Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
CLEONICE PINHEIRO
São Luís
2015
CLEONICE PINHEIRO
São Luís
2015
Pinheiro, Cleonice.
Aprovada em _____/_____/_____
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________
Prof.ª Me. Maria da Graça Reis Cardoso (Orientadora)
Universidade Federal do Maranhão
___________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Klautenys Dellene Guedes Cutrim
Universidade Federal do Maranhão
____________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Conceição de Maria Belfort de Carvalho
Universidade Federal do Maranhão
A minha família por aceitar com amor e
compreensão a minha ausência nos vários
momentos dedicados por mim a esse trabalho.
AGRADECIMENTOS
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11
2 CULTURA E ETNICIDADE ................................................................................. 15
2.1 Cultura afrobrasileira ............................................................................................. 25
2.2 Identidade étnica negra e a luta pelo reconhecimento nacional: políticas de
ações afirmativas ..................................................................................................... 33
2.3 Visualizando a situação do negro no processo de construção da
sociedade brasileira ................................................................................................. 42
3 TURISMO ETNOCULTURAL COMPREENDENDO A RELEVÂNCIA
DO TURISMO ÉTNICO AFRO NO BRASIL .................................................... 48
3.1 Museus etnográficos negros: a singualização da cultura afro-brasileira ........... 52
3.1.1 Museu Treze de Maio ................................................................................................ 54
3.1.2 Museu do Percurso do Negro .................................................................................... 57
3.1.3 Museu do Negro ........................................................................................................ 60
3.1.4 Museu Afro-brasileiro ............................................................................................... 61
3.1.5 Museu Afro Brasil ..................................................................................................... 64
4 CAFUA DAS MERCÊS-MUSEU DO NEGRO:análise da representatividade
da cultura afro-brasileira no cenário turístico ludovicense ................................. 69
4.1 Metodologia da pesquisa ......................................................................................... 70
4.2 Caracterização da realidade pesquisada ............................................................... 73
4.2.1 O Acervo exporgráfico do Museu Cafua das Mercês................................................ 75
4.3 Apresentação e discussão dos resultados ............................................................... 80
4.3.1 Percepções dos visitantes do espaço museológico .................................................... 80
4.3.2 Percepções de representantes de instituições envolvidas com questão étnica racial
negra no Maranhão ................................................................................................... 92
4.3.3 Apontamentos e sugestões de melhoramento ............................................................ 101
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................104
REFERÊNCIAS .....................................................................................................106
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO DESTINADOS AOS VISITANTES ........113
APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA .................................................114
ANEXO A – REPORTAGEM ..............................................................................115
ANEXO B – RELAÇÁO DO ACERVO EXPOSTO NO CIRCUITO DE
EXPOSIÇÃO PERMANENTE DA CAFUA DAS MERCÊS ...........................116
11
1 INTRODUÇÃO
a percepção destes acerca do espaço museal bem como da importância da cultura negra. Nesse
mesmo ensejo, busca-se demonstrar a importância da cultura afro-brasileira para o turismo
étnico do Estado. Assim, verificar a opinião de algumas instituições que tem algum
envolvimento com a questão étnica negra no Maranhão acerca do espaço museológico
representa mais um caminho na busca do objetivo geral.
De forma que, propor, com base, na analise da pesquisa e no conhecimento de
outras propostas museais étnicas negras, sugestões para a dinamização do espaço museal
Cafua das Mercês representará uma das intenções do estudo.
A metodologia da pesquisa será dividida em três momentos: o primeiro deles
consiste no levantamento bibliográfico onde buscará através de artigos, reportagens, poesias,
livros, monografias, dissertações, site, documentário; aspectos teóricos a respeito da cultura
negra , englobando etnicidade, museus étnicos , turismo étnicos, entre outros, que permitam
compreender a representatividade da cultura afro no cenário turístico de São Luís.
No segundo momento, buscará in loco no Museu Cafua das Mercês a percepção,
através da aplicação de questionário para os visitantes que poderará ocorre tanto turistas
quanto pessoas oriundas da comunidade maranhense, acerca do espaço museológico.
Por fim, no terceiro momento, busca-se, através de um roteiro de entrevista com
perguntas semiestruturadas, a percepção de instituições envolvidas com a temática étnica
negra acerca do espaço.
A estrutura da pesquisa divide-se em quatro pontos. No primeiro deles transitará
pela compreensão da relação intrínseca entre cultura e etnicidade, haja vista, esses assuntos
comportam-se como mecanismos viáveis para que se compreenda um grupo étnico e como
esse grupo busca respostas para sua vivência diante um mundo complexo. Feita essas
explicações, abordará o ensejo maior da pesquisa que a compreensão da cultura afro-brasileira
que será entendida através dos seus valores referenciais, como memória, religiosidade e a
musicalidade. A identidade como processo de identificação negra terá sua importância frisada
através de algumas ações afirmações. Solidificará todas essas abordagens a discussão acerca
do sujeito dessa cultura, o negro. Esse terá sua visualização destacada devido um
questionamento feito pelo ex-presidente dos Estados Unidos, George W, Bush, que alegará
não ter conhecimento que no Brasil existem negros.
No segundo ponto compreenderá turismo etnocultural um dos segmentos do
mercado turísticos que se fundamenta em atividades turísticas decorrentes da vivência de
experiências autênticas em contatos diretos com os costumes de vida e a identidade de grupos
14
étnicos. Ainda nesse ponto abordará alguns museus étnicos negros com intenção de realçar a
importância da preservação da memória negra nacional em espaço museal.
Feitas essas abordagens teóricas, o presente estudo partirá para a pesquisa onde
será feita primeiramente a caracterização da realidade pesquisada, o Museu Cafua das Mercês.
Logo depois, terá apresentação e a discussão dos resultados que acontecerá em dois
momentos, O primeiro abordará a percepção dos visitantes, porém identificará primeiramente
o perfil deste através de questões como: gênero, cor ou raça, faixa etária, nível de escolaridade
e renda. Depois, buscará junto aos visitantes compreender: se é a primeira vez que ele visita o
espaço museal; como ele obtivera conhecimento acerca do museu e se tem costume de
freqüentar espaços museais étnicos negros.
O segundo momento analisará junto a algumas instituições que apresentam
envolvimento com a questão étnica, através de três perguntas centrais, a saber: como o as
instituições compreendem o Museu Cafua das Mercês; outra questão será a avaliação das
instituições acerca da relação turismo e cultura negra e por fim, se as instituições apresentam
alguma sugestão acerca do espaço. Por fim, a apresentação dos apontamentos sugeridos pelos
visitantes e as instituições.
O último capítulo será apresentado às considerações conclusivas, procedentes da
discussão dos resultados obtidos no questionário aplicado, as sugestões e contribuições desta
temática, visando estudos futuros mais aprofundados tanto para o turismo étnico ludovicense
quanto para a população local.
Assim, contribuir para um conhecimento científico não só na área da cultura
afro-brasileira maranhense, dos museus, mas principalmente do turismo que é uma das razões
principais desta pesquisa.
15
2 CULTURA E ETNICIDADE
Beni (2007) afirma que como não existe uma cultura apenas, esta pode ser
entendida como um conjunto de crença, de valores e técnicas para lidar com o meio ambiente,
compartilhado entre os seus conterrâneos e transmitido de geração a geração.
Diante desses posicionamentos que particularizam a cultura como ação humana
que se diferencia de indivíduo para indivíduo, de comunidade para comunidade, de país para
país e de povo para povo, Barreto (2007, p. 18) alega que “cada cultura, ao mesmo tempo,
teria seus sistemas de valores próprios, o que impediria que fosse possível falar de uma
cultura universal, como em algum momento tentaram os humanistas franceses, e sim falar
sempre em culturas, no plural”. Visão viável para assim compreender cultura no Brasil, pois a
sociedade desta nação se apresenta, segundo Ribeiro (1997), multiétnica.
Esse posicionamento está relacionado à outra compreensão de cultura que,
segundo Barreto (2007), está em evidência atualmente e ela denomina de “multiculturalismo”.
Este, um conceito relativista que, “considera que todas as manifestações de todas as culturas
devem ser respeitadas”.
Entendimento, que de acordo com a preocupação de José Luís Santos (2006),
quando ressalta que todos os estudos e usos da cultura, devem ter em mente a “humanidade
em toda a sua riqueza e multiplicidade de formas de existências”.
Analisando os conceitos, acima apresentados, compreende-se a importância de
cultura, seja sob que perspectiva ela se apresenta: um tipo particular de atividade produtiva,
um mapa, um receituário ou atividades intelectuais e artísticas de um indivíduo, um grupo,
uma sociedade, um país ou de um povo.
É importante destacar que o homem é, acima de tudo, um ser cultural. Isto permite
compreender que cultura é de suma importância no seio de uma sociedade, pois o homem
produz constantemente elementos culturais para se localizar perante a sociedade. Por essa
razão, as produções culturais se diferenciam e tal diferença permite perceber que a cultura não
é um processo igualitário, mesmo sendo humano. É, antes de tudo, respostas diferentes às
distintas formas de vida humana presente neste universo que constantemente no seu dia a dia
criam e recriam sua realidade cultural. Por exemplo, a comunidade negra brasileira vem
através de décadas criando e recriando sua realidade cultural através de elementos, como a
religião, a culinária, a dança, a literatura, a música, dentre outros, que a singularizam como
uma comunidade produtora de cultura diferenciada no contexto nacional.
Essa importância da cultura para a humanidade reflete também no turismo. Mário
Beni (1997, p. 91) é taxativo com base no posicionamento de Hunziker e Krapt que, em suas
primeiras obras, estabeleceram a premissa de que “sem cultura não há turismo”.
17
apesar de não ser um processo nato. Portanto, é necessário compreender que “etnicidade é a
autoconsciência da especificidade cultural e social de um grupo particular” (RIESMAN apud
MESQUITA, 2010).
Diante desse posicionamento, definir grupo étnico também é importante neste
estudo de etnicidade que, segundo Luvizotto (2009) respaldada em Barth (1976), acredita ser
uma forma de organização social, que expressa uma identidade diferencial nas relações com
outros e com a sociedade mais ampla.
Entretanto, isto não quer dizer que esses grupos existam de forma isolada como
que revestidos em bolhas, totalmente esquecidos e sem fazerem essa troca cultural existente
em todo processo culturalmente humano. O próprio Barth (1976, p. 9) reforça essa ideia e diz
categórico:
Aunque ya nadie sostiene la hipótesis ingênua según la cual cada tribu y cada pueblo
ha logrado conservar su cultura mediante um belicioso desdén de sus vecinos,
subsiste todavia la opinión simplista que considera alaislamiento geográfico y
alaislamiento social como lós factores críticos en la conservación de la diversidad
cultural.
Não se pode aceitar a exclusão de vários grupos em razão de um, pois, o que vai, ou já está
resultando é uma nação agonizante na sua base constituída por ser humanos, ainda que
diferentes entre si. Não atentar a isso é comungar dessa “democracia” irreal que não percebe e
não inclui “democraticamente” sua maior beleza que a população brasileira composta por
diversas nuance.
Constantemente, nos noticiários brasileiros (ainda que tendenciosos), cada vez
mais se observa a divulgação de um número crescente de pessoas sendo assassinadas, presas
injustamente, desapropriadas de suas terras, violentadas, dentre outros, que leva a crê que
alguma coisa está acontecendo fora da abrangência do “mito democrático racial”. Não são
registros de casos de comunidades pobres quaisquer de uma determinada região. São ações
direcionadas, principalmente, para comunidades pobres, porém negras. É, na verdade, ou crê
que seja, a desmistificação da harmonia promovida por esse mito, que insistem em propagá-lo
como uma verdade absoluta brasileira.
A divulgação desse mito, fora do Brasil é tão propagada que o afro-americano,
literário, escritor Henry Louis Gates Jr comentou no programa Milênio, vinculado pela Globo
News, em 2013, que veio ao Brasil justamente para conhecer a atuação desse mito na
realidade brasileira. Segundo ele, essa vontade foi motivada quando, ainda, era aluno da
Universidade de Yale nos Estados Unidos, onde ensinavam que no Brasil havia uma
democracia racial e que aqui havia um refúgio para as relações inter-raciais. Gates Jr comenta
que em função disso, todos os alunos tiveram que ler Casa Grande e Senzala de Gilberto
Freyre. Porém, “mais tarde, eu descobrir, que havia critica a esse mito”, pontuou o literário.
Acerca desse famoso e internacional mito brasileiro, Moore (2007) alerta que ele
(o mito), assim como o do Desenvolvimento Separado, na África do Sul, atuou como “mito-
ideologia” eficaz na conservação do status quo sociorracial durante praticamente um século.
Segundo o autor, essa forma de autoengano tem constituído um obstáculo sério ao avanço da
sociedade, tanto na África do Sul quanto no Brasil.
Diante esse quadro, o autor apresenta uma “luz no fim do túnel” para comunidade
negra brasileira.
Mas, graças aos esforços perseverantes de décadas do movimento social negro
brasileiro, uma parte crescente da sociedade tem identificado a “democracia racial”
como uma perigosa falsa visão. Com isso, abrem-se novos espaços para a instituição
de um debate fecundo sobre todos os aspectos da construção de uma nova sociedade
e uma nova Nação brasileira no século XXI. (MOORE, 2007, p. 24).
que por vezes são responsáveis pelas piores prestações de serviços à maioria da população
negra.
Portanto, é necessário e urgente que se lute contra essa nocividade que é o racismo
e os seus efeitos e mais, que o perceba como uma arma que, muita das vezes, se apresenta
sendo “arma branca”, como registrou Moore acima. Não é intenção posicionar-se como uma
manifestação de racismo ao avesso, pelo contrário, e nem tem como ser, são constatações
seculares, que o poeta Cruz e Souza (1943) já relatava em seu poema intitulado “O
Emparedado”. Na ocasião, o autor já registrava o pesado fardo na sociedade brasileira, que é
ser portador de uma quantidade considerável de melanina. Lamentavelmente, ainda hoje, esta
realidade faz-se presente na sociedade brasileira, com o “simbólico nome de racismo” que
cada vez mais vem emparedando a população negra.
