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A ARTE E A BÍBLIA Por Daniel do Carmo

RACIOCÍNIO BÍBLICO e PESQUISA DA HISTÓRIA CRISTÃ DA MATÉRIA ARTES


PLÁSTICAS

A palavra “artista” relacionada a obra de arte é usada na Bíblia pela primeira vez no livro de
Êxodo no capítulo 30 versículo 35, no capítulo 31 versículo 3, e no este último repetido no capítulo
35 versículo 31. Ambas as passagens são relacionadas ao momento em que o Senhor instrui a
Moisés sobre como deveria construir o tabernáculo ou Tenda do Encontro e acerca de
como o próprio Senhor dotaria alguns homens com “plena capacidade artística” pelo
próprio Espírito Santo para que a obra fosse executada. Antes disso, no entanto, temos logo
no relato da criação, uma referência de construção/ação artística, como segue:

Gênesis é um termo grego que significa “origem”, “fonte”, “geração” ou


“começo”. O título original Bereshith significa “No princípio”.

No princípio criou Deus os céus e a terra. E criar aqui significa “trazer à existência do nada”. A
criação refere-se àquele primeiro ato mediante o qual Deus auto-existente trouxe a existência o
que não tinha forma de existência independente.
Deus através da criação revela algo mais do que realmente Ele é e pode fazer nos dando base
para toda a atuação humana sobre a terra. Ele criou todas as coisas e nós apenas cuidamos,
re-arranjamos, recriamos a partir de tudo o que foi feito por Ele.

A “criação” conota alguns princípios da expressão artística. Deus em cada dia e gesto expressou
algo diferente:

Expressão de domínio e poder, pois dizia/ordenava e tudo passava a existir. (Como o


domínio técnico de uma disciplina)

Expressão de fazer, pois com suas mãos formou o homem. (Como produção autoral)

Expressão de crítica, pois ao terminar observou, avaliou, e chegou a uma conclusão


critica sobre o que havia feito dizendo: “é bom”, e “é muito bom”. (Como crítica artística)

Expressão de si (autoconhecimento), pois criou o homem a sua imagem e semelhança.


(Como produção artística relacionada a autoconhecimento e auto-reflexão)

Ao criar o homem, a ação descrita também é como de um artista escultor, pois lemos que
Deus tomou o pó da terra, e dele formou, deu forma, ao homem. Após esse fato,
podemos imaginar que a “forma” do homem estava pronta, montada, modelada, como uma
modelagem em argila. Só então houve o sopro do “fôlego de vida” nas narinas do homem. E
este passou a ser um ser vivente. Em momento posterior, o da criação da mulher, o termo
empregado também é “formou”. Gn 2:7-8, 22.

Deus foi o primeiro criador, arquiteto, executor, e apreciador de beleza. Sendo o “belo”
um conceito estético, estudado na semiótica e um dos temas centrais de todos os filósofos e
filosofias, sejam dos povos orientais, da mitologia e filosofia gregas, ou mesmos as modernas
e contemporâneas. Deus é um admirador de beleza, e esta pode louvá-lo e engrandecê-
lo, pois trás consigo elementos da verdade de Deus. A beleza primeira, limpa, pura, vida
de Deus, perfeita, organizada. Este termo é tão sublime quando encontrado em Deus, que é
apresentado pelo salmista como referência para o ato de adoração como se lê:

"Tributai ao SENHOR a glória de seu nome; trazei presentes, e vinde perante ele;
adorai ao SENHOR na beleza da sua santidade." 1 Crônicas 16:2b

Para Kilby lemos:

“Para o cristão Deus é o artista supremo...Deus olhou para sua criação em


progresso e viu que era boa; quando havia terminado, viu que era ‘muito boa’... É
evidente que o Grande Artista ficou bastante satisfeito com seu mundo. Era um mundo
cheio de coisas, formas e movimentos maravilhosos, abundante em ricas cores como
as dos arco-íris e da rosa, ricas texturas como as do pêlo do castor e das folhas de
magnólia, ricos perfumes como os do marmelo e da madressilva, riscos sons como os
do trovão e do riacho a correr, ricos sabores como da melancia e do chocolate”.
(KILBY, Clyde S.Christianity and Aesthetics, p.18)

