de onda e 𝑍0 é a impedância característica da onda em espaço livre.

Para a antena de 𝜆⁄2, a altura efetiva e o fator direcional vêm, respetivamente

𝜆 𝑙 𝜆
ℎ𝑒𝑓 = tan (𝜋 ) = (2.21)
𝜋 𝜆 𝜋

𝜋
cos(𝑘𝑙 cos𝜃) − cos𝑘𝑙 cos (2 cos𝜃) (2.22)
𝑓𝐷 (𝜃) = =
(1 − cos 𝑘𝑙)sin𝜃 sin𝜃

24
Finalmente, o módulo do campo radiado na zona distante pela antena de 𝜆⁄2 vem dado pela
seguinte expressão:

𝜋
𝑍0 𝐼𝑀 cos (2 cos𝜃) (2.23)
𝐸𝜃 =
2𝜋𝑟 sin𝜃

É fácil verificar que a intensidade máxima de 𝐸𝜃 obtém-se para 𝜃 = 𝜋⁄2. Designa-se o campo
correspondente por 𝐸𝑀 .

𝑍0 𝐼𝑀
𝐸𝑀 = (2.24)
2𝜋𝑟

Pelo que substituindo em (2.23), ficamos com

𝐸𝜃 = 𝐸𝑀 𝑓𝐷 (𝜃) (2.25)

A antena de 𝜆⁄2 , tal como um dipolo de Hertz, radia isotropicamente em azimute, 𝜑. O mesmo
não se verifica no que respeita à colatitude, 𝜃, onde ambos exibem propriedades diretivas.

A direccionalidade da antena de 𝜆⁄2 está definida pela expressão (2.22), o que representa um
diagrama de radiação de tipo toroidal (ver Figura 2.4 e 2.5), do campo elétrico normalizado ao máximo
(𝐸𝜃 ⁄𝐸𝑀 ).

Figura 2.4-Diagrama de radiação do dipolo de meio onda, no plano 𝒛𝒚.

25
Figura 2.5-Diagrama de radiação tridimensional do dipolo de meia onda.

26
2.3.Reflexão no solo

Devido à presença da terra e dependendo das propriedades materiais do terreno, natureza e


orografia, diversos fenómenos podem ocorrer na propagação de ondas eletromagnéticas. A reflexão e
dispersão de ondas no terreno constituem dois dos fenómenos que podem ocorrer durante a
propagação.

A interferência de raios diretos propagados em espaço livre com raios refletidos ou dispersados
no solo, pode ser de natureza construtiva ou destrutiva do sinal, podendo no segundo caso representar
um problema significativo na receção.

Irá ser analisado o caso da reflexão especular em terreno liso, pois deste modo a reflexão do
raio no terreno é concentrada num ponto, não havendo energia dispersada noutras direções, o que
permite nestas condições explorar e analisar situações de interferência extrema. Para estudar este
efeito, considera-se o terreno plano, i.e., despreza-se a curvatura da terra (aproximação da terra plana).

Para determinar o fator de reflexão do terreno em sinais com polarização horizontal e vertical, é
necessário ter em conta diversos fatores, tais como o ângulo de incidência ao solo 𝜓 ou ângulo de fogo,
e o índice de reflexão do solo em relação ao ar.

Algumas considerações a tomar:

 A direção de propagação da onda refletida está assente no mesmo plano que a direção da
onda incidente.
 O ângulo de reflexão é igual ao ângulo de incidência.
 Seja 𝑛, o índice de reflexão do solo em relação ao ar, dado por

1
ℰ𝑠′ 2 (2.26)
𝑛=( )
ℰ0

Onde ℰ𝑠′ = ℰ𝑠 − 𝑗 𝜎𝑠 ⁄𝜔 e ℰ𝑠 = ℰ𝑟 ℰ0 . Sendo ℰ𝑠′ a constante dielétrica complexa do solo, ℰ𝑟 é a


constante dielétrica relativa do solo, ℰ0 é a permitividade elétrica do ar tomada igual à do vácuo, 𝜎𝑠 é a
condutividade elétrica do solo e 𝜓 é o ângulo de chegada da onda incidente.

𝐸𝑖
𝐸𝑖
𝐻𝑖 𝑘𝑖 𝐸𝑟 𝑘𝑟 𝐸𝑟 𝑘𝑟
𝐻𝑖 𝑘𝑖
𝐻𝑟
𝐻𝑟
𝜓 𝜓 𝜓 𝜓

Polarização Horizontal Polarização Vertical

Figura 2.6 – Reflexão em diferentes polarizações. (adaptado de [1])

27
Os campos refletidos vêm dados pelos coeficientes de Fresnel pela seguinte relação de
campos:

 Polarização horizontal

𝐸𝑟𝑒𝑓𝑙𝑒𝑡𝑖𝑑𝑜 sin𝜓 − √𝑛2 − cos2 𝜓


̅̅̅
Γ𝐻 = = (2.27)
𝐸𝑖𝑛𝑐𝑖𝑑𝑒𝑛𝑡𝑒 sin𝜓 + √𝑛2 − cos2 𝜓

 Polarização vertical

𝐻𝑟𝑒𝑓𝑙𝑒𝑡𝑖𝑑𝑜 𝐸𝑛𝑜𝑟𝑚𝑎𝑙 𝑟𝑒𝑓𝑙𝑒𝑡𝑖𝑑𝑜 𝑛2 sin𝜓 − √𝑛2 − cos 2 𝜓


̅̅̅
Γ𝑉 = = = (2.28)
𝐻𝑖𝑛𝑐𝑖𝑑𝑒𝑛𝑡𝑒 𝐸𝑛𝑜𝑟𝑚𝑎𝑙 𝑖𝑛𝑐𝑖𝑑𝑒𝑛𝑡𝑒 𝑛2 sin𝜓 + √𝑛2 − cos 2 𝜓

Em polarização vertical existe um ângulo de incidência para o qual |Γ𝑉 | passa por um mínimo
próximo de zero, designado pseudo-ângulo de Brewster. Assim, para Γ𝑉 (𝜓𝐵 ) = 0 :

𝑛
𝜓𝐵 = arccos [ ] (2.29)
√1 + 𝑛2

Com estes resultados é possível estudar e analisar o comportamento dos campos na chamada
zona de interferência, para a situação de terra plana.

Em distâncias sucessivamente crescentes, o campo oscila em torno de um valor médio,


correspondente à propagação em espaço livre. Esta oscilação deve-se à interferência entre os raios
diretos e refletidos sobre o terreno, na zona de interferência.

Para efetuar uma análise do efeito de interferência entre o raio direto e o refletido, considera-se
o caso particular de uma antena emissora no solo a enviar um sinal a um recetor em movimento, por
exemplo um avião. O recetor desloca-se com uma altura constante.

𝑟𝑑

ℎ2

𝑟𝑟

ℎ1
𝜓

𝑑
Figura 2.7 - Raio direto e raio refletido. (adaptado de [1])

28
Os raios refletido e direto vêm dados respetivamente pelas seguintes expressões:

𝑟𝑟2 = 𝑑2 + (ℎ1 + ℎ2 )2 (2.30)

𝑟𝑑2 = 𝑑2 + (ℎ2 − ℎ1 )2 (2.31)

em que 𝑑 é a distância entre as duas antenas, ℎ1 e ℎ2 as alturas da antena emissora e recetora,


respetivamente.

A diferença de trajetos é dada por (Figura 2.7):

Δ𝑟 = 𝑟𝑟 − 𝑟𝑑 (2.32)

Atendendo a que em geral se tem 𝑑 ≫ ℎ1 , ℎ2 , a diferença de trajetos poderá vir dada


aproximadamente por :

ℎ1 ℎ2 (2.33)
Δ𝑟 ≈ 2
𝑑

e por outro lado:

ℎ1 + ℎ2 (2.34)
tan 𝜓 = ≪1
𝑑

sendo 𝜓, o ângulo de chegada da onda incidente, ou ângulo de fogo.

O vetor campo elétrico dos raios direto e refletido é dado respetivamente pelas seguintes
expressões:

𝐸0 −𝑗𝑘𝑟
̅𝐸̅̅𝑑̅ = 𝑒 𝑑 (2.35)
𝑟𝑑

𝐸0
̅̅̅
𝐸𝑟 = ̅̅̅̅̅
𝛤 𝑒 −𝑗𝑘𝑟𝑟 (2.36)
𝑟𝑟 𝑉,𝐻

em que Γ𝑉,𝐻 é o coeficiente de Fresnel para polarização horizontal ou vertical, que na sua forma polar
é expresso da seguinte forma:

𝛤𝑉,𝐻 = |𝛤𝑉,𝐻 |𝑒 𝑗𝑎𝑟𝑔𝛤̅̅̅̅̅̅


̅̅̅̅̅ 𝑉,𝐻 (2.37)

29
O campo total na localização do recetor, neste caso a posição do avião, resulta então da
sobreposição do campo direto com o refletido. No caso de polarização horizontal, na localização do
recetor ambos os vetores dos campos direto e refletido são paralelos e portanto a sobreposição destes
resulta na sua soma. Para polarização vertical, na receção, o ângulo entre os vetores de ambos os
campos é muito pequeno, dado que em geral se tem 𝑑 ≫ ℎ1 , ℎ2 ,i.e., são praticamente paralelos, e
portanto a sobreposição destes resulta, de forma aproximada, na sua soma também.

𝐸̅ = ̅𝐸̅̅𝑑̅ + ̅̅̅
𝐸𝑟 ⇔ (2.38)

̅̅̅
𝐸𝑟
⇔ 𝐸̅ = ̅𝐸̅̅𝑑̅ (1 + ) ⇔ (2.39)
̅𝐸̅̅𝑑̅

𝑟𝑑 −𝑗(𝑘Δ𝑟−𝑎𝑟𝑔Γ̅̅̅̅̅̅)
⇔ 𝐸̅ = ̅𝐸̅̅𝑑̅ [1 + |Γ𝑉,𝐻 | 𝑒 𝑉,𝐻 ] (2.40)
𝑟𝑟

Na situação em que se verifica 𝑑 ≫ ℎ1 , ℎ2 , então (𝑟𝑑 /𝑟𝑟 ) ≈ 1. O campo resultante vem


aproximadamente dado por:

𝐸̅ ≈ ̅𝐸̅̅𝑑̅[1 + |Γ𝑉,𝐻 |𝑒 𝑗Δ𝜙 ] (2.41)

onde Δ𝜙 representa a diferença de fase resultante da sobreposição dos campos direto e refletido:

Δ𝑟
̅̅̅̅̅
Δ𝜙 = 𝑎𝑟𝑔Γ𝑉,𝐻 − 2𝜋
(2.42)
𝜆

A amplitude máxima do campo direto na zona distante, em espaço livre é dado por:

√60𝑃𝑒𝐺𝑒 (2.43)
𝐸𝑑 =
𝑟𝑑

Na zona de interferência o campo total oscila ao longo da distância, entre máximos se a


interferência entre os raios for construtiva (em fase), e mínimos se a interferência for destrutiva (em
oposição de fase). Observa-se um máximo para 𝑒 𝑗Δ𝜙 = 1 e um mínimo para 𝑒 𝑗Δ𝜙 = −1.

𝐸
Máximo: ( ) = 1 + |Γ𝑉,𝐻 |
𝐸𝑑 𝑚𝑎𝑥
(2.44)

𝐸
Mínimo: ( ) = 1 − |Γ𝑉,𝐻 | (2.45)
𝐸𝑑 𝑚𝑖𝑛

30
Estes extremos ocorrem em intervalos de fase 𝜋. Portanto:

̅̅̅̅̅
𝑘Δ𝑟 − 𝑎𝑟𝑔Γ𝑉,𝐻 = 𝑛𝜋 ⇔ (2.46)

̅̅̅̅̅
E atendendo a que em geral se tem 𝑎𝑟𝑔Γ𝑉,𝐻 ≈ −𝜋 para 𝑑 ≫ ℎ1 , ℎ2 :

ℎ1 ℎ2 (2.47)
2𝑘 = (𝑛 − 1)𝜋 ⇔
𝑑

Obtém-se após alguma manipulação a expressão que possibilita determinar as distâncias para
o qual se observa os extremos:

ℎ1 ℎ2
𝑑𝑛 = 4 , com 𝑛 = 2,3,… (2.48)
(𝑛 − 1)𝜆

𝑛 par ⇒ Máximos

𝑛 impar ⇒ Mínimos

De notar que para |Γ𝑉,𝐻 | ≈ 0, o máximo e o mínimo são aproximadamente iguais, i.e., o campo
total resultante é aproximadamente igual ao campo do raio direto em propagação em espaço livre. Este
evento pode acontecer em polarização vertical quando existe um ângulo de incidência para o qual |Γ𝑉 |
passa por um mínimo acentuado, o pseudo-ângulo de Brewster.

2.4.Simulações

As Figuras 2.8 a 2.13 representam os resultados da variação do campo total com a distância
para o cenário em estudo, i.e., considerando a aproximação terra plana, tendo em conta o raio direto e
refletido pelo solo. O Avião (recetor) encontra-se a 1000 m de altura em voo horizontal sobre o mar
(𝜀𝑟 = 81, 𝜎𝑠 = 5 [Ω−1 𝑚−1 ]). Os parâmetros que caracterizam as propriedades do terreno são usados no
cálculo dos coeficientes de Fresnel em polarização horizontal e vertical. Para o emissor considera-se
um dipolo de meia-onda (𝜆/2), a emitir um sinal em polarização horizontal ou vertical, à altura de 250
m do solo. A potência entregue à antena é de 10 W, ganho de 10 dBi e comprimento de onda (𝜆) de
4 m.

Nas Figuras 2.14 a 2.18 analisa-se a influência e contributo que um agregado de antenas de
meia-onda no emissor tem na propagação.

31
Para o cálculo do campo é necessário acrescentar à expressão (2.40) as contribuições do fator
direcional da antena e do fator do agregado, tanto para o raio direto como para o raio refletido. O fator
direcional do raio direto e refletido vem, respetivamente

𝜋
cos(2 cos(𝜃𝑑 ))
𝑓𝐷 (𝜃𝑑 ) = (raio direto) (2.49)
sin(𝜃𝑑 )

𝜋
cos(2 cos(𝜃𝑟 ))
𝑓𝐷 (𝜃𝑟 ) = (raio refletido) (2.50)
sin(𝜃𝑟 )

O fator do agregado é dado por:

𝛾
sin (𝑁𝑎𝑛𝑡 2𝑑 )
𝐹𝑑 = 𝛾 (raio direto) (2.51)
sin ( 𝑑 )
2

𝛾
sin (𝑁𝑎𝑛𝑡 2𝑟 )
𝐹𝑟 = 𝛾 (raio refletido) (2.52)
sin ( 𝑟 )
2

onde, 𝛾𝑑 = 𝑘 × 𝑑𝑎𝑛𝑡 × cos(𝜃𝑑 ) + 𝛿 , 𝛾𝑟 = 𝑘 × 𝑑𝑎𝑛𝑡 × cos(𝜃𝑟 ) + 𝛿 e 𝑁𝑎𝑛𝑡 , 𝑑𝑎𝑛𝑡 e 𝛿 representam o número


de antenas do agregado, a distância entre as antenas e a diferença de fase entre a corrente destas,
respetivamente.

Os ângulos 𝜃𝑑 e 𝜃𝑟 representam a colatitude (90𝑜 − 𝑙𝑎𝑡𝑖𝑡𝑢𝑑𝑒) dos raios direto e refletido,


respetivamente.

Sendo

𝜋 𝑎𝑏𝑠(ℎ2 − ℎ1 )
𝜃𝑑 = − tan−1 ( ) (2.53)
2 𝑑

𝜋 ℎ1 + ℎ2
𝜃𝑟 = − tan−1 ( ) (2.54)
2 𝑑

O campo total é então dado pela seguinte expressão:

𝑟𝑑 −𝑗(𝑘Δ𝑟−𝑎𝑟𝑔Γ̅̅̅̅̅̅)
𝐸̅ = ̅𝐸̅̅𝑑̅ [𝑓𝐷 (𝜃𝑑 )𝐹𝑑 + 𝑓𝐷 (𝜃𝑟 )𝐹𝑟 |Γ𝑉,𝐻 | 𝑒 𝑉,𝐻 ]
(2.55)
𝑟𝑟

32
As duas primeiras figuras, 2.8 e 2.9 respetivamente, representam a variação do campo elétrico
normalizado 𝐸 ⁄𝐸𝑑 com a distância, para polarização horizontal (PH). Considera-se apenas uma
antena emissora. Tendo em conta o terreno (mar), a polarização e as distâncias em jogo (onde 𝑑 ≫
ℎ1 , ℎ2 ), na Figura 2.8 faz-se a simulação recorrendo ao modelo aproximado. Admite-se deste modo
que 𝑟𝑟 = 𝑟𝑑 pois a distância em jogo é bastante elevada, Δ𝑟 é dado pela expressão (2.33) ,
̅̅̅̅̅
𝑎𝑟𝑔Γ𝑉,𝐻 = −𝜋 e |Γ𝐻 | = 1. Nestas condições o campo normalizado é dado pela seguinte expressão:

𝐸̅ ℎ ℎ
−𝑗(𝑘 ×2 1 2 +𝜋)
= 𝑓𝐷 (𝜃𝑑 ) + 𝑓𝐷 (𝜃𝑟 )𝑒 𝑑 (2.56)
̅𝐸̅̅𝑑̅

A Figura 2.9 representa a amplitude do campo normalizado ao longo da distância, usando o


modelo exato (sem aproximações). O campo normalizado vem então dado por:

𝐸̅ 𝑟𝑑 ̅̅̅̅
= 𝑓𝐷 (𝜃𝑑 ) + 𝑓𝐷 (𝜃𝑟 )|Γ𝐻 | 𝑒 −𝑗(𝑘Δ𝑟−𝑎𝑟𝑔Γ𝐻 ) (2.57)
̅𝐸̅̅𝑑̅ 𝑟𝑟

em que Γ𝐻 é o fator de reflexão em polarização horizontal e é dado pela expressão (2.27). Os


parâmetros 𝑟𝑟 , 𝑟𝑑 e Δ𝑟 são calculados através das expressões (2.30), (2.31) e (2.32), respetivamente.

Figura 2.8 - Variação da amplitude do campo normalizado com a distância, recorrendo a aproximações. Sinal
emitido em PH.

33
Figura 2.9 - Variação da amplitude do campo normalizado com a distância. Sinal emitido em PH.

Numa primeira análise, verifica-se que os resultados obtidos tanto para o modelo aproximado
como para o modelo exato, usados para simular a variação do campo normalizado, são bastante
próximos. Trata-se de um resultado esperado, e tal deve-se ao facto de a distância entre as antenas e
o fator de reflexão do mar serem bastante elevados.

Devido ao facto de o campo ser normalizado, este oscila entre um máximo e um mínimo ao longo
da distância, 2 𝑉𝑚−1 e 0 𝑉𝑚−1 , respetivamente. A oscilação do campo entre estes valores está de
acordo com o previsto, dado que em polarização horizontal e para uma observação rasante (𝜓 < 5𝑜 ) o
fator de reflexão é bastante elevado (|Γ𝐻 | ≈ 1), pelo que, os raios direto e refletido terão uma amplitude
idêntica. Utilizando as expressões (2.44) e (2.45), chega-se facilmente a estes resultados, em relação
ao máximo e ao mínimo. A oscilação deve-se à variação da diferença de fase do campo ao longo da
distância.

