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Evangelho de João
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SEMINÁRIO ADVENTISTA LATINO AMERICANO DE TEOLOGIA


INSTITUTO ADVENTISTA DE ENSINO DO NORDESTE

EVANGELHO DE JOÃO
PROF. J. A. RODRIGUES ALVES

INTRODUÇÃO GERAL
AUTOR: O Evangelho de João é anônimo no sentido de que o autor deliberadamente evita
declinar seu próprio nome de forma direta. Segundo João 19:35, o autor fora testemunha ocular dos
atos que o Evangelho relata, e em João 21:24,25 identifica-se como o discípulo amado, que também
aparece em outras partes do Evangelho (João 13:23; 19:26, 27; 20:2-10). Quem é esse discípulo
amado?

Posição Tradicional: o autor é João, filho de Zebedeu.

O primeiro escritor extrabíblico que menciona o nome do autor deste Evangelho é Irineu (séc.
II). Ele diz que seu autor é João, o discípulo do Senhor; que este Evangelho foi publicado em Éfeso e
que João permaneceu na cidade até os tempos de Trajano (98-117 AD).

Papias (n. 70 AD) refere-se a João, o Presbítero, o que sugeriu a muitos eruditos a idéia de
que existiram duas pessoas com o nome de João. Tal declaração confundiu o quadro, contudo, Papias
não foi suficientemente claro para definir a questão.

No entanto, até o séc. 18 ninguém apresentou dúvida quanto à identidade de João, o filho de
Zebedeu, como o autor do quarto Evangelho. Desde então, a imaginação dos especialistas produziu
toda classe de soluções. Entre elas figuram a de B. W. Bacon, que sugere o apóstolo Paulo e J.N.
Sanders, que identifica o discípulo amado como Lázaro.

Os atuais estudos sobre este problema apresentam tendências bem definidas. León Morris,
Bruno de Solages, Werner de Boor e Jean Colson defendem a posição de que João, filho de Zebedeu, é
o autor do quarto Evangelho.

Estudos modernos que proporcionam um processo iniciado por João. Esta corrente não aceita
João como único autor do Evangelho. Aceita, contudo, que o Evangelho é produto de uma tradição
originada no testemunho ocular do discípulo amado que, quase seguramente, foi João, o filho de
Zebedeu. Os principais expoentes desta idéia são:

1. Raymond Brown: autor, João; escritor, um discípulo.


2. Hunter: João é a fonte da tradição, e um discípulo compôs o Evangelho.
3. Johnson: João, autor do documento-base.

Finalmente devemos mencionar, entre os estudos atuais sobre a autoria do quarto Evangelho,
uma corrente que propicia a existência de uma fonte anônima como base para o Evangelho de João.
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Evangelho de João
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DATA E LUGAR. A data do quarto Evangelho tem sido variadamente assinalada, desde 40
AD até 140 AD, ou ainda mais tarde. Contudo, o Evangelho não pode ter sido publicado após o ano
120 AD, pois já era conhecido no Egito na primeira parte do século II, segundo o atesta o papiro P 52
(Rylands), que contem fragmentos do Evangelho (João 18:31-33, 37, 38). A data mais provável situa-
se entre os anos 90 e 100 AD.
Quanto ao lugar, algumas sugestões são apresentadas:
1. Alexandria, devido a ampla circulação de João no Egito e pelo fato de que Alexandria doi o lar de
Filo e dos autores do Corpus Hermeticus que, segundo alguns autores, influenciaram o autor do
Evangelho.
2. Antioquia da Síria. A possibilidade de que Inácio de Antioquia dependeu de João. A similaridade
da teologia Inaciana com temas Joaninos é suficiente para levantar a questão se eles vêm da mesma
região. Há evidência de uma tradição entre os escritores Latinos de que Inácio foi um discípulo de
João.
3. Éfeso, na Ásia Menor, parece ser a melhor solução, recebendo o testemunho de Irineu (séc. II,
portanto mais próximo dos acontecimentos) de que foi nesta cidade que João publicou o seu
Evangelho - esta é a posição da IASD.

PROPÓSITO DO EVANGELHO.

Propósitos apologéticos e polêmicos. Sob esta classificação podemos enumerar pelo menos
três diferentes objetivos apresentados para o Evangelho:

1. escrito contra os discípulos de João Batista;


2. contra os cristãos heréticos;
3. contra os judeus.

Contudo, nenhum destes pode ser tomado independentemente como o único propósito, já que
no Evangelho há referências a todos eles.

Propósito Pastoral. Classificamos sob este título os propósitos que apontam para os fiéis
como o centro da preocupação de João ao escrever o seu Evangelho.

1. Assistência pastoral a uma elite. Posição defendida por Beda Rigaux, derivada do cap. 17 para todo
o Evangelho. Esta elite era formada pelos amigos ou apóstolos de Jesus.

2. Assistência pastoral à comunidade. Não se trata de um grupo especial de crentes, como pretendia
Rigaux, mas de toda comunidade. Segundo o objetivo pastoral, o Evangelho de João foi escrito
para atender aos crentes em suas crises de fé, sejam estas provocadas por excesso de simpatia pelo
sincretismo helênico ou por uma falta de relação pessoal de vida com Jesus.

3. Propósito Missionário.
a. Para converter todos os judeus.
b. Para converter os judeus da Dispersão.
c. Para converter Samaritanos.
d. Para converter os não cristãos em geral.

PROPÓSITO SEGUNDO JOÃO

João 20:31 - "Estes (sinais - v. 30), porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o
Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em Seu nome."
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Evangelho de João
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Propósito: Mostrar que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus. Isto não como informação
intelectual apenas, mas para provocar fé e, por esse meio, chegar a participar de uma nova vida nEle..

O exame do conteúdo revela vez após vez que Jesus é o Messias, o Cristo, o Filho de Deus.
Isto divide os homens: uns crêem e outros rejeitam ou permanecem incrédulos. É impossível ficar
indiferente quando Cristo aparece na vida da pessoa.

OBJETIVOS RELACIONADOS COM AS CIRCUNSTÂNCIAS

1. O perigo para a igreja de uma fé em desvanecimento por formalismo (hoje por causa do
secularismo. Não se pensa mais na verdade, mas se preocupam em adaptar as verdades à sua “fé”)
ou incredulidade.
2. O perigo de heresias, particularmente do gnosticismo que nega a realidade da encarnação e provoca
libertinagem.
3. O perigo da perseguição.

Isto leva o apóstolo a escrever, 30 ou mais anos após os sinóticos, um relato teológico
interpretado da pessoa de Jesus. Quer contra-atacar os perigos que ameaçam a igreja. (SDABC, 5:892)

DESTINATÁRIOS. Do exposto acima, depreendem-se os seguintes


possíveis destinatários:
. os discípulos de João Batista;
. os cristãos heréticos;
. os judeus em geral;
. uma elite de crentes;
. os cristãos em geral;
. os judeus da Dispersão;
. os samaritanos;
. os gentios.

PROBLEMA ESTRUTURAL. Vários planos têm sido propostos para o Evangelho, dentre os
quais destacamos os seguintes: um plano cronológico (não se consegue estabelecer uma cronologia) e
geográfico (basicamente na Judéia, expecificamente em Jerusalém, de acordo com João), um plano
dramático(pois culmina com Sua morte), um plano temático, um plano cíclico, um plano numérico,
um plano simbólico e uma coleção de episódios, além do plano litúrgico (Jesus desenvolvendo Seu
ministério de acordo com as festas) de D.Mollat, a exposição sacramental de Cullmann e a dupla
divisão de C.H.Dodd: a primeira parte apresenta uma seqüência de relatos mais discursos, e a segunda,
uma de discursos mais relatos.

O grande mérito de cada um dos planos está em sua virtude de aclarar alguns dos diversos
aspectos do Evangelho. Com as devidas precauções, cada um dos planos propostos pode contribuir
para elucidar a estrutura que João teve em mente ao escrever seu livro ou, pelo menos, expressa um
aspecto de seu conteúdo.

O Plano Básico. Uma coisa é certa: o Evangelho apresenta uma clara divisão em quatro
partes. Este plano básico é evidente e teria que ser aceito. Com diferentes títulos, aparece em R.
Brown, C.H. Dodd, R. Bultmann e outros. Suas divisões são as seguintes:

I. Prólogo: João 1:1-18.


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Evangelho de João
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II. Ação missionária pública: João 1:19-12:50.
III. Término da obra missionária na hora da glória:
João 13:1 - 20:31.
IV. Epílogo: 21:1-25.
(Cf. Mário Veloso, Comentário do Evangelho de João, pp. 1-26).

R. Brown divide da seguinte forma:


Cai na
prova
I. Prólogo: 1:1-18
II. Livro dos Sinais: 1:19 - 12:50
III. Livro da Glória: 13:1 - 20:31
IV. Epílogo: 21:1-25
C.H. Dodd denomina a terceira parte de Livro da Paixão.

ESBOÇO DO EVANGELHO
(Veloso, pp. 28,29)
A. Prólogo: João 1:1-18
1. A preexistência da Palavra: 1:1-5
2. O testemunho da Palavra: 1:6-8
3. A encarnação da Palavra: 1:15-18

B. A Ação Missionária Pública: João 1:19 - 12:50


1. Testemunhas em ação: 1:19-51
2. Começa a ação geradora de fé: 2:1-22
3. O encontro do homem com Deus: 2:23 - 3:36
4. A fé chega a samaritanos e incrédulos: 4:1-54
5. Restauração do homem à plenitude da vida: 5:1-47
6. Cristo, o Pão da Vida: 6:1-71
7. O conhecimento da doutrina: 7:1-52
8. A liberdade dos crentes: 7:53 - 8:59
9. A luz do mundo: 9:1-41
10. O bom pastor: 10:1-42
11. A ressurreição e a vida: 11:1-57
12. Últimos episódios do ministério público: 12:1-50

C. Consumação da Obra Missionária na Hora da Glória:


João 13:1 - 20:31
1. A santa ceia: 13:1-30
2. O retorno de Cristo ao Pai e a promessa de Sua volta:
13:31-14:31
3. A vida dos crentes no mundo: 15:1 - 16:33
4. A oração de despedida: 17:1-26
5. Paixão, morte e sepultamento: 18:1 - 19:42
6. A ressurreição: 20:1-31

D. Epílogo
1. Jesus aparece aos discípulos junto ao mar de Tiberíades:
21:1-14
2. Jesus interroga a Pedro: 21:15-19
3. Conclusão: 21:24-25
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Evangelho de João
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OBSERVAÇÕES GERAIS

O Evangelho de João é o mais invulgar e talvez o mais valioso dentre os quatro Evangelhos. Embora
apresente a mesma seqüência de acontecimentos que se encontra nos Sinóticos, é completamente
diferente na estrutura e no estilo. Uma leitura superficial comprova que é muito diferente dos outros
três. Omite muitas coisas que os demais incluem. O quarto Evangelho não menciona o nascimento de
Jesus, Seu batismo e Suas tentações; não nos diz nada sobre a última Ceia, o Getsêmani e a Ascensão.
Não diz uma só palavra sobre a cura de pessoas endemoninhadas. Apresenta poucos milagres (apenas
sete), dos quais cinco são exclusivos. E, talvez o mais surpreendente, não registra uma única Parábola,
histórias que formam uma parte de valor inapreciável nos outros três Evangelhos. Nos outros
Evangelhos Jesus fala, seja por Parábolas, ou em frases breves, memoráveis, epigramáticas, simples,
vívidas, que permanecem na memória. No quarto Evangelho, porém, os discursos de Jesus podem
ocupar todo um capítulo; podem ser pronunciamentos complicados, polêmicos, muito diferentes dos
ditos vívidos, expressivos, inolvidáveis dos outros três. Os discursos de Jesus neste Evangelho dizem
respeito principalmente a Sua Pessoa e não à doutrina ética do Reino. As entrevistas pessoais são
várias e a relação de Jesus com os indivíduos é mais acentuada do que o Seu contato geral com o
público (Nicodemos, a mulher samaritana, etc.). Este Evangelho é fortemente teológico e discute
particularmente a natureza da Sua Pessoa e o significado da fé nEle.

A estrutura do pensamento de João, à primeira vista, parece mover-se em um mundo diferente. Já não
se fala mais em termos desta "era" e da "vindoura". O discurso no Monte das Oliveiras, com sua
expectação escatológica do fim dos tempos e da vinda do Filho do Homem em glória para estabelecer
o Reino de Deus, é omitido. Esse dualismo temporal-escatológico parece ser substituído por um
diferente tipo de dualismo. Em lugar da tensão entre o presente e o futuro, encontra-se a tensão entre o
"acima" e o "abaixo", "céu" e "terra", a "esfera de Deus" e a "esfera do mundo". Este fato é mais
vividamente expresso na declaração: "Vocês são daqui, Eu sou de cima, vocês são deste mundo, Eu
não sou deste mundo" (João 8:23; ver também 3:12, 13, 31; 6:33, 62). Em João, "este mundo" quase
sempre permanece em contraste com o mundo de cima. "Este mundo" é visto como mal, tendo o diabo
como seu governante (16:11). Jesus veio para ser a luz deste mundo (11:9). A autoridade de Sua
missão não procede "deste mundo", mas do mundo de cima - de Deus (18:36). Quando a Sua missão
estiver cumprida, Ele deve partir "deste mundo" (13:1). Desta forma, não estamos sob o governo do
príncipe deste mundo (Satanás), mas sofremos sua influência.

O mesmo dualismo é óbvio na expressão que fala de Jesus descendo dos céus e ascendendo novamente
aos céus. "Ninguém subiu ao céu senão o que desceu do céu" (3:13). Jesus veio dos céus para cumprir
uma missão que Ele recebeu de Deus (6:38). Ele desceu dos céus como o "pão vivo". Quando Sua
missão estiver cumprida, Ele deve subir aos céus, de onde viera (6:62).

Outro elemento marcante no dualismo Joanino é o contraste entre luz e trevas. Um dos temas que
transparece nas primeiras palavras do Evangelho é o conflito entre a luz e as trevas. "A luz resplandece
nas trevas, e as trevas não prevaleceram contra ela" (1:5). O mundo é o reino das trevas, mas Deus é
luz (I João 1:5), e Jesus veio para trazer a luz para dentro das trevas (3:19; 12:46; 8:12). Esta é a única
fonte da verdadeira luz; todo homem que acha a luz, deve encontrá-la em Cristo (1:9). Esta luz ainda
está brilhando e a treva não foi capaz de extingui-la (1:5). A antítese de luz e trevas é um aspecto a
mais do dualismo Joanino do superior versus o inferior, céu versus o mundo, e parece substituir o
dualismo horizontal dos Sinóticos (contraste entre duas eras - a era presente e a vindoura) por um
vertical (dois mundos: o mundo superior - de cima - e o mundo inferior - de baixo).
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Evangelho de João
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Ainda mais surpreendente é a versão que o quarto Evangelho apresenta dos fatos da vida e do
ministério de Jesus, que freqüentemente é diferente da que aparece nos Sinóticos:

a. João apresenta uma versão distinta do começo do ministério de Jesus. Nos outros três Evangelhos
fica estabelecido que Jesus não fez Sua aparição como pregador até depois que João Batista estivesse
preso: "Depois que João foi encarcerado, Jesus veio a Galiléia pregando o evangelho do reino de
Deus" (Mc. 1:14; Lc. 3:18-20; Mt. 4:12). Em João, porém, há um período considerável durante o qual
o ministério de Jesus se sobrepõe às atividades do Batista (João 3:22-30; 4:1-2).

b. João apresenta uma versão diferente do cenário onde se desenvolveu o ministério de Jesus. Nos
outros três Evangelhos o cenário principal do ministério de Jesus é a Galiléia e não chega a Jerusalém
até a última semana de Sua vida. Em João o cenário principal do ministério de Jesus é Jerusalém e
Judéia, com algumas visitas esporádicas à Galiléia (João 2:1-12; 4:35-5:1; 6:1-7:14). Segundo João,
Jesus está em Jerusalém para uma Páscoa que se celebra ao mesmo tempo que a Purificação do templo
(João 2:13); está em Jerusalém durante uma festa à qual não identifica (João 5:1), está nesta cidade
para a festa dos Tabernáculos (7:2,10); está ali para a festa da Dedicação durante o inverno (10:22). De
fato, segundo o quarto Evangelho, depois desta festa Jesus não mais saiu de Jerusalém; depois do
capítulo 10 permanece todo o tempo em Jerusalém, o que significaria uma estada de vários meses,
desde o inverno da festa de Dedicação até a primavera da Páscoa durante a qual foi crucificado. Em
realidade, não há dúvida de que João está certo no que diz respeito a este ponto em particular. Os
outros Evangelhos nos mostram a Jesus chorando sobre Jerusalém quando se aproxima a última
semana: "Jerusalém! Jerusalém! que matas aos profetas, e apedrejas aos que te são enviados! Quantas
vezes quis ajuntar a teus filhos... e não quiseste!" (Mt. 23:37; Lc. 13:34). É evidente que Jesus não
poderia ter dito isto a menos que houvesse feito várias exortações à cidade. Era impossível que
dissesse isto em uma primeira visita à Cidade Santa. Neste caso, não há dúvida de que João está
correto.

c. João também apresenta uma versão diferente para a duração do ministério de Jesus. Os outros três
Evangelhos implicam que o ministério de Jesus durou somente um ano. Dentro do ministério só há
uma Páscoa. Em João há três Páscoas (o CBA, 5:183, identifica a festa mencionada em 5:1 como uma
Páscoa): uma durante a purificação do templo (2:13); uma próxima à alimentação dos 5 mil (6:4); e a
última Páscoa durante a qual Jesus foi crucificado. O livro dos Sinais (1:19 a 12:50), portanto, cobriria
um período de três anos e meio, enquanto o livro da Glória cobriria um período de três dias e meio,
incluindo o ministério aos discípulos (o lava-pés, discurso de despedida e oração sacerdotal - 13:1-17
-, a narrativa da paixão e morte - caps. 18 e 19 - e a ressurreição e aparição - caps. 20 e 21.

d. Às vezes João difere dos outros três Evangelhos nos fatos. Por exemplo, a purificação do templo
ocorre no início do ministério de Jesus (2:13-22), enquanto os outros Evangelhos a colocam no final
do ministério de Jesus (cf. Mt. 21:12-13; Mc. 11:15-17; Lc. 19:45-46) como um fato que precipita o
aprisionamento de Jesus. João o coloca no começo para afirmar desde o princípio que Jesus é o Novo
Templo que substitui o Antigo (Nova Aliança, etc.).

COMPARAÇÃO DOS QUATRO EVANGELHOS ( CBA, 5:182)

Mateus Marcos Lucas João


1. Extensão em pp. (RVR) ...... 36,5 23,0 39,0 27,5
2. Incidentes registrados:
quantidade total (sobre 179) 95 79 118 48
porcentagem do total 53% 44% 66% 27%
3. Seções exclusivas (das 179)
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Evangelho de João
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quantidade 14 1 43 31
porcentagem 8% 1% 24% 17%
4. Quantidade de parábolas (40) 21 6 26 0
5. Milagres (35) 20 18 20 8 (7)
Obs.: RVR = Reina Valéria Revisada - melhor versão em espanhol.

.João registra só 48 incidentes dos 179 possíveis, segundo a harmonia do CBA. Isto é 27% menos que
os outros.
.Destes 48, 31 são exclusivos. Não pretende repetir.
.Seu Evangelho teológico não enfatiza o incidente em si, senão seu significado (aparecem vários
discursos).
.Os discursos de Mateus tratam do reino dos céus e o caráter de seus cidadãos. Os de João, sobre a
natureza do encarnado Filho de Deus e o propósito de Sua missão terrena.
.Mateus registra sermões; Marcos oferece uma biografia; Lucas um relato histórico. João é um teólogo
que emprega diversas ferramentas com o objetivo final de estabelecer claramente a verdade de
Jesus Cristo, o encarnado Filho de Deus.

VOCABULÁRIO JOANINO

1. PISTEUEIN = CRÊR

Freqüência da Ocorrência

Sinóticos João I II III João Apoc. Total Joanino Total NT


34 98 9 - 107 241

É digno de nota que o substantivo para "fé" (PISTIS) nunca ocorre no Evangelho (somente uma vez
em I João e 4 vezes em Apocalipse); este é um exemplo da preferência Joanina por verbos e ação. No
restante do N.T. PISTIS ocorre 243 vezes, portanto, mais que o verbo.

Para João, ser um crente e ser um discípulo são realmente sinônimos, pois fé é o fator primário em se
tornar um Cristão. A freqüência de pas "todo", na construção é indicativo disto (cf. 3:15,16,18). A
preferência de João pelo verbo PISTEUEIN mostra que o evangelista não está pensando de fé como
uma disposição interna, mas como um comprometimento ativo.

A nuance particular do conceito Joanino de crer é visto na predileção pela preposição EIS após
PISTEUEIN ("crer em") [ 36 vezes em João; 3 em I João; 8 no N.T. ]. Com a exceção de I João 5:10,
PISTEUEIN EIS é usado nos escrito Joaninos para crença em uma pessoa. Há a mesma exigência para
crer em Jesus como há para crer em Deus (14:1). Um sinônimo freqüente é "vir a" Jesus (paralelismo
em 6:35, 7:37-38), e este sinônimo é outra prova da natureza dinâmica do conceito Joanino de crença.
Assim, PISTEUEIN EIS pode ser definido em termos de um ativo comprometimento a uma pessoa e,
em particular, a Jesus. Envolve muito mais que confiança em Jesus; é uma aceitação de Jesus e do que
Ele alega ser e uma dedicação da vida a Ele. O comprometimento não é emocional mas envolve uma
disposição para responder às exigências de Deus como elas são apresentadas em e por Jesus (I João
3:23). Isto é porque não há conflito em João entre a primazia de fé e a importância de boas obras. Ter
fé em Jesus a quem Deus enviou é a obra exigida por Deus (6:29), pois ter fé implica que alguém
permanecerá na palavra e mandamentos de Jesus (8:31; I João v. 10?).

Crer significa mais do que aceitar somente os fatos acerca de Jesus. Significa mais do que reconhecer
que Ele é todo-poderoso e cheio de amor. Crer em Jesus Cristo é confiar tão completamente no Seu
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Evangelho de João
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poder e amor que estejamos dispostos a renunciar a todas as outras possibilidades de apoio e lançar-nos
inteiramente sobre Ele. É entregar-nos completamente aos cuidados de Sua bondade. É depender
totalmente dEle e confiar plenamente em Sua Pessoa.

A crença inclui a aceitação de certos fatos; mas a fé ou a crença que é para salvação precisa ir além do
assentimento intelectual e abranger ativa e dependente confiança numa pessoa. Verdadeira crença não
é meramente intelectual. Ela é pessoal.

Os demônios crêem que Deus é real. Eles crêem no que Ele diz, mas não confiam nEle. Não se
apegam a Ele para que faça por eles o que não podem fazer por si mesmos. Demônios, anjos ou seres
humanos que não confiam na salvadora e completa suficiência do amor de Deus só tem que tremer.

A resposta da fé implica no compromisso do homem todo, através de toda sua vida, com a pessoa de
Cristo e Sua missão. Esta atitude de fé se expressa por meio do Evangelho com as palavras "ouvir" e
"ver". O ouvir que se origina na fé é um ouvir obediente. Os judeus estão incapacitados para ouvir a
Palavra de Jesus (8:43,47) porque não crêem nEle (8:45,46). Contudo, os que são da verdade ouvem a
Sua voz (18:37). A visão de fé é uma compreensão e uma aceitação da obra de Cristo. Somente o que
vê o Filho e crê nEle tem a vida eterna (6:40).

A verdadeira fé é a fé que conhece, porque a fé procede do ouvir (5:24); de um ouvir que aprende
(6:45) e de um ouvir que obedece (12:47). Esta fé não é adquirida pelo crente por sua própria ação. É a
obra de Deus (6:29). Na decisão de fé, o homem e Deus devem trabalhar juntos. Desta decisão de fé
surge uma nova relação com Deus, a relação de fé. Nela o homem é uma nova criatura (3:3-6).

Embora haja vários estágios no desenvolvimento da fé, em geral João usa PISTEUEIN EIS para a fé
verdadeira, salvífica. É digno de nota que no Evangelho a maioria dos usos de PISTEUEIN (74 de 98)
ocorre nos capítulos 1-12 ou Livro dos Sinais. Esta divisão da freqüência concorda com a tese de que
no Livro dos Sinais Jesus está apresentando aos homens a escolha de crer, enquanto no Livro da Glória
(12-20) Ele está falando àqueles que já crêem. A ênfase sobre a resposta dos discípulos no Livro da
Glória está em termos do amor que é a perfeição do comprometimento do crente.

Os impedimentos para crer:


a. amor a glória humana (5:44; 12:43)
b. escravos do pecado (8:30-34)
c. posição social, preconceito religioso - ser expulso da sinagoga (12:42)
Medo de ser expulsos da sinagoga, etc.

Os efeitos de crer:
a. feitos filhos de Deus (1:12)
b. vida eterna (3:16; 6:40; etc.)
c. fazer as obras de Jesus (14:12)
d. amar e obedecer (14:21)
e. não permanece nas trevas (12:46)

2. HORA = HORA

Embora a freqüência desta palavra em João (26 vezes) não seja extraordinária para um Evangelho, a
conotação especial dada a "hora" em João é digna de nota. Nos outros Evangelhos "HORA" quase
sempre refere-se à hora do dia, mas João freqüentemente usa a palavra para designar um período
particular e significativo na vida de Jesus. A "hora" no Evangelho de João é um termo técnico que se
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Evangelho de João
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refere ao período da paixão, morte, ressurreição e ascensão de Jesus. Jesus descreve esta hora como a
hora de Sua glorificação (12:23). Ele a descreve como a "hora" de passar deste mundo para o Pai. Isto
significa que a glorificação e ascensão estão ligadas com a morte de Cristo, e juntas constituem a
"hora" da qual fala o Evangelho de João. Pode-se determinar melhor o significado de "hora" dispondo-
se: (a) as passagens que dizem que ela não chegou ou ainda está vindo, e (b) as passagens que dizem
que ela chegou.

(a) 2:4 - "Ainda não é chegada a Minha hora" (Caná).

4:21 - "A hora vem, quando nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai" (à mulher
samaritana).

4:23 - "A hora vem, e já chegou, quando os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em
verdade" (idem).

5:25 - "Vem a hora, e já chegou, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus; e os que a
ouvirem, viverão".

5:28-29 - "Vem a hora em que todos os que se acham nos túmulos ouvirão a Sua voz e sairão..."

7:30 - Ninguém O prendeu "porque ainda não era chegada a Sua hora."

8:20 - Idem.

16:2 - "Vem a hora em que todo que vos matar julgará com isto tributar glória a Deus" (ver também
16:4).

16:25 - "Vem a hora quando não vos falarei por meio de comparações, mas vos falarei claramente a
respeito do Pai."

16:32 - "Eis que vem a hora e já é chegada, em que sereis dispersos

(b) 12:23 - "É chegada a hora de ser glorificado o Filho do homem."

12:27 - Jesus não pede ao Pai para salvá-LO desta hora, pois Ele tinha vindo para esta hora com um
propósito definido.

13:1 - A última ceia começa com Jesus sabendo que "era chegada a Sua hora de passar deste mundo
para o Pai."

17:1 - "Pai, é chegada a hora; glorifica a Teu Filho."

Os exemplos em que "hora" é usado com o artigo definido ou um adjetivo pronominal possessivo (a
hora, minha hora, sua [de Jesus] hora) claramente referem-se a um período especial na vida de Jesus,
um período mais bem definido em 13:1 - a hora do retorno para o Pai. Este retorno é cumprido na
paixão, morte e ressurreição. Em João 7:30 e 8:20 é declarado que esta hora incluiria a prisão e morte
de Jesus. A primeira vez que Jesus diz que a hora é chegada (12:23) é após Sua entrada triunfal em
Jerusalém. Neste momento o Sinédrio tinha já decidido matá-LO; Ele foi ungido para a morte (12:7); e
a vinda dos gentios indicou a Jesus que o divino plano da salvação estava operando (12:21). Desde que
esta salvação não pode realizar-se exceto através de Sua morte e ressurreição, Jesus sabe com certeza
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Evangelho de João
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que a hora está próxima. Que a hora também inclui a ressurreição e ascensão ao Pai é visto em 12:23 e
17:1, que colocam a glorificação como o alvo da hora.

As passagens que falam de uma "hora" parecem aplicar os efeitos da "hora" de Jesus (Paixão, morte,
ressurreição, ascensão, glorificação) aos que crêem Nele. Por exemplo, há quatro passagens que dizem
"a hora vem". Em 4:21 esta "hora" verá uma mudança no culto de Deus, em que Jerusalém e Gerizim
perderão o significado; em 5:28-29 a "hora" trará a ressurreição do corpo; em 16:2 envolverá
perseguição; em 16:25 trará um claro entendimento das palavras de Jesus. Evidentemente a referência
a esta "hora" que "vem" é ao período após a ressurreição quando a crença em Jesus tiver se espalhado.

Há três referências mais a "hora" que dizem tanto que ela "vem" como "já chegou". A combinação das
duas indicações temporais sugeririam um efeito antecipado da "hora" de Jesus sobre os discípulos. Em
4:23 esta hora que "vem e já chegou" resulta na adoração do Pai em espírito e em verdade; em 5:25
envolve o dom da vida eterna àqueles espiritualmente mortos. Embora o dom do Espírito não fosse
concedido até após a ressurreição (7:39; 20:22), a obra de Jesus durante Seu ministério já oferecera aos
que criam nEle uma antecipação dos dons celestiais. Assim, durante o ministério, os efeitos da "hora"
podem ser ditos tanto que "vem" como "já chegou". A terceira passagem encontra-se em João 16:32,
que se refere à dispersão dos discípulos, provavelmente pela morte de Jesus. Desde que esta Ceia é
parte da hora João pode propriamente dizer que a "hora é chegada". Entretanto, desde que o efeito
específico de ser disperso ocorrerá após a Ceia, num tempo posterior da "hora", João pode dizer que "a
hora vem".
3. SEMEIA = SINAIS

Quando comparamos a apresentação dos milagres de Jesus no quarto Evangelho com a apresentação
nos Evangelhos Sinóticos, há algumas diferenças óbvias. Algumas destas diferenças são relativamente
superficiais. Primeiro, há uma diferença no número, pois João narra bem menos milagres que os
Sinóticos (7). Por exemplo, cerca de 200 dos 425 versos de Marcos capítulos 1-10 lidam direta ou
indiretamente com milagres, uma estatística que significa que quase a metade da narrativa Marcana do
ministério público de Jesus diz respeito ao miraculoso. João descreve somente sete milagres
cuidadosamente selecionados para encorajar a fé do leitor (cf. 20:30-31). Segundo, há uma diferença
nas circunstâncias acompanhando os milagres. Na tradição Sinótica há muito mais atenção ao aspecto
maravilhoso dos milagres e o entusiasmo que eles produziram - as multidões ao redor de Jesus com
seus doentes e clamando por ajuda; a admiração à vista do milagre; os relatos excitados do que foi
feito, passando de cidade a cidade. Este vívido colorido dos milagres desaparece em João; aqui os
milagres são narrados com discrição (2:8-9), e descrições detalhadas do maravilhoso são evitadas.

Quando analisamos a questão da função dos milagres encontramos uma diferença maior entre os
Sinóticos e João. Nos Evangelhos Sinóticos, os milagres são primariamente atos de poder
(DYNAMEIS) acompanhando a chegada do reino de Deus. Os milagres operados por Jesus não são
simplesmente provas externas de Suas pretensões,, mas fundamentalmente são atos pelos quais Ele
estabelece o reino de Deus e derrota o reino de Satanás. Muitos dos milagres atacam a Satanás
diretamente pela expulsão de demônios. Muitos outros curam doenças que estão associadas com
pecado e mal. A ressurreição de mortos é um assalto sobre a morte, que é o reino peculiar de Satanás.
Mesmo os milagres naturais, como acalmar a tempestade, são um ataque sobre as desordens
introduzidas na natureza por Satanás.

No quarto Evangelho encontramos uma diferente ênfase na função dos milagres. A palavra "sinais" é
mencionada 17 vezes no Evangelho de João, estando quase todas elas nos capítulos 2 a 12 (2:11,18,23;
3:2; 4:48,54; 6:2,14,20,30; 7:31; 9:16; 10:41; 11:47; 12:18, 37; 20:30). João utiliza esta palavra para
designar os milagres realizados por Jesus, e estes milagres têm o propósito de revelá-LO aos homens
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Evangelho de João
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para que creiam nEle. João não fala do reino de Deus e, portanto, não apresenta os milagres como atos
de poder (DYNAMEIS) ajudando a estabelecer o reino. João interpreta o Filho agindo com o poder do
Pai ao realizar Seus milagres, e considera estes milagres parte integral do ministério ou "obra" de
Jesus. Que a ênfase é diferente, entretanto, é vista no fato de que João não faz uma conexão aparente
entre os milagres e a destruição do poder de Satanás. A completa ausência de exorcismos em João é
notável. João, naturalmente, fala de uma hostilidade entre Jesus e Satanás (14:30; 16:33). Conquanto a
transformação de água em vinho (cap. 2), a restauração da vista a um cego (cap. 9) ou a ressurreição
de um homem que estivera morto havia quatro dias (cap. 11) sejam atos extraordinários e
excepcionais, o que torna estes feitos significativos é o conteúdo espiritual que reside neles. Os sinais
apontam para além dos próprios feitos para a realidade em operação no ministério de Cristo. João
deseja que seus leitores reconheçam que na obra de Jesus havia muito mais que o olho podia ver ou o
ouvido ouvir.

Os sete milagres apresentados por João em seu Evangelho ilustram diferentes áreas do poder de Jesus e
testemunham de Sua divindade. Podem ser classificados como segue:

Título Passagem Área do Poder

Mudança da água em vinho 2:1-11 Qualidade


Cura do filho de um nobre 4:46-54 Espaço
Cura de um homem paralítico 5:1-9 Tempo
Alimentação dos cinco mil 6:1-14 Quantidade
Andando sobre as águas 6:16-21 Lei Natural
Cura do cego 9:1-12 Infortúnio
Ressurreição de Lázaro 11:1-46 Morte

Estes sete milagres deram-se precisamente nas áreas em que o homem é incapaz de efetuar qualquer
mudança de leis ou condições que afetem a sua vida. Nessas áreas Se provou Jesus poderoso onde o
homem é impotente; e as obras que Ele fez testificam a Sua sobrenatural capacidade.
As Várias Reações dos Homens aos Sinais

Os sinais em João são comparados por P. Riga às parábolas dos Evangelhos Sinóticos. Ambos, sinais e
parábolas, têm um elemento enigmático que divide a audiência. Há quatro estágios de reação ("a" e "b"
são insatisfatórios e "c" e "d" são satisfatórios).

a. A reação daqueles que se recusam a ver os sinais com qualquer fé, por exemplo, Caifás, que
aconselhou os fariseus a matarem a Jesus, embora eles admitissem que Jesus realizasse muitos
sinais (11:47). Esta é a reação das pessoas que se recusam a vir à luz (3:19-20); seria melhor para
elas serem fisicamente cegas (9:41; 15:22).

b. A reação daqueles que vêem os sinais como maravilhas e crêem em Jesus como um operador de
maravilhas enviado por Deus. Jesus regularmente Se recusa a aceitar um tipo de crença baseado
em sinais (2:23-25; 3:2-3; 4:45-48; 7:3-7); realmente, o Evangelho parece indicar que uma certa
aceitação de sinais não é crença real (7:5). O que é insatisfatório sobre esta aceitação de sinais?
Não é suficiente ser impressionado pelos milagres como maravilhas realizadas pelo poder de
Deus; eles devem também ser vistos como uma revelação de quem Jesus é, e Sua unidade com o
Pai.

c. A reação daqueles que vêem o verdadeiro significado dos sinais, e assim vêm a crer em Jesus e
conhecer quem Ele é e Sua relação com o Pai. Tal fé, que parece ser satisfatória, é a culminação
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Evangelho de João
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de várias das narrativas dos milagres de Jesus (4:53; 6:69; 9:38; 11:40). É este entendimento de
um sinal que capacita o crente a ver que Jesus é a manifestação da glória de Deus (2:11). Neste
sentido as obras que Jesus realiza dão testemunho dEle (v. 36), e Jesus pode desafiar os homens a
depositarem fé em Suas obras (10:38 - note que este verso não é simplesmente um desafio para
crer nos milagres como credenciais de Jesus, mas crer nas obras como manifestando a unidade do
Pai e o Filho). No milagre da ressurreição de Lázaro Jesus agradece ao Pai (11:41-42) por este
sinal que levará o povo a crer nEle como a ressurreição e a vida. Pode-se notar que há sub-
estágios dentro desta reação satisfatória aos sinais: os discípulos que creram em Caná (2:11) estão
ainda crescendo em fé em 6:60-71 e 14:5-12.

d. A reação daqueles que crêem em Jesus mesmo sem ver sinais. Isto é louvado por Jesus em 20:29.
Tais discípulos crêem com base na palavra daqueles que estiveram com Jesus (17:20), e Jesus os
abençoa e ora para que eles possam ver a Sua glória (17:24). Uma fé que não se baseava em sinais
tornou-se uma necessidade quando o período do ministério terrestre de Jesus findou.

Obs.: Talvez o evangelista não tenha dado ênfase aos milagres como os demais, para enfatizar que
estes não eram a principal obra do ministério de Jesus, e sim o testemunho.