Schaeffer poetizando nos trás:

“Se Deus fez as flores, então estas são dignas de serem pintadas e de
aparecerem em versos. Se Deus fez os pássaro, são dignos de serem pintados.
Se Deus fez o céu, este é digno de ser pintado. Se Deus fez o mar, sem dúvida ele é
digno de ser colocado em versos. Vale a pena para o ser humano criar obras que se
baseiam nas grandes obras que já foram criadas por Deus”. (SCHAEFFER, Francis A.
A arte e a Bíblia,Minas Gerais, Ed. Ultimato, 2010, p.60)

Toda obra criativa, bem como a criação de Deus, é fonte de conhecimento, beleza, e prazer
estético. Na criação divina, o Senhor comunica seu cuidado com o ser humano na maneira e
perfeição com que o cria, na maestria do local que criou para colocá-lo – jardim do Éden, nas
funções que lhe concede. Uma das funções atribuídas ao homem era dar nome aos animais,
e isso de acordo com o nome que homem quisesse, trabalho que exigiu criatividade.
Encontramos em Gênesis 2:19-20:
“Havendo, pois, o SENHOR Deus formado da terra todo o animal do campo, e toda a
ave dos céus, os trouxe a Adão, para este ver como lhes chamaria; e tudo o que Adão
chamou a toda a alma vivente, isso foi o seu nome. E Adão pôs os nomes a todo o
gado, e às aves dos céus, e a todo o animal do campo; mas para o homem não se
achava ajudadora idônea.”

Em Anne Lousie Flint lemos:

“A beleza é a letra cursiva de Deus.”(Anne Louise Flint,God in the Classroom,


Ed.Marjorie Adams, p.62.)

No que diz respeito a objetos artísticos, existe no meio cristão um pensamento difundido
e aceito de maneira errônea, pois trata de maneira geral algo que o Senhor determinou
de maneira específica, a representação. Representar é inerente a produção artística. Todo
o equívoco parte do mandamento de não se reproduzir imagens:

“Não fará para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do que há em cima
nos céus, nem embaixo na terra, nem lhes dará culto; porque eu sou o Senhor, teu
Deus, Deus zeloso” Êxodo 20:4-5

Se entendermos que toda representação de Deus ou do que há na terra constitui uma


transgressão a este que é o primeiro dos dez mandamentos, certamente não há espaço para
a arte. Contudo, se debruçarmos sobre as escrituras no próprio livro das leis – Levítico,
obteremos um entendimento ampliado e mais preciso do que a passagem de Êxodo diz:

“Não fareis para vós outros ídolos, nem vos levantareis imagem de escultura nem
coluna, nem poreis pedra com figuras na vossa terra, para vos inclinares a ela; porque
eu sou o Senhor, vosso Deus.” Levítico 26:1

Em Levítico percebe-se que toda a proibição se dá em relação a confecção de imagens para


adoração, ídolos, falsos deus representados em elementos naturais que não possuem
divindade e são contrários ao verdadeiro Deus. A Bíblia não proíbe a confecção de arte
figurativa, o mandamento não é contrário as artes, e sim a adoração de objetos
artísticos atribuindo-lhes capacidades e forças místicas.

Nas escrituras, um pouco a frente do relato dos dez mandamentos (Ex 20:1-17; 34:28; Lv
4:13; 10:4), ainda no livro de Êxodo, o Senhor ordena a Moisés algo que demonstra a
apreciação e desejo de Deus pela arte; pela arte produzida pelas mãos do homem; e
pela arte produzida para estar em seu templo, como louvor a Ele – e que não deixava de ser
representação. Trata-se do texto de Êxodo 30:35; 31:1-11; 35:30-35, onde o Senhor orienta
a Moisés sobre como deviria ser construído tabernáculo para adoração, sacrifícios,
purificação, e encontro com o Senhor. A primeira coisa que Deus providenciou ao dar a
planta para Moises foi designar homens aptos ao trabalho e os dotar de “plena
capacidade artística” como se lê:

