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Cooperativismo e Agricultura Familiar:


um estudo de caso

Marta Cleia Andrade


E-mail: <marta.cleia@hotmail.com>.
Professora da FACER

Daniela Cristina Alves


E-mail: <danny_cristty@hotmail.com>.
Professora da FACER

Resumo

Este trabalho enfoca algumas práticas, vantagens e desafios enfrentados por agricultores fa-
miliares da cidade de Rubiataba, estado de Goiás, em direção à busca pelo fortalecimento da
atividade produtiva. Portanto, este artigo tem como objetivo identificar e analisar as principais
práticas, dificuldades e oportunidades encontradas pelos cooperados de uma cooperativa de
agricultores familiares, denominada Cooperativa Mista de Agricultores Familiares de Rubiataba
(COOMAFAR). Foi realizada uma pesquisa qualitativa, e para a coleta de dados utilizaram-se
questionários e entrevistas. Como resultado, a pesquisa aponta grande interesse dos produtores
em diversificar a produção, agregar maior valor aos produtos, ter maior acesso ao mercado e
com isso obter melhor competitividade. Mas esbarram em aspectos como a falta de incentivos
do poder público, de recursos financeiros, qualificação técnica e escassez de mão de obra. Com
esta pesquisa buscou-se colaborar para uma melhor compreensão da relação entre cooperativis-
mo e agricultura familiar.

Palavras-chave: Cooperativismo. Produtor. Coomafar.

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1. Introdução Hoje, podem-se observar muitas incerte-


zas relacionadas ao futuro das atividades da
Atualmente, o modelo produtivo requer agricultura familiar na região de Rubiataba.
mais flexibilidade, bem como maior contro- Uma considerável fração das áreas de peque-
le e qualidade sobre o trabalho e a produção, nas propriedades rurais encontra-se arrenda-
para responder de forma ágil às novas de- da para a indústria sucroalcooleira (Abreu,
mandas do mercado (Buendía Martínez & 2008). Ocorre, ainda, significativa expansão
Pires, 2002). Nesse contexto, as cooperativas, da cultura da cana-de-açúcar nas proximida-
que são organizações formadas por um gru- des da cidade. Apesar da importância desta
po de pessoas que têm em comum, o desejo e atividade para a economia, há a necessidade
a necessidade de se organizarem para atender de uma produção maior de alimentos do gê-
melhor os mercados, se mostram como uma nero agrícola. Somam-se a isso, outros fato-
importante alternativa. O cooperativismo, res como a falta de perspectiva dos filhos em
dentro da concepção de diversos autores tor- ajudar na gestão da atividade rural dos pais,
na-se uma opção de superação de problemas e
as políticas públicas pouco adequadas às
fortalecimento de muitas atividades produti-
realidades dos agricultores, dificuldades de
vas, pois pode ajudar na conquista de melho-
adaptação às modernas exigências do merca-
res resultados, bem como na facilidade de in-
do, entre outros.
serção e participação mais ativa na economia.
Assim, este artigo enfoca o cooperativis-
Nesse contexto, surge o pequeno agri-
mo no ramo da agricultura familiar. E, tem
cultor familiar, na busca por fortalecer sua
como objetivo identificar e analisar as prin-
atividade produtiva, através do ingresso em
cipais práticas, dificuldades e oportunidades
associações e cooperativas. Uma vez que essa
encontradas pelos cooperados de uma coo-
alternativa apresenta benefícios potenciais,
perativa de agricultores familiares da cidade
como: o acesso a novas tecnologias, crédito,
de Rubiataba, estado de Goiás, denominada
oportunidade de ingresso em mercados mais
Cooperativa Mista de Agricultores Familia-
competitivos, vantagens fiscais, dentre outros.
res de Rubiataba (COOMAFAR).
Há décadas relegada a segundo plano
A COOMAFAR é formada por 20 pe-
pelo Estado, a agricultura familiar e a sua base
quenos produtores rurais, que buscam me-
fundiária –a pequena propriedade– têm so-
lhor organizar a produção, nos moldes do
brevivido em meio à competição de condições cooperativismo, no intuito de obter melhores
e recursos orientados para favorecer a grande resultados no mercado local.
produção e a grande propriedade, setores pri- Com base no exposto, pode- se formu-
vilegiados no processo de modernização da lar a seguinte questão de pesquisa: quais são
agricultura brasileira (Carneiro, 1997). E, com as principais práticas, dificuldades e opor-
a globalização, as disparidades hoje existentes, tunidades encontradas pelos cooperados da
sejam em termos regionais, sejam em relação à COOMAFAR?
agricultura familiar, tendem a se acentuar ain- A importância deste trabalho está em
da mais (Graziano da Silva, 2001). ampliar as discussões no âmbito da relação
Nesse sentido, Pires (2010) salienta que entre cooperativismo e agricultura familiar,
as cooperativas são concebidas pela sua ca- permitindo, com base no caso analisado, co-
pacidade de organizar o espaço e a produção nhecer as estratégias utilizadas pelos coope-
rural, e se identificam como uma alternati- rados, bem como suas perspectivas relacio-
va capaz de organizar a atividade produtiva, nadas à atividade econômica.
potencializando as vantagens da agricultura Para tanto, este trabalho está dividido
familiar e revitalizando os territórios. da seguinte forma: além desta introdução, a
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primeira seção situa o referencial teórico, o glaterra, que sofria as consequências da revo-
qual contempla as origens e evolução do coo- lução industrial, uma vez que, nessa época,
perativismo; a parte seguinte situa o coope- foi substituída a mão de obra artesanal pela
rativismo no ramo agrícola; posteriormente industrial.
são feitas as discussões do cooperativismo e O grande mérito desses pioneiros não foi
suas relações com a agricultura familiar; a apenas a iniciação do cooperativismo mun-
seção posterior aborda a metodologia usada; dial, mas a criação de normas e princípios
em seguida aparece o tópico que apresenta os que ficaram conhecidos como princípios
resultados da pesquisa e por fim, são feitas as cooperativistas e, até hoje, mesmo reformu-
considerações finais do caso. lados, fazem parte dos sete princípios coope-
rativistas mundiais (Irion, 1997). Portanto, a
experiência dos pioneiros de Rochdale foi a
2. Referencial Teórico base para a constituição dos princípios e va-
lores do cooperativismo.
2.1. Origens e evolução do cooperativismo Vale reproduzir uma passagem em que
Irion (1997) relembra os congressos da Alian-
A cooperação entre as pessoas aparece ça Cooperativa Internacional (ACI), onde
na história da civilização em vários momen- foram determinados os princípios cooperati-
tos. No contexto da produção rural, o coope- vistas, segundo a base “Rochdale”:
rativismo surge como modo de inserção do
produtor em um mundo globalizado e com- Quadro 1: Princípios cooperativos
COMO ERA (1966) COMO FICOU (1995)
petitivo, pois sua forma de organização per- 1º Princípio - Adesão livre; 1º Princípio - Adesão livre e voluntaria;
2º Princípio - Neutralidade social, política, 2º Princípio - Controle democrático pelos
mite dividir os medos, as responsabilidades religiosa e racial; sócios;
3º Princípio - Participação econômica dos
e as alegrias. Assim, torna-se possível buscar 3º Princípio - Um homem, um voto;
sócios;
4º Princípio - Retorno das sobras; 4º Princípio - Autonomia e independência;
uma inserção mais sustentável na dinâmica 5º Princípio - Juro limitado do capital;
5º Princípio - Educação, treinamento e
formação;
produtiva (Pires, 2010). Gianezini (2010) sa- 6º Princípio - Educação permanente;
6º Princípio - Cooperação entre
cooperativas;
lienta que a importância do cooperativismo 7º Princípio - Cooperação intercooperativa.
7º Princípio - Preocupação com a
comunidade.
no mundo, hoje reside no fato de que é uma Fonte: Irion (1997), adaptado pelas autoras.
alternativa capaz de mudar comportamentos,
atuar com uma racionalidade própria e condi- Conforme descrito no Quadro 1, os prin-
cionar novos hábitos, ações, posturas e regras. cípios básicos do cooperativismo são mutá-
Conforme a literatura, as cooperati- veis e têm como finalidade fornecer uma di-
vas são uma forma ideal de organização das reção para aqueles que querem construir uma
atividades socioeconômicas da humanidade. cooperativa legítima e autêntica.
Juntas e cooperando, as pessoas trabalham As cooperativas precisam evidenciar
coletivamente, rumo a um mesmo propósito que as grandes bandeiras sociais como pleno
para alcançarem satisfação. emprego, distribuição de renda, justiça so-
Segundo Pinho (2004), o cooperativismo cial, segurança alimentar, desenvolvimento
nasceu na Inglaterra em dezembro de 1844, local e regional sustentável, são também suas
fundado por tecelões. Assim, foi formada a bandeiras, porque pregam seus princípios. Na
primeira cooperativa do mundo, constituí- medida em que realizam isso, as cooperativas
da por 28 cooperados. O objetivo dominante assumem um novo papel, ao serem defen-
era a sobrevivência do povo, em um bairro soras das democracias e promotoras da paz
chamado Rochdale, em Manchester, na In- (Schreiner, 2011).