Essas “pedras”, manifestações de racismo, registradas no poema acima,
atualmente, podem ser vistas em várias situações no Brasil e no mundo. Um caso recente e
que provocou reações (algumas equivocadas) em boa parte do mundo foi o protagonizado
pelo jogador de futebol, o lateral direito Daniel Alves que no durante uma partida de futebol
em Villarreal, Espanha, aos 30 minutos do segundo tempo, um torcedor jogou uma banana no
campo, na direção do lateral, que inusitadamente pegou-a e comeu (RACISMO..., 2014). Essa
ação por parte do jogador foi louvável, pois o jogador não se curvou perante essa
manifestação de racismo, pelo contrário ergue-se majestosamente como vem fazem vários
consagrados personagens negros, com base em Araújo (2004), a exemplo: Zumbi dos
Palmares, Cruz e Souza (poeta ímpar do Simbolismo brasileiro); Luís da Gama (poeta); o
historiador, linguista, engenheiro e administrador Teodoro Sampaio; o primeiro editor
brasileiro e também poeta Paulo Brito; os escultores Francisco Antônio de Lisboa (o
Aleijadinho) Rubem Valentim, Emanuel Araújo (curador do Museu Afro Brasil, em São
Paulo) e Mestre Didi; os médicos Luís Anselmo, Juliano Moreira, Jurema Werneck (Crioulas)
e Luís Ferreira Alves, ativista do Centro do Cultura Negra do Maranhão (CCN-MA); os
pintores Teófilo de Jesus, Estevão Silva e Firmino Monteiro. Além da professora-mestre do
curso de turismo da Universidade Federal do Maranhão Maria das Graças Reis Cardoso; o
antropólogo Carlos Benedito da Silva, dentre outros que não se curvaram perante as perversas
manifestações de racismo ocorridas no Brasil. Pelo contrário, reagem e contribuem para um
legado de resistência promovido já nos primórdios do período escravocrata por vários
africanos e africanos que foram trazidos para o país nas condições mais avessas e que, apesar
de não terem seus nomes escritos no quadro da historia do Brasil, fizeram uso da resistência
como mecanismo de sobrevivência.
24
como mecanismo, também, de preparo para o próximo subcapitulo que trata da cultura afro-
brasileira.
Como já foi dito anteriormente a cultura insere-se em processo étnico como parte
das informações pertinentes do indivíduo ou grupo social. Essas informações estão em
comunhão com a etnicidade, como já foi esclarecido.
De forma que, neste capítulo, tem se traçado uma verdadeira jornada pela área da
cultura e etnicidade, debruçando-se sobre a sua vasta literatura até desaguar no interesse
maior que é a cultura afro-brasileira. Ressalta-se que esta jornada apresenta-se devido a
grande relevância que o assunto tem para o desenvolvimento deste estudo monográfico, que
tem como finalidade analisar em um espaço museológico a cultura afro-brasileira no cenário
turístico ludovicense. Primeiramente, fez-se um recorte apresentando algumas definições
pertinentes, para o estudo, sobre cultura e etnicidade justificadas por autores que,
familiarizados com os temas, elaboraram conceitos.
Nesse mesmo caminho, apresenta-se neste subcapítulo, a cultura afro-brasileira,
razão maior desta abordagem, procurando compreendê-la através dos valores referenciais, que
são elementos primordiais para entender, por exemplo, porque o povo negro tem uma conexão
espiritual com a música assim como com o corpo? Por que, para religião de matriz africana, o
Ori (cabeça) é uma região sagrada do corpo humano? Qual o significado do mexer comida de
forma circular? Essa e outras questões referidas ao povo negro só podem ser respondidas
compreendendo os valores referenciais, que são alicerces de resistência e resiliência e que
sublinham a importância dessa cultura para o universo turístico étnico brasileiro.
Assim, todas essas reflexões, foram e são mecanismos preparatórios utilizados
para tal compreensão e auxílio para entender em que contexto encontra-se a cultura afro-
brasileira, que acaba sendo uma ramificação da cultura nacional, com base na contribuição
africana. Ressaltam-se as existências das outras culturas, também vertentes nacionais, com
base na contribuição dos povos europeus e dos povos indígenas; todos, lembretes do alicerce
cultural qual está deitado “eternamente em berço esplêndido”, o Brasil.
Todavia, o interesse aqui, está voltado para a cultura afro-brasileira, por essa
razão, procura-se compreendê-la diante do cenário cultural nacional e assim despertar um
26
olhar para uma compreensão etnocultural com base na exposição de elementos dessa cultura
em um espaço museológico.
De acordo com o Portal da Cultura afro-brasileira (FAEC, [200?]), denomina-se
cultura afro-brasileira o conjunto de manifestações culturais brasileiras que sofreram de
alguma forma, influência da cultura africana desde o Brasil colônia até os dias atuais. Essa
cultura africana se materializou no país através da presença dos diferentes povos que foram
retirados violentamente desse continente (África) para trabalharem em diversos setores da
economia colonial brasileira. Segundo o Portal, essa cultura africana, no Brasil, sofreu
influência também das culturas dos povos europeus, sobretudo dos portugueses, e indígenas,
de forma que as características de origem africana na cultura brasileira encontram-se em geral
mescladas a outras referências culturais.
Com já foi mencionado, diante do intenso tráfico negreiro qual Prandi (2000)
chama de “infâme comércio”, milhões de africanos, mesmo na condição de escravos,
povoaram diversas regiões do Brasil e espalharam seus saberes e fazeres que culminou na
constituição da cultura afro-brasileira. Regiões como, “Maranhão, Pará, São Paulo, Rio de
Janeiro, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio
Grande do Sul, Goiás e Mato Grosso são oficialmente reconhecidas como locais que mais
receberam afluxos de escravos para trabalharem no campo de fumo, cacau, cana de açúcar; no
cultivo de algodão; na agricultura, na mineração, nos serviço doméstico do complexo casa
grande e senzala e nos serviço urbano” (PRANDI, 2000, p. 55).
Logicamente, esses locais se destacam por apresentarem maior carga de herança
africana no Brasil, no entanto, como a cultura não é um processo estático e sim dinâmico, esta
herança não ficou restrita a esses territórios, expandiu em proporções maiores que o infame
comércio poderia prever. Prandi (2000) comenta que a cultura africana foi se diluindo na
formação da cultura nacional correspondendo, assim, a um vastíssimo elenco de itens que
abrangem a língua, a culinária, a música e artes diversas, além de valores sociais,
representações místicas e concepções religiosas.
É a partir desses itens que se localiza, define e compreende, neste estudo, a cultura
afro-brasileira enquanto conjunto de manifestações culturais brasileiras influenciadas pela
cultura africana. Assim, mesmo que durante anos ela tenha sido negada ou escamoteada com
base no errôneo pensamento que os povos africanos eram desprovidos de cultura,
principalmente no período de escravidão e ainda no pós-abolição, ela resistiu e persistiu
passando por um longo processo dos quais vários foram usados para deixarem-na no campo
da invisibilidade. Porém, muitas foram às lutas e muitos foram e são os autores que
27
incumbiram-se de manterem viva toda essa produção cultural, que apresenta-se como uma
resposta resiliente a toda diversidade encontrada pelos africanos, já citados, nas terras
brasileiras.
Hoje, a partir de um período de revalorização e de um processo de diluição,
presente em qualquer junção de culturas, é inegável a existência da cultura afro-brasileira que
está respaldada nos preceitos africanos.
Ressalta-se que para compreender e conhecer a cultura afro-brasileira, é
necessário pontuar os valores civilizatórios que diante da compreensão de etnicidade permite
que se tenha um amplo olhar acerca dessa cultura e, para além do reduto cultural, no que se
refere ao Brasil, possa-se aprender a reconhecer que “diante uma perspectiva civilizatória
somos, de certa forma ou de certas formas, afrodescendentes. E, em especial, somos o
segundo país do mundo em população negra” (TRINDADE, 2005, p. 30).
De acordo com Trindade (2005), os valores civilizatórios estão inscritos em nossa
memória, no nosso modo de ser, na nossa música, na nossa literatura, nas nossas ciências, na
arquitetura, na gastronomia, religião, na nossa pele e no nosso coração. Portanto, ainda de
acordo com a autora, quando busca-se compreender ou mesmo vivenciar a cultura afro-
brasileira está comungando dos princípios e normas que corporificam um conjunto de
aspectos e características existenciais, espirituais, intelectuais e materiais, objetivas e
subjetivas que se constituíram e se constituem num processo histórico, social e cultural que
foram e são produzidos pelos africanos e seus descendentes no Brasil.
Pontua-se como um lembrete: a cultura afro-brasileira não deve ser compreendida
sob os preceitos euro-centrista, pois se o fizer perde-se a essência dessa cultura que são esses
valores, essas referências que se apresentam, de acordo com Brandão (2006), hibridizados,
interpenetrados, obedecendo aos fluxos e conexões que se dão na cotidianidade e na imersão e
absorção dessa dimensão civilizatória. Esses valores não são concebidos de forma linear e
assim devem ser percebidos, eles estão interligados. Há uma conexão onde um completa o
outro. Dessa forma, não tem como entender ancestralidade sem compreender memória ou
energia vital, muito menos corporeidade e nem circularidade, e cooperatividade sem falar em
oralidade, musicalidade e ludicidade. A religiosidade precisa de todos esses valores para
completar a percepção de que todos, absolutamente, todos estão interligados perante esse ou
aquele universo.
Dessa forma, não se pode compreender a cultura afro-brasileira sem recorre á
esses elementos, por exemplo, de acordo com Trindade (2005) e Brandão (2006), o princípio
do axé, da energia vital esse valor está alicerçado no cotidiano, no fluxo, e no imponderável
28
Essa fala é de um griot1 no documentário, acima citado de 1988, que registra toda
sua indignação perante a frustrada tentativa dos escravocratas de promover esquecimento nos
escravos africanos
Outra referência para se compreender e reconhecer a cultura afro-brasileira é,
segundo Brandão (2006), a ancestralidade, esse valor como todos os outros está muito
interligado com os demais, principalmente, com a memória e tem sua relevância regida sob a
importância de compreender que os antepassados foram e são responsáveis pelo não
esquecimento de quem somos e de onde viemos. São as representações das raízes africanas,
os condutores da memória.
No Candomblé a gente tá muito ligada á água, á terra, e a folha, a gente não pega
uma folha a mais do que precisa, a gente trabalha com a terra porque é lá que
plantamos o que nós vamos comer e na água está a fertilidade dos peixes... (Ebomi
Vera d’Oxum). (OLIVEIRA, 2010 apud BRANDÃO, 2006, p. 59).
1
Griots: como são chamados na África, os contadores de histórias. Eles são considerados sábios muito
importantes e respeitados na comunidade onde vivem (COMPANHIA DOS JOVENS GRIÔTS DA
BAIXADA FLUMINENSE, 2003).
30
formas que deram às africanidades brasileiras e que constituem tudo o que faz parte do
universo da criação negra”. A religiosidade é o “cimento” que sela tudo isso, ainda de acordo
com a autora, para as comunidades tradicionais de terreiro da Nação Ketu existe uma relação
visceral com a natureza, com o corpo, com o mito, com a dança, com a identidade e com o
feminino.
Consoante a Brandão (2006), a cultura negra através da religiosidade, busca
infligir respeito à vida, ao próximo. Logo, compreende-se, através desse valor, que tudo é
sagrado: a vida, o outro, o cozinhar, o vestir, o caminhar, o comunicar, o ouvir, o sentir,
dentre outros.
A cultura afro-brasileira é singular no seio da sociedade nacional, pois
compreendem além dos já citados valores a oralidade, este valor tem sua importância nesta
cultura por que permite que se ressalte a expressão oral como força a ser potencializada e
acima de tudo vivenciada. Na cultura afro-brasileira, oral não é uma negação da escrita, mas
como é frisado por Brandão (2006), é "uma afirmação da independência, de autonomia, de
comunicação, de contato”. Pois
a oralidade nos associa ao nosso corpo: nossa voz, nosso som faz parte do nosso
repertório de expressão corporal; nossa memória registra e recria nosso repertório
corporal-cultural; nossa musicalidade confere ritmo próprio, singulariza á nossa
corporeidade, está marcada pelo pertencimento a um grupo, a uma ou várias
comunidades, na medida em que, para nos comunicar com o outro, precisamos ser
reconhecidos por ele, estar em interação, em dialogo com ele. (BRANDÃO, 2006, p.
35-36).
Gil, Martinho da Vila, Clementina de Jesus, Pixinguinha, João do Vale... (musica); Ruth de
Sousa, Zezé Motta, Milton Gonçalves, Grande Otelo, Chica Xavier, (teatro e cinema).
No Maranhão, esse valor referencial transfigura-se no “contar história”. Prática
muito usada pelo povo negro para explicar alguns fenômenos naturais ou para falar de seres
imaginários, como: a estória do “bicho da cara preta”.
Outro exemplo de como a oralidade é uma referência presente na cultura negra é a
culinária, através do uso desse valor essa arte de cozinha no Brasil tomou dimensões africanas
e receitas de comidas dos povos africanos foram passando oralmente, como exemplo desse
processo tem-se o vatapá, caruru.
No Maranhão essa oportunidade de expressar esse valor referencial através da
culinária foi uma “argamassa” para os africanos rememorar todo viver em África. E, assim
acrescentar sua contribuição no processo formador deste Estado.
Recentemente, na Universidade Federal do Maranhão foi defendida, no curso de
Turismo a monografia intitulada Banquete dos Santos: compreendendo a valorização da
contribuição Gastronômica afro-religiosa Maranhense enquanto Patrimônio Cultural
Imaterial, da autora Denise Cerveira Tavares. Nesta, a autora, busca compreender essa
contribuição gastronômica oriunda dos banquetes dos orixás, que estão “afrobrasileiramente”
presente não só no cotidiano culinário maranhense, mas em todo Brasil.
Na musicalidade, este valor civilizatório apresenta a cultura afro-brasileira nas
mesmas dimensões do valor acima citado, de acordo com Trindade (2005), a música é um dos
aspectos afrobrasileiro mais emblemático. O povo negro é musical e expressa sua cultura
envolta desse valor. Como não perceber a presença da música nas mais diversas
representações culturais afro-brasiliera, por exemplo, a religião é regida pela música, da
mesma forma a culinária. No trabalho também há musicalidade, as quebradeiras de coco e as
lavadeiras, por exemplo, usam esse valor referencial como mecanismo de ameno do seu labor.
A cooperação/comunitarismo, consoante Trindade (2005, p.35), “a cultura negra,
a cultura afro-brasileira, é cultura do plural, do coletivo, da comunhão, da cooperação. Não
sobreviveríamos se não tivéssemos a capacidade da cooperação, do compartilhar, do
preocupar com o outro”.
Se assim não fosse não teríamos sobrevivido no período escravocrata e pós-
abolição, pois os povos africanos tiveram de se unir, cooperar entre si para sobreviver. Ainda
hoje esse processo vem acontecendo, principalmente, diante as mazelas provocadas pelo
racismo.
32
2.2 Identidade étnica negra e a luta pelo reconhecimento nacional: políticas de ações
afirmativas
a etnicidade do grupo étnico negro brasileiro. Da mesma forma aborda-se identidade como
um processo de identificação étnico negro, que na pesquisa faz-se necessário abordar, pois, a
comunidade negra constantemente faz uso desse mecanismo para se posicionar como um
grupo social de cultura e de etnicidade que são elementos de identificação necessário a todo
agrupamento humano, por essa razão será imperioso abordar algumas ações afirmativas para
consolidar essa compreensão.
Ressalta-se, que esses mecanismos auxiliam, no entendimento da pesquisa, na
compreensão maior que é como está sedimentada a Nação brasileira que, mesmo não estando
acabada, contou inicialmente com a presença de mais de 3 milhões de africanos escravizados,
além dos povos europeus e indígenas. Esses povos africanos foram responsáveis pela
transmissão desses valores na cultura afro-brasileira, isto permite compreender que essa
cultura está respaldada na identidade negra africana.