“Disse o Senhor a Moisés: Eu escolhi a Bezalel, filho Uri, filho de Hur, da tribo de
Judá, e o enchi do Espírito de Deus, dando-lhe destreza, habilidade e plena
capacidade artística para desenhar e executar trabalhos em ouro, prata e bronze,
para talhar e esculpir pedras, para entalhar madeira e executar todo tipo de obra
artesanal. Além disso, designei Aoliabe, filho de Aisamaque, da tribo de Dá, para
auxilia-lo. Também capacitei todos os artesãos para executarem tudo o que lhe
ordenei: a Tenda do Encontro, a arca da aliança e a tampa que está sobre ela, e todos
os outros utensílios da tenda – a mesa com os seus utensílios, o candelabro de ouro
puro e os seus utensílios, o altar do incenso, o altar do holocausto com seus utensílios,
a bacia com a sua base – as vestes litúrgicas, tanto  as vestes sagradas de Arão, o
sacerdote, como as vestes para os seus filhos, quando servirem como sacerdotes, e o
óleo para as unções e o incenso aromático para o lugar Santo. Tudo deve ser feito
exatamente como eu lhe ordenei.” Êxodo 31:1-11

Em Êxodo 35:35 acrescenta-se a lista de habilidades:

“A todos esses deu capacidade para realizar todo tipo de obra como artesãos,
projetistas, bordadores de linho fino e de fios de tecido azul, roxo e vermelho, e
como tecelões. Eram capazes de projetar e executar qualquer trabalho
artesanal”.

Toda a capacidade artística veio de Deus para construir o tabernáculo. E o padrão da


construção era divino – “Segundo tudo o que eu te mostrar para modelo no monte” Ex 25:9.
E o que havia no templo eram obras de arte a saber: Esculturas (ou imagens) figurativas de
querubins (seres das hostes celestiais) sobre a arca da aliança, figuras de querubins
bordados nas cortinas, esculturas de ouro batido de querubins para as extremidades do
propiciatório, figuras esculpidas de romãs, flores, amêndoas, no candelabro, nas hastes,
maçanetas, e na orla da sobrepeliz dos sacerdotes. Nesta última, as romãs deveriam ser azul,
púrpura, e carmesins, com campainhas de ouro no meio delas. Representações de coisas
terrenas, e ainda mais, não existem romãs azuis, esta cor para as representações seria
também uma liberdade poética e criativa na confecção da representação, como a arte
abstrata.

No Tabernáculo idealizado por Deus, dado como projeto a Davi (1Cr 28:19), e executado
por Salomão (1Cr 28:11-12) encontramos querubins entalhados em alto e baixo relevo nas
paredes do templo que eram recobertos de madeira nobre; pedras preciosas ornamentando
as paredes do templo – estas sem nenhuma função utilitária (2Cr 3:6), apenas decorativa,
ornamental; portas, paredes, umbrais, traves, e toda a sala recoberta com ouro e querubins
lavrados nas paredes (2Cr 3:7 e 10); cadeias sobre colunas e cem romãs sobre elas; duas
colunas, uma a direita e outra a esquerda da entrada do templo com capitéis de romãs
pressas por correntes – estas não sustentavam peso algum, estavam lá apenas por
ornamento arquitetônico, estética; um altar de fundição (que na verdade era uma piscina ou
banheira) com aproximados quatro metros de diâmetro, sustentada por figuras de colocíntidas
(planta medicinal ou venenosa), um mar de fundição e doze bois (um grupo de três apontando
para cada um dos quatro lados) nos quais o mar se apoiava e cujas partes posteriores
convergiam para dentro deles (2Cr 4; leões, bois, e querubins sobre almofadas (1Rs 7:29);
palmeiras e flores abertas entalhadas junto a querubins em volta de todas as paredes da casa
e nas divisões interiores e exteriores (1Rs 6:29) – nesse caso temos arte figurativa
natural/terena junto a uma representação figurativa de algo celestial; dentre ainda outros
elementos.

