Apresentação
É bastante comum, aos alunos que se iniciam nos estudos dos fluidos, serem
induzidos a acreditarem num comportamento que, de fato, nas condições
propostas, não ocorre na prática. Uma situação corriqueira é apresentar (via
livro ou professor) o 'desenho' de uma lata dotada de três orifícios laterais,
contendo água, com os jatos d'água apresentados como se ilustra na figura
(a).
O argumento apresentado para tal disposição dos jatos é que, como a pressão
aumenta com a profundidade, o jato proveniente do orifício inferior deve
percorrer uma distância horizontal maior que aquelas conseguidas pelos jatos
que saem pelos orifícios superiores.
Porém, se o 'experimento' for realmente realizado, verificaremos que o jato
proveniente do orifício médio é aquele que alcança a maior distância
horizontal, como se ilustra na figura (b).
Discussão
Nossa intenção aqui é explicar esse 'comportamento paradoxal' usando um
pouco de cinemática, a lei de Torricelli e um gráfico. Evidenciaremos,
também, que esse resultado 'inesperado' pode ser justificado analiticamente
usando um simples cálculo de derivada.
Se a lata for colocada sobre uma plataforma elevada, a uma altura suficiente
em relação à mesa, como mostramos na figura (e), o jato será conforme com
nossa intuição, a lei será satisfeita ... e tudo volta à normalidade da Física
Clássica. Agora o jato proveniente do orifício mais baixo terá o maior
alcance horizontal.
Exercício interessante
Propomos que se determine para que altura H da plataforma, o alcance
horizontal do jato proveniente do orifício mais baixo é igual à aquele do jato
proveniente do orifício do meio.
Concluo
Disso tudo decorre o mal-estar que sinto quando vejo a negligência das
escolas e professores com respeito ao uso dos laboratórios a seus alunos.
Prender-se ao desenho, ao giz, ao quadro negro e aos livros para o Ensino da
Física é encaminhar os alunos a uma situação de escuridão intelectual,
retirando deles a oportunidade de suas próprias descobertas, tornando-os
inaptos à concorrência e ao desenvolvimento em seus cursos superiores.
Complementando ...
O experimento "da lata furada" pode ser feito com uma simples garrafa PET
de 2 litros --- dê preferências ás garrafas cilíndricas.
Procedimento
Coloque uma fita crepe envolvendo a garrafa na região mais alta, onde ainda
é cilíndrica. Indiquemos por H a distância dessa fita crepe (sua borda
superior) até o fundo da garrafa. A contar da base da garrafa, faça nela 3
orifícios nas alturas H/4, H/2 e 3H/4. Esses orifícios têm diâmetro da ordem
dos 0,15 cm e não deverão estar na mesma vertical, de modo que os três
jorros d'água não se toquem (1,5 cm de distância entre as verticais que
passam por eles será o suficiente). O nível da água durante as
experimentações deverá ser mantido o mais constante possível, no nível H;
uma mangueira ligada a uma torneira deve ser prevista.
Uma alternativa mais prática, e a mais indicada para demonstrações a um
grande grupo de pessoas, é a seguinte:
Solução
(a) As velocidades com que abandonam seus planos inclinados, já que não
há quaisquer forças dissipadoras, podem ser calculadas pela conservação da
energia mecânica (referência solo). Todas as três bolinhas apresentam a
mesma quantidade de energia mecânica no nível de partida:
(b) Os tempos de queda, a contar dos instantes que deixam seus planos, na
horizontal, podem ser calculados como simples queda livres (pois as
velocidades iniciais verticais na partida são nulas!):
Repare que xA = xC < xB; o alcance horizontal da bolinha B é o maior das três.
(d) Os tempos totais são iguais para as três bolinhas uma vez que, partem
simultaneamente e caem de mesma altura em meio conservativo.