Você está na página 1de 16

PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.

1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641


24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

AUTOS Nº 0073469-94.2015.8.16.0014
PROCEDIMENTO COMUM
AUTORA:
MARIA LIZONETE CARDOSO DOS SANTOS
RÉ:
CREFISA S/A

I – Relatório:

A parte autora nominada e qualificada na exordial,


ajuizou esta AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE
NEGÓCIO JURÍDICO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS e REPETIÇÃO DE INDÉBITO em desfavor da parte ré,
também já qualificada, alegando em síntese que:

a) a autora, apesar de maior de idade, é incapaz


devido a uma enfermidade mental (esquizofrenia), fazendo
tratamentos psiquiátricos desde 1995;

b) foi a ela concedido um benefício de prestação


continuada, mas constatou-se que entre abril de 2008 e novembro de
2011, foram contratados onze empréstimos, tendo havido
pagamentos à autora que chegaram a R$ 21.359,89;

c) os contratos são nulos, nos termos do art. 166,


inciso I do Cód. Civil, o que deve ser reconhecido pelo Juízo.

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 1/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

Pugnou pelo reconhecimento da nulidade dos


negócios jurídicos, com ordem de restituição dos valores pagos, no
montante de R$ 21.359,89, mais indenização por danos morais no
importe de R$ 50.000,00, além dos ônus da sucumbência.

Foram deferidos benefícios da Assistência Judiciária


Gratuita (mov. 15.1).

A parte ré foi citada e apresentou contestação (mov.


25.1), na qual aduziu, em síntese, que:

a) deve ser indeferida a petição inicial, por falta de


documentos indispensáveis à propositura da ação, tendo em vista que
juntada apenas uma nomeação de curadora provisória;

b) prescrição, nos termos do art. 206, parágrafo 3º,


inciso V do Código Civil, e uma vez que os contratos questionados
foram celebrados em 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014;

c) foram pagas parcelas de vários contratos e alguns


deles estão quitados, e cobrou apenas os valores devidos por
contratos que efetivamente foram celebrados, ou seja, a autora
usufruiu o montante emprestado;

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 2/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

d) não ultrapassou limite de 30% posto que seria


para desconto em folha, e isto não ocorre no caso, pois seria para
desconto em conta corrente;

e) dos laudos médicos extrai-se que a autora não


está impedida ou interditada, não havendo que se falar em nulidade,
não havendo publicidade quanto a interdição que exigisse
providências ou cautelas da ré;

f) não agiu de forma ilícita, e não há motivo para


ser condenada ao pagamento de indenização por danos morais;

g) não havendo cobranças indevidas, não deve ser


condenada a restituir valores.

A parte autora impugnou a contestação, ratificando


seus pleitos iniciais (mov. 28.1).

Ministério Público opinou pela instrução do


processo (mov. 47.1).

O processo foi saneado, ocasião em que rejeitadas


as preliminares, postergada a análise da prescrição, fixados os pontos
controvertidos e deferidas as provas a serem produzidas (mov. 52.1).

O laudo pericial foi finalmente juntado (mov.


387.1) e houve manifestação das partes (mov. 392.1 e 395.1).

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 3/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

O Ministério Público afirmou ser desnecessária


prova oral (mov. 412.1), e apresentou parecer de mérito opinando
pelo acolhimento parcial dos pedidos (mov. 425.1).

O processo veio concluso para sentença.

II – Fundamentação:

Trata-se de ação ordinária, por meio da qual a parte


autora pretende reconhecimento de nulidade (ação é de declaração e
não de decretação de nulidade), restituição de valores pagos e
indenização por danos morais, sob argumento de que os diversos
contratos foram celebrados por pessoa absolutamente incapaz.

A preliminar de inépcia da inicial já foi rejeitada na


decisão de saneamento.

Não merece acolhimento a questão prejudicial de


mérito consistente na prescrição.

A uma, porque o pleito é de nulidade de contratos e


a nulidade não prescreve jamais.

A duas, porque ainda que se possa falar de prazo


prescricional para indenização ou mesmo repetição de indébito, a

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 4/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

prescrição não flui contra incapazes, conforme dicção do art. 198,


inciso I do Código Civil.

A incapacidade é uma situação fática, que não se


confunde com o reconhecimento judicial dela.

A autora já apresentava sintomas de doença


psiquiátrica desde 1996, conforme laudos e documentos médicos
juntados no processo.

A perícia médica realizada no processo confirmou


essa incapacidade para os atos da vida civil.

