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2234 REVISÃO REVIEW

Reconhecer Flexner: inquérito sobre produção


de mitos na educação médica no Brasil
contemporâneo

Recognizing Flexner: an inquiry into the


production of myths in medical education
in contemporary Brazil

Naomar de Almeida Filho 1

Abstract “Yet for nearly a century, Flexner has been mis-


understood. Regularly, he is both credited and
1Universidade Federal da In Brazil, there appears to be no doubt concerning blamed for things he did not do, and some of his
Bahia, Salvador, Brasil.
the evils caused by Abraham Flexner, his Report, greatest contributions remain unappreciated” 1
Correspondência and the Flexnerian Biomedical Model (FBM), (p. 195).
N. Almeida Filho conceived and promoted by private foundations
Universidade Federal da
Bahia. and linked to the U.S. health-industrial complex.
Condomínio Jardim Piatã, In this article, I submit the above proposition to a Introdução
Qd. 6, Lt. 3, Salvador, BA
rigorous critical inquiry. I begin with an overview
41650-200, Brasil.
naomarf@ufba.br of Flexner’s life and work. I then review various Neste ano de 2010, em muitos países do mun-
representations of the Flexnerian model in the do ocidental, comemora-se um século de publi-
Brazilian literature on health education, after cação do livro Medical Education in the United
which I identify inconsistencies, contradictions, States and Canada 2. Tal documento é mais co-
and omissions by comparing the original Report nhecido como Flexner Report, ou Relatório Flex-
to elements referring to the FBM. Finally, con- ner, por ter sido elaborado por Abraham Flexner,
trasting historical sources and imaginary repre- pesquisador social e educador norte-americano
sentations, I analyze possibilities for interpreting de origem judia, comissionado pela Carnegie
the FBM as an intriguing and peculiar political Foundation. No contexto anglo-saxão, iniciativas
mythology. de celebração desse evento justificam-se como
reconhecimento de que, adotado pelo General
Medical Education; Educational Models; Biogra- Education Board da Rockefeller Foundation, o
phy relatório em questão desencadeou profunda re-
forma no ensino médico na América do Norte
que, estendendo-se a outros campos de conhe-
cimento, consolidou a arquitetura curricular que
hoje predomina na rede universitária dos países
industrializados. Comemora-se igualmente o fa-
to de que o Relatório Flexner, na prática, intro-
duziu critérios de cientificidade e instituciona-
lidade para regulação da formação acadêmica e
profissional no campo da saúde 1.

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No Brasil, nem de longe se constata entusias- tura argumentativa dessa formulação demonstra
mo ou mesmo respeito perante esse marco his- excepcional consistência interna. Não parece,
tórico centenário. Há, entre nós, quase consenso portanto, haver dúvidas sobre os males causados
de que, por meio do celebrado Relatório, mas por Abraham Flexner e seu Modelo Biomédico,
também em outras obras, Flexner teria produ- concebido e promovido a mando de fundações
zido uma matriz disciplinar e pedagógica que privadas, estreitamente vinculadas ao complexo
veio a se chamar de Modelo Flexneriano (alguns médico-industrial norte-americano. Não obs-
autores chegam a falar de um paradigma bio- tante sua aparência convincente, legitimada por
médico flexneriano). Do ponto de vista concei- consenso aparentemente óbvio, politicamente
tual, reiteradamente identificam-se, no modelo correto, proponho submeter essa formulação a
flexneriano, diversos elementos (ou defeitos): um rigoroso inquérito crítico.
perspectiva exclusivamente biologicista de do- Neste artigo, destoando do coro dos conten-
ença, com negação da determinação social da tes, pretendo explorar a seguinte hipótese: o que
saúde; formação laboratorial no Ciclo Básico; se apresenta como Modelo Biomédico Flexneria-
formação clínica em hospitais; estímulo à disci- no e que, no Brasil, provoca tão intensas reações,
plinaridade, numa abordagem reducionista do não corresponde, e até contradiz, o que Abraham
conhecimento. Do ponto de vista pedagógico, Flexner pensa e escreve, no próprio Relatório Fle-
o modelo de ensino preconizado por Flexner é xner e em outras obras.
considerado massificador, passivo, hospitalo- Em primeiro lugar, apresentarei uma súmula
cêntrico, individualista e tendente à superespe- biográfica de Abraham Flexner, compreenden-
cialização, com efeitos nocivos (e até perversos) do vida, obra, pensamento e impacto no cenário
sobre a formação profissional em saúde. Do intelectual de início e meados do século XX. Em
ponto de vista da prática de saúde, dele resultam segundo, revisarei as formas de representação de
os seguintes efeitos: educação superior elitizada, Flexner e seu pensamento na literatura brasileira
subordinação do Ensino à Pesquisa, fomento à contemporânea sobre educação em saúde, a fim
mercantilização da medicina, privatização da de identificar, em detalhe e com maior consis-
atenção em saúde, controle social da prática pe- tência, pontos axiais que definiriam o suposto
las corporações profissionais. Do ponto de vista Modelo Biomédico Flexneriano. Terceiro, pre-
da organização dos serviços de saúde, o Modelo tendo testar a hipótese proposta, verificando, no
Flexneriano tem sido responsabilizado pela cri- próprio Relatório Flexner, fragmentos de textos
se de recursos humanos que, em parte, produz referenciadores de cada um dos elementos de
crônicos problemas de cobertura, qualidade e identificação do modelo de ensino dito flexne-
gestão do modelo assistencial, inviabilizando a riano, indicando inconsistências, contradições e
vigência plena de um sistema nacional de saú- omissões no contraste entre fonte historiográfica
de integrado, eficiente, justo e equânime em e representação imaginária.
nosso país. Do ponto de vista político, por ter
sido implantado no Brasil a partir da Reforma
Universitária de 1968, promovida pelo regime Quem é Flexner?
militar, tal modelo de ensino e de prática mos-
tra-se incompatível com o contexto democrático Esta seção se baseia na biografia de Flexner es-
brasileiro e com as necessidades de atenção à crita por Thomas Bonner, em 2002, baseada em
saúde de nossa população, e dele resultam sérias fontes documentais primárias, incluindo um rico
falhas estruturais do sistema de formação em epistolário com familiares, colaboradores e per-
saúde. Em suma, ao contrário da aura de herói sonalidades da época 3.
intelectual da medicina contemporânea, como Abraham Flexner (Figura 1) nasce em 1866,
querem alguns autores, Abraham Flexner deve em Louisville, Kentucky, logo após a Guerra da
ser denunciado como intelectual orgânico da Secessão. Quarto de uma prole de nove irmãos
dominação econômica, política e ideológica do numa família de imigrantes judeus alemães, tem
capitalismo imperialista, sobretudo nos campos infância muito pobre e difícil mas, desde cedo,
da educação e da saúde. destaca-se nos estudos secundários por sua inte-
Quem discordaria de análise tão clara e elo- ligência e talento. Em 1886, conclui em dois anos
qüente, precisa e articulada? A síntese apresen- um Bacharelado em Artes na Johns Hopkins Uni-
tada no parágrafo anterior a credencia como versity, com major em humanidades e estudos
posição quase pacífica de importante segmento clássicos. Durante o curso, recebe grande influ-
da inteligência crítica brasileira sobre educação ência de Daniel Gilman, Reitor daquela que se
em saúde e, por conseqüência, deve representar tornou a primeira universidade de pesquisa nos
a opinião predominante no campo da saúde co- Estados Unidos, atualizando-a com base no mo-
letiva, no momento atual. Efetivamente, a estru- delo humboldtiano.