Nas Figuras 2.10 a 2.13 representa-se a variação da amplitude do campo total com reflexão no
solo ao longo da distância, para um comprimento de onda (𝜆) de 4 m, utilizando o modelo exato
(expressão (2.55)). Considera-se apenas uma antena emissora. Estas figuras representam uma
simulação mais rigorosa e próxima da realidade.

34
Figura 2.10 - Variação da amplitude do campo elétrico com a distância. Sinal emitido em PH.

Figura 2.11 - Variação da amplitude do campo elétrico com a distância, em unidades logarítmicas. Sinal emitido
em PH.

35
Os resultados obtidos nas Figuras 2.10 e 2.11 permitem interpretar o comportamento do campo
em polarização horizontal, na zona de interferência. Aumentando sucessivamente a distância verifica-
se que o campo oscila em torno de um valor médio, correspondente à propagação em espaço livre
(linha vermelha). Este fenómeno deve-se à interferência entre o campo direto (definido entre a antena
emissora e o ponto de observação) e refletido. Em polarização horizontal e em particular neste caso
em que o terreno tem uma condutividade elevada (mar) e sabendo que as distâncias são bastante
elevadas, o que implica que a incidência seja rasante (𝜓 < 5𝑜 ), a reflexão é sempre praticamente total.
Como consequência, a amplitude do campo total é próxima de zero quando se atinge um mínimo nas
distâncias mais elevadas, pois, quando as ondas estão em oposição de fase, a interferência será
bastante destrutiva devido ao facto de ambos os campos, do raio direto e refletido, terem amplitude
idêntica. Observa-se também a diminuição de intensidade do campo à medida que a distância aumenta.

Na Figura 2.11 apresenta-se a variação da amplitude do campo em 𝑑𝐵 𝜇𝑉𝑚−1 , com a distância


em escala logarítmica.

As Figuras 2.12 e 2.13 ilustram os resultados obtidos para um sinal emitido em polarização
vertical. À imagem dos casos anteriores, considera-se apenas uma antena emissora.

Figura 2.12 - Variação da amplitude do campo elétrico com a distância. Sinal emitido em PV.

36
Figura 2.13 - Variação da amplitude do campo elétrico com a distância, em unidades logarítmicas. Sinal emitido
em PV.

Em polarização vertical a reflexão é praticamente total para incidência rasante, mas para
distâncias significativamente superiores às do caso anterior e, consequentemente, com valores muito
menores do ângulo de chegada (𝜓 < 0.5𝑜 ), razão pelo qual nas Figuras 2.12 e 2.13 não se observam
mínimos tão acentuados em comparação com o caso da polarização horizontal.

O ângulo de Brewster é bem visível na região entre 10000 e 15000 m. Substituindo (2.29) em
(2.34) conclui-se que este ângulo localiza-se, mais precisamente, à distância de 11250 m, sendo este
o ponto onde se verifica que |Γ𝑉 | passa por um mínimo acentuado, bastante próximo de zero. O campo
resultante coincide com a linha vermelha, i.e., o campo elétrico neste intervalo é aproximadamente
igual ao campo em propagação em espaço livre.

37
Nas figuras que se seguem, o campo é calculado ponto a ponto desde a zona próxima da antena
até a um limite escolhido. Tanto a distância entre as antenas como a altura foram divididas em
intervalos. Como a distância entre as antenas costuma ser superior à altura, considerou-se um maior
número de intervalos para a distância do que para a altura. O comprimento vertical (𝐿𝑣 ) de cada
intervalo é dado por

ℎ𝑚𝑎𝑥
𝐿𝑣 = (2.58)
𝑛𝑣

em que 𝑛𝑣 é o número de intervalos verticais. O comprimento horizontal (𝐿ℎ ) é dado por

𝑧𝑚𝑎𝑥
𝐿ℎ = (2.59)
𝑛ℎ

onde 𝑛ℎ é o número de intervalos horizontais.

Nas simulações considerou-se 250 intervalos horizontais e 100 intervalos verticais. Os


parâmetros 𝑧𝑚𝑎𝑥 e ℎ𝑚𝑎𝑥 correspondem à distância máxima entre as antenas e à altura máxima que o
raio pode atingir nas simulações, respetivamente.

Para a representação do campo recorreu-se à função imagesc do MATLAB®, que atribui cores
conforme os valores da matriz do campo elétrico. Estas cores foram atribuídas pela função
colormap (jet).

A Figura 2.14 ilustra a variação da amplitude do campo elétrico em espaço livre, em função da
distância. O sinal (onda esférica) é emitido por um dipolo de meia-onda (𝜆⁄2) a 60 m de altura, de
potência 10 W, ganho 15 dBi e frequência 1000 MHz. Como se pode observar, a intensidade do campo
elétrico vai diminuindo à medida que a distância e a altura aumentam.

Figura 2.14 – Campo elétrico em espaço livre.

38
Na Figura 2.15 analisa-se o efeito que um agregado de duas e quatro antenas tem na
propagação em espaço livre. Utilizam-se antenas a radiar uma potência de 10 W, com um ganho de
emissão de 15 dBi e frequência 1000 MHz. As antenas encontram-se distanciadas de 𝜆⁄2 e estão
alimentadas em fase. Procedendo à análise da simulação, verifica-se que a intensidade do campo
aumenta e o lobo principal fica mais estreito, i.e., o feixe é mais diretivo. Isto deve-se ao facto de que
quando se utiliza um agregado, o diagrama de radiação tende a reforça-se na horizontal e a anular-se
na vertical. No caso do agregado de quatro antenas, salienta-se a presença de dois lobos secundários.

Figura 2.15 - Campo elétrico em espaço livre com um agregado de duas antenas (à esquerda) e um agregado de quatro
antenas (à direita).

Para um melhor entendimento do efeito que um agregado tem na propagação, foram simulados
vários casos, que se encontram representados na Figura 2.16. Na imagem superior esquerda
representa-se a variação do campo emitido, utilizando apenas uma antena com potência de 10 W. A
imagem superior direita corresponde a um agregado de duas antenas, cada uma a emitir uma potência
de 10 W, separadas entre si de 𝜆/2 e com as correntes em fase. Em relação à primeira imagem, o
diagrama da segunda apresenta um lobo mais estreito, embora a amplitude do campo elétrico seja
mais elevada. O agregado torna a radiação mais diretiva. Alterando por sua vez a distância entre as
antenas para 2𝜆 (imagem inferior esquerda) e o desfasamento das correntes para 45º mantendo uma
distância de 2𝜆 (imagem inferior direita), começam a surgir lobos secundários na radiação das antenas
e, consequentemente, zonas onde o campo é mais intenso e zonas onde é menos intenso. O
desfasamento das correntes faz com que os lobos secundários sejam maiores e que o lobo principal
diminua. Todas as figuras encontram-se representadas para uma frequência de 1000 MHz e um ganho
por antena de 15 dBi. Em relação à Figura 2.15, os valores do campo elétrico, em cada ponto, estão
em V/m e não em unidades logarítmicas. Para aumentar a nitidez das imagens mudou-se para um
conjunto de cores mais apropriado, através da função colormap (bone) do MATLAB®.

39
Figura 2.16 - Efeito do agregado de antenas.

Nas Figuras 2.17 e 2.18 é representado o efeito e o impacto que as reflexões no solo têm na
variação da amplitude do campo elétrico ao longo da distância e também da altura da antena de
receção, ponto a ponto. É feito um varrimento de 0 a 100 m de altura, ao longo de uma distância de
2000 m. Na primeira situação a antena emite um sinal em polarização vertical, com potência de emissão
de 10 W, ganho de 15 dBi e frequência de 500 MHz, em solo húmido. A partir de cerca de 500 m de
distância é possível distinguir os máximos e mínimos do campo na receção, ao longo da distância e da
altura.

40
Figura 2.17 – Variação da amplitude do campo elétrico com reflexão no solo. Sinal emitido em PV.

Por último, na Figura 2.18 representa-se a variação da amplitude do campo em função da


distância e altura da antena de receção, quando o sinal é emitido por um agregado de duas antenas
de meia-onda, em polarização vertical. Cada antena radia com uma potência de 10 W, ganho de 15
dBi e frequência 500 MHz, separadas de 𝜆⁄2 e sem desfasagem entre as correntes. Comparando com
a situação anterior, neste caso o valor do campo elétrico será maior para distâncias mais longas.
Verifica-se também que o ponto a partir do qual se começam a notar os máximos e mínimos aumenta.

Figura 2.18 – Variação da amplitude do campo elétrico com reflexão no solo usando um agregado de duas antenas. Sinal
emitido em PV.

41
42
3. DIFRAÇÃO CAUSADA POR OBSTÁCULOS

3.1.Modelo Knife-edge

No capítulo anterior, tendo em consideração a aproximação em terra plana, fez-se o estudo da


interferência entre raios diretos propagados em espaço livre e raios refletidos no solo com origem na
reflexão especular em terreno liso, durante a emissão de um sinal.

Neste capítulo será analisada a forma como a orografia do terreno intervém na propagação. O
terreno na maioria dos casos tem uma natureza irregular, com elevações e obstáculos que podem
eventualmente causar interferência e atenuar significativamente o sinal emitido.

Para simplificar o problema, recorre-se à aplicação de modelos de obstáculos, como é o caso do


Knife-edge. O tratamento rigoroso deste modelo é útil porque permite definir os parâmetros importantes
do problema e obter estimativas razoáveis da influência dos obstáculos.

No modelo Knife-edge, o obstáculo é visto como um plano opaco semi-infinito. A geometria do


problema é a indicada na Figura 3.1. No plano 𝑧 = 0 para 𝑥 < 0 tem-se o plano opaco semi-infinito, que
se estende de 𝑦 = −∞ a 𝑦 = +∞. Considera-se que incide no plano semi-infinito uma onda esférica
com origem no ponto 𝐸 (emissão), situado na região 𝑧 < 0 (𝐸 e 𝑅 no mesmo plano 𝑦 = 0).

𝑅(𝑥𝑟 , 0, 𝑑𝑟 )
𝑥

𝑥𝑟
𝐸(𝑥𝑒 , 0, −𝑑𝑒 )
𝑥̅
ℎ2
𝑥𝑒
𝑦
ℎ1 𝑧
ℎ𝑜𝑏𝑠

𝑑𝑒 𝑑𝑟

Figura 3.1 - Geometria do modelo Knife-edge.

43
Encontramo-nos na presença dos seguintes parâmetros:

ℎ1 , ℎ2 - Altura das antenas emissora e recetora em relação ao solo

ℎ𝑜𝑏𝑠 - Altura do obstáculo

𝑥𝑒 , 𝑥𝑟 - Altura das antenas emissora e recetora em relação ao topo do obstáculo

𝑑𝑒 , 𝑑𝑟 - Distância das antenas emissora e recetora ao obstáculo

𝑑 - Distância entre o emissor e o recetor. Em que, 𝑑 = 𝑑𝑒 + 𝑑𝑟 .

𝑥̅ – Folga (clearance). Distância entre o bordo do plano semi-infinito (ou topo do obstáculo) e o ponto
do raio em 𝑧 = 0.

𝑥𝑒 𝑑𝑟 + 𝑥𝑟 𝑑𝑒
𝑥̅ =
𝑑 (3.1)

A altura equivalente ℎ𝑒 vem dada por:

𝑘𝑑
ℎ𝑒 = √ 𝑥̅
𝜋𝑑𝑟 𝑑𝑒 (3.2)

O critério de folga muitas vezes utilizado no projeto de ligações hertzianas na presença de


obstáculos e em muitas outras circunstâncias diversas, pretende estabelecer para que cota acima do
obstáculo se pode considerar o feixe como desimpedido dentro de uma certa tolerância. Por outras
palavras, neste critério considera-se que o obstáculo não interfere significativamente com o feixe desde
que não intercete o primeiro elipsoide de Fresnel (Figura 3.2).

𝑬 𝑟1

𝑟𝑎 𝑟2
𝐷/2 𝑟𝑏 𝑹

Figura 3.2 - Elipsoide de Fresnel. (adaptado de [1])

44
Estes elipsoides são os lugares geométricos dos pontos que verificam a seguinte relação:

𝜆
𝛥𝑟 = (𝑟𝑎 + 𝑟𝑏 ) − 𝑟𝑑 = 𝑛 (3.3)
2

sendo 𝑟𝑑 = 𝑟1 + 𝑟2 .

Assim, tem-se para o primeiro elipsoide de Fresnel

𝑛=1

para o segundo

𝑛=2

etc.

Pode-se calcular o diâmetro 𝐷 dos elipsoides de Fresnel a qualquer distância (grande) 𝑟1 do


emissor.

Vem então

𝐷 2
𝑟𝑎 = √𝑟12 + ( )
2 (3.4)

𝐷 2
𝑟𝑏 = √𝑟22 + ( ) (3.5)
2

admitindo 𝑟1 ,𝑟2 ≫ 𝐷.

Para o primeiro elipsoide de Fresnel, o diâmetro à distância 𝑟1 do emissor vem dado por:

4𝜆𝑟1 𝑟2
𝐷1 = √ (3.6)
𝑟𝑑

Quando a folga 𝑥̅ do ponto de observação (i.e., a altura deste ponto acima do topo do obstáculo)
for maior que o raio (𝐷1 /2) do primeiro elipsoide de Fresnel (em 𝑧 = 0) , verifica-se que o obstáculo
representado pelo plano semi-infinito já não interfere com o sinal recebido no recetor, i.e., este sinal
será bastante próximo do que seria recebido em condições de espaço livre.

A atenuação suplementar no ponto 𝑅 de receção, depois da onda esférica ser difratada pelo
obstáculo do tipo Knife-edge, é dada por [1]:

2 2
1 1 1 1
)
𝐴(ℎ𝑒 = [ + 𝐶(ℎ𝑒 )] + [ + 𝑆(ℎ𝑒 )] (3.7)
2 2 2 2

45
em que 𝐶(ℎ𝑒 ) e 𝑆(ℎ𝑒 ) são os chamados integrais de Fresnel para uma dada altura equivalente ℎ𝑒 .

A Figura 3.3 representa a variação da atenuação introduzida por um obstáculo do tipo Knife-
edge, em função da penetração 𝑣, dada por 𝑣 = −ℎ𝑒 .

Figura 3.3 – Atenuação introduzida por um obstáculo tipo Knife-Edge em função da penetração.

Para o cálculo da atenuação da Figura 3.3 utilizou-se a expressão (3.7), obtida de

𝐼(ℎ𝑒 )
𝐴(ℎ𝑒 ) = [ ] (3.8)
𝐼(∞) 𝑑𝐵

1 1 2 1 1 2
onde 𝐼(ℎ𝑒 ) = [ + 𝐶(ℎ𝑒 )] + [ + 𝑆(ℎ𝑒 )] é a intensidade do campo observado no ponto (𝑥, 𝑧) depois
2 2 2 2

da onda ser difratada pelo plano semi-infinito, e 𝐼(∞) = 1 representa o nível de referência da
intensidade do campo. O valor de referência corresponde ao caso em que o ponto de observação está
suficientemente acima do bordo do plano semi-infinito, pelo que a presença deste já não se faz sentir.

A partir da Figura 3.3 podem-se tirar as seguintes conclusões:

 Na zona de sombra geométrica (ℎ𝑒 < 0) o campo não só não sofre uma descontinuidade brusca
como pode ainda ser apreciável;

 Para ℎ𝑒 = 0 (observação rasante) o campo está 6 dB abaixo do campo em espaço livre;

 Para aproximadamente ℎ𝑒 > 1 tem-se o campo em espaço livre com uma imprecisão menor que
± 1 dB;

46
 Para o ponto de observação profundamente imerso na zona de sombra (ℎ𝑒 < 0, |ℎ𝑒 | ≫ 1) a
função 𝐼 decresce rapidamente, sendo deste modo justificável que se limite a análise à região
de Fresnel.

3.2.Simulações

Para simular o modelo Knife-edge, optou-se por dividir a zona de representação do campo
elétrico em duas partes. A primeira parte corresponde ao espaço percorrido desde a antena de emissão
até ao obstáculo, onde o campo é calculado segundo a expressão (2.40). A segunda parte corresponde
ao espaço desde o obstáculo até à antena de receção onde o campo vai sofrer uma atenuação extra
calculada através do modelo knife-edge.

O processo de cálculo dos valores do campo ao longo da distância e da altura da antena de


receção é idêntico ao utilizado para o cálculo do campo elétrico com reflexões no capítulo anterior.
Divide-se tanto a distância máxima e a altura em intervalos (expressão (2.58) e (2.59)). Os intervalos
neste caso serão menores devido à necessidade de se calcular os integrais de Fresnel, o que exige
um maior esforço computacional e, consequentemente, mais tempo.

Considerando também um agregado de antenas no emissor e a direccionalidade das antenas, a


amplitude do campo total antes do obstáculo é calculada ponto a ponto utilizando a expressão (2.55).
Ao passar pelo obstáculo, o campo total resultante é dado pelo produto entre a atenuação suplementar
causada pela difração da onda esférica no obstáculo (expressão (3.7)), e a expressão (2.55). O campo
elétrico após a perturbação provocada pelo obstáculo, é dado por:

𝑟𝑑 −𝑗(𝑘 Δ𝑟−𝑎𝑟𝑔Γ̅̅̅̅̅̅)
𝐸̅ = ̅𝐸̅̅𝑑̅ [𝑓𝐷 (𝜃𝑑 )𝐹𝑑 𝐴𝑑 (ℎ𝑒𝑑 ) + 𝑓𝐷 (𝜃𝑟 )𝐹𝑟 𝐴𝑟 (ℎ𝑒𝑟 )|Γ𝑉,𝐻 | 𝑒 0 𝑉,𝐻 ]
(3.9)
𝑟𝑟

em que 𝐴𝑑 (ℎ𝑒𝑑 ) e 𝐴𝑟 (ℎ𝑒𝑟 ) representam as atenuações suplementares a que os raios direto e refletido
ficam submetidos após a difração no obstáculo, respetivamente. Estes vêm dados por:

2 2
1 1 1 1
𝐴𝑑 (ℎ𝑒𝑑 ) = [ + 𝐶(ℎ𝑒𝑑 )] + [ + 𝑆(ℎ𝑒𝑑 )] (raio direto) (3.10)
2 2 2 2

2 2
1 1 1 1
𝐴𝑟 (ℎ𝑒𝑟 ) = [ + 𝐶(ℎ𝑒𝑟 )] + [ + 𝑆(ℎ𝑒𝑟 )] (raio refletido) (3.11)
2 2 2 2

onde ℎ𝑒𝑑 e ℎ𝑒𝑟 correspondem às alturas equivalentes para os raios direto e refletido, respetivamente.

Tendo em conta a Figura 3.1, o valor da folga 𝑥̅ para o raio direto e refletido calcula-se através
das seguintes expressões:

47
𝑥𝑒𝑑 𝑑𝑟 + 𝑥𝑟 𝑑𝑒 (ℎ1 − ℎ𝑜𝑏𝑠 )𝑑𝑟 + (ℎ2 − ℎ𝑜𝑏𝑠 )𝑑𝑒
𝑥̅𝑑 = = (raio direto) (3.12)
𝑑 𝑑

𝑥𝑒𝑟 𝑑𝑟 + 𝑥𝑟 𝑑𝑒 −(ℎ1 + ℎ𝑜𝑏𝑠 )𝑑𝑟 + (ℎ2 − ℎ𝑜𝑏𝑠 )𝑑𝑒


𝑥̅𝑟 = = (raio refletido) (3.13)
𝑑 𝑑

Substituindo as expressões (3.12) e (3.13) em (3.2), calcula-se a atenuação provocada pelo


obstáculo para o raio direto e raio refletido.

