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FILOSOFIA

A EXPERIENCIA ESTÉTICA

FICHA DE TRABALHO/RESUMO 10 ANO

Podemos viver experiências estéticas ao contemplar uma paisagem ou um objeto natural, ao


ler um poema ou um romance, ao ouvir uma peça musical, ao observar um quadro, uma
escultura ou uma obra de arquitetura, ao assistir a um filme, a um concerto, a uma
representação teatral ou a um bailado, etc. Muitas são as ocasiões que podem estar na origem
de uma vivência estética, mas esta não é uma experiência vulgar. Com efeito, envolve prazer e
satisfação, mas não se trata de prazer ou de satisfação meramente sensoriais.

Comecemos por caracterizá-la de uma forma ainda vaga: a experiência estética é uma vivência
emocional que resulta da contemplação de determinados objetos sensíveis e provoca uma
satisfação muito peculiar.

Os objetos sensíveis capazes de suscitar experiências estéticas – e que por isso recebem o
nome de objetos estéticos – são de dois tipos:

1 – Objetos artísticos – são criações humanas, objetos artificiais, que, produzidos pela
atividade do artista, são capazes de despertar emoções e sentimentos que os avaliem como
belos, horríveis ou sublimes. Exemplos: uma pintura, uma sinfonia, uma peça teatral.

2 – Objetos naturais – são produtos da natureza e não criações humanas; descobrimo-los e


são capazes de despertar emoções e sentimentos que os avaliem como belos, horríveis ou
sublimes.

Assim quer a natureza quer a arte podem proporcionar prazer estético.

Na experiência estética dá-se assim a relação entre um sujeito que observa e contempla e um
objeto – natural ou artístico – sobre o qual se projeta essa atitude contemplativa. Ora, é
precisamente na atitude do observador que reside o segredo, o carácter especial da
experiência estética. Quer isto dizer que só há prazer ou satisfação estéticos se nos
relacionarmos com os objetos naturais ou artísticos de uma determinada forma, se os
observarmos e apreciarmos de um certo modo. Só uma determinada atitude torna possível o
prazer característico da experiência estética. Essa atitude tem o nome de atitude estética e,
analisando-a, iremos esclarecer quais as características próprias da experiência estética,
lançando luz sobre conceitos como contemplação e prazer estético.

1. A Atitude Estética

A experiência estética, com o prazer que a acompanha, só é possível se na relação com os


objetos adotarmos uma atitude desinteressada. Em que consiste esta atitude? Consiste numa
relação que não se interessa pela utilidade do objeto observado, não o transforma em meio ao
serviço de um fim. Na atitude estética, apreciamos o objeto por si mesmo afastando quaisquer
considerações relativas ao proveito que nós ou alguém teríamos em possuí-lo, aos valores
morais que promove ou não, e pondo “fora de circuito” a vontade de ampliar conhecimentos.

Como se vê, a caracterização da atitude estética faz-se essencialmente pela negativa, ou seja,
sabemos o que é a atitude própria de quem tem uma experiência estética indicando as
atitudes que a impedem ou lhe retiram intensidade.

Trataremos agora de aprofundar o que foi sublinhado: a atitude estética — a forma estética de
relação com os objetos naturais e artísticos.

a) Não é uma atitude prática ou utilitária.

A atitude estética é alheia a qualquer consideração sobre a utilidade do objeto, não é


determinada pelo desejo de posse, ou pelo eventual valor monetário ou comercial do objeto
contemplado. A contemplação é, no caso da atitude estética, um fim em si mesma. A atitude
utilitária impede que nos “aproximemos” de forma pura e desinteressada das produções
artísticas e naturais, prende-nos aos nossos interesses e inclinações materiais ou sensíveis, isto
é, não permite uma satisfação livre.

Podemos dar como exemplo o caso do agente imobiliário que, quando observa as paisagens
do Gerês, não consegue evitar pensar no seu valor monetário, no excelente negócio que seria
construir um aldeamento naquele local ou o caso de uma pessoa que, num museu, imagina o
que seria ter um determinado quadro em sua casa, se ele combinaria com os móveis e
tapeçarias da sala. Comprar uma pintura ou uma escultura considerando esse acto como um
investimento com o qual se pretende obter benefício económico e social é também uma
negação da atitude estética ou pelo menos um obstáculo à fruição das obras artísticas em todo
o seu esplendor.

b) Não é uma atitude cognitiva (de conhecimento).