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Figura 1 na Heidelberg University. Retorna da Europa em


1907 e escreve o que teria sido sua tese de Douto-
Abraham Flexner (1866-1959).
rado, nunca defendida na Harvard: um polêmico
estudo crítico da universidade americana, em
comparação com as instituições seculares do Ve-
lho Continente, intitulado The American College:
A Criticism.
Em 1908, Flexner é convidado por Henry S.
Pritchett, Presidente da Carnegie Foundation,
para dirigir um ambicioso programa de avalia-
ção da educação superior nos Estados Unidos,
começando pelo ensino médico, cujo primeiro
e mais conhecido resultado é o famoso Relató-
rio. Por que um professor primário do interior,
judeu, com doutorado inconcluso, sem qualquer
expressão política ou fama intelectual, é alçado à
posição de principal avaliador da educação mé-
dica num país naquele momento já pujante e em
franco desenvolvimento? Uma hipótese é que seu
irmão Simon Flexner, um dos fundadores e Dire-
tor do Rockefeller Institute for Medical Research,
já reconhecido na época como grande patologis-
ta, o teria recomendado à Carnegie Foundation
num movimento de retribuição familiar. O suces-
so de Simon devia-se ao irmão caçula Abraham
que, com duas décadas de trabalho duro como
mestre-escola, sacrificara uma carreira intelec-
tual de grande potencial, responsabilizando-se
pelos altos custos da formação médica de Simon
Flexner na Hopkins 4.
As biografias mais detalhadas dão crédito a
Em 1887, Flexner retorna à sua cidade natal uma outra versão 3. De fato, Pritchett fica impres-
para trabalhar como professor primário, inicial- sionado pela leitura do livro que Abraham publi-
mente na Louisville High School, onde havia fei- cara em 1908, citado acima, que não teve sucesso
to seus estudos secundários. Depois funda uma algum, mal vendeu uma pequena primeira edi-
escola particular de cunho experimental, orga- ção. Após conhecê-lo mais de perto numa série
nizada como uma empresa familiar. Durante 15 de entrevistas pessoais, Pritchett confirma sua
anos como mestre-escola, desenvolve métodos avaliação positiva ao aprovar o texto preliminar
pedagógicos que hoje são considerados vanguar- do projeto apresentado por Flexner.
da em termos de modelo educacional. A Flexner O sucesso do Relatório é extraordinário, com-
School é uma instituição inovadora, centrada na pensando os quase dois anos de trabalho árduo.
motivação e no cultivo das vocações, sem provas, Apenas uma indicação do impacto transforma-
sem verificação de presença, sem normas puni- dor do Relatório e seus desdobramentos: nos 100
tivas. O sucesso de Flexner é tão extraordinário anos prévios ao documento, 457 escolas médicas
que vários de seus alunos conseguem aprovação tinham sido abertas nos Estados Unidos. No iní-
nas universidades mais prestigiosas e concorri- cio do século XX, havia pouco mais de 160 em
das dos Estados Unidos. funcionamento. Flexner inclui 155 em seu rela-
Em 1905, Flexner vende sua escola que, de- tório. Com a aplicação de suas recomendações,
pois dele, não alcança qualquer registro na his- num processo que ele chama de restauração da
tória da educação. Com o lucro, inicia um dou- educação médica, muitas são fechadas; em dez
torado na Harvard University. Permanece em anos, restam 31 escolas.
Cambridge por dois anos e conclui o equivalente O reconhecimento é imediato, de modo que,
ao mestrado. Nesse intervalo, sua esposa e ex- em 1912, Flexner é convidado a dirigir o Gene-
aluna, Anne Crawford, torna-se uma dramaturga ral Education Board, organismo filantrópico da
de enorme sucesso na Broadway, o que lhe per- família Rockefeller para a educação que, duran-
mite custear uma viagem de estudos à Europa, te muitos anos, faz doações multimilionárias às
visitando universidades na Inglaterra, França e, universidades para implantar as recomendações
principalmente, na Alemanha, onde assiste aulas do Relatório. Esse programa condiciona os finan-

