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Memérias de Auschwitz Atualidade e politica Reyes Mate Trad Anténio Sidekurn Memoria de Auschuits~ Astaidad marl y politica © Batorial Trot, SA 2008, AntinioSudkur, 2005 Revit na i ‘Smiona Cavaeiro Sumario atoragt Retro Contesto Baiorope Bletrniea ¢Comuniaaio M42hm Mate, Roses ‘Momirias de Avechwita/ Reyes Mato; Antinio e090 Serre = Sideom—S30 Leopoldo: Nova Harmania, 2005, sp 21 om 1 Do hiersna &racionliads eden porgenrnwsnnennnnnn 33 1 AMODERNIDADE Do HITLERISNO H ISBN ss.g9570.268 2 OENCADEAMENTO DO CORPO. 39 3) DOHITLERISMO A RACIONALIDADE GCIOENTAL 3 1. Aleman - Histvia Polite. 2, Campos de Concen- | 1 ineeiogidae do eu od wn sa tragho- Ambit 8 Gert Mail, 1000-1065 Pris | 2» conse et ent 8 nelrs Predex I idekum, Anns 1 Tia, 4. OcONCEITO RENTALIIMIANO De ExrERIENCIA om) cpp, san7048 $5 OIDEALISMO, FONTE DO TOTALITARISMO. 6 Ticha cavalografica laborada pela bibliotecdria h-o. campo, lugar da politica modern nantes Ginamara Lima Jacques Pinto CRB 10/1204 Mpa sicetTTen oun vanipe Lomae ~ 2 BTUDO CAMPO DE CONCENTRAGAG! 3 PaRADS OPRIMIDOS.O ESTADO DE ENCECAG E NORMA 8 4 DoWsDIscuRSOS E UMA WESMA HISTORIA. 96 Pr Cala bit 3 2 Fascsmo.promesio nnn 3 Demtpnciased ingaacve cwepiicoaniane io 3 Opmmos ov ANzaacAD Dr TODA ExCLUSAO 109 ee & Apatinicn Como nvFERRURGAO DOCAMPO. ms aitora Nova Harmonia Lida. run Mara Bis de Pou 75-142 IUGAaonisaunnG Caracbiicn micunsO Eon ea Mala la do Pel 1673, oNOwo hiheattVo CASON SHENSON ae coruena- Sto Lome RS 2 DOMAL RADICAL ADANALIDADE Do MAL a pC EP 98048210 Cann Poca 5 3) ENTRE ANECESSIDADE DE CONHECER Ea dPOSSIBN DADE DE ae (51) 588-900 Fox (G1) 587.1919 Contenben 13s 4 OSALERTADORES DO FOGO: ie www .novaharmonia.com.br os. ae oe Auschwitz ndo se repita” deve ser ensado, ‘essencialmente, em relagdo as vitimas, por iso tem que significar “quan nto pode perder de visa o pont de pata ss0 69 que di que pone 16 WV Aautoridade da testemunha ‘Contra o esquecimento ergue-s voz da festemunha. Ela sabe o que os ‘demeis esqueceram, Q filme de Claude Lanzmana, Shoah, abre com ‘uma seqlneia na qual um sobrevivente, Simon Srebknik, entra por uma Senda num bosque, que igual e qualquer bosque, até © momenta quando se detém sussurrando leverente: “E dificil reconhecer, mas era aqui”. esse “era aqui” astenta toda forga da testernuna. Esse “aqui asinala ‘um lugar preciso que para 0 espectadornio é nada, coma também nada significaré para a quantidede de transeuntes que circulam por ali hhabitualmente, Pera sestemunka, no entanto, esse “aq” asinala una histria oculta © ocultada, 0 lygar do campo. “Aqui, mesmo que no pareca dissimulado hoje pelo verde bosque, éo lugar de um campo de ‘exterminio, O alhar da festemunha vee desvelao que oolho humano do cidadio conternpordneo nao suspeit ‘Atestemunhia records um lugar, una histria, mas qual €0 gar epistemolégico do testemumho? E ume pergunta importante se quisermos ‘alorizar realmente a forca da estemunha, Comparemos a centralideds que é dada por Kant ao espectador com todas as suspeitas que a testennunha levanta, Essa diferenga no & uma reegdo devido a0s tagos psicolégioos, mas que langa suas raizes nas conviegdes mais profundas {de Modemidade, 0 entusiasma dos espectadores aparece, no serio de ‘Kant, como uma experiénta de tal envergadura que se pode considera a7 ‘como um sal histrio cua presenga indica quea humanidade progride roralment Seocspectador ocupa um lugar tio notvel no julgement da histri ~ tugar que eseapaaté aos propos agentes da revolugdo — isso se exize para que a experincia do espectadortenha a ver com a quintesséncia do conhecimento ilusrado. Temos, pois, que examinar a relagto entre texperiéncia © conhecimento para entender o porqué do entusiasmo do espectador possa convertese no pulsbmetro da saide moral de urna sosiedade eo porgué da palavra da testemunha seja to irrelevant, E Walter Benjamin quem, desde o inicio, ehama aateng0 sobrea dependéncia do conhecimentokantiano de um conceito sobrecarregado por experiéncias: ora o Tlaminisme havia auetriares,entendidas nfo como aqulo 0 «qual deve sbmieter-s ncondicionalment, mas como Forgas espistais ‘apazss de outorgarexperiénia um comedo important (Benjamin, S11 150) Dele era a idsia de experincia reduzida ao ponto zero, a0 puro experiment, Pot isso defende como tarefaprortiria da filosofia do fu turo,elaborst uma nova “fundamentaeto epistemoldgica de wm conceito superior de experigacias” (GS TI 160). O que Beajamin esté querendo dizer ¢ que ateoria modems do conhecinento tem por referencia a expe rigneia cientifica com a qual o modelo de conhetimento ¢ 0 que cons- cigneiaempirca proporcions, mesmo apesar de Kant, Ora, como funcio- ‘nt.a conscigncia empirica? A conscignciaempirica se acha, em relagio 0 conhecimenta, como um sueto diate de um objeto. Kant subenten- de sempre um eu