Na Figura 3.4 apresentam-se os resultados que se obteve para a simulação da difração causada
por um obstáculo durante a comunicação entre um emissor e um recetor. São utilizados dipolos de
meia-onda (𝜆/2), sendo a altura do emissor e do obstáculo de 100 m. O sinal é emitido em polarização
vertical (PV), a 180 MHz de frequência e o terreno entre as antenas é húmido. Relativamente à altura
da antena recetora, fez-se um varrimento entre 0 e 200 m, de forma a poder tirar conclusões
relativamente à atenuação do sinal nos diversos pontos de interesse, após a difração causada pelo
obstáculo.

Um aspeto importante na atenuação suplementar provocada pelo obstáculo é a frequência.


Quanto mais alta for a frequência, mais elevada será a atenuação provocada pelo obstáculo e,
consequentemente, menor é o valor do campo elétrico. A zona de sombra geométrica (ℎ𝑒 < 0) é a
região mais sensível a variações na frequência, como se pode observar na Figura 3.5.

Figura 3.4 - Modelo Knife-edge para 180 MHz.

48
Numa primeira análise à Figura 3.4, pode-se concluir que o obstáculo deixa de interferir com o
sinal recebido no recetor, se o feixe passar acima do obstáculo com uma cota suficientemente elevada,
o que está de acordo com o critério de folga referido anteriormente. Nestas condições o sinal recebido
não difere, a menos de 1 dB, do sinal recebido em condições de espaço livre.

É possível observar também que num ponto de observação profundamente imerso na zona de
sombra (ℎ𝑒 < 0) após o obstáculo (𝑧 > 0), verifica-se uma queda abrupta na intensidade do campo total
recebido. Nesta região, quanto maior for a proximidade ao obstáculo mais elevada é a atenuação.

A Figura 3.5 apresenta os resultados para uma frequência mais elevada.

Figura 3.5 - Modelo Knife-edge para f=1000 MHz.

Como se pode observar a partir da Figura 3.5, à medida que a frequência do sinal emitido
aumenta, a sua diretividade aumenta, tornando o elipsoide de Fresnel cada vez mais estreito, o que
resulta num aumento da zona de sombra (ℎ𝑒 < 0) presente na região a seguir ao obstáculo (𝑧 > 0). Na
Figura 3.5 pode observar-se que o campo atinge -90 dB Vm-1 na zona de sombra próxima do obstáculo,
enquanto na Figura 3.4 este atinge valores de -80 dB Vm-1. Também na zona a seguir ao obstáculo,
onde o valor do campo é menor entre 2000 m e 4000 m, este é maior na Figura 3.4.

A contribuição do agregado de antenas irá aumentar a intensidade do campo elétrico recebido


ao longo da distância e da altura, mantendo o comportamento que os raios manifestam ao serem
perturbados por um obstáculo. Assim, usou-se apenas uma antena de emissão nas simulações.

49
50
4. REFRAÇÃO NA ATMOSFERA

Nos capítulos anteriores foram abordados alguns fatores que caracterizam e influenciam de
forma bastante significativa a propagação de ondas eletromagnéticas na presença da terra. Um outro
fator importante a ter em conta, que intervém ativamente no modo como o sinal se propaga, é a
presença da atmosfera.

Na atmosfera destacam-se fundamentalmente três zonas distintas:

 A baixa atmosfera, principalmente até aos primeiros 2 ou 3 mil metros de altura, constituída por
gases neutros e eventualmente gotas de chuva, etc.;

 Troposfera;

 A ionosfera, que se inicia a cerca de 50 a 70 km de altura, constituída por gases ionizados.

Neste capítulo será dado um maior relevo à baixa atmosfera, pois é nesta região que se efetua
a maior parte das ligações solo-solo, como por exemplo as ligações hertzianas. A baixa atmosfera
influencia a propagação das ondas eletromagnéticas na gama das radiofrequências, fundamentalmente
das seguintes maneiras:

 O índice de refração do ar ainda que muito próximo de 1, varia em cada local com a altura, pelo
que ao longo do trajeto os “raios” deixam de ser retilíneos, passando a apresentar uma curvatura.

 Dado que o índice de refração depende de grandezas “meteorológicas”, o seu gradiente com a
altura além de variar de ponto para ponto, varia também no tempo, o que está na origem do
fenómeno do desvanecimento (fading).

 Em certas regiões da troposfera o índice de refração varia muito rapidamente de local para local,
pelo que essas regiões dispersam as ondas que nelas incidem.

 A presença na atmosfera de gotas de água em suspensão (chuva, nevoeiro, nuvens) ou de água


em estado sólido (granizo, neve) provoca absorção e dispersão, mais acentuadamente em
frequências elevadas.

 Em frequências acima de 10 GHz a transparência da atmosfera é muito diminuída pela absorção


das moléculas dos gases componentes, em certas bandas características.

51
4.1.Índice de refração da atmosfera

O índice de refração em relação ao vácuo na baixa atmosfera é aproximadamente 1, ou seja,


𝑛 ≈ 1. Nestas circunstâncias é usual utilizar a refractividade 𝑁, também conhecida sob o nome de
índice de refração reduzido.

𝑁 = (𝑛 − 1) ⋅ 106 (4.1)

A refratividade 𝑁 depende da temperatura 𝑇 [ 𝑜𝐾 ], da tensão do vapor de água 𝑒 [𝑚𝑏] e da


pressão atmosférica total 𝑝 [𝑚𝑏], através da seguinte fórmula empírica (recomendada pelo CCIR
(Recomendação 453) [39]):

77.6 𝑒
𝑁=( ) ⋅ (𝑝 + 4810 ) (4.2)
𝑇 𝑇

Em condições normais de atmosfera, o índice de refração e, consequentemente, a refratividade


𝑁, diminuem com a altura. No CCIR (Relatório 231-1) [38] é dada a seguinte fórmula para a “atmosfera
média”:

𝑛(ℎ) = 1 + 315 ⋅ 10−6 𝑒 −0,136ℎ (4.3)

onde a altura, ℎ, vem em km.

Que na superfície da terra (ℎ=0), resulta em:

𝑁(0) = 315, 𝜕𝑁/𝜕ℎ|ℎ=0 = −43 𝑘𝑚−1

Na figura que se segue representa-se 𝑁 em função da altura, 𝑁(ℎ), segundo a lei expressa em
(4.3) (traço contínuo).

52
Figura 4.1 – Variação da refratividade com a altura.

A tracejado representa-se

𝑁 = 𝑁(0) − 43ℎ (4.4)

onde ℎ vem em km.

A expressão (4.4) constitui os dois primeiros termos do desenvolvimento em série de (4.3). Esta
variação linear define a “atmosfera padrão”. Observando a figura, verifica-se que até cerca de 1000 m
as duas formas de variação coincidem praticamente. Esta observação tem interesse, porque é nesta
região que se efetua a maior parte das ligações solo-solo.

4.2.Trajetória de um raio ótico numa atmosfera horizontalmente


estratificada

Atendendo à variação do índice de refração de local para local na atmosfera, podemos analisar
esta como uma sequência de estratos ou camadas. São feitas as seguintes suposições simplificativas:

 A atmosfera está estratificada horizontalmente, i.e., o índice de refração 𝑛 é só função da altura.

 A função 𝑛(ℎ) é muito lentamente variável à escala do comprimento de onda, o que permite
considerar que em cada ponto são válidos os resultados da propagação em meios uniformes.

53
 Como consequência de 𝑛(ℎ) ser lentamente variável, ignora-se a onda refletida na transição
entre dois meios para só se considerar a transmitida.

 Utiliza-se um tratamento de ótica geométrica.

Considera-se primeiro uma estratificação plana e depois uma estratificação esférica, atendendo
a que a terra é esférica.

4.2.1.Estratificação plana

A Figura 4.2 ilustra a situação mais simples, em que existem três estratos de índices 𝑛0 , 𝑛1 e 𝑛 .
O andamento do raio implica que 𝑛0 > 𝑛1 > 𝑛 ,mas esse facto não é em nada restritivo.

𝜃 𝑛

ℎ 𝜃1
𝜃1 𝑛1

𝑛0
𝜃0

Figura 4.2 – Geometria para estratificação plana. (adaptado de [1])

Usando a lei da refração, da passagem do meio 𝑛0 para o meio 𝑛1 tem-se

𝑛0 sin 𝜃0 = 𝑛1 sin 𝜃1 (4.5)

E do meio 𝑛1 para o meio 𝑛:

𝑛1 sin 𝜃1 = 𝑛 sin 𝜃 (4.6)

Destas duas equações conclui-se que do meio 𝑛1 para o meio 𝑛 tem-se

𝑛 sin 𝜃 = 𝑛0 sin 𝜃0 (4.7)

54
A inclusão de mais estratos entre os meios 𝑛0 e 𝑛 não altera este resultado, pelo que passando
agora ao limite de uma variação contínua de 𝑛 tem-se

𝑛(ℎ) sin 𝜃 = Cte (4.8)

4.2.2.Estratificação esférica

Consideram-se agora estratos esféricos concêntricos (Figura 4.3). Admite-se ainda que o raio de
curvatura dos estratos é muito grande, utilizando-se então as leis de refração em interfaces planas.

𝑛 𝜃

𝑃0
𝜃1′
𝜃1
𝑛1

𝑛0 𝜃0

𝑟𝑐
𝑟0

Figura 4.3 – Geometria para estratificação esférica. (adaptado de [1])

Note-se que 𝜃1′ ≠ 𝜃1 , mas considerando o triângulo CPoP vem

sin (𝜋 − 𝜃1 ) sin 𝜃1′


= ⇔ 𝑟0 sin 𝜃1 = 𝑟𝑐 sin 𝜃1′ (4.9)
𝑟𝑐 𝑟0

Usando as leis de refração em interfaces planas e a expressão (4.9), vem:

𝑛0 𝑟0 sin 𝜃0 = 𝑛 𝑟𝑐 sin𝜃 (4.10)

55
Induzindo para o caso contínuo vem

𝑛(ℎ) 𝑟𝑐 sin 𝜃 = Cte. (4.11)

Ou, atendendo a que 𝑟𝑐 = 𝑎 + ℎ (onde 𝑎 representa o raio da terra):

𝑛(ℎ) (𝑎 + ℎ) sin 𝜃 = Cte. (4.12)

4.3.Raio de curvatura do raio ótico

O raio de curvatura 𝜌 do raio ótico é dado em cada ponto por

𝑑𝑠 = 𝜌 𝑑𝜑 (4.13)

Sendo 𝜌 definido pela expressão [35]:

𝑛
𝜌=−
𝑑𝑛 (4.14)
sin 𝜃
𝑑ℎ

O sinal de 𝜌 é tal que 𝜌 > 0 quando a curvatura do raio está virada para a terra. A figura seguinte
ilustra o cenário em estudo.

𝜃
𝑑𝑠
𝜃0

𝑎+ℎ 𝑑𝜑 𝜌

Figura 4.4 – Definição do raio de curvatura de uma trajetória. (adaptado de [1])

56
Para que um raio tangente ao círculo de raio (𝑎 + ℎ) concêntrico com a terra volte à superfície
da terra, é necessário que se verifique a seguinte condição:

𝑛
𝜌=− < (𝑎 + ℎ) (4.15)
𝑑𝑛⁄𝑑ℎ

onde sin 𝜃 = 1 (pois o raio é tangente a um círculo concêntrico com a terra).

Com 𝑛 ≈ 1 e 𝑎 + ℎ ≈ 𝑎 = 6370 km, o gradiente vertical do índice de refração vem

𝑑𝑛 1
− > = 157 × 10−6 𝑘𝑚−1 (4.16)
𝑑ℎ 6370

Este valor é muito superior ao observado para a “atmosfera média” (≈ 43 × 10−6 km-1), pelo que
em condições “normais” os raios iniciados horizontalmente afastam-se da terra.

No entanto, dado que em condições “normais” na baixa atmosfera 𝑑𝑛/𝑑ℎ é aproximadamente


constante, verifica-se que o raio de curvatura dos raios iniciados horizontalmente (sin 𝜃 ≈ 1) é também
aproximadamente constante, ainda que se afastem progressivamente da terra.

4.4.Refratividade modificada

A refratividade modificada 𝑀 constitui uma outra forma de representação do índice de refração,


e é definido de tal modo que o seu gradiente vertical 𝑑𝑀/𝑑ℎ seja nulo para a altura ℎ0 em que a trajetória
de um raio ótico iniciado segundo a horizontal seja um arco de círculo concêntrico com a superfície da
terra. Nestas condições, este raio é tangente a um circulo concêntrico com a terra, logo sin 𝜃 = 1 e
𝑛 ≈ 1, e portanto

1
𝜌=− = 𝑎 + ℎ0
𝑑𝑛 (4.17)
𝑑ℎ

Por outro lado, para a atmosfera média sabe-se que

𝑑𝑛 𝑑𝑁
( ) =( ) ⋅ 10−6 = −43 × 10−6 𝑘𝑚−1 (4.18)
𝑑ℎ ℎ=0 𝑑ℎ ℎ=0

57
Assim, ao valor de 𝜌 corresponde um gradiente de 𝑁 dado por

𝑑𝑁 106
( ) =− (4.19)
𝑑ℎ ℎ0 𝑎 + ℎ0

Então 𝑀 satisfaz à sua definição se for

𝑑𝑀 𝑑𝑁 106
= + (4.20)
𝑑ℎ 𝑑ℎ 𝑎 + ℎ0

Visto que desta forma resulta (𝑑𝑀/𝑑ℎ)ℎ0 = 0.

Após alguma manipulação algébrica e escrevendo genericamente ℎ em vez de ℎ0 , e sabendo


que ℎ ≪ 𝑎, vem


𝑀 = 𝑁 + 106 (4.21)
𝑎

em que 𝑎 ≈ 6370 km, representa o raio da terra.

Na Figura 4.5 representa-se a variação do índice 𝑀 com a altura, 𝑀(ℎ), usando a expressão
(4.3) de 𝑛(ℎ) para obter a refratividade 𝑁 para a atmosfera média.

Figura 4.5 – Variação da refratividade modificada com a altura.

58
Para dar uma interpretação importante ao índice 𝑀 , retoma-se a equação da estratificação
esférica:

𝑛 𝑟𝑐 sin 𝜃 = 𝑛0 𝑎 sin 𝜃0 (4.22)

Efetuando as seguintes substituições:


𝑟𝑐 = 𝑎 (1 + ) (4.23)
𝑎

𝑛 = 1 + 10−6 𝑁 (4.24)

Vindo, a menos de um termo de segunda ordem,

(1 + 10−6 𝑀) sin 𝜃 = 𝑛0 sin 𝜃0 (4.25)

Concluindo-se que este mesmo resultado é obtido para um raio numa estrutura plana,
estratificada horizontalmente, com um índice de refração modificado dado por

𝑚(ℎ) = 1 + 10−6 𝑀 (4.26)

em que a refratividade modificada 𝑀, faz o papel da refratividade 𝑁.

Esta interpretação permite resolver os problemas relativos a uma atmosfera com estratificação
esférica caracterizada por 𝑁(ℎ), transformando-os em problemas relativos a uma atmosfera com
estratificação plana caracterizada por 𝑀(ℎ) – Equivalência da terra plana.

4.5.Propagação em Ductos

Devido a condições meteorológicas especiais, podemos estar na presença de curvas que fogem
à forma típica da variação de 𝑀 com a altura nas condições “usuais” de propagação. Existe um
interesse particular nas curvas em que se formam “camadas de inversão”, onde 𝑑𝑀/𝑑ℎ se torna
negativo. Estas regiões da atmosfera são designadas de ductos, pois comportam-se como um guia de
ondas aberto, podendo assim guiar ondas a grande distância.

Em condições meteorologias favoráveis à formação de ductos, pode suceder que um raio iniciado
horizontalmente a uma altura ℎ, com o seu raio de curvatura 𝜌 menor que o da camada esférica de raio
(𝑎 + ℎ) , se aproxime da terra e eventualmente possa ser captado como se exemplifica na Figura 4.6.
O mesmo não acontece na atmosfera padrão como foi visto anteriormente, onde os raios iniciados
horizontalmente se afastam progressivamente da superfície da terra, com 𝜌 > (𝑎 + ℎ).

59
𝑎+ℎ

Figura 4.6 – Raio captado num ducto. (adaptado de [1])

Em outros casos, os raios poderão nem alcançar a superfície da terra, sendo refletidos numa
camada inferior onde as condições do tipo da atmosfera padrão tornem a prevalecer.

Devido ao facto de haver captação de energia sob a forma de ondas guiadas, a atenuação é
menor que em espaço livre. Assim, se um ducto captar a emissão de um sinal de uma antena e se esse
ducto for circunferencialmente uniforme, ter-se-á propagação numa estrutura cilíndrica e portanto a
potência vem atenuada de 1/𝑑 em vez de 1/𝑑 2 como seria em espaço lvre.

O estudo desta forma de propagação em que alguma energia é captada num ducto é deste modo
muito importante, devido à possibilidade destes raios poderem causar interferência noutros serviços,
ainda que a grandes distâncias.

4.5.1.Condições necessárias para a formação de ductos

Um ducto é criado em geral quando ocorre uma inversão de temperatura na atmosfera, em que
a temperatura do ar em vez de decrescer monotonamente com a altura exibe na realidade um
crescimento durante dezenas ou algumas centenas de metros. Lembrando que 𝑁 é muito sensível a
1/𝑇, 𝑑𝑁/𝑑ℎ poderá decrescer tão rapidamente que torna 𝑑𝑀/𝑑ℎ negativo. Esta situação é acentuada
se o ar mais frio for bastante húmido, e a camada mais quente for constituída por ar seco, visto que a
refratividade 𝑁 também é sensível à tensão do vapor de água 𝑒.

A formação de ductos é muito frequente perto da superfície do mar, junto a costas de zonas
desérticas e áridas.

As camadas dos ductos apresentam uma espessura reduzida da ordem do metro ou das dezenas
de metros, razão pelo qual a propagação esteja limitada à captação de frequências muito elevadas.
Normalmente, só para frequências acima de 1 GHz é que o ducto começa a ter dimensão apropriada
para reter a energia que nele foi excitada. As condições de captura por um ducto de altura finita são

60
determinadas pelas perdas por radiação através dos bordos (topos) do ducto. Assim, o ducto só reterá
energia se as perdas pelo topo forem reduzidas.

Quando estão presentes as condições favoráveis ao aparecimento de ductos junto á superfície,


estes designam-se de ductos superficiais. Quando surgem em altitude, denominam-se de ductos
sobrelevados.

Nas figuras seguintes pode-se observar a trajetória dos raios para diferentes variações da
refratividade modificada em função da altura, 𝑀(ℎ). A Figura 4.7 descreve o tipo de comportamento
que os raios manifestam em atmosfera standard e nas Figuras 4.8 e 4.9 pode-se verificar os efeitos
que os dois tipos de ductos criam na propagação dos raios.

