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TRATAMENTOS TERMOQUÍMICOS DOS AÇOS

Universidade Federal de Itajubá


Prof. Paulo Junho de Oliveira

4. TRATAMENTOS TERMOQUÍMICOS DOS AÇOS


Definição: Os tratamentos termoquímicos visam o endurecimento superficial dos aços, pela
modificação parcial da sua composição química nas seções que se deseja endurecer.
Em Engenharia muitas vezes são necessárias peças que tenham ao mesmo tempo, uma boa
resistência a choques e durezas elevadas para resistir bem ao desgaste (dentes de engrenagens,
matrizes, pinos móveis, apoios para mancais, etc.).
Com essas propriedades na maioria dos casos são incompatíveis, usam-se uma série de
tratamentos termoquímicos no intuito de consegui-las.
Em geral os tratamentos termoquímicos constam de um endurecimento superficial pela
modificação parcial de sua composição química e aplicação simultânea e mesmo depois de
um tratamento térmico.
Os principais tratamentos termoquímicos são:
4.1. Cementação
Consiste basicamente na introdução de carbono na superfície dos aços de baixo carbono até
um teor de 1%, em profundidade determinadas.
Para isto se aquece o aço até acima da zona crítica (900 a 950ºC), pois assim este tem maior
possibilidade de dissolver mais carbono, bem como de absorver este último quando em
contato com substâncias carburizantes (cementos).
A têmpera posterior produzirá martensita na camada endurecida em carbono.
A profundidade de cementação depende da temperatura, do tempo à temperatura, da
concentração de carbono. O teor de carbono decresce à medida que se penetra em
profundidade.
Os aços para cementação, além de teor de carbono relativamente baixo e eventualmente
apresentarem alguns elementos de liga em baixos teores devem possuir granulação fina, para
melhor tenacidade tanto na superfície endurecida como no núcleo.
Antes da cementação, os aços devem ser normalizados para permitir usinagem, pois, após a
cementação, somente operações de retificação podem conferir as dimensões e o tolerâncias
definitivas.
Finalmente, deve-se procurar obter uma distribuição de carbono, da superfície para o interior,
gradual, ou seja, deve-se evitar linha nítida de demarcação entre a camada endurecida e o
núcleo.
Na cementação as reações fundamentais são:
2C0 + 3Fe ⇌ Fe3C + CO2
CH4 + 3Fe ⇌ Fe3C + 2H2
Os gases promotores da formação de Fe3C são, portanto, o CO e o CH4 (metano).
A cementação pode ser realizada por 03 processos:
4.1.1. Cementação sólida ou “em caixa”
Neste processo a substância carbonácea, ou seja, fornecedores de carbono, é sólida,
constituídas das chamadas misturas carburizantes. As misturas mais usadas incluem carvão de
madeira aglomerado por meio de óleo comum ou óleos de linhaça, com uma substância
ativadora, que pode ser, entre outras, carbonato de bário, carbonato de sódio, carbonato de
potássio e carbonato de cálcio.
Às temperaturas elevadas, o carbono reage e combina com o oxigênio do ar:
C + O2 ⇌ CO2
O CO2 reage com o carbono do carvão incandescente:
CO2 + C ⇌ 2CO
O CO reage, por sua vez, com o ferro do aço segundo a reação:
3Fe + 2 CO ⇌ Fe3C + CO2
O CO2 originado reage novamente com o C do carvão incandescente e assim por diante.
A presença do ativador – por exemplo BaCO3 – contribui para aumentar a velocidade de
fornecimento do CO, pois, às temperaturas de cementação, ocorrem as reações:
BaCO3 ⇌ BaO + CO2
CO2 + C ⇌ 2CO
A cementação sólida é levada a efeito geralmente entre 850 a 950ºC.
Na cementação sólida, a profundidade de penetração do carbono pode atingir 2mm, ou mais;
como o processo é de controle relativamente difícil, não se deve forçar a obtenção de uma
camada cementada além de 0,5 a 0,7 mm, devido à quase impossibilidade de ter-se uma