Mas não só arte religiosa, em 1 Reis 10:18-20 encontramos uma representação de arte
secular não condenada por Deus, um trono de marfim coberto com ouro puríssimo, com seis
degraus, com um alto espadar, braços dos dois lados e leões junto aos braços. Doze leões
sobre os degraus, um em cada extremidade. O texto completa: “Nunca se fizera obra
semelhante em nenhum dos reinos”. E neste caso, citou uma obra de arte como ilustração
para a sua crucificação futura. A escultura da serpente fora ordenada por Deus, e foi destruída
não porque era uma escultura ou obra de arte, mas porque o sentido original de sua
construção fora confundido, e o povo passou a adorá-la.

Jesus em centro momento cita uma obra de arte realizada com finalidade utilitária em Israel
(Jo 3:14-15), a serpente erguida sobre uma haste em Israel, quando o povo ainda estava no
deserto (Nm 21-8).

Deus ainda faz uso nas escrituras de gêneros literários diversos, dentre eles a poesia.
E não apenas a poesia de exaltação divina, como se lê nos salmos e provérbios, por
exemplo, mas abre concessão a uma poesia de valor secular, terreno, uma ode de amor
entre um homem e uma mulher escrita no livro de Cantares (que por mais que se possa
fazer uma relação entre Cristo e a igreja, trata-se de um poema de entre um casal de
que se amava). Davi escreveu um salmo, uma ode, homenageando a Saul e ao seu
amigo Jônatas como heróis nacionais (2Sm 1:19-27); Os salmos de Davi foram
inspirados pelo Espírito Santo (2Sm 23:1-2), e Davi ainda fora confirmado como profeta
(At 2:25-31).

Em se tratando do termo “arte” de maneira mais ampliada, entendendo-o como modo


perfeito, sublime, excelente, apreciável de se fazer algo, a vida do cristão deve ser uma
obra de arte ofertada como presente, e motivo de apreciação para alegria e deleite do
Senhor Deus. Francis A. Schaeffer contribui:

“Nenhuma obra de arte é mais importante do que a vida do próprio cristão e,


nesse sentido, todo Cristão é chamado a ser um artista. Pode não ter qualquer dom
de criatividade no que se refere à maneira como leva a sua vida. Nesse sentido, a vida
Cristã deve ser algo verdadeiro e belo em meio a um mundo perdido e
mergulhado em desespero.” (SCHAEFFER, 2010, p.63)

A criatividade é algo dado a todo ser humano, uma faculdade divina ofertada ao
homem. Contrapondo a frase citada, é impossível que alguém não possua este talento,
pois dele depende cognitivamente toda a forma de compreensão e aquisição de
conhecimento, aprendizado e desenvolvimento. Mesmo no modo mais simples, como
no desafio dos primeiros passos de um bebê, esta característica (a criatividade) já se
manifesta. Como todo talento, esta deve ser estimulada e desenvolvida – trabalhada.

Para Ruth C. Haycook:

“A criatividade envolve o poder de escolha; dentro de certos limites, constitui


uma indicação de liberdade. A queda do ser humano feriu esta faculdade, refletiu
sobre a natureza e limitou o ser humano. As diversas aptidões criativas do ser
humano demonstram sua singularidade de cada pessoa”. No entanto: “A
criatividade humana e sua capacidade de apreciar a criatividade de outros são
afetadas pelo pecado”. E sendo assim: “Ao contrário da criação divina, a criatividade
humana é limitada. A- limita-se a trabalhar com aquilo que Deus já criou. 2- Limita-se a
criar coisas que, por si mesmas não têm capacidade criativa”. (HAYCOCK, Ruth C.
Enciclopédia das Verdades Bíblicas – Fundamentos para o currículo escolar cristão.
ACSI Publications, 1993, edição 2003, p.338)