Esclarece-se que esse aglomerado de povos promoveu no solo brasileiro um
emaranhado de identidades, dentre elas a identidade étnica negra que terá sua importância
discutida nesta abordagem. Pontua-se que a referida identidade será, também, apresentada
alicerçada em alguns exemplos de luta do povo negro por reconhecimento nacional, antes,
porém procura-se compreender identidade. Lembrando que, essa discussão acerca de assunto,
é mais um momento importante para que se perceba a relevância da cultura negra neste país,
pois é através da cultura que o povo negro consegue se autoidentificar e por ela é identificado
perante a sociedade nacional.
Assim o processo de identificação consiste em um mecanismo importante na
promoção do reconhecimento nacional e de acentuação de etnicidade, por essa razão,
identidade na pesquisa tem esse destaque.
Segundo Ortiz (1985), identidade é uma construção simbólica, porém necessária.
O autor faz essa colocação a fim de deixar claro que, sendo a identidade uma construção, ela
não é única, muito menos “autêntica” ela é construída para determinado povo, indivíduo, se
compreenda e compreenda o mundo no qual está inserido. Assim sendo, ele acrescenta que
não deve ser perpetuado equívoco autenticando uma identidade, o que deve ser levado em
consideração, de acordo com o autor, é a pluralidade de identidades que são construídas por
diversos grupos sociais em diferentes momentos históricos. Posicionamento pertinente para a
compreensão da realidade identitária do Brasil que se constrói em envolto por várias
identidades, das quais a identidade negra é uma integrante. Fica, portanto, claro que cada
indivíduo, grupo, povo, nação têm sua identidade e isso não é e nem deve ser mecanismo de
segregação, de discriminação, de exclusão. Conforme foi mencionado, a identidade é um
35
processo construído, inconstante e viável para que tanto o indivíduo como o grupo social
compreenda e encontre respostas através da sua “lente” no mundo qual está inserido.
A identidade como um processo que ocorre no seio das relações sociais, aproxima
o indivíduo de seu grupo social e diferencia-o o dos outros grupos. Uma construção constante
de igualdade e diferenciação, que segundo Chebel (apud D’ADESKY, 2001), ocorre no
âmbito da subjetividade, por isso, é marcada por uma representação do “eu” nascida da
interação entre o indivíduo, os outros e o meio. É, ao mesmo tempo, um estado da pessoa, em
certo momento de sua existência, na qual uma das vertentes, negativa ou positiva, pode
predominar. Daí a importância dos elementos culturais, pois estes funcionam, perante os
grupos sociais, como um “elo” que afirma o indivíduo ao seu grupo e o grupo ao indivíduo.
Esses mesmo elementos podem, também, funcionar como um mecanismo que particulariza
um grupo perante os outros grupos. Por isso, mais uma vez, a importância se pontuar essa
discussão acerca de identidade, pois no momento que se propõe discutir a importância da
cultura negra, ou qualquer outra cultura, essa questão é de suma relevância, haja vista, que
tanto o indivíduo quanto o grupo social procuram por identificação e afirmação.
O homem é um ser social, ainda que exista alguns que afastam-se do convívio
humano, como os eremitas que, frequentemente, por motivos religiosos preferem viver
isolados, no geral, o homem é um ser que necessita do convívio, da interação com seus
semelhantes. Isto quer dizer pertencer a um grupo com características identificatórias comuns.
Em outras palavras, o homem quer fazer parte de um grupo no qual ele represente e sente-se
representado, onde possa comungar de uma mesma história, de uma mesma língua, de uma
mesma etnia e até de um mesmo território. Ser integrante de uma coletividade humana, cujo
reconhecimento do outro certifica sua existência. Isto equivale a pertencimento social.
Para D’Adesky (2001), a identidade implica um processo constante de
identificação do “eu” ao redor do outro e do outro em relação ao “eu”. É o olhar do outro que
faz aparecer às diferenças culturais e, por estas, a consciência de uma identidade. O autor
recorre ao psicanalista Erik Erikson para solidificar a compreensão de identidade. Para este
psicanalista a identificação é como um jogo de espelhos que por fim reflete o olhar individual
ao mesmo tempo em que reflete o olhar crítico ou lisonjeiro dos outros, possibilitam, assim,
sucessivos ajustamentos. Segundo ele, o fenômeno da identificação social, acaba por ser, uma
complexidade extraordinária.
Exemplificando um comportamento de identidade, enquanto processo de
identificação cultural, ou mesmo de espelhamento, registra-se a situação de um locutor de um
programa de reggae de uma rádio da cidade de São Luís, onde este comentou emocionado que
36
durante sua primeira viagem a Angola a cada rua que passava era como se elas estivessem
habitadas por um irmão ou primo.
O relato desse locutor, que se autoidentifica como negro, permite compreender
que sua emoção diante da presença do “outro” (negro) em Angola2, tenha sido provocada pela
certeza da existência deste “outro”; “homem que pensa e reivindica, que ama e que luta”
(MOURA, 1988). Não é que no Brasil, Maranhão, São Luís não haja negros, não é isso, é o
restabelecimento de um elo entre o passado e o presente; eram suas características culturais
“espelhadas” na forma de vestir, no contraste da pele com a cor da roupa, na forma de andar,
no gesticular; seus valores referenciais, que se materializavam nesse outro ser negro em
Angola, fechando um ciclo que por muitos anos ficou incompleto; Essa viagem proporcionou,
acima de tudo, a possibilidade de se ver refletido no outro sem o julgo do preconceito racial
que para os negros consiste em um pesado fardo. É justamente esse sentimento de
pertencimento, de espelhamento, de resposta que busca-se enfatizar na proposta desta
pesquisa.
Crê-se que diante a diáspora africana algumas lagunas ficaram impreenchíveis,
principalmente no seio da sociedade brasileira, que é uma nação que não se importa em
promover, para a comunidade negra, referenciais culturais capazes promoverem soluções e
respostas que venham sanar anos de questionamentos. Ciente disso, resguarda-se no direito de
apresentar essa singela vírgula (este estudo) como forma de assegurar a importância da cultura
afro brasileira não só para povo negro, mas para a comunidade brasileira no geral.
Ainda sobre identidade, esta também pode ser compreendida como um processo
coletivo onde, segundo Malek Chebel (apud D’ADESKY, 2001), a identidade individual é
uma passagem para a identidade coletiva e para melhor compreender essa noção recorre às
considerações do psicanalista Sigmund Freud, para quem cada pessoa participa de diversas
almas coletivas que são as da sua raça, da sua classe, da sua comunidade confessional, de seu
país, pois o ideal do eu tem um grande papel na compreensão da psicologia de grupo, visto
que, paralelamente ao seu aspecto individual, apresenta também um caráter social.
Apesar de cita esse posicionamento de Sigmund Freud, D’Adesky (2001), acredita
que a identidade coletiva não pode ser resumida como um simples sentimento de
pertencimento, porque, na realidade, a identidade coletiva é também um produto de um
processo de identificação. Quem esclarece essa ideia é o sociólogo Raimond Ledrut, citado
também por D’Adesky (2001), que observa que a identidade social do indivíduo está ligada ao
2
Segundo Albuquerque e Fraga Filho (2006), foi a maior fornecedora de africanos para o Brasil, mais de 52 mil.
37
Munanga (2005), também tem uma observação acerca dessa remoção ocorrida
com negro, abordada por Silva (1995), e estende um pouco mais sua observação chegando até
os imigrantes, dizendo que
[...] esses povos foram sequestrados, capturados, arrancados de suas raízes e trazidos
amarrados aos países do continente americanos, o Brasil incluído, sem saber por
onde estavam sendo levados e por que motivos estavam sendo levados. Uma história
totalmente diferente da história dos emigrantes europeus, árabes, judeus e orientais
que, voluntariamente decidiram de sair de seus respectivos países, de acordo com a
conjuntura econômica e histórica interna e internacional que influenciaram suas
decisões para emigrar. (MUNANGA, 2005, p. 1).
profunda ruptura com os elementos da matriz cultural das sociedades africanas, revelando,
assim, uma irreparável perda de identidade cultural.
Silva (1995, p. 111) acrescenta que
[...] a dificuldade que se coloca para a população negra reside no pensar a própria
diferença e de se pensar diferente, já que os sinais que marcam essas diferenças
foram diluídos no confronto com a sociedade nacional, bloqueando ou eliminando as
bases de sustentação coletiva da identidade.
O senador Paulo Paim – PT/RS acredita que essa luta vem bem antes. Segundo
ele, a luta empreendida pelo povo negro no Brasil já percorre vários séculos e a referência
mais pontual nessa empreitada, de acordo com o senador, “é o grande líder Zumbi dos
Palmares” que a partir de 1670, passou a comandar “a luta por liberdade e cidadania” (PAIM,
2006, p. 2).
Os anos se passaram e a luta continua. A Lei nº 10.639/2003, que alterou a Lei nº
9.394/1996 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), sancionada em 9 de janeiro
de 2003 pelo então presidente da República Luís Inácio Lula da Silva, onde determina a
obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileiras e africanas nas escolas públicas
e privadas do Ensino Fundamental e Médio. Jesus e Gomes (2013) vêm mais uma vez
demonstrar, no campo da educação, como povo negro no Brasil continua lutando
40
incessantemente. Acerca dessa lei, os autores Jesus e Gomes (2013) afirmam que o percurso
de normatização decorrente da aprovação dessa lei se “insere em um processo de luta” e “tem
como protagonista o Movimento Negro”, dentre outros. Revelam também que essa lei pode
ser entendida como uma medida de ações afirmativas, que segundo eles, são políticas,
projetos e práticas públicas e privadas que visam á suas desigualdades que atingem
historicamente determinados grupos sociais, tais como: indígenas, negros, ciganos, pessoas
com deficiência mulheres, homossexuais, entre outros.
Como resultado positivo dessa ação afirmativa educacional favorável ao povo
negro, segundo Gomes (apud BRANDÃO, 2010, p. 21) pode se reconhecer alguns impactos e
inflexões na educação brasileira, a saber: “ações do MEC e dos sistemas de ensino no que se
refere à formação de professores para a diversidade étnico-racial; novas perspectivas na
pesquisa sobre relações raciais, no Brasil; visibilidade á produção de intelectuais negros sobre
as relações raciais em nossa sociedade.” Além dessas ações, a autora reconhece também a
inserção de docentes da educação básica e superior na temática africana e afro-brasileira;
ampliação da consciência dos professores, no que diz respeito à questão étnico racial ser uma
responsabilidade de toda a sociedade nacional e o entendimento do trato pedagógico e
democrático da questão étnico racial como sendo um direito adquirido, como parte desses
impactos e inflexões ocorridas, após a adoção da referida lei no sistema educacional
brasileiro.
A adoção dessa lei educacional brasileira está em sintonia com a palestra “O
perigo de uma única história”, ministrada pela escritora nigeriana Chimamanda Adichie.
Nessa palestra, a escritora alerta para o grande perigo em conceber uma única história. Ela se
refere ao fato de haver, na memória coletiva, uma única história acerca da África, relacionada,
principalmente, ás suas terríveis catástrofes, mas, de acordo com Adichie, há outras histórias
que não são sobre catástrofes e “é igualmente importante, falar sobre elas” (ADICHIE,
[2012]).
Consoante Chimamanda Adichie, a consequência de uma única história é que ela:
“rouba das pessoas sua dignidade. Faz o reconhecimento de nossa humanidade compartilhada
difícil. Enfatiza como nós somos diferentes ao invés de como somos semelhantes”.
Portanto, crê-se, com a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-
brasileiras e africanas nas escolas públicas e privadas do ensino fundamental e médio
promovida pela Lei nº 10.639/03, a população estudantil brasileira terá oportunidade de
estudar, conhecer outra história acerca da formação do povo brasileiro, que perpassa pelo
continente africano. Isso provocará (se bem administrado) a possibilidade dos brasileiros em
41
cargos que antes não poderia ser vistos. Dessa forma é mais do que válida essas iniciativas,
visto que compreendendo de forma macro não é só a população desprovida que ganhará nessa
disputa por oportunidade na nação brasileira, mas toda a sociedade que lucrará em possibilitar
melhores condições para as camadas mais pobres e como já se sabe esse caminho é, na
maioria, feito pelas instituições de ensino superior que são internacionalmente reconhecidas
como locais que promovem conhecimento que consequentemente promovem maior
mobilidade social.
Esclarece-se que essas explanações referentes à adoção da Lei nº 10.639/2003 e a
adoção do sistema de cotas nas universidades brasileiras são mecanismos de lutas da
comunidade negra por reconhecimento nacional e foram citadas por se comportarem como
exemplos maiores no campo da educação. Todavia, existem outros de igual importância,
ainda no campo educacional, que no momento não são relevantes neste espaço de discussão.
O que fica claro nessa discussão é que o negro brasileiro nunca ficou inerte quanto à
promoção de melhorias para seu bem estar, no que se refere à sociedade nacional, e que
historicamente sempre esteve comprometido com as diversas modificações existentes no seio
desta sociedade.
Esses fatos, para a pesquisa, comportam-se como instrumentos para a visualização
da realidade situacional do povo negro e também para enfatizar a importância de se promover
mais trabalhos que certificam a presença da luta da comunidade negra por mais
oportunidades, direitos, liberdades e acima de tudo por respeitos a todo legado promovidos
desde os tempos primórdios da escravidão, onde os negros eram apenas cativos, até os dias
atuais. Pois, os elementos culturais dessa comunidade, ou seja, fazeres e saberes são
relevantes para promoção de conhecimento no contexto turístico e principalmente para
sublinhar mudanças na concepção de se pensar o turismo brasileiro de forma mais étnico.
De forma, que evidenciar o negro através dessas lutas por reconhecimento
nacional insere-se justamente nessa intenção de promover um olhar acerca da relevância da
produção cultural desse personagem brasileiro que muito tem a acrescentar para uma proposta
turística. Diante tudo isso, apresenta-se esse autor brasileiro nas razões já justificadas.
século XIX, o país possuía uma população estimada em 3.818.000 pessoas, sendo que das
quais 1.930.000 eram escravas. Em algumas regiões a população escrava chegava a “superar o
número de pessoas livres”. Por exemplo, no ano de 1872, no município de Campinas, São
Paulo, nesse momento grande produtor de café, o número de escravo na região era de 13.685
cativos, enquanto que a população livre estava em torno de 8.281 pessoas, ou seja, havia
5.404 escravos a mais que os habitantes livres da localidade.
Para Azevedo (1990), o número total de africanos negros que chegaram à colônia
portuguesa é “incerto”, no entanto, ela registra 3,6 milhões de negros. De acordo com a
autora, essa incerteza tem haver com a queima dos registros da chegada desses cativos. Sobre
isso ela informa:
A própria documentação histórica dos africanos no Brasil também foi vitima de
violência. Após a Lei Áurea, o ministro da Fazenda ordenou a queimada de todos os
documentos referente à escravidão.
