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Se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o justo.

E Ele próprio é a
propiciação pelos nossos pecados. (1Jo 2:1–2)

Hoje, amados irmãos, vocês se arrependerão. Eu gostaria de incutir em vocês, pois é o meu dever
como pastor, o que se espera da pessoa que vem à Confissão, para que a Confissão dela seja
verdadeira, agradável a Deus e traga a salvação à alma dela, a saber, o que se exige de uma pessoa
penitente é a compunção pelo seu pecado, a intenção de corrigir a sua vida, a fé em Cristo e a
esperança na Sua misericórdia.

E assim, antes de tudo, é necessário sentir compunção pelos seus pecados. Porém, isso é algo que
nós como padres confessores não vemos nos nossos filhos espirituais.

Muitas pessoas vêm à Confissão com total indiferença na alma, e, se não lhes perguntamos nada,
elas também não dizem nada, ou falam de maneira muito geral a respeito de como são “pecadoras,
pai espiritual, tendo cometido todos os pecados”. Se ao menos elas dissessem isso reconhecendo
sinceramente a culpa, mas não; e, o que é pior, elas dizem isso sem nenhuma consciência dos seus
pecados, e muitas vezes agem assim para que a Confissão acabe rápido. Amados! Não façamos da
obra de extrema misericórdia de Deus para conosco, pecadores, uma ocasião para a ira de Deus.
Por que somos tão insensíveis?! Não temos nada do que nos arrependermos durante a Confissão?!
Não apenas somos pecadores, como, mesmo se passássemos a vida inteira lamentando os nossos
pecados, isso não seria nada de especial, mas só o que de fato deveríamos fazer. Ah! Se algum de
nós dissesse que não tem pecados, estaria enganando a si mesmo, e procurar a verdade nele seria
inútil.

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Você não consegue enxergar os seus pecados? Ore a Deus, para que Ele lhe conceda enxergá-los;
não foi em vão que você repetiu muitas vezes depois do padre na igreja: Senhor! Concede-me
enxergar minhas falhas! Que pelo menos agora, através do nosso esforço conjunto, tentemos
enxergar os nossos pecados de modo que depois, durante a Confissão, confessemo-los com uma
compunção sincera. E assim, o nosso primeiro e mais importante pecado é que nós, sendo grandes
pecadores, não sentimos que somos pecadores, que merecemos não a misericórdia de Deus, mas o
Seu castigo! Antes de tudo, condenemo-nos por essa insensibilidade e digamos ao Senhor com toda
a nossa alma: Senhor e Mestre da minha vida, sou um pecador insensível, sou o maior dos pecadores
e não consigo sentir meus pecados; deve ser porque meus pecados se multiplicam mais que os
grãos de areia e estou completamente cheio de pecados, como uma pessoa enferma com varíola.
Eu me arrependo diante de Ti, meu Senhor e meu Deus, da minha insensibilidade com todo o meu
coração, e oro a Ti: permite-me sentir com todo o meu coração o quanto eu irei e continuo irando a
Ti. Ah! Essa nossa justiça imaginária, farisaica, o quanto ela arruinou e continua a arruinar as
pessoas! E para a nossa ruína ela atinge o nosso coração principalmente durante a hora da
preparação, bem durante o ato da Confissão, e antes do Mistério da Santa Comunhão.

Mas examinemos mais profundamente: que pecados cometemos contra Deus, sobretudo? Se
somos pessoas incrédulas, se vivemos aqui na terra não para o céu, nem para Deus, nem para a
nossa salvação, mas para a terra e os seus prazeres, ou seja, se vivemos para a carne e sua
satisfação, e não para a nossa alma eterna, não para a sua vida futura, isso não é um grande pecado?
O que houve? Será que nos esquecemos de como o nosso Senhor Jesus Cristo sofreu por nós, de
como Ele derramou o Seu Puríssimo Sangue na cruz e de como ressuscitou em glória?! Será que Ele
não fez isso por nós, para nos elevar ao céu? Sua vinda à terra, Seus ensinamentos divinos, Seus
milagres, Suas profecias, por exemplo, quanto ao terrível juízo futuro, à ressurreição dos mortos no
último dia, à bem-aventurança que aguarda os justos e aos tormentos eternos que aguardam os
pecadores, será que não foram todos pra nós? Por fim, Seu sofrimento, Sua ressurreição dos mortos
e Sua ascensão ao céu, será que não aconteceram por nós?