eopeo-espirtuale individual que, por meio dos sen tidos, reeebe sensagdes com as quai const6irepresentagbes. Para Ben Jamin, esta forma de trabalhar da consciéacia empiriea~, porextensd0, ‘© conhecimento flosico ~&pura mitologis, pos mo escapa so mito do hhomineulo que est dentro do homem ¢elabora o que vem de fora 1 "Nia se pode duvidar de qut no concito Kantian de conkeeimento 0 papel nis importa ¢detempenhas pls concep, por mae etna gus ej, de timers ror nia qu por meiodo sends rece senses ‘Sve guns constr sis reprerenngtes, Ma ena eanegp0 €witlogiae no {uc tenge nse onside ere, nce mesn de qualgr aura loa ‘loconkecimento” Benja, OS Up 161) a8 © que Benjamin diseute nto é que o conhecimento eietifico funcione assim, mas que essa psicologizagio seja o modelo do conhecimento filossfica. Num contexto semelhante, a figura do “espectador” adquire uma dimensto exemplar, pois € garantia da neutralidade e universalidade do conhecimento, igual como. experincia cientifica, que serve de base & conseigneia empiricae ao conhecimento filos6fico, © ceme fundamental do problema é que se confunde 6 “coneeito natural ¢ imediato da experiéncia”, proprio das cigncias natura, que se deveriatraduzir por experimento, com o “eoneeito de ‘experidncia da estrutura cognoscitiva” (GS VI, p. 36-37), Eno lugar de subjugar o conhecimento & exporiéncia cienifca, deve-se fazé-lo 20 Inverso, seguindo o espirito de Kant que ele proprio esquecew Kant Para poder fazé-lo deve-se partir de outro tipo de experignca, que tultrpasse os esteitos limites do experimento, até erigit-se no “simbolo da idade do conhecimento” (GS VI, p. 37) Tats-se, pois, de entender 1 expetiéncia nfo como algo exterior ao conbecimento, mas como a amplitude de todas as virtualdades do coahecimento, Ora a testemnunha ‘vem precisamente da ana mais recdnita da experiénei, Essa figura da testemunta, fundamental para conbecer a reala~ de, oeultada por uma aparéncia que tem carta de natureza,defronta-se ‘com uma dificuldade da qual flaram as prpriasvitimas quando dei= -xavam resquicios para que soubéssemos, mesmo que tenham avisido {que nunca saberiamos.” les esto presos entre probigo de calar ea Tso ¢neokanso viv muito er por fs rez a cea fends do onkecimen Corset cli supe» exerioridae do sto com @ ego A sutte denr det cam © gal sat une Specie de “pans ‘onscendertal” Cr Fersindee Casas 199, 77 “Tu dos seri dos arama entre sate ee inuatice ul ous 4 eae" Lane, 1985, pi). Do mesmo or € ele sa de ten ero ple on wat nn tua props oun compat human sien uve cnologe tmnt) ent, ater oar, prs em se lag, WewIenrse com ce is eh teers enal pole miei ies Hime Cee, [cinome nfitosouos.- Nu pederes compre is podsatns de ‘verano carpe’ oe iat, sala, Sesompeenet nse Cahete Ener, porque © set ode val, cisceneta pods duane ftscads de nove ne amas ambén” (Le, 198, p.208), Ae cs qa isin que Lest sete "eumpreenso cence” ke ‘ide fosient com a sigs que 4 adel ene “omens” © 19 impossibiidade de falar e, nds entre a necessidade de escutélos e a impossibilidade de saber. A testemunha sente-e forgada para falar até 0 onto de que esta era em muitos casos arazdo de vive, arazto de hut ‘contra a morte, Por isso, nada horroiza tanto afesemunha como poder perder a memsria." Mas também sabe que jamais poder dar-seaenten- {er verdadeiramente e que of demais munca poderdo saber © que ali ‘eorreu, porque essa experiéacia é incomunicavel ‘0s que entenderam perfeitamente a importincia da testemunha ram 0s proprias naistas, por isso nfo estavam dispostos a deixar ras- ‘to, Os eadaveres eram teansformados em cinzas eas einzas eram logo atitadas ao vento, Os membros dos Sonderkommandos,testemunhas fargadas de todo esse processo, ram também sistematicamente elimi nados, Os soldados da 8S, sabendo que suas vitimas confiavam de que ‘a hnmanidade descobriria aquela barbériee fara justiga,advertiam cie hicamente aos prisioneiros que sbandonassem essa esperanga poraue ninguém permaneceria vivo para conti-lo. A historia do Lager sera es- rita por eles, 08 vencedores, que seriam eelebrados como hersis, en quanto as vitmas se desvaneceriam como fumaga® Ohistriador Vidal Naguet chege a dizer que oespecifico de Auschwitz nao éaindustiali- zacio da morte ist, 0 emprego de tSenicas industrais pars matarem ass, em lugar de produzir bens; 0s fornos erematirios e x8 cimaras {de gis, por mais aperfeigoados que fossem desde um ponto de visa industrial, eram bens clementazes desde o ponto de vista éenico. Nao, 0 cessencial nfo €isso,"o essencal a negago do erime dentco do proprio crime" (Vidal-Naquet, 1991, p. 416). Queriam eriar urn acontecimento ‘epoca som tstemunhas. ™ecleagia"O ue Hempel, prexenpo cha oexpiagte” se aprinaris fosque Lev chan "empresa" soa tata de exacts tm acres Msi pola vid soilidade Mi tae etarav que {let chun “cndesimeno cine com 3 “eapethso" em Hempel 0 ‘on Weight ao ql alr epee a conhecimeto cena, ua sproxinago, sempre infin. porgue eva om consieragio a iberdale itvondctnaia do get CIC. Vine “El conseimiem bto” en Nate (ee) 1995, p 27-280 + EN ona G0 na dominate mo siogo ese. Semprine , Wiese (198). ‘ete dogo gunn dase Wiesel “a too eo pede pre ln + Primo Leveaue sve com ext fled Ox ofrodare or oa astesenta oa ‘lo prea despot ds sont ora J cine gh igre {que come, mes qu sobravv, ser acediodo (p11 5). 