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A INFLUENCIA DA LEI MORAL BÍBLICA SOBRE O ORDENAMENTO JURÍDICO

BRASILEIRO

THE INFLUENCE OF THE BIBLICAL MORAL LAW ON THE BRAZILIAN LEGAL


ORDER

Deuel Pereira Matos Carneiro1

RESUMO

Este artigo tem como objetivo demonstrar a influência da lei mosaica sobre o
ordenamento jurídico brasileiro, comparando as semelhanças entre artigos dos dois
códigos em questão. Mesmo sendo um assunto pouco trabalhado, e com escasso
material disponível para pesquisa, afigura-se fundamental uma busca pela
compreensão do ordenamento constitucional brasileiro. Utilizou-se o procedimento
metodológico descritivo, do tipo transversal e qualitativo, pelas análises de
bibliografias relacionadas ao tema proposto, tendo como um dos fundamentos a
obra prima de livros como Deuteronômio, Levítico. Sendo nosso estado laico, em
que medida se dá essa influência? A lei moral bíblica se tornou universal entre os
homens? Buscar-se-á como resultado esperado, constatar e justificar as influências,
semelhanças e evoluções que o legislador brasileiro, ao longo do tempo, conseguiu
para a melhor adequação e aplicação em nossa sociedade de diversos fundamentos
bíblicos, sociedade essa do século XXI cheia de inovações e necessidades
específicas de sua época.

Palavras-chave: Influência. Hebraico. Direito. Brasileiro. Leis.

ABSTRACT

This article aims to demonstrate the influence of the Mosaic law on the
Brazilian legal system, comparing the similarities between articles of the two codes in
question. Even though it is a subject that has been little worked on, and with scarce
material available for research, a search for understanding the Brazilian constitutional
order is essential. Using the descriptive methodological procedure, of the transversal
and qualitative type, by the analysis of referenced bibliographies of the proposed
theme, and, having as one of the foundations the masterpiece of books such as
Deuteronomy, Leviticus. As our secular state, to what extent does this influence
occur? Has biblical moral law become universal among men? The expected result
will be to look for and justify the influences, similarities and evolutions that the
Brazilian legislator over time has achieved for the best adaptation and application in
our society of diverse biblical foundations, a society of the XX1 century full of
innovations and specific needs of its time.

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Deuel Pereira Matos Carneiro discente do Curso de Direito do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ). E-
mail: pereiradeuel@hotmail.com; Orientadora: Prof(a) Dr.(a) Eunicélia de Fátima Carneiro da Silva, e-mail:
eunicelia@yahoo.com.br.
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Keywords: Legal. Hebrew. Order. Brazilian. Laws.

1 INTRODUÇÃO

“Não tenha relações sexual com uma mulher e sua filha. Não tenha relações
sexuais com a filha do seu filho ou com a filha da sua filha; elas são parentes
próximas. Isso seria uma perversidade.”(Nova Bíblia Viva, 2010, Levítico 18:17),
para quem não tem conhecimento da leis, poderia pensar que o que foi citado
acima, trata-se de um dos milhares de artigos que regem nosso código civil, ou até
mesmo, algum artigo da Constituição Federal de 1988. De certa forma estaria certo,
está previsto no Novo Código Civil, artigo 1521:

Art. 1.521. Não podem casar:


I - os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;
II - os afins em linha reta;
III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o
foi do adotante;
IV - os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro
grau inclusive;
V - o adotado com o filho do adotante;
VI - as pessoas casadas;
VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de
homicídio contra o seu consorte.

É extremamente interessante notarmos as inserções de princípios, as


contribuições de códigos tão antigos, chegando até o século XXI. Podemos, muitas
vezes, pensar que os séculos vão passando, estudos e mais estudos da sociologia,
psicologia, filosofia, para tentar entender o comportamento do homem atual, e
quando falo em comportamento, quero me referir a sua essência, o que move o
homem a fazer o que faz, e não somente hábitos. Achando que o comportamento de
hoje é diferente do século passado, mas não o é.
O homem de 100 atrás tinha o costume de escrever cartas, seu meio de
transporte era um cavalo, sua casa era iluminada à luz de velas, entretanto sua
essência é sempre a mesma. Um ditado popular ressalta que “o homem é sempre o
mesmo, só muda a capa”. Hoje, em 2020, não se escreve mais cartas, é mensagem
de texto ou e-mail; o meio de transporte é o carro, ônibus, avião; e a iluminação tem
para todos os tipos de ambientes, ou seja, comportamentos mudaram, porém,
continua sendo regido pelo mesmo modus operandi. Por isso, que leis e princípios
de séculos atrás, de uma cultura completamente diferente da nossa, de outro
continente longínquo, irradia na trilha da construção de um ordenamento tão recente
e novo.
Vale ressaltar que essa influência sobre nosso ordenamento, mesmo se
tratando de algo religioso, de algo advindo da divindade do povo Hebreu, não se
torna uma imposição religiosa, é fascinante ver que algo advindo da religião
consegue ser imparcial, instruir um ordenamento jurídico em um país laico como o
Brasil, atingindo todas as pessoas independendo da sua crença.
De forma direta tenho como justificativa desse artigo a perfeita junção que
ocorre, entre a religião e o Direito. Os dois lados determinantes da vida de qualquer
ser humano são correlatos e merecem um estudo mais aprofundado. A escassez de
artigos direcionados a mostrar a influência religiosa no direito é motivo de debates e
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merece a releitura de alguns conceitos. O esclarecimento deste assunto implicará