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ciamentos à adoção das seguintes medidas pelas um relato fascinante sobre o processo de atração
faculdades de medicina: regime de ciclos, crité- de Einstein. Os dois se encontram pela primeira
rios de entrada, redução do número de alunos vez no California Institute of Technology (Cal-
nas salas de aula, hospitais com enfermarias de tech), onde Einstein participa de um seminário
ensino, dedicação exclusiva e conseqüente proi- científico. Conversam sobre as idéias ousadas de
bição da prática privada dos médicos docentes. Flexner e continuam a dialogar quando Einstein
O programa de reforma do ensino médico, co- visita Flexner em Oxford, onde ele estava como
ordenado pelo próprio Flexner, sofre duras rea- Professor Visitante. Com a anuência do patrono
ções das faculdades de medicina, notadamente Bamberger, Flexner viaja a Berlim, semi-clandes-
da tradicional Harvard Medical School, antes de tino, para contratar Einstein antes do Caltech,
ser considerado padrão mínimo de qualidade na seu primeiro convite nos Estados Unidos.
educação médica moderna. Entre 1930 e 1939, o instituto é dirigido por
Nesse momento de sua carreira, Flexner tem Flexner, com reconhecida liderança, eficiência
várias de suas idéias heterodoxas sobre pedago- e publicidade. No período, são implantadas as
gia (reunidas num volume intitulado A Modern primeiras unidades de pesquisa em matemática,
School, 1916) incorporadas ao projeto da Lincoln economia e humanidades. Inicialmente, o Ins-
School, colégio de aplicação pioneiro, vinculado tituto acolhe cientistas europeus que fugiam do
ao Teacher’s College da Columbia University, sob Nazismo, como Kurt Gödel, Hermann Weyl e o
a direção de John Dewey. próprio Einstein, além de representantes da van-
Em 1926, Flexner conclui seu trabalho no guarda científica da época, como Von Neumann,
Board e novamente vai à Europa, concentrando- Panofsky e Openheimer. Recebe, na condição de
se na Oxford University, para estudos livres, no pesquisador-visitante, importantes personalida-
que hoje seria um programa de pós-doutorado des científicas da época, como Pauli, Courant,
(apesar de não ter concluído seu doutorado). No Fermi, Bohr e Russel. Posteriormente, respeitan-
ano seguinte, em plena maturidade do ponto de do os princípios da cultura acadêmica sempre
vista acadêmico, Flexner retorna à mais antiga defendidos por Flexner, reconhecidos líderes in-
universidade de língua inglesa do mundo, agora telectuais, como Clifford Geertz e Albert Hirsch-
convidado a ministrar conferências que serviram man, passam a integrar seus quadros.
de base para um dos seus livros mais importan- Abraham Flexner aposenta-se em 1940. Nas
tes (e menos conhecidos), intitulado Universi- duas décadas seguintes, influencia a criação do
ties: American, English, German (1930). Trata-se National Humanities Center, escreve quatro li-
de uma análise das principais universidades da- vros, colabora com Henry Sigerist na introdução
quela época, completada com a proposição de de estudos culturais e históricos no ensino mé-
modelos da “Universidade do futuro”. dico na Hopkins, retorna aos bancos escolares
O marco seguinte na vida de Abraham Flexner como aluno especial na Columbia University e,
é o Institute for Advanced Study. Louis Bamberger junto com Einstein, engaja-se em movimentos
e sua irmã Caroline, herdeiros milionários, ven- sociais a favor da paz internacional. Falece em
dem uma das empresas da família, arrecadando 1959, em Falls Church, Virgínia, aos 93 anos de
uma fortuna sobre a qual deveriam pagar altos idade.
impostos; para evitar isso, querem doar parte do
recurso para alguma obra acadêmica. Em 1930,
os irmãos filantropos fazem contato com Flex- Modelo Biomédico, dito flexneriano
ner, pedindo assessoria sobre como seria uma
Escola Médica ideal, destinada a jovens de cultu- A reforma da educação médica preconizada no
ra hebraica. A essa altura, já crítico do nascente Relatório Flexner repercutiu tardiamente no
movimento sionista e interessado em projetos Brasil. Naquele momento, primeiras décadas do
intelectuais para além da escola médica, Flexner século XX, nossas faculdades de medicina ofere-
propõe experimentar modelos futuristas de edu- ciam modelos retóricos de formação e, onde ha-
cação superior, tema dos seus últimos escritos. via algum dinamismo científico, cultivavam laços
Ele então convence os doadores a criar o Institute com duas tradições européias antagônicas: a es-
for Advanced Study, vinculado à prestigiosa Prin- cola francesa, com forte foco na clínica, e a escola
ceton University, com a finalidade de congregar alemã, marcada pela pesquisa laboratorial.
as mentes mais brilhantes do seu tempo num Em 1919, o International Health Board da Ro-
ambiente acadêmico livre e produtivo. ckefeller Foundation concedeu bolsas de estudos
O instituto inicia seus trabalhos em 1932, para Horácio de Paula e Souza e Francisco Borges
tendo como destaque do seu quadro científico Vieira, docentes da Cátedra de Higiene da Facul-
ninguém menos que Albert Einstein. Na recente dade de Medicina de São Paulo, para um estágio
biografia de Einstein escrita por Isaacson 5, há de dois anos na Escola de Saúde Pública da Jonhs

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Hopkins University. Entre 1922 e 1925, esses pro- va Mello teve reduzido sucesso em sua proposta
fessores, com a ajuda de consultores e assistentes modernizante do modelo de formação médica
contratados pela Rockefeller, tentaram implantar de herança franco-lusitana.
na Faculdade de Medicina uma reforma curricu- O Relatório Flexner realmente implicava uma
lar (com base em disciplinas e não matérias) e tentativa de integração capaz de superar uma
institucional, removendo as cátedras 6. A adoção profunda cisão entre modelos distintos de práti-
do tempo integral para os docentes das forma- ca médica: a clínica e o laboratório. Não obstante
ções pré-clínicas (em departamentos e institu- a reação inicial, “a liderança da tradição clínica
tos) e a redução do número de alunos nas salas seria gradativamente ofuscada pela ascensão das
e enfermarias desencadearam reações das cáte- disciplinas básicas e pelas especialidades clínicas,
dras clínicas e cirúrgicas que rejeitavam o prin- agora associadas ao figurino norte-americano” 9
cípio flexneriano da dedicação exclusiva. Como (p. 18), particularmente após a implantação dos
resultado, a partir de 1926 os docentes do Depar- primeiros hospitais-escola nas décadas de 1930
tamento de Higiene desligaram-se da Faculdade e 1940, com farto financiamento da Rockefeller
de Medicina e constituíram o Instituto de Higie- Foundation 6.
ne de São Paulo, vinculado ao Governo Estadual. Após a II Grande Guerra, a agenda da reforma
Somente em 1939, o Instituto passou a constituir do ensino médico foi retomada ressaltando uma
uma das unidades de ensino da Universidade de vertente da Reforma Flexner pouco conhecida
São Paulo (USP), denominada posteriormente de entre nós – a Medicina Preventiva. Como estraté-
Faculdade de Higiene e Saúde Pública, historica- gia de mobilização, realizaram-se vários eventos
mente separada da Faculdade de Medicina. nos Estados Unidos e na América Latina, sob o
No Rio de Janeiro, outro importante pólo patrocínio de fundações internacionais e da Or-
de educação médica à época, Antonio da Silva ganização Pan-Americana da Saúde (OPAS). No
Mello apresentou uma proposta de reforma da processo de difusão internacional desse movi-
educação médica brasileira em bases muito se- mento, destacaram-se o I Congresso Pan-Ame-
melhantes às propostas do Relatório Flexner 7,8. ricano de Educação Médica (1951, Lima/Peru),
Catedrático de clínica médica da então Faculda- os Seminários sobre o Ensino da Medicina Pre-
de Nacional de Medicina, Silva Mello havia feito ventiva (1955, Viña del Mar/Chile; 1956, Tehua-
sua formação na Alemanha no início do sécu- cán/México) e a 1a Conferência de Faculdades de
lo. Em 1937, num livro extraordinário pela força Medicina da União de Universidades da América
da denúncia corajosa (num momento de dura Latina – UDUAL (1957, México DF) 10.
repressão política, lembrar que Anísio Teixeira Esse momento de transição da hegemonia no
fugira de uma ordem de prisão da polícia política campo da prática médica foi por mim analisa-
do Estado Novo), faz um diagnóstico sombrio e do, em parceria com Jairnilson Paim, conforme
cáustico, embora elegante, sobre a situação do segue:
ensino médico então vigente no país. “Nesta proposta, o conceito de saúde é repre-
“A nossa Faculdade de Medicina, pela sua sentado por metáforas gradualistas do processo
erudição rebarbativa, chegou ao absurdo de criar saúde-enfermidade, que justificam conceitual-
dentro da carreira médica, de todas a mais práti- mente intervenções prévias à ocorrência concreta
ca e objetiva, um tipo teórico, doutoral, de puro de sinais e sintomas em uma fase pré-clínica. A
bacharel, que é fabricado em séries imensas para própria noção de prevenção é radicalmente rede-
viver aos trancos, não raro quase como um mise- finida, através de uma ousada manobra semân-
rável, e que, mesmo tendo estudado muito, ignora tica (ampliação de sentido pela adjetivação da
o que tem necessidade de saber. O estudante que prevenção como primária, secundária e terciária)
trabalha com o fito único de passar no exame, e que termina incorporando a totalidade da prática
que não deveria ter direito de existência, é uma médica ao novo campo discursivo” 10 (p. 303).
criação dessa péssima organização” 8 (p. 33). Na América Latina, apesar das expectativas e
A reforma proposta por Silva Mello é conver- investimentos de organismos e fundações inter-
gente com vários pontos do modelo ideal preco- nacionais, o único efeito desse movimento pare-
nizado pelo Relatório Flexner: marco conceitual ce ter sido a implantação de departamentos aca-
de base científica, dedicação exclusiva de do- dêmicos de medicina preventiva em países que,
centes, revisão de currículos, redução de vagas, já na década de 1960, passavam por processos de
metodologia pedagógica baseada na prática, tur- reforma universitária.
mas menores em laboratórios e clínicas. Apesar Em suma, do primeiro ciclo de aproximação
de dispor de “contatos políticos com governantes, das faculdades de medicina brasileiras com os
os quais acionou quando procurou reformar a organismos de apoio técnico e de financiamento
mais prestigiosa faculdade de medicina do país, que pretendiam difundir a fórmula do Relatório
vinculada à Universidade do Brasil” 7 (p. 581), Sil- da Carnegie Foundation no plano internacio-