A trágica fogueira ardeu na praça pública do Rio de Janeiro, no dia 14 de dezembro
de 1890. Lamentavelmente, cometeu se um duplo erro: não se destruiu no fogo os
sentimentos de racistas e retirou-se dos brasileiros o direito á preservação de sua
história. (AZEVEDO, 1990, p. 37).
presente na extração do ouro e “diamante das minas”, nas plantações e nas colheitas de cana,
café, cacau algodão e outros produtos tropicais de exportação. Pontuam que as mãos escravas
estavam presentes também, na agricultura de subsistências, na criação de gado, na produção
de charque, nos ofícios manuais e nos serviços domésticos. Comentam, ainda, que nos centros
urbanos, eram os escravos que se encarregavam do transporte de objetos e pessoas e eram a
mão de obra mais numerosa empregada na “construção de casa, pontes, fábricas, estradas, e
diversos serviços”. Cabiam a eles, também, a responsabilidade pela distribuição de alimentos,
como, por exemplo, os vendedores ambulantes e as quitandeiras, que, segundo os autores,
povoaram as ruas das grandes e pequenas cidades brasileiras.
Assim, reafirma-se a presença do povo negro e seus descendentes como
participantes ativos nesse processo de desenvolvimento histórico brasileiro que, ainda, não se
encontra acabado, mas em pleno desenvolvimento.
Todavia, lamenta-se quando alguns espaços sociais e midiáticos, sobretudo o
televisivo, coloca em evidência positiva apenas um desses atores sociais, a exemplo da
teledramaturgia brasileira que se posiciona majoritariamente branca. Não há nas telenovelas
brasileiras famílias constituídas por índios, por exemplo, como representante da população
nacional. Em relação ao negro, vem ocorrendo uma tímida movimentação no sentido de o
incluí nesse processo “democrático” televisivo, claro que há ressalvas.
Porém, da mesma forma como reagiram os escravos diante da escravidão, os
trabalhos realizados por Joel Zito tem se posicionado como mecanismo de resistência no
universo midiático. Joel Zito Araújo, doutor em Ciência da Comunicação, cineasta, autor do
livro e do documentário “A negação do Brasil”, muito tem contribuído para desmistificar a
imagem estereotipada do negro brasileiro no meio mediático. Os seus trabalhos são
ganhadores de prêmios importantes, como o Kikito de ouro do Festival de Gramado, onde o
filme “Filhas do Vento”, com um elenco composto por vários atores negros, em 2004 recebeu
seis prêmios, segundo a Revista “Isto é Brasil” (MORISAWA, 2004). Ainda segundo a
revista, em defesa do seu trabalho o cineasta comenta que está trazendo um novo paradigma,
que segundo ele, é um olhar de dentro, do ponto de vista de integração.
Ciente das valorosas contribuições de Joel Zito Araújo e outros, fora elas, o que se
percebe no geral é que o índio e o negro, principalmente, quando aparecem na mídia nacional
estão quase sempre sob o julgo da marginalização, isto é, os papeis designados aos atores
negros, normalmente são de pessoas sem ascensões sociais, posicionamentos políticos,
intelectualidade, enfim a eles são delegados papéis que de maneira alguma justifica a
relevância do negro na sociedade brasileira. Isto acontece, conforme Chaves (2008), sob a luz
47
3
Endereço dos vídeos no youtube original e a correção, respectivamente:
http://www.youtube.com/watch?v=idaAFaYXnAM e http://www.youtube.com/watch?v=FBwJtxCsWyQ.
48
mesclaram e originaram uma das nações mais multirracial do mundo e há presença desses
povos ou seus descendentes, sem nenhum erro de afirmação, nos centros urbanos.
Diante essa elucidação, não se afirma que não existam comunidades quilombolas,
indígenas, dentre outras comunidades, no contexto nacional passivas de planejamento e
explorações turísticas. Elas existem, são relevantes e já ocorrem ações bastantes pontuantes
no que se refere promover visitações turísticas a essas comunidades.
Nesse contexto, o quilombo de Ivaporunduva em Eldourado (SP), desde 2001
vem trabalhando o turismo étnico, onde tem proporcionado “palestra sobre a história e a
características da comunidade, trilhas, visitas á roça e almoço típico. Dependendo da época e
disposição dos visitantes, participam da barreação de casa de pau-a-pique e trabalho na roça.”
(QUILOMBOS DO RIBEIRA, [2011]).
Essas mesmas ações ocorrem de acordo Antonio Gois na Folha de São Paulo, em
Parati (RJ), onde é desenvolvido um roteiro turístico no quilombo de Campinho
Independente, nesse roteiro, semelhante ao quilombo de Ivaporunduva, são desenvolvidos
passeios por trilhas, visitas a núcleos familiares, almoços com pratos típicos e uma atividade
com contadores de história. Ainda, segundo a Folha, não só o quilombo em Parati que tem
atraindo turista, em Valença, 150 km do Rio de Janeiro, a Fazenda de São José já tem um
público de admiradores da cultura negra. Nessa fazenda são organizadas apresentação de
jongo, calangos e capoeira e é servida uma feijoada par os visitantes da localidade (GOIS,
2005).
Essa demonstração de potencial turístico étnico não acontece apenas nos
quilombos, são registrados, também, em comunidades indígenas, reconhecendo o turismo
étnico indígena. Como exemplo desse tipo de turismo temos o da Reserva de Jaqueira, em
Porto Seguro-Cabrália (BA) onde a aldeia dessa reserva, composta por índios pataxós,
começa receber visitantes para pratica de turismo. Os pataxós recepcionam os turistas com
manifestação de sua cultura. Os turistas têm a oportunidade de praticar jogos de arco e flecha,
adquirir artesanato produzido na própria aldeia, fazer trilhas. E ainda, experimentar a culinária
dos pataxós, como: peixe assado na folha de patioba (palmeira muito utilizada na confecção
de rede), de acordo com o site http://bahia.com.br/roteiros/reserva-jaqueira/.
Diante esses exemplos reafirma a importância do turismo étnico nas comunidades
tanto quilombolas como nas comunidades indígenas, e ainda existem outras. Crê na relevância
dessas iniciativas na sociedade nacional, pois oportuniza esse segmento turístico que vem
ressaltar a etnicidade brasileira que se apresenta nos moldes colorido dos vários povos
50
presente, assim como fornece possibilidade para essas comunidades sejam, em parte,
protagonistas do desenvolvimento.
Ciente dessas informações pontua-se que existem, também, oportunidades de
trabalhar o turismo étnico afro, por exemplo, nos grandes centros e isto já é uma realidade, em
Porto Alegre (RS), o Museu de Percurso do Negro (será abordado com ênfase no próximo
capítulo), acontece no centro da cidade onde conseguem enfatizar, durante um percurso, a
presença negra na formação da região e isso para, um registro histórico, cultural, social e
turístico brasileiro é de suma importância, pois certifica a participação negra nas várias
regiões do país e como foram e são relevantes para a compreensão da realidade nacional.
Logo, não têm como negar, esta nação é etnocultural e essas culturas, em especial
a negra, apresentam um leque de possibilidades (elementos culturais) reais de se trabalhar
tanto em comunidades quilombolas como nas cidades através de museus, por exemplo. Para o
turismo, isto, representa uma série de oportunidades, conhecimentos, sensações,
contemplações, vivências e acima de tudo de segmentação de mercado. Um desses segmentos
de mercado turístico (como já foi afirmado) é o turismo étnico negro, finalidade desta busca
por compreensão e conhecimento.
De forma que é relevante para o turismo no Brasil, que vem vivendo um
importante momento, essa compreensão de planejar ou organizar roteiros que trabalhem a
diversidade etnocultural do país, em especial o étnico negro.
Conforme Trigo (2010), no decorre da década (2000-2010), o turismo no Brasil
passou por várias transformações (econômicas, sociais e culturais), um dos reflexos dessas
transformações foi o reconhecimento de segmentos de mercado mais especializados e
delimitados, como o turismo afrobrasileiro, de acordo com o autor, três foram, dentre muitas,
as políticas oficias que incentivaram sistematicamente e deliberadamente o surgimento desse
segmento de turismo no Brasil, a saber:
Em 2006, o Ministério da Cultura e o Instituto do
patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) publicaram o livro “Os tambores da Ilha”.
O texto é uma das bases teóricas para oferecer subsídios ao turismo étnico afro no estado do
Maranhão, no nordeste brasileiro, um dos significativos polos culturais do país (TRIGO,
2010).
Outro exemplo é o manual organizado pela Secretaria de Turismo do Estado da
Bahia, intitulado Turismo étnico afro na Bahia, publicado em 2009, que foi acompanhado
pela organização do I Seminário Nacional de Turismo Étnico afro, em agosto de 2010, em
Salvador. Esse documento é uma importante referencia conceitual e histórica. Seu conteúdo
51
abrange os principais grupos étnicos afro da Bahia [...]. O texto ainda inclui cultura e religião
de matriz africana; festas religiosas e populares; os quilombos e a resistência negra na época
da escravidão; os circuitos e roteiros turísticos existentes e um calendário das atividades,
cerimônias e festas da Negra Bahia (TRIGO, 2010).
O terceiro exemplo é o circuito Rota da Liberdade que promove o resgate e a
valorização da história e da cultura negra no país por meio do desenvolvimento do turismo no
Vale do Paraíba, Litoral Norte e Serra da Mantiqueira, na divisa entre os estados de São Paulo
e Rio de Janeiro. [...] É uma rota marcada pelas antigas fazendas cafeeiras do vale do Paraíba
e remanescentes de quilombolas (TRIGO, 2010).
De forma que, esses acontecimentos, e ainda existem outros, respaldaram ainda
mais a existência do turismo étnico afro brasileiro como uma realidade a ser trabalhada, nos
moldes de outras regiões mundiais, como na cidade de Lisboa em Portugal onde o bairro do
Alto da Cova da Moura no Concelho da Amadora, na Freguesia da Branca; constituído na
maioria por Caboverdenses, através do “Projeto Sabura” tem destacados produtos étnicos, que
vão desde a gastronomia, a exemplo de elementos como: cachupa, moamba, caldo de peixe,
doce de coco, dentre outros; a venda de produtos de origem africana, como o feijão de pedra,
o feijão de congo, o grogue ou o ponche; até á arte dos cabeleireiros; a música, como: grupo
de batuque, discoteca, lojas de discos; além da oferta de aula de danças africanas, como:
funaná, kizomba, koladeira. (COSTA, 2004).
É válido este interesse étnico pelo turismo, principalmente, direcionado à
cultura negra no mundo. No Brasil, também, considera-se importante essas iniciativas, no
sentido de posicionar a cultura afro como uma oportunidade turística, no entanto, Trigo
(2010), vê problema, segundo ele “o problema fundamental que antecede qualquer
planejamento ou organização de roteiros étnicos afro no Brasil refere-se á correta
compreensão da complexidade das culturas negras existentes no país, em virtude de suas
diversas origens africanas. È pertinente a colocação do autor, porém esse aconselhamento
serve também para as outras culturas, aqui existentes, haja vista, que todas são hibridas, a
exemplo da lusitana. Em relação ao fato da cultura afro ser fundamentada nas diversas
contribuições dos povos africanos apresenta como uma oportunidade de conhecimento e de
exploração turística. Esta compreensão já é exposta no Museu Afro-brasileiro da
Universidade Federal da Bahia (MAFRO) que trata exclusivamente das culturas africanas e
sua presença na formação do país, promovendo um dialogo esclarecedor acerca dos vários
povos africanos que vieram escravizados para esta nação, através de uma rica coleção onde
encontra-se elementos culturais de diversos país africanos .
52
Assim, diante o que foi exposto o turismo étnico constitui como um segmento
emergente e necessário, principalmente, para a realidade cultura brasileira que se apresenta
pluri e assim sendo representa uma relevante oportunidade não só no planejamento ou
organização de roteiros em locais afastados ou intocáveis, mas em locais dos centros urbanos,
como os museus que representam dentro dessas cidades um ensejo de turismo étnico em que a
atração é o outro e sua cultura (COSTA, 2004), e em se tratando da cultura afro-brasileira
representa tudo e isso e a possibilidade promover um dialogo compreensivo e inclusivo da
real participação dos negros neste país continental.
memória nacional, na mesma proporção que faz com os elementos da cultura do povo branco,
isto, permite compreender, mais uma vez, que a sociedade brasileira tem e faz uso de espaços
institucionais para, constantemente, invisibilizar o negro como componente atuante deste país.
Cunha (2003, p. 274) amplia esse pensamento dizendo que
A constituição da convencional sociedade brasileira é marcada, em toda a sua
historicidade, por desejo de apagar, ou ao menos atenuar, elementos culturais
alienígenas ao quadro de referências culturais ocidentais europeias, dispostas como
definidora de nosso padrão cultural, marcadamente voltado para práticas e
representações de branqueamento. Esse processo envolveu seleções, manipulações e
negações, no qual memória e esquecimento dialogaram em jogos, onde diversos
mecanismos oficiais foram acionados e utilizados, entre instituições como escola, os
arquivos e os museus, nos quais a monumentalização da cultura esteve baseada na
exaltação de modos de ser, viver e lutar de culturas europeias, em detrimento de
culturas indígenas e africanas, tão fundamentais na formação de nossos sentidos,
saberes, experiências, sensibilidades e desejos, bases da construção da nossa
personalidade enquanto nação marcadamente mestiça, porém negada em nome de
uma superioridade e excelência da cultura europeia.
Localizado em Santa Maria, Rio Grande do Sul, o Museu Treze de Maio faz parte
das constantes lutas promovidas pelo povo negro no contexto nacional para se afirmar
enquanto povo promovedor da cultura nacional e da sociedade brasileira, por isso, o este está
inserido na categoria dos museus étnicos negros brasileiros, haja vista, que tem sob se uma
importante missão, que é a de preservar a memória e o patrimônio do grupo étnico negro no
Rio Grande do Sul, que segundo Escobar (2010, p. 48) é uma “região onde paira no
imaginário nacional como sendo é um Estado totalmente branco onde não existem negros”.
55
papel que “o Treze” desempenhou na construção das suas identidades, afirmado pelo site do
museu.
4
Segundo Zubaran e Machado (2013) com base no blog do MPN, Centro de Referência Afro-Brasileiro-CRAB é
uma instituição fundada no ano de 2009 para ser referencial da cultura afrobrasileira atuando na direção de
resgatá-la e valorizá-la.
5
Segundo Zubaran e Machado (2013) baseadas no site do Programa Monumenta. Monumenta é um programa do
Ministério da Cultura que visa á recuperação do patrimônio cultural urbano brasileiro. Atua em cidades
protegidas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
58
Senhora das Dores, segunda elas, áreas conhecidas hoje como centro histórico de Porto
Alegre. As autoras relatam uma importante decisão do Museu de Percurso do Negro, de
selecionar artistas negros para serem responsáveis pela elaboração de proposições estéticas
dos marcos físicos. Elas complementam, ainda, que as etapas de implementação do projeto
MPN envolveram pesquisa antropológica sobre os territórios negros urbanos de Porto Alegre,
confeccionadas pelo antropólogo Iosvaldyr Carvalho Bittencout Junior, e a definição do
circuito exporgráfico.
De acordo com Zubaran e Machado (2013), o projeto do Museu de Percurso do
Negro teve início em 2009, prevendo a criação de quatro marcos da presença negra na capital
gaúcha. Ainda de acordo com as autoras, até o ano da elaboração do seu artigo, três obras já
foram entregues à cidade: o Tambor, a Pegada Africana e o Bará do Mercado.