positivamente no futuro.
É pertinente estudar, e analisar detalhadamente o que está sendo proposto
nesse trabalho, conhecer a fundo a essência das normas, as influências diretas e
indiretas à sua constituição. Ao operador do direito, é indispensável que entenda os
fundamentos do ordenamento nacional, para que, cada vez mais, se possa
aperfeiçoar o direito, a partir da defesa a bases sólidas e estruturação de críticas
histórica e socialmente embasadas, que provoquem mudanças coerentes, atentas
aos valores e ideias resguardados dentro da sociedade.
De tempos em tempos é necessário reformular e estudar nosso compêndio
legislativo a fim de aparar as arestas, e confirmar aquilo que temos como base,
como firmamento, deixando assim uma constituição sólida. Seguir em frente rumo
ao futuro sem olhar para trás seria ignorância e insensatez, pois uma construção de
grande porte sem um alicerce firme. Está fadada a desmoronar, mesmo que sejam
utilizados os mais perfeitos materiais.
Em vista do tema proposto, este estudo seguiu o procedimento metodológico
descritivo, do tipo transversal e qualitativo, pela análise de bibliografias
referenciadas no tema tratado. Para o desenvolvimento desta pesquisa, tendo em
vista o objetivo proposto, foram coletados dados em referências teóricas que trazem
textos exegéticos dos Livros do Pentateuco e livros de autoria jurídica, com
importantes juristas.
Neste artigo trabalharemos comparações sobre o direito hebraico e o direito
brasileiro: a importância da religião na formação do direito, tendo em vista que o
direito hebraico advém da religião: faremos algumas reflexões sobre o direito
hebraico, que tornará o nosso texto bem elucidativo, de fácil compreensão e, para
finalizar, nada mais óbvio do que as considerações finais.

2 A IMPORTÂNCIA DA RELIGIÃO NA FORMAÇÃO DO DIREITO

Não se pode questionar a importância que a religião teve ou têm sobre a vida
do homem, qualquer comportamento, sentimento, valor e principalmente normas,
advém de regras e pensamentos religioso. O grande Plutarco no seu tempo
asseverava isso:

“Percorrei a terra, e achareis cidades sem muros, sem ciências, sem artes e
sem reis; povos sem habitações fixas, sem uso e sem conhecimentos da
moeda; sem exercícios do corpo, sem teatros e sem espetáculos; mas não
encontrareis um só povo sem Deus, sem culto e sem sacrifícios”
(PLUTARCO, Citado por REIS, p. 62).

É um erro pensar que religioso é quem acredita em Deus ou em qualquer


outro tipo de divindade, santos, etc. Um dos significados da palavra religião segundo
Dicio – Dicionário Online de Português é postura intelectual e moral que resulta
dessa crença. O ateu acredita na ciência, logo, suas condutas morais e intelectuais
serão baseadas no que ele acredita, na sua religião, e a partir daí todo o modus
operandi será traçado. A fé tem uma importantíssima influencia sobre o coração do
homem, em qualquer tempo e lugar da terra. Compreende-se que a história real das
nações se acha ligada à história das suas religiões e que sem estudar as religiões
com especial cuidado, e em suas causas, nada se poderia conhecer da vida íntima
dos povos, nem mesmo se poderia compreender a sua história.
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Até onde é possível perscrutar na história da humanidade, encontramos


sempre os elementos e as raízes da religião. Segundo Boff, citado por Azevedo, a
religião:

tem sido a grande companheira da humanidade tirando-a de sua solidão do


universo, oferecendo uma orientação global, dando sentido às coisas,
criando valores e normas, gerando solidariedade, construindo a realidade a
fundo, a partir de um sentido ultimo e definitivo. Neste sentido, a religião é a
organização mais ancestral e sistemática da dimensão utópica inerente ao
ser humano que aposta que o mundo não está definitivamente perdido
(BOFF, Citado por AZEVEDO, p.01)