 Atmosfera standard

𝑀(𝑧)
Altura

𝑀1
Distância

Figura 4.7 – Trajetória dos raios em Atmosfera standard. (adaptado de [35])

 Ducto superficial

𝑀(𝑧)
Altura

Ducto

𝑀1 Distância

Figura 4.8 – Trajetória dos raios na presença de ducto superficial. (adaptado de [35])

61
 Ducto sobrelevado

𝑀(𝑧)
Altura

Ducto
𝑀1
Distância

Figura 4.9 – Trajetória dos raios na presença de ducto sobrelevado. (adaptado de [35])

4.6.Traçado de raios

4.6.1.Modelo exato

A Figura 4.10 representa a trajetória de um raio, ao atravessar uma atmosfera caracterizada pela
refratividade modificada 𝑀 e do ângulo 𝛼 que o raio faz com a horizontal, para cada ponto da trajetória.
Um raio ao atravessar a atmosfera com mais que um estrato ou camada, os diferentes índices 𝑀 irão
influenciar significativamente a trajetória do seu traçado. O raio é emitido com um ângulo de saída 𝛼0
em relação à horizontal, a uma altura ℎ0 da antena. A refratividade modificada no ponto de partida do
raio é dada por 𝑀(ℎ0 ).

𝑀0 𝑀 𝛼
𝛼0
ℎ0 ℎ

Figura 4.10 – Geometria para o traçado de raios. (adaptado de [1])

62
Para o caso geral de traçado de raios, temos

𝑑ℎ
𝑑𝑧 = (4.27)
tan 𝛼

Atendendo às relações trigonométricas

sin 𝛼 √1 − cos 2 𝛼
tan 𝛼 = = (4.28)
cos 𝛼 cos 𝛼

Usando a equação dos raios para a estratificação plana, temos

cos 𝛼× (1 + 10−6 𝑀) = cos 𝛼0 × (1 + 10−6 𝑀(ℎ0 )) (4.29)

cos 𝛼0 × (1 + 10−6 𝑀(ℎ0 ))


cos 𝛼 = (4.30)
(1 + 10−6 𝑀)

Substituindo em (4.28), ficamos com

−6 2
√1 − cos 𝛼0 × (1 + 10 𝑀(ℎ0 ))
sin 𝛼 (1 + 10−6 𝑀) (4.31)
tan 𝛼 = =
cos 𝛼 cos 𝛼0 × (1 + 10−6 𝑀(ℎ0 ))
(1 + 10−6 𝑀)

Integrando a expressão (4.27) obtém-se a equação da trajetória


𝑑ℎ 𝑑ℎ
𝑑𝑧 = ⟺𝑧= ∫ (4.32)
tan 𝛼 tan 𝛼
ℎ0

onde tan(𝛼) é dado por (4.31).

63
4.6.2.Modelo aproximado

Num projeto de ligação entre duas antenas ao solo, dado que a distância entre estas é muito
maior que as suas alturas, não se pretende raios com inclinação apreciável, mas sim raios cujo traçado
se afaste pouco da horizontal, ao longo da trajetória. Deste modo, pode-se afirmar que em geral, o
ângulo que a tangente ao raio num certo ponto da trajetória faz com a horizontal, é bastante próximo
de zero (𝛼 ≈ 0). Sendo este ângulo bastante pequeno, então 𝜃 ≈ 𝜋/2 (aproximação paraxial), vindo

1 2
sin 𝜃 ≈ 1 − 𝛼 (4.33)
2

e ainda, para ângulos 𝛼 próximos de zero, obtém-se

𝑑ℎ 𝜋
= tan 𝛼 ≈ 𝛼 = − 𝜃 (4.34)
𝑑𝑧 2

Desta forma, a equação (4.27) vem

𝑑ℎ
𝑑𝑧 = (4.35)
𝛼

Para obter a equação da trajetória, começa-se por usar a expressão (4.8) para a estratificação
plana, sob a forma:

1 2 1
(1 + 10−6 𝑀) (1 − 𝛼 ) = (1 + 10−6 𝑀0 ) (1 − 𝛼02 ) (4.36)
2 2

onde 𝑀0 = 𝑀(ℎ0 ).

Desprezando os termos de segunda ordem,

1
1 2
−6
𝛼 = ±√2 [10 𝑀 − (10 −6
𝑀0 − 𝛼02 )] (4.37)
2

donde, atendendo a que para cada raio, o termo

1
10−6 𝑀0 − 𝛼02 = 10−6 𝑀′ (4.38)
2

64
é constante, vem

1
𝛼 = ±√2 × 10−3 [𝑀 − 𝑀′ ]2 (4.39)

onde o sinal de 𝛼 é o de 𝑑ℎ/𝑑𝑧 local.

A equação da trajetória vem então:


𝑑ℎ 𝑑ℎ
𝑑𝑧 = ⇔ 𝑧= ∫ 1 (4.40)
𝛼
ℎ0 ±√2 × 10−3 [𝑀 − 𝑀′ ]2

4.6.3.Modelo analítico para a trajetória

Se a atmosfera for caracterizada por uma refratividade modificada 𝑀 com um perfil linear, a
equação (4.40) pode ser resolvida analiticamente do seguinte modo:

𝑀(ℎ) = 𝑀(0) + 𝜇ℎ (4.41)

onde 𝑀(0) = 𝑁(0) = 315 e 𝜇 = 𝑑𝑀/𝑑ℎ.

Da expressão (4.38), vem

106 2
𝑀′ = 𝑀(ℎ0 ) − 𝛼 (4.42)
2 0

No ponto de partida do raio, a refratividade modificada 𝑀 é dada por:

𝑀(ℎ0 ) = 𝑀(0) + 𝜇ℎ0 (4.43)

Desenvolvendo a diferença das refratividades

106 2
𝑀 − 𝑀′ = (𝑀(0) + 𝜇ℎ) − (𝑀(ℎ0 ) − 𝛼 ) ⇔ (4.44)
2 0

106 2
𝑀 − 𝑀′ = (𝑀(0) + 𝜇ℎ) − (𝑀(0) + 𝜇ℎ0 − 𝛼 ) ⇔ (4.45)
2 0

65
106 2
𝑀 − 𝑀′ = 𝜇ℎ − 𝜇ℎ0 + 𝛼 (4.46)
2 0

Considerando 𝑏 = (106 /2) 𝛼02 − 𝜇ℎ0 , vem finalmente

𝑀 − 𝑀′ = 𝜇ℎ + 𝑏 (4.47)

Substituindo em (4.40), temos:


𝑑ℎ
𝑧= ∫ 1 (4.48)
ℎ0 ±√2 × 10−3 [𝜇ℎ + 𝑏]2

Considerando 𝐴 = √2 × 10−3 , obtém-se:

ℎ ℎ
𝑑ℎ 2√𝜇ℎ + 𝑏
𝑧= ∫ 1 = [ ] ⇔ (4.49)
±𝐴𝜇
ℎ0 ±𝐴[𝜇ℎ + 𝑏]2 ℎ0

2
𝑧= (√𝜇ℎ + 𝑏 − √𝜇ℎ0 + 𝑏) (4.50)
±𝐴𝜇

4.6.4.Cálculo do ponto de indeterminação

Um raio pode inverter o sentido (ascendente ou descendente) de propagação ao longo da sua


trajetória. Os pontos onde se dá essa inversão são chamados pontos de indeterminação, visto a
equação (4.50), que calcula o percurso do raio, tomar valores imaginários a partir desse ponto.

Para determinar o ponto de indeterminação do traçado do raio, é necessário ter em conta que
nesse local da trajetória, o ângulo 𝛼 = 0. Partindo da equação (4.50), vem

2
𝑧= (√𝜇ℎ + 𝑏 − √𝜇ℎ0 + 𝑏) ⟺ (4.51)
±𝐴𝜇

2 106 2
𝑧= (√𝜇ℎ + 𝑏 − √𝜇ℎ0 + 𝛼 − 𝜇ℎ0 ) (4.52)
±𝐴𝜇 2 0

66
Ao parar no ponto de indeterminação e, lançando-se um raio com ângulo inicial nulo 𝛼0 = 0 para
uma atmosfera com as mesmas características, a equação (4.52) fica

2
𝑧𝑖𝑛𝑑 = (√𝜇ℎ + 𝑏 − √𝜇ℎ0 − 𝜇ℎ0 ) ⟺ (4.53)
±𝐴𝜇

2
𝑧𝑖𝑛𝑑 = (√𝜇ℎ + 𝑏) ⟺ (4.54)
±𝐴𝜇

2 106 2
𝑧𝑖𝑛𝑑 = (√𝜇ℎ + 𝛼0 − 𝜇ℎ0 ) ⟺ (4.55)
±𝐴𝜇 2

2
𝑧𝑖𝑛𝑑 = (√𝜇(ℎ − ℎ0 )) (4.56)
±𝐴𝜇

Relativamente à altura do ponto de indeterminação, consideram-se as equações (4.35) e (4.39).


Para que se atinja a indeterminação, o denominador da equação (4.35) tem de ser nulo, ou seja,

𝛼 = ±𝐴√𝑀 − 𝑀′ = ±√𝜇ℎ + 𝑏 = 0 (4.57)

Resolvendo

106 2
𝜇ℎ + 𝑏 = 0 ⇔ 𝜇ℎ + 𝛼 − 𝜇ℎ0 = 0 (4.58)
2 0

O que resulta na expressão

106 2
ℎ𝑖𝑛𝑑 = ℎ0 − 𝛼 (4.59)
2 0

67
4.7.Simulações

4.7.1.Uma camada atmosférica

O conjunto de simulações iniciais consiste no traçado de raios emitidos a uma altura ℎ0 , que
atravessam uma atmosfera caracterizada por uma camada, ao longo de um perfil linear da refratividade
modificada. Para a simulação e representação da trajetória dos raios, define-se um ângulo de partida
𝛼0 , e um valor de 𝑑𝑀/𝑑ℎ. A trajetória dos raios manifesta um comportamento diferente consoante o
valor de 𝑑𝑀/𝑑ℎ seja positivo ou negativo, fazendo com que estes se afastem ou aproximem
progressivamente da superfície terrestre, respetivamente.

Mais adiante apresentam-se as simulações para ductos superficiais e sobrelevados,


considerando uma atmosfera caracterizada por duas ou três camadas, uma das quais com valores de
𝑑𝑀/𝑑ℎ < 0. Nestas simulações é possível observar o trajeto dos raios que se propagam guiados entre
uma camada da atmosfera e o solo, ou dentro de uma camada da atmosfera, com perdas muito
diminuídas.

Em cada simulação, o traçado dos raios vem acompanhado por uma figura que representa a
variação da refratividade modificada em função da altura na atmosfera.

Através da expressão (4.20) sabe-se que

𝑑𝑀 𝑑𝑁 106 𝑑𝑁 106 𝑑𝑁
= + ≈ + = + 157 (4.60)
𝑑ℎ 𝑑ℎ 𝑎 + ℎ0 𝑑ℎ 𝑎 𝑑ℎ

Vindo a refratividade dada por

𝑑𝑀
𝑁 = 𝑁(0) + ( − 157) ℎ (4.61)
𝑑ℎ

onde 𝑁(0) = 315.

A variação da refratividade modificada com a altura é calculada através das expressões (4.21) e
(4.61). Mantendo constantes os parâmetros 𝑁(0), 𝑑𝑀 ⁄𝑑ℎ e 𝑎, e variando o valor de ℎ (altura), obtêm-
se os valores de 𝑀 correspondentes às alturas definidas, em cada camada da atmosfera.

Para a representação da trajetória dos raios, que varia consoante o perfil 𝑀, optou-se pelo
modelo analítico (expressão (4.50)), por uma questão de simplificação dos cálculos computacionais.
Os raios são iniciados a uma altura ℎ0 e com um ângulo de partida 𝛼0 . O valor de 𝑑𝑀⁄𝑑ℎ é definido
para cada camada.

68
Devido aos diversos encurvamentos dos raios, surgem situações onde ocorre uma inversão do
sentido da trajetória. Através das expressões (4.56) e (4.59) é possível calcular os pontos a partir do
qual isso acontece. Esses pontos são designados pontos de indeterminação.

Outra situação abordada é a reflexão que os raios podem eventualmente sofrer no solo. Assim,
quando estes atingem a superfície, são refletidos com um ângulo simétrico ao de chegada.

Nas simulações efetuadas é possível observar os encurvamentos dos raios. Por observação da
Figura 4.11 à Figura 4.20 conclui-se que o valor do gradiente da refratividade modificada é responsável
pelas diferentes trajetórias dos raios. Se este for positivo o raio tende a subir, e se for negativo, a
descer.

As diferentes situações para o caso de uma camada são:

 𝛼0 ≥ 0 e 𝑑𝑀⁄𝑑ℎ > 0

Figura 4.11 – Trajetória dos raios com 𝜶𝟎 ≥ 𝟎 e 𝒅𝑴⁄𝒅𝒉 > 𝟎.

Observando os resultados para a primeira simulação, pode-se constatar que devido ao facto de
o ângulo de partida ser positivo e a refratividade modificada crescer linearmente com a altura, o raio
afasta-se progressivamente da terra, i.e., apresenta uma trajetória ascendente.

69
 𝛼0 < 0 e 𝑑𝑀⁄𝑑ℎ > 0

Figura 4.12 – Trajetória dos raios com 𝜶𝟎 < 𝟎 e 𝒅𝑴⁄𝒅𝒉 > 𝟎.

Figura 4.13 – Trajetória dos raios com 𝜶𝟎 < 𝟎 e 𝒅𝑴⁄𝒅𝒉 > 𝟎 , com reflexão no solo.

70
Procedendo à análise da Figura 4.12, verifica-se que nesta situação, o raio parte com ângulo de
partida negativo, i.e., num instante inicial o raio tem uma fase descendente até chegar a um ponto de
indeterminação (onde 𝛼 = 0), tendo de seguida a fase ascendente ao afastar-se progressivamente da
superfície da terra.

Nestas circunstâncias, outra situação que pode suceder consiste na reflexão do raio no solo,
devido a um ângulo de partida bastante negativo relativamente à horizontal (Figura 4.13). O raio é
refletido com um ângulo simétrico ao do raio incidente.

A figura que se segue engloba todas as situações previamente analisadas, para 𝑑𝑀/𝑑ℎ positivo.

Figura 4.14 – Trajetória dos raios para diversos ângulos de partida e 𝒅𝑴⁄𝒅𝒉 > 𝟎.

71
 𝛼0 ≥ 0 e 𝑑𝑀⁄𝑑ℎ < 0

Figura 4.15 – Trajetória dos raios com 𝜶𝟎 ≥ 𝟎 e 𝒅𝑴⁄𝒅𝒉 < 𝟎.

 𝛼0 < 0 e 𝑑𝑀⁄𝑑ℎ < 0

Figura 4.16 – Trajetória dos raios com 𝜶𝟎 < 𝟎 e 𝒅𝑴⁄𝒅𝒉 < 𝟎.

72
Nas Figuras 4.15 e 4.16 os raios atravessam uma camada atmosférica onde 𝑑𝑀/𝑑ℎ é negativo
e os ângulos de partida são positivos e negativos, respetivamente. No primeiro caso o raio sobe até
atingir o ponto de indeterminação, voltando a cair em fase descendente na direção ao solo e refletindo-
se neste. Após a reflexão o raio volta novamente a subir até ao ponto de indeterminação seguinte. O
segundo caso difere apenas no facto de a trajetória inicial ser descendente, fruto do ângulo de partida
ser negativo.

4.7.2.Ducto superficial e sobrelevado

Por observação da Figura 4.17 à Figura 4.20, verifica-se que os raios ficam captados em torno
da camada onde a variação da refratividade modificada é negativa. Esta região da atmosfera vai
comportar-se como um guia de ondas aberto, podendo guiar ondas a grande distância.

No ducto superficial (Figuras 4.17 e 4.18) observa-se a trajetória descrita por raios com diversos
ângulos de partida, a atravessar uma atmosfera caracterizada por duas camadas. Cada camada
apresenta um valor 𝑑𝑀 ⁄𝑑ℎ de sinal diferente. Neste tipo de ductos a propagação guiada realiza-se
junto à superfície da terra, i.e., com sucessivas reflexões no solo e podendo os raios ascender até à
altura onde se inicia a segunda camada. Quando um raio ultrapassa essa altura, continua a subir
indefinidamente.

Como referido, os raios ficam contidos dentro da camada onde a variação da refratividade
modificada é negativa. Isso apenas não acontece se o ângulo de saída for grande tanto positivamente
como negativamente. No caso positivo, o raio liberta-se no ducto e afasta-se progressivamente da terra,
pois a segunda camada apresenta um 𝑑𝑀⁄𝑑ℎ > 0. No caso do ângulo de partida ser bastante negativo,
este vai refletir-se no solo, entrando imediatamente a seguir numa fase ascendente até passar a linha
de separação das camadas. A partir daí o raio continua a subir.

73
Figura 4.17 – Trajetória de 5 raios na presença de ducto superficial.

Figura 4.18 – Trajetória de 50 raios na presença de ducto superficial.

Um ducto sobrelevado forma-se a uma determinada altitude. As figuras seguintes representam


o trajeto de raios com diferentes ângulos de partida, numa atmosfera com três camadas, onde a
camada do meio é caracterizada por um 𝑑𝑀⁄𝑑ℎ negativo. Nestas circunstâncias, os raios propagam-
se em altura pois estes tendem a ficar captados em torno da camada que apresenta um 𝑑𝑀⁄𝑑ℎ < 0.
No caso do ângulo de saída ser suficientemente grande ao ponto de permitir que o raio ultrapasse a
segunda camada, este tende a subir indefinidamente. O mesmo acontece quando um raio é refletido
no solo após um ângulo de partida elevado.

74
Figura 4.19 – Trajetória de 5 raios na presença de ducto sobrelevado.

Figura 4.20 - Trajetória de 50 raios na presença de ducto sobrelevado.

Como se pode verificar, nesta situação os raios não alcançam o solo, i.e., os raios propagam-
se guiados dentro de uma camada da atmosfera e com perdas muito diminuídas.

Da presença dos ductos resultam por exemplo alcances inesperados para radares, sobretudo
sobre o mar e visibilidade de programas TV inexplicáveis pelos mecanismos normais de propagação.
Um ducto é assim um fenómeno que pode dar origem a fortes perturbações num serviço.

75
4.8.Miragens

Situação com uma conotação bastante mística, as miragens são fenómenos óticos relacionados
com a refração e a reflexão total da luz na atmosfera, não se tratando, portanto, de “alucinações” ou
“visões estranhas” como geralmente a literatura não-técnica sugere. Trata-se assim de um efeito ótico
real, que ocorre na atmosfera e que pode inclusive ser fotografado.

Este fenómeno origina-se no facto de a atmosfera não ser fisicamente uniforme, pois cada fina
camada de ar tem diferentes índices de refração, ainda que relativamente próximos, o que faz com que
os raios luminosos manifestem diferentes comportamentos ao atravessar as camadas, seja na
alteração da direção ou na velocidade da luz.

O valor do índice de refração do ar varia com a temperatura e altera a densidade do ar, ou seja,
camadas mais próximas do solo e que “geralmente” possuem maior temperatura, possuem menor
densidade e menor índice de refração, e o recíproco ocorre com camadas mais altas.

Devido ao facto de os raios luminosos se propagarem mais rapidamente no ar quente, e nestas


camadas o índice de refração ser menor, os raios ao passar pelo ar quente, apresentam uma trajetória
curvilínea. O cérebro humano, no entanto, só intercepta os raios de luz que percorrem uma trajetória
retilínea, porém, a atmosfera não é homogénea e assim sendo, os raios curvilíneos quando atingem
observador, o sistema visual humano interpreta-os como uma linha reta tangente ao caminho que o
raio apresenta até ao olho. O resultado é a visualização de um objeto refletido, invertido e deslocado
da sua posição real, ou seja, uma miragem.

Existem dois tipos de miragem, as inferiores e as superiores.