180 1. TESTEMUNHO E VERDADE, A figura da tester coaverte-s, ass, em porta giratsria de todo olhar presente pata 6 passado e de toda vigéacia do passado no presente, Tratase, pelo que acabamos de adiantar, de uma figura Tartamente complexa, pois, se por um lado nio existe verdade da realidade, se falta esse testemunho, também & certo, por outro, que a verdade eseapa ao testemunho, como bem assinalava Blanchot quando se pergunta “como filosofir, como eserever no recordar de Auschwitz, ddaqueles que nes disseram, is vezes em notas entradas a respeito dos crematérias: sabei @ que passou, nfo esquesais,e, 20 mesmo tempo, fnunea sabereis” (Blanchot, 1980, p. 130-131). Nunea, nem com seu {estemunho, saberemos 0 que ali ocorreu (© que logo chama atengio, em face da centralidade ds testemu- nha, na hora de entender a verdade de uma paca, éfragilidade dessa figura ao lougo da histria da flosola. A testemunha é fundamental no pensamentojudico, mas no na flosofiae, dentro dels, nas tearas do cconhecimento, Na filosofia, a testemunina nfo ¢testemumha da verdade porque verdad ou ¢ objetiva ou & intersubjetiva mas nunca subjugada 4 estemuno subjetive. ‘Atestemuma nfo desempenlna nenhum grande papel, mas alguém {quese parece a ela, mesmo que sea adicalmente diferente. Refiro-me *igora do espectador. 0 ilustrado Kant coloca no espectador o baréme- ‘odo nivel moral de uma sociedade. Quando se pergunta se existe pro- _eresso moral go longo da humanidade, responde que sim e que oetiterio ‘consiste no maior ou menor grau de entusiasmo dos espectadores. A Revolugio Francesa, por exemplo, supés um avango na consciéncia ‘moral da humnanidade pot essa “simpatia [dos espectadores) limiteore ‘no entusiasmo, cuja manifestago [..] lo pode (er oura coisa senio a ‘denna disposigo moral no género humano”* Existe, pois, uma dispo= siglo moral na humanidade que determinados acontscimentos bistri- ‘208, como a Revolugéo Francesa, ativam, produzindo uma “sitmpatia limiteofe no entusiasso". Esse papel pode ser desempenhado pelo es- Tian Ka, spor no Matara winereto claeconmopelia yeas arose Fiona intra tea Enron deC. Pade © 8 R ‘Kray, Mari Teens, 1987,» 88 ae ‘pectador porque éneutal, no estar implicado, por isso pode ser obje tivo, O observador de fensimenos sociais tem a mesma credibilidade {que o pesquisador das ciénciasnatuais: podem avaliar a experigneia ~ ‘6 experimento~ porque nio influem nele, nemo julgam com interesse. A tostemunh ao contro, est implicad, por isso nto tem eredibilidade racional ‘A implicago da testemunha é dada desde as suas origens, segundo ‘orelato de Giorgio Agamben. Agamben remete a palavra “testemunha’ 0 term latino ano, que significa originariamente aquele que inervén no ato de uma menor para conferihe o complementa de validade que the & necessria, Evoca, portnto,o termo de mor. Entre as acepees mais antigas de cwror iguram as de vendedor e estemunha. O que elas tém a ver com os fermos “autor” e "nutor”? Vejamos. O vendedor & ‘autor 00 tutor tanto. quanto intervém igual a0 autor, como principio Tegitimador da venda, do ato de vender ou, se quisermos, como um clemento complementar para a compra, Ua compra nfo vale mais se ‘quem vende ¢proprietirio daquilo que vende, Nesse sentido, o vendedoe ‘cumpre o pape legtimador do autor. Também a wstemunha & auto. Podemos dstinguir das modaldades da testerunha: testis supértite. Se testis se rere 4 testemonha imparcial que presencia o litigio ene «duas pessoas (sentido aproximado, pois, 0 de espectador), supérstite & stutor enquanto faz um relato na primeira pessoa de algo prévio, que & confirmado pelo seu testemunho. A testemunha, nesse sentido (6 e586 sentido ao qual nos referimos)"éele quem viveu até o final a experiéncia fe, enquanto sobreviveu, pode se referir a ontros”,” Assim, pois, 0 testemunho & sempre umn ato de auto, quer dizer, implica dualidade essencial: por um lado, o que necessia ser legitimado ou completado,e, por outro, a complementagae que é dar voz aos que ale tm voz. Com go seria sem sentido um testemunho que pretendesse valer por si 6, ‘somo seria sem sentido se aque sobre o qual se testemunha tivesse voz propria. 