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Universidade de São Paulo – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas

Disciplina: Correntes Críticas I

Docente responsável: Profº. Drº Samuel Titan

Ana Ap. Carvalho Russo Nº USP 9876484 (1º noturno)

Débora Soares Gil de Oliveira Nº USP 8024554 (2º noturno)

• A propósito de As Flores do Mal e o Sublime discorra sobre pelo menos três


observações críticas por meio das quais Erich Auerbach busca singularizar o
estilo e o lugar histórico de Charles Baudelaire.

Auerbach tem como ponto de partida de seu texto a análise do poema “Spleen”,
seu movimento crítico de leitura começa identificando por quais características o texto
adequa-se ao tom sublime (versos alexandrinos, unidade sintática, o uso de epítetos “ao
gosto clássico”) para logo em seguida mostrar em que medida, no mesmo poema
encontram-se coisas incompatíveis com a dignidade esperada. Ao fim da análise, formula
duas características fundamentais do poeta, cujo caráter antitético chama atenção.

A primeira consiste na maneira como Baudelaire cria imagens simbólicas com


uma força de expressividade do real, no poema temos o exemplo “aranhas no cérebro” ou
a cena final da Angústia inclinada sob um crânio. Tal imagem seria realista à medida que
traz uma “representação vívida de aspectos feios, sórdidos e repugnantes da vida”, mas
sua função no poema é estritamente metafórica, pois trata-se de algo empiricamente
irreal.

O vocabulário científico “cérebro” ou os “urros dos sinos” nos remete a segunda


característica destacada por Auerbach: a contradição entre o uso de um tom elevado e a
indignidade do tema e de seus detalhes formais. Uma maneira do autor mostrar a
singularidade do poeta é aproximar seus procedimentos estilísticos com seus precursores
românticos, cuja diferença palavras elevadas e coloquiais já era proposta, mas cuja
prática se realizou de uma forma muito menos agressiva. Essa seria uma marca
importante de mudança de paradigma da poesia moderna, inaugurada por Baudelaire
que, mais do que ignorar a adequação histórica entre tema e maneira de tratamento,
configurou em sua escrita uma mudança na base dessa relação, ou seja, tornou-se
possível abordar com seriedade temas que não eram vistos como tal.

Os temas de As flores do mal são os temas de seu autor e só puderam


transformar-se em poesia pois Baudelaire via neles profundidade e grandeza suficientes.
Auerbach vê autenticidade na poesia de Baudelaire não só na concentração de temas
que lhe são próprios como o desespero sem remédios, ou a “miséria cinzenta” mas
também na relação paradoxal que o poeta estabelece com a escrita: saltar da miséria
para sublime. Seus temas eram não apenas o inimigo mas condição e objeto de sua
atividade poética, o poeta cantou em estilo elevado uma ansiedade paralisante, um
pânico sem esperança “que fenômeno singular: um profeta do infortúnio que só espera de
seus leitores a admiração por sua realização artística!”

A escrita de Baudelaire consistia na negação da vida e também de sua época:


“Para que possamos determinar a posição histórica das flores do mal é importante
observar como um certo homem, em meados do século XIX, foi capaz de moldar tal
caráter e biografia, logrando alcançar expressão integral, justamente nessa época, de
maneira a revelar algo que até então estivera latente e que muitos só iriam perceber de
modo gradual através dele. (...) Não havia saída, o poeta de flores do mal odiava a
realidade do tempo que viveu, desprezava suas tendências, o progresso e a
prosperidade, a liberdade e a igualdade.” Aqui Auerbach explicita sua visão de “homem do
seu tempo”, para ele, a singularidade e qualidade da poesia de Baudelaire decorre da
capacidade que este teve, na sua vida singular de apreender e expressar mudanças e
sentimentos universais do seu tempo.
• Em “O narrador”, Walter Benjamim declara que a arte de narrar está em vias
de extinção”. Discorra a respeito, em especial ao que diz respeito a noção de
experiência e ao contraste entre a narrativa oral e o romance moderno.

Walter Benjamin (1892-1940) diz que na experiência contemporânea “a arte de


narrar está em vias de extinção” e que “são cada vez mais raras as pessoas que sabem
narrar devidamente”.

Nikolai Leskov, defende que “as ações da experiência estão em baixa, e tudo
indica que continuarão caindo até que seu valor desapareça”. Benjamin define dois tipos
fundamentais de narradores, “os viajantes” e “os que viveram muito e conhecem suas
histórias e tradições”, e observa que “a experiência que passa de pessoa a pessoa é a
fonte a que todos recorrem”.

Ele entende que “o senso prático é uma das características de muitos narradores
natos”. E avalia que o “o narrador é um homem que sabe dar conselhos”, uma prática que
percebe como “antiquada” porque “as experiências estão deixando de ser comunicáveis”.
Ele argumenta que o romance não “retira da experiência o que conta”, como o faz a
narrativa

“Se a arte da narrativa é hoje rara, a difusão da informação é decisivamente


responsável por esse declínio”, enfatiza. “A informação só tem valor no momento em que
é nova. Muito diferente é a narrativa: ela conserva suas forças e depois de muito tempo
ainda é capaz de se desenvolver”, Benjamin chama a narrativa de “uma forma artesanal
de comunicação” e a diferencia da literatura, que considera “não uma obra de arte, mas
um trabalho manual”. Ele também diferencia o cronista, aquele que narra uma história, do
o historiador, aquele que escreve uma história:

“O historiador é obrigado a explicar de uma ou outra maneira os episódios com


que lida, e não pode contentar-se em representá-los como modelos da história do mundo,
como o faz o cronista.” Ele finaliza o texto dizendo que “o narrador figura entre os mestres
e os sábios” porque “sabe dar conselhos não para alguns casos, como o provérbio, mas
para muitos casos, como o sábio”. E também pode recorrer ao acervo de toda uma vida:
uma vida que não inclui apenas a própria experiência, mas em grande parte a experiência
alheia.

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