A partir da obra de Fustel de Coulanges (1830), A Cidade Antiga, podemos


traçar um breve panorama sobre a evolução da religião até o evento divisor de
águas chamado Cristianismo, analisando a importância da religião na formação do
direito. Alguns povos usavam e usam até hoje a religião como modelo de conduta e
de vida social. De acordo com de Coulanges, civilizações das mais remotas antes
mesmo de ter conhecimento da ciência filosofia, acreditavam numa segunda
existência depois desta, acreditava-se que a morte se tratava de uma simples
transferência de vida, mudar desse plano para um novo plano e não a dissolução do
ser.
Gregos acreditavam que o novo plano em que passaríamos a habitar depois
da morte seria algo parecido com nosso mundo. Mediante essa crença, começou-se
a prática de sepultamento para que a alma fosse fixada nessa morada tendo em
vista a segunda vida, ou seja, a vida pós morte. Era preciso que o corpo do de cujus
fosse recoberto de terra. Hoje, mesmo de forma falha e não codificado
expressamente, existe um direito funerário no ordenamento jurídico brasileiro que
trata a questão dos cadáveres, sepulturas e o tratamento aos cemitérios.
Como exemplo, podemos citar a impenhorabilidade de jazigos, A 6º Turma
Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, por unanimidade no seu
acórdão de nº 777.065 tratou o jazigo como bem impenhorável por se tratar de uma
extensão do domicílio dos membros da família. Embora a prática de enterrar o corpo
tenha alguma explicação pela vertente da medicina, ou outro viés qualquer, toda
essa prática teve começo na religião em séculos passados.
Retomando nossa retrospectiva, o homem nessa época era atormentado não
pelo medo da morte, mas sim pelo medo de não ter uma sepultura para repouso de
sua alma. De fato, essas crenças logo obrigaram à formação de regras de conduta.
Passado o culto à morte, veio então o culto ao fogo, como se este representasse
uma divindade. Os primitivos cultuavam o fogo como a alma dos entes queridos
mortos que ficavam agora dentro das casas, simbolizando a chama da alma. A
religiosidade e a sociedade foram crescendo juntas à medida que os grupos
familiares foram se juntando e formando cidades.
O ser divino adorado individualmente foi substituído por uma divindade
coletiva, que se tornava o deus daquele grupo, o sucesso daquele grupo familiar era
atribuída à divindade escolhida e assim os demais cidadãos tomavam para si a
divindade da família bem sucedida.
Completamente ligados à religião, cidades foram crescendo juntamente com o
pensamento religioso das gerações passadas. Em cidades primitivas, qualquer
instituição politica tinha sua origem na instituição religiosa. Logo em seguida veio o
Sofismo que estudava as leis que regiam o Estado e a família, e pregavam, que para
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governar um estado, não bastava apelar para os velhos costumes e leis sagradas,
mas era preciso ter persuasão para com os homens. (COULANGES,1830, p.370)
A sociedade antiga é finalizada com a chegada do Cristianismo. Esse novo
marco delimita as relações do homem com a propriedade privada, a hereditariedade,
o procedimento jurídico. (COULANGES,1830, p. 401 a 403) Além disso, Jesus
Cristo, como líder do cristianismo, em seus ensinamentos, separa religião e governo,
“(...) Então, lhes disse: Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de
Deus”,(Bíblia Sagrada, Mateus 22:21).Ele dissocia Estado e religião, iniciando a
transformação da natureza do direito. O estado passa a não ter mais uma religião
oficial, as regras governamentais mudam para sempre. (COULANGES,1830, p.409)
Mudando o prisma desse panorama, mas seguindo a mesma linha de
raciocínio, vamos analisar o Hinduísmo. Se até chegar ao cristianismo, não se tinha
denominação concreta de cada religião, apenas citando o que cada povo tinha como
crença, vamos extrair contribuições de segmentos conhecidos da fé humana e
analisar sua contribuição para com o direito mundial.
Para os Hindus a maneira como você vai reencarnar depende exclusivamente
da maneira como você viveu na vida presente, sua conduta vai determinar em qual
casta você reencarnará. O Vedismo apoia-se na crença da reencarnação e, através
desta, os Hindus puderam basear e firmar sua estrutura social e sua legislação
(CASTRO, 2007,p.46)
Este modo de crer permeia por completo o sistema da Índia antiga, da
economia à sociedade, em suas divisões de castas. É terminantemente proibida a
mistura ou mudança entre as castas, que só pode ser alterado com a morte e
reencarnação. O próprio Código de Manu tinha como base essa crença.

Art. 750. Uma obediência cega às ordens dos Brâmanes versados no


conhecimento dos Livros Santos, donos de casa e afamados pela sua
virtude, é o principal dever de um Sudra e ele dá felicidade depois da morte.
(CASTRO, 2007, p.47)

Art. 751. Um Sudra, puro de espírito e de corpo, submetido às vontades das


classes superiores, doce em sua linguagem, isento de arrogância e se
ligando principalmente aos Brâmanes, obtém um nascimento mais elevado.
(CASTRO, 2007, p.47)

Voltemos nossos olhos agora para o Islamismo, um sistema jurídico bastante


complexo, e rigoroso:

Podemos afirmar mais absolutamente do que no caso de qualquer outro


direito, que este é religioso, tendo em vista que “não é uma ciência
autônoma, mas uma das faces da religião”. Além disso, a principal sanção
compreendida neste direito é o estado de pecado, desta forma o direito
muçulmano preocupa-se, geralmente, muito pouco com sanções nas regras
que prescreve e, pelo mesmo motivo, somente é aplicável aos fiéis.
(CASTRO, 2007, p.150)

Listemos as fontes do direito muçulmano: Alcorão, o livro sagrado para o


muçulmano; a Suna, tradição relativa ao profeta, contendo sua vida e suas decisões;
o idjmâ que trata do acordo unânime da comunidade; e o Qiyâs, que em linhas
gerais é o raciocínio por analogia. Conforme afirmou Castro, na citação acima, o
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direito muçulmano é o mais religioso de todos, em toda direção que se olhe neste
seguimento vemos a religião como base de ordenamentos.
Podemos continuar nessa explanação, listando religião por religião, e vamos
continuar vendo a contribuição para a formação do direito. No direito egípcio, o faraó
era tido como filho diretamente do deus Osíris e isso influenciava toda a base da
sociedade. Acacio Vaz de Lima Filho Bacharel, especialista em Direito Agrário,
Mestre e Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo,
de forma brilhante trata sobre isso com maestria:

Insistamos na enorme importância do fator religioso na Civilização Egípcia.


