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Atualidades

EXCLUSÃO DE SÓCIO EM SOCIEDADES LIMITADAS


NO NOVO CÓDIGO CIVIL

L eonardo G u im a r ã e s

1. Introdução. 2. C onflito* de inleresses entre o s só cio s: so lu çõ e s. 3. S o ­


luções te n d en tes a a co m o d a r inleresses so cietá rio s, sem a d is s o lu ç ã o ,
integral, da sociedade: 3.1 D issolu çã o p a rcia l; 3.2 D ireito d e recesso ;
3 .3 D ireito contratual de retirada; 3.4 E xclu sã o d e sócio. 4. B rev es c o n s i­
d erações acerca do novo C ódigo C ivil no to ca n te a o direito so c ie tá r io :
4.1 S o cied a d es sim ples e sociedades lim itadas; 4.2 H ip ó teses d e e x c lu s ã o
do q u o tista na sociedade lim itada: 4.2.1 A u sên c ia da co n trib u iç ã o e s ta ­
b elecid a no contrato so cia l; 4.2.2 F alta g ra ve n o c u m p rim en to d a s o b r i­
gações; 4 .2 .3 Falência do sócio; 4.2.4 L iquidação da so ciedade; 4 .2 .5 E x ­
clu sã o de sócio rem isso; 4.2.6 R eso lu çã o d o s só cio s m a jo ritá rio s em re ­
lação a o s sócios m inoritários. 5. C onclusão. 6. B ib liografia.

1. Introdução 2. Conflitos de interesses


entre os sócios: soluções
Como em todas as demais espécies de
relações humanas, aquelas entre os mem­ Os conflitos entre os sócios da socie­
dade limitada, sucessora da sociedade por
bros de uma sociedade mercantil são, cer­
quotas de responsabilidade limitada — tipo
tamente, complexas e as divergências, se­
societário a ser, adiante, exam inado — po­
não freqüentes, são bastante prováveis. En­
dem ser solvidos, genericam ente, de duas
quanto um sócio deseja reduzir seus funcio­
formas distintas. A través da:
nários, a fim de conter custos, pode o outro
alm ejar uma expansão das atividades, com (i) dissolução, integral, da sociedade;
conseqüente contratação de novos empre­ ou
gados. O mais ousado planeja diversificar (ii) saída de um, ou m ais, dos sócios.
os produtos oferecidos aos seus clientes e Dentre as hipóteses legais de resolu­
o outro, em contrapartida, pode ter por es­ ção para conflitos entre sócios, apontam os
copo a concentração das atividades da em ­ doutrinadores, bem co m o os sodalícios
presa. Estes são alguns dos diversos exem­ pátrios, de forma unânim e, a saída de um,
plos de possíveis conflitos. ou mais, dos sócios — com a conseqüente
Se a solução para estas divergências m anutenção do funcionam ento da socieda­
for alcançada, ótimo. Entrementes, caso não de — como sendo a m elhor resposta, arri-
haja convergência nestes entendimentos, m ando-se, em apertada síntese, cm dois
iniciam-se, aí, os problemas não apenas dos fundamentos:
sócios, mas, em últim a instância, da pró­ (i) Fundamento de ordem socioeco-
pria sociedade. nômica. A m anutenção da em presa interes­
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sa não apenas a seus sócios, mas, efetiva­ sor C e lso B arbi F ilh o em sua obra de
m ente, a toda a coletividade. Com a saída doutoram ento.1
do quotista, a em presa sobrevive ao atrito
entre os sócios;
3.1 D issolução parcial
(ii) Fundam entos de ordem legal. Há
inúmeros princípios legais, hoje em vigên­ A dissolução parcial ocorre quando o
cia, que justificam a adoção desta solução, sócio, por ato unilateral de sua vontade,
consoante será analisado adiante. afasta-se da sociedade, sem que esta se d is­
Com o a dissolução integral da em pre­ solva e que se extinga a pessoa jurídica.
sa é m edida que não interessa a ninguém São hipóteses legais expressas para a
— face, m áxim e, aos aspectos sociais que dissolução parcial:
envolvem a q u e stão , com o asseverado
(i) discordância do sócio com altera­
alhures — , resta a saída do(s) sócio(s)
ção no contrato social, nos term os do art.
com o solução cogente (caso possível, ob­ 15 do Decreto-lei 3.708/1919;
viam ente) a ser adotada em conflito entre
quotistas. (ii) em caso de sociedade celebrada
por prazo indeterm inado, por vontade de
um dos sócios, consoante disposto no art.
3. Soluções tendentes a acom odar » 335, n.,5, do Código Com ercial;
interesses societários, sem a dissolução, (iii) ou quando o Contrato Social per­
integral, da sociedade m itir a retirada do sócio, “ fundamentando-
se tal cláusula no n. 7 do art. 302, com apoio
Tendo por escopo evitar a morte da nos arts. 335, n. 4, e 308, do Cód. Com .”.2
sociedade em decorrência de conflito entre
Conclui-se que a dissolução parcial,
os seus quotistas, construiu o legislador,
no sentido jurídico da expressão, é o pro­
bem com o os sodalícios pátrios, em legis­
cedimento de saída do sócio, sem a extinção
lação codificada — C ódigo Com ercial e
da sociedade, im otivada ou não, no caso
Civil — ou não, form as que viabilizam a da sociedade haver sido constituída por pra­
saída do sócio, com a m anutenção do fun­
zo indeterm inado.
cionam ento da sociedade.
N o sentir de M auro Rodrigues Pen­
C onfundem -se, no entanto, algum as
teado,3 a dissolução parcial opera-se como
vezes, os operadcfíés do Diréítd' nà carac-'"
efetiva denúncia vazia, sem que o autor da
terização do que representa, legalmente, a “denúncia” identifique a razão pela qual
saída do quotista da sociedade, reputando- está adotando esta postura.
a, indistintam ente, com o sendo dissolução
parcial de sociedade. Poder-se-ia acrescentar a esta obser­
vação, apenas, que não se trata a dissolu­
V erifica-se, pois, efetiva confusão ção parcial, exatam ente, d e um pedido
entre os institutos d a (i) dissolução parcial “im otivado” ou m esmo “ausente de razão” .
de sociedade, do (ii) recesso e da (iii) reti­ O corre que sua sim ples existência é sufi­
rada, bem com o da (iv) exclusão do sócio, ciente para que se presuma a perda da affec-
este últim o objeto de estudo mais aprofun­
dado adiante.
1. C elso Barbi Filho, A D issolução Parcial da
M uito em bora possam ser encontra­ Sociedade po r Q uotas de R esponsabilidade Lim ita­
das obras, bem com o acórdãos, em que os da (Tese de D outorado), p. 153.
quatro institutos são reputados sím iles, c 2. Fran M artins, "R etirada de sócio por per­
missão contratual c apuração de haveres”. Estudos
certo que cada um apresenta suas particu­
de D ireito Societário, pp. 229-230.
laridades, com o bem dem onstrou o esti­ 3. M auro Rodrigues Penteado. D issolução e
m ado e prem aturam ente saudoso Profes­ L iquidação de Sociedades, 11 ed , p. 140.
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tio societatis que uniu os sócios até então, tal circunstância, receberão sócio que exer­
caracterizando, pois, uma justificativa (ain­ ce seti direito de recesso o reem bolso dc
da que subentendida), apta a autorizar a dis­ seus haveres na proporção do últim o ba­
solução em si. lanço aprovado, nos term os expressos do
Há, ainda, aqueles que objurgam este art. 15 do Decreto-lei 3.708/1919.5
direito absoluto do sócio de requerer, a seu Ventilada tal definição, torna-se mais
bel talante, a dissolução parcial da socie­ fácil distinguir a dissolução de sociedade
dade. Unie Caminha observa que “o juiz do recesso do sócio, porquanto, “se con­
que examina o pedido de dissolução (total gêneres no resultado (solução do liame obri-
ou parcial), deve exercer um juízo mais gacional perante um sócio), tem (os insti­
complexo, analisando vários aspectos do tutos) gênese, estrutura, procedim ento e
caso: se a anim osidade entre os sócios pre­ conseqüências distintas” .6
judica a empresa, se com a saída daquele E mais, enquanto o direito de recesso
acionista a empresa poderia continuar pros- objetiva a tutelado sócio m inoritário, exer­
perante, se vale a pena m anter vivo aquele citarei face ao abuso da m aioria,7 a disso­
organismo societário. Esse tipo de análise, lução parcial, decorrente da m oderna inter­
na opinião da jurista, deveria ser feito sem ­ pretação dos arts. 335, n. 5, e 336, do Có­
pre, inclusive em relação às sociedades por digo Comercia], têm por escopo a proteção
quotas, para evitar a tendência de se trans­ da sociedade em si, “conjugando os princí­
formar a dissolução parcial numa verdadei­ pios constitucionais de liberdade de traba­
ra denúncia vazia".* lho, associação, desassociação e função
Im pende ressaltar, rem atando, que, social da propriedade, bem com o o da pre­
não obstante a am plitude e coerência des­ servação da em presa e da rejeição aos vín­
tas observações, som ente ante característi­ culos contratuais eternos”.*
cas m uito especiais poderia o Judiciário
desacolher um pedido de dissolução parcial,
3.3 Direito contratual de retirada
ainda que imotivado (ressalvadas as obser­
vações supra sobre esta pretensa imotiva- Há distinguir-se, outrossim , dentre as
ção), de sociedade por quotas de responsa­ demais hipóteses operacionais para a saída
bilidade limitada, sem prazo de funciona­ dos sócios de sociedade, a possibilidade
m ento determinado, porquanto estar-se-ia, contratual de retirada. Ou seja, pode pre­
em tal situação, forçando o quotista a per­ ver o contrato social, expressam ente, como
m anecer vinculado a pessoas em uma socie­ operar-se-á a saída de sócio da em presa.
dade, o que, a princípio, constituiria afron­ Previsto nos arts. 291 e 302 do Códi­
ta até mesmo a direito constitucionalm ente go Comercial, e, hoje, plenam ente aceito,’
garantido de livre associação. o direito contratual de retirada não se en-