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nal, restou a criação de hospitais-escola como No contexto de abertura política e redemocra-


campo de treinamento e produção de conheci- tização do país vigente nos anos 1980, forjou-se
mento. Do segundo ciclo, já no pós-guerra, re- uma imagem de Abraham Flexner, ainda vigente
sultou a abertura de departamentos de medicina no Brasil, sobretudo no campo da educação em
preventiva substituindo as tradicionais cátedras saúde, como um intelectual conservador e opor-
de higiene, e introduzindo nas escolas médicas tunista, representante da dominação econômi-
conteúdos de epidemiologia, administração de ca, política e ideológica do capitalismo imperia-
saúde e ciências da conduta até então ministra- lista. Pagliosa & Da Ros 15 (p. 493) comentam que,
dos nas escolas de saúde pública, alienadas da hoje em dia, “O adjetivo ‘flexneriano’ é aplicado,
educação médica e destinadas à formação de geralmente com caráter pejorativo, aos currícu-
sanitaristas 10. los (médicos) que apresentam uma divisão clara
Com esse espírito, visando a fomentar pac- entre um período ou ciclo inicial de disciplinas
tos de convergência entre os grupos reformistas básicas, seguido de outro dedicado aos estudos clí-
com algum potencial na cena médica brasileira, nicos”. Com facilidade, denuncia-se Flexner e seu
realizou-se na Bahia, em 1961, a 1a Conferência Relatório por sexismo, racismo e elitismo: “uma
sobre o Ensino da Clínica Médica, patrocinada hierarquização da educação médica, uma vez que
pela Kellogg Foundation 11. Em certa medida, as escolas passaram a contar com um maior nú-
recuperou-se o impulso para superar alguns dos mero de homens, brancos e de classe média alta,
impasses conceituais e políticos das práticas de únicos estudantes que poderiam custear os estu-
cuidado à saúde por meio de reformas curricu- dos em medicina (encarecidos após o Relatório
lares e institucionais nos organismos de repro- Flexner)” 16 (p. 18). Além disso, mercantilismo:
dução social, formação intelectual e educação “o surgimento de toda uma atividade econômica
profissional. voltada para a assistência médica e para o lucro
Nesse contexto, redescobre-se Flexner co- em potencial do mercado por ela constituído –
mo agente reformador do ensino médico, sua uma indústria da saúde” 16 (p. 24). Do ponto de
dimensão mais reduzida e datada, e não como vista pedagógico, denuncia-se “a formação redu-
intelectual criativo, preocupado e atuante na cionista e linear ofertada para os alunos baseada
modernização da escola em geral e, em particu- num modelo flexneriano, ou seja, fundamentado
lar, da universidade. Claro que há exceções. Num num paradigma que mantinha como foco: a repe-
ensaio excepcional intitulado A Universidade de tição, a memorização e a reprodução do conheci-
Ontem e de Hoje 12, publicado logo após ter si- mento” 17 (p. 13).
do exonerado pelos militares do cargo de Reitor Aparentemente, o construto doutrinário que
da mítica Universidade de Brasília (UnB) origi- viria a ser conhecido como modelo biomédico
nal, Anísio Teixeira celebra Humboldt, Newman de educação médica foi em princípio delineado
e Flexner como concebedores dos principais por Eugênio Vilaça Mendes, odontólogo, consul-
modelos de universidade do mundo moderno, tor da OPAS, membro atuante do Departamento
denunciando ironicamente o modelo vigente de de Medicina Preventiva da Universidade Fede-
universidade: “Nem Humboldt, nem Newman, ral de Minas Gerais (UFMG), foco nacional do
nem Flexner reconheceriam mais suas respectivas movimento da Integração Docente-Assistencial e
universidades”. das propostas de reforma curricular promovidas
Para o que nos interessa, dois eventos mar- pela Associação Brasileira de Educação Médica
caram a segunda metade da década de 1960. No (ABEM) 18. Como hipótese, podemos atribuir a
subcontinente latino-americano, o seminal estu- Mendes, pelo menos entre nós, a adjetivação do
do coordenado por Juan Cesar Garcia em 1967- modelo biomédico como flexneriano, num opús-
1968, intitulado La Educación Médica en América culo intitulado A Evolução Histórica da Prática
Latina 13. No Brasil, a reforma universitária pro- Médica: Suas Implicações no Ensino, na Pesquisa
movida pelo regime militar, resultante do Acordo e na Tecnologia Médicas 19.
MEC/USAID de 1967 e da Lei nº. 5.540 de 1968. Num par de textos 19,20, complementados
Destaco o primeiro por ser marco referencial de posteriormente por um livro de síntese doutriná-
todo um movimento intelectual e político que, ria intitulado Uma Agenda para a Saúde (1996) 21,
na América Latina em geral e particularmente no Mendes explicita os elementos estruturais do
Brasil, termina por se configurar como um cam- modelo biomédico suposto como flexneriano:
po de saberes e práticas chamado Saúde Coleti- • Mecanicismo. No modelo flexneriano “O me-
va. Menciono o segundo porque, posteriormen- canicismo se introduz [...], pela analogia do corpo
te, o governo ditatorial implantado pelo Golpe humano com a máquina, elemento importante
de 1964 vem a ser considerado culpado de, com do modo de produção dominante” 20 (p. 540).
atraso de meio século, ter induzido a flexneriza- • Biologismo. O modelo flexneriano “pressupõe
ção da Medicina brasileira 14. o reconhecimento, exclusivo e crescente, da na-