Poetizando, LeRoy apresenta a seguinte pensamento:

“Em menor escala, as mãos humanas criativas imitam essa profusão de Deus, indo
além dos requisitos mínimos para se realizar uma determinada tarefa. As mãos
criativas não se contentam em espalhar a cobertura sobre o bolo; devem fazer um
arranjo estético, formando ondas e usando cores. Não aplicam simplesmente uma
demão de verniz; lustram a superfície até que brilhe como cetim. As mãos criativas
fazem mais do que plantar sementes; dispõem-nas de modo a criar um jardim
bonito e agradável”. (KOOPMAN, LeRoy.Fonte Desconhecida)

Infelizmente o homem perdeu muito de sua capacidade criativa, Schaeffer citando Francis
Bacon – Filósofo inglês pai da ciência moderna - apresenta a seguinte citação:

“Na queda o ser humano perdeu ao mesmo tempo o estado de inocência e o


domínio sobre a natureza. Entretanto, ambas as perdas podem, até certo ponto, ser
reparadas ainda nesta vida; a primeira, por meio da religião e da fé; a segunda, pela
arte e pela ciência”. (SCHAEFFER, 2010, p.19)
Neste ponto pode-se concordar com Bacon, posto que a arte, historicamente, serviu a
humanidade também com objeto de comunicação, transmissão de conhecimento e
agente social. Sendo ainda veículo pedagógico/educacional. Transmitindo valores
culturais como normas e práticas de culto, vida civil, social, jurídica; a história de um
povo ou de alguém notório; mitos e lendas; registros de guerra; e registros pessoais. A
arte influencia e direciona o meio em que se inscreve, pois estimula aqueles que se
relacionam com ela. Percebesse isto desde a antiguidade e muito mais no período
contemporâneo, onde a difusão e leitura de imagens estão como competência sine qua non
para uma perfeita prática social/civil.
A transmissão pedagógica do conhecimento, e a utilização da arte para este fim,
podem ser encontrados em praticamente todos os povos antigos indo até aos
modernos: babilônicos, nipônicos, aborígenes, egípcios, hindus, gregos, romanos,
muçulmanos, judeus, dentre outros.
Na história do cristianismo não e diferente, a exemplo se pode citar:
  
1.Séc XI ao XIII - Quando Constantino pretendeu instituir o cristianismo como religião oficial do
império romano a partir de Bizâncio (mais tarde chamada Constantinopla, e atual Istambul),
ele encomendou o cunho de um movimento artístico para construção das catedrais e
igrejas, aspectos arquitetônicos e decorativos, confecção de murais em mosaicos e
vitrais, pinturas de parede e teto com representações de cenas religiosas em pinturas
de afrescos com folhas de ouro, imagens de esculpidas e oratórios. Para tal cruzou
referências de tapeçarias e mosaicos muçulmanos, com uma evolução da pintura romana e
helênica. Todo esse esforço tinha um propósito, funcionar como imagens didáticas para que o
povo compreendesse e aprendesse a nova religião do império. A igreja católica nasceu com
uma arte não para adoração, mas para constituir beleza e finalidade pedagógica.

2.Séc I ao XIII - Os discípulos posteriores de Jesus se espalharam pelo mundo conhecido, como
se lê em atos. Para transmitir o ensino do cristianismo em Roma, realizavam reuniões nas
catacumbas sob a cidade para fugir das perseguições. Para transmitir os conhecimentos,
realizavam pinturas nas paredes de cenas bíblicas para ilustrar e fixar os saberes. Estas
pinturas continham também um caráter pedagógico e estão presentes ainda hoje nestes
locais. São denominadas como arte paleocristã.

3.Séc XIV e XV - Na idade média as iluminuras e pinturas nos mosteiros cumpriam o papel de
ilustrar o conhecimento não apenas cristão, mas filosófico. Fato que se estende pelo período
barroco.