As obras públicas do Museu de Percurso do Negro de Porto Alegre, segundo o
blog do museu e Zubaran e Machado (2013):
Primeiro marco, o Tambor (Figura 3), inaugurado no ano de 2010, na Praça
Brigadeiro Sampaio, antigo Largo da Forca (assim designado por ser o lugar onde eram
enforcados criminosos entre os anos 1830 e 1860), segundo Zubaran e Machado (2013). As
autoras destacam que a escolha desse marco está relacionada também à presença de um antigo
chafariz nessa praça, onde os escravos se reuniam em busca de água para abastecer as casas
dos seus senhores. O Tambor foi produzido por um coletivo de artistas, entre eles: Adriana
Xaplin, Gutê, Leandro Machado, Elaine Rodrigues, Marco Antônio dos Santos, Mattos e
Pelópidas Thebano.
Figura 3 – Tambor
e publicações, dessa forma oferecer subsídio aos pesquisadores e inúmeros estudantes que
visitam o museu.
A coleção do Museu afro-brasileiro da Universidade Federal da Bahia é composta
por 1192 peças, dividida em dois eixos temáticos: a saber:
a) Coleção Cultura Material Africana – primeiro eixo temático, a cultura material
de origem africana está representada por objetos inspirados nas manifestações
da África tradicional, são: esculturas, máscaras, tecidos, cerâmicas, adornos,
trajes, instrumentos musicais, jogos e tapeçarias. Esse material museológico foi
adquirido na década de 70 pelo Ministério das Relações Exteriores ou doados
ao museu através das diversas embaixadas dos países africanos. A maior parte
da coleção é oriunda da África Ocidental, basicamente do Golfo do Benin,
ligada aos grupos étnicos yourubá e fon. Ainda existem alguns artefatos
originários da África Central (da área do Congo), Angola, da África Oriental,
de Uganda e Moçambique;
b) Coleção Material Afro-brasileira – segundo eixo temático do MAFRO. Este
eixo está composto por coleções cujas peças são inspiradas na cultura afro-
brasileira. Divide-se em: Capoeira, Bloco Afro e Folguedos, Artes Plásticas e
Cultura Material Religiosa Afro-brasileira.
A Coleção Capoeira é formada por peças ligadas á história dos Mestres Pastinha,
Bimba, Cobrinha Verde, Popó, importantes ícones que marcaram a trajetória da manifestação
cultural, capoeira, na sociedade brasileira. A maioria das peças é composta por instrumentos
musicais, fotografia dos mestres e alunos, medalhas, troféus, além de objetos de treinamentos.
Já a coleção Blocos Afros e Folguedos compõe-se por artefatos ligados ao
carnaval afro-baiano. São abadás, fantasias, estandartes e mortalhas que pertenceram a blocos
e afoxés.
Outra coleção é a das Artes Plásticas que apresenta uma reunião de obras de
diferentes temas produzidas por vários artistas, como: Carybé, Hélio de Oliveira, Manoel
Bomfim, Francisco Santos, Terciliano Jr, Emanuel Araújo, entre outros.
Por sua vez, a coleção Material Religiosa Afro-brasileira é composta por artefatos
relacionados basicamente ao candomblé baiano, com predominância de objetos das tradições
orubá e fon, fundamentada nos elementos das nações nagô, ketu e jeje. Subdivide em quatro
classes: Insígnia; Instrumento Sonoro; Utensílio e Vestuário.
Em relação à exposição o objetivo do MAFRO é fazer um trabalho de
preservação, valorização e divulgação das culturas africanas e afro-brasileira. Assim sendo, a
64
exposição torna-se um caminho viável para realização dessa missão, de forma que o museu
tem apresentado exposição de longa duração e temporária. A primeira exposição, como já foi
relatada, está baseada em duas grandes temáticas: África e Religiosidade Afro-brasileira.
No caso da segunda, no ano de 2013 o MAFRO realizou duas exposições
temporárias, “Exú: outras fases” e Kiebé-Kiebé: Dança iniciática do Congo. A primeira
exposição aborda Exu, a importante divindade das tradições afro-brasileiras, fora do espaço
religioso a partir de novas percepções que vão além do sagrado. Kiebé- Kiebé: Dança
iniciática do Congo, outra exposição temporária, que trata de uma manifestação cultural
exclusiva dos povos bantus do Congo Brazzaville e que pela primeira vez fora representada
longe do continente africano, cumprindo assim uma das responsabilidades do Museu em ser
um espaço de aproximação do Brasil com os países africanos, agora de forma positiva.
O Museu Afro Brasil não pretende ser um museu do negro ou sobre o negro, museu
de gueto étnico ou cultural, nem tão pouco um museu folclore, reduzindo a
“curiosidade do passado” às raízes mais profundas das expressões da cultura afro-
brasileira. Ao contrário, o museu propõe a re-visitar nossa história, passar a limpo
nossa memória, para interrogar-nos sobre a formação da nossa sociedade e nossa
cultura, fazendo-o, porém, da perspectiva do negro, a partir do olhar e da experiência
do próprio negro. Não reconhecer ao negro o direito a esse lugar, negar a
importância de sua contribuição, que perpassa todas as manifestações culturais do
Brasil, seria passa um mata-borrão sobre uma saga de mais de cinco séculos e dez
milhões de africanos triturados na construção deste país. (CUNHA, 2006).
com intenção de auxiliar reflexões, através da sua tese de “Teatro das Memórias, palco de
Esquecimentos: Culturas africanas e diásporas negras em exposições”, acerca de mensagens
que estão sendo veiculadas por meio de exposições, sobre tradições, costumes, crenças e
valores, modo de ser de africanos e seus descendentes das diásporas, Cunha (2006, p. 20); e
Marina Soleo Funari que apresenta o Museu Afro Brasil como a voz do negro nos tempos
atuais que, em um só espaço, consegue se comunicar através da sua história, arte e cultura-
após séculos de escravidão, discriminação e desigualdade, Funari (2011, p. 4).
A história do Museu Afro Brasil, localizado em São Paulo, inaugurado em 2004,
dá-se a partir da coleção particular do diretor Curador Emanuel Araújo, que já tentará
frustradamente viabilizar a criação de uma instituição voltada ao estudo das contribuições
africanas à cultura nacional quando, em 2004, apresentou uma proposta museológica a então
prefeita de São Paulo, Marta Suplicy. Encampada a ideia pelo poder publico municipal, deu-
se o projeto de implementação do museu. Foram utilizados recursos advindos da Petrobrás e
do Ministério da Cultura através da Lei Rounet. Assim, desde 2009 o MAB é uma instituição
pública, vinculada à Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo (MUSEU AFRO BRASIL,
[2014]).
Localizado no Pavilhão Padre Manoel da Nóbrega, dentro do Parque Ibirapuera
(local de grande prestígio e ponto turístico de São Paulo). Conserva, em 11 mil m², um acervo
com mais de 6 mil obras, que estão distribuídas entre pinturas, esculturas, gravuras,
fotografias, documentos e peças etnológicas, de autores brasileiros e estrangeiros, produzidos
entre o século XVIII e os dias atuais. Contemplam, através dessa distribuição, diferentes
aspectos dos universos culturais africanos e afro brasileiros, abordando temas como religião, o
trabalho, a arte, a escravidão, entre outros temas registra a trajetória histórica e as influências
africanas na construção da sociedade brasileira.
De acordo com Cunha (2006, p. 235), este museu insere-se em projeto integrado
que busca ir além da sua exposição de longa duração, com uma dinâmica programação de
exposições temporárias, programas de atendimento a públicos diversificados; Biblioteca
(Carolina Maria de Jesus) e um Auditório teatro (Ruth de Souza), no qual tem sido realizada
uma programação que coloca em cena representantes de artes performáticas tradicionais e
contemporâneas afro-brasileira, como as exposições “O Imaginário do Povo Brasileiro” e
Branco e Preto, Brasil Preto e Branco, ambas realizadas no ano de 2005.
De acordo com Funari (2011), o Museu Afro Brasil compõe-se de exposições de
longa duração, temporária ou itinerante, segundo a autora, essas exposições trazem consigo as
particularidades de seu curador que busca quebrar padrões ocidentais através do seu olhar
66
negro para a arte negra. Entre essas particularidades estão às misturas de elementos, como:
música, dança, texto, fala, cor e luz, que segundo ela, proporciona ao expectador experiências
sensoriais.
Ainda de acordo com a autora, a acervo da exposição de longa duração,
atualmente, está divido em 06 núcleos: África: diversidade e permanência; Trabalho e
escravidão; As Religiões afro-brasileiras; Sagrado e profano; História e memória e Artes
plásticas: a mão afro-brasileira.
Diante disso, partimos das contribuições encontradas no “Projeto de Implantação
do Museu Afro Brasil” (IPPFF; PREFEITURA DE SÃO PAULO, 2006) ao tratar dos núcleos
da exposição de longa duração do Museu Afro Brasil, como forma de organização de um
trabalho voltado para a apresentação da cultura afro-brasileiro em um espaço museal. Ciente
disso, na figura 8, são apresentadas as exposições permanentes do Museu Afro Brasil
divididas em seis núcleos, a saber: Diversidade e permanência; As Religiosidades Afro-
Brasileiras; Sagrado e Profano; Trabalho e Escravidão; História e Memória; Artes Plásticas e
Mão Afro-brasileira (Figura 8).
Figura 8 – Exposições permanentes
Afro Brasil. Em 2006 realizou o curso de Teatro Vocacional no Museu Afro Brasil. Anterior a
esse, no mês de março do mesmo ano, o museu promoveu em parceria com a Secretaria de
Educação do município de São Paulo o curso História e Cultura Afro Brasileira: Ensinar e
Aprender na Diversidade, com a responsabilidade de preparar professores para o ensino de
questões relativas á cultura e a história África e Brasil.
Por toda essa programação pontua-se o Museu Afro Brasil como modelo de
espaço museológico diferenciado, no que se refere às questões relacionadas à etnicidade
negra. Nas palavras de Cunha (2006, p. 246), conclui-se: “este é um local de novas
referências, abordagens, no qual são nomeados os protagonistas negros da nossa história, que
normalmente são mencionados como coadjuvantes. O seu discurso procura valorizar a
participação de negro em todos os segmentos sociais, fugindo do lugar comum e recorrente
das suas representações apenas enquanto artistas, jogadores, ou personagens folclorizados,
apesar destes locais também serem enfocados na exposição”.
Diante essa oportunidade de conhecimento acerca desses espaços étnicos negros
que tem pontuado significadamente para uma procura turística por espaços museal que
trabalham os saberes e fazeres do povo negro de forma positiva.
Esclarece que muito poderia contribui para o estudo, caso fosse disponibilizado o
número de visitação desses espaços museal étnicos negros. Foi solicitado (por e-mail) aos
referidos museus a possibilidade de obter essas informações, no entanto até o final da
pesquisa nenhuma resposta foi enviada.
Mesmo ocorrendo esta pequena vírgula as informações encontradas através de
sites, blogs e artigos foram suficientes para compreender a existências desses espaços e como
eles estão posicionados no contexto museal étnico brasileiro. Dessa forma, conclui-se que
esses espaços são relevantes para a preservação, manutenção e a propagação da cultura negra
no cenário museal e turístico brasileiro. Consoantes esses museus étnicos negros apresenta-se
o Museu Cafua das Mercês.
69
colher informações dos visitantes do Museu Cafua das Mercês. Dessa forma, elaborou-se um
questionário devidamente estruturado com 11 questões composto de perguntas abertas e
fechadas, onde buscou conhecer o perfil do visitante, as opiniões destes acerca do espaço, sua
percepção acerca da relevância da cultura afro-brasileira para o turismo local.
Como já foi relatado as entrevistas foram realizadas com representantes de
instituições envolvidas com questões étnicas raciais negras no Estado do Maranhão. Ressalta-
se que para obtenção das entrevistas de forma mais segura, fez-se uso de equipamento de
gravação que foi de suma importância para transcrição posterior.
Nenhuma pesquisa está isenta de limitações, qualquer que seja, portanto,
pontuam-se as encontradas nesta pesquisa. Parafraseando Carlos Drummond de Andrade: no
caminho tinha umas pedras, tinha umas pedras no caminho.
A primeira “pedra” foi referente às referências bibliográficas, como a pesquisa
trata, em suma, da questão negra, (não está se pontuando a inexistência de assunto referente à
cultura negra) buscou-se referências que pontuassem a contribuição do povo negro de forma
positiva, sem as entrelinhas preconceituosas e os velhos propagados espaços: escravos,
escravidão, vitimizados, sem ascensão social, inexistentes. Como a pesquisa enveredou por
uma busca da relevância da cultura negra, tais posicionamentos foram dispensados, por essa
razão o trabalho foi árduo.
Outra “pedra”. Diante da proposta da pesquisa em analisar a cultura afro-brasileira
através de um espaço absorvido pelo turismo, no contexto maranhense, acreditou-se na
importância de posicionamento de alguns órgãos responsáveis pelo turismo maranhense,
refere-se: a Secretaria Estadual de Turismo, Secretaria Municipal de Turismo, a Central de
Informação ao Turista e a Secretaria de Cultura do Maranhão, que não é um órgão delegado a
trabalhar com o turismo, porém como a suas atribuições estão direcionadas à cultura
compreendeu sua importância na mesma categoria dos órgãos que trabalham com este.
Estes órgãos foram procurados pela pesquisadora que não obteve um retorno
convincente a cerca do Museu Cafua das Mercês (Museu do Negro). Por exemplo, quando
buscou a Central de Informação ao turista a fim de saber se diante uma procura por espaços
culturais, o museu era citado como um espaço a ser visitado. As respostas foram vagas e
disseram que não indicam nenhuma localidade ou espaços, só orientam o que o turista procura
e recomendaram que a pesquisadora procurasse as secretarias.
Na procura pelas Secretarias para saber se havia alguma ação atual ou futura
direcionada para o Museu do negro. Eis os acontecimentos: na Secretaria Estadual do
Turismo, o atendimento foi ótimo, porém não obteve nenhuma resposta positiva, pois
73
segundo comunicação não trabalham com essas propostas. O máximo que fazem em relação
aos museus é divulgar a Agenda Cultural, exemplar mensal da Secretaria de Cultura do
Maranhão que divulga as atrações e os locais culturais do Estado.
Na Secretaria Municipal Turismo, a pesquisadora foi “barrada” na porta, por uma
pessoa que não se identificou, porém disse que não tinha nenhum conhecimento e caso
houvesse alguma ação nesse sentido só a Secretaria de Cultura poderia responder, assim a
pesquisadora direcionou-se á Secretaria de Cultura do Maranhão. Na secretaria, solicitou a
secretária se haveria alguém que pudesse responder acerca do espaço museológico, segunda a
secretária não tinha ninguém para responder acerca do espaço, e novamente a pesquisadora
foi incumbida de procurar outro órgão, nesse caso, o Museu Histórico e Artístico do
Maranhão (MHAM) qual o Museu Cafua das Mercês está vinculado.