3.2 Direito de recesso 5. Celso Barbi F ilho, A D issolução..., ob. cit.,


p. 157.
Constitui o direito de recesso uma 6. Vera Helena de M ello Franco, “ Dissolução
parcial e recesso nas sociedades por q u otas de res­
prerrogativa legal do sócio de sociedade por ponsabilidade limitada. Legitim idade e procedim en­
quotas de responsabilidade limitada de re­ to. C ritério e m om ento de apuraçSo de h averes’\
tirar-se quando divergir de alteração do RD M 75/19. jul.-set. 1989.
contrato social, executada pela maioria. Sob 7. R achel Sztajn, “O d ireito de recesso nas
soeiedndes com erciais", RD M 71/50*54, ju l.-se t.
1988.
4. Uinie Cam inha, “C om entário a acórdão do 8. Celso Barbi Filho, A D issolução..., ob. cit..
Tribunal de Justiça de S3o Paulo acerca de dissolu­ p. 165.
ção parcial de sociedade anônim a", RD M 114/182, 9. Fran M artins. “ Retirada de sócio...” , ob. cit.,
abr.-jun. 1999. pp. 229-230.
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contra, todavia, insculpido na lei de socie­ bilidade Lim itada, Decreto 3.708/1919, em
dades por quotas dc responsabilidade lim i­ seu art. 7Ç, tornando-a cogcnte.
tada. Poder-se-ia indigitar, ainda, como re­
De outro norte, diverge o direito con­ gra originalm ente autorizadora da exclusão
tratual de retirada da dissolução parcial, do sócio, aquela contida no art. 339 do
inicialm ente, na base legal na qual o sócio Código C om ercial, que durante longo tem ­
se ampara para executar sua saída. Enquan­ po autorizou aos q u o tistas m ajoritários,
to na retirada o quotista se arrima no con­ desde que justificadam ente, determ inar a
trato social, na dissolução ampara-se, como saída do m inoritário da em presa.
ressaltado anteriorm ente, em dispositivos Em face destas disposições legais, que
expressos no Código Comercial, tem pera­ autorizavam a exclusão do sócio somente
dos pela orientação jurisprudencial acerca ante um m otivo ju sto — m áxim e ante a
da necessidade de preservação da empresa. ausência de integralização do capital social
A diferença m arcante entre o direito subscrito — , prevaleceu, durante bastante
de retirada e o direito de recesso consiste tem po, o entendim ento jurisprudencial de
no fato de que, enquanto na retirada, o só­ que, regra geral, a exclusão do sócio so­
cio se ampara no cumprimento de uma cláu­ m ente operar-se-ia m ediante:
sula, pré-ajustada do contrato social, para (i) ju sta causa;
requerer sua saída da sociedade, no reces­ (ii) existência de cláusula contratual
so , o sócio se retira por discordar de altera­ expressa a autorizá-la.
ção perpetrada no contrato social, im ple­
O entendim ento dos sodalícios pátrios
m entada pela m aioria social.
acerca do tem a, entrem entes, evoluiu, ad­
m itindo-se, hoje, por deliberação da m aio­
3.4 Exclusão de sócio ria, a exclusão unilateral do quotista deten­
tor de participação m inoritária. Esta é a ite-
Finalm ente, tem -se a figura da exclu­ rativa orientação, m áxim e, do Superior Tri­
são do sócio com o últim o modelo para a bunal de Justiça acerca do tem a."
solução de conflitos entre quotistas, sem a A legislação pátria m ais recente veio
extinção, absoluta, da sociedade. corroborar, integralm ente, tal posiciona­
Consiste o direito à exclusão do sócio m ento, segundo se infere do atual texto do
na possibilidade do quotista m ajoritário .art. 54 da Lei 8.934, de 1994 (disciplina-
excluir, sob a égide do princípio da fo rç a dora do registro público das em presas mer­
da maioria votante, o quotista m inoritário cantis), ao prever que a deliberação majo­
da sociedade por quotas de responsabili­ ritária, não havendo c lá u su la restritiva,
dade limitada. abrange a hipótese, dentre outras, de ex­
Acerca da matéria, aponta Luiz Gastão clusão de sócio.
Paes de Barros Leães, com o gênese do ins­ Reunindo tais entendim entos, soma­
tituto da exclusão, a norma consubstanciada dos ao disposto no parágrafo único do mes­
no art. 289 do C ódigo Comercial, adm itin­ mo art. 54 da Lei 8.934, que im põe que:
do a exclusão do sócio na inocorrência de “os instrum entos de exclusão de sócio de­
integralização do capital social pelo m es­ verão indicar, obrigatoriam ente, o motivo
mo subscrito."’ Convém salientar que tal da exclusão e a destinação da respectiva
regra foi, outrossim, insculpida no texto da participação no capital social”, Celso Barbi
Lei de Sociedade por Quotas de Responsa­ Filho conclui: “Evidencia-se, pois, que a
exclusão do sócio da sociedade por quotas
10. G astão Paes de Barros Leão, “Exclusão
ex traju d icial de sócio em sociedade por quotas", II . D entre outros, convém destacar: STJ, R T
RDM 100/89, OHt.-dcz. 1995. 7 3 0 /1 % .
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de responsabilidade limilada opera-se, ho- gundo bem decidiu o Tribunal de Justiça