4.Séc XVI e XVII - No período barroco, para fazer oposição, enfrentar a reforma protestante,
trazer novamente os fiéis perdidos e manter os que permaneceram, a igreja católica planejou
um grande ato artístico com a função de cativar o povo por meio de sedução estética. Tratou-
se do movimento barroco, que se libertou dos valores estéticos renascentistas e postulou
estruturas de criação e composição diferenciadas. Elaborou projetos arquitetônicos de suas
igrejas em referência ao tabernáculo de Davi, projetou esculturas, pinturas, formas de culto e
práticas que penetravam e atingiam a sensibilidade do espectador pelos canais sensíveis
para arraigar os valores religiosos que acreditavam. A esse período seguiu-se o movimento
Rococó, também de grande suntuosidade com inúmeras aproximações estéticas (na verdade
uma transformação, ou em certo modo,“extensão evolutiva” do movimento anterior.

    Desde então, o protestantismo (os evangélicos), pelo entendimento desfocado dos


textos bíblicos como já citado anteriormente, tem desprezado o conhecimento e
produção de arte. A igreja (leia-se os cristãos) possui a responsabilidade de reinar para
Cristo na terra, e esse reino e influência deve alcançar toda a terra em todas as esferas
da sociedade, inclusive a artística.

“O senhorio de Cristo sobre a vida como um todo significa que não há áreas
platônicas no cristianismo, nem dicotomia ou hierarquia entre corpo e alma.
Deus fez tanto o corpo como a alma, e a redenção é para o homem todo. Os
evangélicos têm sido criticados, com razão, por estarem sempre tão
interessados em ver almas sendo salvas e indo para o céu, e não se importam
muito com as pessoas de maneira integral” (SCHAEFFER, 2010, p16.)

E ainda:

“A verdadeira espiritualidade significa o senhorio de Cristo sobre o homem


todo”.(SCHAEFFER, 2010, p.17)

    O ser humano foi redimido para ser a expressão de Jesus na terra, em todos os níveis da
vida. Entendimento que não despreza o valor artístico e as relações culturais. Um
contrassenso percebido na elaboração e construção de nossos templos, rígidos, frios,
repletos de fiação, caixas de som, espaços para ventilação e nenhum trabalho arquitetônico
de cunho artístico. Quando muito uma pintura repetida e figurativa ao fundo do altar com uma
cena de natureza, uma Bíblia aberta, uma pomba e um versículo justificando o propósito da
pintura. Muito pouco – para não dizer simplesmente nada – para quem pretende mudar
influenciar uma sociedade.
    O Cristão é integralmente cristão, do contrário não pode ser Cristão. Sua criação
fatalmente deve refletir o que ele é, pois não poderá se contradisser se for sincero.  Assim
sendo, sua obra será uma obra cristã não pelo que se faz (poderia até mesmo ser uma
pintura abstrata contendo simplesmente manchas de tinta), o que caracteriza um trabalho
artístico como cristão é a vida de quem o faz. Determinada obra é cristã por ser feita por
um sujeito cristão. Schaeffer nos trás:
  
“Criamos a partir de uma cosmovisão, e é nossa responsabilidade alinhar este
ponto de vista com as escrituras antes de seguirmos adiante.”
É possível, portanto, cumprir a grande comissão de cristo, levar o evangelho ao todo o
mundo e a toda a criatura (Mc 16:15), através da arte. Algo que se nota através da música,
e em muito menor escala através do teatro e dança. Mas de maneira nula em se tratando de
artes plásticas. Sendo a arte também utilizada aqui como agende de transformação cultural e
intelectual.

