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2008

Brasil como maior exportador mundial de carne bovina:


a contribuição do melhoramento genético

Fabiano Rodrigues da Cunha Araujo1 e Roberto Daniel Sainz2


1
AVAL Serviços Tecnológicos S/S. Uberaba- MG. www.aval-online.com.br.
email:faraujo@aval-online.com.br
2
Professor Titular, University of California, Davis-USA. e-mail: rdsainz@ucdavis.edu

Resumo – O Brasil conquistou a posição de maior exportador de carne bovina do mundo


através de avanços na genética e do manejo, aproveitando revezes nos maiores países
concorrentes. A consolidação desse mercado e a conquista de novos mercados irá depender
da abilidade da pecuária brasileira de aumentar a sua eficência produtiva, e de melhorar a
qualidade do produto. O melhoramento genético deve portanto enfatizar as característcas
de eficiência alimentar, precocidade sexual e qualidade de carcaça. Apresentamos alguns
dados de campo com gado Nelore mostrando uma correlação positiva entre acabamento de
gordura e precocidade sexual, e nenhuma correlação entre o consumo alimentar residual
(uma medida de eficiência) e a qualidade da carcaça. Estes resultados, aliados às
tecnologias atualmente disponíveis, indicam que o rebanho brasileiro irá apresentar uma
evolução genética muito rápida nos próximos anos, contribuindo para manter o Brasil em
uma posição de vanguarda no cenário mundial de carne vermelha.

Palavras-chave: bovinos de corte, objetivos de seleção, eficiência, precocidade, carcaça

Brazil as the biggest world beef exporter: the contribution of genetic improvement

Abstract – Brazil has conquered the position as the world’s greatest beef exporter due to
improvements in genetics and management, taking advantage of setbacks in competitor
countries. Consolidation of these markets and gaining new markets will depend upon the
ability of the Brazilian beef industry to improve its productive efficiency and product
quality. Breeding programs should therefore focus on feed efficiency, sexual precocity and
carcass quality traits. We present results of on-farm research with Nelore cattle showing a
positive correlation between subcutaneous fat and sexual precocity, and no correlation
between residual feed intake (a feed efficiency trait) and carcass traits. These results, along
with currently available technologies, indicate that the Brazilian cattle herd will undergo
rapid genetic progress in the next few years, contributing to keeping Brazil at the forefront
of global beef trade.

Keywords: beef cattle, breeding objectives, efficiency, precocity, carcass


2008

Introdução
A bovinocultura brasileira tem demostrado nos últimos anos o seu grau de
evolução, mostrando o profissionalismo e a eficiência de produção, que trazem resultados
que nos surpreendem a cada dia. A vocação pecuária com a rápida assimilação de novas
tecnologias contribuiram para que o Brasil se tornasse o maior exportador mundial de
carne bovina. O Brasil foi responsável pela exportação de 2.420 mil toleladas em
equivalente carcaça em 2007, representando mais de 50% do volume mundial e resultando
em 4.552 milhões de dólares que trouxeram ótimos resultados à nossa balança comercial.
No período de 2000 a 2007 tivemos um crescimento de 579% nas exportações de carne
bovina, com um crescimento de 126% do rebanho no mesmo período (CNPC, 2008).
Alguns acontecimentos como a seca na Austrália, febre aftosa na Inglaterra e BSE
nos Estados Unidos foram fatores que também contribuiram para este cenário. Neste
período tivemos a modernização das nossas indústrias, redes de comercialização
ampliadas, com mais de 200 países compradores de carne bovina brasileira (ABIEC,
2008). O maior gargalo na ampliação dos mercados de exportação estão relcionados à
sanidade animal: ratreabilidade e controle de doenças como a febre aftosa. Além disto,
atualmente a indústria brasileira vem sinalizando a necessidade de melhorarmos a
qualidade dos animais abatidos e a uniformidade de nosso produto. O desenvolvimento e a
transferência de tecnologias aplicadas ao produtor, podem trazer ao Brasil um cenário com
maiores possibilidades de agregar valor ao nosso produto e alavancar ainda mais a nossa
balança comercial.
A chave do sucesso futuro da pecuária brasileira resume-se em uma palavra:
eficiência. Eficiência de produção se consegue em logística, processamento,
armazenamento e comercialização. É indiscutível a melhora do manejo de nossos rebanhos
e dos recursos utilizados na nutrição animal. Sabemos desta contribuição, mas também da
importância do componente genético na eficiência de produção e na excelência da
qualidade da carne brasileira. Acreditamos na mudança do foco de nossa seleção, onde
ainda temos uma valorização predominante do desempenho animal; para uma seleção
objetivando a a melhoria das características de carcaça, a precocidade sexual, e a eficiência
nutricional. A melhora da qualidade de nosso produto se obtém com a redução de idade ao
abate e melhor acabamento.