diernamente, por simples alteração contra­ do Estado de São Paulo: “Havendo previ­
tual majoritária, exigindo-se apenas a ine­ são legal para a exclusão unilateral de só­
xistência de cláusula restritiva, a indicação cio — arts. 1.346 do CC c/c 1- e 15 do
de qualquer m otivo para o ato e da des- Decreto 3.708/1919 e 339 do CCom. — e
tinação da participação do excluído no ca­ tendo sido justificada a m edida extrema por
pital”. 12 fatos que levaram ao desaparecim ento da
Necessário, quanto ao tema, mencio­ affectio societatis, inexiste ilegalidade a ser
nar, ainda, Fábio Ulhôa Coelho, cujo es- coibida por este m andam us, devendo ser
cólio coaduna com a necessidade, para ope­ norm alm ente registrada a alteração socie­
rar-se a exclusão de sócio, de inexistir, no tária, independentem ente da assinatura do
contrato social d a em presa, a cham ada sócio excluído. (Por outro lado), constitui
"cláusula restritiva”. 1-1 Segundo seu enten­ um excesso a referência ao disposto no art.
dimento, antes da vigência da Lei 8.934, a 58, LIV da CF, pois o im pte. em absoluto
exclusão de sócio minoritário podia ser pro­ está sendo privado de sua liberdade ou de
movida, extrajudicialmente, por simples al­ qualquer de seus bens; aliás, m uito pelo
teração contratual subscrita pelo sócio re­ contrário, (foi) com posta a m atéria m e­
presentante da m aioria do capital social, diante o levantam ento de balanço especial
ainda que o contrato social contivesse a no momento de sua exclusão. D e igual for­
cham ada “cláusula restritiva” , exigindo a ma, sem razão o impte. ao argum entar com ­
unanjmidade para sua alteração. Tal orien­ as garantias da am pla defesa e contraditó­
tação arrim ava-se no art. 6°, inc. I, alínea c, rio, aplicáveis aos processos civis, penais
da Lei 6.939 de 1981, diploma revogado e adm inistrativos, situação distinta da es­
pelo art. 67 da Lei 8.934. De acordo com a pécie, em que (foi) deliberada em socieda­
legislação atual, o contrato social pode con­ de civil por quotas de responsabilidade li­
templar cláusulas restritivas à sua alteração mitada, com ju sta causa invocada para tan­
por simples vontade da maioria social, in­ to, (...) sua exclusão da sociedade”. 15
cluindo-se, m as a tanto não se limitando, a Torna-se bastante clara, ante a simples
matéria relativa à exclusão do sócio. “A al­ exegese dos textos legais m encionados su­
teração do direito positivo, portanto, é bas­ pra, a diferenciação do instituto da exclu­
ta n te p re c isa : a tu a lm e n te , os só c io s são de sócio dos demais estudados alhures.
minoritários podem, quando da celebração Dentre outras particul;u;idades, basta res­
dò còntrato social, preservar eficientem en­
saltar que, enquanto na dissolução parcial,
te os seus interesses, obstando a possibi­
no recesso e na retirada de sócio, o exercí­
lidade de sua futura exclusão e x tra ju ­
cio do direito de deixar o quadro social é
dicial”. 14
exercido pelo próprio quotista retirante, na
E a possibilidade de exclusão do só­ exclusão opera-se a vontade da m aioria
cio — mormente ante a constituição das sobre a minoria, dentro dos estreitos liames
garantias previstas com a edição da Lei legais elencados alhures.
8.934 — não significa, de forma alguma,
um malferimento, ou mesmo vulneração,
dos princípios constitucionais da liberdade 4. Breves considerações
e da m anutenção dos bens particulares. Se­ acerca do novo Código Civil
no tocante ao direito societário
12. Celso Barbi Filho, A Dissolução..., cit,, p.
176. Clamava-se, já há algum tempo, por
13. Fábio Ulhôa Coelho, Código Comercial e uma alteração/revisão das norm as regentes
Legislação Com plem entar Anotados, v. 5. p. 153.
14. Fábio Ulhôa Coelho, Código Comercial...,
cit., p. 339. 15. TJSP, R T 705/117.
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do direito societário pátrio, m áxim e aque­ Reputando despiciendas, para o pre­