camada uniforme.
4.1.2. Cementação gasosa
Neste processo, a substâncias carbonácea é uma atmosfera gasosa, como CO, gases derivados
de hidrocarbonetos (gás natural, propano, etano, butano), etc.
As reações fundamentais são:
2CO ⇌ (C) + CO2
CO + H2 ⇌ (C) + H2O
CH4 ⇌ (C) + 2H2
(metano)
C2H6 ⇌ (C) + xCH4 + yH2
(etano)
C3H8 ⇌ (C) + xC2H6 + yCH4 + 2H2
(propano)
Onde (C) é o carbono que se dissolverá na austenita e irá difundir-se no interior do aço. O
propano é o gás mais empregado.
4.1.3. Cementação líquida
O meio carburizante, neste processo, é um sal fundido cuja composição é variável. Os
componentes essenciais dos banhos de sal e sua quantidade variam em função da espessura da
camada cementada e da temperatura utilizada.
O mecanismo da cementação líquida pode ser explicado pelas seguintes reações:
2NaCN ⇌ Na2CN2 + C
NACN + CO2 ⇌ NaCNO + CO
resultando
3Fe + C ⇌ Fe3C
ou
3Fe + 2CO ⇌ Fe3C + CO2
A rigor, a ação carburizante é devida ao cianeto de sódio NaCN ¯ ativado pela presença de
sais alcalino – ferrosos, como cloreto de bário.
2NaCN + BaCl2 ⇌ Ba (CN)2 + 2NaCl
4.1.4. Cementação sob vácuo
É este um processo relativamente novo, pois foi introduzido em escala comercial em 1970. As
peças são introduzidas no forno, onde se processa o vácuo. Em seguida, a temperatura é
elevada na faixa de 925ºC a 1040ºC, em que a austenita pode ficar rapidamente saturada de
carbono. Introduz-se, então, um fluxo controlado de hidrocarbonetos gasosos (metano,
propano ou outro gás), em quantidade que depende da carga, da área das superfícies a serem
cementadas, do teor de carbono desejado e da profundidade de cementação. O gás, ao entrar
em contato com a superfície do aço, desprende vapor de carbono, depositando uma camada
muito fina de carbono na superfície do material. Esse carbono é imediatamente absorvido pelo
aço, até o limite de saturação.
O fluxo de gás é a seguir interrompido e as bombas de vácuo, que estão operando durante
todo o processo, retiram o excesso de gás. Nesse instante, começa a segunda fase do processo,
ou o chamado “ciclo de difusão controlada”, onde se atingem os desejados teores de carbono
e da profundidade da camada cementada.
As peças assim cementadas são menos suscetíveis à formação de óxidos, microfissuras,
descarbonetação e outros defeitos.
4.1.5. Tratamentos térmicos da cementação
A têmpera é o tratamento térmico que se realiza nos aços cementados. Ao se temperar esses
aços, deve-se levar em conta que o material apresenta duas seções distintas: uma
correspondente à camada cementada, de alto carbono, muito dura e de alta temperabilidade e
outra, central, de baixo carbono e dúctil.
De fato, o aço apresenta duas temperaturas críticas, o que significa que, no aquecimento para
têmpera, a temperatura crítica do núcleo pode ou não ser atingido eventualmente.
A têmpera pode ser realizada de acordo com as seguintes técnicas principais:
 Têmpera direta, que consiste em se temperar imediatamente após a cementação;
recomenda-se para aços de granulação fina ou no caso de peças cementadas em
banhos de sal, onde o tempo de permanência à temperatura de cementação é
geralmente mais curto, não ocorrendo, pois, excessivo crescimento de grão do
material;
 Têmpera simples, em que, o aço após a cementação é esfriado ao ar. Em seguida é
reaquecido e temperado. A temperatura de reaquecimento para a têmpera vai depender
da granulação do aço: quando esta é mais fina, aquece-se logo acima da linha A 1, ou
seja, austenitiza-se somente a camada cementada: ou aquece-se acima da A 3, o que
facilita a dissolução do carboneto e se atinge o núcleo também: pode-se aquecer numa
temperatura intermediária, que produz um núcleo mais resistente e tenaz.
 Têmpera dupla tipo A, B ou C.