0 testemunba € uma voz na primeira pessoa que nos fala em rome da trea pesto. Diziamas que ado existe apenas reflexto filosdfica sobre a testemunha e isto merece um escatesimento, pois ela foi instruida em ‘hlv-ne ds considers flies de G Agamben 2000,» 186 182 um procedimento em autores come Fr Levinas ow Walter Benjamin 1 Rosenzeteig, Emmanuel 1 Para Rosenzweig a verdade ¢testemunho Para Franz Rosenzweig, a verdade é testemanho, Sua flosofia ccomega, como bem sabemos, por uma denincia 8 filosofia cident como idealist. A iusto de que o pensar precede ao ser converte a realidade em mero subministo para 0 conhecimento, A realidade é 0 pensivel e como o pensado se pensa conforme o mado de quem pense, pensar a realidade é pensar-se. A verdade & ent, um assunto entre a ‘mente que pensa eo pensivel da realidade Em face da nica que dominou a flosofia “desde os jénicos até Jena” Rosenzweig situa sua filosfiaexperiencalcuj primeiro objetivo 6 liberar do cole idealist a liberdade nela prisioneea. O resultado dessa operago destruidara ou deconstrutors éa presenga autSnoma dos {18s elementos que compdem a realidade sobre a qual a filosofia nfo cessou de trabalher: Deus, homem e mundo. Uma flosofia que se prestgie tem que reconhecer a prioridide Isgica e antoldgica dessas salidades e renunciar, portant, em considetilas produtos do sujito ‘eognoscente,O interessante para nosso propdsitoé que esses elementos ‘originsrios da relidade manifestam-se ao fldsofo crtico do Mealismo ‘coma elementos isolados, encerados em si. A critica, o mais que possa {ager om sou labor anaitca, édescobrir sua existénca isolada, mesmo que na sua existéncia real esses elementos funcionem de fato relacionados. Para captar a realidade desses elementos a flosofia ter que reconhecer a proridade do ser sobre o pensar. A ilosoia que parte du realidade descobre uma inter-relagio entre os elementos oriinirios ‘que ea expressa com a particulae, Dessas relagdes ~ eragas a particula ‘¢— sairam as grandes experidneias da humanidade: da relagto entre Deus ¢ 0 mondo surge a crsgto; da relagio entre Deus e o homem, & revelago;e da partculae ene 0 homem e o mando, aredenso Esse ¢assinala una concepeo especifica da verdade, que nfo se ‘esgola em si mesma, mas que remete para algo ou alguém fora de si: ‘sem mundo allo existe eriagdo; sem homem nfo existe redengto; sem Deus, no existe revelagio, A verdade & verdade para alguém, Estamos Tonge de Spinoza para quem a verdade se revelaa si mesma: uma idéia 183 verdadeira ¢ a que conece a esséncia do cbjcto que ela representa (Moses, 1982, p, 283). E longe de Hegel que afimava que o Espirito comhece o Absolutona mea em que o Absoluto se encara no Espirit, Isso para Rosenzweig soa a tautlog! A veracidade da evidéocia nfo se fundamenta no préprio sujeito copnoscente mas fora dele, Rosenzweig siturse, assim, na esti Descartes das Méditaions métophysiques que coloca o titim ei da verdade em Deus: a bondade divine garante que minhasidSias claras « dlistintas sejam sempre verdadeires porque sua bondade e perfeicto no permiter enganat-me, Coincide com o filsofo francés no conven cimento de que 0 fundamento de um pensamento verdadeiro funciona ‘como um ato de fA verdade no se consegue com demonstragaes apoditicas, mas pelo testemuiho que dela sed; o que significa que sem renga numa cumplicidade entre o testemumho que se de a fonte do que se dé testermunio, mais ands, sem o convencimento de que a fonte a verdade necessita e gerante 0 testemunko, no exisvia verdade Rosenzweig se expressa nesses termos referindo-se aos flosofos que dominaram “desde os jénicos até Jena ‘Ao conto da verdade dos flsofos, ques se pode concer a si ‘mesma, esta em que se Vedade pata alg. Mas ses pode sera, ‘pode lo parao uno Por isso ¢quesejnecessrio que aosa verde se fgamtpl equea vedadese transform em nossa verdade. Assen avetdade dela de sero que dverdadeio ese converte nagilo ge] ‘quer ser confinmado como verdadeira. 0 coneeito de eonfrmaglo da verdad (Bewahrung der Wairhet) converte sen conceito fundamen] dessa nova eaia do conhacimenta™ (Rosenzweig, 198, . 76)! E para que fique claro o papel da testemunha nesta concep gto da verdade precisa, para que existam verdades, tis como dois © dais sto ‘quatro, ou propria tora da elatividade, que dependem de um esforgo ‘especulativo, mas existem outras que o Homem “do pode coafirmar a no ser com a oferenda de sua vida", sem descartar 9s que exigem, para hogar a serem tais, “o compromisso vital de todas as geragies™ Rosenzweig, 1989, p. 16-77 Para odo ete po resomentase Maes, 198, p 277289, 188 (0 eritério da veréade tem que ser exterior & subjetividade e isso significa que para o homem a verdade exige um modesto ato de confinga: 4 Tonte da verdade no esti 4 mere do conhecimento objetivo, da lemonstraocientifiea, mas que se expressa mediaateo testemunho da ‘ida, Podem dizer que exist umn fundamento transeendente da verdad, mas um fundamento que se confirma na experigncia. As verdades da texisténia si 0 testemunho da verdade. As verdades nfo se medem por lum etitétio objetive que decide o que € verdadeiro on falso, mas