las reguladoras das cham adas sociedades sente estudo, considerações acerca do m é­
p o r quotas de responsabilidade lim itada, todo técnico-legal adotado para organizar
tratadas, a partir de agora, tão-som ente, e sistematizar o T ítulo II do novo C ódig i
como sociedades limitadas. Civil, exsurge necessário, no entanto, an­
Tais m odificações foram introduzidas, tes do exam e, específico, da m atéria obje­
segundo vontade do legislador, através da to do presente estudo (exclusão de quotista
em sociedades lim itadas), esclarecer, dida­
prom ulgação do novo C ódigo Civil, Lei
ticamente, que:
10.406, de 10.1.2002, o qual revogou, ex­
pressam ente, em seu art. 2.045, o antigo (i) as sociedades denom inadas, sim ­
Código Civil, Lei 3.071, dè 1e. 1.1 9 16, além plesmente, lim itadas, substituirão, tão-logo
da Parte Primeira do Código Comercial, Lei vigente a nova Lei, as cham adas socieda­
556, de 25.6.1850. des por quotas de responsabilidade lim i­
tada-,
N o entender de A ttila de Souza Leão
Andrade Jr., tais m odificações foram posi­ (ii) as sociedades lim itadas regem -se,
subsidiariamente, pelas normas inerentes às
tivas para o direito societário, haja vista que
sociedades sim ples.
o “Brasil necessitava realm ente de um Có­
digo m ais m oderno e condizente com os V entiladas tais assertivas, passa-se,
desafios da econom ia contem porânea”."' adiante, à análise do tem a específico^
Sem som bra de dúvidas, as alterações
operadas pela prom ulgação do novo C ódi­ 4.2 Hipóteses de exclusão
go Civil mostram -se bastante profundas, do quotista em sociedades lim itadas
representando um avanço, m orm ente, na Com arrim o no texto do novo C ódigo
sistem atização das condutas e regras a se­ Civil, Título II, pode-se atestar, sem dúvi­
rem adotadas pelos quotistas das socieda­ das, que a nova legislação societária pátria
des. E diz-se “para os quotistas” , na m edi­ prevê a possibilidade de exclusão de sócio
da em que perm anece quase integralm ente quotista de sociedade lim itada, caso carac­
inalterada a legislação regente das socie­ terizada qualquer um a das seis hipóteses
dades anônim as, Lei 6.404/1976, e altera­ adiante indigitadas:
ções posteriores. (i) caso caracterizado o disposto no art.
_■1.004, e se u .p a rá g ra fo único: m ora, de
4.1 Sociedades simples quotista, na integralização do capital social
e sociedades limitadas subscrito, na form a prevista no contrato
social;
O novo Código Civil versa, em seu (ii) art. 1.030: falta grave, pelo quo­
Título II — D a Sociedade, Subtítulo II — tista, no cum prim ento de suas obrigações,
Da Sociedade Personificada, C apítulo I, ou, ainda, por incapacidade;
acerca da cham ada “Sociedade Simples".
(iii) art. 1.030, parágrafo único: em
M ais adiante, insculpido no m esm o Título caso de falência do sócio quotista;
II, desta feita em seu Capítulo II, trata da
(iv) art. 1.030, parágrafo único: liqui­
Sociedade em Nome Coletivo, no Capítulo
dação da quota detida pelo sócio, em caso
III da Sociedade em Comandita Sim ples e,
de sua pcnhora, nos term os do art. 1.026,
finalmente, no Capítulo IV, Das Socieda­
parágrafo único, do m esm o Código;
des Limitadas.
(v) art. 1.058: não integralização do
valor da quota pelo sócio remisso;
16. Á tti!a dc Souza Leão A ndrade Jr., Com en­
tários ao N ovo Código Civil, v. IV, A presentação da (vi) art. 1.085: um, ou mais sócios, de­
obra. tentores da m inoria do capital social, po­
114 REVISTA DE DIREITO M ERCANTIL-129

derão ser excluídos caso coloquem em ris­ T do Decreto 3.708, de 10.1.1919, com bi­
co a continuidade da empresa, em virtude nado com o art. 289 do C ódigo Comercial,
dc alos de inegável gravidade. ao facultar, a Lei atual, ao sócio rcinisso,
Obviamente, cada uma destas hipóte­ através da notificação que se lhe é dirigida,
ses possui procedim entos próprios para a possibilidade de purgar sua m ora no pra­
operar-se, os quais serão, detidamente, ana­ zo de trinta dias.
lisados a seguir. Este, aliás, era o anseio externado pelo
saudoso Professor Nelson A brão, no senti­
do de facultar ao sócio rem isso a possibili­
4.2.1 Ausência da contribuição
dade de, após notificação obrigatória, pur­
estabelecida no contrato social
gar a sua mora: “Perm itindo nosso sistema
Preconiza o art. 1.004 do novo Códi­ legal a integralização da quota social em
go Civil, ipsis litteris: prestações, poderão os sócios em dia optar
“Art. 1.004. Os sócios são obrigados, pela cobrança ou pela exclusão do inadim ­
na forma e prazo previstos, às contribui­ plente, a teor do art. 1° do D ecreto 3.708.
ções estabelecidas no contrato social, e Havendo, como é usual, prazo m arcado no
aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias contrato para o pagam ento da prestação, a
seguintes ao da notificação pela socieda- mora se caracteriza pelo sim ples inadim-
. de, responderá perante esta pelo dano emer­ plemento, segundo decorre do art. 960 do
gente da mora. Código Civil. Não obstante, ocorre na prá­
tica uma m anifesta tendência de nossos
“Parágrafo único. Verificada a mora, Tribunais no sentido de, m esm o existindo
poderá a m aioria dos demais sócios prefe­ termo avençado, impor-se a notificação ou
rir, à indenização, a exclusão do sócio re- interpelação, que pode ser extrajudicial,
misso, ou reduzir-lhe a quota ao montante uma vez que a lei não impõe a judicial. (...)
já realizado, aplicando-se, em ambos os ca­ Levando em conta que o sócio teve a sua
sos, o disposto no § 1? do art. 1.031.” mora configurada e não revelou o m enor
A “contribuição estabelecida no con­ interesse em cum prir com a sua obrigação
trato social”, convém salientar ab inilio, respeitante à integralização, tudo aconse­
quer dizer o capital social subscrito e a lha que a sociedade se com porte com curial
integralizar pelo quotista, quer seja esta agilidade no propósito de regularizar esta
contribuição representada por bens móveis situação”. 17
inclúiridò-'se dentre estes, mas a tanto Frente à nova Lei, o sócio rem isso de­
não se limitando, o próprio dinheiro — ou, ve, obrigatoriam ente, ser notificado para
ainda, bens im óveis, dentro das regras e que, contra este, possam ser adotadas as
normas estabelecidas em lei.
providências legais inerentes à espécie, das
Com efeito, quis o legislador que, caso quais, destaca-se, a exclusão.
subscrito e não integralizado o capital so­ Surge, no entanto, um a dúvida decor­
cial de sociedade lim itada, fosse o quotista rente da exegese do art. 1.004 em tela: o
remisso (expressão que caracteriza o sócio que se entende com “ responderá pelo dano
em atraso com suas contribuições, previs­ emergente da m ora”? O dano emergente da
tas no contrato social, necessárias à consti­ m ora é relativo ao valor subscrito e não
tuição do capital social), depois de cienti­ integralizado, aos prejuízos enfrentados
ficado, pela sociedade, de sua mora, atra­ pela sociedade, decorrentes da rem issão do
vés de competente notificação, respondes­ sócio, ou a ambos, som ados? Tal dúvida é
se pelos danos em ergentes de sua atitude. aguçada pela redação do parágrafo único
Desde já , pode-se notar uma diferen­
ça entre esta disposição e aquela que regia 17. Nélson A brão, Sociedade p o r Q uotas de
a matéria anteriormente, concentrada no art. Responsabilidade L im itada, 7® ed., p. 77.
ATUALIDADES 115