A arte é sempre um reflexo do social. Isto porque a arte é produzida por um sujeito
histórico; dentro de um contexto histórico; sob referenciais históricos, a saber, os referenciais
do sujeito que produziu a obra. Porque não podem ser referenciais anteriores ao período do
produtor da obra? Porque o produtor da obra precisaria estar na época de seus referenciais,
ele pode sim se pautar por referências passadas, mas ainda sim seria uma arte
contemporânea a ele, porque o produtor da obra fatalmente lerá o passado sob a ótica de seu
tempo, que é o período que o formou como sujeito. É uma questão de paradigma, e é
exatamente por isso que podemos conhecer outras culturas; hábitos; estatutos culturais,
políticos, sociais, religiosos, jurídicos, e artísticos de outros povos através de sua arte, ou da
história de sua arte. Pelo fato da arte se tratar de um produto e documento histórico.
Para Amanda Coomaraswamy, a arte reflete exatamente os valores fundamentais de uma
sociedade, abrigando saberes intrínsecos sobre ela. Esses valores não se dissociam de
seus produtos, e podem ser encontrados, decodificados e lidos nele. Denunciando mais uma
vez a qualidade documental da arte e seus produtos.

“Aquilo que é, de fato, produzido numa sociedade é a chave para a idéia


fundamental do que vem a ser o propósito de vida daquela sociedade...”(Amanda
Coomaraswany, Christian and Oriental Philosophy of Art– N.Y.: Dover Publications),
p.27)

Portanto não podemos tratar nossas produções artísticas como meros utilitários e produtos de
terapia. O valor da arte cristã deve ser resgatado a serviço do reino.

“Em nossa visão tradicional da arte, na arte popular, na cristã e na oriental, não existe
uma diferença essencial entre a bela arte, ou seja, aquela que não é funcional e o
artesanato utilitário. Não há distinção em princípio entre o orador e o carpinteiro, mas
apenas uma distinção entre as coisas feitas com habilidade e esmero e as coisas que
não são confeccionadas desse modo e entre o que é belo e o que é feio...”.(Ibdem)
Daniel do Carmo

ALGUMAS REFERÊNCIAS BÍBLICAS:

A. A primeira obra de arte de Deus está no início da bíblia, a própria criação. Gn1:2; 2:8-9, Sl
135:6; 139:14; Jo 1:3; Cl 1:16-17.

B. Deus ao completar seu trabalho criativo o avalia. Gn 1:4,10,12,18,21,25,31.


C. O amor de Deus pelo homem e sua verdade são comunicados através da criação. Êxodo
31:18; 32:15-16; Sl 19:1-3; 145:10; 148:5; Is 40:26; Rm1:20.

D. Criação: Fonte de prazer e instrução. Gn15:5; 32:12; Jó 12:7-10; Sl 8:3-4; 19:1-6; Pv 6:6-
8; 30:24-28

E. O homem foi criado com capacidade de apreciar e produzir coisas belas. Gn1:27; 2:9;
4:21-22; Ex 25-28; 25:8-9.

F. Aptidões criativas dadas ao homem por Deus. Ex 28:3; 31:1-16; 35:30-35; 36:1-2; 1Rs
4:29-34

G. Criatividade humana ressaltada por Deus. Gn 4:17-22

H. Criações do homem como expressões de seus sentimentos e pensamentos. Pv 4:23; Mt


12:33-35; 15:19; 23:25-28

I. Limite da criatividade humana. Gn 3:7; 2:8-9; 2:18-19; Jó 38:1; 4-7, 19-23, 28-32;
39:13,26,27; 40:15-19; 42:4

J. Criatividade como poder de escolha e indicação de liberdade. Em Gênesis Deus fez


escolhas: Gn1:3,6,9,11,20,24,26; Noé fez uma escolha Gn 6:13-15; 22 Em Êxodo Moisés
e o povo de Israel fizeram uma escolha Ex 25:’1,8,9; 39:42-43 Salomão 1Rs 5:5

K. Criatividade humana e apreciação do belo afetadas pelo pecado. Rm 1:18-20; 1:21-24;


1:28-32; Ef 2:3; 2Pedro 3:5; 2Reis 16:10-12

L. Compreendendo a Deus através das obras criadas por Ele – o artista expresso na obra. Jó
37:14; 38:41; 40:1-5; 42:2-6; Sl 8:3-4; 19:1-6; 104:24-34 Rm 1:20; Mt 6:28-30.

<http://ccbharte7.blogspot.com.br/p/a-arte-e-biblia.html?m=1> Acesso em 21/abr/2018.

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