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tureza biológica das doenças e de suas causas e mo modelo biomédico de formação e de prática
conseqüências” 19 (p. 31). “Dessa maneira, o no- (dito flexneriano), pode constituir interessante
vo paradigma procura absolver os fatores deter- hipótese de pesquisa histórica no campo da saú-
minantes de natureza e social, na causa das doen- de no Brasil. Uma rápida revisão da literatura re-
ças” 20 (p. 540). cente sobre educação médica e formação profis-
• Individualismo. O modelo flexneriano “é, du- sional para o sistema de saúde brasileiro permite
plamente, individualista. Primeiro, ao eleger co- identificar uma rede de referências bibliográficas
mo seu objeto, o indivíduo; segundo, ao aliená-lo, caudatárias, convergentes e concordantes na
excluindo, da sua vida, os aspectos sociais. Daí, construção discursiva anti-Flexner inaugurada
poder-se imputar ao indivíduo, a responsabilida- pelos textos anteriormente destacados. Esses au-
de pela sua própria doença” 19 (p. 31). tores 14,15,16,17,21,22,23,24,25,26,27,28,29,30,31,32,33 iden-
• Especialização. No modelo flexneriano, o tificam no Relatório elementos conceituais de
especialismo é visto como: “Primeiro, e numa uma matriz ou paradigma de ensino médico e
perspectiva ideológica, em função do mecanicis- de prática assistencial, configurando uma cons-
mo que impôs à parcialização abstrata do objeto trução imaginária que se chamou de Modelo
global, segundo um esquema contraditório que Biomédico (e que muitos escrevem au complet:
aprofunda o conhecimento específico e que ate- modelo biomédico flexneriano).
nua o conhecimento holístico. Segundo, e numa Na seção seguinte, pretendo avaliar a hipó-
dimensão econômica, a especialização decorreu tese em estudo destacando trechos seleciona-
das necessidades da acumulação de capital, que dos do Relatório, para demonstrar que muitos
exigiu a fragmentação do processo de produção desses pontos simplesmente não correspondem
e do produtor, via divisão técnica do trabalho” 20 à letra do texto escrito por Abraham Flexner.
(p. 540). Parecem mais corresponder a uma montagem
• Exclusão de práticas alternativas. “A viabili- mitológica restrita, composta por cinco mitos e
zação do paradigma da odontologia científica se duas omissões:
fez com base na sua supremacia sobre as outras Mitos:
práticas alternativas, consideradas, a priori, ine- 1) Conteudismo pedagógico;
ficazes” 20 (p. 540). 2) Biologismo anti-humanista;
• Tecnificação do cuidado à saúde. O modelo 3) Tecnologização da prática;
flexneriano faz da medicina uma “engenharia 4) Medicina curativa individualista;
biomédica [que] cria uma nova forma de media- 5) Submissão às corporações médicas.
ção entre o homem e as doenças, os milagres da Omissões:
medicina tecnológica” 19 (p. 32). 1) As faculdades de medicina devem ser integra-
• Ênfase na prática curativa. O modelo flexne- das às Universidades, a fim de propiciar...
riano “prestigia o fisiopatologismo em detrimento 2) Formação universitária prévia para acesso à
da causa” 19 (p. 33). formação profissional (tomando o College como
Mendes arremata a construção ideológica do pré-requisito de entrada na escola médica).
modelo flexneriano ao apontar determinantes e
descrever seu contexto de surgimento e difusão,
da seguinte forma: O Relatório Flexner
“O Relatório Flexner poderia ter tido o mesmo
destino de centenas de documentos preparados na O Relatório Flexner na verdade intitula-se Medi-
Era Progressista, e que não foram levados à práti- cal Education in the United States and Canadá
ca. [...] Além desse interesse das grandes indústrias, (Figura 2). Henry Pritchett, Presidente da Carne-
há que se ressaltar a participação, na origem e na gie Foundation, abre sua apresentação com as
consecução do Relatório Flexner, da profissão or- seguintes palavras: “Este relatório sobre educação
ganizada, via Associação Médica Americana. [...] médica é o primeiro de uma série de trabalhos
Pode-se concluir, pois, que a medicina científica sobre escolas profissionais que será lançado pela
se institucionalizou, através da ligação orgânica Carnegie Foundation”. Flexner havia sido contra-
entre o grande capital, a corporação médica e as tado para fazer, depois desse Relatório, avalia-
universidades. O novo paradigma determinou ções da formação em Direito e nas Engenharias
mudanças substantivas no objeto, nos propósitos, e, em seguida, para outras profissões. A avaliação
nos recursos e nos agentes da medicina, levando à sobre o ensino de Direito não foi à frente, as de-
configuração de um marco conceitual, que passa mais sequer começaram, pois a transformação
a referenciar a prática e a educação médicas” 20 provocada pelo Relatório Flexner sobre a educa-
(p. 540). ção médica estadunidense foi de tal impacto que,
Tratar esse conjunto de textos 19,20,21 como em dez anos, a Carnegie Foundation considerou a
“caso-índice” do que viria a ser conhecido co- missão cumprida.

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RECONHECER FLEXNER 2241

Figura 2

Facsímile da folha de rosto do Relatório Flexner.