Os milagres de Jesus produziam fé em Sua divindade. Proviam fortes evidências de que Ele era
exatamente o que afirmava ser. Para nós, porém, que talvez não tenhamos tanta necessidade de
convencer-nos de Sua divindade, os milagres de Cristo têm uma significação adicional. Eles nos dizem
que Jesus é Aquele que pode fazer por nós o que não podemos realizar por nós mesmos. Dizem-nos
que enquanto confiarmos no Seu extraordinário poder, nada é desesperador ou impossível. Dizem-nos
também que Jesus Se deleita em mostrar Seu amor por nós exercendo o Seu poder em nosso favor.

4. ZOE = VIDA (vida eterna)

Freqüência da ocorrência

Sinóticos João I II III João Apoc. Total João Total NT


16 36 13 17 66 135

Obviamente "vida" é uma palavra teológica Joanina favorita. O quarto Evangelho pode ser chamado o
Evangelho da vida, pois 20:31 enuncia o principal propósito pelo qual o Evangelho foi escrito: "para
que tenhais vida em Seu nome." Em particular, a expressão ZOE AIONIOS (vida eterna) ocorre 17
vezes em João e seis vezes em I João. (Aion, "era", "segmento de tempo", é o equivalente grego ao
hebraico olam, um período de tempo sem começo ou fim visível).

Mesmo sem o adjetivo aionios, zoe em João não se refere à vida natural. Antes, psyché é usado para a
vida que termina na morte (13:37, 15:13). Mas, obviamente, é a vida natural que deve ter
originalmente sugerido o uso de "vida" como um símbolo para um dom especial de Deus. A vida
natural é o maior bem entesourado pelo homem; "vida" é, portanto, um excelente símbolo para indicar
o mais precioso dos dons divinos. Desde que o homem pensa analogicamente de Deus, era apropriado
falar da "vida" de Deus sobre a analogia da vida do homem; e o maior ato de amizade de Deus para
com o homem foi descrito em termos de o homem receber uma parte na vida de Deus. A relação deste
simbolismo ao de se tornar filho de Deus é óbvio.

Para João, Cristo é a "vida" porque Ele concede a vida: "O pão de Deus é o que desce do céu e dá vida
ao mundo" (6:33); "As Minhas ovelhas... Me seguem, e Eu lhes dou vida eterna" (10:27 ss; cf. 17:2).
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Evangelho de João
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Cristo tem "palavras de vida eterna" (6:68) e através de Sua dádiva cria vida eterna: "Aquele que beber
da água que Eu lhe der, nunca mais terá sede, para sempre; pelo contrário, a água que Eu lhe der será
nele uma fonte a jorrar para a vida eterna" (4:14). "Vida" e "vida eterna" aparecem de forma clara
alternadamente, com o mesmo significado: "Quem crê no Filho tem a vida eterna; o que, todavia, se
mantem rebelde contra o Filho não verá a vida" (3:36); "Quem ouve a Minha palavra... tem a vida
eterna, não entra em juízo, mas passou da morte para a vida" (5:24; cf. 5:39-40; 6:63-68).
João diz freqüentemente que o que crê já AGORA possui vida eterna: "Quem come a Minha carne e
bebe o Meu sangue tem a vida eterna" (6:54); "O testemunho é este, que Deus nos deu a vida eterna" (I
João 5:11; cf. João 3:15 ss; 5:40; 6:40,47,53; 10:28).

Todo o Evangelho de João define o ministério de Cristo como a ação de trazer vida abundante, ou a
plenitude da vida, aos seres humanos (João 10:10). Isto torna-se evidente na freqüência da palavra
"vida", cuja presença é muito mais abundante nos doze primeiros capítulos (Livro dos Sinais) que
relatam a ação de Cristo entre os incrédulos. Nesta seção o termo "vida" é mencionado 32 vezes. Em
troca, no restante do Evangelho é mencionado apenas três vezes. A razão está no fato de que,
particularmente nos discursos de despedida (João 13-17), Jesus Se dirige "aos Seus". Eles já têm a vida
eterna.

O dom da vida eterna é, ao mesmo tempo, uma posse realizada e escatológica, precisamente por ser
uma permanência em Deus, desde o momento que passou a crer e por toda a eternidade. "Quem crê no
Filho tem a vida eterna" (3:36; 5:24; 8:12). O caráter escatológico da vida eterna aparece no fato de
estar relacionado com a ressurreição dos mortos (5:21,29; 11:25) e no contraste entre "este mundo" e o
"mundo vindouro" que João 12:25 apresenta com total clareza: "Quem ama a sua vida perdê-la-á e
quem neste mundo aborrece a sua vida preservá-la-á para a vida eterna." A vida eterna como uma
posse presente e como vida ressuscitada no último dia, são dois aspectos e estados da própria vida dada
pelo Pai por intermédio do Filho. Por conseguinte, pode-se dizer que a vida eterna é uma realidade
atual e um realidade do último dia.

E.G.White declara: "Cristo tornou-Se uma mesma carne conosco, a fim de nos podermos tornar um
espírito com Ele. É em virtude dessa união que havemos de ressurgir do sepulcro - não somente como
manifestação do poder de Cristo, mas porque, mediante a fé, Sua vida se tornou nossa. Os que vêem a
Cristo em Seu verdadeiro caráter, e O recebem no coração, têm vida eterna. É por meio do Espírito
que Cristo habita em nós; e o Espírito de Deus, recebido no coração pela fé, é o princípio da vida
eterna" (D.T.N., 370).

A vida eterna é mais que a realização futura de tudo o que o homem anela hoje. É a experiência
presente de comunhão com Deus. É o começo agora das realidades do céu que Jesus prepararia após
Sua ascensão.
5. EGO EIMI = EU SOU

O grego ego eimi pode ser simplesmente uma maneira comum de se falar. Entretanto, tem sido usado
de maneira solene e sacra no V.T., N.T., Gnosticismo e escritos religiosos pagãos gregos.

Gramaticalmente, podem-se distinguir três tipos de uso de ego eimi no Evangelho de João:
1. Uso absoluto sem nenhum predicado:

a. 8:24 - "Porque se não crerdes que EU SOU morrereis nos vossos pecados."

8:28 - "Quando levantardes o Filho do homem, então sabereis


que EU SOU".
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Evangelho de João
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8:58 - "Antes que Abraão existisse, EU SOU".

13:19 - "Digo-vos antes que aconteça, para que quando acontecer creiais
que EU SOU".

Há uma tendência natural para sentir que tais declarações são incompletas. Por exemplo, em
8:25 os judeus perguntam: "Quem és Tu?" Desde que este uso vai além de uma conversação
comum, reconhece-se que o absoluto EGO EIMI tem uma função revelatória especial em
João. Portanto, pode-se associar o uso Joanino com EGO EIMI empregado como um nome
divino do V.T. e Judaísmo rabínico.

2. O uso onde um predicado está subentendido:

a. 6:20 - Os discípulos no barco estão aterrorizados porque vêem alguém vindo em sua
direção, andando sobre as águas. Jesus lhes assegura: "EGO EIMI. Não temais." Aqui a
expressão pode significar simplesmente: "Sou eu, isto é, alguém a quem vocês
conhecem, e não um poder sobrenatural ou fantasma". Pode-se salientar, entretanto, que
as teofanias divinas no V.T. freqüentemente tinham esta fórmula: "Não temais; Eu sou o
Deus de vossos ancestrais".

b. 18:5 - Os soldados que vieram prender a Jesus disseram que buscavam a Jesus. A
resposta de Jesus foi: "EGO EIMI". Isto significa: "Eu sou Ele". Mas o fato de que
aqueles que O ouviram caíram ao solo sugere uma forma de teofania que deixa os
homens prostrados em temor diante de Deus. Mais uma vez parece que João está
empregando ego eimi com um duplo significado.

"Nenhum vestígio de Sua recente agonia se podia divisar ao adiantar-Se Jesus para enfrentar
o traidor. Achando-Se à frente dos discípulos, disse: 'A quem buscais?' Responderam: 'A
Jesus Nazareno'. Jesus disse: 'Sou Eu'. Ao serem proferidas estas palavras, o anjo que há
pouco estivera confortando a Jesus interpôs-se entre Ele e a multidão. Uma luz divina
iluminou o rosto do Salvador, e uma como que pomba pairou sobre Ele. Em presença dessa
divina glória, a turba assassina não pôde permanecer um momento. Cambalearam em recuo.
Sacerdotes, anciãos, soldados e o próprio Judas caíram como mortos por terra.
O anjo retirou-se, e dissipou-se a luz" (D.T.N., p. 666).

3. O uso com um predicado nominativo. Em sete exemplos Jesus fala de Si mesmo


figurativamente:

a. 6:35,51 - "Eu sou o pão da vida [pão vivo]."


b. 8:12 (9:5) - "Eu sou a luz do mundo."
c. 10:7,9 - "Eu sou a porta [das ovelhas]."
d. 10:11,14 - "Eu sou o bom pastor."
e. 11:25 - "Eu sou a ressurreição e a vida."
f. 14:6 - "Eu sou o caminho, a verdade e a vida."
g. 15:1,5 - "Eu sou a videira [verdadeira]."

Um contraste é sugerido pelo contexto do Evangelho. "Eu sou o pão" é encontrado no


contexto onde a multidão sugere que o maná dado por Moisés era o pão do céu (6:31). A
declaração na Festa dos Tabernáculos, "Eu sou a luz", provavelmente contrastava com o
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Evangelho de João
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festival de luzes que ardiam brilhantemente no pátio das mulheres no Templo. A dupla
afirmação, "Eu sou a porta" e "Eu sou o bom pastor" estava em contraste com os Fariseus
mencionados ao final do capítulo 9.

Em todos estes exemplos, Jesus deseja também enfatizar o predicado que diz algo sobre Sua função. O
predicado não é uma definição ou descrição essencial de Jesus em si; é mais uma descrição do que Ele
é em relação ao homem. Em Sua missão Jesus é a fonte de vida eterna para os homens ("videira",
"vida", "ressurreição"); Ele é o meio através do qual os homens podem encontrar vida ("caminho",
"porta"); Ele leva os homens à vida ("pastor"); Ele revela aos homens a verdade ("verdade") que
alimenta sua vida ("pão"). Assim, estes predicados não são títulos estáticos de autodoxologia mas uma
revelação do divino comprometimento envolvido no envio do Filho pelo Pai. Jesus é estas coisas para
os homens porque Ele e o Pai são um (10:30), e Ele possui o poder doador de vida do Pai (5:21).

Deve-se lembrar ainda que no quarto Evangelho os predicados são adaptações do simbolismo vétero-
testamentário (pão, luz, pastor, e vide são todos usados simbolicamente para descrever a relação de
Deus para com Israel).

Você necessita de um Deus que esteja sempre presente em sua vida? Luta com o desânimo, a decepção
ou a depressão? com o fracasso, o medo ou a frustração? com o pecado, a doença ou a tristeza? Para
todas as nossas prementes necessidades, para todas as nossas lutas, para todos os nossos fardos, Jesus é
o grande "EU SOU", o Deus que está conosco, o Deus eterno que Se interessou por nós antes mesmo
de sermos criados. Ele Se acha disposto a empregar todo o Seu ilimitado poder para realizar milagres
em nosso favor. Está disposto a lançar mão de todos os recursos do Céu e da Terra para solucionar os
nossos problemas e suprir as nossas necessidades.

COMENTÁRIOS GERAIS

Prólogo 1:1-18 - O principal tópico desta seção é a encarnação e a rejeição de Cristo por Seu povo. O
LOGOS é o grande tema através do prólogo.

Seis vezes LOGOS é explicitamente aplicado à pessoa de Jesus nos escritos joaninos: João 1:1 (3
vezes), 1:14, I João 1:1; Ap. 19:13. As passagens acima indicam que Jesus sempre foi, é e será o
LOGOS. A existência de Jesus como o LOGOS é dividida em três grandes fases:

a. antes da encarnação (João 1:1);


b. durante Sua vida terrestre (João 1:14; I João 1:1);
c. depois da ressurreição (Ap. 19:13).

A conclusão é que nunca houve um tempo em que Deus Se revelasse senão por Cristo (cf. João 1:18).

Embora no Quarto Evangelho o termo seja empregado apenas no prólogo, o conceito Joanino do
Logos se faz presente em todo o Evangelho. A encarnação, longe de furtar ao Filho de Deus a
condição de LOGOS, propicia-Lhe singular oportunidade para Se revelar como tal. Todavia, é no
prólogo que se encontra uma síntese desse conceito. Ali se observa a relação do LOGOS:
a. Com Deus - o LOGOS é Deus desde a eternidade, entretanto, é pessoalmente distinto de Deus, pois
mantem uma associação íntima e dinâmica com Ele.

b. Com o Universo - o LOGOS é a razão primária de todas as coisas, a causa eficiente da criação.

c. Com o ser humano - o LOGOS Se fez carne e habitou entre os homens para comunicar-lhes o
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Evangelho de João
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conhecimento salvífico de Deus. Em todos os aspectos, o LOGOS é Aquele que cumpre o desígnio
divino.

Preferência Joanina pelo Termo Logos

Três razões específicas podem ser sugeridas:

1. Razão Teológica - Neste termo João parece sintetizar o sentido de todos os outros títulos
cristológicos e sumariza sua própria cristologia. João traça o perfil histórico de Jesus de forma tal a não
deixar dúvida de que Ele reúne todos os atributos inerentes ao LOGOS, e Se constitui, por isso
mesmo, na mais perfeita e, ao mesmo tempo, na mais inteligível conceituação do termo. Em outras
palavras, todo o Evangelho de João é um brilhante comentário sobre o LOGOS divino; não apenas
uma narração de alguns episódios da vida terrena de Jesus, mas uma profunda exposição teológica da
natureza, da personalidade e do desempenho dAquele Ser.

2. Razão Apologética - Pode-se divisar um motivo secundário para a preferência Joanina do termo: a
defesa da fé. João desenvolve em seus escritos a correta concepção do LOGOS, a qual ele opõe a
certas distorções filosóficas muito difundidas em seus dias e em seu meio. A forma do Gnosticismo
sustentado por Cerinto, judeu-cristão do Egito e formado na escola filosófica de Alexandria. Estas
distorções se revestiram de uma aparência cristã e passaram a ameaçar a estabilidade da Igreja na Ásia
Menor, particularmente em Éfeso. João introduz e sintetiza sua cristologia com o emprego de LOGOS
evidentemente para chamar a atenção de seus leitores à doutrina autenticamente cristã do LOGOS e
adverti-los contra a heresia. Em suas epístolas ele é bem taxativo nestas advertências.

Substanciado provavelmente no conceito filônico (de Filo de Alexandria) do LOGOS, Cerinto


afirmava que seres intermediários, e não Deus, criaram o mundo. Cristo é um destes seres, mas Jesus
não, pois um deve ser considerado distinto do outro. Jesus, apesar de extraordinário, era um homem
comum, filho natural de Maria e José. Por ocasião do batismo Cristo se juntou a Jesus, mas o
abandonou pouco antes da cruz. A conclusão lógica é que o LOGOS nem é Deus com Deus, nem se
tornou homem com os homens.

Argumentando em favor do LOGOS da vida (I João 1:1) e desmascarando o erro, João ressalta a
encarnação sem olvidar uma referência à divindade de Jesus (cf. 2:22; 5:1; 4:2-3; II João 7; 5:6-9, 20).

Observe-se a insistência de João na fórmula JESUS CRISTO. Sete vezes ele a emprega em sua
primeira epístola, sem dúvida para realçar a unidade entre ambos. No Evangelho ela aparece em 1:17
e 17:3.

3. Razão Evangelística - João não somente recorre a um termo adequado para expressar sua cristologia
e para combater o engano, mas igualmente providencial para introduzir sua mensagem junto a
diferentes grupos sociais e culturais. Ele se vale de um termo amplamente conhecido no mundo grego
e não estranho aos judeus, mesmo os da Palestina, familiarizados com os conceitos divinos da
MENRA-DABAR. Assim ele usa um termo altamente significativo à sociedade de seu tempo e pode
dar uma forma mais popular à doutrina do verdadeiro LOGOS.

vv. 1 e 2 - A PALAVRA E DEUS (A NOVA CRIAÇÃO DE DEUS)

As palavras de abertura, "no princípio" são provavelmente uma conscienciosa


reminiscência das primeiras palavras da Bíblia. O primeiro livro da Bíblia Hebraica foi chamado "No
princípio" (por causa de suas palavras de abertura - BERESHIT) de maneira que a expressão seria
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Evangelho de João
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amplamente conhecida.

João está escrevendo sobre um novo princípio, ou começo, uma nova criação, assim ele usa palavras
que relembram a primeira criação. Acrescenta outras palavras que são usadas em Gênesis 1, como
"vida" (v. 4), "luz" (v. 4) e "trevas" (v. 5). Gênesis 1 descreve a primeira criação de Deus. O tema de
João é a nova criação de Deus.
Estamos diante de um novo Gênesis. O Gênesis de João vem antes que o de Moisés, porque não diz
"no princípio criou", mas "no princípio era". O ser vem antes da ação . Toda a ação relatada no novo
Gênesis tem seu fundamento na preexistência de Cristo. João declara: "No princípio era (en) o Verbo."
O sentido linear ou contínuo do imperfeito grego permitiria traduzir esta frase da seguinte maneira: "O
Verbo continuamente era."

"O Verbo estava com Deus" - A Palavra existiu desde o princípio na mais íntima relação possível com
o Pai. A Palavra e Deus não são idênticos. Mas Eles são um. O LOGOS está numa posição de
igualdade com Deus. Ele era Deus.

"E o Verbo era Deus" - João não está meramente dizendo que há alguma coisa divina sobre Jesus. Ele
está dizendo que Jesus é Deus. O texto não permite interpretar a palavra "Deus" como "um deus". A
frase não expressa a existência de dois seres divinos no sentido politeísta, nem a inferioridade de Jesus
com respeito a Deus, nem a existência de uma emanação de Deus, como ensinavam os gnósticos,
porque nesta frase e nas anteriores, o termo "Deus" é usado num sentido estritamente monoteísta no
qual Jesus e Deus têm o mesmo status.

v. 2 - Dois pontos repetidos do v. 1 -

a. A Palavra estava "no princípio" - eternidade realçada.


b. A Palavra estava "com Deus" - íntimo relacionamento entre o Pai e a Palavra. O Pai e a
Palavra não são o mesmo, mas permanecem juntos. O fato de que Um pode estar com o Outro
claramente Os diferencia. Mas, embora distintos, não há desarmonia. A expressão de João aponta para
a perfeita unidade em que estão ligados.

v. 3 - A ação criadora de Jesus - A totalidade do Universo veio à


existência "por meio dEle". "Por Ele" ou "por meio dEle" não significa que Jesus seja
somente o instrumento da criação. Significa que nenhuma coisa pode existir se Ele não a cria e
significa que nada pode se manter com vida se estiver separado dEle. Tanto o começo como a
continuidade da existência dependem de Jesus (Heb. 1:3). João expressa esta verdade de forma
negativa e a repete de forma positiva (1:3) para indicar a absoluta certeza de sua declaração: Positiva
Negativa
Todas as coisas Nada do que foi feito
Foram feitas Se fez
Por intermédio dEle Sem Ele

Como a primeira criação, a segunda não é realizada por algum ser subordinado, mas pelo LOGOS,
eterno Deus.

v. 4 - "A vida estava nEle" - Jesus é a vida e a fonte da vida.


Aqui há uma mudança da criação em geral para a criação da vida, o mais significativo
19

Evangelho de João
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elemento na criação. "Vida" é um dos conceitos característicos de João. Ele usa o termo 36 vezes,
enquanto nenhum outro escrito do N.T. usa o termo mais que 17 vezes (Apocalipse; Romanos - 14
vezes; I João 13 vezes).
"Vida" em João caracteristicamente refere-se à VIDA ETERNA, o dom de Deus através de Seu Filho.
É somente porque há vida em Jesus que há vida em qualquer outra coisa sobre a terra. Há
provavelmente um duplo significado aqui. A vida de que João escreve é a princípio a espécie de vida
que vemos através desta terra. Mas o texto também relembra que a vida espiritual é tão mais
significativa que João se refere a ela como "a vida". Este Evangelho constantemente associa vida com
o LOGOS. Ele veio para que os homens tivessem vida, e vida em abundância (10:10). Ele morreu para
que os homens pudessem ter vida eterna (3:16). Ele deu Sua carne pela vida do mundo (6:51).
Somente aqueles que comem Sua carne e bebem o Seu sangue tem vida (6:53ss) e, similarmente,
somente aqueles que vêm a Ele têm vida (5:40). Quando Ele dá vida os homens não perecem (10:28).
Ele diz que tem poder para dar a Sua vida e tornar a tomá-la (10:18), e isto Ele fez. Como Senhor da
vida Ele levantou Lázaro de entre os mortos (cap. 11). Duas vezes Ele disse que era "a vida" (11:25;
14:6).

"A VIDA ERA A LUZ DOS HOMENS" - "Pois em Ti está o manancial da vida; na Tua luz vemos a
luz" (Salmo 36:9). É esta espécie de coisa que está em mente. Mas o escritor está escrevendo sobre o
LOGOS, assim seu significado é que o LOGOS, em Si mesmo a vida, é também a "luz dos homens".

Da mesma maneira como João liga "vida" com Cristo, assim também liga a "luz". Cristo é "a luz do
mundo" (8:12; 9:5). Ele vem como "uma luz no mundo" (12:46). Realmente, aquele que O segue "não
andará nas trevas, mas terá a luz da vida" (8:12). Os homens podem ser exortados a crer na luz
(12:36), assim como são exortados a crer nEle. E assim como Ele, que é A VIDA, deu vida a Lázaro,
assim Ele, que é A LUZ DO MUNDO, deu visão ao cego de nascença (cap. 8). Em Gênesis 1:3, a
primeira coisa que Deus diz é "HAJA LUZ". Similarmente, neste capítulo, o LOGOS é a fonte da luz.

v. 5 - "A luz resplandece nas trevas, e as trevas não prevaleceram contra ela." A antítese é a mesma,
quer pensemos no mundo físico ou mundo espiritual. É a função da luz brilhar precisamente nas
trevas, opor-se às trevas, dispersar as trevas. A oposição de luz e trevas é um tema proeminente neste
Evangelho.

Note que João muda o tempo verbal. Até aqui ele tem usado o passado exclusivamente. Mas a luz
BRILHA. A luz está continuamente em ação. A luz do mundo, a luz dos homens, nunca cessa de
brilhar.

O tema do perpétuo conflito entre a LUZ e as TREVAS é encontrado no Evangelho. Os homens são
condenados porque amaram mais as trevas do que a luz (3:19). Jesus convida os homens para segui-
LO de modo a não andar nas trevas (8:12). Eles devem andar enquanto têm a luz, antes que as trevas
os envolvam (12:35). Ele veio como uma luz no mundo para que aquele que nEle crê não permaneça
nas trevas (12:46). Toda a missão de Cristo foi um conflito entre a luz e as trevas. Cristo veio para
iluminar a todos os homens (v.9), mas as trevas ainda permanecem. Depende do homem o andar na luz
ou nas trevas.

1:6-8 - O LOGOS E JOÃO BATISTA

Parece que João introduz o Batista no prólogo para demonstrar quem era realmente o Batista
em sua relação com o LOGOS, evitando assim uma identificação equivocada. Contudo, embora João
Batista seja apresentado como estando subordinado a Cristo, é salientada a sua importância como um
"enviado" de Deus, divinamente comissionado para "testemunhar" de Jesus.
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Evangelho de João
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Contraste entre Cristo e João Batista

CRISTO JOÃO
a. Era (en) desde a eternidade . Veio (egeneto)
b. é o LOGOS . é um homem (antropos)
c. é DEUS . é comissionado por Deus
d. é a verdadeira LUZ . veio para testemunhar da luz
e. é objeto de confiança . é o agente por cujo testemunho os homens vêm
a crer em Jesus.
João, a testemunha - Nesta seção podemos distinguir quatro idéias bem definidas a respeito da
testemunha: recebe uma ordem, tem uma experiência, realiza uma atividade e possui um objetivo.

A Ordem que a Testemunha Recebe - João introduz o tema da testemunha com esta frase: "Houve um
homem enviado (apestalmenos) por Deus" (1:6). No envio de João está a ordem que ele recebeu de
Deus. O tema do envio no Evangelho de João é central. Duas palavras diferentes, com variados
matizes, são empregadas no original, com uma mesma tradução em português:
. Pempein - refere-se à origem do envio (da missão)
. Apostellein - refere-se ao cumprimento da missão anteriormente decidida e tem que ver
exclusivamente com o cumprimento das ordens originadas nestas decisões.

O envio de João expressa-se com a palavra que se refere à execução e que contém as ordens do envio
(apostellein). A atitude correta que João deve tomar, então, é cumprir a ordem de Deus. É exatamente
o que João realiza. Isto é claramente expresso nas palavras: "Este veio para" (v. 7). Esta obediência é
produto de uma íntima relação pessoal de João Batista com Deus, e isto nos leva ao aspecto seguinte.

A Experiência Espiritual da Testemunha - João veio enviado de (para) Deus. Isto significa que veio de
uma íntima relação com Deus. Tão íntima era esta relação que Deus falou com ele (João 1:33). João
recebeu as ordens de sua missão diretamente de Deus.
A Atividade da Testemunha - João veio como "testemunha" para que "testificasse" (1:7). Um encontro
verdadeiro do homem com Deus transforma-o numa testemunha.

O Objetivo do Testemunho - Este objetivo encontra-se na frase, "a fim de todos virem a crer por
intermédio dele" (1:7). O testemunho e a fé estão intimamente relacionados e, em grande medida, esta
depende daquele. O testemunho é a afirmação daquele que tem estado em íntima comunhão com Deus,
na qual expressa o significado dessa experiência e o conteúdo da revelação que ele tem recebido da
parte de Deus. A testemunha apresenta esta afirmação a alguém que não tem tido a oportunidade de
experimentar tal relacionamento com Deus e que desconhece o conteúdo da revelação.

Ao enunciar o propósito do testemunho é registrado pela primeira vez no Evangelho de João o verbo
"crer". Este verbo aparece através de todo este Evangelho como a resposta correta do homem à
revelação de Deus. O fato de que João Batista devia conduzir à fé "todos" os homens, indica que o
evangelista tem em mente todos os crentes que, pelo fato de crerem, estão comprometidos a dar
testemunho para que todos tenham a oportunidade de crer em Cristo.

Esta ênfase ao testemunho no Evangelho de João não deve ser passada por alto. Há um aspecto legal
em relação com ele. O testemunho é uma coisa séria, e ele é necessário para confirmar a veracidade de
uma questão... O testemunho estabelece a verdade. Mas testemunhar faz mais do que confirmar a
verdade. Compromete a pessoa. Se eu me coloco no banco das testemunhas e testifico que isto e aquilo
é a verdade sobre a questão, eu não sou mais neutro. Eu me comprometi.
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Evangelho de João
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Uma evidência da maneira como testemunhar envolve comprometimento é que a palavra


"testemunho", no NT, é traduzida do vocábulo grego de que obtivemos a palavra "mártir". O supremo
testemunho é dar a vida pela causa em que se está empenhado.

João usa 47 vezes em seu Evangelho a palavra grega que geralmente é traduzida por "testemunho" -
muito mais do que qualquer outro escritor do NT; 14 vezes o substantivo e 33 vezes o verbo.

"Como testemunhas de Cristo, cumpre-nos dizer o que sabemos, o que nós temos visto e ouvido e
sentido. Se estivemos a seguir a Jesus passo a passo, havemos de ter qualquer coisa bem positiva para
contar acerca da maneira por que nos tem conduzido. Podemos dizer como Lhe temos provado as
promessas e as achado fiéis. Podemos dar testemunho do que temos conhecido da graça de Cristo. É
esse o testemunho que nosso Senhor pede de nós, e por falta do qual está o mundo a perecer" (DTN, p.
323).

"Há uma eloqüência mais poderosa do que a eloqüência de meras palavras na tranqüila e coerente vida
do puro e verdadeiro Cristão. O que o homem é tem mais influência do que o que ele diz" (A Ciência
do Bom Viver, p. 469).

1:9-14 - O LOGOS ENCARNADO (Um Novo Nascimento)

Dois pontos enfatizados:


a. O LOGOS, verdadeiro Deus, tomou sobre Si a natureza humana.
b. Mais impressionante ainda, o LOGOS encarnado foi
rejeitado pelos homens.
Ilustr.: Imagine-se metendo a mão num vaso sanitário para limpá-lo sem utilizar-se de luvas e nada,
sob obrigação de um sargento. Deus fez pior que isto ao se encarnar.

João não quer que nos esqueçamos nem as boas novas da encarnação de Deus, nem a tragédia da
rejeição de Deus por parte do homem.

v. 10 - Três coisas são ditas:

a. A LUZ (ou o LOGOS) estava "no mundo". O verbo leva a


idéia de continuidade. Não era uma visita rápida, mas estava lá continuamente.
b. O mundo deve sua própria existência ao LOGOS.
c. A rejeição do LOGOS pelo mundo. O LOGOS continuamente estava no mundo, o
mundo que Ele fez. Ainda assim o mundo não O conheceu.
Notar a sutil mudança no significado da palavra "mundo". Nas duas primeiras ocasiões ela se refere à
terra com tudo o que está nela, incluindo o homem. Mas nesta terceira ocasião ela significa homens em
geral, e mais particularmente os homens que entraram em contato com Jesus de Nazaré.

"Não O conheceu" - Mais que conhecimento intelectual está em mente.


Há também o sentido de falhar em conhecê-LO intimamente, conhecer e
amar como um amigo, estar em correta relação. O tempo é o aoristo, que
talvez indique uma ação única. O mundo perdeu sua grande oportunidade.
Não conheceu o LOGOS quando o LOGOS estava em seu próprio meio.
O mundo não O conheceu. É esta uma reação característica do mundo.
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Evangelho de João
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v. 11 - Com vívidos toques João focaliza a tragédia da rejeição.

As palavras de abertura podem ser traduzidas "Ele veio ao lar". Quando o LOGOS veio a
este mundo, não veio como um estranho. Ele veio ao lar. Ele veio a Israel. Se Ele tivesse vindo a outra
nação... Mas Israel era o povo peculiar de Deus. O LOGOS não foi onde não era conhecido. Ele veio
ao lar, onde o povo deveria tê-LO conhecido.

Não se trata de conhecer uma doutrina acerca da divindade. Trata-se de conhecer que Jesus é o
Criador, vindo para salvar, para dar vida. Não se trata de uma atitude intelectual passiva; trata-se de
uma posição diante da Pessoa de Jesus. Há três posições possíveis:
a. O agnóstico, que nega que o homem possa chegar ao conhecimento
da verdade.
b. O incrédulo segundo João.
c. O crente segundo João.

E foi Sua família, "o que era Seu", que "não O recebeu". Esta designação coloca os rejeitadores numa
relação especial com o Rejeitado. Eles deveriam tê-LO conhecido melhor. Desta vez João não diz que
eles não O conheceram, mas que eles não O "receberam". O verbo pode ser usado no sentido de se
tornar um íntimo companheiro de alguém. É usado desta maneira quando José tomou Maria como sua
esposa (Mt. 1:20,24), e de Cristo tomando os crentes para Si no céu (João 14:3). Esta era a espécie de
boas-vindas que Seu próprio povo deveria ter-Lhe dado quando Ele veio ao lar. Mas eles "não O
receberam". O tempo no aoristo, como no verso anterior, aponta para o decisivo ato de rejeição.
Chama nossa atenção sobre a crise antes que o contínuo resultado.

"Os Seus" - Nos capítulos 1 a 12 referência aos judeus; nos caps.


13 a 17 referência aos discípulos, justamente aqueles
que O receberam (1:12), os quais serão recebidos por
Ele em Seu lar (14:3).

v. 12 - João não deseja deixar a impressão (que poderíamos inferir do verso 11) que ninguém
respondeu ao LOGOS. A massa do povo não respondeu, mas alguns o fizeram. João agora volta a sua
atenção para eles. A eles o LOGOS dá o "poder" (eksousian) de se tornarem "filhos" (tekna) de Deus.
Há três importantes palavras aqui:

a. "deu" - O fim da história não é a tragédia da rejeição, mas a graça da aceitação. Este verbo
define o caráter de Deus.
b. "poder" - ou status - e não somente status, mas mudança de status: filhos da ira para "filhos de
Deus". "Eksousian significa "autoridade" e não poder inerente. O sentido aqui é
"direito", "garantia", "autorização" de ser filho de Deus. Outorgado pelo próprio
Deus.

c. "filhos" - Enquanto o N.T. vê a Deus como Pai de todos os homens, paradoxalmente não pensa de
todos os homens como filhos de Deus. A atitude de Deus para todos os homens
é como a de um Pai. Todos são Seus filhos no sentido de que Ele os fez. MAS
OS HOMENS SÃO SEUS FILHOS NO PLENO SENTIDO SOMENTE
QUANDO RESPONDEM AO QUE ELE FEZ POR ELES EM CRISTO.
Quando os homens recebem o LOGOS então nascem de novo (cap. 3) na
família celestial. É somente nesta maneira que eles são realmente "filhos" de
Deus.
23

Evangelho de João
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Os "filhos", portanto, são aqueles que crêem. No início do verso João fala de "recebê-LO", agora de
"crer em Seu nome". Estas são diferentes maneiras de referir-se à mesma mudança espiritual, onde o
homem deixa de confiar em seus próprios méritos e realizações e põe sua confiança inteiramente em
Cristo.

"Filhos" --------------Tekna --- e não ------------Huios


| |
João Paulo
| |
Ponto de vista da geração Ponto de vista da
divina, pela comunicação adoção divina (lei romana como
da vida de Deus. pela aceitação de Deus).
Em João "Huios" é reservado para Jesus.

"Em Seu Nome" - "Nome" significa muito mais para os povos da antiguidade que
para nós. Para nós é um mero apelativo, uma maneira de distinguir uma pessoa de outra. O nome é um
assunto sem muita importância, indiferente. Mas não era assim no mundo antigo. Quando, por
exemplo, o Salmista fala de "amar o nome de Deus" (Salmo 5:11), ou quando ele orou, "o nome do
Deus de Jacó..." (20:1), não tinha em mente simplesmente a pronúncia do nome. Ele estava pensando
em tudo o que "Deus" significa. O nome, de alguma maneira, expressa a pessoa como um todo. Crer
"no nome" do LOGOS, então, significa confiar na Pessoa do LOGOS. É crer Nele como Ele é. É crer
que Deus é o Deus que vemos revelado no LOGOS e colocar nossa confiança neste Deus. Isto é mais
que simples crença. Não apenas crer que o que Ele diz é verdadeiro (sabemos que é verdadeiro) mas
confiar nEle como uma Pessoa.

A Origem dos Filhos de Deus - é descrita três vezes negativamente e uma vez positivamente.

a. Não são do sangue, isto é, nascimento físico.


b. nem da vontade da carne (talvez o desejo sexual).
c. nem da vontade do homem - nenhum homem, por maior que seja, pode realizar o nascimento de
que fala João.
d. Fortalecendo ainda mais sua idéia, João afirma a maneira pela qual os homens nascem na
família celestial. O novo nascimento é sempre um completo milagre. Toda iniciativa humana é
fracassada.
Os homens são nascidos "de Deus". Não podem nascer de outra maneira.

v. 14 - A ENCARNAÇÃO DO LOGOS
A glória do LOGOS na encarnação é o tema em 1:14-18. A encarnação - e a realização de
seu propósito, a crucifixão - é o clímax da condescendente graça de Deus. Isto é claro do contexto;
note os vv. 10 e 11: "estava no mundo... mas o mundo não O conheceu. Veio para o que era Seu, mas
os Seus não O receberam". E ainda assim, no meio deste mundo ingrato, Ele manifestou Seu supremo
amor. Desde as infinitas delícias eternas, da própria presença do Pai, o LOGOS Se dispôs a descer a
este reino de miséria, "Velado na carne, foi vista a Deidade".

Kai ho logos sarks egéneto - "o Verbo Se fez carne". Quando "o Verbo Se fez carne, e habitou entre
nós", o Céu desceu à Terra. Chegamos à frase que apresenta o principal propósito de ter sido escrito o
Evangelho de João. Ele falou sobre o LOGOS - uma expressão familiar tanto a judeus como a gregos.
E agora ele diz a coisa mais surpreendente que poderia haver declarado: Este LOGOS, que criou o
mundo, tornou-Se um ser humano, e nós O vimos com os nossos próprios olhos.
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Evangelho de João
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Não Se fez carne no sentido de cessar de ser o que era antes. A Segunda Pessoa da Trindade assumiu a
humanidade sem colocar de lado a natureza divina. "Encarnação" é uma palavra de origem Latina que
significa "tornar-se em carne". A encarnação - a corporificação do próprio Deus em carne humana - é
absolutamente singular e profundamente misteriosa. No entanto, o fato de que ela é um mistério não
deve dissuadir-nos de examiná-la.

"Quando quisermos estudar um problema profundo, concentremos o pensamento na coisa mais


maravilhosa que já ocorreu na Terra ou no Céu - a encarnação do Filho de Deus" (E.G.White.
SDABC, 7:904).