do mesmo artigo, que prevê a possibilida­ versa omissão, na m edida em que não dis­
de dos sócios preferirem , "à indenização, põe, expressam ente, se a exclusão, operada
a exclusão do sócio rem isso”. Em resumo, com fincas no art. 1.004, será extrajudicial
a dúvida é a seguinte: o sócio remisso, com —• e, por conseguinte, através de simples
fincas no art. 1.004, e seu parágrafo único, alteração do contrato social — ou judicial,
do novo C ódigo Civil, será excluído caso: m ediante o ajuizam ento de ação própria.
(i) não indenize os demais sócios ape­ Felizm ente, tal questão, aparentem en­
nas pelos danos emergentes da sua m ora? te, encontra resposta m ais sim ples que a
(entendendo-se, desta forma, que, para o anterior, podendo-se presum ir, com ampa­
quotista remisso não poder ser excluído, ele ro em doutrina análoga acerca do tem a,1*
deverá responder, tão-somente, pelos pre­ que, para que se opere a exclusão, nos m ol­
juízos causados — relativos a danos m o­ des elencados alhures, seja necessária sim­
rais, m ateriais etc. — , e não pelo capital ples alteração contratual, levada a registro
social subscrito e não integralizado); na com petente ju n ta com ercial do Estado
(ii) deixe de integralizar o capital so­ em que se situe a sede da empresa.
cial subscrito, ainda que parcialmente? (não
guardando, este dispositivo legal, qualquer 4.2.2 Falta grave
relação com a necessidade de indenização no cum prim ento das obrigações
— pecuniária, por exem plo — devida aos
demais quotistas da sociedade); ou D eterm ina o art. 1.030 do novo Códi­
(iii) não integralize o capital social go Civil: “Art. 1.030. Ressalvado o disposto
subscrito e nem indenize os seus demais no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o
sócio ser excluído judicialm ente, mediante
sócios pelos prejuízos causados, sim ulta­
neamente. iniciativa da m aioria dos demais sócios, por
falta grave no cum prim ento de suas obri­
C om pulsando o art. 1.004 do novo gações, ou, ainda, por incapacidade su­
Código Civil em testilha com os demais ar­ perveniente”.
tigos desta Lei, não se pode olvidar que a
O rientação integralm ente nova no or­
redação deste dispositivo legal — repetindo
denam ento pátrio, a norm a insculpida no
aquela contida no art. 289 do Código Co­
art. 1.030, facultando aos dem ais quotistas
mercial — conduz, forçosamente, ao enten­
a possibilidade de excluir um, ou m ais, só­
dimento de que, para ser excluído, nos ter­
cios, é passível de implementação desde que
mos ora examinados, o sócio remisso deve­
presentes três condições:
rá não ter indenizado seus demais sócios
pelos prejuízos decorrentes da sua mora, (i) seja a m edida adotada por sócio,
deixando, outrossim, de integralizar a parti­ ou sócios, que representem a m aioria sim­
cipação societária que havia subscrito. Deve- ples do capital social;
se caracterizar a ocorrência de ambas as hi­ (ii) tenha ocorrido falta grave no cum ­
póteses para que se proceda à exclusão arri- prim ento das obrigações do sócio a ser ex­
mada neste específico dispositivo legal. cluído; e/ou
Curial destacar, de outro norte, que, (iii) venha a ser caracterizada a inca­
na hipótese vertente, a lei exige que ^m aio­ pacidade superveniente daquele a ser ex­
ria sim ples do capital social delibere so­ cluído.
bre a exclusão do sócio que gerou dano à Presente o requisito previsto no item
sociedade em decorrência de sua mora, haja (i) e, alternativam ente, algum daquelespre-
vista que o texto legal determina que “maio­
ria dos demais sócios” assim decida.
18. Fábio K onder C om parato, “Exclusão de
Rematando, verifica-se, ainda, que o sócio nas sociedades por cocas de responsabilidade
legislador incorreu, concessa venia, em di­ limitada”, R D M 25/39.
116 REV1STA DE Dl RHITO M ERCANTIL-129

vistos em (ii) e/ou (iii), acima indigitados, as condições da ação, ou condições do


possível se faz a exclusão, ju d icial, do exercício do direito dc ação".2'
sócio. Para que a notificação do sócio a ser
Ainda que doutrinadores, como Wal- excluído seja im prescindível para o ajuiza-
dirio B ulgarellilw e Am ador Paes de A l­ m ento da ação prevista no art. 1.030 do
m eida,20 apontem com o m elhor prática novo Código C ivil, deve a caracterização
aquela que exige a maioria qualificada, ou da mora deste, portanto, ser uma das con­
até mesmo a integralidade dos votos, para dições da ação.
que possam ser adotadas deliberações ex­ Acerca da caracterização da mora, por
traordinárias que alterem, substancialmen­ outro lado, tem -se com o regra geral que “o
te, a vida da empresa, o legislador do novo inadim plem ento da obrigação, positiva e
Código Civil preferiu privilegiar o princí­ líquida, no seu term o constitui de pleno
pio da maioria sim ples do capital social direito em mora o devedor” (prim eira par­
para que se pudesse deliberar, caracteriza­ te do art. 960 do C ódigo C ivil, Lei 3.07!,
da a hipótese versada, a exclusão de um dos de 19.I.1916). Entrem entes, “não havendo
sócios. prazo assinado, com eça ela desde a inter­
De outro norte, tratando-se de ação pelação, notificação, ou protesto” (segun­
judicial, curial questionar se, antes da ado­ da parte do art. 960).
ção desta medida extrema, seria obrigató­ A cerca da m ora, A lbert C om m ent,
rio ao sócio m ajoritário/excludente consti­ destacado processualista francês, elucida,
tuir o minoritário/excluído em mora, atra­ com propriedade, que a “M ora é o injusto
vés de competente notificação. Configurar- retardamento no cum prim ento da obriga­
se-ia tal providência uma das condições ção ou por parte do devedor, quando não
para o processamento, e procedência, da satisfaz a tempo a obrigação, ou por parte
ação? Ou seja, a notificação, constituindo do credor, quando não quer aceitar o paga­
o sócio em mora. é necessária para que se m ento”.
caracterize a fa lta grave no cumprimento Ora, u m a/a lia grave no cumprimento
de suas obrigações ou, ainda, sua incapa­ de obrigação ou m esm o um a incapacida­
cidade superveniente? de superveniente não possuem “data de
Para ter-se certeza da necessidade da vencimento”, não possuem “termo”, Assim,
constituição em mora e, por conseqüência, o sócio que tenha adotado tal sorte de con­
da notificação do sócio a ser excluído para duta deve, para ser considerado passível de
caracterizá-la, faz-se necessária incursão, punição — através, in casu, da sua exclu­
acurada, no campo do direito civil e pro­ são — , portanto, ser constituído em mora
cessual civil. através da com petente notificação, justa­
m ente para colocar term o em sua conduta,
O direito à ação, incluindo-se, mas a
caracterizando-a, pois, com o irregular e,
tanto não se limitando, a ação prevista no
então, passível de punição.
art. 1.030, “é o direito público subjetivo à
prestação jurisdicional do Estado. Para Destarte, afigura-se necessária a noti­
obter a solução da lide (sentença de méri­ ficação, judicial ou extrajudicial, para que,
to), incumbe, porém, ao autor atender a caracterizada, escorreitam ente, a falta gra­
determinadas condições, sem as quais o juiz ve no cum prim ento de suas obrigações, ou,
se recusará a apreciar seu pedido: são elas ainda, sua incapacidade superveniente, pos­
sa o sócio de sociedade lim itada ser excluí­
do da sociedade, judicialm ente, pelos quo-
19. Waldirio Bulgarelli, M anual das Socieda­
des Anônimas, 2“ ed., p. 145.
20. Amador Paes de A lm eida. M anual das 21. H umberto Theodoro Jr., Curso de Direito
Sociedades Comerciais, ll * e d ., p. 137. Processual C ivil. 135 ed., p. 3 1 J.
ATUALIDADES 117