A citação latina – imperium in imperio – na universidades. Em muitos casos, as faculdades


introdução de Pritchett ao Relatório (Figura 3), se vinculavam às instituições como uma peque-
dá conta de outro elemento que muito motivou na universidade dentro da universidade (daí im-
Flexner e que terminou sendo uma das principais perium in imperio) separada e autônoma, com
conclusões: as escolas médicas se constituíam peculiaridades e regras próprias. Então, uma das
como feudos soberanos dentro do império das recomendações do Relatório foi reintegrar a fa-

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2242 Almeida Filho N

Figura 3

Relatório Flexner (1910; p. vii): Introdução. Autoria de Henry Pritchett.

culdade de medicina à instituição universitária. mente saber a não ser que ele saiba como”. Notem
Esse aspecto é pouco conhecido, para não dizer que o emprego do verbo envolver é prescritivo
praticamente ignorado, entre nós; constitui a e não descritivo; com isto, Flexner quer dizer: a
Omissão nº. 1. Tenho uma hipótese sobre o recal- educação médica deve envolver o aprendizado
que desta que foi uma das principais conclusões de como fazer, fazendo.
do Relatório. Seria porque nas universidades do No tocante à metodologia pedagógica, com a
Brasil – não diria todas, pois exceções existem – experiência de quem havia passado quase duas
as faculdades de medicina continuam impérios décadas criando métodos originais de ensino-
dentro do império? aprendizagem, Flexner propôs um pragmatismo
Assinalo, ainda na Introdução de Pritchett operativo, muito parecido com a ABP – aprendi-
(Figura 4), a eficiente síntese dos dados signifi- zagem baseada em problemas. Thomas Bonner 3,
cantes desse estudo. Vejamos aqui as constata- seu biógrafo mais detalhista e rigoroso, afirma
ções que servem de justificativa para o estudo: que de fato a pedagogia flexneriana antecipa as
“Há 25 anos, tem existido uma enorme superpro- principais teorizações e propostas do pragmatis-
dução de médicos mal treinados e deseducados”; mo em relação à utilização da vivência e da práxis
“essa superprodução de pessoas mal treinadas é como modelo educacional, em diálogo contem-
devida principalmente à existência de um enor- porâneo com William James e John Dewey. No
me número de escolas comerciais, sustentadas em livro intitulado A Modern School (1916), referido
muitos casos por métodos de publicidade, através anteriormente, Flexner apresenta de modo sis-
dos quais uma massa de jovens não preparados é temático suas idéias sobre a educação em geral,
retirada das ocupações industriais para o estudo particularmente a noção de uma pedagogia con-
da medicina”; “até recentemente a condução de textual.
uma escola médica era um negócio rentável por- Ainda nesse aspecto, vejamos a seguinte ci-
que os métodos de instrução eram principalmente tação, ainda mais pertinente porque se refere
didáticos”. especificamente à educação médica. “O progres-
Examinemos diretamente o Mito nº. 1. Aqui so da Ciência e a prática científica ou inteligente
estão trechos do Relatório, na página 53 (Figura 5): da medicina emprega, portanto, exatamente a
“No lado pedagógico, a medicina moderna, co- mesma técnica. Para usá-la, seja na investigação
mo todo ensino científico, é caracterizada pela ou na prática, o estudante deve ser treinado no
atividade. O estudante não mais apenas observa, exercício positivo de suas faculdades. Treinado
escuta e memoriza, ele faz. Suas próprias ativida- dessa maneira, a escola médica começa, ao invés
des no laboratório e na clínica são os principais de completar, a educação médica. Não pode, em
fatores na sua instrução e sua disciplina (e na sua nenhuma hipótese, transmitir ao estudante mais
formação, podemos atualizar). Uma educação que uma fração dos tesouros reais da ciência, po-
em medicina envolve, tanto o aprender, quanto rém pode pelo menos colocá-lo no caminho de
o aprender como; o estudante não pode efetiva- ampliar consistentemente seu patrimônio inte-

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RECONHECER FLEXNER 2243

Figura 4

Relatório Flexner (1910; p. x): Introdução. Autoria de Henry Pritchett.

Figura 5

Relatório Flexner (1910; p. 53).

lectual. Um hábito profissional, definitivamen- ele se refere às ciências básicas (Física, Química e
te formado sobre o método científico, converte- Biologia) como mínimo necessário, muito longe
rá cada detalhe de sua experiência prática num de ser suficiente, para uma boa prática médica.
fator adicional na sua educação efetiva” (Figura “Elas [as ciências fundamentais] fornecem de fato
6). Aqui Flexner claramente antecipa o conceito os instrumentos essenciais básicos da formação
de lifelong learning, também posto como grande médica, mas esse instrumental mínimo pouco
novidade na proposição de metodologias ativas pode além de servir como mínimo profissional
de aprendizagem, tão populares no Brasil pós- permanente e, ainda assim, instrumentalmente
mobral. inadequado. O médico lida de fato com duas ca-
O Mito nº. 2 diz que Flexner tinha uma visão tegorias. Química, física e biologia o capacitam
exclusivamente biológica e mecanicista do co- a apreender um desses conjuntos. Ele precisa de
nhecimento sobre a saúde-doença e a medicina. uma perspectiva diferente e um aparato apre-
Vejam esta citação, na página 26 (Figura 7), onde ciativo para lidar com o outro, elementos mais

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2244 Almeida Filho N

Figura 6

Relatório Flexner (1910; p. 55).

Figura 7

Relatório Flexner (1910; p. 26).

sutis. Preparação específica nesta direção é muito lida, portanto, não apenas com certezas, como faz
mais difícil; deve-se confiar no requisito insight o empirismo, mas também com probabilidades,
e simpatia numa experiência cultural variada pressupostos, teorias”. Acrescenta que a medicina
e ampla”. distancia-se do empirismo ao reconhecer a “qua-
O Mito nº. 3 refere-se a uma concepção tec- lidade lógica” do seu objeto de conhecimento e
nologizada e empiricista da prática médica, su- de prática. Na citação da página 55, antes referi-
postamente constitutiva do modelo flexneriano. da, Flexner mencionava “a prática da medicina
Mas é o próprio Flexner que desmente sucinta científica ou inteligente”.
e singelamente essa atribuição enviesada, à pá- Vejamos agora o Mito nº. 4: a questão da me-
gina 26: “Nós podemos então descrever de modo dicina curativa e individual como se este fora um
justo que a medicina moderna é caracteriza- paradigma flexneriano. Não sei como se pôde
da por uma manipulação severamente crítica inventar que Flexner preconizava um modelo
da experiência”. curativo individualizado em oposição a algo di-
E mais ainda, à página 53 (Figura 8): “A mo- ferente, supostamente uma medicina integral e
derna medicina [que é a que Flexner preconiza] socializada. Olhem a clareza da afirmação con-