4.8.1.Miragens inferiores

A temperatura junto ao solo pode determinar a ocorrência de fenómenos interessantes das


miragens. Quando a temperatura do solo torna-se muito elevada, o ar aquecido junto ao solo torna-se
menos denso. Como consequência, um raio de luz que desce obliquamente em direção ao solo, pode
sofrer reflexão total antes de o atingir. O resultado é uma trajetória côncava ascendente.

Este tipo de miragens são comuns nos desertos e no asfalto das estradas em dias bastante
quentes, onde observamos os objetos abaixo da sua posição real. As imagens que se seguem ilustram
o fenómeno.

76
Imagem 4.1 – Miragem inferior. (Fonte: [52])

Imagem 4.2 – Miragem inferior. (Fonte: [52])

Um segmento do campo visual está esquematicamente representado acima. À direita, foi


representada a miragem, e à esquerda, uma simulação de como apareceria o horizonte na mesma
paisagem, se os raios luminosos não sofressem distorções.

77
Figura 4.21 – Trajetória dos raios desde vários pontos do objeto alvo até ao observador.

O ponto A encontra-se perto da base da montanha. Devido a desvios causados pela temperatura,
não há nenhum raio de luz vindo de A que atinja o olho do observador. O ponto B foi escolhido numa
posição crítica, tal que um único raio de luz emerge dele e atinge o olho do observador, após ter sido
ligeiramente curvado ao atravessar a camada de ar quente. O ponto C está no topo da montanha, dois
raios luminosos emergem dele e alcançam o olho do observador, cada um com uma curvatura diferente.

A Figura 4.22 revela o que será visto na miragem.

Figura 4.22 – Trajetória dos raios numa miragem inferior.

O raio superior que parte de C é interpretado como C’, enquanto o raio inferior que parte de C é
interpretado como C’’ pelo sistema visual humano. Este ultimo é responsável pela montanha invertida
na miragem. O mesmo ocorre com a luz do céu azul, que pode ser vista abaixo da montanha invertida,
na miragem.

78
4.8.2.Miragens superiores

Quando a temperatura do solo é baixa, o que implica que o ar próximo dele se torne mais denso
e mais frio que o ar situado acima, podem ocorrer miragens superiores. Nessas circunstâncias, os raios
de luz que partem do objeto sobem obliquamente e sofrem reflexão total nas camadas superiores,
menos frias e menos densas. Como consequência, os raios apresentam uma curvatura descendente,
produzindo uma miragem superior. O observador vê a imagem do objeto acima da sua posição real e
invertida. Um exemplo seria o avistamento de objetos no mar. Tendo em conta a curvatura da terra,
seria impossível observar navios a 300 km de distância, porém, devido a este tipo de miragens, é
possível avistá-los.

Imagem 4.3 – Miragem superior. (Fonte: [55])

Imagem 4.4 – Miragem superior. (Fonte: [54])

79
Raios de luz Imagem falsa invertida

Barco real

Imagem falsa

Observador

Figura 4.23 – Trajeto dos raios numa miragem superior.

4.8.3.Simulação de miragens

Por forma a facilitar a explicação, começa-se por considerar uma imagem “unidimensional”. A
imagem está contida num plano vertical a uma distância 𝑑 do observador, como representado na Figura
4.24.

𝑑
Figura 4.24 – Plano vertical visto pelo observador.

A imagem é dividida em intervalos verticais iguais, consoante o número de linhas da imagem e


a altura máxima definida para o plano vertical. A altura de cada intervalo é assim dada pelo quociente

80
entre a altura máxima e o número total de linhas da matriz. Na realidade, cada raio parte de um ponto
da imagem no plano vertical chegando ao utilizador com um determinado ângulo, sendo posteriormente
reconstruída pelo cérebro segundo os diferentes ângulos. Para aproveitar o módulo de simulação do
traçado de raios, o problema é abordado de maneira inversa, isto é, cada raio sai do utilizador com um
determinado ângulo e chega a um determinado intervalo da imagem. Os raios estão numerados por
ordem crescente do ângulo de partida e associa-se a cada raio à linha da imagem correspondente à
chegada, formando assim uma matriz final transformada (reordenada). A matriz reordenada é depois
convertida para uma imagem. A Figura 4.25 representa o modo como as trajetórias dos raios podem
alterar a imagem final.

1
2
6

3 2
4
1
3
5 8
5
6
4
7 7
8 9

9 10
10

Figura 4.25 - Deformação da imagem inicial tal como é vista pelo observador após alteração das trajetórias dos raios
pelas alterações do índice de refração da atmosfera.

No caso de uma imagem bidimensional, o processo é repetido considerando cada raio como
uma linha da matriz da imagem. Todos os pontos horizontais da imagem são tratados da mesma
maneira porque se considera que o índice de refração da atmosfera só tem variação na vertical. Para
se obter uma simulação mais próxima da realidade, a imagem é representada através de dois planos:
o horizontal e o vertical. Ao plano horizontal associa-se a parte inferior da linha do horizonte e ao plano
vertical a parte superior (Figura 4.26).

81
Horizonte
Horizonte

Figura 4.26 - Divisão da imagem nos dois planos ortogonais (vertical e horizontal).

Este módulo permite simular uma imagem observada para alterações do índice de refração da
atmosfera e consequentemente das trajetórias dos raios. Se o raio atingir o valor máximo definido pelo
utilizador, este atingiu o plano vertical da imagem. Se o raio atingir o solo, este pertence ao plano
horizontal.

Após se definir onde cada raio pertence (plano vertical ou horizontal), convertem-se os
comprimentos e alturas dos mesmos para uma escala de acordo com o número de raios. A posição de
cada raio no plano vertical (𝑧𝑣 ) é dada pela seguinte expressão:

𝑛𝑟
𝑛 𝑟 ℎ𝑟 × 2 (4.62)
𝑧𝑣 = −
2 ℎ𝑚𝑎𝑥

onde a altura do raio (ℎ𝑟 ) é dada em relação à altura máxima (ℎ𝑚𝑎𝑥 ). Assim, a primeira posição refere-
se ao cimo da imagem e a linha de horizonte corresponde à posição 𝑛º 𝑟𝑎𝑖𝑜𝑠 ⁄2. A posição de cada raio
no plano horizontal (𝑧ℎ ) é dada por:

𝑛𝑟
𝑛𝑟 𝑑𝑟 × 2 (4.63)
𝑧ℎ = +
2 𝑑𝑚𝑎𝑥

As posições horizontais compreendem-se entre o 𝑛º𝑟𝑎𝑖𝑜𝑠/2 e 𝑛º𝑟𝑎𝑖𝑜𝑠. Na expressão anterior


𝑑𝑟 , 𝑑𝑚𝑎𝑥 e 𝑛𝑟 correspondem, respetivamente, ao comprimento do raio (diferença entre a distância
máxima definida pelo utilizador e o ponto que o raio atinge o solo) , comprimento máximo e número de
raios.

A matriz das posições vai ter dimensão de 𝑛º𝑟𝑎𝑖𝑜𝑠. Esta contém as posições de cada raio tendo
em conta em que plano o raio termina a sua trajetória. Cada valor da matriz corresponde a uma dada
linha da nova imagem. A matriz é posteriormente convertida para uma imagem que é representada.

A simulação inicia-se com a transformação da imagem original numa matriz. Nessa matriz, cada
linha corresponde a um raio. A divisão da matriz nos dois planos faz-se com base no número de raios.
Assim os primeiros 𝑛º𝑟𝑎𝑖𝑜𝑠/2 correspondem ao plano vertical e os seguintes ao plano horizontal.

82
Os valores do comprimento máximo e altura máxima necessária para o cálculo da matriz de
posições (expressões (4.62) e (4.63)) são obtidos através do primeiro e último raio. O primeiro raio
corresponde ao raio com maior ângulo de saída e o último ao de menor ângulo de saída como
representado na Figura 4.27. A altura máxima é então a altura que o primeiro raio atinge e o
comprimento máximo corresponde a diferença entre a distância máxima definida pelo utilizador e o
ponto que o último raio atinge o solo. Esses valores são calculados por razões trigonométricas.

ℎ𝑚𝑎𝑥 = tan(𝜃1 ) × 𝑑 + ℎ1 (4.64)

ℎ1
𝑑𝑚𝑎𝑥 = 𝑑 − (4.65)
tan(𝜃2 )

ℎ1

𝑑
Figura 4.27 - Esquema geométrico para cálculo dos limites da imagem.

De seguida, recorrendo à função que calcula as trajetórias dos raios, obtém-se a matriz de
posições para cada raio. Usando a matriz de posições transforma-se a imagem original numa nova
imagem que contêm a representação da miragem.

Simulou-se então dois tipos de miragem: superior e inferior.

Em relação à miragem superior, esta obtém-se utilizando duas camadas na atmosfera. A Figura 4.28
representa este tipo de miragem.

83
Figura 4.28-Miragem Superior.

A miragem inferior está representada na Figura 4.29. Neste caso a atmosfera é caracterizada
por três camadas.

Figura 4.29 – Miragem inferior.

84
5. MODELOS DE PROPAGAÇÃO EM AMBIENTES URBANOS

Nos últimos anos tem-se verificado um grande crescimento, tanto a nível comercial como
tecnológico, por parte dos sistemas de comunicação via rádio, especialmente no sector das
telecomunicações. O serviço telefónico apresenta um histórico bastante antigo que se inicia em 1876,
ou seja, à mais de cem anos atrás, com a primeira transmissão por voz através de sinais elétricos,
testada por Alexander Graham Bell. Mais tarde, entre 1960 e 1970, o conceito de telefonia móvel viria
a nascer nos laboratórios Bell [45]. Hoje e após décadas de evolução, os sistemas de comunicação por
voz e de transmissão de dados a longa distância encontram-se em evidência, e representam um serviço
vital para a humanidade, seja a nível pessoal ou empresarial.

Entre os sistemas que constituem as redes de comunicações móveis usadas a nível mundial, os
que mais se destacam atualmente são o GSM, UMTS e LTE. A primeira geração de sistemas de
comunicações móveis sem fios surgiu nos anos 80 e era baseada numa tecnologia analógica com
modulação FM. Alguns exemplos de sistemas de primeira geração são o Nordic Mobile Telephone
(NMT) e o Advanced Mobile Phone System (AMPS). [21]

O sistema GSM (Global System for Mobile Communications) é de segunda geração (2G) e foi
lançado no mercado nos anos 90. Este opera principalmente nas bandas de frequência de 900 MHz e
1800 MHz. [21]

O UMTS (Universal Mobile Telecommunications System) é uma rede de terceira geração (3G) e
trabalha principalmente na banda de 2100 MHz, podendo também utilizar a banda de 1800 MHz do
GSM. A terceira geração é o resultado de um trabalho realizado pela ITU (International
Telecommunications Union) no início dos anos 80. As especificações e normas foram desenvolvidos
durante 15 anos. A tecnologia 3G está mais focada para a transferência de dados. Esta permite
transferências até 200 kbit/s. As atualizações mais recentes ao 3G, nomeadamente o 3.5G e 3.75G,
permitem transferências na ordem de alguns Mbit/s. Entre diversas aplicações, destaca-se o acesso a
internet móvel, videochamadas e mobile TV. [21]

As redes 4G LTE (Long Term Evolution) são as mais recentemente implementadas, e operam
principalmente na banda de 800 MHz e 2600 MHz. Este sistema permite acesso à internet a alta
velocidade. Algumas das aplicações possíveis são as chamadas sobre IP, serviços de jogos, TV de
alta definição, videoconferência, televisão 3D, entre outros. [21]

As redes dos sistemas de comunicações móveis têm vindo a melhorar o seu desempenho e
capacidade de transferência de dados, possibilitando novas aplicações e inovações.

No presente capítulo faz-se uma especialização de alguns aspetos abordados nos capítulos
anteriores, para o caso dos serviços de rádio móvel, i.e., serviços com capacidade para suportar
comunicações via rádio com terminais em movimento, ou pelo menos terminais com possibilidade de
movimento.

85
Para além da questão da mobilidade do terminal, que implica uma variabilidade adicional do nível
de sinal recebido, a distância entre antenas já não é necessariamente muito maior que as dimensões
transversais envolvidas na ligação (altura das antenas, altura dos obstáculos, etc.), ou pelo menos,
uma das antenas encontra-se na vizinhança imediata dos obstáculos, das superfícies refletoras, das
arestas de difração, etc.

Existe alguma variedade de serviços de rádio móvel, o que arrasta uma variedade ainda maior
de cenários de propagação. No entanto, a ênfase deste capítulo vai incidir na propagação em
ambientes exteriores e urbanos, com base em serviços de cobertura por estações de base terrestres.
Os ambientes urbanos representam um caso de grande interesse devido à existência de uma grande
concentração de utilizadores nestes locais, utilizadores esses que exigem ter à sua disposição todos
os recursos e serviços disponíveis nos seus terminais.

Um dos parâmetros que influenciam mais significativamente a propagação é o grau de


urbanização. Em geral, quanto maior for a densidade e altura dos edifícios, mais difícil é a
caracterização da propagação em termos determinísticos. Assim, também por esta razão, os centros
das cidades surgem como os ambientes que mais estimulam a investigação em modelos matemáticos
de propagação. Os modelos de propagação desempenham um papel importante porque permitem
prever a potência do sinal recebido num dado local. Através da potência do sinal recebido, decisões
fundamentais são tomadas no planeamento de um projeto.

A cobertura por estações de base terrestres é, em geral, indicada para servir áreas pequenas,
com dimensões que podem vir desde alguns quilómetros até 100 a 200 m consoante a densidade de
tráfego de telecomunicações vá sendo maior, isto porque, enquanto a atitude tradicional em
radiodifusão é a de tentar servir a maior área possível, nas comunicações móveis pretende-se que a
cobertura do emissor não ultrapasse os limites de uma certa área (que se designa por célula), cuja
dimensão é pré-estabelecida tendo em conta por um lado os aspetos do tráfego de telecomunicações,
e por outro, os aspetos de propagação e da qualidade de serviço. A cada estação de base é alocada
uma porção do número total de canais disponíveis ao sistema2. Em estações de base vizinhas são
atribuídos diferentes grupos de canais, para que a interferência entre estações de base (e os terminais
móveis a ela associados) seja minimizada. Pretende-se desta forma assegurar que a mesma frequência
possa ser reutilizada tantas vezes quanto necessário em outras células próximas, mantendo a
interferência co-canal a um nível controlado, de modo a resultar numa utilização eficiente do espectro
de frequências.

À medida que a densidade de tráfego aumenta, o número de estações de base pode ser
aumentado, juntamente com um correspondente decréscimo na potência dos transmissores, para que
se evite a interferência. Se por exemplo surgir o aparecimento, não previsto num projeto, de uma zona
de sombra numa célula, em geral este problema não pode ser ultrapassado com o aumento da potência

2
A alocação de canais numa determinada banda aos sistemas dos operadores, é decidido a nível nacional pela
entidade reguladora ANACOM.

86
do emissor, pois iria resultar numa extensão dos limites iniciais da célula e o consequente aumento de
interferência co-canal com uma célula próxima.

Um bom planeamento para a projeção das células de um sistema numa determinada área
geográfica, é de elevada importância para uma boa performance do sistema e para o fornecimento de
uma boa qualidade de serviço. Este planeamento depende do posicionamento e cobertura das
estações de base, da gestão eficiente da banda do espectro eletromagnético reservada ao sistema 3 e
da minimização da interferência.

A Figura 5.1 exemplifica a cobertura típica de uma área usando clusters de sete células.

Figura 5.1 – Clusters de sete células.

Nesta figura, cada cluster corresponde a um conjunto de sete células. Estas encontram-se
representadas por uma cor, para distinguir os diferentes grupos de canais. As células da mesma cor
partilham as mesmas frequências, razão pelo qual encontram-se a uma determinada distância umas
das outras, designada distância de reutilização (de frequências), necessária para minimizar a
interferência co-canal. Quanto maior for esta distância, menor será a interferência entre estas células
e entre os terminais móveis a elas associados.

3
As bandas de frequência a serem usadas nos diversos sistemas é uma decisão tomada a nível internacional
pela ITU.

87
5.1.Cenário para o rádio móvel terrestre

Antes de entrar nos modelos de propagação, começa-se por identificar os tipos de cenário
previsíveis para o rádio móvel terrestre. Em ambientes urbanos, suburbanos e rurais, as células
classificam-se segundo três classes, de acordo com o seu raio:

 Macro-célula
 Micro-célula
 Pico-célula

Macro
Micro

Pico

Figura 5.2 – Classes de células.

As macro-células dividem-se em duas subclasses. As macro-células pequenas, que


correspondem a zonas de cobertura com dimensões que podem ir até 2-3 km de raio, em que as
antenas das estações de base encontram-se tipicamente no topo dos edifícios, mas os terminais
móveis estão em geral na zona de sombra profunda dos obstáculos. Estas células são comuns em
regiões urbanas. As macro-células grandes, com dimensões superiores a 3 km de raio, além de serem
usadas em áreas com alguma urbanização, são tipicamente usadas em zonas rurais ou abertas, onde
a densidade populacional não é tão elevada.

As micro-células são regiões de cobertura de rádio móvel com dimensões da ordem de muito
poucas centenas de metros, em que os terminais móveis e a estação de base estão quase sempre em
linha de vista.

Finalmente as pico-células correspondem a áreas de cobertura significativamente menores e são


em geral usadas no interior de edifícios.

88
Figura 5.3 – Classes de células em meio urbano. (adaptado de [1])

Listam-se a seguir alguns fatores que têm um efeito determinante nas características dos sinais
que são recebidos, em ambientes exteriores:

 A antena do terminal móvel está tipicamente muito próxima do solo. Pode tomar-se como
referência a altura de um automóvel, ou a altura do utilizador: ℎ𝑟 ≈ 1.8 m.

 Nem sempre é viável colocar a antena da estação de base a uma altura suficientemente elevada
para iluminar toda a zona de cobertura com o raio direto, pois desse modo, a área de cobertura
da célula aumenta, o que pode resultar num aumento de interferência com células vizinhas.
Portanto só em casos excecionais, como acontece por exemplo nas micro-células, existe linha
de vista entre duas antenas.

 O sinal chega à antena do terminal móvel por uma multiplicidade de trajetos de comprimentos
diferentes, depois de ter sofrido processos de difração em obstáculos, e reflexão ou dispersão
pelo solo, pelas paredes etc. O sinal recebido é assim resultado da interferência entre várias
contribuições, onde cada onda apresenta polarização, amplitude, fase e atraso diferentes. Este
fenómeno designa-se efeito de multipercurso (multipath).

 O deslocamento do terminal móvel implica a alteração a cada instante, não só do perfil dos
obstáculos entre duas antenas, mas também dos vários trajetos que as ondas tomam antes de
atingir a antena do terminal móvel.

 Para além do movimento do terminal, o próprio ambiente é dinâmico, i.e., pode encontrar-se em
constante mudança. Um cenário exemplificativo pode ser dado pelos veículos que circulam nas
ruas, podendo estes funcionar como superfícies de reflexão ou difração, contribuindo assim para
a flutuação do sinal recebido no terminal móvel.

89
 Juntamente com o sinal útil vindo da estação de base, chegam ao recetor do terminal móvel
sinais interferentes co-canal, com origem em células vizinhas, bem como ruído eletromagnético
proveniente de causas naturais e atividade humana.