Em relação a essa procura, ressalta-se que foram várias as tentativas para
entrevistar a Chefe do MHAM, a Sr.ª Maria Luiza Raposo, diante várias respostas negativas
deste uma agenda repleta de compromisso até problema de saúde não obteve êxito na busca
por entrevista com a chefa do MHAM.
Mais uma “pedra”. Tentou-se buscar um olhar de um representante da
religiosidade afro-brasileira, a fim de obter um posicionamento que ajudasse a análise da
pesquisa, várias foram às tentativas que culminaram na não obtenção desse esse olhar. Esse
empedramento não prejudicou, de forma alguma, a pesquisa, uma vez que os problemas
servem para encontrar novos caminhos na busca do objetivo central, assim encontrou novas
soluções e a pesquisa transcorreu de forma satisfatória.
É válido ressaltar que no decorrer dessa trajetória obteve-se um “grande achado”
para a pesquisa: o depoimento de Dona Jazi, antiga funcionária do Museu Cafua das Mercês
que trabalhou 31 anos como guia do museu. Concedeu esse depoimento em 14 de março de
2014, por obra do acaso, mais que muito auxiliou a pesquisa. Assim, o próximo subcapítulo
terá como auxílio esse testemunho.
“Não se conhece tudo. Tudo o que se conhece é uma parte do tudo”. Este
pensamento africano traduz a intenção desta apresentação, pois não tem como conhecer todo
o museu, neste espaço de pesquisa, mas parte do que vai ser apresentado integra esse todo,
que é o Museu Cafua das Mercês (Figura 10).
74
O Museu Cafua das Mercês foi criado pelo Decreto Estadual nº 5.536 de, 05 de
fevereiro de 1975 (ARAÚJO JÚNIOR, 2011; RODRIGUES, 1995). Está vinculado ao Museu
Histórico e Artístico do Maranhão.
Localizado no bairro da Praia Grande, antigo local das grandes casas comerciais
do Maranhão, no início do século XIX, a Cafua das Mercês também conhecida como Museu
do Negro é um espaço cultural destinado a preservação da memória da forte presença, da
cultura afro no Maranhão.
Segunda a tradição, a Cafua (palavra de origem banto para caverna, cova, lugar
escuro e isolado) era um antigo depósito de escravos, construído no século XVIII para receber
os negros africanos, que desembarcavam no Portinho vindos da África, onde eram conduzidos
até o pequeno sobrado. Ali chegando eram amontoados em quartos pequenos para mais tarde
serem expostos, em praça pública, com uma placa no pescoço indicando o seu preço, assim
eram comercializados. No “Governo de Pedro Neiva de Sant’ana, então Governador do
Maranhão, a Cafua foi adquirida, restaurada e aberta a visitações” (FERRETTI, 2007, p. 1).
Em relação ao horário de funcionamento, o museu é aberto à visitação pública,
não há necessidade de agendamento prévio, exceto para instituições escolares e grupos
especiais. A Cafua funciona de segunda a sexta, das 9:00 às 17:00 horas. Ressalta-se que é o
único museu de São Luís que funciona na segunda-feira, este fato ocorre em razão de não
haver expediente no final de semana como acontece com os demais museus ludovicenses.
75
O acervo do museu Cafua das Mercês reúne diversas peças que transitam pelo
período da escravidão, da religiosidade afro maranhense, bem como da arte africana dos
povos vindos para o Brasil. O acervo está distribuído em dois salões dos dois únicos
pavimentos responsáveis por um circuito de exposição permanente da Cafua das Mercês. As
peças inseridas nesses espaços são providas de compras e doações.
76
Esse salão que fica localizado no térreo é a primeira comunicação do museu com
seu visitante e já de inicio ele retrata com base nos elementos expostos o período da
escravidão. Nesse inicio de contato o visitante encontra elementos de suplício e de tortura,
como gargalheira, as correntes, a palmatória de ferro e o tronco vira mundo (Figura 11).
Figura 11 – Algumas exposições do 1ª pavimento
Governadora Roseana Sarney que foi ao Rio de Janeiro e essas peças estavam em exposição,
ai ela comprou e doou para a Cafua. Não ficaram todas as peças aqui, dizem que era por que
a cafua é pequena, veio vária peças, só porta africana vieram 3 (três) e aqui parece que só
tem 2 (duas). As outras estão armazenadas. O vira mundo, palmatória de ferro já era da
casa, agora a tartaruga e o lagarto veio com essas peças africanas que foram doadas pela
Roseana. Ela achou essas peças muito bonitas na exposição comprou e doou para a Cafua. A
Cafua estava sem nada mesmo! Quando chegaram essas peças, foram retiradas todas as
fotos de mãe de santos que estavam aqui nesse pavimento. A mudança na disposição das
peças foi feita pelo um colega nosso Sebastião Santos. As peças de madeira todas foram
doação de Roseana, Eram 19 peças.
Esse primeiro pavimento do Museu Cafua das Mercês tem sua importância para a
história do povo negro no Brasil e no Maranhão, É uma parte da história que deveria ser
contata com mais informações e que seu foco central não relatassem apenas os elementos de
torturas e suplicio como a boa vinda da Cafua para seus visitantes.
Em Amaral (2001, p. 3), a ialorixá do Axé Ilê Obá, Silvia de Oxalá pergunta
Eles [instituições oficiais de memória e academia] veem o negro como escravo. Mas
os negros não foram apenas escravos. Tinham suas famílias, suas crenças, suas
comidas. Ninguém conta a história dos judeus, que também foram escravos, apenas
como escravos. Por que a história do negro tem que sempre a do povo escravizado.
Neste Segundo Pavimento, o Museu Cafua das Mercês apresenta uma sequência
de objetos mais contemporâneos, fugindo da zona de conforto de expor elementos referentes
ao negro através apenas da lente da escravidão. Assim, nesse salão encontra-se mais peças
centradas na arte africana, no sincretismo religioso, em personagens pontuantes na
religiosidade afro maranhense, dentre outros. A figura 12 expõe alguns desses elementos.
79
O circuito apresenta, ainda, dois registros fotográficos das duas casas de cultos
africanos mais antigas de São Luís (Casa de Nagô e Casa da Mina). O Museu Cafua das
Mercês, nesse segundo pavimento, homenageia, através de registro fotográfico, duas figuras
importantes e representativas das referidas casas de cultos: as mães de Santo Andressa Maria
de Sousa Ramos (“Mãe Andressa”), da Casa da Mina e Vitorina Tobias Santos (“Mãe
Dudu”), da Casa Nagô.
Através desse pequeno circuito de exposição permanente, registrado nesses
pavimentos, o Museu Cafua das Mercês propõe-se em apresentar e representar a cultura negra
afro-brasileira maranhense na intenção de promover um conhecimento e reconhecimento da
diversidade cultural existente no Brasil. Diante disso, singulariza a importância desse estudo
no sentido de ser uma oportunidade de averiguação desse espaço como um mecanismo
representativo da cultura afro brasileira no cenário turístico ludovincense.
presente no espaço museal ocorreu uma expressiva presença dos autóctones, sendo a maioria
da cidade de São Luís.
Gráfico 1 - Gênero
46% Masculino
54% Feminino
34% Branca
45% Amarela
Indigena
Preta
Parda
18%
3%
0%
Diante isso, conforme mostra o gráfico 2 a prevalência foi da cor branca com 45%
seguindo da cor parda com 34%; preta e amarela correspondem respectiva á 18% e 3% dos
entrevistados, a categoria indígena não pontuou.
Ainda conhecendo o perfil socioeconômico dos entrevistados identificou no que
tange ao quesito faixa etária que dos 56 visitantes do Museu Cafua das Mercês, consoante o
gráfico 3, a maioria possui a faixa etária entre 52 a 59 anos, o que corresponde a 23% dos
visitante. Já as faixas etárias de 18 a 25 anos e 43 a 51 anos estiveram igualmente
representadas pelos visitantes do museu, correspondendo a 48% comunidade e 52% turistas.
As pessoas com idade entre 23 a 33 anos e 34 a 42 anos correspondem respectivamente a 20%
e 14%. No momento da pesquisa não teve a presença de nenhum visitante com a faixa etária
igual ou maior de 60 anos.
Gráfico 3 - Faixa etária
0%
23% 22%
De 18 a 25
De 26 a 33
De 34 a 42
De 43 a 51
20% De 52 a 59
21%
≥ 60
14%
0% 2%
Ensino Fundamental
0% Completo
11%
Ensino Fundamental
Incompleto
Ensino Médio Completo
49%
25%
Ensino Médio Incompleto
20%
23%
De 1 a 3 salários
De 4 a 6 salários
De 7 a 9 salários
Mais de 9 salários
16%
29% Outros
12%
real (verificar os turistas e a comunidade) que pela as análises dos gráficos demonstram ser
um tipo de público consciente da sua procura por visitação. Um dos fatores que comprova
esse posicionamento e o nível escolaridade dos visitantes, onde a maioria possui pós-
graduação, o que leva a entender que a visitação nesse espaço não ocorreu de forma aleatória,
pelo menos por parte dos turistas, sem uma possível busca por esse tipo de demanda cultural.
Outro fator que respalda essa determinação é a renda, ou seja, o poder aquisitivo que diante a
realidade brasileira contribuem muito para uma disponibilidade de visitação tanto em espaço
museal como a qualquer outro espaço cultural, mesmo para a comunidade local. Por fim a
faixa etária, onde dos 56 visitantes a maioria apresentou idade entre 52 a 59 anos, sendo
seguida pelas faixas etárias de 18 a 25 anos e 43 a 51 anos comprovando certa maturidade dos
visitantes o que também influencia muito uma decisão por visitação.
Diante da apresentação do perfil dos visitantes do museu, o presente trabalho
entendeu ser de suma importância os seguintes questionamentos: se era a primeira vez que o
visitante frequentava o espaço museal; como ficou sabendo da existência da Cafua e se o
visitante tinha habito de frequentar museus étnicos negros. Eis as respostas em gráficos e as
devidas análises.
Gráfico 6 – É a primeira vez que você visita este museu?
5%
23%
Sim
Não
Não Responderam
72%
Perguntou-se, diante resposta positiva, para os visitantes de São Luís que tiveram
uma representação expressiva, porque ainda não tinham visitado esse espaço museal? Eis
alguns posicionamentos:
[...] sempre tive vontade de conhecer esse museu que fala do negro, mas ele fica
muito escondido e esse lugar é perigoso.
[...] a vontade era imensa, mas nunca tive oportunidade, por isso disse: da
próxima vez que for a São Luís vou visitar esse museu. É que agora estou morando em
Caxias. Só penso que deveria ser maior e ter mais coisas, não é?
[...] a cultura negra é importante, mas quase ninguém fala desse local aqui em
São Luis. Diante a minha vida escolar nunca nenhum professor tocou no assunto e muito
menos trouxe os alunos aqui. E eu não sou tão velha assim. Acho que foi por isso. Como ele
estava aberto, hoje, segunda-feira, resolvi encostar.
[...] sei lá! Sempre morei em São Luís, a vida toda. Só agora achei jeito. Minha
prima que chegou da Bahia insistiu que queria conhecer o museu, aí eu vim junto com ela.
Ela ficou sabendo pela internet, parece que tem um site, sei lá!
[...] por que eu nunca visitei esse museu? Bem... Na verdade eu até tinha vontade
de conhecer, principalmente depois da reportagem que vi na TVMirante, mas ficava sempre
adiando, hoje que vim nesse evento que está acontecendo no Convento das Mercês resolvi
entrar, só não sabia que era pago.
[...] é vergonhoso e olha que sou professor de história.
[...] a gente sabe da importância da cultura negra para esse país, principalmente
para o Maranhão que é um dos estados brasileiros com o maior número de negros, porém
ficamos nessa inércia, eu mesmo só vim por que mamãe que mora em Brasília veio aqui no
Reviver e como ela gosta de visitar Igreja e formos naquela ali, quando saímos de lá
resolvemos olhar o museu. Mas confesso que esperava mais. Tem pouca coisa, é mais sobre a
escravidão.
[...] engraçado, esse museu que está na minha cidade nunca tinha visitado. Ah!
Mas já visitei outros museus do negro, viu? Um foi aquele fica em São Paulo, muito bonito e
grande. Lá têm várias peças e não só sobre escravidão. Tem até coisas do Bumba boi do
nosso Estado, bonito aquilo. Todo arrumado, as pessoas explicam tudo para você, parece que
não é coisa do Brasil. Lá tem coisas que a gente nem sabe que foi o negro que fez, pois é.
Também visitei o da Bahia, foi... faz um tempinho. Também é muito diferente desse daqui.
[...], pois é. Eu sabia que esse museu existia faz tempo, você não sabe como é
brasileiro? Deixa tudo para a última hora. Mas eu estou aqui (risos).
86
[...] nunca tinha vindo por uma questão de oportunidade, acho que foi por isso!
Diante desses posicionamentos observa-se que os entrevistados comportam-se
como se estivessem se desculpando pelo fato de não terem visitado o museu anteriormente.
Talvez tenham respondido dessa forma por estarem sendo questionados nesse momento. O
que ficou nítido é que as visitas, na maioria, foram feitas por acaso, mas nenhum dos
entrevistados respondeu que nunca tinha visitado o museu por considerar a cultura negra
irrelevante, ou seja, sem importância.
Essas falas em outra oportunidade equivalem à nova (as) análises importantes
para compreender a relação do Museu Cafua das Mercês com a comunidade ludovicense. A
priori, nesta pesquisa, são importantes para que se compreenda que a comunidade ludovicense
não tem a Cafua como um local museológico para ser visitado após um planejamento, ou seja,
as visitas orquestradas pelos moradores foram, diante essas falas, por acaso. No entanto,
ressalta-se que o museu trabalha com visitas agendadas por escolas de São Luís, que no
momento da pesquisa, aconteceram em dias e horários diferentes da aplicação do
questionário.
Gráfico 7 – Como obteve conhecimento deste museu?
Visitando em outros
museus
Indicação de
30% 31% Amigos/Parentes
Internet/Site do Museu
Radio/TV
9% Meios de Comunicação
Impressos
23%
5% Outros
2%
14%
Sim
Não
54% Não responderam
32%
Como a maioria dos entrevistados responderam que têm costume de visitar esses
espaços e isso normalmente ocorre diante um processo turístico, para a pesquisa é uma
sinalização da relevância da cultura afro-brasileira diante um cenário turístico.
Outra abordagem pertinente no questionário, foi o olhar do visitante acerca do
acervo etnográfico da Cafua. De acordo Pérez (2009), devemos analisar se as exposições
cumprem as expectativas dos visitantes para que só assim possa compreender a relação entre
museus, públicos e turismo. Nessa perspectiva, através do questionário, os entrevistados
foram arguidos acerca do acervo etnográfico do Museu Cafua das Mercês, que se apresenta
através de um circuito de exposição de longa duração.
Para a pesquisa o interessante foi compreender através dessa questão se os
elementos expostos nesse espaço satisfaz a necessidade dos visitantes de ter informações,
conhecimento acerca da cultura negra. Em função disso, a questão foi fechada e aberta. Na
questão fechada o entrevistado respondia se o acervo é: péssimo, ruim, bom, muito bom e
excelente. Na questão aberta solicitava que o entrevistado tecesse comentário, se achasse
pertinente.
