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UESB - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA

BAHIA
PPGEO - PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
DISCIPLINA: TÓPICOS ESPECIAIS
DOSCENTE: MARIO RUBEM SANTANA
DISCENTE: VICTOR ANDRADE SILVA LEAL

Resenha: DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix. O que é Filosofia?.

Deleuze (1925 – 1995) foi um filósofo francês, especialista na área da história da


filosofia. Sua obra foi profundamente influenciada por, dentre outros, autores como
Foucault, Spinoza, Bergson e Nietsche. Se tornou amigo e colaborador de Felix Guattari
(1930 – 1992), que por sua fez trabalhou maior parte da vida enquanto um psicanalista.
Guatarri possuiu graduação em farmácia e filosofia, as duas, entretanto, incompletas.
Grande período de sua vida ele esteve presente na militância de esquerda de filiação
anarquista e comunista. Junto com Deleuze, escreveu alguns livros. Dentre eles, o que
será analisado nessa resenha, O que é Filosofia?, escrito em 1991.
Apesar do título ser sugestivo no sentido de aparentar um livro introdutório, a
obra não é indicada para quem está começando a se aventurar em leituras filosóficas.
Isso por que ele traz uma série de referências, explicitas ou implícitas, de outros
filósofos, sendo essas necessárias para compreender a obra. Além disso, os autores dão
um tratamento teórico voltado ao movimento filosófico da “pós-modernidade”, que por
sua vez se utiliza de uma indiscriminada mistura de teorias e conceitos, tornando o texto
de difícil compreensão.
O principal objetivo do livro capitado ao fazer a leitura é o de responder a
pergunta: De onde vem o conhecimento? E para isso, Deleuze e Guattari vão dividir a
produção intelectual em três grandes grupos: Filosofia, Ciência e Arte. Cada um desses
grupos se distinguiria por produzir conhecimentos qualitativamente diferentes, apesar de
estarem ligados um com os outros.
Ao falar do primeiro grupo, os autores afirmam que “[...] a filosofia é a arte de
formar, de inventar, de fabricar conceitos” (p. 10). Assim, o conceito seria o constructo
da filosofia. É com conceito que a filosofia consegue criar explicativas para a realidade.
Contudo, o conceito não é ele mesmo sozinho, está inserido em um todo. Possui
intercessões com outros conceitos. Assim, um conceito individual só pode existir
quando amparado por outros que estão dentro de um mesmo universo teórico. Por
exemplo, para compreender o que seria o conceito de ser-humano seria necessário
compreender na mesma ordem (e logo, sem hierarquias) os conceitos de razão, primata,
sociedade, linguagem, cultura, trabalho etc.
Mais além, o conceito é construído com base em uma realidade, e sempre
historicamente, nunca do nada. Isso quer dizer que eles não surgem para explicar algo
do plano transcendente, como criticam Deleuze e Guattari, mas para explicar a própria
realidade. Além disso, os conceitos vão se construindo tendo como base outros
conceitos predecessores. Da mesma forma que o conceito de trabalho já passou pelo
tratamento de Adam Smith, David Ricardo, Karl Marx e Friedrich Engels, dentre
outros.
Sendo o conceito o conhecimento pertencente a filosofia, ele é apenas criado pelo
filosofo, que seria o que os autores chamam de “amigo da filosofia”, a pessoa que faz a
filosofia acontecer, por assim dizer. Esse tipo de conhecimento trata de assuntos mais
gerais da realidade (o que é a vida? O que é a existência? O que é o espaço e o tempo?
Etc.). Já a ciência trata de realidades mais específicas e concretas (como o mamífero se
reproduz? Como a luz se comporta e qual sua velocidade? Como uma determinada
civilização s erigiu? Etc.). Por outro lado, a arte produz um conhecimento mais
subjetivo, a concretude de algo percebido ou sentido.
Sobre o conhecimento filosófico, os autores afirmam que ele existe em um plano
específico, denominado por eles de Plano de Imanência. Este seria onde os conceitos
são construídos. O plano de imanência não é os livros, ou o cérebro e suas funções, ou
até mesmo o pensamento. É o plano onde os conceitos existem e coabitam com outros
que o complementam. Um plano infinito no qual os conceitos finitos viajam em uma
velocidade infinita, dando formas e contornos ao plano de imanência. Mas não é um
“espaço” de coordenadas e de pontos de referências.
Para Deleuze e Guattari, cada grande filósofo vai criar uma nova maneira de
pensar, e com isso, criar (ou talvez estender) um plano de imanência, que é delimitado
pelo conjunto de conceitos que agem de forma conjunta para explicar o mundo. Em
outras palavras (não utilizadas pelo autor), o plano de imanência é uma ideologia, no
sentido de se um grupo de ideias mais ou menos coerentes que criar uma explicativa o
real.
“Se a filosofia começa com a criação de conceitos, o plano de imanência deve
ser considerado como pré-filosófico. Ele está pressuposto, não da maneira pela
qual um conceito pode remeter a outros, mas pela qual os conceitos remetem eles
mesmos a uma compreensão não-conceitual. Esta compreensão intuitiva varia
ainda segundo a maneira pela qual o plano está traçado” (p. 57).
“A partir de Descartes, e com Kant e Husserl, o cogito torna possível tratar o
plano de imanência como um campo de consciência. É que a imanência é
suposta ser imanente a uma consciência pura, a um sujeito pensante” (p. 63).
O plano de imanência tratado como um campo da consciência. O algo intuitivo da
filosofia.
“Husserl concebe a imanência como a de um fluxo do vivido na subjetividade,
mas como todo este vivido, puro e mesmo selvagem, não pertence inteiramente ao
eu que a representa para si, é nas regiões de não-pertença que se restabelece, no
horizonte, algo de transcendente: uma vez sob a forma de uma ‘transcendência
imanente ou primordial’ de um mundo povoado de objetos intencionais, uma
outra vez como transcendência privilegiada de um mundo intersubjetivo povoado
de outros eus, uma terceira vez como transcendência objetiva de um mundo ideal
povoado de formações culturais e pela comunidade dos homens” (p. 64).
“A suposição de Sartre, de um campo transcendental impessoal, devolve à
imanência seus direitos. É quando a imanência não mais é imanente a outra coisa
senão a si que se pode falar de um plano de imanência. Um tal plano é talvez um
empirismo radical: ele não apresenta um fluxo do vivido imanente a um sujeito, e
que se individualiza no que pertence a um eu. Ele não apresenta senão
acontecimentos, isto é, mundos possíveis enquanto conceitos, e outrem, como
expressões de mundos possíveis ou personagens conceituais” (p. 65).
“Quem sabia plenamente que a imanência não pertencia senão a si mesma, e
assim que ela era um plano percorrido pelos movimentos do infinito,
preenchido pelas ordenadas intensivas, era Espinosa. Assim, ele é o príncipe
dos filósofos. Talvez o único a não ter aceitado nenhum compromisso com a
transcendência, a tê-la expulsado de todos os lugares” (p.66).
“Jamais a relação do pensamento com o verdadeiro foi um negócio simples,
ainda menos constante, nas ambigüidades do movimento infinito. É por isso que é
vão invocar uma tal relação para definir a filosofia. O primeiro caráter da
imagem moderna do pensamento é talvez o de renunciar completamente a esta
relação, para considerar que a verdade é somente o que o pensamento cria, tendo-
se em conta o plano de imanência que se dá por pressuposto, e todos os traços
deste plano, negativos tanto quanto positivos, tornados indiscerníveis: pensamento
é criação, não vontade de verdade, como Nietzsche soube mostrar” (p. 73).