Progresso recente
Hoje o criador conta com muitas ferramentas e informações para orientar uma
seleção quantitativa. Estas incluem as DEPs (Diferenças Esperadas na Progênie), seleção
massal, modelos para simulação de acasalamentos, marcadores genéticos e etc.. Alguns
projetos pecuários já adotam as características de precocidade sexual e características de
carcaça como critérios de seleção e já começam a usufruir destes resultados. Durante os
últimos anos, aplicando a avaliação por ultra-sonografia em tempo real, já tivemos a
avaliação de carcaça de 12.402 animais que através da matriz de parentesco geraram
informações genéticas (DEPs) para 764.474 animais das raças Nelore, Guzerá e Brahman
(Lôbo et al., 2008). Neste mesmo período também tivemos a avaliação para Probabilidade
de Prenhez Precoce (DEP 3P) para 10.742 animais, gerando avaliações genéticas para uma
população de 768.484 animais da raça Nelore (Lobo et al., 2008).
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O criador tem opções quanto às características a ser enfatizadas no processo de


seleção. Com o uso da ultra-sonografia existem desde 2003 DEPs para área de olho de
lombo (AOL,cm2), espessura de gordura entre as 12a-13a costelas (EG, mm) e espessura de
gordura na garupa (EGP8, mm). Desta maneira, é possível enfatizar o rendimento de
carcaça e de carne (AOL) ou a acabamento da carcaça (EG, EGP8, ou a média (EGmédia).
Visando a futura abertura de mercados mais valorizados (ex. EUA, Japão) alguns criadores
já inciaram trabalhos de seleção para marmoreio e até maciez da carne.
O conhecimento das interações entre características e sua expressão gênica é de
grande importância, porque não é vantagoso selecionar para qualquer característica
positiva se esta acarretar conseqüencias negativas. Com este objetivo apresentamos abaixo
um estudo sobre as características de precocidade sexual e características de carcaca
(musculosidade e acabamento). Neste trabalho foram avaliadas 316 novilhas com idade
média de 520 dias. Estas novilhas, oriundas de 24 touros, pertenciam a 10 lotes de manejo
que foram expostos a monta natural por 120 dias.
Como pode ser constatado na Figura 1, apenas 24% desta novilhas apresentaram
prenhez positiva ai final da estação de monta; as novilhas prenhes foram aquelas com
maior espessura de gordura. Quando se estodou a relação entre a espessura de gordura e a
probabilidade de prenhez precoce, constatou-se que houve um efeito linear entre estas
variáveis (Figura 2). Vale a pena ressaltar que estes efeitos são apenas fenotípicos, porém
são respaldados por resultados semelhantes já apresentados por Ribeiro (2006) em
novilhas da raça nelore expostas ao desafio de precocidade sexual entre 14 e 16 meses de
idade.

6.0
Espessura de Gordura Média, mm

5.5

5.0

4.5
5.43mm

4.0

4.17mm
3.5

3.0
Novilhas Novilhas
Gestantes (85) Negativas (270)

Figura 1. Associação entre a prenhez aos 17 meses e a espessura de gordura.