tistas que representam a maioria sim ples do suas atividades. E xcluir-se-á, tão-somente,
capital social, nos term os do art. 1.030 do o sócio falido.
novel Código Civil. A nova Lei, ao dispor desta form a,
Finalm ente, convém destacar, conces- solucionou, form alm ente, um problem a
sa venia, a pouca precisão do legislador ao que, há muito, era discutido em sede dou­
utilizar-se, neste artigo, da expressão “ fal­ trinária e jurisprudencial. Isto, pois a nor­
ta grave no cum prim ento de suas obriga­ ma contida no art. 335. n. 2, do Código
ções”, m orm ente quando analisam os tal Com ercial, agora revogada, integralm ente,
previsão sob a luz do art. í . 085 do m esm o pelo novo C ódigo C ivil, determ inando, ex­
Diploma Legal, que autoriza a resolução da pressam ente, a dissolução da sociedade no
sociedade, extrajudicialm ente, em relação caso da sua quebra ou de seus sócios, tra­
aos sócios que “estão pondo em risco a con­ zia grande instabilidade nas relações com er­
tinuidade da em presa, em virtude de atos ciais, m áxime enquanto ainda estava vigen­
de inegável gravidade”. te a antiga Lei de Falências, Lei 2.024/1908.
A dúvida é: com o divisar a dicotom ia A cerca deste problem a. Celso B arbi
entre fa lta grave e risco à sociedade? E esta Filho esclareceu, com propriedade; “D is­
é um a dúvida de extrem a relevância, haja pondo que a falência de um sócio acarreta­
vista que, se os sócios cometeram fa lta gra­ va a dissolução da sociedade, as norm as do
ve, som ente poderão ser excluídos da so­ C ódigo C om ercial e da L ei 2.044/1908
ciedade judicialm ente; cometendo ato aten­ trouxeram diversos desconfortos ao em pre­
tatório à existência d a sociedade, estão sariado da época, tendo sido alvo de crítica
sujeitos à exclusãaextrajudicial, consoan­ doutrinária e atenuação pretoriana. De fato,
te será, detidam ente, analisado no tópico revelava-se autêntico contra-senso a neces­
4.2.6. sária dissolução de, por vezes, próspera
N ão há, a princípio, resposta a esta sociedade, em virtude da falência de ape­
questão, razão pela qual afigura-se mais nas um de seus sócios. Os preceitos que pre-
prudente — e a prudência deve pautar to­ viam a dissolução d a sociedade pela falên­
dos os atos jurídicos — a qualificação de cia do sócio eram m arcados pelo já referi­
um ato indevido praticado pelo sócio como do princípio individualista que norteou a
sendo, genericam ente,fa lta grave. Som en­ normatização societária do Código de 1850,
te em casos, efetivam ente, incontestes, herdado do C ódigo Francês de 1807” .22
deve-se’adm itir a equiparação de um ato
A prom ulgação da então nova Lei dè
do sócio com o sendo de risco à sociedade,
Falências, Decreto-lei 7.661, em 21.6.1945,
protegendo-se, assim, o quotista minoritário
atenuou esta situação, ao dispor, em seu art.
de atitudes abusivas possivelm ente perpe­
48, que: “Se o falido fizer parte de algum a
tradas pelo m ajoritário.
sociedade, com o sócio solidário, com andi-
tário ou cotista, para a m assa falida entra­
4.2.3 Falência do sócio rão som ente os haveres que na sociedade
ele possuir e forem apurados na form a es­
Estatui a prim eira parte, do parágrafo tabelecida no contrato. Se este nada dispu­
único, do art. 1.030, do Código Civil, in ser a respeito, a apuração far-se-á jud icial­
verbis: “Art. 1.030. (...). Parágrafo único. m ente, salvo se, por lei ou pelo contrato, a
Será de pleno direito excluído da socieda­ sociedade tiver de liquidar-se, caso em que
de o sócio declarado falido, (...).” os haveres do falido, som ente após o paga­
Frente a esta disposição, a sociedade m ento de todo o passivo da sociedade, en­
cujo sócio vier a ter aberto seu concurso trarão para a m assa”.
de credores não será afetada por esta situa­
ção, perm anecendo no exercício normal de 22. C elso Barbi Filho, ob. cit., p. 192.
118 REVISTA DE DIREITO M ERCA NTIL-129

