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Memorial do Convento

Lê atentamente o excerto de Memorial do Convento.

Meados de dezembro, voltava Baltasar para casa ao fim do dia, quando viu Blimunda, que,
como quase sempre, o viera esperar ao caminho, porém, havia nela uma agitação e uma tremura
não costumadas, só quem não conhece Blimunda não sabe que ela anda no mundo
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como se já o conhecesse de outras vidas anteriores, e chegando-se, perguntou, É meu pai que
5 está pior, e ela respondeu, Não, e logo, baixando muito a voz, o senhor Escarlate está em casa
do senhor visconde, que terá ele vindo cá fazer, Tens a certeza, viste-o, Com estes olhos, Seria
talvez um homem parecido, E ele, a mim basta-me ver uma vez uma pessoa, vi-o muitas. En-
traram em casa, cearam, depois foi cada qual à enxerga onde dormia, cada casal na sua, o
velho João Francisco com o neto […]. Ao outro dia, no crepúsculo da madrugada, enquanto
1 se acomodava ao canto da lareira, o velho disse, Esta noite ouvi uma música, não lhe ligaram
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importância Inês Antónia, nem Álvaro Diogo, nem o neto, isto de velhos estão sempre a ouvir
coisas, mas Baltasar e Blimunda ficaram tristes de ciúme, se alguém ali tinha direito a ouvir
músicas assim, eles eram, e mais ninguém. Foi ele para o trabalho, e ela ficou rondando durante
toda a manhã o palácio. […]
Saiu o músico a visitar o convento e viu Blimunda, disfarçou um, o outro disfarçou, que
1 em Mafra não haveria morador que não estranhasse, e estranhando não fizesse logo seus juízos
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muito duvidosos, ver a mulher do Sete-Sóis conversando de igual com o músico que está
em casa do visconde, que terá ele vindo cá fazer, ora veio ver as obras do convento, para quê
se não é pedreiro nem arquiteto, para organista ainda o órgão nos falta, isso a razão há de ser
outra, Vim-te dizer, e a Baltasar, que o padre Bartolomeu de Gusmão morreu em Toledo, que
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é em Espanha, para onde tinha fugido, dizem que louco, e como não se falava de ti nem de
0 Baltasar, resolvi vir a Mafra saber se estavam vivos. Blimunda juntou as mãos, não como se
rezasse, mas como quem estrangula os próprios dedos, Morreu, Foi essa a notícia que chegou
a Lisboa, Na noite em que a máquina caiu na serra, o padre Bartolomeu Lourenço fugiu de
nós e nunca mais voltou, E a maquina, Lá continua, que faremos com ela, Defendam-na,
cuidem-na, pode ser que um dia volte a voar […].
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5 SARAMAGO, José, 2014. Memorial do Convento. 56.a ed. Porto: Porto Editora
(Capitulo 17, pp. 244-246) (1.a ed.:1982)

Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas ao questionário.

1. Localiza o excerto na globalidade da obra.

2. Apresenta três traços caracterizadores de Blimunda, ilustrando-os com


passagens textuais.

3. Explicita o valor da comparação usada nas linhas 22-23.

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