O religioso permeia, com efeito, todos os aspectos da vida daquele
extraordinário povo que viveu outrora às margens do Rio Nilo. E a religião
está presente, inclusive, na concepção do poder político. Com efeito, sob as
duas primeiras dinastias tinitas, que ora enfocamos, o Faraó é deus, com
tudo o que daí dimana. Ele encarna Horus, cujo nome usa. Este dado
embasa o seu caráter divino, e bem assim, a legitimidade do seu poder.
(FILHO, 2009, P. 43)

Os impostos arrecadados ficavam retidos nas mãos do faraó, que fazia uso
conforme lhe convinha, e isso jamais poderia ser contestado, a suposta divindade do
faraó dava-lhe prerrogativa para ter o tratamento que achasse melhor sobre
impostos, políticas e etc. Além da atribuição de “cofre público”, o faraó tinha
atribuições como monarca soberano, de cuidar das construções, do poder bélico,
algumas atribuições religiosas e afins.
Em linhas gerais ficou clara a contribuição da religião para a construção do
direito na sociedade seja qual for, e o quadro evolutivo da religião, crença e fé lado a
lado com o direito e as demais ciências. Adaptações para cada cultura, levando em
conta quadro social, econômico foram necessárias para chegarmos até o século
XXI. Aqui vale ressaltar que não está se colocando julgamento sobre cada tipo de
ordenamento, não é este o nosso propósito.

3 REFLEXÕES SOBRE O DIREITO HEBRAICO

Em 1800 a. C uma enorme escassez de chuva obriga os Hebreus a saírem da


sua terra situada na Palestina rumo ao Egito (CASTRO, 2007, p.29). Devido ao
crescimento exorbitante da população em pouco tempo, o povo começa a ser
perseguido, sendo obrigado a pagar grandes impostos, e culminando em uma
escravidão de aproximadamente 400 anos:

Entrementes, se levantou novo rei sobre o Egito, que não conhecera a José.
Ele disse ao seu povo: Eis que o povo dos filhos de Israel é mais numeroso
e mais forte do que nós. Eia, usemos de astúcia para com ele, para que não
se multiplique, e seja o caso que, vindo guerra, ele se ajunte com os nossos
inimigos, peleje contra nós e saia da terra. (Bíblia Sagrada, 2016, Êxodo 1:
8-10)

Em um episódio chamado Êxodo, por volta de 1250 a. C, todo o povo Hebreu


retorna a Palestina por um percurso que levou 40 anos pelo deserto. Neste espaço
de tempo, sob a liderança de Moisés, toda a estrutura da civilização hebraica foi
formada, inclusive suas leis. A base legislativa hebraica, a Legislação mosaica é
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encontrada nos Dez Mandamentos, escrita pessoalmente por Deus em tábuas de


pedra no Monte Sinai, representando a aliança entre Ele e o Povo.
A Torá, que contem a lei dos Hebreus, também chamada de Pentateuco, é
constituída por 5 livros: Gêneses, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. Esses
5 volumes são os 5 primeiros livros da Bíblia. São encontrados leis em toda a Torá,
e especialmente no último livro existe uma maior concentração de preceitos,
inclusive repetindo alguns já mencionados nos demais, é o chamado Deuteronômio,
que significa segunda lei. Devido ao tipo de construção legislativa, a que se propõe o
povo Hebreu, pode-se constatar que o fator religioso se incorpora em tudo, a religião
é a essência de tudo. Uma cultura monoteísta com tal, torna impossível o estudo
desse povo sem se ater a esse ponto.
A estrutura da sociedade hebreia tinha como ponto de convergência a
religião, e de forma tão sólida que em todo ponto da história que o povo enfrentou
problemas sociais, econômicos e políticos, o motivo foi a desobediência às leis
criadas por Deus. (CASTRO, 2007, p.30) Com o povo hebreu levado cativo pelo rei
Babilônico em 586 a.C, o direito que outrora era positivado nas Tábuas da Lei, agora
teria que ser convergido para um novo direito, um direito passado para as gerações
futuras de forma oral na tentativa de manter firme toda a legislação divina. Em
contato com outras diversas culturas como persas, gregos e romanos, a
necessidade de afirmar no que criam foi necessário. (CASTRO, 2007, p.31)
Essa forma oral do direito hebreu é conhecida como Talmud (‫)תלמּוד‬, ַ
transmitida por Moisés aos patriarcas de sua geração com o objetivo de perpetuar o
ensinamento sem um registro propriamente escrito. (WOLKMER, 2008, p.45). O
Talmud é configurado em seis sessões denominadas de Sedarim (Ordens) e cada
Sedarim se subdivide em tratados, cada tratado se subdivide em capítulos. O
Talmud, de forma completa, compreende 63 tratados e 517 Capítulos:

1. ZERAIM (sementes): 11 tratados, 74 capítulos


2. MOED (festas): 12 tratados, 88 capítulos
3. NASHIM (mulheres): 7 tratados, 71 capítulos
4. NEZIKIN (danos): 10 tratados, 73 capítulos
5. KODASHIM (objetos santos): 11 tratados, 89 capítulos
6. TAHOROT (pureza): 12 tratados, 136 capítulos
(WOLKMER, 2008, p.46)

O direito Hebreu é completamente rígido acerca da justiça, inclusive,


cobrando compulsoriamente a imparcialidade no julgamento de cada indivíduo.
Cada cidade deveria ter obrigatoriamente juízes incorruptíveis. Geralmente os juízes
eram escolhidos dentre os chefes de família, com reputação ilibada.

Vocês deverão nomear juízes e oficiais para cada tribo em todas as cidades
recebidas do Senhor, o seu Deus, para que julguem o povo com justiça e
honestidade. Não pervertam a justiça, nem sejam parciais, fazendo acepção
de pessoas. Não aceitem suborno, porque o suborno cega até os sábios e
perverte a causa dos justos. (Nova Bíblia Viva, 2010, Deuteronômio 16:17)

Para o hebreu ter o sangue inocente em suas mãos é uma falta gravíssima,
por isso as leis são tão enfáticas na questão de ser sempre justo. Na cultura hebreia
a vida pertence somente a Deus, Ele é o único Dono da vida, sendo assim, o sangue
derramado de forma errônea se torna pecado gravíssimo. Esse tipo de conduta
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torna os Hebreus diferente dos outros povos, o julgamento de qualquer causa deve
passar por uma investigação justa e minuciosa.

Se alguma vez vocês ouvirem dizer que numa das cidades recebidas pelo
Senhor, o seu Deus, para sua moradia, homens malignos fizeram sugestões
pecaminosas e desviaram os seus habitantes, dizendo: ‘vamos e sirvamos a
outros deuses’, deuses que vocês não conhecem, vocês deverão verificar e
fazer uma investigação cuidadosa para ver se isso é verdade. (Nova Bíblia
Viva, 2010, Deuteronômio 16:17)

O homicídio era tratado de forma severa pela Pena de Talião porém, como
fruto da preocupação com maior equidade e justiça em sua legislação, no direito
Hebreu eram designadas cidades refúgio ou asilos, em que pessoas com problemas
jurídicos poderiam se refugiar para que que fosse evitada tomadas de decisões no
calor do momento. Nessas cidades, apenas pessoas que tivessem cometido
homicídio culposo poderiam entrar, portanto, sendo provado a falta de intenção, o
réu era isento. (CASTRO, 2007, p.34)

Quando o Senhor, o seu Deus, tiver destruído as nações cuja terra ele está
dando a vocês, e quando as expulsarem e habitarem nas suas cidades e
nas suas casa, separem três cidades de refúgio no meio da terra de vocês
que o Senhor, o seu Deus, está dando a vocês, para dela tomarem posse.
Dividam a terra em três partes que o Senhor, o seu Deus, está dando a vês
como herança, e escolham uma cidade que seja de fácil acesso, para que o
homicida possa chegar lá com segurança. Estes são os casos em que o
homicida, ao correr para as cidades refúgio, terá a vida salva. Isso vale para
aquele que sem intenção e sem ódio premeditado matar o seu próximo.
(Nova Bíblia Viva, 2010, Deuteronômio 19:1-5)

Mesmo que de forma mais amena por haver outros princípios (com a
individualidade das penas), que limitavam sua aplicação, é possível observar a pena
de Talião no pentateuco. A Bíblia que primeiro descreve, não de forma direta, mas
de forma indireta, o princípio da Pena de Talião:

Não tenham pena de uma testemunha falsa! A regra é esta: vida por vida,
olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé” (Nova Bíblia Viva,
2010, Deuteronômio 16:17)

A Individualidade das penas, contida na legislação hebreia, minimiza o


princípio da Pena de Talião, deixando claro que cada um paga pelos seus crimes, a
responsabilidade é completamente pessoal. Tomemos nota de que esse valoroso e
lógico princípio não é comum entre as culturas, este tipo de princípio depois dos
Hebreus, só foi visto novamente no século XVIII d. C. (CASTRO, 2007, p.34)