Reputou-se, tacitam ente, revogado, sede doutrinária e jurisprudencial: Poder-


naquela época, o art. 335, n. 2, do Código se-ia adm itir a entrada de um estranho na
Comercial, consoante entendim entos ex­ sociedade, face à penhora das quotas so ­
ternados por R ubens Rcquião c Nelson ciais por dívida de um dos sócios?
Abrão.25 A cerca da matéria, Leonardo G uim a­
Porém, somente agora, tendo-se como rães conclui, após análise do posicionamen­
expressamente revogado o aludido dispo­ to das T urm as com ponentes do excelso
sitivo, torna-se indene de dúvidas o enten­ Superior Tribunal de Justiça, que: “Ante tais
dimento acerca da m atéria, o que se afigu­ julgados, afigura-se paten te que, m uito
ra bastante importante dentro do consagra­ embora seja imaterial, sem sequer poder
do princípio da preservação da empresa. fazer-se representar por título ou certifica­
Ressalte-se, por fim, que a legitim ida­ do, a quota é, efetivam ente, um bem móvel
de para excluir o quotista falido da socie­ e, como tal, a princípio, pode ser penhora-
dade é, face aos termos do caput do art. da”. Alerta o autor, no entanto, que: “a per-
1.030, dam aior/a dos demais sócios, e não m issividade, pura e sim ples, desta prática
da própria sociedade. conduziria a uma situação pouco confortá­
vel a todos os envolvidos na quaestio, pois
4.2.4 Liquidação da sociedade seria estabelecida um a relação entre o cre­
dor ou arrematante — em caso de penhora
Determina o m esm o art. 1.030 do novo da quota e sua posterior hasta pública e
Código Civil, em seu parágrafo único, em arrem atação — e a sociedade, e não entre
sua segunda parte: “Art. 1.030. (...). Pará­ o credor e seu devedor” .24
grafo único. Será de pleno direito excluído Encerrando o debate sobre a questão,
da sociedade o sócio declarado falido, ou os aludidos textos legais, em solução bas­
aquele cuja quota tenha sido liquidada nos tante elogiável, ressalte-se, afastando a hi­
termos do parágrafo único do art. 1.026". pótese da entrada do credor na com posi­
Convém, para com preensão do dispo­ ção social, enquanto terceiro estranho à
sitivo legal, transcrever-se, outrossim , o sociedade, faculta aos sócios da sociedade
disposto no art. 1.026 indigitado supra: a oportunidade de excluí-lo, através da li­
“Art. 1.026. O credor particular de sócio quidação da quota.
pode, na insuficiência de outros bens do
Com o ocorre na exclusão de sócio fa­
devedor, fazer recair a execução sobre o que
lido, é importante observar que a legitim i­
a este couber nos lucros da sociedade, ou
dade para exercer o direito de impedir a
na parte que lhe tocarem liquidação. Pará­
entrada do credor do quotista que teve suas
grafo único. Se a sociedade não estiver dis­
quotas penhoradas é dos dem ais sócios da
solvida, pode o credor requerer a liquida­
empresa, e não da sociedade.
ção da quota do devedor, cujo valor, apu­
rado na forma do art. 1.031, será deposita­
do em dinheiro, no juízo da execução, até 4.2.5 Exclusão de sócio remisso
noventa dias após aquela liquidação”.
Dispõe o art. 1.058 da Lei 10.406, de
Dessume-se dos aludidos dispositivos
10.1.2002: “Art. 1.058. N ão integralizada
legais, em breve síntese, a preocupação do
a quota do sócio remisso, os outros sócios
legislador em responder a um problema,
podem, sem prejuízo do disposto no art.
bastante atual, discutido, iterativamente, em
1.004 e seu parágrafo único, tomá-la para
si ou transferi-la a terceiros, excluindo o
23. Rubens Requião, Curso de Direito Fali-
m entar, v. I, I45 ed., p. 187 c Nélson Abrão, Curso
de Direito Falimentar, 5- ed., p. 162, em com entá­ 24. LeonardoG uim arães. “Questões controver­
rio extraído de Celso Barbi Filho, ob. cit., p. 193. tidas no processo de execução” . RD M 122/64, 2001-
ATUALIDADES 119

primitivo titular e devolvendo-lhe o que Após as considerações ventiladas no


houver pago, deduzidos os juros da mora, tópico 3.4 do presente trabalho, denom ina­
as prestações estabelecidas no contrato mais do exclusão dos sócios, pouco se tem a
as despesas”. acrescentar aos ditam es contidos no artigo
Caso o sócio rem isso não integralize em referência.
o capital social que subscreveu, poderão os Antes, era p erm itida a exclusão do
outros sócios, sem prejuízo do disposto no sócio m inoritário, por ju sta causa, através
art. 1.004, e seu parágrafo único, tomá-la de alteração contratual, desde que não hou­
para si ou transferi-la para terceiros. vesse, no contrato social, cláusula restritiva
A questão aqui tratada é bastante sim ­ de tal ato. O legislador, agora, apenas in­
ples e os comentários acerca da mesma são, verteu a exigência ao tornar im prescindí­
precipuamente, os mesmos já ventilados no vel que, para operar-se a exclusão do só­
item 4.2.1. A usência de contribuição esta­ cio, por justa causa, haja o contrato social
deliberado, expressam ente, neste sentido.
belecida no contrato social, com uma di­
ferença: no presente artigo, não há qualquer D everá o sócio, devidam ente convo­
dúvida quanto à possibilidade de exclusão cado com a antecedência necessária para
do sócio, caso seja este considerado rem is­ exercer seu direito de defesa, apresentar,
so, descabendo, pois, qualquer pleito inde- em reunião ou assem bléia de quotistas —
nizatório contra o mesmo. , conform e disposição, expressa, contida no
contrato social — suas justificativas, caben­
O procedim ento da exclusão deverá,
do à adm inistração da sociedade julgá-las
outrossim, ser adm inistrativo — através de
razoáveis, ou não, para excluí-lo, ou não.
simples alteração do contrato social — e a
legitimidade para fazê-lo será dos demais Perm anecem in alterad as as dem ais
sócios, em dia com suas integralizações. disposições e procedim entos inerentes à
esta forma de exclusão, operando-se, após
a com petente alteração do contrato social,
4.2.6 Resolução dos sócios m ajoritários nos term os dos arts. 1.031 e 1.032 do novo
em relação aos sócios m inoritários C ódigo Civil.
Sob a Seção VII — Da Resolução da
Sociedade em R elação a Sócios M inori­ 5. Conclusão
tários, o nç>vo Código Civil, prevê a última
hipótese de exclusão de sócio, máxime em Verifica-se, pois, que a exclusão de
seu art. 1.085, adiante transcrito ipsis verbis: sócio pode ser, desde que operada de for­
ma ju sta e equânim e, a m aneira ideal para
“Art. 1.085. Ressalvado o disposto no
solver, rapidam ente, problem as tais quais
art. 1.030, quando a m aioria dos sócios,
os ventilados supra, entre os quotistas de
representativa de mais da metade do capi­
sociedade lim itada, na m edida em que pro­
tal social, entender que um ou mais sócios
picia a saída de um dos sócios, com a m a­
estão pondo em risco a continuidade da
nutenção das atividades da em presa.
empresa, em virtude de atos de inegável gra­
vidade, poderá excluí-los da sociedade, Tais soluções, sobre representarem
m ediante alteração do contrato social, des­ um a hom enagem ao princípio da continui­
de que prevista neste a exclusão por justa dade das em presas, dem onstram a evolu­
causa. Parágrafo único. A exclusão somente ção — e por que não dizer a m aturidade —
poderá ser determ inada em reunião ou as­ do direito societário no B rasil, fortalecen­
sem bléia especialm ente convocada para do as bases para o florescim ento de novas
esse Fim, ciente o acusado em tempo hábil relações com erciais.
para permitir seu comparecimento e o exer­ C onvém aos operadores do direito,
cício do direito de defesa.” entrem entes, um acurado exam e nas cir­
120 REVISTA DE DIREITO M ERCA NTIL-129

cunstâncias que envolvem cada hipótese de d is s o lu ç ã o p a rc ia l d e s o c ie d a d e a n ô n im a ” ,