A relação com os objetos naturais e artísticos na contemplação estética não é motivada


primordialmente pela vontade de adquirir e de ampliar conhecimentos.

Imaginemos que estudantes de História de Arte visitam vários monumentos e se revelam


capazes de identificar os vários estilos arquitetónicos, as características de cada um e as
diferentes épocas a que pertencem. Nada há de negativo neste comportamento porque o
conhecimento permite desfrutar com mais prazer a contemplação das obras artísticas (é
importante educar o gosto e neste sentido o conhecimento artístico é um auxiliar muito
valioso de uma atitude — a estética — que não é em si mesma cognitiva). Contudo, se
contemplam esses monumentos para consolidar conhecimentos adquiridos ou para os pôr à
prova, não podemos dizer que a sua atitude seja estética. Se gostamos de arte mas
predominam objetivos profissionais e sociais na nossa relação com as obras de arte corremos
o risco de nos afastarmos da forma de contemplação pura e desinteressada que caracteriza a
atitude estética.
Pode-se também dizer que o biólogo que estuda um bosque de árvores milenares para
verificar o estado da sua flora manifesta uma atitude cognitiva e não estética, tal como o
antropólogo que estuda a arquitetura e a cerâmica de uma comunidade para conhecer os seus
costumes.

c) Não é uma atitude subordinada, em si mesma, a princípios e objetivos morais.

Se uma pessoa sente prazer na contemplação de um dado objeto estético (filme, poema,
romance, conto…) somente por lhe reconhecer valor moral, a sua atitude não é estética. A
nossa atitude só terá forma estética se dermos atenção ao objeto contemplado por si mesmo
e não à relação do objeto com os nossos conceitos e princípios morais.

QUESTIONÁRIO

1 – Qual a condição que torna possível a experiência estética?

2 – Que diferenças pensas existirem entre as obras de arte e as “obras” da natureza?

3 – Poderemos considerar semelhante a emoção estética provocada pela observação de um


quadro (pintura) e de uma paisagem natural?

4 – O que significa dizer que a atitude estética não é condicionada nem por interesses teóricos
nem por interesses práticos?

5 – Se gostas de ouvir uma canção ou uma melodia porque te recorda os tempos da infância
ou uma relação amorosa, estás a ter uma experiência estética?

6 – Uma comida apetitosa e um banho reconfortante são experiências agradáveis. Serão por
isso experiências estéticas?

Em suma, a atitude estética é desinteressada, não porque seja indiferente ou passiva, mas
porque na contemplação do objeto o sujeito se comporta como se ele não tivesse qualquer
utilidade. A contemplação do objeto não tem qualquer finalidade situada fora de si própria.
Por isso, a atitude estética é puramente contemplativa, isto é, livre de qualquer forma
interessada de relação com objetos naturais ou artísticos. O prazer estético é uma satisfação
puramente desinteressada em que nos distanciamos, ao contemplar o objeto, de interesses,
desejos e de convicções morais e ideológicas.

2. O Juízo Estético

A experiência estética, possibilitada pela atitude anteriormente descrita, envolve uma


avaliação do objeto estético, mais precisamente da relação com ele estabelecida. Tal avaliação
traduz-se num juízo (este enuncia o que o objeto vale — se é belo ou feio, horrível ou
sublime).
O que é, em termos gerais, um juízo? É uma proposição que atribui uma determinada
qualidade a um objeto: “Este cavalo é rápido”. Ao ato mediante o qual formulamos esta
proposição dá-se o nome de acto de julgar e à proposição formulada o nome de juízo.

O que é um juízo estético? Um acto mediante o qual formulamos uma proposição que atribui
determinada qualidade estética (beleza, sublimidade, fealdade) a um objeto: “Este palácio é
belo”.

Parece simples, mas temos de aprofundar a noção de juízo estético. Ao fazê-lo iremos
reencontrar características fundamentais da experiência estética porque tal juízo exprime, na
medida do possível, o que se passa nessa experiência. Seguiremos de perto a reflexão que
Immanuel Kant efetuou sobre o tema.

Quando eu digo que algo é belo estou a transmitir uma satisfação, um sentimento de prazer
que acontece na contemplação de um objeto. À primeira vista, ao atribuir a esse objeto o
predicado “belo”, parece que estou a referir-me à beleza como propriedade que “está” nesse
objeto. Contudo, segundo Kant, dizer que algo é belo é traduzir um sentimento, é expressar
algo que acontece em mim. A beleza é um sentimento de prazer, algo que se dá na consciência
do sujeito e não algo que seja propriedade do objeto.