pela sia capacidade de erat creibilidsde. Rosenzweig fo vé outra manera de defender a encarmasio da verdadena expergncia anto ser revorrendo ‘uma fonte transexperiencala vida. Isso significa quea vids €0 gar dda manifestagao da verdade, a qual dé testemunho da verdade que transcends 0 homem. ‘Comparemos um posicionamentoimanente com outro transcen~ ‘dente ds verdade, No primeiro ces, x verdade & participagdo aydnima na razio universal; no segundo, a pessoa decide o que é verdadeiro na ‘medida em que dé testemunho, Na realidade da existéncia, a verdade se ‘prova racionalmente, mas que se aprova, se testifica.Averifieagio (Be~ ‘warang) &aprovagio e verfieagio: ‘A verdade tam que ser fetacverdade(verifeada,e presismente do ‘modo come comtumente se neys: deitando estar & verdade fod © ‘econlevenda, no enfolo, ela verdade tera a porgio qual atm (osenzig, 37/1997, p. 462), Joga-se verdade na experitncia do homem, na confissio que © Ihomem faz dela © mesma que a expetigncia concreta do homem seja ‘uma porgio muito pasticulr, assim sejoga 0 ser ou ono ser da verdade toda. As proposigSes nfo slo verdadeiras ou falsas em si mesnras, mas ‘ero que serreferendadas pelo que segue de sorte que a seqnencia & 0 ‘que testifies ou verifiea a verdade da proposiezo. Eo que éaseqténcia, ‘esse lugar onde se verifia a verdade? Nao seri na conclusto do silogismo, mas wa vida, Estamos diante de um tipo de logics — “inessinica” dria ele ~ na qual o decisivo 0 camino que leva attavés das verdades que custa algo ao homer, até aquelasoutras que apenas pode veriticar com 0 suerificio de sua vida, Estamos, pois, diamte de ‘uma ligiea que “valoriza as verdades segundo o prego de sua confirmayo 185, segundo o vinculo que criam entre os homens” (Rosenzweig, 1989, p, 7715 A vida converte-se em testemunha de win momento previo cuja verdade ou mentiapende do testemunho da vid. Para. homem conereto 0 verdadero éagulo pelo qual vive Isso «que sentido sua vida se torn verdadero ma medida em que 0 homem ‘cones, Se isso € assim, explica-se que todas as Verdades humanas ‘so paris, pois vm a existéacia pelo testemunho do homem que assim ‘quer. Dai se podetatirar a conclusdo de que no existe verdade-una, porém tembem a contri a saber que a existe verdade porque a verdad se partcipadumente,Podemosinchusive dizer que os homens repartem ‘a verdade na medida em que cada um dé extemuso da pare da verdode ‘que the fo dado experiment ‘Outro momenta da concepso rosenzweigana da verdde &0 da sua indecibilidade ou inpronunciabiidade. O nome, o nome proprio & ‘ que expressa a singularidade eredutvel de eada ser human. [ss se ‘observa bem no momento da morte, Quando o moribundo for despojado ‘de todos os acidentes roupagens com os quais foi identificad ao Tongo de sua vida, apenas Ie fiea © nome priprio, sé responde quando & cchamado pelo seu nome (Ora, Rosenzweig se apéia na mistica judaica para assinalar 0s limites da linguagem, em geral, e do hemem, em particule. A cabal, or exemplo, distingue, a propésito de Deus, enire » Nome revelado-e esstncia transcendental de Deus. Rosenaweig recorre a essa distingio quando disse que aldm da revelag3o, do Nome revelado, no existe lin {bua por isso, o Deus absconaitus nfo tem nome, A tradiglo judaica & Fiel a essa distinio quando estabeloce um nome “pronuncivel” que corresponde a outro nome que &mpronunciével.” Que o Nowe revel CE tb Ase, 1934, 488. Sobre a cacao singers otuiversl feos gurenesaeAdoro inima mraia.O que comet iagularem exis, pratt, dor de toda tnversdade™ io sina em saguasade, rma, prone, { universidadeabsvatn Se dsermos que "xo somos uae enth, dh > reso tio un como our, e por ise gaigue sm poder dela ae cot {o.com a qu exch ig o que ao sea ele Eng airamos a dite site apart o tds, eto, repos s singular carer de eno, de ‘cde representantes” (GS 4, 90-9: Ad, 199), 9.7779). “im vez de plo seu Nome o etamsmos Soho Noe meu ala e038 boca” (Rsereweip 190, 9.427 1997p 451-882) 186 1 re eet oneor do seja uma pla verbalizagdo de um nome proprio impronnnsiavel & tum esianho paradoxo que sé se entende se levarmos em considerag0.0 «que se quer dizer ap homem éque o nome da linguagern no &realids- do hima posto que reenvia para uma essEncia inomindvel. ‘Do questionamento de Rosenzweig sobre a veniadecabe destacar dois aspectos, Em primeiro lugar, que a verdade €testemunbo, A verdde {para algum que verifies o verdadeiro do questionamento. A testemunha 6a garania da verdade, que verifica com sua vida ou com sua more. Em segundo lugar, que a verdade¢incormpreensvel porque ¢inomisvel Isso fem conseqiéncias para a testemutha, pois, na medida em que a ‘estemunha pe nome & verdade, personiticaa; © que agora se disse & que este nome apenas um substituto de um Nome secreto, impronuncidvel, A testemunhs deve remeter, portant, para um siléncio 0 qual se obra. 2 Em Levinas o dizer