Tal estudo será fascinante e muito compensador se o empreendermos com espírito dócil, humilde e
reverente. "Quando tratamos do assunto da divindade de Cristo revestida da humanidade, podemos
atender apropriadamente às palavras proferidas por Cristo a Moisés junto à sarça ardente: 'Tira as
sandálias dos pés, porque o lugar em que estás é terra santa.' Precisamos efetuar o estudo deste assunto
com a humildade de um discípulo e com o coração contrito. E o estudo da encarnação de Cristo é um
campo fecundo, e retribuirá o pesquisador que cava fundo em busca da verdade oculta" (E.G.White
Comments, SDABC, 7:904-905).
Por mais importante que seja compreender tudo que pudermos sobre a natureza da encarnação - sobre
a misteriosa união do divino com o humano - é muito mais essencial que compreendamos o seu
propósito. Jesus veio salvar-nos da penalidade do pecado. Veio livrar-nos do poder do pecado. Veio
revelar como o Pai realmente é.

Kai eskeneosen en hemin - "e habitou entre nós" - A Palavra, ao encarnar-se, entrou na esfera humana.
A revelação divina fez-se presente na carne, num encontro absoluto da divindade com a humanidade.
Esse encontro produziu-se em Cristo Jesus, que tomou completamente a natureza humana e deste
modo "habitou entre nós".

Por causa da figura de habitar numa tenda referida neste texto (verbo skenoo), supõe-se que o verbo
habitar expressa uma breve estada de Jesus. Entretanto, em todas as passagens onde é mencionado este
mesmo verbo, não está presente a idéia de habitação temporária. Todas elas são mencionadas em
Apocalipse e falam da Nova Jerusalém onde Deus morará com Seu povo para sempre (Ap. 21:3; cp.
7:15; 12:12; 13:6).
Esta afirmação volta ao tempo do tabernáculo nas caminhadas de Israel pelo deserto. O tabernáculo foi
erigido por ordem de Deus, a fim de que fosse a Sua morada com o Seu povo (Êxo. 25:8). Fica
implícito que, assim como naquele tempo Deus manifestou Sua presença entre Seu povo, na tenda que
Moisés levantou, agora Ele fixou residência na terra em um sentido mais pleno, na Palavra que Se fez
carne. Este encontro da Palavra divina com a humanidade é permanente. Começou na encarnação e
prolongar-se-á pela eternidade na Nova Terra.
E ainda mais. Entre os judeus de fala grega, o substantivo skene e suas palavras cognatas, como o
verbo skenoo, que é usado nesta frase, comumente eram associados ao verbo hebraico shakan
("morar") e seus derivados, como o mishkan ("tabernáculo") da Bíblia e a shekinah pós-bíblica - uma
palavra que significa literalmente "residência", porém era usada mais especificamente para a gloriosa
presença de Deus que residia no tabernáculo de Moisés e no templo de Salomão.

Kai etheasametha ten doxan autou - "Vimos a Sua glória" - Isto somente foi possível graças a Sua
encarnação. O verbo "ver" nunca é usado no N.T. para uma visão espiritual. Todas as vezes que
aparece refere-se a ver com os olhos do corpo (João 1:32, 38; 4:35; 6:5; 11:45; I João 1:1,2; 4:12, 14)
(Veloso, p.43).
Vários verbos para ver:
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Evangelho de João
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a. Theomai - 7 vezes - Sentido principal: contemplar, como num teatro, olhar e ver alguma coisa
dramática, não alheiamente, mas como participando dela (1:14; 4:35).
Sentido secundário: visão física.

b. Horao - 58 vezes - Sentido principal: visão acompanhada de real entendimento = perceber (ver com
profundidade) - em geral, conduz a fé genuína.
Sentido secundário: simplesmente ver, testemunhar um fato ocorrido (4:45), visão física
(1:39; 5:6).

c. Blepo - 17 vezes - Sentido principal: visão física, ocular (que toma um momento), muito usado no
cap. 9 sobre a cura do cego.
Sentido secundário: visão espiritual (9:39); visão transcendente (5:19).

d. Theoreo - 24 vezes - Sentido principal: olhar com concentração, atentamente, que toma tempo;
leva a algum entendimento, mas não profundo. É um meio termo entre horao e blepo. Leva a um
pequeno grau de fé, como aquela fundamentada num milagre, portanto equivale mais ao mero
entusiasmo (2:23; 4:19; 6:2). Não é o tipo de fé que Jesus espera.
Sentido secundário: ver com profundidade (6:40). Contemplação da glória de Jesus (17:24).
Visão simplesmente física (20:12,14).

O sentido principal de cada verbo é apenas sugestivo (Phillips & Abbott. Johannine Vocabulary). Não
é fundamentado no maior número de referências. Apenas uma diferenciação de sentido é objetivada,
sentido este que deve ser observado pelo contexto.

"Glória" - glória e caráter = mesma coisa.


Ver a glória de Cristo é ver o caráter do Pai.

"Pelo sofrimento e perseguição, a glória - o caráter - de Deus será manifestada em Seus


escolhidos" (O Maior Discurso de Cristo, p. 31).

"Implantando-lhes no coração os princípios de Sua Palavra, o Espírito Santo desenvolve nos


homens os predicados de Deus. A luz de Sua glória - Seu caráter - deve refletir-se em Seus seguidores"
(Parábolas de Jesus, p. 414).

"Unigênito" = monogenes - único de sua espécie, não único gerado.

E o Verbo Se fez carne e habitou entre nós e vimos a Sua glória.


| | en hemin | | Ato Divino Ato Divino Reação
Humana Shekinah
No VT, o santuário (ou o povo) - instrumento da habitação divina.
Em João - o corpo humano de Jesus.

v. 17 - "Porque a lei foi dada por intermédio de Moisés; a graça e a verdade vieram por meio de
Cristo".
Não há contraposição entre a lei e a graça. A única diferença está nos verbos - "dada" X "vieram a
existir" (egéneto). A graça e a verdade têm origem em Cristo.

v. 18 - Jesus faz a "exegese" do Pai, mostra Quem o Pai verdadeiramente é. Para conhecer a Deus é
necessário conhecer a Jesus. "Quem Me vê a Mim, vê o Pai".
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Evangelho de João
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O Testemunho de João Batista: Concernente a seu Papel.

v. 19 - "Este foi o testemunho" - nos versos 6-7 é dito que João Batista foi enviado para testificar da
luz, e agora aqui está o seu testemunho. Espera-se um testemunho acerca de Jesus, mas este vem
somente no dia seguinte. O primeiro registro do seu testemunho é sua resposta a uma delegação
enviada pelo sistema religioso de Jerusalém.

"Judeus" - Originalmente os descendentes de Judá. Depois Judá é igual a Judá e Benjamin. Reino de
Judá = reino do sul. Após o cativeiro corporificam a Israel.

No Evangelho de João o termo é usado com sentido neutro (2:6); positivo (4:22; 19:40, 42) e, na
maior parte das vezes, como hostis a Jesus.

Os "judeus" são tomados pelos líderes que são hostis a Jesus (cf. 9:22 - os pais do cego são judeus, mas
temem os "judeus"). Nesta passagem, "judeus" representa o Sinédrio. "Judeus" é um termo técnico
para indicar a liderança (Saduceus). Por alguma razão João não menciona os Saduceus; talvez por
terem desaparecido em 70 AD (João escreveu seu Evangelho muito depois desta data), e por serem os
Fariseus os líderes a partir daí, ele menciona mais este grupo (v. 20) - 20 vezes no Evangelho.

"sacerdotes e levitas" - Para inquirir sobre o seu batismo eles enviaram seus especialistas em
purificação ritual. Normalmente "levitas" refere-se a uma classe sacerdotal inferior, mas algumas
vezes, nos documentos rabínicos, à polícia do templo.

João era filho de Zacarias, e Zacarias era um sacerdote (Lc. 1:5). No Judaísmo, o único direito para se
entrar para o sacerdócio era a ascendência. Se um homem não descendia de Aarão, não podia tornar-se
um sacerdote; se era descendente de Aarão, nada podia impedi-lo que fosse sacerdote. De maneira que,
ante os olhos das autoridades, João era de fato um sacerdote, e era muito natural averiguar por que um
sacerdote estava se comportando de forma tão inusitada.

A conversação de João Batista com os sacerdotes e levitas caracteriza-se pela estrutura de


interrogatório. Eles o interrogaram sobre sua própria pessoa e sua obra. Sobre sua pessoa perguntaram-
lhe: "Quem és tu?" "És tu Elias?" "Que dizes de ti mesmo?" (1:19-22).

João responde com uma confissão. A "confissão" e o "testemunho" estão intimamente relacionados
(ver 1:19-20). A confissão é uma solene confirmação e também uma declaração solene de fé, que
implica um compromisso pessoal com aquilo que se confessa.

Em João a mensagem revela o mensageiro (ênfase para a pessoa). Nos Sinóticos a pergunta é: "Que
havemos de fazer?" (Lc. 3:10-14)

A pergunta corresponde a: "Que personagem és tu?", e não mera identificação pessoal (nome, idade,
etc...).

v. 20 - EU NÃO SOU O CRISTO. Ligado ao Cristo a pergunta é respondida em forma completa, com
ênfase na negativa EU NÃO SOU (contraste com a fórmula EU SOU usada por Jesus para definir a Si
mesmo).

Os judeus esperavam (e ainda esperam) a chegada do Messias. Não havia uma idéia única acerca do
Messias. Alguns esperavam a alguém que traria paz a toda a Terra. Alguns esperavam alguém que
traria o reino da justiça. A maioria esperava a alguém que seria um grande líder nacional, que guiaria
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Evangelho de João
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os exércitos judeus na conquista do mundo inteiro. Alguns esperavam uma personalidade sobrenatural
surgida diretamente de Deus. Mais ainda eram os que esperavam um príncipe que surgiria da casa de
Davi. Sempre surgiam pretendentes messiânicos que provocavam rebeliões. A época em que viveu
Jesus era de grande excitação. Era natural que perguntassem a João se pretendia ser o Messias.

v. 21 - És tu Elias? - NÃO SOU (sem "eu").

Era popular a crença de que Elias em pessoa surgiria para proclamar a vinda do Messias (cf.
DTN, 119). Jesus disse posteriormente, referindo-Se a João: "Se quereis dar crédito, é este o Elias que
havia de vir [na obra e não na carne]" (Mt. 11:14). "João veio no espírito e poder de Elias, para fazer
uma obra idêntica à daquele profeta. Houvessem-no recebido os judeus, e ela teria sido realizada em
favor deles. Mas não lhe receberam a mensagem. Para eles João não foi Elias. Não podia realizar em
seu benefício a missão que viera cumprir" (DTN, 119).

És tu o profeta? - NÃO (sem o verbo).

"As palavras 'o profeta' referiam-se a Moisés. Os judeus inclinavam-se a crer que Moisés
ressuscitaria, e seria levado para o Céu. Não sabiam que já fora ressuscitado. Quando o Batista
começara o ministério, muitos pensaram que talvez fosse o profeta Moisés, ressuscitado; pois parecia
possuir inteiro conhecimento das profecias e da história de Israel" (DTN, 118/119).

Até agora os judeus receberam somente respostas negativas. Então buscam tirar de João uma resposta
positiva:

v. 23 - "Declara-nos quem és... que dizes de ti mesmo?"

Tendo negado os papéis escatológicos tradicionais, João agora identifica-se nos mesmos termos
humildes pelos quais os Sinóticos o identificam, isto é, como a voz preparatória de Isaías 40:3. A
passagem de Isaías originalmente referia-se ao papel dos anjos em preparar um caminho através do
deserto pelo qual Israel pudesse retornar do cativeiro Babilônico. Mas João Batista deve preparar um
caminho, não para o povo de Deus retornar para a terra prometida, mas para o próprio Deus vir a Seu
povo. Seu batismo e pregação no deserto estava abrindo os corações dos homens, nivelando seu
orgulho, preenchendo o seu vazio, e assim preparando-os para a intervenção de Deus.

João Batista reconhece com exatidão sua relação com Cristo. Ele não é a Palavra, mas é a voz (ego
phone). O verdadeiro valor da voz consiste em transmitir a Palavra. E João identifica-se como a voz
que prepara o caminho para o Senhor.

O que João quis dizer foi: "Eu não sou ninguém; sou apenas uma voz que vos diz para vos preparardes
para a chegada do Rei". Dizia: "Preparai-vos, porque o Rei está a caminho."

DESERTO - Um elemento escatológico está envolvido. O povo é convidado a ir ao deserto iniciar um


novo êxodo, pois os dias messiânicos devem cumprir e repetir em escala maior os fatos do passado.

Dois aspectos figurativos: a. positivo; e b. negativo.

a. Positivo - As maiores maravilhas de Deus foram operadas no deserto: travessia do Mar Vermelho, o
maná, a água da rocha, etc. Todos tipos de eventos dos dias messiânicos (I Cor. 10:1-4). Para os dias
messiânicos mais amplos milagres de Deus seriam realizados (Isa. 35:1,6; 41:19; 43:19-20; 51:3;
32:15-17). O deserto era, pois, considerado como o lugar onde Deus mostrara especial favor a Israel
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Evangelho de João
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(Jer. 2:26; Hab. 3:15; Juízes 5:4-5).

b. Negativo - O deserto é também visto como um lugar de rebelião e pecado: o bezerro de ouro (Êxo.
32:23), a rebelião de Coré, Datã e Abirão (Núm. 16), adoração a Baal (Núm. 25), as várias
murmurações,... Por causa disto, o deserto é visto também como um lugar em que o Senhor testa o Seu
povo, a ver se serão fiéis (Salmos 78, 95 e 107).

Estes dois aspectos escatológicos do deserto estão presentes no ministério de Jesus. Jesus vê em Sua
crucifixão, finalmente, o cumprimento do tipo da serpente de metal (João 3:14).

v. 24 - "Fariseus" - O partido dos Fariseus tinha consciência de estar cumprindo a lei nos mínimos
detalhes, apesar de todos os membros da comunidade da aliança terem a responsabilidade de guardá-la.
Os Fariseus aparecem na história pela primeira vez perto do fim do segundo século AC, e eram
herdeiros espirituais dos hasidim, ou grupos piedosos, que desempenharam um papel nobre na defesa
da religião quando Antíoco Epifânio (175-163 AC) tentou aboli-la (ver I Mac. 2:42; 7:14; II Mac.
14:6).

O termo "fariseus" significa "separados" (hebr. perushim); há diversas explicações para o sentido desta
palavra, mas na prática ela enfatiza sua separação de qualquer coisa que possa comprometer sua pureza
ética ou cerimonial.

v. 25 - "Por que batizas?" - O batismo não era uma prática nova no judaísmo. O gentio tornava-se um
prosélito por 3 caminhos:
a. circuncisão; b. sacrifício; c. batismo.

O que era novo: o batismo aplicado a judeus.

Os fariseus tinham um interesse especial nas implicações religiosas da atividade de João,


especificamente no batizar. Sua pergunta sugere que, na opinião deles, o batismo era um rito
escatológico, que deveria ser administrado por um dos personagens esperado para o fim dos tempos, e
João negara ser qualquer um deles. Talvez Ezequiel 36:25 e Zacarias 13:1 indicassem batismo para o
povo escolhido nos dias messiânicos.
v. 26 - João simplesmente declara acerca de sua obra: "Eu batizo com água". Não discute se tem
autoridade ou direito para batizar; simplesmente declara que está realizando esta tarefa e que
continuará a executá-la. João contava com a autoridade suprema para seu ministério de batismo:
"Aquele que me enviou a batizar com água" (v. 33) era Deus. Assim sendo, sua posição pessoal não
tinha importância; ele era um instrumento na mão de Deus para apresentar Alguém maior do que ele.

"Eu batizo com água" - O "eu" é enfático e prepara o leitor (ouvinte) para a menção de Alguém que
batizará usando outro meio. No momento João não fala deste batismo diferente, mas menciona Aquele
que o administrará. Trata-se dAquele para quem João está preparando o caminho, como precursor,
Aquele que virá depois dele. De qualquer modo, o precursor é menos importante que a pessoa para a
qual ele prepara o caminho.

"no meio de vós está quem vós não conheceis" - "Era positiva e inequívoca a mensagem a ser levada
de volta ao Sinédrio. As palavras de João não se podiam aplicar a nenhum outro senão ao longamente
Prometido. O Messias Se achava entre eles! Sacerdotes e principais olharam em volta, com assombro,
na esperança de descobrir Aquele de quem João falara. Ele, porém, não era distinguível entre a
multidão" (D.T.N., 120).
29

Evangelho de João
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v. 27 - "Não sou digno de desatar-Lhe as correias das sandálias" - João destaca sua irrelevância
relativa em comparação com Aquele que vem, ao dizer que é indigno até de prestar um serviço tão
baixo como o de desatar as correias das sandálias. Um rabino disse: "Um discípulo deve executar para
seu mestre qualquer serviço que um escravo faz para seu dono, exceto desatar-lhe as correias das
sandálias". João considerava-se indigno até desta atitude tão servil diante dAquele que vem; não se
sentia digno nem de ser Seu escravo. Na verdade, porém, ao preparar o caminho para Ele, João tinha
um ministério muito mais honroso do que qualquer outro que seus ouvintes pudessem imaginar.

A função de João se limitava a ser quem preparava o caminho. Qualquer grandeza que possuísse
provinha da grandeza dAquele cuja vinda anunciava. João é o grande exemplo do homem que está
disposto a desaparecer para que se possa ver a Cristo. No seu entender, ele não era mais que um dedo
que apontava para Cristo. Deus nos conceda a graça de esquecer de nós mesmos e lembrar somente de
Cristo.

A Identidade dAquele que Vem ( 1:29-34 ).

v. 29 - "viu" - blepo - 17 vezes

"Eis" - horao - "vejam" - exclamação. E.G.White diz que a glória de Deus repousou sobre
João quando fez esta exclamação. Da mesma forma, em outra ocasião (v. 36), ela diz que "o rosto do
profeta iluminou-se outra vez com a glória do Invisível" ao apontar para Jesus como o Cordeiro de
Deus (DTN, 120, 122).
Que privilégio ser o primeiro arauto de Jesus, dAquele de quem deram testemunho todos os profetas
da antigüidade, como o verdadeiro sacrifício! Qual dos profetas não se comoveria com este privilégio!

"Cordeiro de Deus" - Este título é mencionado somente duas vezes em todo o NT (João
1:29,36). Várias explicações têm sido apresentadas sobre o uso deste termo. E.G.White comenta:

"Quando, por ocasião do batismo de Jesus, João O designara como o Cordeiro de Deus, nova luz foi
projetada sobre a obra do Messias. O espírito do profeta foi dirigido às palavras de Isaías: 'Como um
cordeiro foi levado ao matadouro' (Isa. 53:7)" (DTN, 120).

"tira" - airon - 3 sentidos:

a. levantar (pegar do chão) - 8:59


b. carregar sustentando ou sustentar carregando (Mt. 26:24)
c. remover, colocar de lado (João 20:1)

Em virtude de que o Cordeiro de Deus não tinha pecado (Heb. 4:15; I Ped. 2:22) Ele podia "tirar"
nossos pecados (I João 3:5). Devido a que a carga de pecado era demasiado pesada para que nós a
levássemos, Jesus veio para levantar a carga de nossas vidas.

"Pecado" - hamartia (errar o alvo) - usada no singular - ressalta o pecado como um princípio,
e não os pecados específicos.

"Mundo" - kosmos - O pecado que o Cordeiro de Deus remove é do mundo; este tom
universal soará novamente durante a narrativa do Evangelho (3:16; 4:42; 6:51) e na primeira carta
(2:2; 4:14). O mundo engloba todos, sem distinção de raça, religião ou cultura (cf. João 12:32).

v. 30 - "varão" - aner - homem - João exalta a divindade de Jesus e igualmente a Sua humanidade.
30

Evangelho de João
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"já existia" - en - pré-existência eterna.

v. 31 - "fosse manifestado" - mesmo verbo para se falar das manifestações de Deus no passado -
TEOFANIAS.

Aqui João Batista define o objetivo de sua missão: tão-logo Cristo Se manifeste, minha missão chega
ao fim. Paulatinamente, no Evangelho de João, o ministério de João vai se encerrando, enquanto o de
Jesus assume a preeminência. É como uma luz que vai se apagando, conforme a outra vai brilhando
mais (3:22-30).

v. 32 - "Vi o Espírito" - theaomai - Em vários textos do NT, esta visão expressa uma atitude de amor
e de intimidade de parte da pessoa que olha (Lc. 23:55; Rom. 15:24; João 6:5; 11:45). João Batista
manifesta esta atitude de amor e de intimidade para com a vinda do Espírito Santo porque esta
constituía o cumprimento de um sinal que o Pai lhe havia dado para que ele pudesse identificar "o que
batiza" com o Espírito Santo (1:33).

A visão constitui um dos elementos mais importantes na comunicação do Espírito de Deus ao profeta
no AT. Por esta razão os profetas foram chamados de "videntes" (I Sam. 9:9; II Sam. 24:11; Amós
7:12). Diz-se que quase todos os profetas tiveram visões (Núm. 12:6): Isaías (1:1), Ezequiel (1:28),
Daniel (1:17), Naum (1:1), Amós (1:1). No profetismo vétero-testamentário a visão é a penetração nos
planos de Deus, e é a abertura do significado da história, de Seu reino e de Seu propósito redentor. O
profeta vê tudo isto pela ação do Espírito Santo.
A palavra hebraica para o Espírito é ruach, que significa vento. Para a mentalidade judaica sempre
havia três idéias básicas acerca do Espírito:

a. O Espírito era poder, como o poder de um vento muito forte .


b. O Espírito era vida, a essência da vida;
c. O Espírito era Deus.

A vinda do Espírito à vida de um homem era a vinda de Deus. Sobretudo, o Espírito era quem
dominava e inspirava aos profetas (cf. Miq. 3:8; Isa. 59:21; 61:1; Ezq. 36:26-27). Podemos dizer que o
Espírito de Deus fazia três coisas para o homem sobre quem descia. Em primeiro lugar, trazia aos
homens a verdade de Deus. Em segundo lugar, outorgava aos homens o poder de reconhecer essa
verdade quando a vissem. Em terceiro lugar, dava-lhes a habilidade e a coragem de pregar essa
verdade aos homens.

"Descer" - também referido pelos Sinóticos.


"Pousar" - não referido pelos Sinóticos.
emeinen - pousar, permanecer - idéia de habitação permanente. O Espírito veio para ficar. O
Espírito Santo e Jesus estão perfeitamente unidos na obra salvadora que Cristo deve realizar sobre a
terra.

No momento do batismo o Espírito desceu sobre Jesus de forma única. E o fez de maneira diferente,
como jamais fizera a qualquer outro homem. Em Jesus o Espírito ocupou Sua morada de maneira
permanente.

A referência do Evangelho de João ao batismo de Jesus é feita de forma oblíqua, como o momento da
descida do Espírito. Quando comparamos o relato de João da descida do Espírito com o relato dos
Sinóticos, notamos:
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Evangelho de João
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Mc. 1:10 - O Espírito - descendo como pomba - sobre (eis)


Mt. 3:16 - Espírito de Deus - descendo como pomba, vindo - sobre (epi)
Lc. 3:22 - Espírito Santo - desceu em forma corpórea, como pomba- sobre (epi)
João 1:32 - O Espírito - descer do céu como pomba - sobre (epi)
Ao usar "o Espírito" sem um modificador, João está próximo de Marcos, mas ao descrever a descida
João está mais próximo de Mateus. João difere de todos os Sinóticos em dois elementos: João não
descreve o batismo em si e, ao descrever a descida do Espírito, João tem a frase "do (desde) céu" [ex
ouranou]. Os Sinóticos mencionam a voz do céu (Lucas: ex ouranou; Marcos-Mateus: ek ton ouranon)
e, no gr. da frase, Lucas é igual a João.

João claramente entende o impacto da descida do Espírito sobre Jesus, como identificando-O como o
único instrumento de Deus e, em particular, como o Messias e o Servo do Senhor. Em Isaías 11:2 é
dito que o Espírito de Yahweh repousará sobre o renovo de Jessé, que é o Rei Davídico. E Isaías 42:1
diz que Yahweh tem posto Seu Espírito sobre o Seu Servo.

"Pomba" - teria visto uma pomba real?

Na Palestina a pomba era uma ave sagrada. Não era caçada e não era comida. Em Gênesis 1:2 lemos
acerca do Espírito criador que se move sobre a face das águas. Os rabinos costumavam relatar que o
Espírito de Deus se movia e voava como uma pomba por cima do antigo caos enquanto lhe insuflava
ordem e beleza. A imagem da pomba era algo que os judeus conheciam e amavam.

E ainda mais: para a mente hebréia, a pomba era simbólico da renovação das coisas (Noé - pomba -
nova criação).

Quando recordamos a concepção que os judeus tinham acerca do Espírito, podemos dizer que quando
o Espírito toma posse de um homem sucedem determinadas coisas:
a. A vida se ilumina. O conhecimento de Deus vem a sua mente. Vê com clareza a vontade de
Deus. Sabe qual é o propósito de Deus, o que significa a vida, onde está o dever. Algo da sabedoria e
da luz de Deus tem chegado até ele.
b. A vida se fortalece. O conhecimento sem poder é algo frustrante. Porém o Espírito não só
nos dá conhecimento para saber o que é o correto, senão também força e poder para executá-lo. O
Espírito nos proporciona uma triunfante adequação para encarar a vida.
c. A vida se purifica. O batismo de Cristo com o Espírito seria um batismo de fogo (Mt. 3:11;
Lc. 3:16). A escória das coisas más, a mescla das coisas inferiores, são limpadas e queimadas, até que
o homem fique limpo e puro.
Os Primeiros Discípulos - 1:35-2:12

"No outro dia" - É o terceiro dia da semana inicial; é o terceiro testemunho de João a respeito de Jesus.
Os dois testemunhos anteriores não renderam fruto, mas este renderá. No livro de Gênesis, a primeira
criação, as primeiras formas de vida aparecem no terceiro dia.

João Batista está acompanhado de dois de seus discípulos quando vê (emblepsas - olhar com atenção)
Jesus passando. Um deles era André; o outro, provavelmente, era João.

v. 37 - "Ouvindo-o dizer isto" (que Jesus era o Cordeiro de Deus). O verbo "ouvir" tem um
significado notável no Evangelho de João. Quando aparece na mesma construção deste versículo
significa ouvir e apreciar (João 10:3, 16 e 20; 18:37). É este ouvir com simpatia o que produz a fé
(5:24). Paulo afirma o mesmo (Rom. 10:17). Bultmann ressalta que no Evangelho de João, crer é
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Evangelho de João
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ouvir, sempre que não seja uma simples percepção, mas um ouvir de aprendizagem (6:45) ou um ouvir
obediente (12:47).

"Seguiram a Jesus" - de akoloutheo = seguir como discípulo. Segundo Bruce, o verbo está no aoristo,
que pode ser tomado como exemplo do aoristo "ingressivo": "Eles se tornaram Seus seguidores."
Indica uma ação tomada de uma vez por todas. Não era uma simples pesquisa para ver se valia a pena
segui-LO. Seguir = entregar-se.

Por que João não se preocupa com o chamamento à beira do lago? Ou o chamamento de Mateus?
Porque a formação dos discípulos parte de João Batista. Ele veio para manifestar o Messias "a Israel".

v. 38 - "Que buscais?" - Primeiras palavras dirigidas aos discípulos. É equivalente a:


"Precisam de alguma coisa que Eu possa lhes oferecer?" Deus não pergunta: "O que farão por Mim?",
mas "O que necessitam que Eu faça por vocês?" Bartimeu - que queres que Eu te faça?

Ellen White comenta que, com esta pergunta, Jesus "queria deixá-los em liberdade de voltar atrás, ou
de falar de seus desejos" (D.T.N., p. 122).

"Rabi" - Mestre - primeira vez que aparece - literalmente: Meu Grande. Pode ser uma forma de
tratamento ou título.

"Onde assistes?" - "Onde moras? permaneces?" - meno - o mesmo verbo do v. 33 sobre a permanência
do Espírito Santo em Jesus. Pode indicar habitação temporária (neste caso o local onde Jesus ficava),
mas por usar o mesmo verbo do v. 33, pode ter um sentido teológico mais profundo.

E.G.White diz que "numa breve entrevista à beira do caminho, não podiam receber aquilo por que
ansiavam. Desejavam estar a sós com Jesus, sentar-se-Lhe aos pés e ouvir-Lhe as palavras" (DTN,
122).

v. 39 - "Vinde e vede" - lit. "vinde e vereis". Neste caso Jesus os estava convidando para que
vissem Sua habitação conosco (na humanidade) e não somente o local de Sua permanência temporária.

Barclay diz que os rabinos judeus tinham uma forma muito especial de empregar esta frase em seus
ensinamentos. Diziam, por exemplo: "Quereis conhecer a resposta a esta pergunta? Quereis conhecer a
solução para este problema? Vinde e vede, e pensaremos juntos". Quando Jesus disse: "Vinde e vede!"
estava convidando a estes dois não somente a ir e conversar, senão a ir e descobrir as coisas que só Ele
era capaz de revelar-lhes.

"As palavras de Jesus foram para eles cheias de novidade, verdade e beleza. Divina luz foi projetada
sobre o ensino das Escrituras do Velho Testamento. Os complexos temas da verdade apareceram sob
nova luz" (Ibid.).

"É contrição e fé e amor que habilitam a alma a receber sabedoria do Céu. Fé que opera por amor é a
chave do conhecimento, e todo que ama 'conhece a Deus'" (DTN, 123).

"Hora décima" - 16:00 hs. Hora do encontro com Jesus. A vida se converteu em algo novo para João.
Quando um homem se encontra autenticamente com Jesus, não se esquecerá do dia ou da hora, assim
como não se esquece da data do seu nascimento. A hora décima assinala a linha divisória entre a época
em que não conhecia a Jesus e o momento em que chegou a conhecê-lo.
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Evangelho de João
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vv. 40-42 - A cada vez que André é mencionado, ele está levando alguém a Cristo:
. levou seu irmão, Simão (v. 42);
. levou o menino dos pães e peixes (6:8);
. levou os gregos (12:22).

"Tu és Simão..." - onisciência e superioridade de Jesus.

v. 43 - Filipe - nome grego que significa "o que ama cavalos". Documentos atestam que era
um nome comum para judeus.

"Segue-Me" - seguir como discípulo. Antes não houve iniciativa de Jesus no chamado. O evangelista
quer realçar o papel de João Batista para abrir o ministério de Jesus.

Caráter de Filipe - "Filipe era um sincero indagador da verdade, mas tardio de coração para crer.
Conquanto se houvesse unido a Cristo, a comunicação que a Seu respeito fizera a Natanael, mostra que
não estava inteiramente convencido da divindade de Jesus. Conquanto Cristo houvesse sido
proclamado, pela voz do Céu, como o Filho de Deus, para Filipe era 'Jesus de Nazaré, filho de José'.
De outra vez, quando foram alimentados os cinco mil, revelou-se a falta de fé de Filipe. Foi para
prová-lo que Jesus perguntou: 'Onde compraremos pão, para estes comerem?' A resposta de Filipe foi
de incredulidade. ...Quando os gregos interrogaram Filipe acerca de Jesus, não se aproveitou da
oportunidade para apresentá-los ao Salvador, mas foi ter com André." E em João 14:5-8, encontramos
a "resposta de incredulidade" de Filipe: "Senhor, mostra-nos o Pai".
"Tão tardio de coração, tão fraco na fé era aquele discípulo que por três anos estivera com Jesus"
(DTN, 275/6).

Todavia, "quando o Espírito Santo foi derramado sobre os discípulos, Filipe tornou-se um mestre
segundo as normas divinas. Sabia de que falava, e ensinava com uma certeza que levava convicção aos
ouvintes" (DTN, 276).

v. 45 - "Natanael" - aparece somente aqui e em 21:2. Quem foi?


a. Alguns identificam Natanael com Bartolomeu. Os outros discípulos mencionados nest

b. Bartolomeu nunca é mencionado em João, como Natanael nunca o é nos Sinóticos.


c. Bartolomeu é colocado junto com Filipe na lista dos Sinóticos (Mt. 10:3; Mc. 3:18; Lc.
6:14).
d. Atos 1:13 o coloca junto com Tomé e este com Filipe: Filipe, Tomé, Bartolomeu. Tomé e
Natanael estão juntos em João 21:2.

v. 46 - "Nazaré" - Tanto a má reputação de Nazaré está aqui envolvida, como a sua


insignificância. Natanael era de Caná (21:2) que ficava próxima a Nazaré, portanto, falava de algo que
conhecia.
v. 47 - "Verdadeiro israelita" - Esta é a única vez que o termo "israelita" é mencionado no
Evangelho de João e, indubitavelmente, não é utilizado no sentido étnico, mas religioso, da forma
como Paulo aplica o termo "judeu" em Romanos 2:28-29. Este pensamento é reforçado pelo adjetivo
"verdadeiro" que aparece qualificando o substantivo "israelita". O substantivo "verdade", do qual
provém o adjetivo "verdadeiro", é uma categoria moral, portanto, é pessoal e afeta à consciência.

Que significa ir a Cristo? Natanael não somente vem caminhando, partindo da figueira, mas também
de suas dúvidas, que foram alimentadas por seus preconceitos nacionalistas, sociais e culturais.
Natanael está andando da desintegração para a integração; do caos para a ordem; das trevas para a luz;
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Evangelho de João
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da incredulidade para a ação da fé. Ir a Cristo significa adotar uma atitude que realmente permita
realizar este trajeto.

Quando Filipe mencionou que Jesus era de Nazaré, o preconceito surgiu no coração de Natanael. E foi
em dúvida e cedendo ao preconceito que Natanael foi ter com Jesus (DTN, 124).

"Dolo" - Em grego antigo - isca, própria para pegar peixes.


Vale-se de recursos escusos para conseguir a bênção.
Na LXX (Gên. 27:35) - Jacó pega a bênção por fraude. Tornou-se Israel quando passou a depender de
Deus.

Jesus afirma que Natanael é alguém que não procura obter alguma bênção por um caminho
pecaminoso, mas pela oração e dependência de Deus (v. 48). Alguém que é completamente Israel e
nem um pouco Jacó.

Os 144.000 em Apocalipse 14:5 não possuem dolo (segundo alguns manuscritos) em suas bocas.
Passarão pela angústia de Jacó e aprenderão a depender exclusivamente de Deus. São também
"israelitas" (Ap. 7:4).

v. 48 - "Debaixo da figueira" - "Ao tempo em que Filipe o chamou, Natanael se havia


retirado para um bosque sossegado, a fim de meditar sobre o anúncio de João, e as profecias
concernentes ao Messias. Orou para que se Aquele que João anunciara fosse o libertador, isso lhe fosse
dado a conhecer, e o Espírito Santo repousou sobre ele com a certeza de que Deus visitara Seu povo,
levantando-lhes um poder salvador. Filipe sabia que seu amigo estava examinando as profecias, e
enquanto Natanael orava sob uma figueira, descobriu-lhe o retiro. Muitas vezes haviam orado juntos
nesse isolado lugar, ocultos pela folhagem" (DTN, 124).

"Figueira" - A figueira e a oliveira eram as árvores favoritas que se cultivavam na Palestina, por seus
frutos. Sentar-se debaixo da figueira significava estar em casa e em paz (Miq. 4:4; Zac. 3:10).

v. 49 - A Reação de Natanael: "Mestre, Tu és o Filho de Deus, Tu és Rei de Israel".

Ele chama Jesus pelo título de cortesia (Mestre), mas vai adiante, dando-Lhe títulos mais grandiosos.
Na verdade, ele O está aclamando como Messias, usando dois títulos messiânicos que constam do
Salmo 2, onde Deus diz ao ungido rei de Israel, entronizado no monte santo Sião: "Tu és Meu Filho,
Eu hoje te gerei" (v. 6ss).

Natanael orara pela manifestação de Israel. Agora O tinha face a face.

"Rei de Israel" - Ao reconhecer Jesus como o rei de Israel, ao mesmo tempo em que aceitara o
tratamento de "israelita", Natanael reconhece que Jesus é o seu rei.
v. 50 - "Crês" - Natanael é declarado explicitamente ser o primeiro que creu no Evangelho de
João.

"Maiores coisas" - o ministério de Jesus está apenas começando, e obedecerá um crescendo de


revelação.
v. 51 - "Em verdade, em verdade" - Amém, amém.

Ao anunciar uma destas maiores coisas, Jesus pela primeira vez usa neste Evangelho Sua palavra
característica de afirmação solene, Amém. Nos Evangelhos Sinóticos a frase "em verdade, em verdade
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Evangelho de João
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vos digo" só tem um "Amém"; a repetição, o duplo amém, é uma característica Joanina, como aqui.
"Amém", em sua origem, é uma palavra hebraica que significa "constante" ou "certo"; da mesma raiz
vêm as palavras hebraicas que indicam "fé", "fidelidade" e "verdade". Ela era usada na liturgia (ver
Salmo 41:13) para expressar a certeza de que uma oração (p. ex., para que o nome de Deus fosse
glorificado) seria ouvida. Na boca de Jesus ela confirma a certeza e confiabilidade do que Ele diz, e foi
preservada sem tradução na Igreja Grega como Sua ipsissima vox, que indica Sua autoridade especial.

Implicação Cristológica: Cristo identifica-Se com Sua palavras, com o Deus a Quem elas apelam.
Cristo mesmo é o Amém (Ap. 3:14).

"O céu aberto" - Única referência no Quarto Evangelho.

Os Sinóticos falam do céu aberto por ocasião do batismo de Jesus.


