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No ringue com Freud

Freud postulou uma série de coisas numa linguagem que parecia poética e que
facilitou o trabalho dos seus detratores. Então, ele falava, por exemplo, em
resto diurno. O resto diurno freudiano é aquilo que resta da vigília no sonho, ou
seja, aquilo que reverbera no sonho, cuja origem está na experiência da vigília.

Traços da vigília continuam a reverberar durante o sono e a gente pode medir


isso daí. Então essa afirmação freudiana é uma afirmação científica, testável e
corroborada. Uma outra coisa que Freud falou, é que traumas da infância
podem modificar o comportamento do adulto.

Então, por exemplo, pessoas que passaram por abuso na infância, podem ter
uma metilação da região promotora que permite a transcrição do gene que
codifica para o receptor grupo corticoide.

Significa que vai haver uma redução da expressão desse receptor que está
envolvido na resposta ao estresse. Então, essas pessoas se tornam
hiperestressaveis.

Ou seja, aquela pessoa que passou por um trauma, ela vai passar o resto da
vida mais sensível ao estresse e, portanto, voltando novamente a se
traumatizar multiplamente, ou seja, é totalmente biológico, isso que acontece
em função da experiência, quer dizer, a experiência gera modificação
comportamental de longo prazo.
Freud também postulou que o que faz o sonho é o desejo, a frase que ele usou
é que o desejo é o motor do sonho.

Hoje está bem demonstrado que pessoas que são desprovidas do sistema
dopaminérgico, ou seja, do sistema que permite desejar coisas boas e evitar
coisas negativas, quando as pessoas não têm esse sistema, elas não sonham,
então de fato deseja o motor do sonho.

Freud foi a pessoa que descreveu a repressão inconsciente de memórias e a


supressão consciente de memórias. Então, quando alguma coisa é muito
desagradável, consciente ou inconscientemente a gente pode colocar aquilo
por debaixo do tapete e a pessoa, de fato, acha que aquela memória não
existe.

No entanto, a memória está lá e na teoria psicanalítica essa memória oculta


pode gerar sintomas. Hoje em dia existe uma linha de pesquisa, vários
pesquisadores diferentes publicando em revistas do mais alto nível, mostrando
que existe, de fato, esse fenômeno.

Então, porções do córtex frontal se ativam e inibem a atividade do hipocampo e


amígdala, suprimindo essas memórias.

Isso é um programa de pesquisa, absolutamente central na ciência e ele é tão


inspirado em Freud que você vai nos artigos e no próprio resumo, a primeira
palavra que aparece é: “de acordo com aquilo que foi postulado por Freud”.

Portanto, Freud está voltando com a neurociência e eu acredito que nos


próximos anos ele vai voltar a ocupar o lugar que ele sempre deveria ter
ocupado, que é um lugar ao lado de Santiago Ramon Cajal, ao lado do
Sherrington, ao lado do Adrian, ao lado do Pavlov, dos grandes fundadores da
neurociência, no início do século 20.

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