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RECONHECER FLEXNER 2245

Figura 8

Relatório Flexner (1910; p. 53).

trária. “Mas a função do médico está se tornando enfim uma educação geral para os médicos, an-
rapidamente social e preventiva, mais que indivi- tes mesmo da formação nas ciências básicas da
dual e curativa”. Ele já dizia exatamente o opos- saúde.
to do que hoje muitos dizem ser o flexnerismo; A conseqüência lógica do uso distorcido des-
“nele [o médico] a sociedade confia para avaliar, ses elementos, no caso, é que a principal propos-
e através de medidas essencialmente educacionais ta do modelo flexneriano, que Vinten-Johansen
executar, as condições que previnem a doença e & Riska 34 denominam de modelo flexneriano
constroem positivamente o bem-estar físico e mo- “verdadeiro”, nunca foi mencionada na literatura
ral. Escusado dizer que esse tipo de doutor é antes brasileira, constituindo a Omissão nº. 2. Trata-se
de tudo um homem educado” (Figura 9). A des- do college como requisito para entrada no curso
peito de vários atos e escritos que mostram um médico – que depois se estenderia a todas as ou-
Flexner quase feminista – Bonner 3 narra como tras formações profissionais nos Estados Unidos.
Flexner cuidava das filhas enquanto Anne pro- Nunca li qualquer texto brasileiro sobre Flexner
duzia peças de sucesso na Broadway ou quando, que mencionasse sua defesa veemente de que
com a mulher, participava de passeatas e mani- os médicos deveriam ter formação nas culturas,
festações das sufragistas –, na época prevalecia nas humanidades, nas linguagens, na educação;
o sexismo: então se dizia “um homem educado” na verdade; nossos autores dizem exatamente
[an educated man]; hoje usaríamos “uma pessoa o contrário. Mas, para sermos justos e precisos,
educada”. devemos fazer uma verificação no próprio texto
Vejamos como esses três últimos temas do de Flexner.
texto flexneriano, tomados em conjunto, condu- Eis o fragmento do Relatório onde essa pro-
zem a um argumento fundamental: a necessi- posta aparece com clareza e justificação (Figura
dade de formação nas humanidades, na cultura, 10). Acompanhemos o texto: “O requisito é, por-

Figura 9

Relatório Flexner (1910; p. 26).

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2246 Almeida Filho N

Figura 10

Relatório Flexner (1910; p. 26).

tanto, necessariamente um requisito de college, school”; segundo, a experiência da diversidade


cobrindo [pelo menos] dois anos, porque três cultural; e terceiro, a educação nas artes liberais.
cursos laboratoriais não podem ser conduzidos e Ainda nesse aspecto, há outra seção do Relató-
ministrados em período muito curto. Isso é uma rio Flexner inteiramente destinada a promover
circunstância afortunada dado que favorece o de- o requisito do college para atender à necessidade
senvolvimento simultâneo do estudante em rela- de mais maturidade nos candidatos à carreira da
ção a outras e mais gerais linhas. Parece então que Medicina. Ao concluir, menciona novamente a
uma política que, desde o começo, foi considerada, integração da escola médica na universidade.
do ponto de vista estreito da escola médica, isola- O diagnóstico de Flexner havia encontrado
da, implica logo o abandono desse ponto de vista que a maioria das escolas médicas dos Estados
a favor de algo mais compreensivo”. Compreen- Unidos não tinha qualquer pré-requisito univer-
sivo, no idioma inglês, tem sentido mais amplo sitário prévio. Propôs então que as escolas mé-
que no nosso léxico. Não quer dizer apenas com- dicas do Sul dos Estados Unidos, região menos
preensivo no sentido de compreensão ou en- desenvolvida e mais necessitada de assistência
tendimento, mas também no sentido de ampla social e de saúde, poderiam ter, durante certo
abertura. Continuando: “O requisito preliminar prazo, apenas a conclusão do ensino médio (high
para entrada na educação médica deve, portanto, school) como requerimento de entrada. O college
ser formulado em termos que estabelecem uma de dois anos se tornaria o requisito padrão, de
distinta relação, pedagógica e cronológica, entre a acordo com uma base legal mínima, para o resto
escola médica e outros órgãos educacionais”. do país. Um número pequeno de instituições, na
Aqui as duas omissões se articulam, pois sur- época Harvard, Yale, Hopkins e algumas outras,
ge como questão a quebra do “império dentro que já exigiam o college de quatro anos, mante-
do império” com a integração da escola médi- riam seus critérios rigorosos de entrada como
ca na universidade. Então, a parte propositiva antecipação do futuro patamar nacional de in-
do Relatório, o verdadeiro modelo flexneriano, gresso na escola médica.
claramente se apresenta num argumento para Pois bem, ao ter sucesso em postular e tor-
justificar o college como requisito essencial para nar o college, inicialmente com pelo menos dois
entrada na escola médica a partir de três justi- anos, e depois o curso pleno de quatro anos,
ficativas, necessárias para humanizar a prática como padrão de requerimento para entrada na
médica: primeiro, a necessidade de competência escola médica, Flexner na prática definiu o mo-
nas três ciências básicas da saúde (como ele diz delo norte-americano de arquitetura curricular
em outro momento) “de um modo que não seja universitária. Portanto, seu projeto de estrutura
superficial, informativo tal como se faz na high de educação superior em ciclos foi de tal manei-