Em Atos - a visão de Estêvão.
Em Apocalipse - as visões de João.
No Quarto Evangelho, é todo o ministério de Jesus.

"Abrir" - anoigo - usado em João para:

a. Abrir os olhos do cego (9:10, 14, 17, 21, 26, 30, 32; 10:21; 11:37).
b. Abrir a porta (10:3).

As bênçãos do evangelho são derramadas porque em Cristo o céu se abriu sobre nós.
"Aberto" - Está no particípio perfeito: o céu foi aberto e permanece aberto até agora, ou os efeitos de
ter sido aberto permanecem até agora.

E.G.White comenta:
"Com isto, Cristo virtualmente diz: nas margens do Jordão os céus se abriram, e o Espírito desceu
como pomba sobre Mim. Aquela cena não era senão um testemunho de que Eu sou o Filho de Deus.
Se crerdes em Mim como tal, vossa fé será vivificada. Vereis que os céus se acham abertos, e nunca se
hão de fechar. Eu os abri a vós. Os anjos de Deus estão subindo, levando as orações dos necessitados e
aflitos ao Pai em cima, e descendo, trazendo bênçãos e esperança, ânimo, auxílio e vida aos filhos dos
homens.

"Os anjos de Deus estão sempre indo da Terra ao Céu e do Céu à Terra. Os milagres de Cristo pelos
aflitos e sofredores, foram operados pelo poder de Deus através do ministério dos anjos. E é por meio
de Cristo, pelo ministério de Seus mensageiros celestiais, que toda bênção nos advém de Deus.
Tomando sobre Si a humanidade, nosso Salvador une Seus interesses aos dos caídos filhos de Adão,
ao passo que mediante Sua divindade, lança mão do trono de Deus. E assim Cristo é o medianeiro da
comunicação dos homens com Deus, e de Deus com os homens" (DTN, 126/7).

Títulos de Jesus no Capítulo 1

Logos, Deus, luz, unigênito do Pai, Messias, Cristo, Deus unigênito, Senhor, Cordeiro de Deus, Filho
de Deus, Rabi, Rei de Israel, Filho do homem.

Capítulo 2
As Bodas de Caná

Uma das "grandes coisas" prometidas por Jesus a Natanael.


36

Evangelho de João
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v. 3 - "Vinho" - tanto a festa do casamento como vinho são símbolos da era messiânica para o
pensamento judaico e cristão (Isa. 62:2-5; 54:48; Mt. 8:11; 22:1-14; Lc. 22:16-18). A consumação
escatológica exibe o quadro das bodas do Cordeiro (Ap. 19:7).

Riqueza: Pão, leite, óleo e vinho (prosperidade e alegria). A falta de vinho indicava falta de previsão e
tristeza, ou pobreza da família ou mau futuro para os noivos.

Abundância de vinho - alegria dos dias finais (Jer. 31:12; Joel 2:23-24; 3:18; Amós 9:13-14).

v. 4 - "Não é chegada a Minha hora" - Estas palavras indicam que "todo ato da vida de Cristo
na Terra era cumprimento do plano que existira desde os dias da eternidade" (DTN, 131).

v. 5 - "Fazei tudo quanto vos disser" - Fé: deixar o assunto nas mãos de Jesus.
"Levai-Lhe tudo quanto vos causa perplexidade. Coisa alguma é demasiado grande para Ele, pois
sustém os mundos e rege o universo. Nada do que de algum modo se relacione com a nossa paz é tão
insignificante que não o observe. Não há em nossa vida nenhum capítulo demasiado obscuro para que
o possa ler; perplexidade alguma por demais intrincada para que a possa resolver" (Caminho para
Cristo, 100).

Este semeion anuncia que a dispensação antiga chega ao fim e a nova está começando.

v. 6 - "Seis talhas de pedra" - As talhas estavam vazias. O sistema cerimonial de purificação


estava também vazio, sem conteúdo, sem significado, não cumpria mais a sua função, havia se perdido
em cerimônias externas e tradições sem valor. Indício do fracasso e impropriedade do sistema religioso
judaico, com todos os seus preceitos rituais.

O velho sistema deve ser substituído agora pelo novo vinho do evangelho, que é oferecido em
abundância para atender a todas as necessidades humanas (entre 450 e 700 litros).

v. 7 - "Encheram totalmente" - lit. "até a boca" - Isto era importante para evidenciar o
milagre. Nada podia ser adicionado à água. Dali sairia vinho somente se a água fosse transformada.

Este primeiro milagre revelou que Jesus é o Senhor da Natureza. Do ponto de vista humano,
transformar água em vinho é impossível. É contrário à Natureza. Mas Jesus é o Senhor do impossível -
Senhor da própria Natureza.

v. 10 - "Bom vinho" - "Os dons de Cristo... são sempre novos e sãos. A festa que provê para a
alma não deixa nunca de proporcionar satisfação e alegria. ...Não pode haver falta na provisão. Se
permaneceis nEle, o fato de receberdes hoje um rico dom, garante a recepção amanhã, de um mais
precioso ainda" (D.T.N., p. 132).

"O que João deseja que enxerguemos aqui é que sempre que Jesus entra na vida humana, sobrevém
uma nova qualidade que é como a transformação da água em vinho. Sem Jesus a vida é enfadonha,
desinteressante e monótona; quando Jesus entra nela, a vida torna-se vívida, brilhante e emocionante.
Sem Jesus a vida é insípida e desinteressante; com Ele é emocionante e animadora" (W. Barclay, The
Gospel of John, vol. 1, pp. 104/5).

v. 11 - "Princípio a Seus sinais... em Caná da Galiléia" - Com este sinal Jesus está
oficialmente começando o Seu ministério em João. Os Sinóticos indicam que Jesus começou o Seu
37

Evangelho de João
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ministério também na Galiléia. Tanto para os Sinóticos, como para João, o começo do ministério de
Jesus é o cumprimento de Isaías 9:1.

"Seus sinais" pode não apontar apenas para os 7 narrados no Evangelho, mas a todos os que Jesus
praticou (v. 23; 20:30). Todo o ministério de Jesus é um grande sinal (1:50).

"Manifestou a Sua glória" - Que significa a manifestação de Sua glória? No AT distinguia-se a glória
do Senhor por meio de duas características: 1. Sua visibilidade e 2. sua manifestação em ações de
poder. Desta maneira o Ser de Deus era acessível à experiência humana. A glória de Deus manifestou-
se em Sua ação criadora (João 19:1-2), ao intervir com atos de salvação na história de Israel (Salmo
106:20-22) e ao realizar sinais em favor de Seu povo no Egito e no deserto (Núm. 14:21-22).

No AT, entende-se a glória de Deus como uma epifania. Não descreve o modo de ser da Divindade,
mas Seu modo de operar, isto é, Seu poder ativo. Por esta razão, "glória" e "poder" são equivalentes.
Os primeiros textos do Evangelho de João sobre a glória (1:14; 2:11) têm um sentido cristológico.
Quando Jesus Cristo veio, entendia-se que a manifestação da glória divina estava estritamente
vinculada ao templo de Jerusalém (4:21). João nos diz que essa glória se tem manifestado e Jesus é a
presença de Deus sobre a Terra. Todas as ações e todas as palavras de Cristo manifestam a glória
divina. Então, Cristo está na Terra para mostrar a ação de Deus e para que Seu poder seja visível aos
homens.

Como em todos os Seus milagres, Jesus tencionava que este milagre revelasse Sua glória. Podemos
deduzir que a palavra "glória", neste caso, se refere ao poder de Cristo - e é verdade que os Seus
milagres demonstravam poder sobrenatural e sobre-humano. Provavelmente, porém, o significado
primordial de "glória", neste caso, é o que EGWhite tantas vezes lhe atribuiu ao igualar "glória" com
"caráter" (MDC, 31; PJ, 414).

Jesus desejava que cada um de Seus milagres fosse uma revelação de Seu caráter de amor. Tudo que
Ele sempre fez foi para nós. E, visto que Jesus veio revelar em Sua própria vida o caráter do Pai, um
objetivo de cada milagre também era revelar o amor do Pai por Seus filhos.

Outro objetivo deste milagre, era firmar a fé dos discípulos. Cristo sabia que uma violenta tempestade
de oposição se desencadearia contra Sua pessoa. Sabia que os rabis e sacerdotes lançariam dúvidas
sobre o Seu ministério. Os discípulos necessitariam de força para permanecer firmes durante tudo isso.

Através deste sinal Jesus revelou Sua glória e os discípulos creram nEle. Assim, o primeiro sinal tem o
mesmo propósito que todos os sinais subseqüentes terão, isto é, revelação sobre a pessoa de Jesus. João
não enfatiza primariamente a substituição da água para as purificações judaicas, nem a transformação
da água em vinho (que não é descrita em detalhe), nem mesmo sobre o vinho resultante. João não
enfatiza a pessoa de Maria ou sua intercessão, nem o porquê de ela ter solicitado a ajuda de Jesus, nem
a reação do noivo. O foco primário é, como em todas as histórias Joaninas, sobre Jesus como o único
enviado pelo Pai para trazer salvação para o mundo. O que brilha é a Sua glória, e a única reação que é
enfatizada é a crença dos discípulos.

A Purificação do Templo

"Com a purificação do templo, anunciou Jesus Sua missão como Messias. ...Purificando o
templo dos compradores e vendilhões mundanos, Jesus anunciou Sua missão de limpar a alma da
contaminação do pecado - dos desejos terrenos, das ambições egoístas, dos maus hábitos que a
corrompem" (DTN, 142).
38

Evangelho de João
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v. 13 - "Páscoa" - No Evangelho de João são mencionadas três Páscoas (ou quatro, se


considerarmos a festa de 5:1 como uma Páscoa, como o faz o SDABC).

a. 2:13, 23 (Março/Abril 28)


b. 5:1 ( Março/Abril 29)
c. 6:4 ( Março/Abril 30)
d. 11:55; 13:1 ( Março/Abril 31)

Cálculo do ministério de Jesus, segundo Daniel 9 (na metade da semana fará cessar o sacrifício): três
anos e meio. Neste caso, temos 4 Páscoas.

O objetivo de João ao relacionar as Páscoas e outras festas, é mostrar que Cristo cumpre todas as
festas.

João menciona a Páscoa mais que todos os outros evangelistas.

Motivo teológico: o grande livramento do passado foi apenas uma figura do livramento definitivo
através do sacrifício de Jesus.

v. 14 - "Templo" - Gr. hierón, o templo com seus átrios, pórticos e edifícios adjacentes; toda
a área do templo. Aqui não se usa naós, que se refere ao edifício do templo, com seu lugar santo e seu
lugar santíssimo. Ambas se traduzem "templo"no NT.
Em João 2:21 Jesus usa naós referindo-se a Seu corpo.

O comércio profano era realizado no átrio exterior, ou átrio dos gentios. Mas Jesus considerou santo
este local tanto quanto os outros e, portanto, impróprio para o comércio. "A presença do Senhor, que
outrora santificara o monte, tornou agora sagrado o templo erigido em Sua honra" (DTN, 142).

João menciona apenas esta primeira purificação do templo, ocorrida no início do ministério de Jesus.
Por que não menciona a segunda? Encaixa no propósito do escrito: o começo do ministério de Jesus é
o fim do velho sistema. O que leva Jesus à morte no Quarto Evangelho é a ressurreição de Lázaro (o
tema da ressurreição está relacionado com a purificação).

v. 15 - "Azorrague de cordas" - EGWhite diz que Ele não lhes bateu com o açoite de cordas,
mas que o açoite, nas mãos de Jesus pareceu terrível como uma espada flamejante (DTN, 141). Esta
foi uma das ocasiões em que "a divindade irradiou através da humanidade (invólucro humano)" (DTN,
141,143).

Outra ocasião foi na Transfiguração: "A divindade interior irrompe através da humanidade,
encontrando-Se com a glória vinda de cima" (DTN, 407).

Também na ressurreição de Lázaro (DTN, 512).

Ainda na segunda purificação do templo: "A divindade irrompeu da humanidade, revestindo Cristo de
uma dignidade e glória que jamais manifestara" (DTN, 564).
Outra vez diante de Herodes (DTN, 701).

v. 17 - Citação do Salmo 69:9. Em cada momento crucial o VT é citado no Evangelho de


João.
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Evangelho de João
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v. 18 - "Perguntaram" (apekríthesan) - tradução incorreta. O certo é "responderam". Uma


resposta dos "judeus", isto é, dos líderes, ao ATO DE JESUS.
"Que sinal fazes?" - Eles não disputam o ato em si; pedem um sinal de que Ele era a pessoa
indicada para fazer aquilo. "Só o Messias poderia fazer o que tu fizeste. Qual o sinal de que és o
Messias? Mostra-nos Tua credencial!"

Jesus mesmo é o grande sinal que eles insistem em não ver. É a Ele que os verdadeiros crentes vêem, e
não um mero sinal exterior.

v. 19 - "Jesus respondeu" (apekríthe) - mesmo verbo do verso anterior.

Ao ser desafiado, Jesus nada fez para defender Sua autoridade, mas fez uma profecia que
seria mais tarde lembrada por Seus discípulos. "Foi por amor dos que haviam de crer em Cristo que
essas palavras foram proferidas. Ele sabia que seriam repetidas. Pronunciadas por ocasião da Páscoa,
seriam levadas aos ouvidos de milhares, e a todas as partes do mundo. Depois de Ele haver
ressuscitado dos mortos, o sentido delas se tornaria claro. Para muitos, seriam concludente prova de
Sua divindade" (DTN, 146). De acordo com o v. 22, Seus discípulos creram nEle.

"Destruí" (lysate) - desligar, desatar, desmembrar, destruir; também dissolução da vida,


matar. Imperativo com sentido condicional: "Se vós destruirdes Eu..."

Ironia: Os próprios judeus seriam o meio de produzir o sinal e, quando o vissem, não o
creriam.

"Santuário" (naós) - Matando a Jesus estariam realmente pondo um fim ao próprio santuário.

v. 20 - "Em 46 anos foi edificado este santuário" - A reconstrução do templo na forma que
tinha nesse tempo foi iniciada por Herodes, o Grande, no começo de 19 AC. A parte principal da obra
foi completada e consagrada em dez anos, mas outras partes ainda estavam sendo executadas; na
verdade, os toques finais no empreendimento inteiro só foram dados em 63 AD, apenas sete anos antes
da destruição (Bruce).

v. 21 - "Santuário do Seu corpo" - Ressurreição. Nos Sinóticos, a ressurreição é o sinal


oferecido por Jesus aos que pedem um sinal (Mt. 12:39-40; 16:4; Lc. 11:29). Outra evidência de que é
a ressurreição que Jesus tem em vista é que no v. 19 o verbo usado por Ele é egerô (reconstruirei -
ARA - traduzido por "levantarás" no v. 20), verbo este freqüentemente usado para o fato da
ressurreição.

v. 22 - "Lembraram-se" - Em 14:26 é dito que o Espírito nos fará lembrar de tudo o que Jesus
disse.

"Creram na Escritura" - No singular, refere-se a uma passagem das Escrituras (Salmo 16:10;
Isa. 53:12). Creram também na palavra de Jesus.

v. 23 - "Muitos creram no Seu nome" - Fé superficial, entusiasmo, como a planta que brotou
entre as pedras, sem profundidade, amor de adolescente. Lutero chamou de "crença de leite" (dente de
leite).

Em João existe, de fato, uma graduação de fé, da descrença para a crença, fundamentada
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Evangelho de João
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numa variação de não ver, ver e não crer:

1. Não ver e não crer ( 6:30; 9:39; 12:37-40 ).


2. Ver e não crer ( 6:36 ).
3. Ver e crer superficialmente ( 2:23; 4:48 ).
4. Ver e crer profundamente ( 6:40; 20:8, 27-29 ).
5. Não ver e crer profundamente ( 20:29 ).

A verdadeira fé ocorre com a visão do ressuscitado = glorificado:

a. Antes que Ele morra e ressuscite (através dos sinais temos a antecipação da Sua glória - os
que vêem um mero milagre não chegam a esta fé, embora João ateste que foi um sinal);

b. Durante Sua presença na terra, após a ressurreição;

c. Depois que Ele subiu.

Falta de genuína fé, ou presença superficial de fé, deve-se ao fato de que os milagres de
Cristo, e não propriamente Sua pessoa, são conhecidos. Devemos conhecer a Cristo, não a doutrina
referente a Ele.
v. 24 - "Jesus não Se confiava (epísteuen) a eles" - Devemos considerar não apenas se temos
fé em Jesus, mas se Ele tem fé em nós. Por que Jesus não confiava neles:

a. Pela atitude deles. Eles somente criam ao ver as obras de Jesus. Estas eram obras isoladas.
Uma aqui e outra ali. A fé surgia da impressão que eles recebiam pelas obras isoladas de Jesus. Trata-
se, então, de uma fé que algumas vezes surge e outras desaparece, para surgir novamente quando
algum milagre especial a alimenta. Em contraste com este tipo de fé está aquela que surge das obras de
Cristo, tomadas em seu conjunto total como uma unidade inalterável (João 4:45). O reconhecimento
esporádico de Seus sinais ou milagres (7:31; 11:47), não pode senão produzir uma fé intermitente, que
não merece a plena confiança de Jesus (2:24). Em realidade, a verdadeira fé não necessita de milagres
para fundamentar-se (4:48; 20:29). Usa os milagres apenas como um primeiro passo para Jesus, para, a
seguir, estabelecer seu completo fundamento na própria pessoa do Senhor (9:35-38).

b. Porque Jesus os conhecia. Não porque alguém Lhe houvesse informado o que tinham
dentro de si, mas porque "Ele bem sabia" o que havia neles (2:25). Este conhecimento interior do
homem é um atributo de Deus (Jer. 17:10; 20:12) que surge de Sua onisciência.

O encontro com os milagres é, simplesmente, um falso encontro com Cristo. Pode estar
totalmente envolvido por elementos emocionais e, no entanto, ser apenas uma experiência passageira.
O efeito passageiro desta experiência contribui para aumentar a frustração posterior. Por isso, a pessoa
que tem experimentado alguma vivência religiosa sem alcançar a plenitude de Cristo, encontrar-se-á
em piores trevas do que aquelas que não tiveram qualquer experiência. Quem está ofuscado com a luz,
ao se encontrar em trevas, terá menor capacidade de ver o verdadeiro sentido da vida em Cristo.
Capítulo 3

Os capítulos 3 e 4 são uma ilustração do conhecimento que Jesus tem do ser humano. No
caso de Nicodemos, Jesus vai logo ao ponto de sua real necessidade ("se não nascer de novo"). O
mesmo ocorre com a mulher samaritana (4:4 - "era-Lhe necessário").

Duas ilustrações usando personalidades e situações opostas. Toda a humanidade está


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Evangelho de João
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envolvida:

NICODEMOS SAMARITANA

Homem Mulher
Judeu Samaritana
Jerusalém (mais importante) Sicar (bebedeira)
Pio/religioso/respeitado Adúltera
Nome (Nico = líder Demos = povo) Anônima
Fariseu Pessoa simples
Noite Meio-dia

v. 1 - "Nicodemos" - Mencionado três vezes no Evangelho de João (3:1; 7:50; 19:39) e em


nenhum outro.

"Desde que ouvira Jesus, Nicodemos estudara ansiosamente as profecias relativas ao Messias;
e quanto mais procurara, tanto mais forte era sua convicção de que este era Aquele que havia de vir.
Ele, como muitos outros em Israel, sentira-se grandemente aflito com a profanação do templo. Fora
testemunha ocular da cena da expulsão dos vendedores e compradores por Jesus; presenciara a
maravilhosa manifestação de poder divino; vira o Salvador receber os pobres e curar os enfermos;
vira-lhes a expressão de alegria, e escutara-lhes as palavras de louvor; e não podia duvidar de que Jesus
de Nazaré era o Enviado de Deus"(DTN, 150).

v. 2 - "Noite" - Para um fariseu, membro do Sinédrio e rabi, seria demasiado humilhante


declarar publicamente sua simpatia por um mestre tão pouco acreditado entre os dirigentes de Israel
(não estudara em suas escolas, etc). Se sua visita chegasse ao conhecimento dos membros do Sinédrio,
certamente lhe acarretaria desprezo e denúncias. Para ele era mais seguro visitar a Jesus secretamente
(cf. DTN, 150).

"Noite" - Especifica um ponto de tempo, mas, no Evangelho de João é significativo do


dualismo LUZ (DIA) versus TREVAS (NOITE). Elemento simbólico: Nicodemos parte das trevas
para a luz (Contraste com Judas, que abandonou a Luz [Jesus] e saiu para as trevas - 13:30).

"Rabi, sabemos que és Mestre vindo da parte de Deus" - "Suas palavras visavam exprimir e
despertar confiança; na realidade, porém, exprimiam incredulidade. Não reconheceu Jesus como o
Messias, mas apenas como um mestre enviado por Deus" (DTN, 150).

Quando Nicodemos se aproximou de Jesus, disse que ninguém podia evitar sentir-se
impressionado pelos sinais e maravilhas que fazia. A resposta de Jesus é que o que importava
verdadeiramente não eram os sinais e maravilhas; o que importava era que na vida interior de um
homem se produzisse uma mudança tal que só se pudesse considerar como um novo nascimento.

v. 3 - "Em verdade, em verdade" (somente João utiliza esta expressão) - duplo amém. Três
vezes na conversa com Nicodemos - importância das declarações de Jesus.

"Reino de Deus" - Uma das duas ocasiões em que o reino é mencionado em João.
"Nascer de novo" - Gr. anothen. W. Barclay apresenta três significados para a palavra:

a. Desde o início, completa e radicalmente.


b. Outra vez ou pela segunda vez.
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Evangelho de João
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c. De cima e, conseqüentemente, de Deus. (Esta parece se encaixar melhor dentro do contexto
de João).

Em outras partes do Evangelho de João significa "de cima" (3:31; 19:11). Esta palavra pode
ser usada no sentido de "de novo" e "de cima", e não é seguro que significado Jesus quis dar-lhe aqui.
É claro que Nicodemos a entendeu no sentido de "de novo"(v. 4), porém talvez Jesus quisesse dizer
"do alto", o sentido em que se usa no v. 31. Com certeza, o nascimento ao qual Jesus se refere aqui é
um segundo nascimento, porém não é uma repetição do primeiro nascimento, como a tradução "de
novo" poderia implicar.

v. 4 - "Como pode...?" - Uma resposta irônica (DTN, 151).

v. 5 - "Água e Espírito" - Jesus agora explica o que significa "nascer de novo". A referência a
"água" é uma clara alusão ao batismo com água que se administrava aos prosélitos judeus e que parece
haver sido praticada pelos essênios. Além disso, durante muitos meses João havia estado batizando a
seus compatriotas judeus no Jordão (Mt. 3:5-6, 11). Sem dúvida, os fariseus, que pretendiam possuir
um grau superior de justiça, recusavam o batismo (Lc. 7:30) porque João o converteu no símbolo do
arrependimento. Sem dúvida, Nicodemos havia escutado a João e talvez tenha ouvido suas afirmações
quanto ao batismo com água (1:26) e com o Espírito Santo (1:33). Nicodemos antecipava sua entrada
no reino de Deus por haver nascido judeu e ser piedoso, porém Jesus declarou que qualquer coisa que
fosse inferior a uma transformação completa da vida mediante o poder do Espírito Santo, era
inadequada (ver Rom. 6:3-6).

Ser nascido da "água e do Espírito" equivale a ser "nascido de novo", ou seja, "do alto". Os
que são nascidos do alto têm a Deus como Pai e refletem Seu caráter (cf. I João 3:1-3; João 8:39, 44).
Pela graça de Deus, daí em diante aspiram viver superando o pecado (Rom. 6:12-16) e a não entregar
sua vontade para cometer pecados (I João 3:9; 5:18).

v. 6 - "Nascido da carne" - Nascimento natural. Neste caso não denota maldade essencial,
nem pecaminosidade, como em Paulo.

v. 7 - "Não te admires...Importa-vos" - De acordo com a teologia judaica, o haver nascido


como filho de Abraão era quase uma garantia de admissão no reino celestial (8:33). Porém, a fim de
ser salvos, os que não eram judeus deviam converter-se em filhos de Abraão por adoção. Não
surpreenderia (causaria admiração, espanto) a Nicodemos ouvir Jesus dizer que os não-judeus deviam
nascer "de novo" a fim de "ver o reino de Deus", porém, a idéia de que ele, um respeitável judeu,
estivesse fora do círculo da salvação, era um pensamento novo e inquietante. Dois anos e meio mais
tarde (8:39), Jesus explicitamente declarou que pertencer à linhagem de Abraão significa ter uma
semelhança moral e não uma relação física. Comparar com o ensino de Paulo sobre o mesmo tema
(Rom. 2:28-29; 9:6-7; 10:12-13; Gál. 3:9, 28-29). A conversão e o nascimento são semelhantes em
que ambos assinalam o começo de uma nova vida.

De acordo com a antropologia Joanina, o homem é determinado pela sua origem. Esta origem
determina a natureza da pessoa, que também se expressa por meio de palavras, mas,
fundamentalmente, o faz por meio de ações.

Segundo o Evangelho de João, existem duas possíveis origens para o homem: uma é "de
Deus" (8:47; I João 4:4, 6; 5:19) ou "do Pai" (I João 2:16), ou "da verdade" (João 18:37). Esta origem
é exatamente a mesma origem de Cristo (João 8:42; 16:28), e pode ser alcançada mediante o novo
nascimento (1:13). A outra origem é "do mundo" (8:23; 15:19; 17:14; I João 2:16; 4:4-5). Todo aquele
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Evangelho de João
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que não nasceu de novo é "do mundo" e, portanto, não tem controle sobre sua vida, não pode
conseguir a salvação por si mesmo, não pode chegar à luz, não pode praticar a verdade, não pode
alcançar a vida.
O que nasceu de novo tem uma origem e um destino. Sua origem está em Deus e seu destino
é o reino de Deus.

v. 9 - "Como pode...?" - Torna a aparecer a formalidade do fariseu. Não lhe havia


impressionado tanto a necessidade do novo nascimento, como a maneira em que este se verifica.

v. 13 - "Ninguém subiu ao céu, senão aquele que de lá desceu" - Nenhum ser humano subiu
ao céu para conhecer as "coisas celestiais" (v. 12). Só o Filho do homem, que desceu do céu, tem
estado ali e só Ele pode revelá-las. Não se faz referência aqui à ascensão de Jesus ao céu depois da
ressurreição.

["Que está no céu"] - A evidência textual se inclina pela omissão desta frase.
v. 14 - "Moisés levantou (hipsosen) a serpente..." - Referência a Números 21:6-9. "O símbolo
da serpente levantada tornou-lhe clara a missão do Salvador. ...Era um símbolo de Cristo" (DTN, 155).
No deserto, o olhar da fé trouxe cura. Assim também a fé no infinito sacrifício do Calvário
proporciona a cura da praga do pecado. Em Seu último dia de ensinamento no templo, Jesus declarou:
"E Eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a Mim mesmo" (12:32). Em João, a expressão
"levantado" sempre se refere à crucifixão (8:28; 12:34). Quando viu a Jesus que pendia da cruz,
Nicodemos deve haver recordado vividamente a figura de Moisés levantando a serpente no deserto, e
as palavras de Jesus quanto a ser "levantado". Este acontecimento, que destruiu as esperanças dos
discípulos, convenceu a Nicodemos da divindade do Filho de Deus (DTN, 745).

Hipsó - levantar - cruz.


Egeiro - levantar - ressurreição.

Dois verbos com o mesmo sentido são usados para dois eventos aparentemente opostos, a
crucifixão (morte) e a ressurreição. Para João os dois eventos são um só: Glorificação.

Katabaino - descer - encarnação.


Anabaino - morte - ressurreição - ascensão.

Todavia, a morte é o ponto mais baixo que desceu, mas é o meio de subir. Se não há um
descer, não há um subir. Ele não volta ao Pai sem a cruz. Na cruz os dois verbos se confundem num
só. Na cruz temos o descer e o subir. Por isso a cruz é o ponto alto da glorificação. Em João Jesus
mostra a Sua glória, não apesar das humilhações e morte, mas por meio da humilhação e morte.
v. 15 - A maioria dos comentaristas sustenta que as palavras de Jesus terminam com este
verso, e que começando com o v. 16 começa o comentário do evangelista.
v. 16 - A Ação Redentora
Lutero chamou este verso de "o coração da Bíblia - o Evangelho em miniatura". É tão
simples que uma criança pode compreendê-lo; todavia condensa as profundas e maravilhosas verdades
da redenção nestas poucas palavras pungentes:
DEUS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O Maior Amante
DE TAL MANEIRA . . . . . . . . . . . . . . . O Maior Grau
O MUNDO . . . . . . . . . . . . . . . . . O Maior Número
QUE DEU . . . . . . . . . . . . . . . . . . O Maior Ato
SEU FILHO UNIGÊNITO . . . . . . . . . . . . O Maior Dom
PARA QUE TODO O QUE . . . . . . . . . . . . O Maior Convite
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Evangelho de João
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NELE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A Maior Pessoa
CRÊ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A Maior Simplicidade
NÃO PEREÇA . . . . . . . . . . . . . . . . . O Maior Livramento
MAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A Maior Diferença
TENHA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A Maior Certeza
VIDA ETERNA . . . . . . . . . . . . . . . . A Maior Possessão
(Pulpits Helps, Abril/85)

Esta é a primeira vez que João utiliza o verbo "amar" (agapao). Trata-se de um amor que
procede de Deus, porque Deus é amor (I João 4:8, 16). Devido a este amor o Pai é definido como "o
que dá". Dá a Jesus que é "o" presente de Deus (3:16), dá a fé (6:65), dá o Paracleto (14:16) e dá tudo
o que os discípulos peçam (15:16; 16:23). Ao dar a Jesus não O enviou vazio, mas com todas as
riquezas do Pai: Suas Palavras, Suas obras, a vida, com todas as coisas e com tudo o que Jesus Lhe
peça (11:12 e 42).

Jesus é o verdadeiro dom de Deus (4:10). É a máxima expressão de Sua graça. O pecador
deve recebê-LO pela fé, mas a fé não é seu salvador. É simplesmente a maneira de receber a Cristo.
Com Cristo, o pecador recebe toda a luz, toda a verdade e o novo nascimento com todas as atitudes
espirituais que moldam a nova criatura, inclusive o arrependimento. Lucas diz: "Deus com a Sua
destra o elevou a Príncipe e Salvador, para DAR a Israel o ARREPENDIMENTO e remissão dos
pecados" (Atos 5:31). Deus, com o dom de Seu Filho, inclusive "nos deu entendimento para
conhecermos o que é verdadeiro" (I João 5:20).

Deus dá ao homem a capacidade para crer, para que "não pereça, mas tenha a vida eterna".
Deus não deu Seu Filho para a especulação racional, deu-O para a fé. Deu-O para que fosse recebido,
aceito e seguido. É desta maneira que o homem não se perde e tem a vida eterna.

"Não pereça" - apóletai - apóllumi - "destruir completamente", "desvanecer em nada". "O


salário do pecado é a morte" (Rom. 6:23). Pecado em João é "não crer em Jesus" (16:9). O oposto da
vida eterna não é um sofrimento eterno, e sim aniquilação eterna, morte eterna. O pecado tem em si
mesmo as sementes da dissolução. O resultado é a morte, não porque Deus o queira, senão porque o
pecador escolheu separar-se de Deus, a fonte da vida.

"Vida eterna" - zoe aionios. Em João o adjetivo aionios só aparece com a palavra zoe (3:15-
16, 36; 4:14, 36; 5:24, 39; 6:27, 40, 47, 54, 68; 10:28; 12:25, 50; 17:2-3). O texto grego de João 3:16
diz literalmente: "possa prosseguir tendo vida eterna". "Vida eterna" é vida que dura para sempre, vida
que não tem fim. É possível unicamente mediante uma conexão ininterrupta com a Fonte de toda vida.

E.G.White comenta:
"Oh, não compreendemos o valor da expiação! Se a compreendêssemos, falaríamos mais
acerca dela. O dom de Deus em Seu amado Filho foi a expressão de um amor incompreensível. Foi o
máximo que Deus podia fazer para manter a honra de Sua lei e... salvar o transgressor. Por que não
deve o homem estudar o tema da redenção? É o tema supremo no qual se pode ocupar a mente
humana. Se os homens contemplassem o amor de Cristo na cruz, sua fé se fortaleceria para apropriar-
se dos méritos de Seu sangue derramado, e estariam limpos e salvos de pecado" (ST, 30/12/1889).

"O plano da redenção supera em muito a compreensão da mente humana. A grande


condescendência de Deus é um mistério insondável para nós. Não se pode compreender
completamente a grandeza do plano, nem a Sabedoria infinita podia idealizar um plano que o
superasse. E só podia ter êxito revestindo a divindade com humanidade, convertendo-Se Cristo em
45

Evangelho de João
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homem e sofrendo a ira que tem causado o pecado devido à transgressão da lei de Deus. Por meio
deste plano o grande e terrível Deus pode ser justo, e ser ainda o que justifica a todo o que crê em
Jesus e que o recebe como a seu Salvador pessoal. Esta é a ciência celestial da redenção, de salvar o
homem da ruína eterna, e só pôde levar-se a cabo pela encarnação do Filho de Deus na humanidade,
por Seu triunfo sobre o pecado e a morte; porém, todas as inteligências limitadas se frustram quando
tratam de examinar a fundo este plano" (Citado em CBA, 5:1107).
vv. 17-21 - Amor e Juízo

Aqui nos encontramos com um dos aparentes paradoxos do Quarto Evangelho: o paradoxo do
amor e do juízo. Acabamos de pensar no amor de Deus, e de repente nos defrontamos com o juízo, a
condenação e a convicção. João acaba de dizer que foi porque Deus amou tanto ao mundo que enviou
a Seu Filho a este mundo. Mais adiante nos mostrará a Jesus dizendo: "Para juízo vim a este mundo"
(9:39). Como podem a duas coisas ser verdade?

João se apressa em explicar que os que não crêem no Filho já tem sido condenados,
simplesmente porque recusaram crer. O propósito de Deus ao enviar a Seu Filho ao mundo é salvar ao
mundo. Se devido à vinda do Salvador alguns incorrem em condenação, não se pode atribuir a culpa a
Deus. A condenação não resulta da vinda da Luz verdadeira (1:4-9) senão de que os homens
deliberadamente se apartaram da luz porque preferiram as trevas. Os judeus pensavam que o Messias
viria como um Juiz para condenar aos descrentes (cf. Lc. 4:19), e que os anjos se regozijariam pela
destruição dos perdidos (cf. 15:7). Porém Cristo não veio para condenar o mundo e sim salvar o
mundo.

v. 17 - "Enviou" - equivalente a "deu" do v. 16 (ver 14:16,26).


"Julgasse" - kríne - No sentido de condenar, em comparação com "salvar". Contraste em
9:39, onde salvação aplica julgamento (dois lados da mesma moeda).
"Salvo" - ter vida eterna, segundo o v. 16.

v. 18 - "Quem nEle crê não é julgado; o que não crê já está julgado" - Assim como os que
crêem em Cristo são justificados em virtude de sua fé nEle, assim também os que não crêem
automaticamente são condenados devido a sua falta de fé. Nunca foi a vontade do Pai que alguns
rejeitassem a Cristo, e os que o fazem trazem assim condenação sobre si mesmos. A ausência de fé
salvadora é que provoca condenação. "Tudo o que não provem de fé é pecado" (Rom. 14:23). O
propósito da vinda do Salvador ao mundo não foi trazer condenação; porém, para os incrédulos, é um
resultado inevitável de Sua vinda. Deus tem predeterminado que os que crêem sejam salvos e os que
não crêem se percam; porém tem deixado com cada ser humano a faculdade de escolher o crer ou não
crer. Neste sentido, o caso de cada crente e de cada incrédulo, de cada santo e de cada pecador foi
decidido quando se determinou o plano da salvação, porém se deixou com cada indivíduo a faculdade
de escolher ser santo ou pecador. Esta é a predestinação bíblica.

"Está julgado" - kekritai - perfeito passivo de krino.


"Não crê" - mé pepisteuken
O perfeito dos dois verbos indica que o incrédulo entrou num estado contínuo de condenação,
porque se recusou a entrar num estado contínuo de fé, ou continua não crendo.

v. 19 - "Julgamento" - krisis - O processo de julgamento. Não krima, a sentença ou resultado


do juízo.
"A luz veio ao mundo" - Ver 1:4-5, 9. João explica como vem a condenação sobre os
homens. Não é porque Deus queira que os homens se percam, senão porque alguns tem preferido as
trevas à luz. A sentença não é arbitrária, senão o resultado inevitável da lei que estipula que "o salário
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Evangelho de João
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do pecado é a morte" (Rom. 6:23). A sorte de cada homem fica selada pela forma em que reage diante
da luz.

Aqui não há menção explícita daqueles que nunca tiveram a oportunidade de crer em Cristo,
para quem a luz jamais brilhou em sua plenitude. Provavelmente, porém, as palavras de João também
esclarecem o princípio do seu julgamento. Se os homens são julgados por sua reação à luz, o
julgamento baseia-se na luz que cada um pôde ver. Os que aceitam com alegria a luz parcial que
podem ver, aceitarão com a mesma alegria a luz perfeita quando esta brilhar sobre eles.