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100%

90%

80%
Probabilidade de Prenhez, %

70%

60%

50%
89%
40% 77%
65%
30%
53%
20% 41%
29%
10% 17%
5%
0%
3 4 5 6 7 8 9 10
Espessura de Gordura, mm

Figura 2. Associação entre a espessura de gordura e a probabilidade


de prenhez aos 17 meses

Finalmente, a eficiência nutricional reflete a quantidade de carne que pode ser


produzida de uma determinada quantidade de alimento, seja no pasto ou no confinamento.
O índice de conversão alimentar, isto é, a razão entre o ganho de peso e o consumo de
alimento, não foi aplicado de forma geral para a seleção genética por causa da sua
correlação indesejável com o peso adulto. Mais recentemente, a estimativa de consumo
alimentar residual (CAR; a diferença entre o consumo observado e aquele esperado para
um determinado peso e ganho de peso) tem sido mais aceito para as raças taurinas em
países como a Austrália, Estados Unidos e Canadá, porque não possui esta desvantagem.
Pela forma de calcular o CAR, valores mais altos estão associados a animais menos
eficientes, e os mais baixos (negativos) são mais eficientes (Figura 3). Estudos no Brasil
com bovinos da raça Nelore indicam que extiste grande variabilidade genética para esta
característica, portanto existe uma oportunidade para melhorar a eficiência da produção
desta maneira.
Apesar do CAR ser consagrado como uma característica de eficiência, não se pode
descuidar dos possíveis efeitos correlacionados. Com este intuito, foram comparados
animais de alto e baixo CAR (menos e mais eficientes, respectivamente) quanto à
qualidade das suas carcaças. Nesse trabalho, conduzido a campo na fazenda de um criador,
os animais de CAR alto e baixo consumiram 11,1 e 8,7 kg/dia de matéria seca, com o
mesmo peso e ganho de peso. Neste trabalho preliminar, não houve diferença entre estes
grupos quanto ao rendimento de carcaça, AOL, EG ou marmoreio. Serão necessárias mais
pesquisas para confirmar esta observação, e também para examinar possíveis efeitos
correlacionados com outras características (ex. fertilidade, precocidade).
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Figura 3. Relação entre o consumo de matéria seca observado e predito pelo peso
e o ganho de peso.

Conclusões

Em se tratando de melhoramento genético atualmente o Brasil se encontra numa


posição priveligiada com um rebanho que nos apresenta uma ótima variabilidade com
possibilidades de uma grande pressão de seleção e com disponibilidade de ótimas
ferramentas. Hoje o criador conta com muitas informações para orientar uma seleção
quantitativa. O melhoramento animal atualmente dispõe de ferramentas, como modelos de
predição de DEPs (Diferenças Esperadas na Progênie), seleção massal, modelos para
simulação de acasalamentos, marcadores genéticos e etc., que podem trazer grandes
benefícios nos próximos anos. Com a difusão destas tecnologias temos uma expectativa de
alcançar nos próximos anos ganhos genéticos muito além daqueles observados em anos
anteriores. Acreditamos que nos próximos 12 anos os rebanho brasileiro irá apresentar uma
evolução genética que não houve nos últimos 100 anos. O desafio agora não é mais como
conduzir o melhoramento, mas sim quais características seriam as mais importantes.
Existem fortes argumentos para priorizar a eficiência alimentar, a precocidade sexual, e a
qualidade da carcaça. Juntamente com avanços na defesa sanitária, o uso correto das
informações irá consolidar o Brasil em uma posição de vanguarda no cenário mundial de
carne vermelha, e permitir a conquista de novos mercados de maior valor agregado.
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Referências Bibliográficas
ABIEC- Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne, 2008. Estátisticas do
Conselho Nacional da Pecuária de Corte. Disponível em
http://www.abiec.com.br/estatisticas.asp. Acessado em: 20/04/2008
Barbosa, V., C. U. Magnabosco, C. U. Faria, R. D. Sainz, F. R. C. Arajo, and R. B. Lôbo.
2005. Implementação da amostragem de Gibbs no estudo da correlação genética entre
as características espessura de gordura e perímetro escrotal em tourinhos da raça
Nelore. Pages 01-05 in Proceedings 42th Reunião Anual da Sociedade Brasileira de
Zootecnia, Goiânia, GO, Brazil.
Lobo R.B., Bezerra L.A.F., Faria, C de U., Magnabosco, C. de U., Alburquerque, L.G.,
Bergmann, J.A.G., Sainz, R.D., Oliveira, H.N. 2008. Avaliação Genética de Touros e
Matrizes da Raça Nelore. Ribeirão Preto - SP. 124p ilust.28. ISSN 1981-1705.
Ribeiro, B. L. Utilização das informações (DEPs) no processo de Seleção. II Workshop de
ultra-sonografia para avaliação de carcaça bovina.1 a 3 de fevereiro de 2006. Uberaba-
MG

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