A beleza não é uma coisa nem uma propriedade das coisas. É um sentimento que é vivido no
interior do sujeito e do qual este tem consciência.

Como se traduz esse sentimento? Dizendo de uma forma não muito correta que o objeto
contemplado é belo.

O Juízo Estético não se refere nem ao Agradável nem ao Bom

Como exprime o que se passa na experiência estética, o juízo estético comunica uma
satisfação desinteressada e pura. O juízo estético ou de gosto implica que o objeto julgado
belo cause satisfação independentemente de qualquer desejo, interesse ou utilidade.

Para Kant, julgar que um dado objeto é belo é muito diferente de dizer que ele é agradável ou
moralmente valioso (bom).

O agradável é algo que desperta os nossos apetites e desejos: é desejável por ser a promessa
de um eventual prazer sensorial. O agradável está ligado ao nosso corpo, quer às suas
necessidades quer aos seus desejos. É por ser desejável ou apetecível que uma coisa é
agradável.

QUESTIONÁRIO

1 – Por que razão é o juízo estético aparentemente objetivo?

2 – Imaginemos um importante palácio construído unicamente com materiais preciosos e à


custa de imenso trabalho de escravos.

a) Se disser que o palácio é magnífico pelo conforto que oferece aos seus habitantes e pela sua
boa exposição ao Sol, estarei a formular um juízo estético?
b) Se disser que o palácio é belo, mas é uma inadmissível ostentação de luxo num meio em
que reina a miséria, estarei realmente a formular um juízo estético?

c) Para Kant é logicamente possível um juízo como este: «Esta obra é bela, mas não me
agrada»?

d) E quanto a um juízo como «Esta obra agrada-me, mas não é bela», qual seria a posição de
Kant?

O bom ou moralmente valioso está também ligado à faculdade de desejar, embora a satisfação
decorrente da sua eventual realização seja, não sensível, mas racional. O que julgamos
moralmente valioso (uma Acão, uma decisão) é avaliado como tal porque está em
conformidade com determinados valores morais, isto é, com o que deveria ser sempre feito e
muitas vezes não o é.

O juízo estético exprime, em palavras e conceitos, uma satisfação puramente contemplativa:


tenho prazer na observação do objeto sem que tal prazer esteja condicionado por um desejo
de posse ou de consumo ou pela sua ligação ao que julgamos moralmente válido.

Segundo Kant, para julgarmos a qualidade estética de um objeto devemos contemplá-lo


abstraindo-nos da consideração da sua possível utilidade e também da sua moralidade.

QUESTIONÁRIO

1 – Que relação existe entre experiência estética, atitude estética e juízo estético?

2 – Segundo Kant ao dizer «Isto é belo» quero dizer que todas as pessoas estão de acordo com
o meu juízo ou que todas deveriam estar de acordo com ele?

O Problema da Universalidade do Juízo Estético

Expressão de um sentimento de prazer (puro e desinteressado), o juízo estético é subjetivo.


Significa isso que, segundo Kant, o juízo estético não tem validade universal, que vale para
mim, mas não vale para os outros?

Kant não admite que juízos como “Este quadro é belo” ou “Esta tempestade sobre o mar é
sublime” sejam meras opiniões pessoais. No seu entender, quando atribuímos beleza a um
dado objeto, estamos convictos de que assim deve ser também para os outros sujeitos. O que
torna legítima esta pretensão? O que me dá direito a julgar assim não só em meu nome como
também em nome dos outros?

Se digo que um certo objeto é belo, implicitamente afirmo que ele é, de direito, belo para
todos. Como o meu juízo não se baseia em inclinações ou interesses (por mais elevados que
sejam) que me são peculiares (unicamente meus) posso julgar-me no direito de que os outros
reconheçam também a beleza do objeto, isto é, experimentem o tipo de satisfação que eu
sinto. Nesse sentido, o juízo estético é subjetivamente universal. Livre de qualquer interesse
ou particularismo do sujeito que julga e sem demonstrar aos outros que o objeto é belo, o
juízo estético tem direito à validade universal.

Embora não possamos demonstrar por que razão algo é belo (como diz Kant, o belo é o que
satisfaz universalmente sem conceito), não podemos resignar-nos a aceitar que as nossas
avaliações sobre a beleza sejam meros gostos pessoais como, por exemplo, gostar de futebol
ou de arroz de tamboril. Há uma exigência de universalidade do nosso juízo. Esta exigência
fundamenta-se na existência ideal de um sentido do gosto comum a todos os seres humanos,
que permitiria avaliar os objetos estéticos da mesma forma. O sentido do gosto asseguraria a
universalidade dos juízos estéticos, o consenso em questões de gosto: tais juízos não seriam o
fruto de opiniões arbitrárias.