Enquanto os homens permanecem sem a luz, não há condenação (Salmo 87:4, 6; Ezq. 3:18-
21; 18:2-32; 33:12-20; Lc. 23:34; João 15:22; Rom. 7:7-9; I Tim. 1:13), porém, quando a luz da
verdade brilha em seus corações "não têm desculpa do seu pecado" (15:22). Os que não estão dispostos
a renunciar a seus maus caminhos preferem as trevas, e ao fazê-lo, cegam-se a si mesmos frente à luz
(II Cor. 4:4). Os que rejeitam a luz, não se importando com a intensidade do seu brilho, pronunciam a
sentença para si mesmos. Por outro lado, Jesus prometeu que o que escolhe segui-Lo "não andará em
trevas" (8:12) e que ninguém o "arrebatará" de Sua mão (10:28).

"Amaram" - agapao - Deus amou os homens (v. 16) e enviou-lhes a luz (1:4-5, 9), mas os
homens amaram as trevas. A idéia de "amaram" aqui é de "preferiram". A mente hebraica expressa o
sentido de preferência com os verbos "amar" e "odiar".
"Amaram mais as trevas do que a luz" - Dualismo LUZ versus TREVAS. O problema não foi
odiar uma coisa e amar a outra, e sim amar mais uma coisa que outra. Coração dividido não serve
(Mt. 6:24 - ( Ninguém pode servir a dois senhores" ).
O grande mal: desde que Deus tem amado o mundo e dado Seu Filho, o pecado humano não
é resultado de ignorância, mas de escolha deliberada, livre preferência.
"Porque as suas obras eram más" - Imersos na prática do mal, não desejam ser perturbados.
Recusam ser sacudidos e tirados de sua confortável pecaminosidade.
v. 20 - Correspondência com OBRAS:
LUZ = BOAS OBRAS
TREVAS = MÁS OBRAS

Existe uma base moral para a incredulidade.

v. 21 - "Pratica a verdade" - A idéia de OBRAS governa o uso do verbo. Não meramente


falar a verdade, mas praticar (Tg. 4:17).

vv. 22-30 - alguns acham que deveria vir depois do v. 36.

v. 22 - Se Jesus estava em Jerusalém (Judéia) como podia ir "para a terra da Judéia"? Pode ser
entendido como o interior do país, longe da cidade.

Jesus batizava? Este é o único dos quatro evangelhos que diz que Jesus batizou durante Seu
ministério terrestre; mesmo assim, segundo João 4:2, não o fez pessoalmente, mas através de Seus
discípulos. O batismo aqui referido não é o cristão, mas ainda o do arrependimento. Os discípulos de
Jesus aqui são os que foram de João Batista, o qual dizia: "Arrependei-vos". No princípio Jesus
também pregava esta mesma mensagem (Mt. 3:2; 4:17). Não é impróprio que o símbolo do
arrependimento tenha sido retido por um tempo.

v. 24 - "João não tinha sido preso" - O propósito deste comentário parece ser deixar claro que
os eventos registrados aqui são anteriores a qualquer coisa narrada pelos Sinóticos sobre o ministério
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Evangelho de João
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de Jesus. No relato Sinótico, a pregação de Jesus começou "depois de João ter sido preso" (Mc. 1:14).
v. 26 - "Por meio dessas palavras, tentou Satanás a João. Conquanto a missão deste parecesse
prestes a concluir-se, ser-lhe-ia ainda possível prejudicar a obra de Cristo. Houvesse ele se doído por si
mesmo, ou expressado desgosto ou decepção, por ser sobrepujado, e estariam lançadas as sementes da
dissensão, incitados o ciúme e a inveja, tornando-se sério obstáculo ao progresso do evangelho" (DTN,
159).

v. 35 - Todas as coisas confiadas à mão do Filho -


O que o Pai tem dado ao Filho:

a. O Espírito - v. 34.
b. Sua obra - 17:4.
c. Suas obras - 5:36.
d. Sua mensagem - 12:49; 17:8.
e. Seus discípulos - 6:37-39; 10:29; 17:6,9,12,24; 18:9.
f. O cálice que Ele deve beber - 18:11.
g. Todo o julgamento - 5:22.
h. Ter vida em Si mesmo - 5:26.
i. Poder sobre toda a carne - 17:2.
Quem aceita a Cristo, aceita não um Cristo de mãos vazias, mas com toda a plenitude.
v. 36 - Reminiscência dos vv. 16 e 18.

"Quem crê" "Mantém rebelde" (part. pres.)


| |
Contínua confiança Contínua rebeldia
"Ira" - orgé - única referência no Evangelho. Desprezo divino pelo pecado.
Capítulo 4

v. 4 - "Era-Lhe necessário" - Não era o único caminho. Os judeus mais estritos, para não
passar por Samaria, iam por um caminho mais longo, do outro lado do Jordão. Jesus não partilhava
dos preconceitos judaicos contra os samaritanos. Sua necessidade de passar por Samaria tinha relação
com Sua missão. L. Morrison destaca o fato de que a expressão "era-Lhe necessário" no Evangelho de
João é utilizada para referir-se à missão de Cristo (3:14; 9:4; 12:34; 20:9) e afirma que aqui reflete a
impulsora necessidade divina de que a luz chegue também aos samaritanos. A iniciativa da salvação
parte de Deus (Adão, onde estás? Zaqueu, convém ficar em tua casa, ...).

v. 5 - Sicar - bebedeira, embriagado - shikkor. Falsidade - sheker. Hoje, provavelmente, é


Ascar.

v. 6 - "Cansado" - humanidade de Jesus. "Cabia-Lhe a sorte da humanidade" (DTN, 163).

"hora sexta" - meio-dia.

v. 7 - A mulher samaritana - Talvez de má reputação.

"Dá-Me de beber" - Pedido irrecusável. Jesus pediu um favor, não ofereceu. O oferecimento
poderia ter sido rejeitado (DTN, 164).

v. 8 - Os discípulos tinham ido comprar alimentos. Era permitido negociar com os


samaritanos, em caso de necessidade.
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Evangelho de João
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v. 9 - "Como... tu... judeu?" - Razões do preconceito:

a. Assíria levou em cativeiro as dez tribos para outras terras e trouxe povos de outras terras
para seus antigos domínios (720 AC). Alguns dos habitantes do reino do norte, que não foram
exilados, casaram-se com os estrangeiros (um pecado imperdoável para qualquer judeu), perderam sua
identidade e o direito de serem chamados judeus.
b. Os estrangeiros trouxeram seus deuses, mas aos poucos foram agregados ao culto de Jeová.
c. Formaram um grupo peculiar em aspectos de crença, p. ex., criam apenas no Pentateuco.
d. Na reconstrução do Templo de Jerusalém, após o retorno de Babilônia, ofereceram-se para
ajudar, mas foram rejeitados. A inimizade tornou-se cada vez mais intensa, principalmente quando os
Samaritanos dificultaram a construção, fazendo intriga com os líderes persas, contra os judeus.
e. Samaritanos recusaram adorar em Jerusalém, e construíram seu próprio templo no monte
Gerizim em 400 AC.
f. A inimizade intensificou-se quando os judeus queimaram o templo dos Samaritanos em
129 AC. (cf. W. Barclay aca. do v. 9).

Os rabinos judeus diziam: "Nenhum homem deve comer o pão dos chuteus (samaritanos),
porque quem come do seu pão é como o que come carne de porco".

O Eclesiástico mostra a Deus dizendo: "Há duas nações que minha alma detesta, e a terceira
nem sequer é nação: os habitantes de Seir, os filisteus e o povo néscio que mora em Siquém" (50:25-
26). Siquém era uma famosa cidade samaritana.
Retrato de Jesus:

a. Caráter real de Sua humanidade. Cansado, esgotado, sedento. Jesus era Alguém para quem
a vida era um esforço, tal qual para nós.
b. O calor de Sua compaixão. Ela fugiria envergonhada de um líder religioso qualquer.
Porém, a Jesus era algo natural falar com a mulher. Por fim ela havia encontrado alguém que não era
um juiz, senão um amigo, alguém que não condenava, e sim compreendia.
c. Mostra a Jesus como Alguém que rompe barreiras. Não Se envolveu no preconceito
histórico entre judeus e samaritanos.
d. Derrubou mais outra barreira. A samaritana era uma mulher. Os rabinos estritos proibiam
que um rabino saudasse a uma mulher em público. Um rabi nem sequer podia falar em público com
sua própria mulher, sua filha ou irmã. Haviam fariseus que fechavam os olhos quando viam a uma
mulher na praça. Para um rabi, o fato de que o vissem falando com uma mulher em público significava
o fim de sua reputação e, sem dúvida, Jesus falou com esta mulher. Não somente era uma mulher; era
uma mulher cuja personalidade era conhecida. Nenhum homem decente, muito menos um rabi, se
deixaria ver em sua companhia ou falando com ela; mas Jesus lhe falou.

Para um judeu este relato era surpreendente. Aqui estava o Filho de Deus, cansado, esgotado,
sedento. Aqui estava o mais santo de todos os homens escutando compreensivamente uma triste
história. Aqui estava Jesus rompendo as barreiras do nacionalismo e do costume judeu ortodoxo. Aqui
está o começo da universalidade do evangelho; aqui está Deus amando o mundo de tal maneira, não
em teoria, mas sim em ação.

O CBA, 5:915, apresenta quatro etapas principais no processo usado por Jesus para alcançar e
salvar a samaritana:

a. Despertou o desejo de algo melhor - vv. 7-15.


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Evangelho de João
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b. Despertou a convicção de uma necessidade pessoal - 16-20
c. A exortação de reconhecer a Jesus como o Messias - 21-26
d. O estímulo a uma ação apropriada para a decisão - 28-30, 39-42.

Jesus chamou a atenção da mulher com o pedido: "Dá-Me de beber" (v. 7). Sua surpresa é
evidente com a resposta-pergunta do v. 9: "Como tu...?" Havendo conseguido assim sua atenção por
completo, Jesus despertou seu interesse com o oferecimento da água viva (v. 10). A reação dela
aparece nas perguntas "com que" tiraria tal água (v. 11), e se pretendia ser "maior" que Jacó, que havia
cavado o poço (v. 12). Partindo da atenção e do interesse, Jesus a induziu a desejar a "água viva",
declarando que o que bebe desta "não terá sede jamais" (v. 14). A mulher respondeu com o pedido:
"Senhor, dá-me dessa água" (v. 15), ainda que não compreendesse bem o que estava pedindo.
v. 10 - "Dom de Deus" - No Oriente, a água era chamada "o dom de Deus" (DTN, 163). O
dom de Deus é o próprio Jesus. O que é significativo em relação a Jesus não é que ele seja um "judeu"
e sim que Ele é "o dom de Deus" (João 3:16; II Cor. 9:15).

"Tu Lhe pedirias" - Tu podes satisfazer a Minha sede física, mas Eu posso satisfazer a sede de
tua alma.

"Água viva" - Gr. hudor zon - água fresca, água que flui ou água que dá vida.
v. 11 - "Senhor" - Gr. kyrios - Forma respeitosa de tratamento. Mudança: "Tu, judeu" para
"Senhor".
v. 12 - "És Tu maior que nosso pai Jacó?" - "Nosso" aqui significa samaritanos e não da
mulher e de Jesus. Judeus: És maior que Abraão? (8:53).
v. 13 - "Quem beber... tornará a ter sede" - "Aquele que busca dessedentar-se nas fontes deste
mundo beberá apenas para tornar a ter sede" (DTN, 165). Os desejos terrestres obtém satisfação
temporária. Toda a nossa vida é feita de desejos intermitentes e satisfação parcial, de paixão e
saciação. Os desejos humanos nunca são realmente satisfeitos. Nossas almas nunca repousarão até que
encontrem o repouso em Deus.
v. 14 - "Aquele que beber da água que Eu lhe der... nunca mais terá sede" - "Jesus não queria
dar a idéia de que um único sorvo da água da vida bastasse ao que a recebe. O que experimenta o amor
de Cristo, anelará continuamente mais; mas não busca nenhuma outra coisa. As riquezas, honras e
prazeres do mundo não o atraem" (DTN, 165).

"Fonte" - contraste com o "poço" dos esforços humanos que nunca podem satisfazer
realmente. Esta água satisfaz a sede que tem a alma de melhores coisas que a que esta vida oferece. "A
água que Eu dou se torna uma fonte, e a fonte se expande em um rio, e o rio se expande até se perder
no grande oceano da eternidade".

"Jorrar" - állomai - movimento tremendamente dinâmico. Usado para falar de paralíticos


curados que "pulam" (Atos 3:8; 14:10). A vida que Jesus dá é dinâmica.
v. 15 - "Dá-me dessa água" - "Ao falar Jesus da água viva, a mulher O olhou com atenta
curiosidade. Ele lhe despertara o interesse, e incitara o desejo de receber o dom de que falava. Percebia
não ser à água do poço de Jacó que Se referia" (DTN, 165).
v. 16 - "Chama teu marido" - Mudança abrupta. "Antes que essa alma pudesse receber o dom
que Ele ansiava conceder-lhe, seria preciso que fosse levada a reconhecer seu pecado e seu Salvador"
(DTN, 165). "Havia águas de pecado estagnadas que deviam ser eliminadas. A antiga vida de pecado
devia morrer antes que pudesse começar a nova vida de retidão. As duas não podem coexistir lado a
lado" ( CBA, 5:917 ).
v. 17 - "Não tenho marido" - Era verdade, mas não completamente honesto. Foi uma tentativa
de fuga.
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Evangelho de João
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"Bem disseste" - Jesus coloca as coisas na sua devida ordem, mas respeitando o que a mulher
disse, e enfatizando a palavra "marido".
v. 18 - "Cinco maridos tiveste, e esse que tens agora não é teu" - "A ouvinte tremeu.
Misteriosa mão estava voltando as páginas de sua vida, apresentando aquilo que esperava manter
sempre oculto. Quem era Esse que podia ler-lhe os segredos da vida? Acudiram-lhe pensamentos da
eternidade, do juízo futuro, quando tudo que é agora oculto será revelado. A esse clarão, despertou a
consciência" (DTN, 166).

O encontro com Cristo significa uma confrontação com o próprio passado. A mulher quis
ocultar seu passado, mas teve que admitir que havia estado vagueando de um marido para outro, até
possuir seis, sem nunca haver conseguido o verdadeiro senso de pertencer a algum. Estava
desorientada. O encontro com Cristo dá um novo sentido à vida.
v. 19 - "Profeta" - Começa a ter uma mais correta compreensão acerca dAquele que ali
estava.

Profeta nessa época não era apenas alguém que tinha uma mensagem de Deus para dar, mas
que tem um conhecimento particular do homem e de suas condições (I Cor. 14:24-25; Lc. 7:39).

Mas os samaritanos só admitiam dois profetas: Moisés e Aquele que viria semelhante a
Moisés - o próprio Cristo. A mulher está pelo menos entrando na área da especulação messiânica.
v. 20 - A mulher introduz a tradicional discussão religiosa entre judeus e samaritanos: Qual é
o verdadeiro lugar de adoração? Jerusalém ou Gerizim? Procurou desviar a conversa de uma verdade
desagradável para temas religiosos (detalhes teológicos). É o esforço para fugir da verdade ou buscar
pretextos para ignorá-la. Esperava "abafar a consciência" tocando em pontos de controvérsia religiosa
(DTN, 166).

Jesus recusou-Se a entrar na discussão racional que mulher apresenta. Não é o conhecimento
racional que produz as verdadeiras transformações da vida. O que produz as mudanças radicais que
uma vida cheia de sentido exige é a fé que une o poder de Deus com todas as forças humanas geradas
em uma nova atitude.
v. 21 - "Crê-Me" - "Não discutamos, aceite o que vou lhe dizer". Jesus solenemente exortou a
mulher a que se esquecesse das formas do culto e da controvérsia tradicional com os judeus acerca do
lugar de adoração. O culto divino não se restringiria a um determinado lugar: Jerusalém, Gerizim ou
qualquer outro lugar. Para o verdadeiro crente o mundo todo é um templo.

"Hora" - Os eventos da morte e ressurreição de Jesus colocam um fim no sistema de culto do


VT. Jesus passa a ser o novo templo (2:19-22), o novo e definitivo local em que se manifesta a glória
de Deus. Não haveria mais restrição a um local específico para adorar. Onde estiverem dois ou três
reunidos...
v. 22 - "Vós adorais o que não conheceis" - Os samaritanos firmaram os pés na base
estabelecida pelos "pais" no passado e não acompanharam a luz posterior de Deus. Ficaram, assim, nas
trevas, não desenvolveram a luz inicial; nem aceitavam nem os Escritos, nem os Profetas, só o
Pentateuco.

"Nós" - Jesus Se coloca como um judeu, reconhece sua nação como a dEle, e o seu Deus
como o dEle.

"Salvação vem dos judeus" - Judá - Davi - Messias.


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Evangelho de João
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Os samaritanos, por rejeitarem os Profetas, passaram a ignorar muitos dos propósitos de Deus
ligados a Davi e o estabelecimento de uma Nova Jerusalém, onde o Filho de Davi deverá reinar para
sempre.
v. 23 - "Mas" - Nada disso é importante agora. É chegada a hora de se dar uma correta
definição da verdadeira adoração.

"Em espírito e em verdade" - local e simbolismo não tem valor.


"Em espírito" - local: o íntimo. O essencial é o espírito correto de adoração.
"Em verdade" - a maneira correta.

"O Pai procura" - Iniciativa divina na salvação.


v. 24 - "Deus é espírito" - Não se descreve aqui o ser de Deus; em nenhum momento o
Evangelho de João atenta para tal tipo de definição. Tudo o que faz é especificar a esfera da ação de
Deus. Não é a esfera do mundo, nem a dos homens incrédulos. É na esfera de Deus que o homem pode
relacionar-se com Ele e adorá-Lo. Para isso, "é mister nascermos do divino Espírito" (DTN, 167).
v. 25 - "Eu sei que há de vir o Messias" - "Nela se começou a formar a convicção acerca de
Seu caráter. Surgiu-lhe no espírito a indagação: 'Não poderia este ser o tão longamente esperado
Messias'?" (DTN, 168).
v. 26 - "Eu o sou" - ego eimi - A busca da verdade chegou ao seu final. É possível encontrar-
se autenticamente com Deus e relacionar-se com Ele em Sua própria esfera. Essa possibilidade é
oferecida "agora"; já não é necessária a vida sem sentido, desorientada, errante, sem o senso de
pertencer. A mulher chegou a este ponto, não por intuição, ou conhecimento adquirido, mas por
revelação. "Eu sou o Messias".

"Ao ouvir a mulher estas palavras, a fé brotou-lhe no coração. Aceitou a maravilhosa


comunicação dos lábios do divino Mestre" (DTN, 168).
v. 27 - Discípulos admirados - conceito da mulher.
v. 28 - "Deixou o seu cântaro" - orgulho. "Eu tenho com que tirar água; eu posso lhe oferecer
água. Tu não tens como fazer o que somente eu posso fazer nesta situação".

Aplicação espiritual: A água do poço de Jacó não tem mais valor, desde que ela bebeu da
água da vida que lhe foi oferecida. Assim, ela deixou o seu cântaro, pois encontrara algo melhor.

"Foi à cidade... homens" - foi em busca de novos cântaros para serem enchidos pela água da
vida. Transformara-se, ela mesma, numa fonte a jorrar para a vida eterna.
v. 29 - "Vinde e vede" - Filipe e Natanael (1:46). Convite para participar de uma experiência.
Essa experiência ela mesma havia vivido.

"Tudo quanto tenho feito" - panta hosa epoiesa - Significa: o que fiz e está totalmente
acabado (o aoristo epoiesa deixa a ação definitivamente no passado e estabelece a sua interrupção para
sempre). Aqui ocorre a decisão da mulher. Ela nunca mais tornará a realizar as coisas más que estava
executando, cujo significado para a sua vida compreendeu completamente em seu encontro com
Cristo.

"Será este, porventura, o Cristo?" - meti houtos estin ho xristos - "Não é este o Cristo?" - A
construção grega da pergunta exige uma resposta afirmativa. O interrogado pode responder
negativamente, se assim o decide. No entanto, a maneira de construir a pergunta revela o pensamento
daquele que a formula. Sua tradução poderia ser mais clara da seguinte maneira: "Não é verdade que
este é o Cristo?" A mulher crê assim e convida aqueles homens para que também participem de sua
experiência e possam afirmar o que ela crê acerca daquele homem: Ele é o Cristo (Veloso, 118).
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Evangelho de João
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v. 39 - Ao que a mulher falou, João dá o nome de "testemunho". Isto mostra que o verdadeiro
encontro com Cristo produz um novo zelo e uma nova dedicação na vida. É interessante notar que a
mulher não dirige qualquer palavra de resposta a Jesus. Responde-Lhe com uma AÇÃO.

"Creram em virtude do testemunho" - Esta é a função do testemunho: conduzir almas a


Cristo.
v. 40 - "Vindo" - aoristo elthon - ação única. No Evangelho de João, basicamente, ir a Cristo
e ouvi-Lo implicam numa atitude de obediência.

"Pediam-Lhe que permanecesse" - meno - Discípulos no caminho de Emaús - novas


revelações.
v. 41 - "Outros creram por Sua palavra" - fé por testemunho e fé por meio da palavra.
Contraste: "Sua palavra" e a "palavra da mulher" (v. 39).
v. 42 - "Não é pelo que disseste que nós cremos" - Necessidade de conhecimento pessoal de
Cristo se se quer possuir uma experiência cristã autêntica.

"Temos ouvido" - akekoamen - o perfeito tem o sentido de algo que se iniciou no passado e
continua ininterruptamente, sem pôr limites temporais a sua ação. A fé por meio da palavra produz
uma obediência contínua.

"Salvador do mundo" - Título aplicado duas vezes a Cristo no NT: neste verso e em I João
4:14.

A conversão dos Samaritanos é o primeiro sinal da universalidade da salvação em Cristo.

vv. 46-54 - A Cura do Filho de um Oficial do Rei.

Este é o segundo sinal relatado no Evangelho de João. Alguns crêem que seja o mesmo dos
Sinóticos (servo do Centurião). As diferenças indicam ser um acontecimento distinto um do outro:

CENTURIÃO OFICIAL DO REI

Pagão Judeu
Escravo Filho
Capernaum (Jesus estava) Caná
Fé admirável (Jesus louva) Fé superficial.
Denuncia
"Não venha a minha casa" "Venha a minha casa"
Paralisia Febre
Anciãos intercedem pelo homem. O próprio homem pede.

Em comum o fato de que é uma cura à distância.


v. 46 - "Oficial do rei" - basilikós - pertencente ao rei, oficial real ou alguém de sangue real.
A palavra pode inclusive significar que era um rei menor (cf. Barclay. Com. do Ev.). Aqui designa a
alguém que ocupava uma posição proeminente na corte de Herodes. Por outro lado, Jesus não tinha
maior status que o de ser o filho do carpinteiro da aldeia de Nazaré. Além disso, Jesus estava em Caná,
e este homem vivia em Capernaum, distante cerca de 30 km de Caná.
v. 47 - "Foi ter com Jesus" - "...o nobre possuía certo grau de fé..." "Ao ver apenas um
homem simplesmente vestido, poento e exausto da viagem, vacilou-lhe a fé. Duvidou que esse
Homem pudesse realizar o que viera pedir-Lhe;..." (DTN, 176).
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Evangelho de João
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"Filho... estava à morte" - lit. "estava para morrer" - iminência e certeza.


v. 48 - "Jesus lhe disse" - Reprovação. O nobre havia estabelecido condições para crer em
Jesus. "A menos que sua petição fosse atendida, não O havia de aceitar como o Messias" (DTN, 176).

"Sinais" - com o sentido de milagres.

"Prodígios" - o sobrenatural, o puro milagre.

Na atitude da multidão o milagre é um fim em si mesmo. Para Jesus é um meio de revelar


uma verdade mais profunda e que transcende ao próprio milagre.

"Jesus tinha um dom ainda maior para conceder. Desejava não somente curar a criança, mas
tornar o régulo e sua casa participantes das bênçãos da salvação..." (Ibidem).

v. 49 - "Rogou-lhe o oficial" - "Sua fé apoderou-se de Cristo" (DTN, 177).


"Antes que meu filho morra" - Urgência da situação. A "descida" de Jesus livraria o filho de
morrer; a "descida" de Jesus do céu a esta terra livra a todos os Seus filhos de morrerem.
v. 50 - "Vai; o teu filho vive".
"O homem creu na palavra" - logos - palavra dinâmica. Quando Jesus fala alguma coisa
sempre acontece. Tudo o que o oficial teve para se apegar foi a palavra de Jesus. A palavra proferida
por Jesus, neste caso, equivale ao ato de descer e curar o menino.
v. 51 - "Descia" - quando? No mesmo dia? Só na manhã seguinte chegou a Cafarnaum (DTN,
177).

"O seu filho vivia" - Mas não estava vivo enquanto estava doente? Significa "está curado".
Antes estava vivo, mas agora "vive".
v. 52 - "A que horas" - Não está surpreso com a notícia da cura do filho, mas se interessa em
saber a que horas a criança havia melhorado. E foi exatamente na hora em que "a fé se apegara à
afirmação de Jesus: 'Teu filho vive', o divino amor tocara a moribunda criança" (DTN, 178).
v. 53 - Resultado: "Creu ele e toda a sua casa".

Capítulo 5

Nos capítulos 5 e 6, o tema principal é a recepção da vida. Apresenta o Doador da vida em


ação e a maneira como o homem a recebe.

O capítulo 5 tem quatro seções:

a. A cura do paralítico (5:1-9a);


b. A discussão entre os judeus e o ex-paralítico, pelo fato da cura ter sido realizada no
sábado (9a-16);
c. A defesa de Cristo, com base no fato de que Suas obras são iguais às do
Pai (17-30);
d. Continua a defesa de Cristo baseada na validade de Suas
testemunhas (31-47).

v. 1 - Festa dos judeus - Páscoa, segundo o CBA.


v. 2 - Betesda - O nome deste lugar aparece em diferentes formas em vários manuscritos:
Bethesda, Bethzatha, Belzetha e Bethsaida, e a evidência textual em favor de cada uma destas variantes
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Evangelho de João
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tem sua importância. Sem dúvida, a evidência textual sugere o texto Bethzatha.

O nome Betesda poderia provir do aramaico beth jesda', "casa de misericórdia", ou de beth
'esda, "casa do derramamento".
v. 3 - A multidão de enfermos - Pelo fato de se atribuírem poderes curativos ao movimento
das águas do tanque havia tal multidão esperando a oportunidade de entrar na água para serem
curados. Os mais fortes atropelavam os mais fracos e muitos morriam, em vez de encontrar a cura
(DTN, 179).
v. 4 - A evidência textual tende a confirmar a omissão deste verso.

Anjo agitava a água - A agitação da água era real e pode explicar-se facilmente como um
fenômeno natural. Várias das fontes de Jerusalém são intermitentes, isto é, a água flui em grande
volume e logo cessa. Se o tanque de Betesda era suprido por uma destas fontes, a pressão da água
poderia facilmente agitar a calma do tanque.

O primeiro a chegar ao tanque a cada vez que se agitava a água aparentemente se curava;
porém, os dons de Deus são igualmente para todos os que estão em condições de recebê-los. Além
disso, a cura se efetuava só periodicamente. Os princípios implícitos neste registro dessas "curas" no
tanque parecem estranhamente diferentes dos princípios mediante os quais Jesus efetuava Seus
milagres (CBA, 5:926).
v. 5 - "Enfermo há 38 anos" - Enfermidade crônica e não algo temporário. Qualquer
restabelecimento seria por milagre.
v. 6 - "Jesus, vendo-o" - Quando Jesus vê a alguém sofrendo, move-se de íntima compaixão
pelo sofredor.

"Sabendo" - Jesus sabe tudo acerca dos homens: suas necessidades, suas aflições, seus
desejos, etc.

"Queres ser curado?" - Deus não pede nada do homem. Sempre está oferecendo algo para o
homem. Aquilo que é mais precioso, Ele está disposto a conceder. A palavra "curado" aparece várias
vezes no relato, em todos os casos com o sentido de plena restauração. A saúde faz parte da vida, que
por sua vez é um dom de Deus. Por esta razão, considera-se que o enfermo não está completo, perdeu
uma parte de seu próprio ser, perdeu uma parte do dom de Deus. Sua vida já não é a totalidade que
saiu das mãos de Deus.

A primeira coisa que se necessita para receber o poder de Jesus é um desejo intenso desse
poder. Jesus vem a nós e diz: "Realmente queres mudar?" Se bem no íntimo estamos contentes em ser
como somos, não pode haver nenhuma mudança. O desejo pelas coisas superiores deve inflamar nosso
coração.
v. 7 - É evidente que o paralítico compartilhava a crença comum das propriedades
terapêuticas da água agitada. Assim, encara o oferecimento de Jesus em termos de suas próprias idéias.
v. 8 - "Levanta-te, toma o teu leito e anda" - O mesmo poder e a mesma coisa que ocorreu
quando disse: "Haja luz. E houve luz" (Gên. 1:3), ocorre agora com o paralítico.

"Levanta-te" - Jesus estava ordenando o impossível. O homem poderia haver dito, com
ressentimento e dor, que era exatamente isto que não podia fazer.

"Toma o teu leito" - O homem poderia haver dito que durante trinta e oito anos a cama o
esteve levando e que não tinha muito sentido dizer-lhe que levasse a cama.
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Evangelho de João
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A fé do paralítico apoderou-se das palavras de Jesus. "Cada nervo e músculo vibra de nova
vida, e a energia da saúde enche-lhe os membros paralisados. Sem duvidar, determina-se a obedecer à
ordem de Cristo, e todos os músculos obedecem-lhe à vontade" (DTN, 180).

"Jesus não lhe dera nenhuma certeza de auxílio divino. O homem se podia haver detido a
duvidar, perdendo a única oportunidade de cura. Creu, porém, na palavra de Cristo, e agindo sobre ela,
recebeu a força" (Ibid.).
v. 9 - "Imediatamente o homem se viu curado" - Produziu-se a restauração física de forma
imediata e somente pelo efeito da palavra pronunciada por Cristo. A restauração espiritual também
começa a ser produzida com a obediência do paralítico que tomou a sua cama e partiu. Depois, Cristo
libertou-o do pecado como causa de sua fracassada existência (v. 14).
Com Cristo conquistamos aquilo que durante muito tempo nos tem conquistado.

"Leito" - Apenas uma esteira e um cobertor. O Mishnah admitia que se podia carregar um
leito no sábado, mas somente se houvesse alguém sobre ele.

vv. 9b-16 - A Discussão Sobre a Cura no Sábado.

O paralítico obedeceu a todas as ordens de Jesus. Sua obediência não é expressa com
palavras, mas com as ações que realiza. Não diz com palavras que crê ou que obedece. Mas suas ações
revelam que creu e obedeceu.

v. 10 - "Judeus" - parte do sistema em Jerusalém.

"Hoje é sábado e não é lícito carregar o leito" - O interesse era na questão em si: carregar o
leito. "Mas eu estava enfermo há 38 anos! Não era isto uma carga extremamente pesada?" Desde esse
ponto de vista, vê-se quão ridícula era a observação dos fariseus.
v. 11 - "O mesmo que me curou" - diferente da mulher samaritana, a quem havia Se revelado
como o Messias. O homem só conhecia as obras de Jesus, por isto disse "O meu curador". É baseado
na autoridade de quem me curou que eu carrego o leito.
v.12 - "Quem foi o que te disse: Toma o teu leito...?" - A ênfase é colocada no ato - levar o
leito - e não na Pessoa que realizara tal maravilha. Eles não perguntaram: "Quem foi que te curou?"
Maior preocupação com as coisas do que com a pessoa. Na verdade, eles sabiam Quem havia feito tal
coisa (DTN, 181).
v. 14 - Jesus e o ex-paralítico no templo. O homem foi ao templo oferecer uma oferta pelo
pecado e outra de ações de graça (DTN, 182).

"Não peques mais, para que não te suceda coisa pior" - Até esse momento Jesus não havia
relacionado Sua ação com a vida passada do paralítico. Simplesmente havia considerado sua
necessidade e a situação na qual se encontrava junto ao tanque de Betesda. Mas, nesse momento, devia
reconstruir-lhe um presente tal, que o amanhã fosse um passado livre de pecados. Com isto Jesus não
quis dizer que todas as enfermidades têm como causa o pecado, mas que a enfermidade deste homem
fora causada pelo seu pecado (DTN, 179); coisa que não ocorre com o cego de nascimento (9:2).
v. 15 - "Disse aos judeus" - Não foi uma delação. EGWhite diz que o homem era "ignorante
da inimizade" que os fariseus nutriam contra Jesus (DTN, 182).
v. 16 - "Judeus perseguiam... porque Jesus fazia" - A perseguição dos fariseus começou por
causa das coisas que Jesus fez no sábado. "Coisas" no plural, porque Jesus: a. Jesus curou o homem no
sábado; b. ordenou-lhe que carregasse a cama, ou seja, quebrar uma lei rabínica.

"Fazia" - epoiei - O mesmo verbo usado pela LXX para o ato da criação. Aqui está no
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Evangelho de João
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imperfeito - indica uma atitude habitual. Segundo os Sinóticos, Jesus fez várias curas no sábado.

Jesus enfrenta duas acusações: a. quebrar o sábado e; b. fazer-Se igual a Deus. Contra a
primeira, Sua defesa se baseia no fato de que Ele realiza as mesmas obras que Deus realiza no sábado
(João 5:17-30). Contra a segunda, apresenta a existência de testemunhas que confirmam Sua igualdade
com Deus (31-47).

A defesa de Cristo contra quebrar o sábado é exposta em quatro seções:

a. A primeira mostra que a obra de Cristo é exatamente a mesma que o Pai realiza
continuamente, inclusive no sábado (17-20);
b. A segunda explica em que consiste esta obra que Deus realiza constantemente: dar vida e
exercer juízo (21-23);
c. Na terceira, aparece uma explicação sobre a obra de dar vida (24-26);
d. A quarta é uma explicação da obra de exercer juízo (27-30).
v. 17 - "Ele lhes disse" - Gr. apekrínato - O sentido é responder pública e formalmente a uma
defesa. O significado é: "Ele fez Sua defesa" ou "Ele Se defendeu". Esta é a única vez em todo o
Evangelho de João que Jesus Se defende formalmente.

"Meu Pai" - Na literatura judaica intertestamentária, Deus é chamado de Pai dos judeus. Mas
aqui Jesus diz que Deus é Seu Pai num sentido muito especial. Os judeus compreenderam o que Jesus
queria dizer, pois procuravam matá-Lo (v. 18). A relação Pai-Filho entre Deus e Jesus é uma relação
de igualdade.

"Trabalha até agora" - Com estas palavras Jesus não Se referiu à obra da criação ou que o Pai
ainda está trabalhando nela. A obra criadora de Deus terminou quando Ele descansou no sétimo dia da
criação (Gên. 2:1-3). O Evangelho de João ensina que a obra criadora de Deus corresponde a um
tempo passado, que é descrito com a expressão "No princípio" (1:1). O verbo usado por João (1:3) e
Paulo (Col. 1:16) está no aoristo, indicando uma ação acabada.
Jesus identificou-Se com o Pai na obra salvadora. A defesa de Jesus diante de Seus inimigos
poderia ser expressa assim: "Não vos confundais, estou fazendo a mesma obra que o Pai realiza
continuamente. Estou ocupado na salvação dos homens.

vv. 21-23 - Em que consiste o contínuo atuar de Deus?

v. 21 - "O Pai ressuscita e vivifica os mortos" - O contínuo trabalho de Deus não é a obra da
criação, e sim dar vida e fazer juízo (v. 22).

O trabalho de dar vida e de fazer juízo o Pai entregou nas mãos do Filho. Por esta razão, o
Filho "dá vida aos que quer".

O Pai ressuscita e vivifica, inclusive no sábado. O Filho tem provado, por Sua curas, que
pode vivificar e dar vida eterna aos que nEle crêem. Por esta razão Ele diz ao paralítico não pecar
mais.
v. 22 - "O Pai confiou ao Filho todo o julgamento" - "Os sacerdotes e principais haviam-se
arvorado em juízes para condenar a obra de Cristo, mas Ele Se declarou juiz deles próprios, e de toda a
Terra" (DTN, 189).
v. 23 - Objetivo de Deus ter dado o julgamento ao Filho: que todos honrem o Filho como
honram o Pai. A única maneira de honrar o Pai é honrando o Filho.
v. 24 - "Em verdade, em verdade" - Duplo amém. Solene declaração.
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Evangelho de João
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"Quem ouve e crê" - Mostra a estreita relação entre o ouvir e o crer. Ouvir sem crer não tem
valor.

"Tem vida eterna" - Esta declaração é mais que uma promessa de vida futura. É uma
afirmação de que o crente, aqui e agora, pode começar a desfrutar vida eterna porque está unido
espiritualmente a seu Senhor, de cuja vida compartilha.
v. 25 - "Em verdade, em verdade" - duplo amém.

"Vem a hora" - Refere-se à ressurreição literal futura.

"E já chegou" - Ressurreição da morte espiritual, mediante o ouvir a mensagem de Jesus e


viver (v. 24).

"E os que a ouvirem" - existem os que não ouvem.


v. 26 - "O Filho tem vida em Si mesmo" - Em Cristo há vida original, não emprestada, não
derivada.
v. 27 - autoridade - eksousian.