O acervo de um museu é a concretização do diálogo que a casa se propõe fazer
com os seus visitantes, por isso, tal questionamento, para a pesquisa, foi de suma importância,
haja vista que o acervo da Cafua está inserido é uma prática bastante usada por aquele que se
propõe falar das questões negras no Brasil, que é colocar toda contribuição do povo negro sob
a ótica da escravidão. Como se esse povo e sua cultura não estivesse para além desses lugares
comuns.
Esclarece, que o objetivo da pergunta não era fazer o visitante desbravar pelo
campo da museologia e analisar peça por peça do museu. O que se propôs foi sua percepção
acerca do acervo de forma geral.
Assim, diante o gráfico 9, observou-se que avaliação do acervo como “bom”
prevaleceu, foram 50% dos entrevistados que o reconheceram assim. Alguns entrevistados
avaliaram que o acervo é ruim, foram 16% que afirmação essa porcentagem. Na avaliação dos
entrevistados, que foi de 18% a cafua tem um acervo péssimo. Outros avaliadores acharam ser
o acervo muito bom, foram 11%. Outra percepção era excelente, 5% acreditaram ser assim o
acervo. Como essa questão teve dois momentos de perguntas (fechada e aberta), expõe
alguns argumentos apresentados nesta pesquisa acerca do acervo referente às perguntas
abertas.
89
5%
16%
11%
Péssimo
Ruim
18% Bom
Muito Bom
Excelente
50%
com seus visitantes através da compreensão de que os negros aqui presente, ontem e hoje, não
obtiveram ascensão social e a cultura, resposta humana que permite ter essa observação, não é
mostrada com esse propósito. Não existe problema algum em apresenta elementos de
suplícios do período escravocrata, haja vista, que faz parte do contexto cultural do negro no
Brasil. O que chama atenção para esse acervo e os entrevistados reconhece é a insistência de
posicionar toda a contribuição cultural desses povos em uma única condição que a de escravo,
claro que têm outras leituras no museu, mas a primeira conversa (acervo do primeiro
pavimento) do museu com seu público é sobre a escravidão, com ênfase para os elementos de
torturas. O que dá entender ser esse olhar o mais importante.
Se assim o faz é porque reconhece apenas essa história, isso lembra o que a
escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie falou acerca do perigo de se conhecer apenas
uma história. No caso da história do negro brasileiro é uma “mutilação” perante todo acervo
histórico, cultural, humano que este povo teve e tem no universo brasileiro e com certeza o
turismo se interessa por essa informação ou esse conhecimento.
Outro “pesar” que vai mais ou menos à direção da explanação acima é o fato do
acervo ser pequeno. Foi uma reclamação bastante acentuada. Nessa observação, registra-se
uma diminuição de informação e conhecimento que diante o arsenal de possibilidade existente
na cultura negra, realmente é lamentável o acervo apresenta esse proporção de conhecimento.
Mais um “pesar” foi o registro do pequeno diálogo que vem sendo promovido
pelo acervo do museu para com os estudantes, visto que, algumas visitas agendadas são feitas
por escolas. Poderia ser uma oportunidade de fornecer um olhar mais esclarecedor acerca da
cultura negra neste país, mesmo não sendo seu público oficial, e não devera ser, pois museu
são casas públicas e como tal todos são bem vindos.
Todos esses “pesares” foram viáveis para dimensionar a relevância da cultura
negra. Como se observou são reclamações que vem em auxilio de melhor posicionar essa
oportunidade de conhecimento, que a cultura pode promover no cenário turístico ludovicense.
Os vários pesares “bons” regados de reclamações devem ser vistos como sinais positivos para
um reajuste desse espaço juntamente com seu acervo nesse cenário e para a comunidade, pois
esta também apresentou sua avaliação. Do mesmo modo é que devem ser visto os vários
“ruins” que não foram tão ruins, apenas olhares críticos no sentido de despertar para melhoras
para este espaço.
Perante esses posicionamentos dos visitantes acerca do acervo da Cafua deu para
perceber indícios de que a cultura afro-brasileira tem relevância no universo turístico, esta
percepção confirmou-se perante as respostas dos turistas e da comunidade de São Luís. Para
92
0%
Sim
Não
100%
4.3.2 Percepções de representantes de instituições envolvidas com questão étnica racial negra
no Maranhão
turismo de São Luís, essa responsabilidade duplica, pois cabe a este local apresentar um
diálogo que promova conhecimento tanto para sua comunidade como para os turistas.
Por essa razão, não podemos deixar de pensar na importância de apresentar, na
pesquisa, a percepção dos visitantes (analisado anteriormente), vendo-os como caminho para
compreender como está apresentada a cultura afro-brasileira no cenário turístico de São Luís.
Da mesma forma, compreendemos a necessidade de apresentar outras percepções, que não
são necessariamente visitantes museais, mas estão inseridos em contexto étnico racial negro
no Estado. Que são instituições que já têm uma longa caminhada com as questões étnicas, ou
seja, já venham desenvolvendo ações onde os fazeres e os saberes da comunidade negra são
abordados sob uma perspectiva positiva. Onde o negro tem visibilidade, tem mobilidade
social, tem seu intelecto ressaltado, enfim é ser ativo e atuante dentro da realidade brasileira.
Diante disso, partimos para inserir na pesquisa percepções de algumas dessas
instituições, pois compreende-se que o estudo necessitam da compreensão desses órgãos, para
que não haja um “silencio”, por parte do estudo, como acontece com outros levantamentos,
que tratam da questão negra e escamoteiam os verdadeiros personagens. Por essa razão, é
válido apontar esses olhares, visto que são personagens institucionais, ou seja, representações
coletivas da comunidade negra, o que permite compreender que apresentem respaldo para se
posicionar perante cultura negra.
Existe uma passagem na Bíblia que diz: se estes se calarem, as próprias pedras
clamarão (LUCAS 19:40). Para que as pedras não clamem, a pesquisa apresenta algumas
percepções de representantes das seguintes instituições: Núcleo de Estudos Afro-brasileiro
(NEAB) da Universidade Federal do Maranhão; Centro de Cultura Negra (CCN) e Secretaria
Extraordinária de Igualdade Racial.
Ressalta-se que compreendemos a relevância da percepção de alguma instituição
envolvida com religião de matriz africana, porém diante várias tentativas e a escassez de
tempo não teve como apresentar essa importante contribuição, mas como o processo de
aprendizagem é continuo, pretende-se buscar, em outro momento, esse posicionamento. O que
permite entender que outros levantamentos científicos acerca da Cafua acontecerão em curto
espaço de tempo.
Assim diante de um roteiro de entrevistas semiestruturadas, as perguntas centrais
foram elaboradas no sentido de compreender como essas instituições entende o espaço
museológico, ou seja, qual percepção desses órgãos acerca da Cafua das Mercês? Outra
questão foi saber se é relevante a apresentação da cultura afro-brasileira no cenário turístico
94
de São Luís. Perguntou-se também se essas instituições têm algumas sugestões que elas
consideram pertinentes para futura melhoria do espaço museal.
Na pesquisa pedimos que os representantes se identificassem e relatasse algumas
ações desenvolvidas pelas instituições que representam. Por essa, razão antes de adentrar no
contexto central da discussão, faz-se uma breve apresentação desses órgãos segundos seus
representantes.
Centro de Cultura Negra do Maranhão (CCN) é uma instituição do movimento
negro no Maranhão. Foi fundada em 19 de setembro de 1979. Fica localizada na Rua dos
Guaranis, S/N – Bares – João Paulo. O representante dessa instituição, na pesquisa, foi o
professor, médico e fundador do CCN Luiz Alves Ferreira,
De acordo com o professor Luís Alves, o CCN tem como função resgatar a
identidade negra e sua autoestima através da educação e da cultura. Na hora que você
destrói a cultura de qualquer povo ele estará destruído, ele está dominado, Almir Cabral
dizia isso, grande pensador africano. O CCN tem contribuído muito para melhor a condição
da população negra do Maranhão. A gente desenvolve seminários, palestras, encontros para
formação de quadros de militância o povo negro. Temos realizado organização de Encontros
de Comunidades Negras Rurais quilombolas, esses encontros têm fortalecidos essas
comunidades, além de está promovendo a criação de várias entidades do Movimento Negro
no Estado Maranhão. Organizamos também a Semana do Negro no Maranhão no Dia
Nacional de Denúncia Contra Racismo (13 de Maio) e Semana da Consciência Negra (20 de
novembro). Existem os Projetos Quilombo: Resistência Negra (PQRN), que atua em
comunidades negras rurais; Vida de Negro–PVN em parceria com a Sociedade Maranhense
de Direitos Humanos que desenvolve ações para os encaminhamentos legais, estudos e
identificação de áreas para titulação de posse definitiva pelos quilombolas; O Sonho dos
Erês destinado às crianças e adolescentes deste bairro onde trabalhamos com oficinas
educativas, artísticas e culturais; Religiões afrodescendentes e saúde, esse projeto objetiva
desenvolver ações de educação em saúde junto à comunidade de terreiros e casas de culto
afro-brasileiros identidade da população negra. Temos também o Bloco Akomabu, e o Grupo
de Dança Abanjá que sai às ruas no período de carnaval, das festas juninas, são grupos
culturais que promovido alegria, beleza e afirmação da nossa negritude neste Estado. Essas
são algumas ações, enquanto Centro de Cultura Negra que trabalha a conscientização, a
autoestima e militância política da negritude do Estado do Maranhão.
O Núcleo de Estudos Afrobrasileiro (NEAB) da Universidade Federal do
Maranhão esteve representado Sr. Carlos Benedito Rodrigues da Silva, professor doutor do
95
posicionado como um instrumento de tortura contemporânea para a juventude que chega lá!
Você tem que colocar coisas positivas na entrada. Por exemplo, quando cheguei lá só vi
frases de quem não são de negro, não vi frases do negro Cosme, do Padre Ribamar, não vi
nenhuma frase do Nascimento de Moraes (que é negro), enfim... Nenhuma frase de um
babalorixá como o pai Euclides. Mãe Dudu, está lá o retrato dela, mas é um retrato morto. É
como se fosse uma coisa morta, E quando você chega só ver coisas mortas, aquele
instrumento de tortura. Não é isso que tem que ser feito. Tem que colocar no inicio
instrumentos das coisas que o negro fez que construiu esse país, esse Estado!
O museu tem que ser um espaço dinâmico, que reflita nossa contemporaneidade,
a luta do negro, não só como escravo, mas nossas ações avançadas.
Na época, por que trouxeram o negro? Por que eram mais avançados na
agricultura. Cadê o instrumento de agricultura que o negro fazia isso lá? Algumas coisas
estão lá, mas são mortos. Aquelas molduras, os retratos, aquele material, e o instrumento de
arte que tem lá africana, uns são de origem africana, o que eles querem comunicar? Quando
as crianças vão lá, o que vão pensar?Nada! Não tem um diálogo. Até porque a maioria dos
professores do município e do estado não está fazendo nada, há um racismo institucional, no
Estado da cultura negra, em todo lugar, apesar de ter negros lá, mas eles não se sentem
negros! É preciso assumir a identidade e colocar isso em evidência. Não se faz isso com as
outras culturas? Sabemos que são importantes, mas não foram só elas que construíram esse
país, e o povo cigano? Assim como o negro ninguém quer falar. Tem que falar!
Tem o retrato da mãe Dudu, está certo! Mas não tem nada dela, o que ela era?
Qual a importância dela?
O museu não pode ser uma instituição morta, do jeito que estar lá ela uma
instituição morta. Ela reflete na entrada a violência sobre o negro, não é isso! Tem que
colocar que era a civilização africana que muito antes de cristo já existia. Qual foi o papel
do negro aqui no Maranhão? A arte, na agricultura, na economia, na música. É isso que tem
que ser feito! E os negros importantes não estão lá nenhum. E as frases importantes desse
povo, não têm nenhuma? Tem do Josué Montello grande escrito. Tem a frase de Castro Alves.
Tem que ter frase de Nascimento de Moraes, Cesário Coimbra que são negros! É importante!
O depoimento acima chama atenção para a importância do Museu Cafua das
Mercês se posicionar como um espaço dinâmico que contribua com reflexões, acerca do
negro, que permitam olhares não só dos elementos de torturas e suplícios existentes no
período da escravidão, mas que possibilite olhares que promovam reconhecimento da
importância do povo negro na sociedade brasileira como contribuinte real, ou seja, que avance
97
em seu discurso. Não que se fique na zona de conforto, compreendendo o negro apenas pelo
víeis da escravidão. Como o representante do CCN frisou é preciso avançar nos discursos.
O referido representante, cita alguns expoentes negros que têm sua história,
contada pela metade ou ignorada, escamoteada, desconhecida. E ainda existem mais. Quando
ele faz esse depoimento, não é uma critica direcionada apenas para a Cafua, mas para outras
esferas que deveriam pontuar de forma positiva a presença negra nesta Nação, como
exemplos têm as escolas (que ele chama atenção) que são cientes da Lei nº 10.639/03, que
institui a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira, porém não obedece a
Lei que seria uma oportunidade de estar focalizando esses personagens.
O Museu Cafua das Mercês tem que promover essa visibilidade, o professor Luiz
Alves chama atenção para este fato, pois a Cafua se intitula museu do negro. Em função dessa
razão tem que mudar seu discurso e se posicionar como um representante dos vários
personagens negros históricos que assinalaram um espaço determinante na edificação da
sociedade nacional que precisam ter sua versão da historia do Brasil contada e apresentar
nesse espaço museal.
O museu ao se posicionar como um espaço que apresenta uma cultura morta,
assim definiu o professor Luiz Alves, ele está estagnando a cultura negra e isso não condiz
com um processo cultural, pelo contrário, cultura implica em movimento, renovação,
inclusão. O Museu Afro Brasil em São Paulo compreendeu essa dinamicidade e tem
apresentado várias exposições que vem dialogando de forma positiva com a comunidade
brasileira assim com o mundo.
O referido museu recebeu pelo 2º ano consecutivo o Certificado de Excelência
2014 do TripAdivisor, (MUSEU..., 2014). O TripAdivisor trata-se de um site especializado
em fornecer informações e opiniões no que diz respeito produtos e serviços relacionados ao
ambiente turístico. Esse reconhecimento é dado apenas aos lugares de visitação de alto nível
ao redor do mundo que recebem constantemente as melhores avaliações dos viajantes.
A representante da Secretaria Extraordinária de Igualdade Racial, Sra. Jacinta
Santos compreende o espaço museal como um “espaço importante do ponto de vista da
história”, mas
A Cafua, ela tenta expor uma memória do passado histórico do negro aqui no
Maranhão. É isso que faz! É importante, mas como um espaço que se propõe em falar da
cultura negra é pouco o que apresentam lá. Nós compreendemos que diante os vários
aspectos culturais do povo negro, deveria ser mais ampliado. Ter uma dinamicidade naquilo
que o negro representa para este imenso país que não pouca coisa. Agora o que tem lá? Tem
98
quando chama atenção para apresentação da cultura negra na Cafua como uma cultura morta,
sem mobilidade, sem reconhecimento, sem perspectiva e sem dinamicidade.