5.2.Ambientes de macro-célula

A grande maioria dos sistemas de comunicações móveis operam em ambientes de propagação


complexos, que não podem ser modelados com precisão apenas com o cálculo das perdas de espaço
livre ou pelo método de traçado de raios usado no estudo da reflexão no solo. A propagação em
ambientes urbanos origina diversos fenómenos, desde a reflexão de raios (efeitos de multipercurso) e
a existência de zonas de sombra, provocados pela presença de inúmeros edifícios e outros obstáculos;
as ruas e avenidas originam fenómenos de propagação guiada, entre outros. A reflexão e as perdas de
transmissão variam de acordo com os materiais de construção dos obstáculos.

Tem sido desenvolvido ao longo dos anos, um número considerável de modelos para prever a
atenuação suplementar existente na transmissão de um sinal entre uma estação de base e um terminal
móvel, em ambientes típicos de macro-células urbanas.

Existem duas famílias base de modelos usados em ambientes exteriores, separados em duas
categorias [36]:

 Modelos empíricos
 COST 231 – Okumura-Hata
 Grandes distâncias;
 Ambientes urbanos, suburbanos e rurais.
 Modelos teóricos
 COST 231 – Walfisch-Bertoni
 Pequenas distâncias (< 5 km);
 Ambientes urbanos e suburbanos.

5.2.1.Modelos empíricos

Estes modelos são baseados essencialmente em medições empíricas, feitas ao longo de uma
certa distância, num determinado intervalo de frequência e para uma área geográfica em particular.
Como tal, têm a vantagem de contabilizar todos os fatores que afetam a propagação. Contudo, a
aplicação destes modelos não é sempre restrita a ambientes onde as medições empíricas foram
realizadas, o que pode comprometer a precisão destes modelos quando aplicados em ambientes mais
generalizados. Apesar deste facto, bastantes sistemas rádio fazem uso destes modelos como base
para a sua análise de performance.

90
5.2.1.1.Modelo Okumura

Um dos modelos empíricos mais comuns e usado atualmente é o modelo de Okumura [43],
proposto por Yoshihisa Okumura em 1968. Este modelo é um dos poucos concebidos especificamente
para utilizar em zonas construídas: o único que toma em consideração a variação do terreno e da
urbanização. Foi desenvolvido com base num extenso conjunto de medições de propagação efetuadas
em Tóquio entre 1962 e 1965, com várias estações emissoras a transmitir em várias bandas de
frequência, numa grande variedade de ambientes de propagação, tentando explorar os fatores
fundamentais que influenciam a propagação desde a morfologia do terreno à existência de edifícios,
orientação de ruas, existência de superfícies abertas, superfícies aquáticas, etc.

Estes testes em larga escala foram realizados por forma a desenvolver os seus resultados em
formato gráfico (curvas de Okumura), tendo como padrão uma área urbana e terreno quase plano, onde
cada curva representa o valor mediano da atenuação adicional em relação à propagação do sinal em
espaço livre (𝐴𝜇 ) [43]. Estas medições foram feitas para uma altura efetiva da estação de base de 200
m (ℎ𝑡 ) e um terminal móvel de altura 3 m (ℎ𝑟 ).

A altura efetiva da antena da estação de base ℎ𝑡 , é calculada como especificado por Okumura
[43], e corresponde à altura da sua antena acima da elevação média do terreno. A altura média do
terreno ℎ𝑔𝑎 , é determinada ao longo do percurso das ondas eletromagnéticas, numa distância entre 3
a 15 km. Este procedimento é facilmente explicado com o auxílio da Figura 5.4. Primeiro, é determinado
o perfil do terreno entre a antena da estação de base e o terminal móvel recetor. A altura média do
terreno é determinada na direção do recetor, entre 3 e 15 km. Finalmente, a altura efetiva da antena da
estação de base ℎ𝑡 , é determinada como sendo a diferença entre a altura da antena da estação de
base ℎ𝑏𝑠 e a altura média do terreno ℎ𝑔𝑎 .

EB

ℎ𝑏

ℎ𝑡
ℎ𝑏𝑠

TM
ℎ𝑜𝑏

ℎ𝑔𝑎 ℎ𝑜𝑚

0 3 𝑘𝑚
15 𝑘𝑚

Figura 5.4 – Esquema para o cálculo da altura efetiva da antena da estação de base no modelo Okumura. (adaptado de
[36])

91
Para localizações do terminal móvel inferiores a 15 km, a altura média do terreno é determinada
entre 3 km e a distância do terminal móvel. Para localizações inferiores a 3 km da estação de base, a
altura da estação de base vem dada por [46]:

ℎ𝑏 + ℎ𝑜𝑏 − ℎ𝑜𝑚 , ℎ𝑜𝑏 > ℎ𝑜𝑚


ℎ𝑡 = { (5.1)
ℎ𝑏 , ℎ𝑜𝑏 ≤ ℎ𝑜𝑚

Okumura classifica os diferentes tipos de ambientes em 3 classes [36]:

 Zona urbana – região com uma elevada densidade de edifícios, tendo cada um mais de dois
andares;
 Zona suburbana – Alguns obstáculos, não muito denso, na região em frente ao terminal móvel;
 Zona rural/aberta – Ausência de obstáculos numa região entre 300 m a 400 m em frente do
terminal móvel. Zona quase aberta é definida como o meio-termo entre as zonas suburbanas
e abertas.

Se o terreno não for quase plano, a região não for urbana e/ou as alturas das antenas diferirem
dos valores de referência (ℎ𝑡 = 200 m e ℎ𝑟 = 3 m), utilizam-se fatores de correção.

Este modelo é aplicável para distâncias de 1 km a 100 km, frequências no intervalo de 150 MHz
a 2000 MHz, pode ser usado para alturas efetivas de estação de base compreendidas entre 30 m a
1000 m, e terminais móveis com alturas de 1 m a 10 m.

A expressão empírica de Okumura para determinar a atenuação do sinal, à distância 𝑑 e


parametrizada pela frequência da portadora 𝑓, vem dada por [43]:

𝐿𝑃[𝑑𝐵] = 𝐿𝑓𝑠 (𝑓, 𝑑) + 𝐴𝜇 (𝑓, 𝑑) − 𝐺(ℎ𝑡 ) − 𝐺(ℎ𝑟 ) − 𝐺𝐴𝑅𝐸𝐴 (5.2)

onde:

 𝐿𝑃 - é o valor mediano das perdas de transmissão;


 𝐿𝑓𝑠 - é a atenuação de espaço livre, à distância 𝑑 e frequência 𝑓;
 𝐴𝜇 - é o valor mediano do excesso de atenuação (em relação à atenuação de espaço livre),
para uma zona urbanizada sobre um terreno “quase plano”, uma antena de emissão ℎ𝑡 = 200
m e de receção ℎ𝑟 = 3 m. Depende da frequência 𝑓 e da distância 𝑑;
 𝐺(ℎ𝑡 ), 𝐺(ℎ𝑟 ) - fatores de correção a aplicar quando as alturas da antena de emissão ou de
receção diferem das alturas de referência (ℎ𝑡 = 200 m, ℎ𝑟 = 3 m). São designados por fatores
de ganho de altura, dependem da distância 𝑑 e da frequência 𝑓;

92
 𝐺𝐴𝑅𝐸𝐴 – é o fator de correção (ou fator de ganho) devido ao tipo de ambiente (zona suburbana,
zona quase aberta e zona aberta ou rural);

Os valores de 𝐴𝜇 e 𝐺𝐴𝑅𝐸𝐴 são obtidos nas curvas empíricas de Okumura [43]. No seu modelo,
Okumura fornece alguns fatores de correção adicionais sob a forma de curvas [43]. Por exemplo,
correções para as orientações das ruas relativamente ao emissor, ondulação do terreno, inclinação do
terreno, trajetos mistos de terra e mar, podem ser usados para aumentar a precisão do modelo.

Okumura desenvolveu formulas empíricas para 𝐺(ℎ𝑡 ) e 𝐺(ℎ𝑟 ):

ℎ𝑡
𝐺(ℎ𝑡 ) = 20 𝑙𝑜𝑔 ( ), 30 𝑚 < ℎ𝑡 < 1000 𝑚 (5.3)
200

ℎ𝑟
10 𝑙𝑜𝑔 ( ) , ℎ𝑟 ≤ 3 𝑚
3
𝐺(ℎ𝑟 ) = (5.4)
ℎ𝑟
{20 𝑙𝑜𝑔 ( 3 ) , 3 𝑚 < ℎ𝑟 < 10 𝑚

Apesar de ser um modelo empírico usado com bastante frequência e considerado uma referência
entre os modelos de propagação macroscópicos, devido ao facto do modelo Okumura ter sido
construído com base nas características de Tóquio, é discutível a sua aplicação sem reservas em
outros ambientes:

 As curvas standard são para ambiente urbano (na classificação de Okumura). A experiência
tem mostrado que face aos resultados experimentais em outras cidades, a classificação
ambiental nem sempre é compatível.
 É discutível que os fatores de correção obtidos para Tóquio sejam aplicáveis a outras cidades
com outro tipo de edifícios, materiais e orografia.
 A aplicação dos fatores corretivos faz intervir a subjetividade do utilizador.

Este modelo transporta deste modo alguns inconvenientes, pois, sendo a situação standard a
urbana, significa que as situações práticas mais correntes (que não são urbanas) têm de ser calculadas
como correções. Por outro lado, o cálculo automático não é fácil, dado que, toda a informação é
apresentada sob a forma de gráficos, o que faz intervir a subjetividade do projetista.

93
5.2.1.2.Modelo Okumura-Hata

Masaharu Hata [42] desenvolveu em 1980 um conjunto de fórmulas empíricas apropriadas para
cálculo numérico, baseadas nos resultados em formato gráfico disponibilizados por Okumura. Este
modelo empírico simplifica o cálculo das perdas de transmissão, contudo, tem um domínio de aplicação
mais limitado. O modelo de Hata [42] é válido para o intervalo de frequências de 150 MHz a 1500 MHz,
para distâncias de 1 km a 20 km, com altura efetiva das estações de base e altura dos terminais móveis
de 30 m a 200 m e 1 m a 10 m, respetivamente.

A expressão desenvolvida por Hata, para determinar o valor mediano da atenuação empírica em
áreas urbanas, vem dada por [42]:

𝐿𝑃[𝑑𝐵] = 69.55 + 26.16 𝑙𝑜𝑔(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) − 13.82 𝑙𝑜𝑔 (ℎ𝑡[𝑚] )


(5.5)
+ [44.90 − 6.55 𝑙𝑜𝑔 (ℎ𝑡[𝑚] )] 𝑙𝑜𝑔(𝑑[𝑘𝑚] ) − 𝐽(ℎ𝑟 , 𝑓) − ∑ 𝐾𝑐𝑜𝑟𝑟𝑒𝑐𝑡𝑖𝑜𝑛

onde ∑ 𝐾𝑐𝑜𝑟𝑟𝑒𝑐𝑡𝑖𝑜𝑛 representa os fatores de correção a aplicar se o ambiente e o tipo de terreno fugirem
das condições padrão referenciadas para o modelo (áreas urbanas em terreno quase plano). 𝐽(ℎ𝑟 , 𝑓)
é um fator de correção para a altura do terminal móvel. Para pequenas ou médias cidades, este fator
vem dado por [42]:

𝐽(ℎ𝑟 , 𝑓)[𝑑𝐵] = [1.10 𝑙𝑜𝑔(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) − 0.70]ℎ𝑟 [𝑚] − [1.56 𝑙𝑜𝑔(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) − 0.80] (5.6)

e para grandes cidades, vem

8.29𝑙𝑜𝑔2 (1.54ℎ𝑟 [𝑚] ) − 1.10 , 𝑓 ≤ 200 𝑀𝐻𝑧


𝐽(ℎ𝑟 )[𝑑𝐵] = (5.7)
2
{3.20𝑙𝑜𝑔 (11.75ℎ𝑟 [𝑚] ) − 4.97 , 𝑓 ≥ 400 𝑀𝐻𝑧

94
5.2.1.3.Factores de correção

Os fatores de correção do ambiente e do terreno, são aplicados para otimizar e melhorar a


precisão do modelo quando estes parâmetros diferem dos de referência (terreno quase plano, zona
urbana).

Os resultados destes fatores foram desenvolvidos por Okumura e disponibilizados em formato


gráfico [43]. As expressões que se seguem representam uma boa aproximação das curvas de Okumura
[36]:

 Terreno ondulado, 𝐾𝑡ℎ , e posição do terminal móvel no terreno ondulado, ±𝐾ℎ𝑝

EB

10 % TM

Δℎ

90 %

𝑑𝑡 = 10 𝑘𝑚

Figura 5.5 – Terreno ondulado. (adaptado de [36])

Figura 5.6 – Correção para a ondulação do terreno.

95
Figura 5.7 – Correcção para a posição nas ondulações do terreno.

−8𝑙𝑜𝑔2 (Δℎ[𝑚] ) + 12𝑙𝑜𝑔(Δℎ[𝑚] ) − 3, 𝑓 = 453 𝑀𝐻𝑧

𝐾𝑡ℎ (Δℎ)[𝑑𝐵] = −8𝑙𝑜𝑔2 (Δℎ[𝑚] ) + 16𝑙𝑜𝑔(Δℎ[𝑚] ) − 7, 𝑓 = 922 𝑀𝐻𝑧 (5.8)

2
{−3𝑙𝑜𝑔 (Δℎ[𝑚] ) − 0.5𝑙𝑜𝑔(Δℎ[𝑚] ) + 4.5, 𝑓 = 1430 𝑀𝐻𝑧

𝐾ℎ𝑝 (Δℎ)[𝑑𝐵] = −2𝑙𝑜𝑔2 (Δℎ[𝑚] ) + 16𝑙𝑜𝑔(Δℎ[𝑚] ) − 12 (5.9)

A intensidade do campo calculado pode ter de ser ajustado de acordo com o grau de
irregularidade no terreno ao longo do percurso entre as antenas. A intensidade do campo diminui em
função da rugosidade do terreno, i.e., a altura da ondulação do terreno. Esta altura é definida pela
diferença entre o valor 10% abaixo do máximo das elevações, e o valor 10% acima do mínimo das
elevações do terreno, ao longo de uma distância de 10 km.

De notar que este fator de correção encontra-se especificado para 453, 922 e 1430 MHz.
Qualquer frequência entre 453 e 1430 MHz será interpolada a partir destes valores. Para frequências
fora deste intervalo, estas são avaliadas com as curvas de 453 e 1439 MHz.

Outro fator de correção que pode ser incluído no cálculo das perdas de transmissão é relativo ao
posicionamento do terminal móvel no terreno irregular. Assim, a intensidade do campo aumenta quando
a receção do sinal é feita nas proximidades do topo da colina (+𝐾ℎ𝑝 ) (local mais elevado do terreno
irregular), e diminui quando a receção é feita nos vales (−𝐾ℎ𝑝 ). [51] [36]

96
 Inclinação média do terreno, 𝐾𝑠𝑝
TM

EB

𝜃𝑖 ℎ1
ℎ2

𝑑𝑖

Figura 5.8 – Terreno inclinado. (adaptado de [36])

Figura 5.9 – Correção para a inclinação média do terreno.

2
−0.0025𝜃[mrad] + 0.204𝜃[mrad] , 𝑑 < 10 𝑘𝑚

−0.648|𝜃|1.09
[mrad] , 𝑑 > 30 𝑘𝑚, −15mrad < 𝜃 < 0mrad
𝐾𝑠𝑝 (𝜃)[𝑑𝐵] = (5.10)
2
−0.007𝜃[mrad] + 0.5𝜃[mrad] , 𝑑 = 30 𝑘𝑚, 0mrad < 𝜃 < 20mrad

2
{ −0.012𝜃[mrad] + 0.84𝜃[mrad] , 𝑑 > 60 𝑘𝑚, 0mrad < 𝜃 < 20mrad

97
Em geral, a intensidade do campo total na receção, aumenta em percursos com inclinação
ascendente, e diminui para percursos descendentes. O ângulo de inclinação do percurso e o
correspondente ajuste do campo são calculados apenas para distâncias superiores a 5 km. O ângulo
médio de inclinação é determinado ponto a ponto desde o ponto base mais baixo até ao local da
receção. O ângulo médio calculado está limitado aos limites da Figura 5.9, i.e., ângulos calculados com
magnitude superior a ± 20 mrad, são avaliados nos limites da figura, ou seja, em ± 20 mrad.

O intervalo de frequências da Figura 5.9 é entre 450 e 900 MHz. Não é feito qualquer outro ajuste
quando este fator de correção é incluído para outras frequências. [51] [36]

 Trajeto misto terra/mar, 𝐾𝑚𝑝


 𝛽 = 𝑑𝑠 ⁄𝑑

EB
TM

𝑑𝑠

Figura 5.10 – Terreno misto terra/mar. (adaptado de [36])

Figura 5.11 – Correção para trajetos mistos.

98
−12.4𝛽2 + 27.2𝛽 , 𝑑 > 60 𝑘𝑚
{ 𝐴
−8.0𝛽 2 + 19.0𝛽 , 𝑑 < 30 𝑘𝑚
𝐾𝑚𝑝 (𝛽)[𝑑𝐵] = (5.11)
11.9𝛽2 + 4.7𝛽 , 𝑑 > 60 𝑘𝑚
{ 𝐵(𝛽 < 0.8)
{ 7.8𝛽 2 + 5.6𝛽 , 𝑑 < 30 𝑘𝑚

No caso 𝐵, as expressões são válidas para 𝛽 < 0.8.

Em percursos mistos de terra e mar, a intensidade do campo calculado na receção, aumenta


com o parâmetro 𝛽. O cenário 𝐴 corresponde à situação em que o terreno com água encontra-se mais
próximo do local onde é feita a receção. No cenário 𝐵, a área ocupada pela água encontra-se mais
próxima da estação de base. [51] [36]

 Orientação das ruas e avenidas relativamente ao emissor, 𝐾𝑎𝑙 , 𝐾𝑎𝑐

Figura 5.12 – Correção para orientação das ruas relativamente ao emissor.

𝐾𝑎𝑐 (𝑑)[𝑑𝐵] = 2.1 𝑙𝑜𝑔(𝑑[𝑘𝑚] ) − 6.3 (5.12)

−2.7 𝑙𝑜𝑔(𝑑[𝑘𝑚] ) + 8.6 , 𝑑 ≤ 40 𝑘𝑚


𝐾𝑎𝑙 (𝑑)[𝑑𝐵] = { (5.13)
−4.0 𝑙𝑜𝑔(𝑑[𝑘𝑚] ) + 10.7 , 𝑑 > 40 𝑘𝑚

99
A intensidade do campo calculado na receção pode sofrer um ajuste, de acordo com a orientação
das ruas relativamente ao emissor. O campo aumenta para recetores colocados em ruas que se
encontram dispostas paralelamente em relação à direção das ondas emitidas pela estação de base
(𝐾𝑎𝑙 ), e diminui quando as ruas são perpendiculares (𝐾𝑎𝑐 ). Para distâncias inferiores a 5 km da estação
de base, os valores máximos da Figura 5.12 (+6.71 𝑑𝐵 ou −4.83 𝑑𝐵) são usados. [51] [36]

Os fatores para correção ambiental vêm dados pelas seguintes expressões desenvolvidas por
Hata [42], a partir das curvas de Okumura:

 Zonas suburbanas, 𝐾𝑠𝑢

Figura 5.13 – Correção para áreas suburbanas.