4.2. NITRETAÇÃO
Neste processo, o endurecimento superficial é obtido pela ação do nitrogênio quando o aço é
aquecido numa determinada temperatura, sob a ação de um ambiente nitrogenoso.
O processo permite, além de alta dureza superficial e elevada resistência ao desgaste, melhor
a resistência à fadiga, à corrosão e ao calor.
No processo de nitretação clássico, a faixa de temperaturas é mais baixa que na cementação,
situando-se entre 500 e 560ºC. Esse fato acarreta menor probabilidade de empenamento das
peças durante o tratamento. Além disso, a camada superficial, uma vez nitretada, apresenta-se
suficientemente dura para as aplicações desejadas, não exigindo qualquer tratamento térmico
posterior.
Normalmente, entretanto, antes da nitretação, as peças sofrem um tratamento da têmpera e
revenido; esta última operação é realizada entre 600 e 700ºC, de modo a produzir estrutura
mole, que permite usinagem das peças até as tolerâncias desejadas, visto que, após a
nitretação, qualquer correção dimensional só pode ser levada a efeito mediante retificação.
Os processos de nitretação são os seguintes:
4.2.1. NITRETAÇÃO A GÁS
É o processo clássico, que exige um tempo muito longo, de 48 a 72 horas (às vezes cerca de
90 horas). A nitretação é levada a efeito na presença amônia.
Durante o processo, a amônia se dissocia parcialmente em nitrogênio, conforme a seguinte
reação:
2NH¯3 → 2N + 3H2
O nitrogênio produzido combina-se com os elementos de liga do aço e forma nitretos
complexos de elevada dureza.
Um dos inconvenientes do processo, além do tempo e em função de sua própria demora, é o
crescimento que o material sofre enquanto submetido ao tratamento. Assim sendo, esse fato
precisa ser levado em conta na usinagem a que são submetidas as peças antes da nitretação.
Na nitretação a gás, a espessura nitretada raramente ultrapassa 0,8mm e a dureza superficial
obtida é da ordem de 1.000 a 1.100 Vickers.
4.2.2. NITRETAÇÃO LÍQUIDA OU EM BANHO DE SAL
O meio nitretante é uma mistura de sais de sódio e potássio, como NaCN, em predominância,
Na2CO3 ou KCN, em predominância K2CO3, KCNO e KCl.
A faixa de temperatura varia de 500 a 560ºC e o tempo é muito mais curto que na nitretação a
gás, raramente ultrapassando duas horas.
As camadas nitretadas são geralmente menos espessas que na nitretação a gás.
As propriedades obtidas são semelhantes às obtidas no outro processo; aparentemente
conseguem-se melhores propriedades de fadiga.
Finalmente, enquanto na nitretação a gás os aços devem possuir certos elementos de liga (em
particular alumínio e cromo), qualquer tipo de aço, simplesmente ao carbono ou ligado, pode
ser nitretado em banho de sal.
4.3. CIANETAÇÃO
Consiste no aquecimento de um aço a uma temperatura acima de A 1 num banho de sal de
cianeto fundido, acarretando enriquecimento superficial de carbono e nitrogênio
simultaneamente. Segue-se resfriamento em água ou salmoura, e, assim, obtém-se uma
superfície dura e resistente ao desgaste.
A faixa de temperaturas varia de 760 a 870ºC, o tempo, dentro do banho de sal fundido, varia
de 30 a 60 minutos. A espessura da camada cianetada varia, em geral, de 0,10 a 0,30 mm.
O processo é aplicado em aços-carbono de baixo teor de carbono.
4.4. CARBO-NITRETAÇÃO
O meio carbo-nitretante é uma atmosfera gasosa, contendo carbono e nitrogênio ao mesmo
tempo. A atmosfera pode ser constituída pelos seguintes gases:
 Gás de gerador: 77 a 89%
 Gás natural: 9 a 15%
 Amônia: 2 a 8%
A temperatura varia de 700 a 900ºC e o tempo de tratamento é relativamente pequeno; a
espessura das camadas carbo-nitretadas varia de 0,07 a 0,7 mm.
4.5. BORETAÇÃO
Trata-se de um processo de endurecimento superficial relativamente novo que consiste na
difusão superficial do boro, que faz aparecer o boreto de ferro que é muito duro (1.700 a
2.000 Vickers).
A boretação é feita num meio sólido que é composto de carboneto de boro (B 4C) e de um
ativador (fluoreto duplo de boro e potássio).
A temperatura para esse tratamento é aproximadamente de 900ºC e durante um tempo, que
dependerá da espessura desejada. Por exemplo, para o aço SAE 1045 consegue-se durante 4
horas uma profundidade de pouco mais de 100 µ; já com 12 horas a espessura pode
ultrapassar os 200 µ.

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