Os pais não serão mortos por causa do pecado dos filhos, nem os filhos por
causa dos pecados dos pais. Cada um morrerá pelo seu próprio pecado.
(Nova Bíblia Viva, 2010, Deuteronômio 24:16)
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É difícil deixar de notar tamanha equidade e integridade em cada princípio


desse povo, a busca pelo que é justo e correto advém da divindade, para
exemplificar, vejamos o ritual religioso. A presença do Deus dos Hebreus era
representada pela arca da aliança, nenhum indivíduo por livre e espontânea vontade
poderia ter contato ou sequer tocar nessa arca, só um sumo sacerdote, selecionado,
poderia entrar no santo dos santos, uma vez por ano, para fazer sacrifício pelo povo
em busca da expiação do pecado. (Nova Bíblia Viva, 2010, Hebreus 9:1-28)
Portanto, um Deus com tamanhas exigências de pureza e santidade jamais poderia
aceitar regras e leis cíveis ou penais com algum vício ou mácula.
De modo algum é algo fácil relacionar e refletir sobre a legislação de uma
nação que compreende um espaço de tempo de vinte séculos de existência,
consequentemente muita coisa deixou de ser citada aqui, porém as principais
características foram ressaltadas: O direito hebraico era de caráter religioso,
resultado do pacto entre Deus e um povo, havia uma investigação, tanto humana
quanto divina, na resolução de alguns casos; sociedade patriarcal, tendo como
liderança os juízes; a justiça e probidade como centro das ações. Israel Drapkin
citado por Wolkmer, fala sobre o que ele considera ser o grande legado do Israel
antigo:

Em seu estudo “The Ancient Hebrew Criminal Law”, (...) Ele faz, então, a
pergunta: “Qual a contribuição dos judeus?” Sua reposta é que, se por um
lado eles não construíram pirâmides, estátuas, ídolos, ou representações de
Deus em pedra ou madeira, por outro lado, legaram ao mundo o conceito de
um Deus invisível, intangível, e que se relaciona com a humanidade
mediante um sistema de leis. Sua crença monoteísta em um Deus difundiu-
se para outras grandes religiões monoteísticas e é esse conceito de
monoteísmo que parece transcender em importância as contribuições de
outras civilizações. (WOLKMER, 2008, p.67)

Estudar o Direito hebraico antigo é estudar as raízes da civilização moderna


ocidental, compreender a influência que vem exercendo por meio da religião deveria
ser material de estudo jurídico de todo operador do direito.
4 COMPARAÇÃO DAS LEIS MOSAICAS COM O ORDENAMENTO JURÍDICO
BRASILEIRO

Influenciados pela Bíblia Sagrada, vários ramos da ciência jurídica tiveram


essa preciosa contribuição. Esse fato não interfere na liberdade de consciência e de
crença. A luz da Bíblia sobre o Direito brasileiro se atém a questões penais, cíveis,
éticas, tributárias, administrativas e constitucionais. O Brasil se configura um país
laico, independentemente de ter uma sociedade majoritariamente cristã, isso está
positivado de forma brilhante e clara na nossa Constituição Federal de 1988,
confirmando a liberdade de consciência e de culto:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado
o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção
aos locais de culto e a suas liturgias; (BRASIL. Constituição 1988, dos
direitos e garantias fundamentais)
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Como mencionado anteriormente a Torá, lei hebraica, está contida no


Pentateuco, os primeiros 5 livros da Bíblia. Esse código foi inspiração para muitas
leis e, conforme o tempo, costumes e sociedade, foi sendo modificada. A adaptação,
ou até mesmo revogação foi necessária para a nova realidade. Entretanto, algumas
são tão atuais e fortes, mesmo tendo mais de 2 mil anos de existência, que se
perpetuaram e continuarão sendo necessárias ao longo da história, servindo de
controle social.
O objetivo desta sessão é comparar as normas contidas no Pentateuco e o
ordenamento jurídico brasileiro. Infelizmente não é possível esgotar essas
comparações, devido a riqueza e a imensidão de material científico para estudo. As
comparações feitas serão suficientes para constatarmos as benéficas influências do
direito hebraico sobre o ordenamento jurídico brasileiro, não se atendo há um único
ramo do direito.
Como ponto de partida, entraremos no Direito Constitucional, conforme
positivado no artigo 5º inciso XLI “A Lei punirá qualquer discriminação atentatória
dos direitos a liberdade fundamentais” (BRASIL. Constituição 1988, dos direitos e
garantias fundamentais) No direito Hebreu já era positivado o respeito ao próximo
evitando a discriminação: “Não amaldiçoe o surdo nem faça tropeçar o cego, mas
tema o seu Deus. Eu sou o Senhor” (Nova Bíblia Viva, 2010, Levítico 19:14).No
mesmo seguimento temos a igualdade perante a lei:

Não cometam injustiça num julgamento; não favoreçam os pobres e nem


procurem agradar os grandes, mas julguem seu próximo com justiça.
Quando um estrangeiro viver na terra de vocês, não o maltratem. O
estrangeiro residente que viver com vocês deverá ser tratado como natural
da terra. Amem-no como a si mesmos, pois vocês foram estrangeiro no
Egito. (Nova Bíblia Viva, 2010, Levítico 19:15, 33-34)

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: (BRASIL. Constituição 1988, dos
direitos e garantias fundamentais)

A imparcialidade do código mosaico acarretava uma igualdade tanto formal


quanto material. Não existia a diferenciação do rico ou pobre se o delito era grave ou
leve, tudo deveria ser julgado de forma imparcial. Embora a ação de ser imparcial
não seja a realidade em nosso ordenamento, está positivada na nossa constituição.
As leis da antiguidade e as leis do século XXI, têm como finalidade manter a ordem
e organização da sociedade.
No ramo do Direito Civil, podemos citar a reparação ao Dano moral. Na lei
Hebraica também se apresenta a reparação ao dano moral, reprimindo a difamação,
a calúnia:

Se um homem casar com uma jovem e, depois de ter tido reações com ela,
rejeitá-la e difamá-la, dizendo: ‘Casei-me com esta moça, mas descobri que
ela não era virgem’, o pai e a mãe da moça apresentarão aos juízes na
entrada da cidade a prova da virgindade da filha. O pai da moça dirá aos
oficiais: ‘Dei minha filha em casamento a este homem, mas agora ele a está
11

rejeitando. Ele também a difamou e disse: Descobri que a sua filha não era
virgem. Entretanto, aqui está a prova da virgindade da minha filha. Então os
pais estenderão a roupa dela diante dos oficiais da cidade e eles castigarão
aquele homem. Imporão uma pesada multa de cem peças de prata. O
dinheiro da multa será dado ao pai da moça, pois aquele homem acusou
falsamente uma virgem de Israel. Ele não poderá obter divórcio enquanto
viver. (Nova Bíblia Viva, 2010, Deuteronômio 22:13-39)

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou


imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito. (BRASIL. Código Civil 2014, dos
Atos ilícitos)

No direito das sucessões há o art 1.784 do Código Civil: “Aberta a sucessão,


a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”. No
Direito hebraico também se pode verificar a existência do instituto da herança e, em
Números 27: 5-11, é possível observar a justiça atenta ao Caso concreto, que
estabelece uma ordem de sucessão hereditária a fim, de preservar a estrutura
famíliar, de acordo com a época histórica vivenciada:

Então Moisés levou o caso perante o Senhor, e o Senhor respondeu a


Moisés: As filhas de Zelofeade estão certas. Você deve dar a elas uma
propriedade por herança entre os parentes de seu pai, e passará a elas a
herança de seu pai. Diga aos israelitas: Quando um homem morrer e não
deixar filhos, a herança pertencerá à sua filha. Se ele não tiver filha, então a
herança pertencerá aos irmãos dele. E se não tiver irmãos, a herança
pertencerá aos irmãos do seu pai. E se o pai não tiver irmãos, a herança
pertencerá ao parente mais próximo do seu grupo de famílias. (Nova Bíblia
Viva, 2010, Números 27:5-11)

Da mesma forma que no Código Civil, em Números os herdeiros deveriam


receber a herança do pai logo após sua morte. O Hebreu também fazia uso de leis
sobre a inviolabilidade de domicílio, assim como nosso ordenamento. A casa é asilo
inviolável, expressamente garantida no artigo 5º da nossa Constituição.

Se você emprestar alguma coisa ao seu próximo, não entre na casa dele
para pegar o que ele ofereceu como garantia pela dívida. Fique do lado de
fora. O homem que recebeu o empréstimo é que sairá de casa e entregará
a você o que prometeu como garantia pela dívida. (Nova Bíblia Viva, 2010,
Deuteronômio 24:10-11)

Art 5, XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo


penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito
ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação
judicial. (BRASIL. Constituição 1988, dos direitos e garantias fundamentais)

Para concluir as comparações no âmbito civil, temos a responsabilidade Civil


também positivada nos dois códigos em questão, a obrigação de compensar o dano
que uma pessoa causou a outra, caso comprovado depois de severa investigação.
Trata-se de matéria muito clara e objetiva nas duas legislações, não há como haver
diferenciação a não ser adaptações para os dias de hoje:
12

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o
dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar,
por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (BRASIL. Código Civil
2014, Da Responsabilidade Civil)

E o Senhor disse a Moisés: Diga ao povo de Israel: Quando um homem ou


uma mulher prejudicar outra pessoa e, portanto, ofender o Senhor, será
culpado. Confessará o pecado que cometeu, fará restituição completa, e
acrescentará um quinto a esse valor e o dará à pessoa prejudicada. (Nova
Bíblia Viva, 2010, Números 5:5-7)

Para o hebreu, a vida humana consistia em algo muito sagrado, por ser um
bem pertencente a Deus, Ezequiel 17:4 “Pois todos me pertencem. Tanto o pai
como o filho me pertencem” (Nova Bíblia Viva, 2010), no âmbito penal, e de forma
bastante conhecida, temos o 6º Mandamento, Êxodo 20: 13 “Não Mate (Nova Bíblia
Viva, 2010º) Não é diferente com a legislação brasileira, na nossa Constituição
Federal, artigo 5º, caput, que prevê a inviolabilidade do direito à vida:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: (BRASIL. Constituição 1988, dos
direitos e garantias fundamentais)

Segundo Luciana Russo (2009), “o direito à vida é o bem mais relevante de


todo ser humano e a dignidade da pessoa humana é um fundamento da República
Federativa do Brasil e não há dignidade sem vida.” Paulo Gustavo Gonet Branco,
em seu livro Direito Constitucional, diz:

A existência humana é o pressuposto elementar de todos os demais direitos


e liberdades disposto na Constituição e que esses direitos têm nos marcos
da vida de cada individuo os limites máximos da sua extensão concreta. O
direito a vida é a premissa dos direitos proclamados pelo constituinte; não
faria sentido declarar qualquer outro se, antes, não fosse assegurado o
próprio direito estar vivo para usufruí-lo. O seu peso abstrato, inerente à
capital relevância, é superior a todo outro interesse. (BRANCO, 2010,
p.441)

A seu modo, cada ordenamento jurídico, tanto hebraico como brasileiro,


explica a origem de tamanha importância da vida, e como consequência, foram
constituídas leis rígidas para a preservação de tamanho bem jurídico. A partir daí as
ramificações vão sendo criadas, como a vertente do homicídio culposo, que para o
hebreu não existia como foi citado seções anteriores; legítima defesa, etc.
No ramo da assistência social temos legislações dos dois povos que
abordam a assistência para garantir às pessoas o mínimo existencial. A caridade no
direito hebreu, a assistência social sempre foi carro chefe nas tomadas de decisões
dos juízes e reis:
13

Se houver algum israelita pobre na terra que o Senhor, o seu Deus, está
dando a vocês, não endureçam o seu coração nem fechem as mãos para o
seu irmão pobre. Ao contrário, abram as mãos e emprestem ao pobre
liberalmente tudo o que falta a ele. (Nova Bíblia Viva, 2010, Deuteronômio
15:7-8)

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho,


a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a
proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na
forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº
90, de 2015 (BRASIL. Constituição 1988, dos direitos e garantias
fundamentais)

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar,


independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por
objetivos: (BRASIL. Constituição 1988, da Assistência Social)

Encerrando esta seção, o Direito trabalhista é mais um ramo que teve


influências hebraicas. O direito Hebreu tem essa diferenciação das demais por ser a
primeira a instituir o descanso semanal além de leis sobre a proteção salarial “Não
explore o seu próximo, nem roube dele. Não fique até o dia seguinte com o salário
de um trabalhador pago por dia de trabalho” (Nova Bíblia Viva, 2010, Levítico 19:13)

Guarde o dia do sábado como um dia de santo repouso, conforme o


Senhor, o seu Deus, ordenou a você. Trabalhe nos outros seus dias, mas o
sétimo dia é o dia de descanso do Senhor, o seu Deus. Nenhum trabalho
será feito nesse dia, nem por você, nem pelo seu filho, nem pela sua filha,
nem pelo seu servo, nem pela sua serva, nem pelo seu boi, nem pelo seu
jumento, ou qualquer dos seus animais, nem pelo estrangeiro que mora
com você, para que o seu servo e a sua serva descansem como você.
(Nova Bíblia Viva, 2010, Deuteronômio 5:12-14)

Art. 67. Será assegurado a todo empregado um descanso semanal de 24


(vinte e quatro) horas consecutivas, o qual, salvo motivo de conveniência
pública ou necessidade imperiosa do serviço, deverá coincidir com o
domingo, no todo ou em parte. (SAAD. Consolidação das Leis do Trabalho
comentada 2005, Dos Períodos de Descanso)

O ponto chave que ampara esta similaridade das leis expostas, consiste no
dia proposto. No código hebraico, ficava obrigado o descanso no sétimo dia da
semana: o Sabbath, em referência a ressureição de Cristo. No código brasileiro, fica
facultado ao empregador conceder qualquer dia para descanso, mas
“preferencialmente”, que seja aos domingos. São artigos de fácil compreensão e que
enriquecem ainda mais o estudo comparativo destes códigos jurídicos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste artigo foi mostrar a influência do direito hebraico sobre a


legislação brasileira. É extremamente pertinente saber as origens da legislação do
seu país, negligenciar essa responsabilidade seria loucura. Para tal propósito, nos
propomos, em três seções, trazer o máximo de informações possíveis.
Primeiramente falamos sobre a influência da religião sobre a formação do direito,
discorrendo sobre algumas religiões mundiais.
14

Na segunda seção consideramos características do direito hebraico


detalhando cada uma delas, e mesmo sendo impossível discorrer sobre todas e
fazer um trabalho digno da cultura hebraica, foram citadas as principais para
embasar a proposta do artigo.
Como terceira e última seção, a comparação entre as duas legislações foi
feita, mostrando o que dispõem nosso ordenamento e as leis hebraicas acerca de
ramos do Direito Penal, Trabalhista, Civil, Constitucional, familiar.
O tema desse artigo serviu para desmistificar uma das fontes do direito
brasileiro e que merece ser estudada a fundo. São dois mil anos de formação
legislativa, e assim como o que até aqui foi de grande benefício para nosso
ordenamento jurídico, mais pode ser acrescentado e melhorado se mais estudos
forem feitos.

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Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

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C289i Carneiro, Deuel Pereira Matos Carneiro.


A Influência da Lei Moral Bíblica sobre o Ordenamento
Jurídico Brasileiro/Sérgio Rodrigues da Silva. - João
Pessoa, 2020.
17f.

Orientador (a): Prof. Eunicelia de Fátima Santos


Monografia (Curso de Direito) –
Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ.

1. Influência. 2. Hebraico. 3. Direito. 4. Brasileiro.


5. Leis. I. Título.

UNIPÊ / BC CDU - 34:81

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