étestemunho Em Levinas encontramos também um esbogo da teoria da testemunha a propésito de sua reflexto sobre a relacio entre odizer © clita, Arclagio entre eles! no fa mesma entresigniicanteesignifiead, ‘entre o significado e 0 dito. Nessas relagbes v dizer aparece como um prinepio prévioe superior, afonte da qual emanao dito, oreferente que ‘ede a verdade do dito. Para Levinas, no entanto, o dizer € de outraordem. Expressa-o ‘eserevendo que “a dizer estemunho" (Levinas, 1987, p.224).0logico seria que o testemunho fosseo dito, como num juizo em que a palavra dda testemusha € garantia da verdade de um fato que ele presenciou, por exemplo, Aqui o testemunho, 0 dizer, & uma projesto, “um sinal ‘dado ao utto, que consisteem entender vida como "aventura humana «da aproximagao a0 outro, por meio da substiuigae do outto, por meio da expiagdo para o outro” ibid, p, 224-225). O dizer & a construcko * Roasevsig ssn que tina paar poe se «hing, ec pe. um Jewel de Wore prawns du plage 8 ten vine ase ‘erie snl" eine in torte qu design oo eindo (190, p ‘24,199 45), Nerem Levinas, 1987, p. 215261 ‘ica do sujeito que se resolve na proximidade,substituigto ou expiagio para © outto. Estamos falando de um dizer que & 0 depois, um escutar 0 feconbecintenta do magistério da palavra do outro. Atestemunha nfo & ‘quetnfala, mas quem esti em tens, dispost, disponivel para pergunta ‘que vem de fora." Ser testemunha equivale em constitur-se em uma sueito human. ‘Vimo, na filosofia propesta por G. Agamben, que a festernunha se deve & autoridade de algo prévio, mais fontanal, ou superior. O chamado em Levinas € que a autoridade da testemunba nasce da ‘mpoténcia do outro. Quer dizer, 0 testemunino, nfo eonsste em fazer lum gesto em relago a esse outro vuleravel, mas em se constitu em testemunha tanto quanto um responded soictude do outro, Atestermunka ‘eonsiste em dizer “eis-me aqui”. Esse “eis-me aqui soa como resposta para uma convocatéria que alguém me faz na demands de ajuda, Mas Io € isso: 0 “eis-me aqui” da testemunha é diferente, pois do existe convocagdo prévia, mas, antes de tudo, & a resposta. © ser humano sabe em um determinado memento que s6 pode Ser humano quanide se compreende como responsabilidad diante dos rostos, por isso mesmo, ilo necessta que o chamem para que responda: antes de que mechamem, cu respondere. E nessa tesponsabilidade jf esté dada a ordem do outro 0 qual eu me spresento com meu “eis-me agui. 0 testemuunho consiste na assungo da minha responsabilidade diante do outro. Entendamos bem. Uma eotsa ¢ a solieitude pela fome no mundo, prépris daquilo ‘com que costumamos chamar um ser responsive, @ oui coisa € que apenas enquanto en respondo pela forme no mundo cu me consttuo em set moral, No primero caso minha ago, solidéria, dé testemnnho de Paco Penaver formula com precsto quando escrove ave “a sociedad, a Tngunges, pos, trent coscian oa revo da rere Mieco ivinos trae ingigan ns qua o ote me enna, seine qi ssbte © dinamo da libra e elaa0 ao cut. A recipe do logs ou 8 munca ere ium vise postr essen =e ingangen, tas qe oct sia esas im ort (Peale, 2001. 0), "ttn me orden 0 io sa rot, sm expose 4m to Inpaiante quot mais eee pom. Orden gue noe sido ‘tsa da minha resposta, na seqer ins gust gu nese proved rum Ailog. Orem que eu encom mint pris pst, aul sagan Sal sto primo, enn qeeisme a eer ds vince, srt ‘gua ina esponstldde oder ri lad Fase ie petece ‘esa ld da gual eterna” Levins, 1987, 9.23, 188 tum sentido da responsabilidade que eu tento, enquanto no segundo feaso me constituo uma testemunha com minha agio de modo 0 testemunho consise na constitugho da responsablidade, Ndo existe nada ‘de moral anterior a esse resposta (0 testemunho ndo é aqui uma declaragao a favor do outro, mas um gesto consttuinte de subjetividade, um “eis-me aqui, um recone cimento da eutoridade do outro desvatido. Bey Levinas a festemanha ‘fo esti em Fungo do silencio da alteidade que me constitui num su jto, ante quanto me entendo e me situo como ser responsive Seo ser {estemuho se resume na resposia“eissme aqui" festemuno que se manifesta através dessa respostaremete autoridade do outro desvaido. 3 O narrador como testemunha, em Benjamin (Qs elementos para uma teoria da testersunha da verdade em Benjamin poderemos encontrar sincopadamente em seu escrito O norrador 8 parragio alimenta-se da experincia daquilo que corte de ‘boea em boca, sto implica que se entenda generosampente a experiéncia do narador, ois se refere sua e&experigncia dos demais."" O que, no cenlanto, Benjamin assinala em seguida € perda de experiencia, coma ‘qual complica-se a vida do narrador quando secar a fonte do relato.* ‘Com a perda da experiéncia perde-se a sabedori, que € uma maneira de ‘iver diante dos acontecimentos, sabendo lero texto eat 0 contextono qual se produz um foto determinado.