𝑓[𝑀𝐻𝑧]
𝐾𝑠𝑢 (𝑓)[𝑑𝐵] = 2.00𝑙𝑜𝑔2 ( ) + 5.40 (5.14)
28

100
 Zonas abertas, 𝐾𝑜𝑎 , ou quase abertas, 𝐾𝑞𝑜

Figura 5.14 – Correção para áreas abertas e quase abertas.

𝐾𝑜𝑎 (𝑓)[𝑑𝐵] = 4.78𝑙𝑜𝑔2 (𝑓(𝑀𝐻𝑧) ) − 18.33 𝑙𝑜𝑔(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) + 𝐾 (5.15)

𝐾𝑞𝑜 (𝑓)[𝑑𝐵] = 𝐾𝑜𝑎 (𝑓)[𝑑𝐵] − 5 (5.16)

onde, 𝐾 varia entre 35.94 (região rural) e 40.94 (desertos).

Naturalmente, a intensidade do campo na receção irá aumentar à medida que a densidade de


edifícios e obstáculos decresce.

5.2.1.4.Extensão do modelo Okumura-Hata

O modelo Okumura-Hata foi alargado pela COST4 em 1999, para cobrir o intervalo de
frequências de 1500 MHz a 2000 MHz. A expressão do valor mediano da atenuação empírica, em áreas
urbanas, vem dado por [47]:

4
Cooperação europeia de investigação em ciência e tecnologia

101
𝐿𝑃[𝑑𝐵] = 46.30 + 33.90 𝑙𝑜𝑔(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) − 13.82 𝑙𝑜𝑔 (ℎ𝑡[𝑚] )

+ [44.90 − 6.55 𝑙𝑜𝑔 (ℎ𝑡[𝑚] )] 𝑙𝑜𝑔(𝑑[𝑘𝑚] ) − 𝐽(ℎ𝑟 , 𝑓) + 𝐶𝑚 [𝑑𝐵] (5.17)

− ∑ 𝐾𝑐𝑜𝑟𝑟𝑒𝑐𝑡𝑖𝑜𝑛

onde

0, pequenas cidades, zonas suburbanas e rurais


𝐶𝑚 [𝑑𝐵] = { (5.18)
3, centros urbanos

Os restantes fatores de correção são os mesmos mencionados anteriormente. Este modelo é


referido como sendo a extensão COST 231 do modelo Okumura-Hata, e é válido para o intervalo de
frequências 1500 MHz a 2000 MHz, para alturas efetivas da estação de base entre 30 m a 200 m,
alturas de receção entre 1 m a 10 m, e distâncias compreendidas entre 1 km e 20 km.

5.2.1.5.Campo total

De modo a obter a expressão que permite determinar o valor médio do campo total recebido pelo
terminal móvel, parte-se da expressão que relaciona a potência recebida por uma antena e a densidade
de fluxo de potência:

𝑃𝑟 = 𝐴𝑒𝑓 (𝜃, 𝜑) × 𝑆𝑃 (𝜃, 𝜑) (5.19)

onde, a constante de proporcionalidade 𝐴𝑒𝑓 representa a área ou abertura efetiva da antena de receção.
A potência entregue no recetor é proporcional à área efetiva que a antena apresenta segundo a direção
de incidência.

Substituindo (2.6) e (2.15) em (5.19), vem

𝐸 2 [𝑉/𝑚] 𝜆2[𝑚] 𝐺𝑟
𝑃𝑟 [𝑊] = ⇔ (5.20)
𝑍0 [Ω] 4𝜋
2
𝐸 2 [𝑉⁄𝑚] 𝑐[𝑚⁄𝑠]
⟺ 𝑃𝑟 [𝑊] = ( ) 𝐺𝑟 (5.21)
30 4𝜋𝑓[𝐻𝑧]

onde, 𝐸 é o valor médio do campo elétrico à receção, 𝑍0 = 120𝜋 [Ω], é a impedância de onda em espaço
livre, 𝜆 é o comprimento de onda, 𝑓 é a frequência de operação, 𝑐 = 3 × 108 𝑚⁄𝑠 , é a velocidade da luz
no vácuo, e 𝐺𝑟 é o ganho da antena de receção em relação a uma antena isotrópica.

102
Procede-se de seguida à conversão da equação (5.21) em unidades logarítmicas:

𝑐[𝑚⁄𝑠]
𝑃𝑟 [𝑑𝐵𝑊] = 20𝑙𝑜𝑔(𝐸[𝑉⁄𝑚] ) − 10 log(30) − 20 log(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) + 20log ( ) − 120
4𝜋 (5.22)
+ 10𝑙𝑜𝑔(𝐺𝑟 )

A potência entregue no recetor relaciona-se com a potência emitida pelo emissor e com as perdas de
propagação, através da expressão (2.11). Substituindo (5.22) em (2.11), vem

𝑐[𝑚⁄𝑠]
𝐸[𝑑𝐵 𝑉⁄𝑚] = 𝑃𝑒 [𝑑𝐵𝑊] + 𝐺𝑒 [𝑑𝐵𝑖] + 20 log(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) − 20log ( )
4𝜋 (5.23)
+ 10 log(30) + 120 − 𝐿𝑃 [𝑑𝐵]

onde, 𝐿𝑃 é o valor mediano das perdas de propagação em áreas urbanas (perdas de espaço livre
incluídas), segundo o modelo Okumura-Hata. Este valor pode ser ajustado com o auxílio de fatores de
correção, se o terreno não for quase plano e/ou a região em análise não for urbana.

Convertendo 𝑑𝐵 (𝑉⁄𝑚) para 𝑑𝐵(𝜇 𝑉 ⁄𝑚), são adicionados 120 𝑑𝐵 na expressão (5.23) do campo. A
expressão final para o valor médio do campo total, vem dada por

𝑐[𝑚⁄𝑠]
𝐸[𝑑𝐵 𝜇𝑉⁄𝑚] = 𝑃𝑒 [𝑑𝐵𝑊] + 𝐺𝑒 [𝑑𝐵𝑖] + 20 log(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) − 20log ( )
4𝜋 (5.24)
+ 10 log(30) + 240 − 𝐿𝑃 [𝑑𝐵]

O modelo Okumura-Hata é reconhecido pela sua simplicidade e elevada precisão na estimação


das perdas de propagação para sistemas de rádio móvel instalados em ambientes citadinos, i.e., com
uma grande densidade de edifícios e obstáculos a obstruir a linha de vista entre o emissor e o recetor.
É um modelo bastante prático e tornou-se uma referência no planeamento de sistemas rádio. A sua
maior desvantagem é a resposta lenta que este modelo apresenta em relação a mudanças drásticas
de terreno, e portanto, é bastante bom em áreas urbanas e suburbanas, e não tão bom em áreas rurais
[48]. O modelo Okumura assume um desvio padrão empírico de cerca de 10 a 14 dB para as
frequências mais elevadas, entre as perdas de propagação previstas pelo modelo e os resultados
obtidos através de medições usadas para desenvolver o modelo. [43] [49]

O desvio padrão do erro entre os resultados previstos pelo modelo Okumura-Hata e os obtidos
através de medições em áreas urbanas, 𝜎𝑢 , e suburbanas, 𝜎𝑠𝑢 , vem aproximadamente dado pelas
seguintes expressões [36]:

𝜎𝑢 (𝑓)[𝑑𝐵] = 0.70𝑙𝑜𝑔2 (𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) − 2.50𝑙𝑜𝑔(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) + 11.10 (5.25)

𝜎𝑠𝑢 (𝑓)[𝑑𝐵] = 0.98𝑙𝑜𝑔2 (𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) − 3.40𝑙𝑜𝑔(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) + 11.88 (5.26)

103
5.2.1.6.Simulações do modelo Okumura-Hata

As figuras que se seguem representam os resultados obtidos a partir de simulações do modelo


Okumura-Hata, em diferentes ambientes e percursos.

Na primeira simulação as curvas de Okumura-Hata são obtidas para diferentes ambientes, em


terreno quase plano. O objetivo é analisar o comportamento do modelo no cálculo do campo ao longo
da distância, quando as ondas são propagadas em pequenas e grandes cidades, áreas suburbanas,
áreas abertas e quase abertas, e em espaço livre.

O valor médio do campo elétrico total na receção é calculado para cada caso aplicando primeiro
um fator de correção à expressão (5.5) das perdas de propagação do modelo Okumura-Hata, que está
referenciada para área urbana, e depois finalmente substituindo (5.5) na expressão do campo (5.24).

A expressão (2.9) é usada para obter os resultados referentes à propagação das ondas em
espaço livre. É necessário converter esta em unidades logarítmicas (dB), vindo:

4𝜋𝑑[𝑚]
𝐿𝑓𝑠 [𝑑𝐵] = 20𝑙𝑜𝑔 ( ) ⇔
𝜆[𝑚] (5.27)

⇔ 𝐿𝑓𝑠 [𝑑𝐵] = 32.44 + 20𝑙𝑜𝑔(𝑑[𝑘𝑚] ) + 20𝑙𝑜𝑔(𝑓[𝑀𝐻𝑧] ) (5.28)

Os fatores de correção ambiental usados na primeira simulação, foram de zona suburbana, área
aberta e quase aberta, expressões (5.14), (5.15) e (5.16), respetivamente. Para pequenas e grandes
cidades, tratando-se de zonas urbanas, não se aplicam fatores de correção ambiental. Relativamente
ao fator de correção para a antena recetora do terminal móvel, é usada a expressão (5.7) em todos os
ambientes, exceto o caso da pequena cidade em que se usou a expressão (5.6).

Na simulação da Figura 5.15 são usados os seguintes parâmetros:

 Potência de emissão: 10 dBm.


 Ganho da antena de emissão: 2.15 dBi.
 Frequência: 450 MHz.
 Altura efetiva da estação de base: 30 m.
 Altura da antena recetora: 5 m.
 Distância: 1-10 km.

104
Figura 5.15 – Modelo Okumura-Hata em diversos ambientes.

Procedendo à análise da Figura 5.15, verifica-se, como seria de esperar, que o campo à receção
atinge a maior amplitude no caso das perdas de espaço livre, onde não estão contabilizados alguns
fenómenos determinantes na propagação, tais como: o efeito de multipercurso, que provoca reflexões
e difrações do sinal devido à presença de obstáculos (edifícios, veículos, entre outros), causando
desvanecimento; a possibilidade de interferência com outras células; ruído eletromagnético com origem
em causas naturais ou atividade humana, entre outros. As restantes curvas manifestam o
comportamento previsto, pois à medida que a densidade de edifícios e obstáculos aumenta, maiores
serão as perdas de transmissão, provocando uma queda acentuada do sinal.

A Figura 5.16 representa a simulação feita em ambiente suburbano, para diferentes tipos de
terreno e percursos entre a estação de base e o terminal móvel. O objetivo desta simulação é analisar
o comportamento dos diferentes fatores de correção para o terreno, e o impacto que estes têm na
intensidade do campo prevista pelo modelo Okumura-Hata.

Nesta simulação, os fatores de correção aplicados para cada caso na expressão (5.5), foram o
de correção ambiental para uma zona suburbana, de correção da altura do recetor, e um para correção
do percurso, expressões (5.14), (5.7) e (5.8) a (5.13), dependendo do tipo de terreno, respetivamente.

Para a simulação da Figura 5.16 são usados os seguintes parâmetros:

 Potência de emissão: 10 dBm.


 Ganho da antena de emissão: 2.15 dBi.

105
 Frequência: 450 MHz.
 Altura efetiva da estação de base: 30 m.
 Altura da antena recetora: 5 m.
 Distância: 1-10 km.
 𝛽 = 0.5.
 𝜃𝑖1 = 10 𝑚𝑟𝑎𝑑 (ângulo de inclinação em percurso ascendente).
 𝜃𝑖2 = −10 𝑚𝑟𝑎𝑑 (ângulo de inclinação em percurso descendente).
 Altura da ondulação do terreno, Δℎ: 50 m.
 Distância: 1-10 km.

Figura 5.16 – Modelo Okumura-Hata em diversos terrenos e percursos.

Ao analisar-se a Figura 5.16, conclui-se imediatamente que o percurso que apresenta o cenário
mais vantajoso para a propagação, é um trajeto misto de terra e mar. Este resultado era esperado,
pois, com o parâmetro 𝛽 = 0.5, considera-se que metade do percurso é feito sobre o mar e tendo este
um fator de reflexão bastante elevado (Γ ≈ 1) e não havendo outros obstáculos em redor, a componente
refletida do campo terá uma grande contribuição para a receção. De referir que dentro do trajeto misto,
foi simulado o cenário 𝐴 , expressão (5.11).

No extremo oposto, o percurso que menos vantagens apresenta para a propagação corresponde
ao caso em que entre o terminal móvel recetor e a estação de base existem irregularidades no terreno,
tendo este uma altura de ondulação de 50 m. Nestas condições, o pior cenário é quando o recetor

106
encontra-se localizado nos vales, onde a probabilidade de existência de zonas não iluminadas (sombra)
é elevada.

A seguir ao trajeto misto, a melhor situação é quando o recetor encontra-se localizado numa rua
paralela à direção das ondas emitidas pelo emissor. Nestas circunstâncias, pode existir linha de vista
entre as duas antenas. Por outro lado, quando o recetor encontra-se situado numa rua perpendicular à
direção das ondas emitidas pelo emissor, é comum o sinal estar obstruído por edifícios, e nessas
circunstâncias, o sinal é recebido essencialmente através do efeito de multipercurso e difrações no topo
dos edifícios. A existência de ruas conduz a fenómenos de propagação guiada, com características
diferentes nas ruas paralelas e nas perpendiculares.

Salienta-se também que os resultados da propagação num percurso com inclinação ascendente
ou em declive só devem ser apreciados para distâncias superiores a 5 km, pois, sendo o modelo
definido para ângulos bastante pequenos, é necessário haver uma distância significativa entre as
antenas para que o ângulo de inclinação do terreno tenha um impacto considerável na propagação.

Na Figura 5.17 procedeu-se à simulação de dois cenários próximos da realidade com o modelo
Okumura-Hata. Como cenário exemplificativo, considera-se uma comunicação entre dois terminais na
rede GSM (900 MHz), na cidade de Lisboa (zona urbana).

O primeiro cenário corresponde à transmissão de um sinal entre uma estação de base, situada
na cidade, e um terminal móvel que se encontra num navio inicialmente a 100 m da margem lisboeta,
e que se afasta gradualmente. Encontramo-nos na presença de um percurso misto terra e mar (cenário
𝐴), em zona urbana.

No segundo cenário, a transmissão é feita no centro da cidade, encontramo-nos portanto numa


situação em que o recetor encontra-se situado, com grande probabilidade, entre as ruas, numa
perpendicular relativamente à direção de propagação das ondas. A existência de ruas conduz a
fenómenos de propagação guiada através do efeito de multipercurso, sendo que a atenuação
proveniente das reflexões nos edifícios e objetos circundantes varia de acordo com os materiais de
construção.

Na simulação da Figura 5.17 são usados os seguintes parâmetros:

 Potência de emissão: 10 dBm.


 Ganho de emissão: 2.15 dBi.
 Altura efetiva da estação de base: 30 m.
 Altura da antena recetora: 3 m.
 Frequência: 900 MHz.
 Distância: 1 a 3 km.
 𝛽 = 𝑑𝑠 ⁄𝑑 , em que 𝑑𝑠 varia entre 100 a 2100 m, e 𝑑 é a distância entre as antenas.

107
Figura 5.17 – Modelo Okumura-Hata em ambiente urbano.

Procedendo à análise da Figura 5.17, e como já foi referido previamente, verifica-se que um
percurso misto de terra e mar apresenta melhores condições para a propagação do sinal do que no
centro da cidade. A 1000 m de distância, no centro da cidade o valor mediano da atenuação é superior
em cerca de 10 dB relativamente ao trajeto misto, de acordo com o modelo Okumura-Hata. À medida
que a distância aumenta, o parâmetro 𝛽 também aumenta, resultando numa diferença cada vez maior
do valor do campo recebido nos dois casos. No centro da cidade o sinal sofre do efeito de multipercurso
ao refletir nos edifícios, veículos e outros obstáculos, causando desvanecimento. O ambiente é mais
dinâmico e caótico, existem outras fontes de interferência, tais como ruido proveniente de atividade
humana e possibilidade de interferência co-canal de células vizinhas, que é comum em ambos os
casos.

Além de todos estes fatores, para obter uma maior precisão deve-se também ter em conta as
perdas de transmissão nos cabos entre o transmissor e a antena da estação de base.

Sendo a comunicação bidirecional (canais uplink e downlink), deve-se contabilizar também as


perdas devido à proximidade entre os terminais móveis e utilizadores, quando os terminais transmitem
para a estação de base. Esta proximidade com o utilizador origina perdas que variam em cerca de 3 a
10 dB para o serviço de voz, e cerca de 0 a 3 dB para o serviço de transmissão de dados (internet
móvel, sms, mms, etc.), nas redes GSM, UMTS e LTE. [50]

Com o auxílio da expressão (5.25), pode-se estimar de forma aproximada o desvio padrão de
erro do modelo, em ambiente urbano: 𝜎𝑢 ≈ 9.8 𝑑𝐵.

108
Apesar do modelo ter sido desenvolvido com base nas características de Tóquio, sendo
discutível a sua aplicação em outros ambientes, o modelo de Okumura-Hata é um dos modelos
empíricos com desvio padrão de erro mais baixo quando otimizado para um determinado ambiente, o
que torna este um dos modelos empíricos de eleição para o planeamento de sistemas de rádio móvel,
principalmente em áreas urbanas. [44]

5.2.2.Modelos teóricos

Os modelos teóricos não são baseados em medidas, representam uma aproximação da


realidade. Como consequência, não contabilizam todos os fatores que afetam a propagação e
manifestam uma forte dependência da definição de bases dados geográficas.

5.2.2.1.Modelo Walfisch-Bertoni

Tipicamente numa macro-célula urbana, o terminal móvel encontra-se em zonas de sombra


geométrica em relação à estação de base. Deste modo, o campo que atinge o terminal móvel poderá
ter origem fundamentalmente na propagação por entre os edifícios, através dos edifícios, ou por
difrações sucessivas nos topos dos edifícios. Um modelo teórico para propagação em ambientes
urbanos foi proposto por Walfisch e Bertoni em 1988 [41], e segundo este modelo, a difração no topo
dos edifícios é o mecanismo que mais contribui para o campo recebido no terminal móvel.

Uma situação típica de ambiente de macro-célula encontra-se representada na Figura 5.18.

Efeito sombra
Efeito multipercurso

Figura 5.18 – Perfil típico numa macro-célula em meio urbano. (adaptado de [37])

109
O modelo de Walfisch-Bertoni considera dois tipos de atenuação para o cálculo aproximado da
amplitude do campo ao nível da rua:

 A atenuação 𝐴𝑛 , introduzida pelos múltiplos obstáculos que interferem desde a região do emissor
até ao obstáculo que antecede o terminal móvel. Esta atenuação é calculada no ponto
correspondente ao topo do último edifício antes do terminal móvel. Para obter o valor absoluto
do campo neste ponto, multiplica-se 𝐴𝑛 pela amplitude da onda esférica (onda de espaço livre
que tem origem na antena da estação de base) calculada neste ponto.

 A atenuação 𝐴𝐸 , associada à difração desde o topo do ultimo edifício antes do terminal móvel
até ao nível da rua, entrando em consideração com eventuais reflexões e dispersão nas paredes
dos edifícios e em outros obstáculos na vizinhança do móvel.