"Filho do homem" - "Como Ele tenha provado as própria fezes do cálice da aflição e tentação
humanas, e compreenda as fragilidades e pecados dos homens; como tenha, em nosso favor, resistido
vitoriosamente às tentações de Satanás, e lidará justa e ternamente com as almas para cuja salvação
derramou o próprio sangue - como assim seja, o Filho do homem é indicado para exercer o juízo"
(DTN, 190).
vv. 28-29 - A Ressurreição Final - Será uma ressurreição de juízo, porque mesmo que todos
os que estão nos sepulcros ouçam a Sua voz, somente os que fizeram o bem sairão para a ressurreição
da vida. Em troca, os que fizeram o mal, sairão para a ressurreição da condenação. De qualquer
maneira, esta situação é antecipada, porque Ele já está exercendo o poder de dar vida.
O paralítico foi restabelecido à plenitude da vida e isto é o que acontecerá no dia final quando
os que fizeram o bem ressuscitarão para a vida eterna.
v. 31 - Alusão a Deut. 19:15 - pelo menos duas testemunhas são necessárias; Jesus tem
quatro:

a. O testemunho de João - 32-35;


b. Os milagres, que não podiam ser ignorados - 36;
c. O Pai - 37;
d. As Escrituras (39) e, especialmente, os escritos de Moisés, a quem os judeus reconheciam
como sua grande autoridade - 45-47.
v. 40 - "Não quereis" - A recusa é deliberada (Mt. 23:37).
Incoerência:

v. 39b v. 40 v. 39c - Razão:


Zelo para Não quer vir As mesmas Escrituras que são pesquisadas
ser salvo a Jesus para para se obter vida testificam que o meio
ser salvo. de se obter vida é indo a Cristo. E isto
eles não fazem.
v. 41 - "Eu não aceito glória que vem dos homens" - Jesus não
recebe a glória dos homens porque recebê-la significaria declarar-Se dependente deles e de seus
critérios, com o que Jesus ficaria submetido à esfera humana. "Não era a influência do Sinédrio, não
era sua sanção que Ele desejava. Não podia receber honra alguma da aprovação deles. Achava-Se
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Evangelho de João
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revestido de honra e autoridade do céu" (DTN, 192).
v. 42 - A esfera divina está baseada no amor de Deus. Pelo fato de os fariseus não terem o
amor de Deus, eles não atuam dentro da esfera divina e nem recebem a Jesus (v. 43).
v. 43 - "Se outro vier" - allos (outro da mesma espécie) - Um qualquer, professando ser o que
Eu sou (falsos cristos, anticristo).
v. 44 - A Insegurança da Glória Humana. Receber a Cristo significa crer. Isto é o que permite
aos homens sair da esfera humana e entrar na esfera divina, mas os incrédulos preferem manter-se
dentro de seus próprios critérios de segurança e recebem glória uns dos outros. Entretanto, essa
segurança humana é absoluta insegurança. Por buscarem constantemente um a glória do outro, os
homens sofrem permanentemente a necessidade de ser aceitos pelos demais. Toda sua experiência é
baseada na busca de reconhecimento que demonstra sua insegurança da vida. Se Jesus buscasse a
glória dos homens aceitaria para Si mesmo esse estado de insegurança e, portanto, Sua igualdade com
Deus seria destruída. Jesus não busca nem aceita para Sua obra a segurança construída pelos homens.
Ele aceita somente a glória que vem do Deus único; por esta razão permanece na esfera divina e Sua
igualdade com Deus permanece inalterável.

vv. 45-47 - A Falsa Segurança do Incrédulo.

v. 45 - Jesus conduz a posição dos fariseus a Moisés, em cujos escritos firmaram a confiança (
elpikate - perfeito: contínua ação de ter esperança em Moisés).
v. 46 - Na verdade não criam no que Moisés escreveu, pois, se crêssem, teriam aceitado a
Jesus, porque ele falou a Seu respeito.
v. 47 - "Se não credes" - O defeito dos fariseus é a sua descrença. Nem sequer creram nos
escritos de Moisés. Por esta razão estes escritos se transformaram em seus próprios acusadores.
Depositaram sua "esperança" em Moisés, mas não desenvolveram o desejo de crer em seus escritos.

Capítulo 6

O capítulo 6 de João apresenta a Cristo como o Pão da Vida. Seu conteúdo pode ser dividido
em oito partes:

a. O milagre da multiplicação dos pães e peixes - 1-15;


b. A viagem de regresso a Capernaum e Jesus andando sobre o mar- 16-21;
c. A multidão novamente buscando a Jesus - 22-24;
d. Introdução ao sermão sobre o Pão da Vida - 25-34;
e. Discurso sobre o Pão da Vida - 34-40;
f. Continuação do discurso - 41-51;
g. Conclusão do discurso - comer a carne - beber o sangue - 52-59;
h. A crise como resultado do sermão - 60-71.

O milagre da multiplicação dos pães é o único incidente do ministério público de Jesus,


anterior à Sua última visita a Jerusalém, registrado pelos quatro evangelhos (cf. Mt. 14:13-21; Mc.
6:30-44; Lc. 9:10-17).

v. 1 - "Mar da Galiléia... Mar de Tiberíades" - A cidade de Tiberíades (homenagem a Tibério)


foi fundada por Herodes Antipas em 26 AD, e introduziu-se o costume de nomear o lago com o nome
da cidade.
v. 2 - "Seguiu-O porque viram os sinais" - João apresenta a razão pela qual O seguiram. Eles
"viam" continuamente os milagres de Cristo. Eram espectadores. Não eram crentes. A fé não havia
amadurecido neles.
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v. 5 - Jesus prova os discípulos. "Onde compraremos pão?" Assim Ele disse para provar a fé
de Filipe (DTN, 349).
v. 6 - Jesus sabia o que iria fazer.
v. 7 - "Duzentos denários" - Um trabalhador ganhava um denário por dia (Mt. 20:2). Isto
significa que o salário de duzentos dias de uma pessoa não teria sido suficiente.
vv. 8-9 - De sua parte André também expressa a incapacidade do grupo apostólico de suprir a
necessidade de alimento. Informa que somente podem dispor de cinco pães e dois peixes que vira com
um menino.

"Pães de cevada" - Cereal de animais e pessoas pobres.

"Peixes" - Gr. opsária - "peixinho".

Ênfase na pequenez dos recursos humanos e a grande necessidade.

É estranho que nenhum dos discípulos tenha pensado na possibilidade de que Cristo pudesse
realizar alguma coisa extraordinária para alimentar a multidão. Eles já haviam visto milagres como o
que ocorrera nas bodas de Caná, no qual Cristo demonstrara Sua capacidade de suprir as necessidades
humanas. De qualquer modo, este fato torna mais que evidente a incapacidade humana, inclusive de
resolver os problemas comuns da vida.
v. 11 - "Tomou os pães e, tendo dado graças, distribuiu-os entre eles" - Semelhança com a
santa ceia. Entregou aos discípulos e os discípulos entregaram ao povo (DTN, 350).

"Quanto queriam"; "estavam fartos" e "sobraram" (v. 12). Contraste com a pequenez humana
(v. 9). Pela palavra de Jesus, abundância em lugar de escassez. No VT foi feita a promessa de
abundância (Sal. 37:19; 81:16; 132:15: Isa. 49:9; 25:6; 65:13).
v. 12 - "Recolhei" - Maná - abundância sem desperdício (Êxo. 16:16 ss). Uma dupla lição:
"Coisa alguma se deve perder. Não devemos deixar escapar nenhuma vantagem temporal. Não
devemos negligenciar nada que possa beneficiar um ser humano. Reúna-se tudo que minore a
necessidade dos famintos da Terra. E o mesmo cuidado deve presidir às coisas espirituais. Ao serem
recolhidos os cestos de fragmentos, o povo pensou em seus queridos em casa. Queriam que
participassem do pão que Cristo abençoara. O conteúdo dos cestos foi distribuído entre a ansiosa turba,
sendo levado em todas as direções ao redor. Assim os que se tinham achado no banquete deviam levar
a outros o pão que desce do Céu, para satisfazer a fome da alma. Cumpria-lhes repetir o que haviam
aprendido das maravilhosas coisas de Deus. Coisa alguma se devia perder. Nenhuma palavra que dizia
respeito a sua salvação eterna devia cair inútil" (DTN, 351).
v. 14 - "Vendo... o sinal" - Viram o sinal em si e não o que ele significava.

"Homens" - anthropoi = o povo (homens, mulheres e crianças).

"Profeta" - aquele predito por Moisés (DTN, 358).


v. 15 - "Arrebatá-Lo... proclamá-Lo rei" - Até os discípulos se uniram ao povo (DTN, 359).
Objetivos terrenos, temporais. Isto frustraria o plano de Jesus.

"Retirou-Se, sozinho, para o monte" - Uma falsa concepção a respeito de Cristo sempre
provoca uma separação dEle. Esta foi a experiência da multidão. Jesus retirou-Se para o monte. Só.
vv. 16-21 - Jesus anda por sobre o mar.

O "estádio" equivale a uns 200 metros (Bruce); eles tinham remado uns cinco ou seis
quilômetros. A maior medida do lago é de 61 estádios de largura e 109 de comprimento (Brown).
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Evangelho de João
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Alguns comentaristas pensam que Jesus não andou sobre o mar e sim caminhava pela margem (p. ex.,
W. Barclay). Na verdade, a frase epi tes thalasses pode ter este sentido quando o contexto o exige
(como em 21:1), mas o relato Sinótico usa os mesmos termos neste incidente (Mt. 14:26, Mc. 6:48ss),
onde, com certeza, o sentido é sobre o mar. João não costuma disfarçar o elemento milagroso na
narrativa do seu Evangelho. Além disso, não haveria razão para medo se os discípulos vissem Jesus
andando ao seu lado no mar; eles gritaram porque O viram andando sobre o mar, porque pensaram
(como percebemos em Mc. 6:49) ser um fantasma.

"Escuro... mar empolado... águas agitadas por um grande vento... temor" - Contraste com o
dia perfeito que tiveram os discípulos. Estas expressões revelam um estado interior de insegurança,
ansiedade, incerteza e desequilíbrio emocional. Tudo isto como resultado da separação produzida no
outro lado do lago. Ficaram confusos e não souberam interpretar a realidade como ela realmente era:
viram a Jesus e pensaram que fosse um fantasma.

A narrativa é um sinal e a verdade que se esconde por detrás deve ser procurada no sentido de
águas revoltas ou rugidoras, como inimigos do povo de Deus no campo espiritual - forças demoníacas
e humanas que se opõem a Deus e a Seu povo. No caso dos discípulos, impedindo-os de cumprirem a
ordem de Jesus (Mt. 14:22 - levaram quase a noite toda para navegar 5 ou 6 km - Jesus os encontrou
na quarta vigília da noite - aproximadamente 3 horas da manhã).

No Apocalipse: a. Besta que sobe do mar;


b. Mar - multidões onde se assenta a besta;
c. Nova Terra - o mar já não existe.

No VT: a. Isa. 27:1; Hab. 3:15;


b. A experiência de Jonas; Os. 6:2;
c. O Mar Vermelho.
"Sou Eu" - A expressão em si mesma é neutra, mas o Evangelista a tem tomado e feito dela a
forma do divino nome que o Pai tem dado a Jesus e pelo qual Ele Se identifica. É provável que João
interprete a cena como uma divina epifania, centrada na expressão ego eimi. Este foi um milagre que
deu expressão à majestade de Jesus, semelhante à Transfiguração. Foi uma resposta de Jesus ao
desapontamento dos discípulos, ao impedir que a multidão O proclamasse rei. Ele é rei, num sentido
muito mais amplo; é rei até sobre a natureza.

Que papel desempenha este milagre em relação à multiplicação dos pães e o restante do
capítulo? Até certo ponto, o evangelista o usa para corrigir a inadequada reação da multidão à
multiplicação. Impressionados pelo caráter maravilhoso daquele sinal, eles se dispuseram a aclamá-Lo
como um messias político. Mas Ele é muito mais do que se pode expressar pelos títulos tradicionais de
"o Profeta" e rei; o andar sobre a água é um sinal de que o que Ele é somente pode ser expressado
plenamente pelo divino nome "Eu sou" (Brown).

A experiência de andar sobre o mar tem ligação com a travessia do Mar Vermelho ao tempo
do Êxodo. A travessia do Mar e o dom do maná estão associados. Assim, a multiplicação dos pães está
para o maná, como o andar sobre o mar está para a travessia do Mar Vermelho. Só que aqui o mar não
se abre, mas Jesus anda sobre as águas. De qualquer forma, Ele é Senhor das águas.
v. 21 - "De bom grado O receberam" - Ressalta a mudança de atitude dos discípulos ao
ouvirem as palavras de Jesus. A presença de Jesus elimina o medo, a insegurança, a confusão.

"Logo chegaram" - outro milagre?


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Evangelho de João
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Lições:
1. Jesus vigia. "Jesus não os esquecera. O Vigia vira, da praia, aqueles homens possuídos de
temor, em luta com a tempestade. Nem por um momento perdeu de vista os discípulos" (DTN, 361).
Vivemos a vida com o olhar amoroso de Jesus sobre nós.

2. Jesus vem. "No momento em que se julgavam perdidos, o clarão de um relâmpago revela-
lhes um misterioso vulto que deles se aproxima, vindo sobre as águas" (DTN, 362). Jesus não nos
observa, simplesmente, conservando-Se distante. No momento em que as forças estão por terminar e a
vida parece demasiado difícil, Ele vem, e com Ele, a vitória.

3. Jesus ajuda. Vigia, vem e ajuda. Não estamos sozinhos em nossas lutas; Ele está ao lado
para lutar conosco.

4. Jesus nos leva ao porto. Ver Salmo 107:30.


vv. 22-24 - Transição para o Discurso Sobre o Pão da Vida.

A multidão retirou-se e no dia seguinte voltaram de Tiberíades esperando encontrar a Jesus


ainda em Betsaida. Mas sua busca foi infrutífera. Jesus não estava ali. Entraram novamente em seus
barcos e foram a Capernaum "em busca de Jesus" (v. 24).

Entretanto, uma multidão reuniu-se em torno de Cristo em Capernaum. A ela agregar-se-á


mais tarde o grupo que havia participado do milagre no dia anterior e que agora está buscando a Jesus.
Harmonizar esta parte do texto não é fácil, mas a solução parece ser que uma multidão se reuniu em
Capernaum e juntou-se a ela a que vinha do outro lado do lago.

v. 23 - "Comeram o pão, tendo o Senhor dado graças" - Segundo M. Veloso, isto refere-se
diretamente à Santa Ceia ou Eucaristia. Ressalva, contudo, que aqui não se apresenta uma teologia
completa da Santa Ceia.
vv. 25-34 - Prefácio ao Discurso Sobre o Pão da Vida:
A Fé como Obra de Deus.

v. 25 - "Mestre" - A aplicação deste título a Jesus ilustra o conceito equivocado do


povo com respeito a Jesus e Sua obra.

"Quando chegaste aqui?" - EGWhite diz que, com esta pergunta, "esperavam receber, de Seus
próprios lábios, uma segunda narração do milagre", pois já haviam ouvido dos discípulos (DTN, 366).
v. 26 - "Amen, amen" - solene declaração. Jesus não satisfez a curiosidade do povo. Mostra
que a motivação deles em procurá-Lo não era digna. Esperavam receber mais bênçãos temporais. O
verdadeiro significado da multiplicação não fora percebido por eles. No v. 14 lemos que eles "viram o
sinal", portanto, só a ação externa. De acordo com a narrativa Sinótica, mesmo os doze "não haviam
compreendido o milagre dos pães, antes o seu coração estava endurecido" (Mc. 6:52; cf. Mc. 8:14-21).
O que estava sob a superfície do milagre, João traz à tona, ao registrar o discurso sobre o Pão da Vida.
"Comestes dos pães" - Jesus não encontra aqui o menor grau de fé; nem mesmo a fé por se
ver "sinais". O interesse é meramente material. Em vez de verem no pão o sinal, vêem no sinal apenas
os pães.

"Fartastes" - chortazesthai - Vieram por causa de um estômago cheio, e não por um coração
cheio.
v. 27 - "Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela que subsiste para a vida eterna".
62

Evangelho de João
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O contraste entre alimento perecível e espiritual é semelhante ao contraste entre água material
e espiritual (4:10ss). Assim como a água do poço de Jacó não podia dar o refrigério à alma como a
"água viva" faz, também o alimento que "perece" pode sustentar a vida física, mas não transmitir vida
eterna. Assim como no capítulo 4 Jesus é Aquele que dá a água que jorra para a vida eterna naqueles
que a recebem, também aqui Ele é quem dá o alimento cujas propriedades fazem com que aqueles que
comem dele nunca mais tenham fome.
A multidão pensa somente em coisas. Representam uma busca limitada. Jesus indica-lhes que
sua busca deve ter um sentido superior à simples obtenção da comida e das coisas do viver diário.
"Trabalhai pela comida que subsiste para a vida eterna". Esta multidão, como toda a humanidade, está
sempre ocupada em conseguir a comida que perece, e as coisas que dizem respeito à vida natural daqui
e do momento. Permanecem com um vazio constante, e com uma ansiedade de busca que nunca chega
ao fim.

Este vazio de sentido provoca o desejo, sempre presente, de possuir mais e mais. Mais coisas,
mais bens, mais de tudo aquilo que faz parte da rotina diária. A multidão comera do pão milagroso,
mas vinha à procura de algo mais. Sua busca era falsa porque não havia captado o significado dos
fatos. Somente havia recebido os benefícios materiais. Mas as coisas materiais chegam ao seu fim e a
necessidade da multidão torna a surgir, como o apetite saciado torna a aparecer tão intensamente como
antes.

"Não busqueis meramente benefícios materiais. Não seja vosso primeiro esforço o prover o
necessário à vida atual, mas buscai o alimento espiritual, isto é, a sabedoria que permanece para a vida
eterna" (DTN, 366).

"O Filho do homem vos dará" - Este é freqüentemente um título escatológico, e o uso aqui
provavelmente reflete a escatologia realizada Joanina. Se lemos "dará" ou "dá", o alimento que
permanece para a vida eterna é em parte um dom presente, assim como a vida eterna é um dom
presente. Estas realidades celestiais são realizadas no ministério de Jesus.

Jesus pode satisfazer as "fomes" da humanidade:

a. A fome da verdade - e somente Ele pode dar a verdade aos homens - Eu sou a verdade.
b. A fome da vida - e somente Ele pode dar vida aos homens e o faz em abundância - Eu sou
a vida.
c. A fome do amor - somente Ele pode dar aos homens o amor que supera ao pecado e à
morte.
d. Cristo é o Único que pode satisfazer os anelos de imortalidade e a fome insaciável do
coração humano.

"Porque Deus, o Pai, o confirmou com o Seu selo" - Os rabinos tinham uma frase: "O selo de
Deus é a verdade". O Talmude diz: "Um dia a grande sinagoga (a assembléia dos judeus eruditos em
leis) estava se lamentando, orando e jejuando, quando caiu um pequeno rolo do firmamento, no meio
deles. Abriram-no e só continha uma palavra, Ameth, que significa "verdade". 'Este', disse o rabino, 'é
o selo de Deus'." Ameth se escreve com três letras hebraicas: aleph, que é a primeira letra do alfabeto,
min, a letra do meio, e tau, a última. A verdade de Deus é o princípio, o meio e o fim da vida.

É por isto que Jesus pode satisfazer a fome dos homens, porque tem o selo de Deus, é a
verdade de Deus encarnada. Vê-Lo é ver a Deus; obedecer-Lhe é obedecer a Deus; recebê-Lo é
receber a Deus; e Deus é o único que pode satisfazer a fome do homem, que Ele mesmo criou, e no
qual colocou fome por Ele.
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Evangelho de João
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v. 28 - "Que faremos para realizar as obras de Deus?"

"Tinham estado a realizar muitas e enfadonhas obras, a fim de se recomendar perante Deus; e
estavam prontos a ouvir qualquer nova observância pela qual pudessem obter maior mérito. Sua
pergunta significativa: Que faremos para merecer o Céu? Qual o preço que nos é exigido para alcançar
a vida por vir?" (DTN, 366).
v. 29 - "A obra de Deus é esta, que creiais nAquele que por Ele foi enviado" - A multidão
pergunta quais são as obras de Deus, e Jesus Se refere à obra de Deus. Para que os homens possam
fazer as obras de Deus, a obra de Deus deve ser efetuada no homem.

A ação da fé é a única obra válida diante de Deus. Contudo, precisamos compreender que a
vida eterna não é uma recompensa de crer - de ter suficiente fé. A fé, escreveu EGWhite, "é o meio,
não o fim" (SDABC, 6:1073).

"A fé é a condição que torna possível a salvação. A causa não é a fé, mas a graça. Conquanto
a fé não tenha mérito em si mesma, a ausência de fé frustra a graça. Embora a graça seja a fonte da
salvação, não podemos ter salvação sem fé" (Herbert E. Douglas. Faith: Saying Yes to God, p. 52).

Em essência, só há duas maneiras básicas de encarar a religião:

1. A primeira salienta a palavra conduta. Os que adotam este conceito acham que devem fazer
grande esforço para serem bons. Não vêem como Deus possa estar contentes com eles se não se
portarem como Ele deseja. Tais pessoas geralmente dão prioridade às ordens e proibições. O
cristianismo, para elas, consiste em fazer tudo que Deus ordena e evitar tudo que Deus proíbe.
Encaram erroneamente a vida cristã, considerando-a uma obrigação, não um prazer.

2. A segunda maneira de encarar a religião acentua a palavra comunhão. Os que adotam este
conceito crêem que devem dar prioridade a conhecerem a Deus. Eles não procuram fazer com que
Deus os ame, pois sabem que Ele já os ama. Não obedecem porque têm de fazê-lo, mas porque
querem fazê-lo. Os cristãos voltados para a comunhão sabem que sua batalha não é a luta para serem
bons, e sim o "combate da fé". Sabem que sua obra é crer no enviado de Deus (João 6:29).

A obra de procurar ser bom é desalentadora porque resulta em fracasso. Ninguém gosta de
esforçar-se bastante e fracassar. Mas a obra de crer é animadora porque resulta em sucesso. Esses dois
tipos de obras têm o mesmo objetivo: obediência. Mas, quando procuro fazê-lo por mim mesmo, eu
fracasso. Quando confio em Jesus, Ele age em mim e por meu intermédio, levando-me a fazer Sua
vontade.
v. 30 - "Que sinal fazes?" - No v. 26 Jesus afirma que eles viram vários sinais. Denunciam-se
a si mesmos como cegos. Pediam um sinal, isto é, um milagre. Quando o milagre é operado, não vêem
o sinal. Querem ver um sinal, ou seja, um milagre, e falham em ver o maior sinal, o próprio Cristo (v.
40).

"Para que o vejamos e creiamos?" - Ver não é o melhor antecedente da fé, pois são bem-
aventurados os que não viram e creram (20:29). Não surge a ação de crer cada vez que se realiza a
ação de ver (6:36). As ações visíveis de Cristo podem ser evidências que ajudam a crer, mas se estas
evidências são rejeitadas, a pessoa não crê. A fé depende mais de uma atitude interior de aceitação do
que da visibilidade da evidência externa.

"... pediam ainda outro sinal. Houvesse este sido dado, e permaneceriam tão incrédulos como
antes. Se não se convenciam pelo que tinham visto e ouvido, inútil seria mandar-lhes mais obras
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Evangelho de João
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maravilhosas. A incredulidade encontrará sempre desculpa para a dúvida, e raciocinará negativamente
sobre a mais positiva prova" (DTN, 368).
v. 31 - "Nossos pais comeram o maná no deserto" - A referência ao maná como o pão do
Céu, dado por Moisés aos israelitas no deserto, aparece como o critério para avaliar as ações de Cristo.
O critério humano é sempre pedir uma prova, uma demonstração de autoridade, para depois crer.

MOISÉS JESUS
1. Tempo: 40 anos Um dia (uma ocasião).
2. Quantidade: toda a nação Alguns milhares
3. Qualidade: pão do céu Pão terrestre(de cevada, qualidade inferior).

Se Jesus era o Messias, esperavam dEle maiores bênçãos do que as trazidas por Moisés.
Considerava-se a dádiva do maná como a obra suprema da vida de Moisés, e não havia dúvida de que
o Messias faria o mesmo, ou mais. Alguns ditados judeus rezavam:

"Como foi o primeiro redentor assim será o último redentor; assim como o primeiro redentor
fez cair o maná do céu, assim também o segundo redentor fará cair o maná."

"Não encontrareis o maná nestes tempos porém o encontrareis nos tempos que virão."
v. 32 - "Amen, amen" - duplo amém.

Com esta introdução solene Jesus dissipa suas ilusões, dando-lhes uma resposta dupla. Em
primeiro lugar recorda-lhes que não foi Moisés quem lhes dera o maná, e sim Deus. Em segundo lugar
lhes diz que o maná não era em realidade o pão de Deus; era apenas um símbolo deste pão.

"Seus pais tinham murmurado contra Moisés, e posto em dúvida e negado sua missão divina.
Agora, no mesmo espírito, os filhos rejeitaram Aquele que lhes apresentava a mensagem de Deus"
(DTN, 367).

Foi Deus quem alimentou o povo nos dias antigos no deserto e agora lhes oferecia pão
espiritual, maná celestial, alimento que dá vida.

"... Ele mostra-lhes quão insignificante era aquele dom em comparação com as bênçãos que
lhes viera conceder. O maná só podia manter a existência terrena; não impedia a aproximação da
morte, nem garantia a imortalidade; mas o pão do Céu nutria a alma para a vida eterna" (DTN, 370).

"Dá" - O uso do verbo no presente ressalta que o Dom de Deus lhes estava sendo oferecido
precisamente nesse tempo, na pessoa dAquele que estava diante deles.
v. 33 - "O pão de Deus é o que desce do céu" - O Pão de Deus é o que Deus dá. Como o
maná, Ele vem do céu, mas difere daquele, pois dá vida, vida eterna, a toda a humanidade.

Os judeus perguntaram: "Que sinal fazes Tu?" Jesus respondeu com o verbo dar: O Pão de
Deus dá vida ao mundo. O sinal não está em alguma coisa que Jesus faz. Está naquilo que dá. O sinal é
o Dom de Deus - Jesus.
v. 34 - "Senhor, dá-nos sempre deste pão" - Semelhante à samaritana (4:15). Interpretam de
maneira material ou temporal a expressão de Jesus.
v. 35 - "Eu sou o Pão da Vida" - ego eimi com predicado. A expressão não revela a essência
de Jesus, mas reflete Sua maneira de lidar com os homens; neste caso, Sua presença os alimenta.

A figura empregada por Cristo era familiar aos judeus (cf. Deut. 8:3; Jer. 15:16). "Os próprios
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Evangelho de João
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rabinos" ensinavam que "o comer do pão, em seu sentido espiritual, era o estudo da lei e a prática das
boas obras; e dizia-se muitas vezes que, na vinda do Messias, todo o Israel seria alimentado" (DTN,
368).

"Vem a Mim... crê em Mim" - paralelismo.

"Jamais terá fome... jamais terá sede" - Uma vez que conhecemos, aceitamos e recebemos a
Jesus como o Pão da vida, o Pão de Deus que desce do céu, desaparecem todos os anelos insatisfeitos,
os desejos insaciáveis do coração e da alma. A fome e a sede da situação humana se apagam quando
conhecemos a Cristo e, por Ele, a Deus. A alma inquieta encontra a paz; o coração faminto se farta.
Chegamos ao porto.
v. 36 - "Embora Me tenhais visto, não credes" - A tragédia do incrédulo.
vv. 36-40 - Léon-Dufour encontrou um quiasmo aqui:

36: ver e não crer ---- 40: ver e crer


37: não lançar fora o que o Pai deu ---- 39: não perder o que o Pai deu
38: Eu desci do céu.
v. 37 - "De modo nenhum lançarei fora" - Esta é a mesma expressão que os Sinóticos usam
no contexto do julgamento final quando os homens serão lançados fora do reino (Mt. 8:12 - os filhos
do reino serão lançados para fora, nas trevas; ali haverá choro e ranger de dentes. 22:13 - homem sem
veste nupcial lançado fora do banquete). Em João, o contexto é de escatologia realizada.

Gên. 3:22-23 - o homem é lançado para fora do Éden, para não comer da árvore da vida.

Apocalipse - escatologia consumada: comerão da árvore da vida.


v. 39 - assemelha-se ao v. 37, mas o contexto é de escatologia consumada (último dia).
v. 40 - ambos os aspectos: realizada e consumada. Aquele que crê no Filho tem vida eterna
agora, e ainda será ressuscitado no último dia.

"... mediante a fé, Sua vida se tornou nossa. Os que vêem a Cristo em Seu verdadeiro caráter,
e O recebem no coração, têm vida eterna. É por meio do Espírito que Cristo habita em nós; e o
Espírito de Deus, recebido no coração pela fé, é o princípio da vida eterna" (DTN, 370).
v. 41 - "Murmuravam... os judeus" - Provavelmente os oficiais da sinagoga de Capernaum.
Murmuravam, como os antepassados no deserto.
v. 42 - "Diziam: Não é Este Jesus, o filho de José? Acaso não Lhe conhecemos o pai e a
mãe?" - Aqui, como em 1:45, Jesus é conhecido como o "filho de José", enquanto em Marcos 6:3, em
Nazaré, Ele é conhecido como o "filho de Maria".
v. 44 - "Ninguém pode vir a Mim se o Pai não o trouxer" - A palavra grega helkuein
geralmente implica em algum tipo de resistência. Deus pode e, de fato, atrai os homens para Ele,
porém a resistência do homem pode vencer a atração de Deus. A graça não é irresistível.

Aqui vemos as razões que levaram os judeus a rejeitarem a Jesus e, ao fazê-lo, rejeitaram a
vida eterna:

a. Julgaram as coisas segundo valores humanos e de acordo com normas externas. Era-lhes
impossível entender como um filho de um carpinteiro, proveniente de um lar humilde, podia ser um
mensageiro especial de Deus. Rejeitaram a Jesus porque O avaliaram segundo atributos humanos,
valores sociais e normas mundanas.
b. Os judeus discutiam entre eles. Estavam tão ocupados em suas próprias discussões que não
lhes ocorreu deixar a decisão nas mãos de Deus. Estavam interessados em que todos soubessem a
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Evangelho de João
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opinião que tinham sobre o tema; não tinham interesse em saber o que pensava Deus.
c. Os judeus ouviram, porém não aprenderam. Há formas distintas de ouvir. Pode-se ouvir
com o desejo de criticar ou ouvir com ressentimento. Pode-se ouvir com um sentimento de
superioridade ou indiferença. O que ouve enquanto aguarda sua vez de falar. Porém, a única forma de
ouvir que é válida é a que aprende. Não há nenhuma outra forma de ouvir a Deus. No Evangelho de
João, ouvir e aprender descrevem a aceitação obediente da revelação. Portanto, equivalem a crer.
d. Os judeus resistiram à atração de Deus. Os únicos que aceitam a Jesus são os que aceitam
ser conduzidos por Deus. A fé somente se torna possível quando são abandonados os arrazoados
próprios e os critérios humanos de avaliação, para aceitar os critérios divinos nos quais o verdadeiro
conhecimento é adquirido através da revelação.
v. 45 - "Profetas" - Referência a Isaías 54:13. Todos os homens são conduzidos a Cristo pelo
Pai através do ensino que Ele lhes tem comunicado.
v. 46 - paralelo com 1:18. Ambos apontam para o íntimo relacionamento entre o Pai e o
Filho, partilhado por ninguém mais.
v. 47 - Duplo amém. Jesus vai direto ao ponto. Seu interesse é com a vida e como ela pode
ser alcançada.

"Tem" - possessão presente.


v. 48 - "Eu sou o pão da vida" - Com esta expressão se completa o argumento central do
discurso sobre o Pão da Vida. O Pão da Vida transforma-Se assim em uma realidade histórica; é a
própria pessoa de Jesus. O fato de que os pais tinham comido o maná no deserto também foi uma
realidade histórica, mas - como todas as ações dos homens - aquela também foi passageira. Não
produziu resultados permanentes. O que permanece naquele incidente histórico é a ação de Deus ao
dar o maná, que agora se repete ao dar o verdadeiro Pão do Céu.
v. 49 - "Vossos pais comeram... e morreram" - Contraste com o verso seguinte.
v. 50 - "Este pão... todo que comer... não pereça" - Jesus não é só o pão vivo em contraste
com o alimento perecível; Ele é o pão que dá vida, que liberta do poder da morte os que O recebem;
isto nem o maná podia fazer por aqueles que o comiam. Os israelitas da geração do deserto
alimentaram-se do maná, e mesmo assim morreram. Com todas as suas propriedades milagrosas como
"cereal do céu... o pão dos anjos" (Salmo 78:24ss), ele não podia conceder vida eterna: aqueles que o
recebiam sustentavam a vida física com ele, mas acabavam morrendo. O verdadeiro pão celestial, por
outro lado - que é o próprio Filho de Deus - concede vida espiritual àqueles que comem dEle (isto é,
que se apropriam dEle pela fé); e esta vida espiritual é sustentada por Ele e protegida da ameaça de
morte.
v. 51 - "O pão... é a Minha carne" - Estas palavras apontam para a Sua morte como o meio de
salvação (DTN, 370).
v. 52 - "Como pode...?" - Semelhante a Nicodemos (3:4). O objetivo desta pergunta não é a
busca de conhecimento. Até certo ponto compreendiam o que Jesus queria dizer, "mas não estavam
dispostos a reconhecê-Lo" (DTN, 371). Preferiam manter-se na incredulidade e afastados da oferta de
vida eterna.
v. 53 - "Beber o Seu sangue" - Aumentou ainda mais a resistência. As leis de saúde proíbem
claramente a utilização de sangue como alimento (Gên. 9:4; Deut. 12:16). Entretanto, eles esqueciam a
parte fundamental daquela proibição: a vida está no sangue. E Jesus desenvolveu o tema da vida
durante todo o discurso. Falharam. Escandalizaram-se. Não queriam entender. Escolheram não receber
a vida.
"Comer a carne e beber o sangue de Cristo é recebê-Lo como Salvador pessoal, crendo que
Ele perdoa nossos pecados, e nEle estamos completos. ...O que a comida é para o corpo, deve ser
Cristo para a alma. Precisamos alimentar-nos dEle, recebê-Lo no coração, de modo que Sua vida se
torne nossa vida" (DTN, 371/2).
v. 54 - Quem come a carne e bebe o sangue será ressuscitado no último dia. O verbo grego
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Evangelho de João
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implica um comer contínuo, uma alimentação constante. Não é suficiente participar uma vez de Cristo.
Seus seguidores devem nutrir continuamente seu ser espiritual, alimentando-se dAquele que é o Pão da
Vida.
v. 40 - Quem vê o Filho e nEle crê será ressuscitado no último dia.

Comer a carne e beber Seu sangue é o mesmo que vê-Lo e crer nEle.
v. 56 - "Permanece" - menei - presente de meno: companheirismo contínuo do crente com
Cristo e vice-versa.
vv. 60-61 - "Discípulos murmuravam" - não os doze. No v. 41 os judeus murmuravam.

"Duro discurso" - sklerós - de skello = secar - esqueleto.

Sequidão = morte. O que era para vida, entenderam como para morte.

"Cristo declarara uma sagrada e eterna verdade com respeito às relações entre Ele e Seus
seguidores. Conhecia o caráter dos que se diziam Seus discípulos, e Suas palavras provavam-lhes a fé.
Declarou que deviam crer e agir segundo Seus ensinos. ... Isso envolvia a renúncia de suas acariciadas
ambições. Exigia completa entrega de si mesmos a Jesus. Eram chamados ao sacrifício, à mansidão e
humildade de coração. Deviam andar na estreita vereda trilhada pelo Homem do Calvário, se queriam
compartilhar do dom da vida e da glória do Céu" (DTN, 373/4).
v. 62 - "Subir" - anabaino. Ele já dissera: "Importa que o Filho do homem seja levantado,
para que todo o que nEle crê tenha a vida eterna" (3:14). Este "ser levantado" na cruz é considerado
neste Evangelho o primeiro estágio de "subir para o lugar onde primeiro estava." O que, de uma
perspectiva, é o estágio mais baixo da humilhação do Servo, de outra é o primeiro estágio de "ser
exaltado e elevado" (Isa. 52:13). Ver Jesus ser elevado, olhar além das aparências superficiais e
aprender o significado interior da exaltação do Crucificado - significa realmente crer nEle; este é o
caminho para a vida eterna.
Trata-se de um pré-anúncio da ascensão. Em outras palavras: "Quando chegar o momento de
Eu voltar para o Céu e Minha glória, vereis que Minhas afirmações são verdadeiras." Significa que a
ressurreição é a garantia de todas as afirmações de Jesus sobre Si mesmo. Não chegou ao final
vencido, e sim como um vencedor. A ressurreição é a prova indestrutível das afirmações de Cristo.
Assim, no Evangelho de João, temos:
CRUZ -------- RESSURREIÇÃO -------- ASCENSÃO = EVENTO ÚNICO

Se as pessoas tropeçam (escandalizam) ao ouvir um discurso, muito mais tropeçarão na hora


da crucifixão.
v. 66 - "Muitos dos Seus discípulos O abandonaram" - Isto assinala o momento decisivo da
obra de Jesus na Galiléia, e, certamente, de todo o Seu ministério. Até este instante, havia sido
amplamente aceito como um mestre e profeta popular. Agora muitos de Seus seguidores o
abandonaram e, desde esse momento em diante, esteve cada vez mais à sombra da cruz.