* [A perda de experigncia, como 0 mal dos nossos dis, tem das ‘causas. Em primico lugar, aocultagio da morte, Aburguesiaprivatizou ‘0 morrer, que era até entio “um acontesimento piblico na vida dos individuos, sumamente exemplar” (Benjamin, GS 12, p. 449: 1970, p. '= 70 adr toma oq nar experiencia ia peri ou ara qf trams” (Elnard om We Bejan, 08 12, 9.43) "Reser es em wane de desapnece” (Bexar, GS IV2, p59; 1970, ish esac pobre em iris esos” Beaarnin CS 102, p. {o70,9. 198, " comecgeia ela é que to sabes dar em tomar const, “0 soetho ‘io €tato «respect a unt ieropxto quate popes lias 8 seers de ia bstla qe se a deenvlvend” (enim, 8 102, . #42; Beja, 1970.9 192), 189 198), Na experincia do morrer transmitem-se as formas nio dos conhecimentos de um homem, mas, sabretudo, de “sua vida vivida ¢ essa €-a maria com a qual se fazem histrias”. Outro agente muito tivo no enfraquecimento da narragio ¢ a informagio. O tempo da informagio € o instante, como bem aprecism publicitar 0s meios de comunicagdo, enquanto ¢nartador “pestaatengao navidad que ver de longe”, © tempo curto da informagao opde-se ao tempo longo do relato, Sua forge portato, sua autoridade, no Ihe advém da constaagto ‘que alguém posse fazer da noticia, mas de seu mistéro, Para esclarecer este ponto recorda & passagem de Herédoto que conta 6 encareeramento do rei egipclo Psammenito. Submetem-to a forturas e sotimentos ¢ ele ndo se altera © no muda de atitude. Vi padccer seu flho, a sua filha © no move um misculo sequer, Mes 20 reconecer na fila dos prisioneiros um dos seus servidores "comegou a solar acabeca com os puns, danda todos os sinais de uma profunda dor” (GS 12, p. 195; 1979, p 195). Benjamin vé nsso a esséncia do relato, porque ndo explica sua reagio, a0 no dar explicagdes de sua ‘surpreendente conduta, deixa abort porta para todas asinterpretagbes, ‘obrigand as geragdesfaturas para um proprio esforgo interpretative.” Herddoto nada explica, igual aos cronistas medievsis que renunciam buscar explicagdes racionas dos Tatos porque se inserem num plato divino que & insondivel. Em lugar de demonstragaes, © eronista proporeiona exposigbes de fatas ques insevem numa trama cxjo sentido ‘escapa aquele que sedi conta dela e que por isso mesmo deixa a porta aberta para novasinterpretagdes 0 relato mio se esuots no narrador, Sem ouvinte ado existe narragdo, melhor dito, sem ouvinte que se faga narradot nko existe narragao, “reatar historias € a arte de saber cont-las, ese perde quando ashistias deixam de ser retias", E assinala uma condigto necessiria para que. ouvinte se converta em narador:“Quanto mais esquccido de simesmo este ouvint, tanto mais profindamente se agudizao ouvido nele” (Benjamin, GS 1/2, p. 447; 1970, p, 196). Essa comunidade de narradores, que foram consttuidos tanto pelo narrador como pelo ouvints, “Dat qe ess hist git ago sei ap, depos de miles de noe, de evoear emirate eet (Bemin, G8 Hp. 446, Benji, 190. 190 Ema especialidade do relato ou da crénica que no encontramos, por ‘exemple, na novela. Aio leita esti a ss. (0 nartador de Benjamin tem tragos anunciadores da testermuna, ‘Ambos, com efeito,alimentam-se da experigncia. A diferenpa entre & testermnha e o nanrador & que para aquele ests servida a experiencia da mort, enquante este pode vir na teroeira pessoa, Se a experiéncia da morte éonicleo da expergneia esta somente pode faltar&testermaniha ‘quando renuncia para sé 0 narrador est mais exposto a perda de ‘experiéncia porque pode conkecer a morte apenas de owvido. ‘Outro trago comum € que nem © narrador nem & testemunha pretender esgotar as explicagdes, Melhor fazem perguntas, deixam imerrogagies, como o rei egipeia. Como essas sie inesgotévels, slo existe eomprecnsio possivel que esgote 9 sentido de uma experiacts, "No caso datesternha, como veremos, existe um sil2ncio que atavessa todo seu testemunho, Sendo for capaz deremeter a iso, 0 testemunho& suspeito, Também onarrador épessionado pelo siléeio tanto quanto.o Felato expde e nao explica; mostra, mas nto demonstra, deixando esse tmistério ou sléncio como legu ds gorges posteriores. © sentido do elato & converter o ouvinte em tstemunhs, Para tal, énecessirio que oestemunin seja um acontecimento para oouvinte ‘ou. leitor, Quem expressou este ponto de maneira excelente foi Claude ‘Lanzmana em seu filme Shoah. Essa oto horas € meia de filme —cujos protagonistas no sf0 atores, mas sobreviventes, sem reconsirugio alguna do que pode ter sido, e mostrando unicamente tagos, restos 0 ‘que hoje se tomou aquee passado —ndo é um documentisio, mas un filme com o qual o dretor eata de provocar uma experiénea esttin ‘apae de converter o espectadorem eimplie do relato, em testemunh® Se reuninmos os elementos dispersos nesss dstintas aproxima- ‘es, pademas tentar um desenho da testemunha com esses trayos co Em primeiro lugar, @ r2lacdo da testemmnha com a verdade. ‘Quando