Assim, o prazo prescricional, em face dela, não fluiu


até que tivesse efetivamente uma representante legal.

A nomeação de curadora judicial provisória


somente ocorreu em 13 de maio de 2015, e no mesmo ano proposta a
ação, pelo que não se implementou o prazo prescricional.

Passo ao exame do mérito.

O cerne da questão é saber se é possível reconhecer


invalidade de negócios jurídicos celebrados antes da sentença de
interdição.

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 5/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

Nem o Código Civil Brasileiro de 2002, nem o


Estatuto da Pessoa com Deficiência respondem a tal questionamento
de forma satisfatória.

Para alguns, a sentença de interdição é constitutiva


(Santos, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil,
1994, p. 33/34), e seus efeitos, por óbvio, para esta corrente, seriam
“ex nunc” (STJ REsp. 1251728/PE, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, 3ª Turma).

Para outros, a sentença tem natureza declaratória, e,


para essa corrente, a ausência de interdição não é motivo suficiente
para impedir o reconhecimento da incapacidade para os atos da vida
civil (nesse sentido STJ, AgInt no AREsp. 675784/RJ, Min. Gurgel de
Faria, 1ª Turma).

Reputo que esta é a melhor teoria, e apesar de


inexistir regulamentação suficiente na lei brasileira, é possível
encontrar nos ordenamentos estrangeiros soluções bastante
interessantes, perfeitamente aplicáveis ao caso concreto.

O Código Civil Francês, em seu art. 503, estabelece


que os negócios poderão ser anulados se demonstrado que a causa da
interdição existia à época da celebração do negócio.

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 6/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

Em Portugal, há ampla regulamentação, que aqui


deve ser apresentada, para esclarecimento do melhor entendimento a
respeito do tema ora enfrentado.

Dispões o art. 148º: “São anuláveis os negócios


jurídicos celebrados pelo interdito depois do registo da sentença de
interdição definitiva.”

Esta primeira regra normal é semelhante ao que


vigora em nosso ordenamento. Depois da sentença de interdição, os
atos praticados pelo incapaz sem representação ou assistência do
representante legal são inválidos, e nisso não há dúvida.

Prossegue o Código Português, no seu artigo


ARTIGO 149º, que não tem similar em nosso ordenamento:

“1. São igualmente anuláveis os negócios jurídicos


celebrados pelo incapaz depois de anunciada a proposição da acção
nos termos da lei de processo, contanto que a interdição venha a ser
definitivamente decretada e se mostre que o negócio causou prejuízo
ao interdito.”

Aqui o marco é a propositura da ação de interdição.


Todo negócio praticado após a propositura da ação, desde que depois
reconhecida a interdição, pode ser anulado, mas depende da prova de
prejuízo ao interditado.

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 7/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

Por fim, estabelece o artigo 150º do Código Civil


Português, que também não tem similar no Brasil:

“Aos negócios celebrados pelo incapaz antes de


anunciada a proposição da acção é aplicável o disposto acerca da
incapacidade acidental.”

O artigo que regula tal situação da incapacidade


acidental é o 257º, que assim estabelece:

“1. A declaração negocial feita por quem, devido a


qualquer causa, se encontrava acidentalmente incapacitado de
entender o sentido dela ou não tinha o livre exercício da sua vontade
é anulável, desde que o facto seja notório ou conhecido do
declaratário. 2. O facto é notório, quando uma pessoa de normal
diligência o teria podido notar.”

O que se exige, aqui, é a análise da boa-fé objetiva,


ou seja, é possível invalidar o negócio, mas desde que a incapacidade
seja notória ou seja conhecida do declaratário (pessoa que negociou
com o incapaz.

Tais regras exigem uma maior atuação do Juiz na


aferição das condições e circunstâncias específicas do caso concreto.

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 8/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

No caso em exame, a parte autora afirma que a


incapacidade se iniciou em 1990, bem antes dos contratos celebrados
com a parte ré (mov. 1.20 a 1.30), posto que o primeiro é de 2008.

Bem anotou o digno Representante do Ministério


Público, Janderson Camões de Carvalho Iassaka, no parecer juntado
no mov. 425.1, que no mov. 1.10, já consta uma declaração médica
data de 28 de agosto de 2007, firmada pelo psiquiatra do CAPS
(Centro de Atenção Psicossocial) do Município de Londrina,
informando que a autora estava em acompanhamento psiquiátrico
desde o ano de 1995, com histórico anterior de sintomas psiquiátricos
e que necessitava de “cuidados constantes sem condições de fazê-lo
sozinha”.