Ao mencionar que eles já não andavam com Ele, João não quer somente dizer que eles não O
seguiam mais em Seu ministério itinerante; quer dizer que eles não estavam mais com Ele em espírito.
Tornaram-se mesmo em inimigos de Cristo (DTN, 375).
É interessante comparar este verso com Mateus 11:20-24, onde Jesus pronuncia um juízo
sobre as cidades galiléias que recusaram crer em Seus feitos poderosos (Cafarnaum aparece no v. 23).
v. 67 - "Quereis também retirar-vos?" - A construção da pergunta exigia uma resposta
negativa.
vv. 68-69 - Outras pessoas estavam dispostas a aceitar Jesus como o segundo Moisés, que
providencia alimento para o seu povo, mas não tinham tempo para o pão vivo que foi oferecido pela
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Evangelho de João
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vida do mundo. Pedro e seus companheiros recusaram-se a se deixar confundir, mas creram no que Ele
disse e tiraram a conclusão lógica. Ele era mais do que o profeta semelhante a Moisés; Ele era o Santo
de Deus (um título messiânico em Marcos 1:24 - na boca de um endemoninhado, o que é
significativo).
v. 69 - "Crido e conhecido" - ambos no perfeito.
| |
Chegamos a um lugar Temos reconhecido a verdade
de fé e permanecemos ali. e nos mantemos nela.

"Conhecer", na Bíblia, e particularmente em João, significa entrar em relacionamento com


alguém, e assim ter uma experiência pessoal, íntima, com este alguém. Conhecer é VIVER COM. É
entrar no mundo do que quero conhecer, familiarizar com a pessoa, conhecer o caráter, é experiencial -
envolvimento pessoal. Conhecer a Jesus não é saber o que Ele fez ou Suas doutrinas; conhecê-Lo é ter
um encontro pessoal com Ele, estabelecer um relacionamento; e isto exige tempo: para falar com Ele,
ouvi-Lo, estar com Ele. Este relacionamento (conhecimento) pessoal com Jesus é o que opera a
diferença na vida das pessoas.
Assim termina a primeira parte do ministério de Cristo, segundo o Evangelho de João.
Alguns O abandonam, mas outros O reconhecem, crêem nEle e continuam a segui-Lo.
Capítulo 7

v. 1 - "Passadas estas cousas" - Festa da Páscoa - multiplicação dos pães, até a Festa dos
Tabernáculos - 6 meses.

"Jesus andava pela Galiléia" - peripatein - tempo imperfeito: "Jesus continuou andando".
Descreve o ministério itinerante de Jesus juntamente com Seus discípulos, indo de um lugar para
outro.

"Porque os judeus queriam matá-Lo" - edzétoun - imperfeito: não se tratava de uma ação
solitária, mas uma atitude contínua. Pode ser uma referência a 5:18 (cura do paralítico no sábado).
Jesus não Se expôs desnecessariamente. Cumpriria Sua missão até que chegasse a Sua "hora".
v. 2 - "Festa dos Tabernáculos" - Celebrada no mês de Tishri (parte de setembro e parte de
outubro). Durava sete dias com o prolongamento de um oitavo. Assim 15-21+22. Última das três
festas anuais dos judeus. Só perdia em importância para a Páscoa. Comemorava:

a. livramento da escravidão no Egito;


b. vida no deserto e cuidado protetor de Deus;
c. ação de graças pela colheita (Êxo. 23:16).

A Festa dos Tabernáculos relaciona-se também especificamente com o Messias. O profeta


Zacarias relaciona-a com o triunfante dia do Senhor, quando virá a Jerusalém como rei justo, Salvador
e pobre (Zac. 9:9), e Deus derramará sobre Jerusalém o espírito de bondade e adoração (12:10). Nesse
dia abrirá a fonte da casa de Davi para que Jerusalém se purifique do pecado e da impureza (13:1),
para que corram de Jerusalém águas vivas (14:8), e todos os que restarem de todas as nações subam a
Jerusalém para celebrar a Festa dos Tabernáculos (14:16).
v. 3 - "Seus irmãos" - Representam os incrédulos (v. 5) e os do mundo (v. 7) São os membros
de Sua família (2:12), filhos de José (DTN, 432).

"Vai para a Judéia" - A idéia é: "Se você é realmente o Messias, vá para Jerusalém, porque
este é o lugar apropriado para você Se manifestar publicamente a Israel como tal e convidá-lo que O
reconheça." A crença geral era de que, quando o Messias viesse, Ele Se daria a conhecer publicamente
69

Evangelho de João
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de uma maneira espetacular. De acordo com uma tradição rabínica, "Ele virá e ficará de pé sobre o
telhado do lugar santo; então anunciará aos israelitas: 'Vocês, pobres, o tempo da redenção chegou'."

"Para que Teus discípulos vejam as obras que fazes" - Compreensão errônea das obras de
Cristo. Suas ações não tinham propósito propagandístico, auto-promoção. As ações de Cristo eram
uma tarefa constante para a salvação da humanidade. Não fazia obras para mostrar Sua autoridade.
Transformava essa autoridade em dons que oferecia aos homens.
v. 4 - "Manifesta-Te ao mundo" - João vê nestas palavras um sentido mais profundo. Indo a
Jerusalém, Jesus realmente Se mostraria ao mundo no sentido mais amplo; Jerusalém é o lugar onde
Ele precisa ser "levantado", para que todos, sem distinção, sejam atraídos a Ele (2:14ss; 12:32).
v. 6 - "O Meu tempo ainda não chegou" - kairós - tempo apropriado, favorável, a ocasião
propícia. O tempo de Cristo e o tempo do mundo tem um sentido completamente diferente. Os dois
tempos são exatamente iguais. Tanto Jesus como o mundo têm momentos decisivos na seqüência total
do tempo, que são especialmente propícios para a ação. Mas existe uma diferença: Para o mundo estes
momentos estão sempre presentes. Para Cristo, não. A viagem de Seus irmãos poderia ser realizada em
qualquer momento. Qualquer ocasião era oportuna para eles.

Quando chegasse a hora indicada pelo Pai, Ele iria a Jerusalém para "manifestar-Se ao
mundo" em um sentido mais profundo do que eles podiam imaginar. No entanto, para pessoas
acostumadas a viver sem a preocupação de conhecer a vontade orientadora de Deus, uma hora é tão
boa quanto a outra; "o vosso (tempo) sempre está presente".
v. 7 - Os irmãos tinham insistido com Jesus para que se mostrasse ao mundo; Jesus fala agora
do mundo em outro sentido - o sentido dado ao termo no prólogo deste Evangelho, onde "o mundo"
não reconheceu o Verbo eterno quando veio ao mundo (1:10). Isto também se manifestava contra os
que criam nEle, demonstrando assim que não eram "deste mundo" (15:18-25). As pessoas que não
criam nEle, como Seus irmãos, não experimentavam a hostilidade do mundo. Como poderiam? Eles
pertenciam ao mundo. Jesus explica a hostilidade do mundo contra Ele em termos que lembram
3:19ss: O brilho da luz verdadeira no mundo expôs a maldade humana, e aqueles que preferiam suas
obras más à luz vivificadora, odiavam-na, porque ela os expunha.
v. 8 - "Subi vós outros" - Não importava que dia fossem a Jerusalém os irmãos de Jesus.
Qualquer dia dava no mesmo, pois ninguém notaria mesmo a presença deles. A ida deles a Jerusalém
podia ocorrer em qualquer momento, sem que fizesse qualquer diferença.

"Eu por enquanto não subo" - A resposta dada por Jesus a Seus irmãos é um exemplo
clássico dos dois níveis de significado encontrados em João. Num nível puramente natural, os irmãos
de Jesus entendem que Ele não subirá à Festa porque a ocasião não é oportuna. O comportamento
subseqüente de Jesus em subir à Festa mostra, entretanto, que o significado real não era este. João
preparou o leitor para entender o significado real das palavras de Jesus pela referência à morte nas
mãos dos "Judeus" no v. 1. Quando Jesus fala de Seu "tempo", Ele está falando no nível do plano
divino. Seu "tempo" é Sua "hora", a hora da paixão, morte, ressurreição e ascensão ao Pai; e este
tempo não chegou nesta Festa dos Tabernáculos - está reservado para a Páscoa subseqüente. "Os
judeus" tentarão matá-Lo nos Tabernáculos (8:59), como um exemplo do ódio do mundo que Jesus
menciona no v. 7; mas eles falharão. Nesta Festa Ele não subirá, isto é, subir ao Pai. João está fazendo
um jogo de palavras com o verbo anabainein, que pode significar subir em peregrinação ao Monte
Sião em Jerusalém, e pode também significar "ascender". Em 20:17 João usa este verbo quando fala de
ascender ao Pai, e este é o significado mais profundo aqui.

"O Meu tempo ainda não está cumprido" - "...não devia ser presunçoso, nem Se precipitar no perigo,
nem apressar a crise. Cada acontecimento em Sua obra tinha sua hora determinada. Cumpria-Lhe
esperar pacientemente. Sabia que havia de ser objeto do ódio do mundo; sabia que Sua obra Lhe traria
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Evangelho de João
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em resultado a morte; mas expor-Se antecipadamente não seria a vontade do pai" (DTN, 434).
Segundo R. Brown, os irmãos de Jesus queriam que Ele mostrasse Seus poderes miraculosos
em Jerusalém. Em João 6 e 7, três atos de Jesus assemelham-se com as tentações em Mateus 4:1-11 e
Lucas 4:1-13:

EV. de JOÃO TENTAÇÕES

6:15 - O povo queria --------------- Satanás oferece-Lhe


fazê-Lo rei os reinos do mundo

6:31 - O povo pede pão -------------- Satanás ordena-Lhe que


milagroso transforme pedras em pães

7:3 - Os irmãos querem que --------- Satanás leva Jesus ao cume do Templo
Jesus vá a Jerusalém em Jerusalém e Lhe diz para mostrar Seu
mostrar o Seu poder poder, lançando-Se dali abaixo.
v. 10 - "Subiu... em oculto" - "Não publicamente" - lit. "Não manifestadamente" - ou faneros.
Contrariou a proposta dos irmãos (v. 4) para Se manifestar publicamente, ao mundo. Eles
queriam ditar as normas de conduta para o Senhor; estabelecer os objetivos para Sua vida e a maneira
como chegar a eles. Nenhum ser humano estabelece o padrão para Jesus, nem mesmo Sua mãe (2:3-4).
Ele é Senhor de cada situação.
v. 11 - "Judeus" - inimigos de Jesus.

"Onde está Ele?" - Esta não é a busca do que deseja aceitar a Cristo. É a busca do que quer
encontrar nEle razões para condená-Lo. "Os fariseus e principais esperavam que Ele fosse, na
esperança de um ensejo para O condenar" (DTN, 434).
v. 12 - "Murmuração" - A murmuração a Seu respeito corria a pé de ouvido, com debates e
discordâncias; mesmo ausente, Ele era o principal assunto de conversa. "Era Ele o pensamento
predominante em todas as mentes" (DTN, 434).

"Multidões" - Distinta dos "judeus", de quem tinham medo. São os grupos de peregrinos que
subiram para a Festa.

"Ele é bom" - Consciência de Seu caráter, mas falta de percepção sobre Sua pessoa.
"Engana o povo" - Opiniões divididas sobre Jesus. Os dirigentes judeus se referiram a Jesus
como "Aquele enganador" (Mt. 27:63). Suas ações bondosas e poderosas eram interpretadas como
uma cortina de fumaça que disfarçava Suas verdadeiras intenções; na verdade, diziam, Ele era um
impostor, dizendo ser o que não era, confundindo o povo simples. Este ponto de vista passou a
predominar mais tarde nos círculos judeus ortodoxos; uma tradição antiga citada no Talmude diz que
Ele foi executado na Páscoa porque era um enganador que iludira a Israel.
v. 14 - "Meio da festa" - Provavelmente o quarto dia da festa. "De repente virá ao Seu templo
o SENHOR, a quem vós buscais" (Mal. 3:1). Era o momento em que o interesse acerca de Jesus
atingira o auge.
"Templo" - hieron - todo o complexo do templo. Jesus ensinava no pátio.
v. 15 - "Maravilhavam - como sabe letras?" - O domínio que Ele tinha das Escrituras e Seu
poder de persuasão na exposição eram inegáveis, mesmo sem ser Ele treinado em alguma das grandes
escolas rabínicas da época. Como um homem que não estivera sentado aos pés de nenhum dos mestres
de Israel, podia enfrentar com tanta habilidade os estudiosos mais dotados da época? O Sinédrio
enfrentou uma dificuldade semelhante aproximadamente um ano mais tarde, quando "homens iletrados
(agrammatoi) e incultos" como Pedro e João, defenderam-se da acusação de terem sido companheiros
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Evangelho de João
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de Jesus (Atos 4:13). Pedro e João falaram em nome de Jesus, mas aqui Ele não invocou a autoridade
de nenhum mestre. Os escribas sempre se sentiam mais seguros quando podiam citar um precedente de
algum mestre do passado, mas Jesus, agora em Jerusalém, como antes na Galiléia, "ensinava como
quem tem autoridade, e não como os escribas" (Mt. 7:29). De onde Ele recebeu Sua autoridade?
Seu conhecimento de "letras" não significa Sua habilidade de ler e escrever; isto não era raro
entre os judeus. Significa Seu domínio do aprendizado sacro. A palavra traduzida por "letras"
(grammata) foi usada em 5:47 para indicar os "escritos" de Moisés.

"Como?" - "Queriam desviar a atenção que convergia para Ele, para a questão do direito que
tinha de ensinar e, assim, para a importância e autoridade deles próprios" (DTN, 438).
v. 16 - "O Meu ensino não é Meu, e, sim, dAquele que Me enviou (pempo)" - Este verbo, que
é usado em relação à origem da missão de Cristo, agora é usado com respeito à origem do Seu
"ensino". Os rabinos eram mestres em citar autoridades passadas; Jesus utiliza a mais alta autoridade
possível em Sua afirmações.

Com esta afirmação de Jesus, podemos dizer que há dois tipos de "ensino": um que tem
origem em Deus (v. 17) e outro que se origina nos homens (v. 18 - fala por si mesmo).
v. 17 - "Se alguém quiser FAZER... CONHECERÁ" - Como naquele tempo, também agora
não será somente a percepção intelectual que determinará se realmente a reivindicação de Jesus de
estar transmitindo o ensino do Pai é fundamentada ou não; uma atitude de coração também é
importante. Se há disposição de "fazer" a vontade de Deus, a capacidade de entender a mensagem virá
em seguida. Quem estiver disposto em seu coração, reconhecerá no ensino de Jesus uma mensagem
que se autentica diante de percepção espiritual e consciência.
No Evangelho de João a doutrina e a ética têm o mesmo fundamento. Não se pode conhecer
nada, nem se pode fazer a vontade de Deus sem que exista primeiramente a obediência de fé, pois a fé
não é uma especulação abstrata, mas a resposta humana à vontade de Deus. Tal resposta não é também
simplesmente intelectual, mas um compromisso da vida toda que inclui as ações e o conhecimento.

"Se a doutrina é de Deus" - Profeta verdadeiro. Deve-se ouvir o profeta verdadeiro, sob pena
de julgamento divino (Deut. 18:19).
"Se falo por Mim mesmo" - Profeta falso. O falso profeta será morto (Deut. 18:20).
v. 18 - "Verdadeiro" - alethes - Quando se refere a pessoas, significa "genuíno", "verdadeiro",
"honrado". Em 3:33 e 8:26 é dito que Deus é verdadeiro. Aqui, Jesus é verdadeiro. No Apocalipse,
Jesus é a testemunha fiel e verdadeira.

"NEle não há injustiça" - contraste com a atitude injusta que os judeus adotarão em relação a
Jesus.
v. 19 - Ele Se defendera das acusações de estar quebrando a lei invocando Moisés como
testemunha contra eles. Moisés já falara dEle como o profeta que viria, mas eles não davam crédito ao
testemunho de Moisés (5:45-47). Agora Ele invoca novamente Moisés como testemunha contra eles,
porque, apesar de toda a veneração que professavam pela lei, eles eram culpados de quebrá-la. Mais
importante que serem os recebedores da lei era guardar a lei, o que eles não faziam.

"Procurais matar-Me" - Se Jesus fosse um falso profeta, estava de acordo com a lei matá-Lo.
Mas eles não tinham provado Sua falsidade. Pelo contrário, Jesus estava mostrando que Ele era
verdadeiro (v. 18).

E G White diz que, aos ler seus corações, deu-lhes uma "prova de Sua divindade" (DTN,
439).
v. 20 - A multidão não sabe nada acerca do complô dos líderes contra Jesus, por isto O
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Evangelho de João
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acusam de estar endemoninhado. Os de Jerusalém sabem do complô (v. 25).
v. 21 - "Um só feito" - ergon - obra. Refere-se a uma obra realizada no sábado. Sem dúvida
alguma a cura do paralítico em Betesda, pois desde aquela ocasião vinham tramando Sua morte (cf.
DTN, 439).
vv. 22-24 - Sua obra de cura em Betesda estava em harmonia com a lei do sábado. Segundo a
interpretação dos rabis, a circuncisão era mais importante que o sábado. Mesmo que o oitavo dia caísse
num sábado, o rito deveria ser realizado. A circuncisão prefigurava o aperfeiçoamento do homem por
inteiro, exatamente o que o Messias realizaria quando viesse. Isto é visto melhor no verso 23:
"Pode" - lambanei - lambano - presente do indicativo: lit. "recebe" - prática contínua - a cada
sábado pessoas são circuncidadas.
"Para que a lei de Moisés não seja violada" - tem o sentido de obrigatoriedade e não mera
permissibilidade: a criança deve ser circuncidada no oitavo dia, mesmo no sábado, para que a lei seja
cumprida.
v. 24 - "Não julgueis segundo a aparência" - Condenar a alguém por salvar um homem no dia
de sábado é simplesmente julgar segundo as aparências, e este juízo decorre da doutrina que se origina
no próprio homem (v. 18). Esta atitude apenas evidencia que tal pessoa é totalmente alheia à esfera de
Deus e à Sua doutrina.
"Reta justiça" - Se este critério tivesse sido adotado no julgamento da obra em favor do
paralítico, teriam concluído inevitavelmente que os atos misericordiosos de Jesus não constituíam uma
violação da lei do sábado.
v. 25 - "Alguns de Jerusalém" - distintos da "multidão" e dos "judeus".

"Não é Este Aquele a quem procuram matar?" - A maneira da construção da frase no original
exige uma resposta afirmativa.
v. 26 - "Fala abertamente" - Justamente como os Seus irmãos pretendiam que Ele fizesse,
quando Lhe disseram para subir para a Festa (vv. 3-4).

"Porventura" - exige uma resposta negativa. Esta é a primeira vez neste Evangelho em que a
idéia de ser Ele o Messias é ventilada em Jerusalém.
v. 27 - "Sabemos donde Este é" - Novamente é mencionado no Evangelho o argumento que é
constante: A origem determina o que o homem é. Se a origem de Jesus pode ser conhecida, e
identifica-se entre os seres humanos, tem, então, que ser exatamente igual ao restante dos homens.

Jesus parece não Se encaixar neste critério popular sobre o Messias. Era crença comum que o
Messias, depois de vir ao mundo, permaneceria escondido em algum lugar insuspeito até que chegasse
a hora indicada por Deus para Ele Se manifestar. Mas - diziam eles - Este homem, obviamente, não
esteve escondido até agora; qualquer pessoa sabe de onde Ele vem. Este é um exemplo de "ironia
joanina". Eles estavam pensando no lar de Jesus na Galiléia; para eles, Ele era "Jesus de Nazaré". Mas
a resposta sobre a origem de Jesus é expressa nas próximas palavras de Jesus.
v. 28 - "Jesus clamou" - ekradzen - alta voz - descreve anúncios públicos e solenes de
doutrina. Mateus a utiliza para aplicá-la às últimas palavras de Cristo sobre a cruz (27:50).
Jesus começa ironizando o conhecimento humano. Os habitantes de Jerusalém julgam
conhecer a origem de Cristo, mas a ignoram. O fato de conhecerem os pais de Cristo (6:42) os induz a
crer que conhecem alguma coisa, mas realmente nada conhecem. Assim é o conhecimento humano:
fictício e enganoso. É anticonhecimento, pois não possui a verdade e não oferece a possibilidade de
adquiri-la. Significa incredulidade e rejeição de Cristo.

Ironia: pensavam conhecer os pais de Jesus (6:42) e Jesus lhes diz que não conheciam Aquele
que O enviou (v. 28), a Quem Ele sempre identificou como o Seu Pai.
v. 29 - "Eu O conheço" - oida - Jesus não partilha da ignorância da multidão.
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Evangelho de João
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Jesus foi enviado pelo Pai; Ele vem do Pai; Ele conhece o Pai. A linguagem é simples e não
dá margem a outras interpretações; a reivindicação é altiva. Jesus reafirma a relação especial que tem
com o Pai, e Seus ouvintes não podem deixar de captar as implicações das Suas palavras.
v. 30 - "Procuravam prendê-Lo" - reação às declarações de Jesus sobre a origem de Seu ser e
Sua missão. Esta reação ocorreu em outras ocasiões: 5:18; 8:58-59; 10:30-31.

"Ninguém Lhe pôs a mão" - "... foram impedidos... por invisível poder, que lhes pôs limite à
fúria, dizendo-lhes: Até aí irás, e não mais adiante" (DTN, 441).
"Não era chegada a Sua hora" - No plano de Deus, a "hora" da prisão e sofrimento de Jesus
ainda não chegara (8:20; 12:23, 27; 13:1; 17:1).
v. 31 - "Muitos da multidão creram" - dos peregrinos.
"Porventura fará maiores sinais...?" - a pergunta é feita de modo a requerer uma resposta
negativa.
v. 32 - "Fariseus... principais sacerdotes (archiereis)" - Significa o Sinédrio. Fariseus +
Saduceus (o partido dominante) unidos contra Jesus (7:45; 11:47; 57; 18:3).

"Guardas" - A polícia do templo, responsável por manter a lei e a ordem no recinto sagrado.
Eles eram levitas escolhidos criteriosamente, e seu comandante ("o capitão do templo") era um oficial
que gozava de grande autoridade, abaixo apenas do sumo-sacerdote, e geralmente também era
escolhido de uma das famílias sacerdotais de destaque (Bruce).
v. 33 - Não somos informados imediatamente do resultado da missão confiada aos guardas,
mas temos um registro das palavras de Jesus. Evidencia que Jesus não está interessado nas ameaças de
Seus inimigos. Sua vida e Sua morte não depende da ação de Seus inimigos e sim do plano do Pai.
Mesmo que a crucifixão seja realizada pelos líderes judeus, Sua morte será um ato de Sua própria
vontade. Morre porque Ele mesmo depõe Sua vida. Ninguém a tira dEle (10:17-18).

Anteriormente lhes havia falado sobre Sua origem (v. 28) e agora lhes fala sobre o Seu
destino (irei para junto dAquele que Me enviou).
vv. 34-36 - "Onde Eu estou vós não podeis ir" - verbo no presente. Quando Jesus desceu do
céu (6:38), Ele não deixou o céu, mas todo o tempo está no céu, pois céu é companheirismo com o
Pai, e deste companheirismo Ele desceu ao mundo, entretanto, nunca esteve fora deste
companheirismo. Assim, não é meramente onde Ele estará que eles não poderão ir, mas onde Ele está
agora, isto é, no seio do Pai (1:18), em íntimo relacionamento, companheirismo com Deus.
O que separa o homem de Deus não é o espaço, mas a incredulidade - dessemelhança de
pensamento, coração e espírito (Isa. 59:2).

Eles não podem ir à presença do Pai, pois não vieram dali. O mundo, por não ter sua origem
no Pai, vive desorientado e numa permanente e indefinida busca. Quando Cristo os chama, rejeitam-
nO e continuam sua própria busca sem sentido. Assim, nunca estarão em condições de ir ao Pai. A
única maneira de ir ao Pai é tendo a origem nEle, e a única maneira de ter esta origem é mediante o
novo nascimento e a aceitação de Cristo pela fé. Deste modo recebe a salvação e pode se encontrar
novamente com Cristo na casa do Pai (14:2-3).
v. 35 - "Diáspora" - Dispersão: judeus em todo o Império Romano e além.
"Gregos" - Especificamente mencionados. Em 12:20, quando os gregos querem ver a Jesus,
Este entende que Seu ministério está chegando ao fim, e é chegado o momento da cruz.

Nestas palavras descreveram a missão de Cristo (DTN, 441).


v. 36 - "Que significa o fato...?" - Até aqui há uma confusão na mente do povo - o desfecho
será contra ou a favor de Jesus?
v. 37 - "Último dia - o grande dia da Festa" - O oitavo dia da Festa, quando devia ser
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Evangelho de João
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realizada uma "assembléia solene" (Núm. 29:35; Nee. 8:18) ou sábado cerimonial (Lev. 23). Salomão
realizou a festa de dedicação do templo no dia da assembléia solene da Festa dos Tabernáculos (I Reis
8:2). Por esta razão, a Festa relacionou-se especialmente com o templo.

A cada manhã era realizada uma cerimônia relacionada com a água. Um grupo de sacerdotes
retirava água da fonte de Cedrom com um cântaro de ouro a fim de trazê-la para o altar. Cantavam as
palavras do Salmo 122: "Os nossos pés estão dentro de tuas portas, ó Jerusalém". No altar havia duas
bacias de prata, com um sacerdote em pé ao lado de cada uma delas. O cântaro de água era derramado
em uma e um cântaro de vinho em outra. Dali, água e vinho fluíam por tubos de prata até o Cedrom e,
dali, ao Mar Morto.
No tempo de Cristo, enquanto os quatrocentos sacerdotes cantavam o Grande Hallel (Salmos
113-118), o povo orava: "Salva-nos, nós Te rogamos, ó Deus". Então o sacerdote oficiante exclamava:
"Vós com alegria tirareis águas das fontes da salvação" (Isa. 12:3).
No oitavo dia não se oferecia a libação de água. Em vez disso, havia uma simples cerimônia
em que o cântaro vazio era erguido para o céu, num mudo apelo do sacerdote oficiante. Era uma
expressão eloqüente de promessas não cumpridas e insatisfeitos anseios.
Foi neste último dia da Festa, justo no momento em que o sacerdote erguia o cântaro vazio e
a multidão foi dominada por grave silêncio, que Jesus pôs-Se de pé e clamou em voz clara e ressoante:
"Se alguém tem sede, venha a Mim e beba".
Se neste dia não era derramada água material, em lugar dela havia água espiritual, vivificante,
à disposição de todos que quisessem recebê-la. A oferta desta água fora feita séculos antes pelo
profeta: "Ah! todos vós os que tendes sede, vinde às águas" (Isa. 55:1); mas agora ela é repetida com
uma referência pessoal: Se alguém tem sede, venha a MIM.
A água que se utilizava no templo como um símbolo de todas as bênçãos derramadas por
Deus, torna-se num símbolo de Cristo. Ele é a Fonte da Água Viva. Através dEle são derramadas todas
as bênçãos de Deus. Somente Ele possui a água que pode extinguir toda sede. Uma vez que o crente
tenha recebido a Cristo em seu coração, de seu interior fluirão rios de Água Viva (7:37), porque as
bênçãos não se deterão nele. Este rio de Água Viva é o Espírito Santo (7:39). Ele tomará o lugar de
Jesus (14:16), habitará nos crentes (14:17) e ativamente testificará de Cristo (15:26).
Uma vez mais Cristo Se apresenta ante a multidão como o cumprimento de todos os símbolos
do Templo. Toda a missão do templo era um símbolo da missão de Cristo. A missão do templo
cumpriu-se inteiramente em Cristo. Ele era a realidade de todos os símbolos relativos ao Messias.
A importância da proclamação de Jesus é percebida nos verbos "levantar" e "clamar".
v. 39 - "O Espírito não fora dado" - em sua plenitude (Pentecostes).
"Glorificado" - doxadzo - aoristo - sentido de uma vez por todas. O termo aparece em João 23
vezes, demonstrando ser um conceito importante. Em Lucas, que o utiliza mais vezes que os demais,
só aparece 9 vezes.
Esta glorificação é vista particularmente na cruz. Assim, o Calvário é o necessário prelúdio
para o Pentecoste.

Enquanto Jesus está na Terra, o Espírito não pode vir (16:7).

Tão logo Sua obra é consumada, o Espírito é dado (20:22).


v. 40 - "O Profeta" - Deut. 7:40. Aqui Ele é tido como profeta por Suas palavras. Profeta =
Moisés, o que dera de beber da rocha. Em 6:14 Ele é tido como profeta pelo sinal que fizera.

Um grupo O identificou como "O Profeta"; outro, como "Cristo"; e ainda outro duvidava das
identificações anteriores, por causa de Sua origem.
v. 41 - "Porventura virá da Galiléia?" - Forma de pergunta que requer uma resposta negativa.
A ignorância se manifesta. Ignorância baseada em tradições e incredulidade. Se apenas
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Evangelho de João
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tivessem investigado onde Ele nasceu e Sua ascendência, saberiam que Ele era Aquele em quem se
cumpriam todas as Escrituras, as quais tão bem conheciam.
v. 43 - "Dissensão" - A presença de Cristo provoca uma crise: aceitá-Lo ou rejeitá-Lo.
v. 44 - "Queriam prendê-Lo" - mais uma vez são frustrados - não era chegada a Sua hora.
v. 45 - Os guardas retornam sem Jesus. "Por quê?"
v. 46 - "Jamais alguém falou como Este homem" - Nem mesmo os fariseus e principais
sacerdotes. O poder das palavras de Jesus falou mais alto que o poder das armas.
v. 47 - A pergunta requer uma resposta negativa.
"Também" - reconhecimento de que outros foram "enganados".
v. 48 - Esta pergunta também requer um não como resposta.
Declaram sua incredulidade e demonstram não estarem em condições de julgar a Cristo.
Querem ser um padrão de aferição dos ensinos de Jesus e consciência para o povo.
v. 49 - "Plebe" - o povo comum, da terra.
v. 50 - "Nicodemos" - contraria a afirmação de que nenhum dos fariseus creu nele (v. 48).
v. 51 - "Sem ouvir" - Êxodo 23:1 adverte contra falsas notícias; Deut. 1:16 orienta
implicitamente a ouvir ambos os lados.
Nicodemos, nas entrelinhas, diz: "Como eu já ouvi" (cap. 3).
A pergunta de Nicodemos exige um não como resposta. A implicação é que o grupo não
conhece o que Jesus faz.
v. 52 - A pergunta também exige uma resposta negativa. O critério que usam para estabelecer
que Jesus é falso profeta é que da Galiléia não se levanta profeta. Jonas era Galileu. Os galileus eram
comumente desprezados.

Reações Acerca de Jesus - Cap. 7

1. Reação dos irmãos (1-5). Na verdade, um desafio. Não criam nEle. Era uma provocação.
2. Manifestação de ódio. Dos fariseus e principais sacerdotes (7 e 19). Os fariseus O odiavam
porque passava por alto suas regras e normas. Se Ele estivesse certo, eles estavam errados, e amavam
seu sistema mais que a Deus. Os saduceus formavam um partido político. Não observavam as regras e
normas dos fariseus. Quase todos os sacerdotes eram saduceus. Não queriam um Messias, pois
poderiam perder seus privilégios e riquezas. Odiavam a Jesus porque interferia com seus próprios
interesses, aos quais amavam mais que a Deus.
3. Ambas as reações se manifestaram no desejo de eliminar a Jesus (30-32). Quando os ideais
de um homem chocam com os de Jesus, podem ocorrer duas coisas: ou que o homem se submeta e se
entregue, ou que lute contra Cristo e trate de destruí-Lo.
4. Orgulho arrogante (15, 47-49). Com que direito Este iletrado expunha a Lei? Não estudara
nas escolas rabínicas.
5. Reação da multidão. Dupla reação. Primeiro manifestou interesse (11). A única coisa
impossível diante da pessoa de Jesus é ficar indiferente. Segundo, estabeleceu-se uma discussão (12,
43). Falavam sobre Jesus. Discutiam suas opiniões sobre Jesus; expunham seus pontos de vista;
trocavam idéias. Nisto há algo positivo e algo perigoso. Positivo: o debate de idéias permite clarificar
nossas próprias idéias. Perigo: a religião se converte em tema de discussão e debate.

Vereditos Sobre Jesus (no cap. 7)

1. É um homem bom (12). É verdade, mas não toda a verdade. Ele não é apenas um homem;
Ele é Deus.
2. É um profeta (40). Também está certo. Mas há uma diferença: o profeta fala o que recebe
do Senhor ("Assim diz o Senhor"). Jesus diz: "Eu vos digo".
3. Está endemoninhado (20). Se por endemoninhado entendemos alguém que não está de
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Evangelho de João
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posse do pleno controle das faculdades mentais, sob uma perspectiva puramente humana, é verdade.
Escolheu a cruz, quando poderia ser poderoso. Foi um servo sofredor, quando poderia haver sido um
rei conquistador. Lavou os pés aos discípulos, quando poderia ter os homens ajoelhados aos Seus pés.
Veio para servir, quando poderia ter submetido o mundo à servidão.
4. É um enganador (12). As autoridades judaicas viam nEle alguém que afastava os homens
da verdadeira religião. O fato concreto é que Jesus foi acusado de cada pecado possível contra a
religião. Foi acusado de violar o sábado, de ser beberrão e glutão, de ter amigos suspeitos, de destruir a
religião ortodoxa.
5. É um homem valente (26). Ninguém jamais duvidou de Sua coragem franca e clara. Teve a
valentia moral de desafiar as convenções e de ser diferente. Tinha a valentia física que podia suportar a
dor mais terrível. Teve a coragem de continuar quando sua família O abandonou, Seus discípulos
falharam e um deles O traiu. Entrou em Jerusalém, a própria cova dos leões. Jesus "tinha tanto temor
de Deus que jamais experimentou temor ante nenhum homem".
6. Tem uma personalidade dinâmica (46). O testemunho dos guardas que foram prendê-Lo.
7. É o Cristo, o Ungido de Deus. Nenhuma categoria humana serve para Ele; só Lhe serve a
categoria do divino.

Três Reações

1. Medo (13). Falavam dEle, mas tinham medo de elevar a voz. Cochichos.
2. Crença (31). Homens e mulheres que não podiam negar ou deixar de crer no testemunho
de seus próprios olhos. Escutaram o que Jesus dizia, viram o que fazia, defrontaram-se com Sua
personalidade dinâmica, e creram. Se alguém se liberta de preconceitos e temores, não tem outra
alternativa senão crer.
3. A Reação de Nicodemos - a defesa de Jesus (50). Este é o nosso dever. O privilégio que
nos é dado por Deus - defender a Cristo ante a crítica, até zombaria, dos homens.

Capítulo 8

I. A mulher adúltera - 7:53 - 8:1-11

Autenticidade e Canonicidade

Os eruditos concordam que esta seção originalmente não formava parte do Evangelho de
João, embora registre um incidente genuíno na vida de Jesus. Não somente uma esmagadora maioria
de antigos MSS Gregos a omitem neste ponto, como muitos dos MSS posteriores que a incluem aqui
fazem uma marcação denotando dúvida sobre sua posição. Ainda um grupo de MSS insere esta seção
após Lucas 21:38; um MS a situa após João 7:36; e uns poucos outros após João 21:24. Toda esta
evidência sugere que os escribas ignoravam sua exata posição, embora estivessem ansiosos em retê-la
como parte do quarto
evangelho.1

Sejam quais forem os problemas textuais levantados por esta passagem, "o relato tem todos
os sinais característicos de veracidade histórica."2

O significado da história

1
R.V.G.Tasker, The Gospel According to St. John, p. 110.
2
B.M.Metzger, citado por F.F.Bruce, João - introdução e comentário, p. 355.
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Evangelho de João
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A história apresenta várias questões.3 Uma diz respeito à razão pela qual os escribas e fariseus
levaram a mulher a Jesus: para julgar ou sentenciar? J. Jeremias sugere que ela já fora julgada e
condenada pelo Sinédrio e Jesus decidiria a punição. O v. 10 não favorece tal sugestão e é difícil crer
que a mais alta corte da nação deixaria uma definição de sentença com um pregador itinerante.