exclusão, para que, de forma apropriada c R D M 114, S ã o P a u lo , ab r.-ju n . 1999.
dentro de procedimentos corretos, utilizem- C O E L H O , F á b io U lh ô a . C ó d ig o C o m e r c ia l e
se daquela que m elhor se lhes aprouver. L e g is la ç ã o C o m p le m e n ta r A n o ta d o s , v. 5,
S ão P a u lo , 2 0 0 1 .
G U IM A R Ã E S , L e o n a rd o . “ Q u e s tõ e s c o n tro v e r­
6. Bibliografia tid a s n o p ro c e s s o d e e x e c u ç ã o ” , R D M 122,
S ã o P a u lo , 2 0 0 1 .
A B R Ã O , N é ls o n . C u r so d e D ireito F a lim e n ta r .
M A R T IN S , F ra n . “ R e tir a d a d e s ó c io p o r p e r ­
5® e d ., rev. e a tu a l, p o r C a rlo s H e n riq u e
m is s ã o c o n tra tu a l e a p u ra ç ã o d e h a v e re s ” ,
A b rã o , S ão P a u lo , L e u d , 1997.
E s tu d o s d e D ir e ito S o c ie tá r io , S ã o P a u lo ,
--------- . S o c ie d a d e p o r Q u o ta s d e R e s p o n s a b i­ S a ra iv a , 1993.
lid a d e L im ita d a . 7a e d ., S ão P au to , 20 0 0 . M E L L O F R A N C O , V e ra H e le n a d e . “ D is s o lu ­
A L M E ID A , A m a d o r P a e s de. M a n u a l d a s S o ­ ç ã o p a rc ia l e re c e s s o n a s so c ie d a d e s p o r q u o ­
c ie d a d e s C o m e r c ia is . I I 9 e d ., S ã o P a u lo , ta s d e re s p o n s a b ilid a d e lim ita d a . L e g itim i­
1999. d a d e e p ro c e d im e n to . C r ité rio e m o m e n to d e
a p u ra ç ã o d e h a v e re s ” , R D M 7 5 , S ão P a u lo ,
A N D R A D E JR ., Á ttila d e S o u z a L eão. C o m e n ­
ju l.- s e t. 1989.
tá rio s a o N o v o C ó d ig o C ivil. v. 4 , R io de
P E N T E A D O , M a u ro R o d rig u e s . D is s o lu ç ã o e
J a n e iro , 2 0 02.
L iq u id a ç ã o d e 'S o c ie d a d e s . 15 e d ., B ra s ília ,
B A R B I F IL H O , C e lso . A D is so lu ç ã o P a r c ia l B r a s ília J u r íd ic a , 199 5 .
d a S o c ie d a d e p o r Q u o ta s d e R e s p o n s a b ili­
R E Q U IÃ O , R u b e n s . C u r s o d e D ir e ito F a l i­
d a d e L im ita d a (T e se d e D o u to ra d o ). B e lo
m e n ta r . 143 e d ., S ã o P a u lo , S a ra iv a , 1991.
H o r iz o n te /M G , F a c u l d a d e d e D ir e ito d a
S Z T A J N , R a c h e l. “ O d ir e ito d e re c e s s o n a s s o ­
U F M G , 2 0 00.
c ie d a d e s c o m e r c ia is ” , R D M 7 1 , S ã o P a u lo ,
B U L G A R E L L I, W a ld irío . M a n u a l d a s S o c ie ­ ju l.- s e t. 1988.
d a d e s A n ô n im a s . 2- e d ., S ão P a u lo , 1996.
T H E O D O R O JR ., H u m b e rto . C u r so d e D ireito
C A M IN H A , U in ie . “ C o m e n tá rio a a c ó rd ã o d o P r o c e s s u a l C iv il. 13® e d ., R io d e J a n e iro ,
T rib u n al d e J u s tiç a d e S ão P au lo a c e rc a de 1994.
Atualidades

O ISS NA CONSTRUÇÃO CIVIL

J osé A l c id e s M on tes F il h o

1. O tem a. 2. O IS S na C o n stitu içã o F e d e ra l d e 1988 —■ C o m p etê n cia


trib u tá ria : 2.1 O fa to im p o n ív el d o IS S e a le i com plem en ta r. 3. O D e e r e -
to -le i 4 0 6 /1 9 6 8 e o s serviç o s d e co n stru ç ã o civil. 4. A b a s e d e c á lc u lo d o s
tributos: 4 .1 A b a se de c á lcu lo d o IS S ; 4 .2 O D e c re to -le i 4 0 6 /1 9 6 8 e su a
p o s iç ã o de lei co m p le m en ta r; 4.3 A b a se d e cá lcu lo d o IS S p a r a a p r e s ta ç ã o
d e serviç o s d e co n stru çã o civil; 4 .4 O D e c re to -le i 4 0 6 /1 9 6 8 e a su a re c e p ­
çã o p e la C F /1988; 4 .5 A n á lis e d o a s p e c to fo r m a l d o D e c r e to -le i 4 0 6 /
1968 e a C F /1988; 4 .6 A a n á lis e d ó a sp e c to m a teria l d o D e c r e to -le i 4 0 6 /
1968 e a C F /l 988; 4 .7 A su b e m p re ita d a ; 4 .8 0 D ecreto -lei 4 0 6 /1 9 6 8 e o
p r in c íp io co n stitu cio n a l da ca p a c id a d e co ntributiva. 5. A p o s iç ã o c o n ­
trá ria à recep çã o d o D ecreto -lei 4 0 6 /1 9 6 8 p eta C F /1988 : 5.1 A isen çã o ;
5 .2 O in stitu to do in cen tivo fis c a l e o a r t. 9-, § 2 - d o D e c r e to -le i 4 0 6 /
1968. 6. A Ju risp ru d ên cia . 7. C onclusão. 8. B ibliografia.

1. O tem a cia do direito, procurarei a m elhor inter­


pretação científica sobre o tema.
Esta m onografia tem por objetivo es­
tudar a base de cálculo do im posto sobre
serviço de qualquer natureza (ISS) inciden­ 2. O IS S na C onstituição F ederal
te na atividade de construção civil. - de 1988 — C om petência tributária
O tema foi alvo de diversos estudos
nas últimas décadas, vez que a lei com ple­ O legislador na C F/1988 concedeu às
m entar que trata do assunto, o Decreto-lei pessoas políticas de direito público inter­
406/1968, é de 31.12.1968. no, respeitados todos os princípios consti­
P or m uitos anos o tem a foi se consoli­ tucionais, com petência tributária para ins­
dando de form a pacífica, até que nos últi­ tituir tributos.
m os anos, os sujeitos ativos da obrigação Assim, cabe à U nião, aos Estados, ao
tributária entenderam em rever o assunto D istrito Federal e aos M unicípios instituir
face a C onstituição Federal de 1988. tributos (art. 145, caput, da CF).
N este m om ento, diversas são as inter­ Estes subdividem -se em im postos, ta­
pretações e discussões administrativas e ju ­ xas ou contribuição de m elhoria (art. 145,
diciais a respeito da base de cálculo do ISS ines. I, II e III, da CF).
na construção civil. A Constituição estabeleceu, para cada
N o trabalho serão abordadas as várias pessoa jurídica de direito público interno,
interpretações existentes sobre o assunto e, fatos genéricos possíveis de vir a ser trans­
fundamentando-me exclusivamente na ciên­ form ados em im postos.

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