OS PERSONAGENS CONCEITUAIS
Os personagens conceituais são o devir de um pensamento filosófico. Diferente do
personagem de um diálogo filosófico, eles não apresentam o conceito através da
linguagem, mas são a representação do próprio conceito.
“O idiota é o pensador privado por oposição ao professor público (o escolástico):
o professor não cessa de remeter a conceitos ensinados (o homem-animal
racional), enquanto o pensador privado forma um conceito com forças inatas que
cada um possui de direito por sua conta (eu penso). Eis um tipo muito estranho de
personagem, aquele que quer pensar e que pensa por si mesmo, pela "luz natural".
O idiota é um personagem conceitual” (p. 83).
O “idiota” é o personagem do senso comum.
“A diferença entre os personagens conceituais e as figuras estéticas consiste
de início no seguinte: uns são potências de conceitos, os outros, potências de
afectos e de perceptos” (p, 87-88).
“A filosofia apresenta três elementos, cada um dos quais responde aos dois
outros, mas deve ser considerada em si mesma: o plano pré-filosófico que ela
deve traçar (imanência), o ou os personagens pró-filosóficos que ela deve
inventar e fazer viver (insistência), os conceitos filosóficos que ela deve criar
(consistência). Traçar, inventar, criar, esta é a trindade filosófica” (p. 101).

GEO-FILOSOFIA
A filosofia precisa, antes de tudo, de um território para se desenvolver. A pré-
filosofia, o plano de imanência puro, sem conceitos formados, se encontrou com a
geografia da Grécia, em um momento histórico no qual os ocidentais helênicos puderam
desenvolver a filosofia como os orientais não puderam. Da merma forma, a filosofia
moderna encontra na Inglaterra, França e Alemanha, em pleno desenvolvimento
capitalista, seu território de desenvolvimento. Para isso, a filosofia desses últimos
precisou de desterritorializar e se reterritorializar na Grécia de Sócrates e Platão.

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