Uma declaração médica de 2015, também juntada


com a inicial (mov. 1.11) firmada por outra profissional médica
psiquiatra do CAPS, relatava história de várias internações
psiquiátricas anteriores, com incapacidade de gerir atividade da vida
civil.

Há anotações bem referidas pelo digno Agente


Ministerial - no parecer antes já citado – de que as equipes de
atendimento relataram em prontuários quadro de delírios (mov. 1.12,
p. 10, 1.15, p. 21), pensamento desorganizado e frases fora do
contexto, desconexa, agitação motora (mov. 1.12, p. 12),

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 9/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

comportamentos inadequados (mov. 1.12., p. 20), tudo a demonstrar


a precariedade da saúde mental da autora já há vários anos atrás.

Por certo, essas situações eram facilmente


perceptíveis, pelo que a representante da ré que obteve os contratos
(certamente para ganhar comissões), deveria ou poderia ter percebido
essa ausência de condições dela praticar atos da vida civil sozinha,
posto que o diagnóstico da autora indica esquizofrenia.

Determinada a perícia neste processo, a Perita


Judicial relatou que “o quadro psicopatológico da periciada é a
justificativa psiquiátrica para suas incapacidades”, e que ela é incapaz
de realizar atos complexos da vida civil (mov. 387).

Se a autora não possuía capacidade de


discernimento, logicamente os negócios que ela praticou sem
representante legal são inválidos, na modalidade de nulidade, posto
que o artigo 3º do Código Civil estabelecia a incapacidade absoluta,
isto até 2016, com advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Todos os contratos foram celebrados na vigência


da antiga redação do artigo 3º do Código Civil, e por isso, como bem
anotou o Promotor de Justiça que atua no processo, há nulidade
absoluta, nos termos do art. 166, inciso I do Código Civil, que pode

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 10/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

ser reconhecida a qualquer tempo (art. 169 do Código Civil) e até


mesmo de ofício, caso não fosse suscitada a questão neste processo.

Resta apenas examinar as consequências desta


declaração de nulidade.

A parte autora pugnou pela indenização por danos


morais e mais repetição de indébito por aquilo que teria sido dela
cobrado indevidamente.

Em se tratando de nulidade de negócios jurídicos,


em regra o nulo não produz efeitos, e as partes devem retornar ao
estado anterior ao negócio, conforme art. 182 do Código Civil. Na
lição de Carlos Roberto Gonçalves:

“O ato nulo não produz nenhum efeito (quod nullum est


nullum producit effectum). O pronunciamento judicial de
nulidade produz efeitos ex tunc, isto é, desde o momento da
emissão da vontade (natureza declaratória)” (Direito Civil
Brasileiro, Vol 1. Parte Geral, São Paulo: Saraiva, 2008, p.
439).

Entretanto, o caso aqui se refere a empréstimos


bancários, e inegavelmente a autora recebeu o valor dos créditos e os
utilizou, bem ou mal, e não poderia simplesmente deixar de restituir

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 11/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

valores porque o contrato é nulo, sob pena de enriquecimento sem


causa, que também é rechaçado por nosso ordenamento jurídico.

A consequência lógica é que a parte ré não pode


continuar cobrando parcelas em aberto, mas, inegavelmente,
conforme lição de Fábio Ulhoa Coelho (, citado pelo Digno
Representante do Ministério Público, “os direitos transitados devem
percorrer o caminho de volta, de modo que se restabeleça a situação
patrimonial imediatamente anterior ao negócio”.

Isto implica em dizer que a autora deve restituir na


integralidade o valor nominal do capital mutuado, compensando-se
pagamentos que realizou com valores nominais emprestados, e
pagando eventual saldo devedor que sobejar.

A parte ré não poderá exigir, por decorrência lógica


e óbvia da nulidade, os encargos remuneratórios e de mora previstos
nos contratos, posto que aqui reconhecidos inválidos, diante da
incapacidade que a autora já possuía.

Bem asseverou o digno Agente do Ministério


Público em seu parecer (mov. 425.1):

“Portanto, não é possível a restituição integral, à autora, dos


pagamentos descontados na conta em que recebe seu
benefício assistencial, eis que ela deve restituir à demandada

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 12/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

o numerário que recebeu quando realizados os


empréstimos. Da dívida em questão devem ser abatidos em
razão da nulidade do negócio jurídico, os encargos
contratados, a exemplo de juros remuneratórios,
capitalização de juros e comissão de permanência. Por não
ser possível nesta fase processual a apuração da quantia
líquida a ser compensada entre os créditos das partes, a
questão deverá ser resolvida em liquidação de sentença
(CPC, arts. 509 e 511)”.