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RECONHECER FLEXNER 2247

ra absorvido por toda a rede de formação uni- nais e práticas sociais estava sendo introduzido
versitária nos Estados Unidos que o que hoje se na vida social.
chama de modelo anglo-saxão é originário do Se essa constatação parece tão evidente,
Relatório Flexner. O Relatório e a atuação de Fle- por que no Brasil desenvolveu-se, com tal vigor,
xner no General Education Board fizeram com uma retórica falseadora dos elementos axiais do
que nos Estados Unidos, já em 1925, todas as for- pensamento de Abraham Flexner, forjando um
mações profissionais passassem a incorporar um pretenso modelo flexneriano e fomentando um
elemento estrutural necessário de pré-formação movimento anti-Flexner? Por que o anti-Flexner
que se encontrava no college. É claro que, antes aparece como posição progressista supostamen-
disso, muitas universidades americanas já ofere- te diferenciadora da educação médica brasileira
ciam cursos de estudos gerais no nível undergra- perante a educação superior em geral, a educa-
duate [equivalente à graduação brasileira], com ção em saúde em particular e, especificamente, a
os títulos BA [Bachelor of Arts] e BSc [Bachelor of formação profissional?
Sciences], mas eram cursos indiferenciados que Creio que podemos compreender a rationale
não tinham a finalidade de educação propedêuti- desse movimento, analisando duas vertentes do
ca fundamental para a formação nas profissões. processo de descaracterização de Flexner e sua
Resta comentar o Mito nº. 5: Flexner seria obra: o contexto ideológico-político de emergên-
cúmplice ou refém da corporação profissional cia dessa montagem e o regime imaginário que
da Medicina. De fato, no Relatório, há um capítu- lhe deu sustentação.
lo sobre os conselhos estaduais de regulação da Na década de 1970, no campo da saúde,
prática médica, com uma série de prescrições, houve intenso esforço de produção teórica para
principalmente avaliação externa e exames de alimentar a luta ideológica de resistência con-
acreditação, porém tais órgãos não seriam auto- tra a ditadura militar. Uma importante estratégia
nomamente geridos pelos profissionais médicos utilizada com sucesso foi a recriação crítica ou
e sim por representantes de governo e da socieda- reelaboração de conceitos, como prevenção 35,
de. Em contradição com a versão anti-Flexner, e mercado de trabalho 36, prática médica 37, raízes
desmontando esse mito, três dos seus princípios sociais do trabalho médico 38, entre outros.
– o regime de ciclos, a dedicação exclusiva dos Com a queda da ditadura e a abertura polí-
docentes e a proibição da clínica privada – foram tica gradual e controlada, já na década de 1980,
objeto de ferrenha resistência da Associação Mé- o país iniciava a redemocratização política e a
dica Americana, a ponto de seu Presidente, Ar- reorganização de suas instituições. Na interface
thur Bevan, arrogantemente denunciar a Refor- entre educação e saúde, naquele momento bus-
ma Flexner como “the clumsy work of a layman” cavam-se propostas capazes de superar pautas
[o trabalho desastrado de um leigo], conforme e agendas de reforma da educação médica e de
Bonner 3 (p. 150). formação de recursos humanos em saúde, su-
postamente herdadas do regime de exceção e do
imperialismo americano. Tal movimento se deu
Comentários finais tanto positiva como negativamente. Por um la-
do, positivamente, ao resgatar temas da ação ex-
Como vimos, equivocam-se os que consideram tensionista da Saúde Comunitária, combinados
Flexner como defensor de uma formação com com as então incipientes pedagogias ativas (de
base em conteúdos e não em métodos, que sua inspiração freiriana), além de elementos de pla-
visão da saúde era exclusivamente biológica e nejamento estratégico regionalizado, propunha-
reducionista, e não social e humanista, que a se um modelo de formação baseada na prática
vertente principal do seu modelo de prática é denominado Integração Docente-Assistencial
a da medicina curativa e individual, e que Fle- que, num marco teórico referencial revolucioná-
xner apoiava a prática privada da medicina e o rio, propiciaria respostas tecnicamente efetivas e
controle social da formação médica pelas cor- corretas politicamente. Por outro lado, negativa-
porações profissionais. Porém estão corretos os mente, o recurso a certa desonestidade intelectu-
que acham que ele propunha uma reorganização al foi útil para se reconstruir um suposto discurso
do conhecimento com base numa abordagem antagônico, atribuindo-lhe maldade e erro, ne-
disciplinar. Entretanto, se fizermos uma análise cessário para criar a imagem do inimigo.
justa e rigorosa, a disciplinaridade era vanguar- A análise do modelo de ensino médico que
da mesmo em 1910, implicando consolidação ou efetivamente compõe o Relatório Flexner revela
formalização dos avanços da ciência. A especiali- eixos fundamentais que, distorcidos, omitidos,
zação e a profissionalização regulada eram então esquecidos, encontram-se recalcados ou per-
posturas avançadas, porque naquele momento vertidos na imagem ou montagem ideológica
um rico conjunto de novas atividades institucio- pretendida. Num contexto como a Saúde Co-

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2248 Almeida Filho N

letiva brasileira das duas últimas décadas, es- Enfim, demonstramos neste artigo que o su-
se conjunto de recalques e distorções permitiu posto modelo biomédico flexneriano deixa de
indiciar um arcabouço conceitual ou matriz de considerar, ou o faz de modo distorcido, alguns
teorias sociais comprometidas com a domina- dos elementos que de fato têm importância para
ção (estrutural-funcionalismo), subsidiadas por o entendimento do papel histórico de Abraham
epistemologias vencidas ou superadas (reducio- Flexner. Buscamos fazê-lo na perspectiva de des-
nismo positivista), produtoras de formas autori- construção dessa montagem como dispositivo
tárias de gestão (gerencialismo organizacional), retórico com o qual, por um lado, se tentou de-
convergindo para um modelo de formação e de monizar uma personagem histórica (o próprio
prática em saúde (modelo biomédico) que se Flexner) e, por outro, a ele se atribuiu respon-
devia antagonizar. Para tornar mais eficiente a sabilidade por uma concepção (o modelo dito
montagem imaginária, foi preciso atribuir face flexneriano) produtora de efeitos imaginários de
humana ao antagonista: o funcionalismo seria exclusão, negatividade e repulsa, particularmen-
parsoniano; o reducionismo, cartesiano; o po- te nos subcampos denominados Ensino Médico
sitivismo, comtiano; o organizacionismo, taylo- e Educação em Saúde, que compõem importante
rista; o modelo biomédico seria, naturalmente, segmento da matriz ideológica da Saúde Coletiva
flexneriano. brasileira.

Resumo Referências

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vido por fundações privadas, vinculadas ao complexo and Canada. New York: Carnegie Foundation for
médico-industrial norte-americano. Neste artigo, pro- the Advancement of Science; 1910. http://www.
ponho submeter essa formulação a um rigoroso inqué- carnegiefoundation.org/files/elibrary (acessado
rito crítico. Primeiro, apresento uma súmula de vida e em 02/Jun/2010).
obra de Flexner. Segundo, reviso as formas de represen- 3. Bonner TN. Iconoclast: Abraham Flexner and a life
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verifico inconsistências, contradições e omissões nos 4. Flexner JT. An American saga: the story of Helen
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de São Paulo (1934-1952). São Paulo: Autores As-
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Agradecimentos 7. Kemp A, Edler F. A reforma médica no Brasil e
nos Estados Unidos: uma comparação entre duas
À Denise Coutinho, pela revisão crítica de conteúdo e retóricas. Hist Ciênc Saúde-Manguinhos 2004;
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