Simon Srebaik, no filme Show, pronuncia um “era aqui, est desvelando uma realidede oculka 40 conhecimento comum. Pode set =m campo ees dace do Mince dss inplieages moras encont seem Tet 2001 wt que o testemunho mio seja capaz de abarcar tode a verdade; o certo & ‘que sem ele tampouco existirs verdade, Sem a palavra da testemunha o bosque seria apenas bosque e nunca um campo de exterminio. O que isto quer dizer & que a meméria da testemunha nao s6 constitul uma pega acusatéria contea os ctiminosos do passado (valor juridico do testemunho), mas contribu’ pars. a reconstrucio da realidade desseespao (valor eistemico): esse bosque e campo, ou melhor, um bosquenascido sobre a auséncia da campo, Bm segundo lugar, a verdade éverlade para alewin, Nia existe verdade emi, pois aquilo do qual se testiica nfo tem mais verdade que 1 verdade verificads pela testemunha. A testemunha corrobors 0 scontecimento originirio, Sem testemunhs a verdad se frustra,pois nfo existe maneira de que realidade chegue a sia perfeigdo, Este seu ‘iazerverdade no consist em desvetaro ser do ente, mas em remeter 0 fente para a verificagto da testemunha, Mas a testemunha no pode encerrara verdade; ao eontririo, seu papel é de impedit que seencerreo «330, que ele sejaarquivado numa éeterminada versdo. testemunho no pode eacerrar a verdade porque ela escapa dele mesmo. E 0 cembaixador de uma expergociainomingvel e sabe que sua minsBo ‘Principal onsite em entndé-la como aguilo quedo ue pens, como ‘0 impensad, algo que ninuém pode dee por deinitvamente pensado, ‘Nivenseverdde sem estemunto, mesmo que oreconbecer d verdade escape a estemunho Em teri gar, sea verdade&testemunio os testemunos sto to varados quantoa vid, verdade pla. Dai no deriva nenkum relativismo, pois todos esses testemunhos da verdaderemetem pare um 'além da inguagem”, que silencio. E uma surpreendente iin da ‘verdad, pois ndo existe sem a pala da testemuna, as esta enaia «emseu papel se nzoremetese ao silencio do qual procede, Esse silncio exigiro, pinelpio fi do estemunho, tem diferentes tatamentos. Em Rosenzweig, €aessécia ingistica do nome, que €inizivel. As coisas tém dois nomes: um que é diaivel e cognoseivel e outeo & inominivel. Para Benjamin, a nudcz € a incapacidade de 0 mundo expressr-se por mesmo, tendo que recorer 8 inguagem humana: ¢¢ também a incapacidade do homer, depois da queda, para nomeae. Auschositesupas uma brutal revelago do signe da testemanhas 0 sobrevivente fla, mas no desi porém, em nome daquele que no tn 192 voz Ble cumprea tarefa que Benjamin impura a escrituea:conduzir 0 sileneiado para a palavra” sé que isso se revels indizivl,resistnte a uma expresso suliciente, com 2 qua a palavra se converte em guardia do sino. A testemuna no puarda silencio, pelo contrrio, tem que falar, mas conseiente do limite da Tingvagem, protexe osiléncio como fonte inesgotivel da palavra Por isso a testemunka, que no pode ‘euardarsiléncio, tem que guardar o silencio. Em quavto lugar, a relago entre testemunho e morte, Na medida fem que a testemunha, como 0 narvador de Benjamin, limenta-se da cexperigncia ~ nlo se testfiea por ideais ~ © a morte & wim momento privilegiado da experiéncia, tstemunho ¢ morte implicam-se mutua= ‘mente. Se Benjamin sublinha a experigncia da morteé porque ea cst. liza. conjunto da vida Porér, em que morte esti pensando? Pareceia que na vide dos patiareas bibieas, esses que viviam muito, deixavam airs de si viras geraghes de descendentes € morriam rodeades pelos seus, Mas Benjamin ndo pensa 6 nisso; ele sabe e deixar escrito que se pode lr numa biografia todo o sentido de wna gereg0, enum acontes mento, 0 sentido de uma vids, Coincide esta aprecagao flosStics com o testemumbo tanto dos afimelados como dos salvos, para utilizar a de rnominago de Primo Levi, segundo os quai se envelhecia num instante Porque em pouco tempo no sofrimento extremo se fazia a experiéncia fe toda uma vida Finalmente, a testemunha dissolve-s se nto tiver herdeitos, por iss0 busea 6 letor, 0 ouvinte ou 0 espectador, para converté-1o em ‘estemunha. A testemunha nfo conta uma histGria, mas se conta, ent, set para nds, ele vem nos buscar porque a verdade que ele ilumina necessita, para manterse vigente, » cumplicidade de alguém. Para consegui-la,atestemunha recor todos os meios, Primo Levi, que ere na razio do interlocutor, recorre a ume “linguagem sdbria e sob 3 “Mina dem esti ede rt sua objivos exo mes tempo alemen riicosé ena condi asl ail eps paler (aaa Sueno 7 de tho de 1916, em Gest Brey 325-127) “Char siecle € que guoremas todo, Som abil, eeevendo” disse M, Blanchot Citado por Arsau Pors em sua lnendiads dese de lancet como testemnho, CF. "La palabra en estage (gar ct derecho de Blaechot al tester" Revises ees 192193 dicen Mori Bot Vacseriuna def sono, p25, 198

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