Portanto, se é verdade que devemos viver aqui na terra para a vida do século futuro, não é pecado,
então, viver não para aquela vida, mas sim viver aqui na terra com todo o nosso coração e os nossos
pensamentos voltados para o que é da terra? E quantos pecados nascem do fato de que queremos
viver bem na terra e não cremos de todo o coração na vida futura e bem-aventurada? Quanta
maldade, ódio, ganância, avareza e falsidade nascem disso? Disso nascem todos os vícios, todas as
cobiças carnais, todas as paixões da alma. Arrependamo-nos também disso, ou seja, arrependamo-
nos do fato de que nos falta fé, se é que não somos totalmente incrédulos, e de que ou não vivemos
aqui para Deus e para a salvação da nossa alma, ou vivemos muito pouco. Arrependamo-nos
também por haver nos nossos corações muito pouca, se é que há alguma, esperança da vida futura.
Também sofremos do grande pecado da ingratidão a Deus, da falta de amor a Ele por Suas inúmeras
e indescritíveis misericórdias. Acho que todas as pessoas vêem isso em si mesmas de vez em
quando.

Vejam, todos vocês que são capazes de andar, que são saudáveis física e espiritualmente, dotados
de intelecto e de livre arbítrio por Deus, o Criador; o que vocês eram não muito tempo atrás? Não
eram nada; o Senhor trouxe todos vocês do não-ser para o ser, e desde então Ele deu-lhes tudo:
deu-lhes uma alma, com todas as suas faculdades; um corpo, com a sua sábia e bela disposição.
Deu-lhes e continua dando-lhes alimento para a nutrição do corpo; roupas para vesti-lo. Ele deu-
lhes um canto próprio na Sua terra, e abrigo nas suas casas; Ele os alimenta com o inestimável e
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vivificante alimento do Seu Corpo e Sangue, satisfazendo-os e consolando-os com Ele; Ele os alegra
com a Sua palavra que vocês ouvem; Ele perdoa os seus incontáveis pecados; Ele protege
constantemente as suas vidas, como uma mãe protege a vida do filho; Ele nos dá o Seu reino futuro,
e não há nada que Ele não faça por amor a nós, pecadores ingratos. É impossível numerar todas as
Suas bênçãos. E o que damos em troca do Seu amor por nós, um amor sem limites e sem medida?
Damos em troca transgressões, imoralidade, ingratidão. Portanto, arrependamo-nos, com
lágrimas, da nossa ingratidão diante de Deus, da nossa falta de amor a Ele, e também peçamos a
Ele, com lágrimas, que nos conceda o dom do amor. Bendize, ó minha alma, ao Senhor. E não te
esqueças de nenhum dos Seus benefícios (Sl 103:2).

A intenção de corrigir a vida também é necessária à pessoa penitente; preste atenção a isso. Durante
o caminho para a Confissão, diga a si mesmo: depois da Confissão, tentarei com toda a minha força
corrigir a minha vida de todos os pecados dos quais desejo me arrepender. Não me enganarei mais;
não mentirei para Deus, nem insultarei novamente o Mistério do Arrependimento. Ajuda-me,
Senhor; fortalece as potências da minha alma, Senhor! Que proveito há num arrependimento
depois do qual, sem nenhum remorso, a pessoa se entrega novamente aos mesmos pecados dos
quais ela se arrependeu? Nessas pessoas, cumpre-se o provérbio: ‘O cão volta ao próprio vômito’ e
‘a porca lavada chafurda na lama’ (2Pe 2:22).

Por fim, uma pessoa penitente também deve ter fé em Cristo e esperança na Sua misericórdia. Cada
pessoa que se aproxima da Confissão deve crer que durante o Mistério o próprio Cristo comparece
invisivelmente e recebe a Confissão dela; ela deve crer que somente Cristo pode perdoar pecados,
porque Ele, por meio do Seu sofrimento, do Seu Puríssimo Sangue e da Sua morte, obteve do Pai
Celestial o direito de nos perdoar todas as nossas transgressões sem insultar a justiça divina, e que
Ele, segundo a Sua misericórdia, está sempre pronto a perdoar todos os nossos pecados, desde que
os confessemos com uma compunção sincera, tenhamos a intenção de sermos melhor a partir de
agora e tenhamos no coração fé n’Ele. A tua fé te salvou. Vai-te em paz (Mc 5:34). Ele fala dentro de
cada pessoa que se arrepende de modo apropriado, depois de receber a absolvição do sacerdote.

Arrependamo-nos todos com corações puros; cuidemos todos de corrigir nossas vidas;
apresentemos a Deus os frutos do arrependimento. Amém.

Tradução: Fernando Xavier

Fonte: Season of Repentance: Lenten Homilies of Saint John of Kronstadt. (Holy Trinity Monastery,
2015, pp. 76-81.)

https://cristianismoortodoxo.wordpress.com/2021/03/11/homilia-sobre-o-arrependimento-
sao-joao-de-kronstadt/

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