A autora somente terá direito a repetição de


indébito se os pagamentos superarem os valores recebidos nos
empréstimos, o que será averiguado em liquidação de sentença, e,
ainda assim, de forma simples, não se evidenciando presentes os
motivos do art. 42 do Cód. de Defesa do Consumidor, até porque a
parte tinha direito de exigir os pagamentos enquanto não houve o
reconhecimento da incapacidade, o que se dá somente neste
momento desta sentença.

Por derradeiro, reputo que também não procede,


pelas mesmas razões, o pedido de indenização por danos morais.

A parte ré não efetuou cobranças indevidas, apenas


o que tinha previsto em contrato, e, repita-se, apenas agora tais
negócios jurídicos são definidos como inválidos.

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 13/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

Houve apenas descontos normais de parcelas


previstas nos empréstimos (por valores que a autora recebeu, diga-se
de passagem), e não havia registro de interdição, e diante disso, não
há que se falar que a conduta foi inequivocamente abusiva.

Ademais, se desfeito o negócio e restituídas as


partes ao “status quo ante”, não há que se falar em abusos e nem
ilícitos, muito menos em prejuízos à parte autora, a justificarem
desgostos capazes de caracterizarem danos morais.

III- Dispositivo:
Diante do exposto e pelo que mais consta do
processo, resolvendo-o com análise do mérito, nos termos do art.
487, inciso I do Código de Processo Civil, julgo parcialmente
procedentes os pedidos formulados por MARIA LIZONETE
CARDOSO DOS SANTOS nesta AÇÃO DE NULIDADE DE
NEGÓCIO JURÍDICO cumulada com INDENIZAÇÃO e
REPETIÇÃO DE INDÉBITO movida em face de CREFISA S/A
e, em consequência, rejeitando o pleito de indenização por danos
morais:
a) reconheço e declaro a nulidade de todos os
contratos de mútuos que a autora celebrou, enquanto incapaz, junto à
parte ré, conforme cópias nos mov. 1.20 a 1.30, nos termos do art.

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 14/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

166, inciso I do Código Civil, determinando o retorno das partes ao


estado anterior aos referidos contratos, inclusive reconhecendo o
dever da autora restituir os numerários que recebeu emprestado (para
evitar enriquecimento sem causa), mas afastando direito de a ré
cobrar os encargos previstos nos contratos cuja invalidade ora é
reconhecida, notadamente juros remuneratórios lá previstos,
capitalização de juros, comissão de permanência e outros encargos de
mora;
b) determino recálculo em liquidação de sentença,
considerando os valores quitados, para apurar se há ainda algum saldo
em favor da autora, e se houver, condeno a parte ré a restituir esse
montante à parte autora, de forma simples e não dobrada, sobre o
qual deverá incidir correção monetária desde a propositura da ação,
pela média entre o INPC e IGP-DI, e mais juros de mora de 1% (um
por cento) ao mês desde a citação neste processo, tudo a ser apurado
em liquidação de sentença, por mero cálculo aritmético.
Tendo em vista a sucumbência recíproca de cada
parte, de igual importância, condeno a parte autora ao pagamento de
metade e a parte ré ao pagamento da outra metade das custas e
despesas processuais, bem como cada parte ao pagamento de
honorários advocatícios em favor do patrono da respectiva parte
adversa, nas mesmas proporções (50% para cada um), que deverão
ser calculadas sobre o montante total que ora arbitro em 12% (doze

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 15/16


PROJUDI - Processo: 0073469-94.2015.8.16.0014 - Ref. mov. 432.1 - Assinado digitalmente por Alberto Junior Veloso:8641
24/10/2019: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: sentença - parcial procedência

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE
Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJVQ3 WKCYH S9MEY NVY6U
COMARCA DE LONDRINA - 5ª VARA CÍVEL

por cento) do valor atualizado da causa, conforme disposto no art. 85,


§2º, do CPC, tendo em vista o grau de zelo dos profissionais, a
mediana complexidade da lide e o relativo tempo nela despendido.
Considerando, todavia, que a parte autora é
beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita, suspendo a cobrança
de sua quota parte do ônus da sucumbência, nos termos do artigo 98,
§3º do CPC.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Londrina, 24 de outubro de 2019.
Alberto Junior Veloso - Juiz de Direito

Alberto jr. Veloso - juiz de direito fls. 16/16

Você também pode gostar