5.2.2.2.Efeito de multi-percurso

Múltiplos raios podem eventualmente contribuir para o campo recebido no terminal móvel, como
se pode verificar nas Figuras 5.18 e 5.19. De acordo com resultados experimentais obtidos [40], apenas
o raio difratado que atinge diretamente a antena do móvel, e o raio difratado que se reflete uma vez no
edifício da frente antes de atingir o móvel, têm contribuição preponderante para o campo recebido no
terminal móvel.

ℎ𝐸

ℎ𝑟

𝑤
Figura 5.19 – Geometria do multi-percurso (representação do alçado).

O valor da atenuação associada à difração das ondas desde o topo do edifício até ao nível da
rua vai depender das características da estrutura urbana, nomeadamente a geometria dos edifícios e
da forma como os edifícios ou obstáculos circundantes se encontram dispostos nos casos em que haja
reflexão. No modelo de Walfisch-Bertoni tomam-se as seguintes considerações:

110
 Os edifícios são substituídos por um ecrã opaco semi-infinito (knife-edge), alinhado com a aresta
de difração do edifício.

 O ecrã é iluminado por uma onda plana, cuja frente de onda está inclinada de um ângulo α em
relação à horizontal.

 O efeito do chamado “ângulo de rua” 𝜙 é contabilizado de forma empírica, escalando a


coordenada longitudinal.

𝜙 𝜙

𝑇𝑀

𝑤 𝑤

Figura 5.20 – Esquematização do ângulo de rua (representação em planta).

Em que:

 ℎ𝐸 – Altura dos edifícios


 ℎ𝑟 – Altura do terminal móvel
 𝑤 – Espaçamento entre edifícios, ou largura das ruas
 𝛼 – Ângulo entre a horizontal e a altura da estação de base, definido a partir do topo do último
edifício
 𝜙 – Ângulo de rua
 𝑇𝑀 – Terminal móvel

A atenuação 𝐴𝐸 é obtida pela seguinte expressão [1]:

1
2 2 2
1 1 1 1 (5.29)
|𝐴𝐸 (ℎ𝑒 )| = { [ + 𝐶(ℎ𝑒 1,2 )] + [ + 𝑆(ℎ𝑒 1,2 )] }
2 2 2 2

111
em que 𝐶( ) e 𝑆( ) designam as funções co-seno e seno integrais de Fresnel. A altura equivalente vem
dada por

2sin𝜙 sin𝛼
ℎ𝑒1 = √ [(ℎ𝑟 − ℎ𝐸 ) + 2𝑧 ] (5.30)
𝜆𝑧 sin𝜙

para a onda difratada direta. No caso da onda refletida no edifício da frente, tem-se

2sin𝜙 sin𝛼
ℎ𝑒2 = √ [(ℎ𝑟 − ℎ𝐸 ) + 2(2𝑤 − 𝑧) ] (5.31)
𝜆(2𝑤 − 𝑧) sin𝜙

Os campos com origem no raio difratado direto e no raio refletido pelo edifício, vêm dados
respetivamente por

2
𝐸12 = 𝐸𝑓𝑠 |𝐴𝐸 (ℎ𝑒1 )|2 (5.32)

2
𝐸22 = 𝐸𝑓𝑠 |𝐴𝐸 (ℎ𝑒2 )|2 |𝛤𝑒𝑑 |2 (5.33)

sendo

√60𝑃𝑒 𝐺𝑒
𝐸𝑓𝑠 = (5.34)
𝑟

e Γed o fator de reflexão das paredes dos edifícios.

5.2.2.3.Efeito de sombra e difração por filas múltiplas de edifícios

Para obter a atenuação 𝐴𝑛 associada à difração no topo dos edifícios, o modelo de Walfisch-
Bertoni assume que a estrutura urbana é muito regular, tanto em termos de altura dos edifícios, como
no mapeamento das ruas e avenidas, considerando-as praticamente paralelas umas em relação às
outras. À semelhança do que se fez anteriormente, substitui-se cada edifício por um ecrã opaco semi-
infinito (knife-edge).

Embora este modelo se aplique apenas nos casos em que os ecrãs apresentam alturas e
espaçamentos constantes, conduz, no entanto, a resultados que concordam razoavelmente bem com
resultados experimentais [41].

112
𝑁0 𝑤𝑡𝑎𝑛(𝛼)
𝛼

𝑁 𝑁+1
𝑤 𝑤 𝑤
𝑁0

Figura 5.21 – Esquema para a atenuação devido a 𝑵 + 𝟏 obstáculos. (adaptado de [1])

O ângulo 𝛼 pode então ser obtido por:

ℎ𝑏
𝛼 = tan−1 ( ) (5.35)
𝑁𝑒𝑑 𝑤

Em que ℎ𝑏 é a altura da estação de base desde o topo do edificio e 𝑁𝑒𝑑 é o numero de edifícios.

A atenuação introduzida pelos 𝑁 + 1 obstáculos múltiplos é dada pela seguinte expressão


aproximada

𝐴𝑁+1 ≈ 2.35𝑔𝑝 0.9 (5.36)

Sendo 𝑔𝑝 dado por

𝑤
𝑔𝑝 = √ sin𝛼 (5.37)
𝜆

A expressão do cálculo da atenuação só é válida para 0 < 𝑔𝑝 < 0.5 e 𝑁𝑒𝑑 > 0.1𝑁0 [41], em que
𝑁𝑒𝑑 é o numero de edifícios e 𝑁0 é o numero de edifícios que intersecta o elipsoide de Fresnel, vindo
este dado por

𝜆 1
𝑁0 = 𝐼𝑛𝑡 { 2 } = 𝐼𝑛𝑡 { } (5.38)
𝑤sin 𝛼 𝑔𝑝 sin𝛼

113
5.2.2.4.Campo total

O valor médio do campo total recebido pelo terminal móvel, de acordo com o modelo de Walfisch-
Bertoni, é então dado por

𝐸 = 𝐴𝑁+1 × √𝐸12 + 𝐸22 (5.39)

A atenuação total a que é submetido o sinal até chegar ao terminal móvel, é deste modo a soma
entre a atenuação resultante das perdas de espaço livre do sinal na baixa atmosfera, determinado no
topo do último edifício; da atenuação devido à difração no topo da fila de edifícios, vistos como um
conjunto de ecrãs opacos semi-infinitos (knife-edge) que intersectam o elipsoide de Fresnel; e da
atenuação com origem na difração do sinal desde o último edifício até ao nível da rua, onde se incluem
as reflexões e dispersões do sinal em obstáculos próximos do terminal móvel.

O modelo conduz a resultados com erros aceitáveis [41], especialmente se a estrutura urbana
próxima do terminal móvel for razoavelmente uniforme, num comprimento de 𝑁0 𝑤.

5.2.2.5.Simulações do modelo Walfisch-Bertoni

Nesta simulação, o campo elétrico é calculado por três formas diferentes consoante a zona onde
o sinal se encontre.

Na primeira zona, o campo é calculado através da expressão (2.55). Dessa expressão apenas é
considerada a componente direta do raio, podendo considerar-se que os raios refletidos se irão perder
entre os edifícios, não contribuindo significativamente no valor do campo.

A segunda zona corresponde aos espaços entre os edifícios, sendo o campo determinado
segundo o modelo Walfisch-Bertoni. Para a simulação do modelo utilizou-se as expressões (5.29),
(5.32), (5.33) e (5.39). Neste modelo dividiu-se tanto a distância como a altura da antena de receção
em pequenos intervalos como já havia sido feito no caso do cálculo do campo elétrico com reflexões
no solo. O número de intervalos para a distância é 500 e para a altura 200. Após a divisão em intervalos
calculou-se os diversos parâmetros necessários ao cálculo da atenuação devido ao multi-percurso (𝐴𝑒 )
e à atenuação introduzida pelos obstáculos (𝐴𝑁+1 ). O campo eléctrico é calculado posteriormente
através da expressão (5.39).

Para cada edifício são calculados os valores de 𝛼, 𝑔𝑝 e 𝑁0 . Estes parâmetros servem para
comprovar a validade do modelo. Este apenas é válido para 0 < 𝑔𝑝 < 0.5 e 𝑁𝑒𝑑 > 0.1𝑁0 . Na figura os
edifícios que cumprem a validade do modelo estão compreendidos entre a linha azul e vermelha. A
linha azul corresponde ao edifício onde o valor de 𝑔𝑝 começa a ser menor que 0.5. A linha vermelha
corresponde ao ultimo edifício para o qual é garantida a condição 𝑁𝑒𝑑 > 0.1𝑁0 .

114
Por último, na terceira zona, utiliza-se o modelo knife-edge para obter o valor do campo,
considerando-se apenas os raios diretos, pois a reflexão no terreno não contribui como parte
significativa da expressão (3.9).

Apenas se apresenta a simulação utilizando uma antena, pois o comportamento que o campo
elétrico terá é igual ao comportamento utilizando um agregado com várias antenas.

Na simulação representada pela Figura 5.22 estão representadas as três regiões, bem como o
comportamento do campo elétrico em cada uma delas.

Para a simulação da Figura 5.22 são usados os seguintes parâmetros:

 Potência de emissão: 10 W.
 Ganho antena de emissão: 15 dBi.
 Frequência: 600 MHz.
 Número antenas: 1.
 Altura antena de emissão: 50 m.
 Largura da rua: 70 m.
 Altura dos edifícios: 45 m.
 Número de edifícios: 20.
 Γed = 1.
 𝜙 = 90𝑜 .

Figura 5.22 – Modelo Walfisch-Bertoni para uma frequência de 600 MHz.

Procedendo à análise da figura, é possível perceber que o campo vai perdendo intensidade entre
os edifícios, até chegar ao nível da rua. Esta situação era esperada pois a intensidade dos raios é
atenuada em função da penetração, uma vez que a altura equivalente decresce. Após o último edifício,
o campo apresenta o comportamento já analisado na secção da difração por obstáculos (knife-edge).

115
Variando a frequência, as condições de validade do modelo variam. Na simulação da Figura 5.23
aumentou-se a frequência para 1800 MHz pelo que a condição de 0 < 𝑔𝑝 < 0.5, linha azul, e
𝑁𝑒𝑑 > 0.1𝑁0 , linha vermelha, alteram-se. Com o aumento da frequência, aumenta também a atenuação
provocada pelos edifícios.

Figura 5.23 – Modelo de Walfisch-Bertoni para frequência de 1800 MHz.

É interessante analisar o caso em que o fator de reflexão das paredes dos edifícios é reduzido
de forma significativa. Considera-se o coeficiente de reflexão dos edifícios igual a zero, Γ𝑒𝑑 = 0. Pela
análise da Figura 5.24 é possível perceber que o raio refletido nos edifícios deixa de ter efeito no cálculo
do campo elétrico, surgindo apenas a contribuição do campo que é difratado no topo do edifício. O
campo aparenta assim ter um comportamento semelhante ao do modelo knife-edge, aparecendo uma
zona de sombra em cada edifício.

Figura 5.24 – Modelo de Walfisch-Bertoni para frequência de 600 MHz, considerando 𝚪𝒆𝒅 = 𝟎.

116
6. CONCLUSÃO

6.1.Principais conclusões

Com este trabalho pretende-se investigar a influência, ao nível do grau de perturbação, que um
dado ambiente pode ter na propagação de ondas eletromagnéticas. Os resultados foram obtidos a
partir de uma abordagem teórica e de demonstrações gráficas de modelos teóricos e empíricos
estudados durante o curso. Assim, num contexto académico, este trabalho permite uma melhor
compreensão de alguns dos fenómenos que afetam a propagação de ondas eletromagnéticas num
dado ambiente, dando ao aluno uma melhor perceção de cada modelo e da influência dos seus
parâmetros. A nível de projeto, a visualização gráfica dos modelos constitui uma mais-valia no
planeamento celular de um sistema de comunicações móveis em ambiente urbano. Dos temas
abordados consta a reflexão, difração, refração, e modelos de propagação em determinados
ambientes.

No capítulo da reflexão, representou-se graficamente o andamento do campo elétrico com


polarização vertical e horizontal, considerando o raio refletido no solo. Foi possível verificar a
interferência entre o raio direto e raio refletido, observando-se, a partir de um certo ponto, a existência
de máximos e mínimos do campo elétrico. Da análise efetuada ao andamento do campo em função da
altura da antena de receção e da distância entre antenas observa-se que este apresenta máximos e
mínimos tanto em altura como em distância. Partindo de um certo ponto, esses máximos e mínimos
são mais visíveis. Através da Figura 2.17 e Figura 2.18 é possível visualizar o andamento do campo e
academicamente perceber-se a que distância e altura se deve colocar a antena de receção para se
obter um maior rendimento do sistema. A Figura 2.18 distingue-se da Figura 2.17 através da utilização
de um agregado de antenas como emissor. É possível verificar que o ponto a partir do qual se começa
a distinguir os máximos e mínimos aumenta. O agregado utilizado torna a antena mais diretiva como
exemplificado na Figura 2.16.

No módulo da difração em obstáculos, demonstrou-se graficamente o modelo knife-edge, onde


foi possível observar a atenuação causada pelo obstáculo no campo elétrico. No andamento do campo
é possível distinguir duas zonas. A zona anterior ao obstáculo onde é possível observar os máximos e
mínimos do campo, como demonstrado no capítulo da reflexão no solo, e a zona após o obstáculo,
onde o campo sofre uma atenuação suplementar. Nessa zona já não se observa tão nitidamente os
máximos e mínimos do campo, apenas para alturas superiores à altura do obstáculo, onde através do
modelo knife-edge se verifica que a atenuação provocada pelo obstáculo é menor. Por outro lado, num
ponto de observação profundamente imerso na zona de sombra criada pelo obstáculo, a amplitude do
campo será bastante reduzida. Este modelo é dependente da frequência pelo que se demostrou o
efeito desta no campo elétrico. Verificou-se que quanto maior é a frequência maior é a atenuação
provocada pelo obstáculo (Figura 3.4 e Figura 3.5).

117
No estudo da refração demonstrou-se o traçado de raios em atmosferas normais e em condições
especiais (ductos). Aproveitando o estudo anterior visualizou-se o efeito provocado por determinadas
atmosferas em imagens captadas pelo olho humano. A esse efeito dá-se o nome de miragens. Através
da visualização das trajetórias dos raios observou-se a influência do gradiente da refratividade
modificada sobre os raios. Como já referido, se este for positivo, os raios tendem a subir e afastam-se
da superfície terrestre, caso contrário, tendem a descer. A simulação das trajetórias dos raios na
presença de vários tipos de ductos confirmou que os raios ficam confinados à camada que apresenta
um gradiente negativo da refratividade modificada, atingindo, assim, distâncias mais elevadas do que
na presença de uma atmosfera tradicional. Existem dois tipos de miragens: a miragem superior e a
miragem inferior. Usando uma atmosfera estratificada em duas camadas, e após simulação das
trajetórias dos raios, obtém-se uma miragem superior em que o que se encontra ao nível da superfície
terrestre (navio neste caso) é “copiado” na parte superior da imagem (Figura 4.28). Caso a atmosfera
esteja estratificada em três camadas, a trajetória dos raios vai provocar o aparecimento de uma
miragem inferior, onde o céu é refletido no solo (Figura 4.29).

No capítulo dos modelos de propagação em ambientes urbanos, foram demonstrados os


modelos Okumura-Hata e Walfisch-Bertoni.

O modelo empírico Okumura-Hata foi concebido para ser usado em ambientes urbanos de
macro-célula. O modelo foi simulado para diversos ambientes e tipos de terreno com auxílio dos fatores
de correção inerentes ao modelo, verificando-se que o valor médio do campo obtido na receção diminui
à medida que a densidade de obstáculos e de irregularidades no terreno for maior, devido ao aumento
do valor mediano das perdas de transmissão (Figura 5.15 e Figura 5.16). Por outro lado, quando a
receção do sinal é feita no topo de uma colina, numa rua paralela relativamente à direção das ondas
emitidas pela estação de base, ou quando o recetor encontra-se localizado num percurso com
inclinação ascendente, a atenuação nestes casos será menor. Estas são algumas das situações mais
favoráveis em comunicação, devido à existência, com elevada probabilidade, de linha de vista entre as
duas antenas. Um modelo empírico toma em consideração todas as influências ambientais implícitas,
sendo que a sua precisão depende da precisão das medições e principalmente da similaridade entre o
local onde as medições foram realizadas e o local onde se pretende projetar um sistema de
comunicações, caso contrário, o erro envolvido será maior, devendo-se proceder a correções adicionais
de otimização. A grande vantagem dos modelos empíricos reside na sua simplicidade e eficiência
computacional.

O modelo teórico Walfisch-Bertoni é indicado para ambientes urbanos de macro-célula


constituída por uma fileira de edifícios. A representação do campo elétrico ao longo da distância e altura
da antena de receção está dividido em três zonas. A primeira zona localiza-se no topo dos edifícios e
está compreendida entre a antena de emissão e o último edifício. Nessa zona o campo elétrico apenas
é constituído pelo raio direto, pois o raio refletido vai sofrer atenuações por cada edifício que atravessar,
podendo ser descartado. O campo calculado entre os edifícios desde o emissor até ao último edifício
corresponde à segunda zona. Aí o campo é calculando recorrendo ao modelo Walfisch-Bertoni. A
terceira zona é a região que vai desde o último edifício até à antena recetora, onde se usou o modelo

118
knife-edge para o cálculo do campo elétrico. Também nesta zona não se considerou o raio refletido.
Para além da análise da influência da frequência neste modelo, observou-se também o efeito do
coeficiente de reflexão dos edifícios. Conclui-se que se o coeficiente for nulo, vai existir uma zona de
sombra próxima do edifício anterior, uma vez que deixa de haver contribuição do raio refletido entre os
edifícios (Figura 5.24). O campo apresenta um andamento muito semelhante ao demonstrado no
modelo knife-edge. Caso o coeficiente seja diferente de zero, observa-se a contribuição do raio
refletido, o que resulta num aumento do valor do campo entre os edifícios (Figura 5.23).

6.2.Perspetivas de trabalhos futuros

Este trabalho pode ser atualizado, futuramente, com a introdução de novos tópicos referentes a
temas relevantes dentro da área da propagação de ondas eletromagnéticas.

O tema da reflexão pode ser atualizado com a introdução do modelo da terra esférica, tornando
o capítulo mais completo.

Um modelo que poderia ser acrescentado em relação à difração, é a difração em torno da terra.
Neste caso seria possível investigar a influência da curvatura da terra na propagação.

Relativamente à polarização das ondas, neste trabalho foram consideradas as polarizações


horizontais e verticais através dos coeficientes de Fresnel, porém, pode ser introduzido um estudo
sobre sistemas com polarização circular, uma vez que a polarização circular é bastante comum em
sistemas de comunicação via satélite, encontra-se presente em rádio móvel e em outros serviços.

Um estudo profundo sobre desvanecimento seria uma adição significativa, dado tratar-se de um
fenómeno que afeta de forma preponderante a qualidade de serviço conseguida. Para atenuar os
efeitos do desvanecimento, nem sempre é económico, ou sequer tecnicamente possível, aumentar a
potência emitida ou os ganhos das antenas. Uma solução elegante e eficaz é a diversidade, que
também constituiria um bom tema de atualização ao trabalho.

Na sequência do desvanecimento, um tema que poderia ser abordado seria a atenuação


suplementar causada pela absorção e dispersão das ondas devido à presença de hidrometeoritos (em
especial a chuva) e gases na atmosfera (oxigénio e vapor de água), em ligações de elevada frequência.

A comunicação via satélite e a propagação de ondas eletromagnéticas via ionosfera também


seriam possíveis sugestões de interesse académico.

119
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