Assim, é extremamente relevante que Museu Cafua das Mercês, que se intitula
Museu do Negro se posicionem, não apenas como reprodutor de imagens distorcidas do
negro, mas como um representante da memória continua dessa comunidade, que juntamente
com as demais comunidades vem construindo este país.
Outra questão abordada foi a relevância da cultura negra no cenário turístico
ludovicense. Ou seja, essa relação entre cultura étnica negra e o turismo. Como essas
entidades mensuram esse contato? Diante essa questão, assim se posicionaram os
entrevistados.
Para a Secretária Extraordinária essa relação é vista de forma positiva,
principalmente, se for apresentada de forma ética e responsável. Visitando o museu algumas
vezes observamos que essa relação é positiva e tem sua importância. Mesmo o museu se
posicionando da forma que estar, observamos expressivo número de turistas. O turismo
permite que compreenda que a cultura tem avanços, ou seja, no caso da cultura negra esse
avanço é sair da condição só de escravo, compreende? Quando você viaja para outros locais,
você observa que o turismo busca avanços, mudanças na forma de mostrar os aspectos
culturais de um povo. Então o Museu Cafua das Mercês precisa entender isso. Como
iniciativa primária ele é importante para o turismo de São Luís, mas precisa avança mais e
mostra o que tem de positivo, não só para turistas, mas para todas as pessoas que frequentam
aquele espaço. Eu viajo muito e observo isso. É muito importante a cultura negra para se
trabalhar no turismo, principalmente aqui no Maranhão que esta cultura estar presente, de
forma riquíssima. É muito importante perceber isso. A cultura negra tem muitos personagens
históricos que podem ser apresentados, trabalhados. Por exemplo, poderia se trabalhar com
a história de Maria Firmina que foi a primeira professora, mulher e negra maranhense a
compor uma obra literária. Ela vem dali de um quilombo, lá de Guimarães. Isso é cultura e
com certeza muito importante para o turismo, por isso, acredito que seja relevante essa
relação turismo e cultura, claro respeitando a história do povo.
O professor Carlos Benedito (NEAB) também considera importante essa relação.
Ele observa: certamente que é importante essa relação. Penso que ponto de vista do turismo a
cultura negra tem muito a oferecer, porque é detentora de um repertório de informações que
certamente interessa o turismo, como o reggae que já faz parte da cultura do Maranhão. A
cidade de São Luís é conhecida como a Jamaica brasileira, isso poderia ser trabalhado
dentro do turismo. Pensamos que seja interessante para a indústria do turismo do Estado,
100
trabalhar essa cultura. É uma forma também de afirmar essa identidade africana no
Maranhão através dessa relação, certamente que tem grande importância.
O professor Luiz Alves se posicionou de forma confusa perante o questionamento,
no entanto, consegui-se extrair do seu depoimento que essa relação entre turismo e cultura
negra, ele considera de certa forma importante, mas “não é para mostrar só a escravidão,
claro tem que ser falado, não só para mostrar a tortura. Tem que ser falado, mas depois que
colocar com está construída a população negra que tem participação da África. Tem que ser
promovido um dialogo de reeducação introduzindo a dimensão africana e deixar de disser
que somos descendentes de franceses. E o turismo pode promover isso! È importante!”
Conclui-se, a cultura negra e o turismo na visão desses representantes têm certa
relevância, como a pedagoga representante da SEIR ressaltou é necessário que se pense essa
relação diante uma responsabilidade e ética. É preciso que se reconheça que a cultura afro-
brasileira apresenta elemento de suma importância para ser trabalho em contexto turístico,
mas pautado na responsabilidade.
Este avanço já é uma realidade presente no Estado Bahia que tem apresentado o
turismo étnico negro como uma oportunidade de aperfeiçoar o turismo nessa região.
Recentemente vem trabalhando esse segmento de turismo na cidade de Cachoeira, que está
sendo considera a “Meca do candomblé” e tem atraído um número “crescente de turistas
negros estadunidenses, em busca de “raízes perdidas”, herança africana e ancestralidade”
(VATIN, 2008, p. 1).
Assim, confirma-se a oportunidade presente na relação turismo e cultura negra.
Essa oportunidade apresenta-se como um reconhecimento da etnicidade negra neste país que
trabalhada de forma consciente pelo turismo pode vim a ser uma possibilidade de reafirmação
étnica negra na sociedade nacional que diversas vezes não a compreendeu como uma cultura
rica diversificada.
Em relação à terceira pergunta central direcionada aos representantes das
instituições, compreendeu ser importante elencá-las no próximo subcapítulo, que seria se as
instituições têm alguma sugestão para o museu.
No decorrer da entrevista alguns posicionamentos surgiram é importante
apresentá-los. Por exemplo, Luiz Alves relatou que no governo de Jackson Lago, o secretário
da cultura Joãozinho Ribeiro queria fazer uma parceria com o CCN para transformar esse
espaço em um instrumento de cultura e luta. Participamos de algumas reuniões. Não deu
certo, não sabemos por quê. Então ele foi o único que pensou em chamar o CCN que tem esse
101
acumulo de conhecimento de luta pelo direito da comunidade negra. Ele convidou o CCN
para transformar aquele museu em um instrumento de educação e cultura.
Esse depoimento é importante, pois compreende-se que em algum momento o
houve tentativa de transformar algumas dessas instituições em parceiras. Isso poderia
possibilitar ao museu uma forma de trabalhar a cultura negra integrada com outros órgãos que
já vem promovendo direitos da comunidade negra no Maranhão. O museu étnico negro da
Bahia o Museu Afrobrasileiro da Universidade Federal da Bahia, tem mais que uma parceira a
com a Universidade Federal da Bahia, ele está ligado a essa instituição onde tem promovido
conhecimento acerca da influência da cultura africana na sociedade nacional.
Esse convite relato pelo representante do CCN para a entidade ser parceira do
museu foi o único, pois o representante do NEAB relata que “nós nunca tivemos do ponto
institucional, nenhum dialogo, nunca formos chamados para ter um dialogo com a direção do
museu á respeito do acervo ou enfim a respeito da importância histórica da cultura negra
neste país”.
Assim, se conclui que a Cafua perde oportunidade de se dinamizar e de se projetar
como um espaço importante naquilo que se refere à representatividade da cultura negra neste
Estado quando não compreende que instituições como o Centro de Cultura Negra, a
Universidade Federal do Maranhão, dentre outros são importante para auxiliar na promoção
de um conhecimento acerca da diversidade cultural e da importância da cultura negra para o
desenvolvimento da sociedade brasileira.
escravos que fica ali em Viana, que é outro marco, Então a gente precisava ter outros
aspectos para serem lembrados como memória. Nós compreendemos que poderia ter não só a
referência a Casa das Minas, a Casa de Nagô, mas poderíamos ter a memória do Terreiro do
Egito, sabe poderíamos ter outros que aí fizeram também a história, fizeram essa memória.
Poderia ter ali alguns autores negros, como por exemplo, quem escreveu Boboromina, os
livros do Jorge babalaô que escreveu muito livros do pai Euclides, poderíamos ter outras
referências. Poderíamos ter outras referências, outras peças que retratam essas memórias
que não é só a memória da escravidão que parece que a lembrança maior nossa, enquanto
negro foi só escravidão, e não é. Então achamos que aquele espaço precisava ser
revitalizado.
O representante do NEAB tem algumas sugestões que segue o mesmo caminho
apontado pela Sra. Jacinta Santos, de acordo com esse representante: pensamos que o espaço
precisa ser mais dinamizado, ter uma visibilidade maior, uma intervenção, uma ação maior
do órgão responsável por aquele museu para que ele se torne um espaço mais dinâmico, não
só com um registro de um passado, mostrando objeto de tortura, etc., mas que seja um espaço
dinâmico, com atividades relacionadas à cultura negra na contemporaneidade. O Maranhão,
o Brasil tem uma riqueza muito grande, em termos de ritmo, de danças, de atividades
desenvolvidas por várias organizações do Movimento Negro aqui tanto de São Luis como de
outra região do interior, do ponto vista educacional, então seria importante que o museu
dinamizasse essas atividades e trouxessem essas pessoas para fazerem esse tipo de
atividades.
O representante do CCN é taxativo e questionador: Qual foi o papel do negro aqui
no Maranhão? Onde estar o negro? Não está na arte, na agricultura, na economia, na
música, enfim em todas as vertentes. É isso que tem que ser feito!
Essas sugestões são pertinentes e estão em comunhão com as dos visitantes que
opinaram. Eis as sugestões:
Ele poderia ser mais completo e apresentar mais itens. Poderia ter uma
divulgação melhor do local. A sinalização poderia melhorar também (VISITANTE L).
Abrir nos finais de semanas e aumentar o espaço, está muito pequeno.
(VISITANTE M).
Aumentar o espaço e melhorar o acesso (VISITANTE N).
Ter mais manifestações culturais. Melhorar as informações dos cartazes e o
acesso (VISITANTE O).
103
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
não lhes doe a consciência de levá-los à sepultura asfixiados e “famintos”. Esse trecho
encontrado no livro de Úrsula defini como é horrível que locais que trabalham com a cultura
negra tratem seus expoentes assim: esquecidos, famintos e amordaçados.
Além de Maria Firmina, a Cafua poderia resgatar a memória de outros
personagens da cultura negra de grande destaque para sociedade brasileira. “Carcará e Pisa na
fulô” apresentam seu compositor, João do Vale como um importante personagem da cultura
maranhense. Jorge Itaci, babarolixá, escritor e ex-administrador, também poderia ter sua
memória regatada na Cafua, enfim são várias as oportunidades que o espaço museal poderia
explorar.
A Cafua também poderia compreender a Igreja Nossa do Rosário dos Pretos,
localizada no Centro Histórico de São Luís, como uma fonte de elementos culturais negros
para serem expostos como mecanismos de dinamização do museu.
Analisando a representatividade cultura afro-brasileira compreendeu-se que o
espaço museal Cafua das Mercês necessita trabalhar, também, com os elementos que já
possui, mas os posicionando de forma diferente. No caso, poderia expor às histórias dos
povos africanos que deram origens a formação humana do Estado maranhense.
Mas que conclusões, o que pretendemos neste momento é sublinhar
apontamentos, apresentados como mecanismo viáveis para posicionar o Museu Cafua das
Mercês.
O museu tem servido, ao logo do tempo, como veículo de afirmação de discurso
para a dominação, como centro produtores e difusores de ideias, através de textos, objetos e
imagens, selecionados, preservados nas medidas dos interesses de grupos possuidores do
poder de afirmação e manutenção de referenciais patrimoniais oficiais. Iniciativas
diferenciadas têm sido desenvolvidas durante as últimas décadas, provocando novas
perspectivas de seleções, preservações exibição de traços culturais desprezados, abordando
narrativas e sujeitos sociais, até então invisíveis, na realidade da sociedade brasileira. Tendo
surgido diferente de tipologias institucionais e formas de realizar exposições, tem aberto
brechas para introdução de conteúdos antes impensáveis de passiveis de preservação e
exposição.
Esperamos que com nossas considerações, neste estudo, o Museu Cafua das
Mercês, seja visto no curso de turismo da Universidade Federal do Maranhão, como objeto de
estudo para futura análise que auxiliam a posicioná-lo como mecanismo de promoção da
cultura negra no cenário turístico de São Luís.
106
REFERÊNCIAS
BÂ, A. Hampaté. A tradição escrita. In: KI-ZERBO, Josefh. História geral da Àfrica I:
metodologia e pré-história da Àfrica. 2. ed. rev. Brasília, DF: UNESCO, 2010.
BARTH, F. Los grupos étnicos y sus fronteras: la organización social de las diferencias
culturales. México, D.F: FEC, 1976. p. 1-32. Disponível em:
<http://www.cholonautas.edu.pe/2012/wp-content/uploads/2012/04/Barth%20intr.pdf>.
Acesso em: 14 fev. 2014.
______. Análise estrutural do turismo. 12. ed. São Paulo: SENAC, 2007.
<http://www.acordacultura.org.br/sites/default/files/kit/MODOSFAZER-WEB-
CORRIGIDA.pdf>. Acesso em: 11 jan. 2014.
BUSH ignora negros no Brasil, diz revista alemã. Folha de São Paulo, São Paulo, 5 jun.
2002. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u42111.shtml>.
Acesso em: 11 jan. 2014.
GOIS, A. Cultura afro brasileira estimula turismo. Folha de São Paulo,São Paulo, 30 jan.
2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff3001200529.htm>.
Acesso em: 21 fev. 2014.
IBGE. Brasil: 500 anos de povoamento. Rio de Janeiro, 2000. Disponível em:
<http://brasil500anos.ibge.gov.br/estatisticas-do-povoamento/desembarques-no-brasil>.
Acesso em: 25 ago. 2014.
LEONI, R. Cinco atrações da pequena África. Agência O Globo, Rio de Janeiro, [2014].
Disponível em: < http://oglobo.globo.com/rio/cinco-atracoes-da-pequena-africa-1-
14390126>. Acesso em: 25 maio 2014.
LODY, Raul. O negro brasileiro: construindo identidades. Rio de Janeiro: Bertrand: Brasil,
2005.
SÃO PAULO (Estado). Secretaria da Cultura. Museu Afro Brasil recebe certificado de
excelência 2014 TripAdvisor. São Paulo, 2014. Disponível em:
<http://www.museuafrobrasil.org.br/noticias/detalhe-noticia/2014/07/08/museu-afro-brasil-
recebe-certificado-de-excel%C3%AAncia-2014-tripadvisor>. Acesso em: 12 fev. 2014.
OSÓRIO, R. Desigualdade racial e mobilidade social no Brasil: um balanço das teorias. In:
THEODORO, Mario (Org.). As políticas públicas e a desigualdade racial no Brasil: 120
anos após a abolição. Brasília, DF: IPEA, 2008.
PRADO JÚNIOR, C. Formação do Brasil contemporâneo. 23. ed. São Paulo: Brasiliense,
2007.
PAIM, P. Estatuto da igualdade racial. Brasília, DF: Senado Federal, 2006. Disponível em:
<http://www.cedine.rj.gov.br/files/legisla/federais/Estatuto_da_Igualdade_Racial_Novo.pdf>.
Acesso em: 11 jan. 2014.
RACISMO: torcedor atira banana ao Daniel Alves que comeu em pelo jogo (assista ao vídeo).
São Paulo, 2014. Disponível em: <http://arquivo.geledes.org.br/racismo-preconceito/racismo-
no-mundo/24421-racismo-torcedor-atira-banana-ao-daniel-alves-que-comeu-em-pleno-jogo-
assista-o-video>. Acesso em: 11 jan. 2014.
SILVA, C. B. da. Da terra das primaveras à ilha do amor: reggae, lazer e identidade
cultural. São Luís: EDUFMA, 1995.
SOUZA, Cruz e. O emparedado. In: Obras. São Paulo: Cultura, 1943. Disponível em:
<http://www.fflch.usp.br/sociologia/asag/o%20emparedado%20-
%20Cruz%20e%20Souza.pdf>. Acesso em: 16 nov.2013.
ANEXO A – REPORTAGEM
116