«Ao afirmar que o belo satisfaz universalmente, Kant não quer dizer que de facto todos
dizemos que são belas as mesmas coisas, mas sim que só chamamos belo ao que
consideramos ter direito e mérito suficiente em si mesmo para ser reconhecido como tal por
toda a gente, ao passo que tal exigência de universalidade não se verifica a respeito de outros
tipos de gosto: seria de uma ridícula falsa modéstia dar a entender que algo é belo só para
mim».

SINTESE

A Experiência Estética

1 – A experiência estética é uma vivência que pode acontecer na relação com certos objetos —
naturais e artísticos — e exige como sua condição de possibilidade uma atitude adequada.

2 – A atitude que torna possível a experiência estética é a atitude estética, uma relação pura e
desinteressada — contemplativa — com o objeto.

3 – Esta atitude, alheia a interesses de tipo prático (utilitário), cognitivo e moral, torna o prazer
que envolve a experiência estética um sentimento puro e desinteressado que não se pode
confundir como o simples gozo sensível (a vivência estética não é a satisfação dos desejos
despertados pelas sensações). O prazer estético não deriva da satisfação das necessidades do
organismo e não é uma mera reação física a determinado estímulo. Tem uma dimensão
emocional e racional, ou seja, é racional sem ser meramente intelectual e é sensível sem ser
meramente sensorial.

4 – Embora seja um sentimento e por isso difícil de comunicar totalmente aos outros e de ser
por estes compreendido, a experiência estética é verbalmente expressa num juízo: o juízo
estético. Aparentemente objetivo, o juízo estético é a expressão, não de qualidades que o
objeto possui, mas sim do que sentimos quando o contemplamos de forma pura e
desinteressada. O juízo estético é subjetivamente universal, ou seja, uma avaliação subjetiva
que pretende ser válida para todos os sujeitos. Kant justifica esta exigência de universalidade
supondo que o sentido do gosto é um sentido que todos os seres humanos possuem sendo
assim possível aos outros entender e partilhar as minhas avaliações estéticas.
Sintetizando: a experiência estética é uma vivência baseada numa atitude comtemplativa —
pura e desinteressada — e exprime-se num juízo que, transmitindo um sentimento de prazer
pessoal através de palavras e conceitos, não é uma opinião arbitrária.

Contemplar um quadro ou escutar uma melodia são experiências que podem fazer com que a
nossa vontade se detenha e toda a nossa atenção seja “raptada” e seduzida. O prazer estético
que se produz perante esses objetos estéticos é gerado pela admiração. A admiração é um
momento de fascínio e de assombro mediante o qual se estabelece um processo de
comunicação distinto do habitual, abrindo-se perante nós um mundo diferente. Na experiência
estética:

1 – A realidade apresenta-se transfigurada

A experiência estética transforma a nossa visão do mundo.

2 – A vivência do tempo é alterada

O prazer estético faz com que “o tempo passe quase sem o sentir”. Ultrapassamos o carácter
fugaz do tempo vulgar e saboreamos a eternidade. A transição passado – presente – futuro dá-
se sem solução de continuidade.

3 – Verifica-se um desprendimento do eu

Tanto a experiência de criar algo belo ou esteticamente valioso como a de contemplar objetos
belos ou esteticamente valiosos pode conduzir-nos a um certo esquecimento de nós próprios.
Embora se trate de um processo gradual, a experiência estética supõe um distanciamento em
relação ao nosso eu rotineiro para criar ou para, na contemplação, se deixar fascinar e
envolver.

4 – A intensidade da experiência contrasta com a sua brevidade

O prazer estético é precário. A realidade a que se volta depois da contemplação estética


parece mais rude, menos encantadora.

Para alguns artistas, a atitude estética consiste na rutura com o mundo habitual, no início de
uma forma de comunicação nova, uma realidade alternativa que a arte, sobretudo, nos
oferece mediante a imaginação. Contudo, este novo mundo que se abre não é pura ficção: é o
mundo real completado, enriquecido e transfigurado pela imaginação. Este protagonismo da
imaginação não se verifica em detrimento da razão humana porque esta é uma razão sensível.
A sensibilidade estética tem um carácter próprio: é racional sem ser científica e é sensível sem
ser unicamente empírica.

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