Outros crêem que a mulher não tinha sido ainda julgada porque o Sinédrio perdera sua
competência em casos capitais. O Quarto Evangelho indica que o Sinédrio não tinha o poder de
execução. Assim, se o Sinédrio não estava apto a julgar e executar a mulher, então a razão para trazê-la
a Jesus e a natureza da armadilha envolvida se tornam claras. Se Ele decide o caso em favor da mulher
e a liberta, Ele viola as claras prescrições da Lei Mosaica; se Ele ordena o seu apedrejamento,
enfrentará problemas com as autoridades Romanas.
A intenção dos escribas e fariseus não era obter um justo juízo para esta mulher, mas enredar
a Jesus (v. 6). Isto se depreende do fato de que a mulher foi levada sozinha a Jesus. Ora, para se
cometer adultério é necessária a participação de outra pessoa. Se a mulher foi apanhada em "flagrante"
(v. 4), como o seu parceiro conseguiu escapar? E ainda mais: o dever de mover a ação contra a mulher
pertencia ao marido e, pelo que consta do relato, o marido não estava presente entre os acusadores.
Ellen White afirma que eles mesmos haviam induzido a mulher ao pecado, para usá-la contra Jesus.4
v. 6 - Jesus escrevia na terra. O que Ele escrevia? Há algumas sugestões:5
a. T.W.Manson sugere que Jesus seguiu a prática legal romana, na qual o juiz primeiro
escreve a sentença (ação descrita no v. 6) para depois apresentá-la (o que ocorreria no v. 7 - "Aquele
que dentre vós estiver sem pecado, seja o primeiro que lhe atire pedra).

b. Outros pensam que a ação de Jesus refletiria Jer. 17:13: "O nome dos que se apartam de
mim serão escritos no chão, porque abandonam o Senhor, fonte das águas vivas."

c. J.D.M.Derret pensa que Jesus escreveu as palavras de Êxodo 23:1b: "Nem darás mão ao
ímpio, para seres testemunha maldosa."
d. Uma tradição que remonta a Jerônimo é que Ele escreveu os pecados dos acusadores. Com
isto concorda Ellen White ao dizer que "ali, traçados perante eles, achavam-se os criminosos segredos
de sua própria vida."6
Miséria e misericórdia - vv. 10-11

Este incidente diz muito acerca de Jesus e Sua atitude para com o pecador:7
1. Jesus sustenta como princípio fundamental que só o homem livre de falta tem o direito de
manifestar juízo sobre a falta dos demais (o único que tinha direito de atirar a primeira pedra era Jesus,
mas Ele não veio condenar e sim, salvar). "Não julgueis", Ele disse, "para que não sejais julgados"
(Mt. 7:1). Disse que o homem que pretendia julgar a seu irmão era como um que tinha uma trave no
olho enquanto querendo retirar um pequeno cisco do olho de seu próximo (Mt. 7:3-5). Um dos erros
mais comuns é exigir dos outros um comportamento que nós mesmos não podemos cumprir. É comum
um membro da igreja criticar a outro por faltas das quais ele mesmo é tão culpável como seu próximo.
A qualidade que nos permite julgar não é o conhecimento - isto é algo que todos temos; é a realização

3
Cf. R.E.Brown, The Gospel According to John I-XII, p. 337.
4
Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, p. 445.
5
Cf. Brown, p. 333.
6
White, Ibid.
7
Cf. William Barclay, The Gospel of John, Vol. 2, pp. 6-9.
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Evangelho de João
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em bondade - nenhum de nós é perfeito aqui. Os próprios fatos da situação humana implicam que
somente Deus tem o direito de julgar, pela simples razão de que nenhum homem é bom o suficiente
para julgar a qualquer outro.
2. Jesus também sustenta como princípio que nosso primeiro sentimento em relação a alguém
que cometeu um erro deve ser a misericórdia. Tem sido dito que o dever do médico é "às vezes curar;
freqüentemente aliviar e, sempre, consolar." Quando nos confrontamos com alguém que cometeu um
erro, nosso primeiro sentimento não deve ser "Não tenho nada a fazer por alguém que agiu desta
forma", mas sim "O que eu posso fazer para ajudar? O que eu posso fazer para apagar as
conseqüências de tal erro?" Em simples palavras, devemos sempre estender aos outros a mesma
compassiva misericórdia que desejaríamos nos fosse estendida em semelhante situação.
3. É importante compreender como Jesus tratou esta mulher. É fácil empregar esta passagem
para extrair dela uma lição incorreta, dando a impressão de que Jesus perdoava apressada e facilmente,
como se o pecado não tivesse a menor importância, ou que se pudesse perdoar sem qualquer
pagamento da penalidade. Pelo contrário, o próprio Jesus pagaria o preço, não somente dos pecados da
mulher, mas também de seus acusadores e mesmo de toda a humanidade, tomando o seu lugar,
sofrendo e finalmente morrendo sobre a cruz. Isto mostra quão terrível é o pecado. Não se pode
transigir com o erro. Jesus não transigiu. Ele despediu a mulher, contudo não fechou os olhos para o
seu pecado. Mais ainda pode ser dito da atitude de Jesus para com a mulher:

3.a. Uma segunda oportunidade. É como se Jesus tivesse dito: "Sei que você fez coisas
erradas, mas a vida não terminou; você tem a oportunidade de se redimir." Jesus sempre manifestava
um interesse intenso, não só no que a pessoa havia sido, mas no que ela podia chegar a ser.
3.b. Misericórdia. A diferença fundamental entre Jesus e os escribas e fariseus era que estes
queriam condenar, enquanto Jesus desejava perdoar. Aqueles conheciam a emoção de exercer o poder
para condenar; Jesus conhecia a emoção de exercer Seu poder para perdoar. Segundo Agostinho, Jesus
também condenou, "porém o pecado, e não a pecadora."8

3.c. Desafio. O desafio com o qual Jesus confrontou a esta mulher foi o de uma vida livre de
pecado. Não disse: "Está tudo bem, não se preocupe, continue fazendo tudo o que fazia até agora." Ele
disse: "Está mal; você precisa mudar; vá, e não peques mais." Não se trata de um perdão fácil. Trata-se
de um desafio.
3.d. Confiança na natureza humana. A mulher acabara de ser apanhada em flagrante
adultério, e Jesus demonstra Sua confiança nos seres humanos pecadores. Em Jesus a natureza humana
pode ser transformada (como foi o caso daquela mulher).
3.e. Advertência. A advertência não está explícita, mas é percebida claramente. Aqui temos a
situação eterna do evangelho, a opção eterna. Jesus confrontou esta mulher com uma opção: podia
voltar a seus velhos hábitos ou podia iniciar uma vida nova, em união com Jesus.

E Ellen White diz que isto foi para aquela mulher "o início de uma nova vida, vida de pureza
e paz, devotada ao serviço de Deus" e que ela se tornou uma das mais firmes seguidoras de Jesus.9

II. Jesus, a Luz do Mundo - vv. 12-20.

Jesus proclamou-Se a luz do mundo, assim como no cap. 7:37-38 Ele disse ser a fonte de
águas vivas; e ambas as proclamações parecem ter sido induzidas pelas cerimônias da festa dos
Tabernáculos. Assim como com a cerimônia da água, havia um background bíblico para o tema da luz
8
Citado por L. Bonnet & A. Schoroeder, Comentario del Nuevo Testamento - J
Hechos, Tomo 2, p. 182.
9
White, Ibid., p. 446.
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Evangelho de João
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nos Tabernáculos e, realmente, na mesma passagem do VT. No verso anterior da passagem de
Zacarias (14:8) que descreve o fluir das águas vivas a partir de Jerusalém, ouvimos: "E será um
contínuo dia... pois haverá luz mesmo à tarde."
Godet10 vê neste episódio uma comparação que Jesus faz de Si mesmo com a coluna de fogo
que, durante o Êxodo, iluminava a marcha de Israel durante a noite; o povo devia segui-la para não
extraviar-se pelo deserto. Este pensamento encontra apoio em Ellen White.11

Nas cerimônias dos Tabernáculos, na primeira noite (e provavelmente nas noites seguintes)
havia um ritual de iluminação, com quatro candelabros de ouro (segundo o Talmude, cada candelabro
tinha 25 m de altura12), que estavam no Pátio das Mulheres, e sua luz se espalhava e era vista por toda
a Jerusalém. "Na iluminação de Jerusalém, o povo exprimia sua esperança da vinda do Messias, para
espalhar Sua luz sobre Israel."13

A Luz do Mundo. Foi neste contexto que Jesus disse: "Eu sou a luz do mundo." No
pensamento e idioma judaicos a palavra luz era associada de forma muito especial com Deus. "Jeová é
minha luz" (Sal. 27:1). "Em Ti está o manancial da vida; na Tua luz veremos a luz" (Sal. 36:9). "Jeová
te será por luz perpétua" (Isa. 60:19). "Ainda que more em trevas, Jeová será minha luz" (Miq. 7:8). O
livro de Isaías diz que nos tempos messiânicos Jeová será a "luz perpétua" de Seu povo (Isa. 60:20). O
Servo do Senhor é nomeado luz das nações para que a salvação de Deus alcance até os limites da terra
(Isa. 49:6), e o Messias é descrito como a grande luz do povo que andava em trevas (Isa. 9:2 - cf. Mat.
4:16). Os rabinos sustentavam que o nome do Messias é luz. 14 Assim, com tal afirmação, Jesus Se
declarou o Messias.

O que significa seguir a Jesus? Segundo Veloso 15, a palavra "seguir" encontra-se
exclusivamente nos quatro Evangelhos, em todo o Novo Testamento e, de acordo com Barclay 16, a
palavra akolouthein tem cinco sentidos diferentes:
a. Usa-se freqüentemente de um soldado que segue seu capitão. Nas longas marchas, nas
batalhas, nas campanhas em terras estranhas, o soldado segue aonde o capitão o levar. O cristão é o
soldado cujo comandante é Cristo.
b. É freqüentemente usado de um escravo acompanhando a seu senhor. Onde quer que vá o
senhor, o escravo ali está para servi-lo. O cristão é o escravo cuja alegria é sempre servir a Cristo.
c. Também se usa freqüentemente da aceitação da opinião de um sábio conselheiro. Quando
um homem está em dúvida, procura um especialista, e, se ele é sábio, aceita o juízo que recebe. O
cristão é o homem que orienta sua vida e conduta pelo conselho de Cristo.
d. Usa-se ainda da obediência às leis de uma cidade ou estado. Se um homem deseja ser um
membro útil de qualquer sociedade ou cidadão de qualquer comunidade, deve se conformar a suas leis.
O cristão, sendo um cidadão do reino do céu, aceita a lei do reino e de Cristo como a lei que governa a
sua vida.
10
Citado por Bonnet e Schroeder, p. 183.
11
White, p. 447.
12
Comentario Biblico Adventista, Tomo 5, p. 963.
13
White, p. 447.
14
Barclay, p. 13.
15
Mario Veloso, Comentário do Evangelho de João, p. 200.
16
Barclay, pp. 12-13.
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Evangelho de João
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e. Freqüentemente também é usada de seguir a linha de argumento de um mestre ou de seguir
o tema principal de um discurso. O cristão é o homem que entendeu o significado do ensino de Cristo.
Ele coloca a mensagem em sua mente e entende, recebe as palavras em sua memória e relembra, e
esconde-a em seu coração e obedece.

O que Me segue. Singular. Pressupõe uma decisão pessoal. Não é possível segui-LO em
massa; cada um é responsável pela sua própria opção. Esta luz está em movimento e convida para
segui-la para sair das trevas. Jesus propõe com isso o itinerário de Seu êxodo. O homem deve seguir a
direção da luz: não se lhe permite traçar seu próprio curso através do deserto desta vida. No deserto os
antepassados haviam seguido a coluna de luz. Os que a haviam seguido sem se rebelar contra sua
direção alcançaram Canaã. Os outros faleceram no deserto.

Não andará em trevas. Aparece aqui a oposição entre luz e trevas estabelecida no prólogo
(1:5). Os verdadeiros seguidores não somente não andarão nas trevas da ignorância moral e espiritual,
da impureza, como também alcançarão a terra de luz. Para não andar em trevas, que são em todo
sentido o oposto da luz, o homem deve seguir a Jesus, ou seja, receber Seus ensinamentos, entrar em
comunhão com Ele por uma fé viva e conformar toda a sua vida com a vida santa do Salvador.

III. A incompreensão fatal - vv. 21-30.

Jesus novamente fez uma afirmação que seus ouvintes não compreenderam muito bem. A
reação deles mostrou isto, dando-Lhe uma oportunidade de explicá-la e aplicá-la à condição deles.
Três coisas podem ser extraídas da passagem:

a. Há certas oportunidades que passam e não retornam. A cada homem é dada a oportunidade
para aceitar a Cristo como Salvador e Senhor; mas esta oportunidade pode ser recusada e perdida. O
Verbo encarnado está na terra de forma visível, mas por tempo limitado. Este período é a chance deles;
se O aceitarem pelo que Ele é, receberão o direito de se tornarem filhos de Deus, terão vida eterna.
Mas, se perderem a oportunidade, não haverá outra. O tempo desta presença visível terá passado, e
então O procurarão em vão. Em vez de gozarem vida eterna através da fé nEle, morrerão em seu
pecado - sem que ele tenha sido tirado.
b. Implícito neste argumento está a verdade de que a vida e o tempo são limitados. Ninguém
tem todo o tempo do mundo; ninguém tem uma vida ilimitada; nossa duração e nossa vida têm,
necessariamente, um limite. Devemos tomar essa decisão durante o tempo que nos é concedido. O
tempo que temos para decidir-nos por Jesus é limitado, e ninguém sabe qual é seu limite. Portanto,
temos todas as razões possíveis para tomar a decisão agora mesmo.
c. Justamente porque temos uma oportunidade na vida, também existe o juízo. A
oportunidade perdida implica o juízo. Quanto maior essa oportunidade, quanto mais freqüentemente
ela se nos ofereça, quanto mais clara ela for, maior também o juízo se ela for rejeitada e a deixarmos
passar. Esta passagem nos confronta com a glória de nossa oportunidade, e a limitação do tempo que
temos para aceitá-la.

v. 23 - "Vós sois... Eu sou". Eles e Jesus pertencem a níveis distintos. Eles pertencem ao que
é "daqui de baixo", Jesus ao que é "de cima", ou seja, à esfera de Deus, que é a esfera do Espírito (1:32
- desde o céu). Eles, portanto, estão fora da esfera do Espírito, são "carne" (3:6; 8:15). A esfera do
mundo é a esfera do pecado, da incredulidade e da morte (8:24). Este mundo é o kosmos de 1:10, que
não deu crédito ao Verbo divino quando Ele veio, o kosmos do qual Jesus disse: "Ele me odeia porque
dou testemunho a seu respeito de que as suas obras são más" (7:7). Jesus dissera ser "a luz do kosmos",
mas somente aqueles que O seguem têm a "luz da vida" e não andam nas trevas (v. 12). Seguindo-O,
provam que, como Ele, não são deste mundo. Os demais decidem-se pelas trevas e, de acordo com
81

Evangelho de João
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isso, morrem em seus pecados. A esfera de baixo é a esfera da morte; a de cima, da vida. Cada um
deve fazer a sua opção. Para estar onde Jesus está (7:34), terão que nascer do alto (3:3). Em 17:16 os
discípulos são incluídos na mesma esfera de Jesus: "Eles não são do mundo como também Eu não
sou." Colossenses 3:1 oferece um interessante paralelo com esta terminologia: "Se fostes ressuscitados
com Cristo, buscai as coisas lá do alto - que são de cima."
v. 24 - "Se não crerdes que Eu sou morrereis nos vossos pecados." Jesus tem oferecido a água
viva (7:38) e a luz da vida (8:12). Se os homens recusam este dom da vida, morrerão. No v. 21 pecado
está no singular, pois no pensamento Joanino há somente um "pecado" do qual os muitos "pecados"
são meros reflexos. Este "pecado" é a recusa de crer em Jesus. Tal opção os leva inevitavelmente a
cometer múltiplas injustiças. É a dinâmica do mal, que prolifera gerando morte. A única maneira de
escapar ao pecado e às suas conseqüências é reconhecê-Lo como Messias. Crer nEle como Messias é a
condição para estar onde Ele está (7:34) e poder segui-Lo para onde Ele vai. É preciso passar de baixo
para cima, do mundo para a esfera do Pai, que é o lugar onde Jesus está.
v. 25 - "Quem és Tu?" A pergunta parece desnecessária, depois das repetidas afirmações de
Jesus (7:28, 37ss; 8:12) e da que acaba de fazer (8:24), mas, na realidade, não podem compreendê-las,
porque eles, "os de baixo", não podem entender Aquele que pertence à esfera "de cima". São surdos à
esfera do Espírito (3:8) e não podem reconhecê-la. Os seus pressupostos (8:14ss) e a figura do Messias
que criaram (7:27) não passam de racionalização de sua pertença à esfera da morte. Jesus não
corresponde a sua concepção. Aparece a seus olhos apenas como violador da lei (5:18; 7:23) e Suas
palavras continuam sendo para eles um enigma.
v. 28 - "Quando levantardes o Filho do homem, então sabereis que Eu sou..." Não haverá
resposta adequada à pergunta "Quem és Tu?" até que o Filho do homem seja levantado; isto será a
resposta definitiva. "Importa que o Filho do homem seja levantado", Ele disse a Nicodemos, "para que
todo o que nEle crê tenha a vida eterna" (3:14ss). Quando O crucificarem, dar-se-ão conta de que Ele é
o Messias enviado por Deus e de que Sua atividade correspondeu a Sua missão. Sua morte será a prova
definitiva da Sua missão divina. Ela demonstrará sua inteira coerência, a coerência de um amor que
chega até a dar a vida pelo homem (1:14; 10:17ss; 14:31; 15:13).

Levantar tem o duplo sentido de morte e exaltação; matando-O, farão com que se manifeste Sua
glória. Para eles, levantá-Lo significará destruí-Lo; mas, sem o saber, serão instrumentos de Sua
exaltação. Sua morte será sinal de vida, ao qual acorrerão de todo o mundo os filhos dispersos (11:52).
Do Homem levantado fluirá o Espírito (3:14ss) que possibilitará sair da esfera da morte (8:23 - os de
baixo) e passar à vida ( os de cima) onde está Jesus.
v. 30 - "Muitos creram nEle" - não esperaram pela evidência de Ele ser "levantado". Foram
impressionados por Suas palavras, mas não possuíam um alto grau de fé (8:33-40).
vv. 31-32 - O discípulo autêntico

Jesus fala aos que creram do v. 30. O poder com que Ele falava já levara alguns dos ouvintes
a crer nEle, mas ser discípulo é algo constante, é um estilo de vida. As características do verdadeiro
discípulo, segundo Barclay17, são as seguintes:

1. O discipulado começa com o crer. Seu começo é o momento quando o homem aceita o que
Jesus diz como verdadeiro, tudo o que Ele diz sobre o amor de Deus, tudo o que Ele diz sobre o terror
do pecado, tudo o que Ele diz sobre o significado real da vida.
2. Discipulado significa uma permanência constante na palavra de Jesus, e isto envolve quatro
coisas:

2.a. Constante ouvir a palavra de Jesus. O cristão é o homem que durante toda a sua vida
ouve a voz de Jesus e não toma nenhuma decisão até que primeiro ouça o que Ele tem a dizer.
17
Barclay, Op. Cit., pp. 20-22.
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Evangelho de João
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2.b. Envolve um constante aprender de Jesus. O discípulo (mathétés) é literalmente o que
aprende, pois é isto o que a palavra Grega significa. Toda a sua vida o cristão deveria aprender mais e
mais sobre Jesus. A mente fechada é o fim do discipulado.
2.c. Envolve um constante penetrar na verdade das palavras de Jesus. Ninguém pode ler ou
ouvir as palavras de Jesus apenas uma vez e então dizer que entendeu seu pleno significado.
Permanecer na palavra de Jesus significa constantemente estudar e pensar acerca do que Ele disse até
que nos apropriamos do que Ele disse e o incorporamos a nossa vida.
2.d. Envolve um constante obedecer a palavra de Jesus. O cristão não estuda para uma
simples satisfação acadêmica ou apreciação intelectual, mas a fim de descobrir o que Deus deseja que
ele faça. O discípulo é "aquele que aprende", mas "aprende" a fim de "fazer". A verdade de Jesus leva
à ação.
3. Do discipulado surge o conhecimento da verdade. Aprender de Jesus é aprender a verdade.
"Conhecereis a verdade", disse Jesus. Mas, o que é a verdade? Que verdade conheceremos? Há muitas
respostas possíveis a esta questão, mas a mais compreensiva é que a verdade que Jesus nos traz mostra
os reais valores da vida. Na verdade de Jesus vemos que coisas são realmente importantes e quais não
são.
4. Discipulado resulta em liberdade. "A verdade vos libertará." Em Seu serviço há perfeita
liberdade. O discipulado nos traz três liberdades:

4.a. Liberta-nos do temor. O cristão não anda sozinho, anda com Jesus, e, em Sua companhia,
não há lugar para o temor.
4.b. Liberta-nos do eu. Muitos reconhecem que seu maior obstáculo é o próprio eu. E ele
clama em desespero: "Eu não posso mudar a mim mesmo. Eu tenho tentado, mas é impossível." Mas o
poder e a presença de Jesus pode recriá-lo e torná-lo uma nova criatura.
4.c. Liberta-nos do pecado. Da penalidade do pecado (justificação - passado), do poder do
pecado (santificação - presente) e da presença do pecado (glorificação - futuro).
v. 33 - "Jamais fomos escravos de alguém" - Em nenhum sentido esta declaração está correta.
Do ponto de vista político, no instante em que pronunciavam estas palavras, estavam sob o domínio de
Roma. Do ponto de vista histórico, foram escravos no Egito, estiveram sob o domínio dos assírios, dos
babilônios, etc. E do ponto de vista espiritual, são escravos do pecado (v. 34).
v. 37 - "Bem sei que sois descendência de Abraão" - Jesus reconhece que são descendência de
Abraão em sentido natural, ainda que a frase pareça irônica depois de haver declarado sua escravidão.
Sublinha a contradição que implica sua conduta. Gloriar-se de ser linhagem de Abraão e, ao mesmo
tempo, procurar matar a Jesus, são atitudes contraditórias. Eles, que pretendem descender de Abraão,
não se parecem com ele. Jesus enfatiza a idéia de que o relacionamento moral é mais importante do
que o natural e, por isso, os verdadeiros filhos de Abraão são aqueles que seguem o seu exemplo.
v. 38 - Eu vi junto de Meu Pai
vós ouvistes(vistes) em vosso pai.

Aqui um paralelismo antitético onde a linha dois é entendida como uma referência à
descendência "dos judeus" do diabo (o que será expresso claramente no v. 44).

V. 39 - "Nosso pai é Abraão" - Os judeus protestam contra uma possível indicação de que são
filhos do diabo.

"Se sois filhos de Abraão..." - Ao reafirmarem sua descendência Abraâmica, Jesus os


confronta com o modo de agir deles. O problema não é de se originarem de Abraão segundo a carne,
mas terem com ele uma "ligação espiritual", uma "semelhança de caráter". 18 O critério para filiação é
mais uma vez o princípio de que o filho deve agir como o pai, e as ações dos judeus em odiar a Jesus
18
White, Desejado, p. 451.
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mostram que eles não são filhos de Deus. Na tradição judaica, "as obras de Abraão" designavam a
benevolência, a modéstia e a humildade. Mas afirmava-se também entre os rabinos que quem não
realizava estas obras realizava a de seus antepassados, que eram idólatras. Se eles fazem o contrário de
Abraão, pois querem matar O que comunica a verdade de Deus, devem ser filhos de outro pai.19
v. 41 - "Nós não somos bastardos" - Lit. "de fornicação". Os judeus apresentam um
argumento contra Jesus. Ele tem estado falando sobre Seu Pai celestial e sobre o pai deles, mas não
haviam rumores sobre o Seu nascimento? Não existiam algumas dúvidas acerca de se Ele era
realmente filho de José? Com isto os judeus estavam dizendo: "Nós não nascemos ilegitimamente [mas
Tu nasceste]." 20
v. 42 - Jesus insiste em usar os termos "pai" e "filhos" em um sentido ético: filhos são aqueles
que apresentam as qualidades do pai. A única prova de filiação é a semelhança com o próprio pai. Se a
sua conduta tivesse sido aprendida de Deus, necessariamente quereriam a Jesus, que vem de Deus;
contudo, querem matá-Lo, como expressão do seu ódio. Não têm os mesmos sentimentos nem o
mesmo modo de agir de Deus, logo não são filhos de Deus.
v. 44 - A ênfase sobre a natureza essencial do diabo ou o que ele foi desde o princípio está em
todo o verso 44. Talvez seja um contraste com 8:25 onde Jesus enfatizou que Ele era o que estivera
falando a eles desde o princípio. Aqui, pela primeira vez no Evangelho, se destaca o fato de que o
diabo é o real antagonista de Jesus. Assim, ao procurarem a morte de Jesus, os judeus estão fazendo a
"obra" de Satanás. Isto é exemplificado ao extremo em Judas, em cujo coração o diabo se introduziu,
levando-o a trair a Jesus (13:2, 27). Contraste com as variadas declarações de Jesus de estar fazendo a
"obra" do Pai. Ao enfatizar a natureza essencial do diabo como um pecador, um assassino e um
mentiroso, Jesus está falando na tradição do período tardio do VT que traçava todo pecado e morte à
obra do diabo descrita nos primeiros capítulos de Gênesis (cf. Sab. 2:24; Sir. 25:24). A acusação
específica de mentiroso está ligada com o engano de Eva por Satanás e a acusação de assassino à
história de Caim.

A ênfase sobre a mentira na última parte do verso é enfatizada. No dualismo Joanino, a


mentira é equivalente a trevas; é parte do reino diabólico que é oposto à verdade e luz de Deus. Assim,
não se pensa aqui em engano ocasional, mas em perversão fundamental. Se Jesus Cristo é a verdade
(14:6), o diabo é o mentiroso por excelência. No Evangelho o dualismo luz/trevas é mais comum do
que verdade/perversão; mas em I João a última forma de dualismo é freqüente (1:6; 2:4; 4:20; 5:10). I
João 2:22 pergunta: "Quem é mentiroso senão aquele que nega que Jesus é Cristo? Este é o anticristo,
o que nega o Pai e o Filho" (ver também II João 7). Se no Evangelho verdade e mentira são
personificadas em Jesus e Satanás, em I João 4:1-6 o espírito de verdade e o espírito do erro são
encontrados nos homens; e em II João 4 e III João 3 os cristãos andam na verdade (estilo de vida -
cristãos versus não-cristãos). Os filhos de Deus são caracterizados por seu amor à verdade; os filhos do
diabo, por sua recusa em aceitar a verdade. O diabo é a máxima negação da verdade.
vv. 45-46 - "Porque Eu digo a verdade, não Me credes" - Por causa da ascendência espiritual
dos Seus adversários, o fato de Ele dizer a verdade era razão suficiente para eles O rejeitarem. Há uma
oposição radical entre os filhos do pai da mentira e a verdade. Eles não criam em Jesus embora Ele
lhes falasse a verdade; João diz que eles não criam porque Ele falava a verdade. Em 3:20 os filhos das
trevas odeiam a luz; aqui os filhos da mentira odeiam a verdade.
v. 47 - Este verso forma uma inclusão com 41 e 42. Os judeus alegavam no v. 41 que Deus
era seu pai; Jesus termina Sua resposta a eles no v. 47 dizendo: "Não sois de Deus." No v. 42 Jesus
iniciou Sua resposta destacando que eles não O amavam muito embora Ele viesse de (ek) Deus; no v.
47 Ele diz que a razão pela qual eles não O ouvem é porque eles não são de (ek) Deus.
v. 48 - Jesus tem dito que os judeus não são os verdadeiros filhos de Abraão (v. 31-41a), nem
19
Juan Mateos & Juan Barreto, O Evangelho de São João, p. 392.
20
Ver R. Brown, p. 357; White, 451.
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os verdadeiros filhos de Deus (41b-47); e agora, de 48-59 eles desafiam Suas alegações de quem Ele é.
Jesus disse que eles são filhos do diabo; agora eles dizem que Ele "tem demônio". Esta mesma
acusação Lhe havia sido feita anteriormente pela multidão (7:20) e novamente O acusarão (10:20) [ver
também Mc. 3:22-25]. A idéia de posse demoníaca, segundo a crença dos judeus do primeiro século,
está relacionada com a demência, pois supõe-se que esta era um produto direto da posse demoníaca.
João menciona esta crença, mas não parece indicar que Jesus a tenha aceito. Isto significa que a
acusação dos judeus incluía a idéia de que Jesus estava demente. Nas acusações contra Jesus de ser
ilegítimo (v. 41), de ser um samaritano e de ser demente encontramos os precursores dos ataques sobre
Jesus que se tornaram parte da apologética judaica contra o cristianismo.
vv. 50, 54 - A busca da glória. No cap. 7, v. 18, Jesus apresentou o fato de que Ele não estava
procurando Sua própria glória como um critério de que Ele estava falando a verdade. Isto é repetido
nestes versos, com a nota adicional que Deus busca a glória de Jesus e de que esta glorificação de Jesus
será realizada através do juízo vindicatório que o Pai proferirá. Posteriormente, na hora da paixão,
morte, ressurreição e ascensão, que é a hora do julgamento do mundo (12:31; 16:11), será dito que o
Filho é glorificado (12:23; 13:31; 17:1). Para alguns homens este juízo que vindica e glorifica o Filho
será um juízo que leva à morte e o reino do diabo, mas não para aqueles que guardam a palavra de
Jesus (v. 51).

Os versos 45, 50 e 54 se relacionam com 5:43 (ver o comentário). Ele diz a verdade
precisamente porque não vem em Seu próprio nome, nem busca a Sua própria glória. Jesus condena
implicitamente a atitude de Seus adversários. Se Ele viesse buscando satisfazer a própria ambição e
afirmando-Se a Si mesmo, O aceitariam; mas, se assim o fizesse, seria mentiroso como eles. A busca
da própria glória não corresponde à esfera divina. Este é um pensamento puramente humano. A glória
própria nada é. Eles precisam sair dessa luta permanente, por querer alcançar uma posição pessoal.
Precisam compreender que nada disso produz uma autêntica satisfação, tampouco dá sentido algum à
existência. A única posição pessoal válida na vida é aquela que o Pai concede ao ser humano. O
contraste entre a atitude de Cristo e a dos fariseus é realmente impressionante.21
v. 51 - "Em verdade, em verdade" - declaração solene. Mostram a importância do fato de Ele
buscar a honra e glória do Pai. Jesus mais uma vez oferece a oportunidade da salvação, a esperança da
vida eterna, mesmo àqueles que O querem matar.
"Guardar" - "Guardar" a palavra ou mandamento de Jesus é um tema Joanino comum (14:21,
23-24; 15:20; 17:6; I João 2:5). Significa ouvir e obedecer, e assim a promessa no v. 51 é bastante
semelhante à encontrada em 5:24 - "Quem ouve a Minha palavra... tem a vida eterna... passou da
morte para a vida." "Guardar" significa mais que "ouvir"; carrega a noção da palavra de Jesus
habitando no crente. A palavra de Jesus é o antídoto para o pecado e morte que o diabo trouxe ao
mundo no jardim do Éden.

"Não verá a morte" - ou, "viverá eternamente". Guardar Sua palavra ou cumprir Seus
mandamentos conduz a uma experiência de vida eterna.
vv. 52-53 - A declaração de Jesus é recebida pelos judeus com a má compreensão tão
freqüente na narrativa Joanina. Sempre pensando no nível deste mundo, "de baixo", eles entendem
Suas afirmações em termos de livramento da morte física, assim como eles tinham entendido,
equivocadamente, Suas afirmações sobre a liberdade em termos de liberdade política (v. 33). Sua
objeção reintroduz o tema de Abraão, que dominou os versos 31-41.
"És maior que nosso pai Abraão?" - Mulher samaritana (4:12): "És maior que nosso pai
Jacó?" Jesus já havia negado sua condição de filhos (8:39b).

"Que morreu?" - Insistem na idéia da morte inevitável. Eles, que alimentavam a idéia da
morte (de Jesus) são incapazes de compreender uma promessa de vida. A mulher samaritana se
21
Veloso, p. 210.
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Evangelho de João
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lembrava de Jacó como doador de um poço, porém os judeus não se recordam de que Abraão era o
receptor da promessa; somente mencionam a sua morte. Para eles era simplesmente passado, e não se
trata de esperança. Abraão não os leva ao Messias, cumprimento da promessa. Nada esperam do
futuro.

"Quem pretendes ser?" - Jamais chegam a uma conclusão própria (8:19, 25) porque se
recusam a examinar os fatos (7:31).
v. 56 - "Abraão... viu o Meu dia..." - Jesus insiste no fato de que Ele é o real cumprimento da
história de Israel que começou com a promessa a Abraão, e assegura-lhes que foi dEle que Abraão
teve uma visão. Ellen White escreveu:

Abraão desejara grandemente ver o prometido Salvador.


Fazia as mais fervorosas orações para que lhe fosse dado contemplar o Messias antes de Sua
morte. E viu a Cristo. Foi-lhe concedida uma luz sobrenatural, e ele reconheceu o divino
caráter de Cristo. Viu o Seu dia e alegrou-se. Foi-lhe dada uma visão do divino sacrifício pelo
pecado. Desse sacrifício tinha ele uma ilustração no que se passara consigo mesmo (cita Gên.
22:2). ... Essa terrível prova foi imposta a Abraão, a fim de poder ver o dia de Cristo e
compreender o grande amor de Deus para com o mundo..."22
v. 57 - "Ainda não tens cinqüenta anos e viste a Abraão?" Não entendem a alusão messiânica
de Jesus. Interpretam com sarcasmo Sua afirmação, como se se tratasse de conhecimento pessoal e
imediato de Abraão, e pretendem mostrar-Lhe o seu absurdo. Aos cinqüenta anos terminava a vida
ativa (Núm. 4:3, 39; 8:24ss). Sendo ainda homem jovem, pretende ter sido contemporâneo de Abraão.
Jesus lhes dissera que Abraão vira o Seu dia; eles, porém, Lhe perguntam se Ele viu a Abraão. Com a
mudança de perspectiva pretendem frisar a superioridade de Abraão sobre Jesus.

Uma curiosidade da exegese, que remonta ao tempo de Irineu, no fim do segundo século, diz
que os 46 anos mencionado em 2:20 indicam a idade de Jesus naquela época (início do ministério);
acrescentando-se Seus três anos de ministério, chega-se a um total de 49 anos. Assim, Sua vida na terra
equivale às primeiras sete das setenta "semanas" de Daniel.23
v. 58 - Jesus responde com solene declaração: "Amém, amém". Com freqüência o duplo
"amém" serve para introduzir uma afirmação que expressa a conclusão do que o precede, sendo
bastante apropriado neste contexto para expressar uma verdade tão sublime. Não se detém na questão
colocada por Seus adversários. Jesus não pode ser encaixado na medida de tempo dos homens. Os
judeus haviam cometido o erro de atribuir a Jesus uma existência meramente temporal. Viam só a
manifestação histórica, não a Pessoa eterna; só o humano, não o divino. Jesus, portanto, reafirma Sua
essência eterna, absoluta. Para enfatizar este presente eterno usa o infinitivo aoristo (genésthai) para
indicar o nascimento de Abraão no tempo, e o presente indicativo em relação a Si mesmo.24
v. 59 - "Pegaram em pedras" - Os judeus reconheceram a implicação de divindade nas
palavras de Jesus. Levítico 24:16 ordenara: "Aquele que blasfemar o nome do Senhor, será morto; toda
a congregação o apedrejará." Não há certeza acerca da definição legal de blasfêmia no tempo de Jesus;
mas em João, o uso de ego eimi foi suficiente para os judeus tentarem executar a ordem de Levítico.
Na perspectiva do evangelista, contudo, eles estão simplesmente provando que Jesus falou a verdade:
eles são homicidas como o pai deles (v. 44).
"Jesus Se ocultou" - Esta frase faz inclusão com 7:10, 14: a subida a Jerusalém, para a festa
dos Tabernáculos, para apresentar-Se no templo, não publicamente, mas em oculto, clandestinamente.
22
White, p. 453.
23
Bruce, pp. 76-77, 181.
24
Guilhermo Hendriksen, El Evangelio Segun San Juan, p. 332.
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"Jesus saiu do templo" - Jesus volta à clandestinidade. Deus não abandona aos homens porque
Ele quer, mas porque os homens O repelem. Em seu intento de matar a Jesus, os incrédulos O
rejeitaram completamente. Por conseguinte, Jesus os abandonou e, passando pelo meio deles, retirou-
Se. No templo a glória de Deus se manifestou nEle, não com gestos de poder para ganhar publicidade,
como propuseram os Seus irmãos (7:4), e sim oferecendo salvação como expressão do amor de Deus.
Ao sair Jesus do templo, é a própria glória de Deus que se afasta dele, deixando-o vazio.

A denúncia do templo feita por Jesus no início de Seu ministério (2:13ss) não obtivera
resposta. Então, com gesto clamoroso e simbólico, expulsou a todos do templo. Agora Jesus, o Filho,
sai daí em razão do perigo de morte que O ameaça. Decididamente, já não é a casa do Pai; o homicida
e mentiroso ocupou o seu lugar.

Esta cena poderia aludir ao que ocorreu com Moisés no deserto (Êxo. 17:1-7). Os israelitas,
por causa da falta de água no deserto, "tentaram ao Senhor, dizendo: 'Está o Senhor no meio de nós ou
não?'" E estavam prestes a apedrejar a Moisés. 25 Os dirigentes judeus tentam apedrejar a Jesus, que
ofereceu a água viva (7:37, 39) e que no templo, posto de pé (cf. Êxo. 17:6), é a manifestação da
presença de Deus no meio deles (ver 1:26).26

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Evangelho de João
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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO GERAL

Autor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
Data e Lugar. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
Propósito do Evangelho. . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
Destinatários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
Problema Estrutural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
Esboço do Evangelho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

OBSERVAÇÕES GERAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

COMPARAÇÃO DOS QUATRO EVANGELHOS . . . . . . . . . . . . . . 7

VOCABULÁRIO JOANINO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

Pisteuein = Crer . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
Hora = Hora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
Semeia = Sinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Zoe = Vida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
Ego Eimi = Eu Sou . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

COMENTÁRIOS GERAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

Capítulo 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
Prólogo: 1:1-18 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
Capítulo 2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
Capítulo 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
Capítulo 4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
Capítulo 5 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
Capítulo 6 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
Capítulo 7 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
Capítulo 8 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89

BIBLIOGRAFIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102

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