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Para Irion (1997), a doutrina cooperati- sobrevivência e adequação à realidade e, as


vista traz formas de solução de ajuda mútua demais, enfrentam dificuldades financeiras e
entre pessoas que têm interesses ou anseios estão em processo de autoliquidação. Pode-se
em comum, pois permite modificar o am- afirmar que algumas das causas estão rela-
biente de concorrência através da coopera- cionadas à falta de capacidade de adequação
ção, criando oportunidades de trabalho. E, às mudanças, às novas tecnologias, falta de
funciona como um motor de negócios para lealdade e fidelidade à organização, à instabi-
uma melhor qualidade de vida das pessoas. lidade econômica das últimas décadas e aos
Nas observações de Pinho (2004), o coo- decorrentes planos econômicos que se fize-
perativismo veio para o Brasil com a coloni- ram presentes por um longo período na eco-
zação portuguesa, onde começou a aparecer nomia brasileira (Simioni, Siqueira, Binotto,
“o processo de criação de uma cultura da Spers, & Araújo, 2009).
cooperação” e logo em seu início foi inter- Somam-se a isso outros grandes desa-
rompida pela escravidão. fios: a internacionalização dos mercados, a
No decorrer do século XIX, como lem- pressão por inovação, preservação ambien-
bram Morato e Costa (2001), a chegada ao Bra- tal e segurança alimentar. Nesse contexto, o
sil de imigrantes Alemães e Italianos, deu iní- enfoque cooperativo é considerado um ins-
cio às comunidades, principalmente no sul no trumento de autoproteção para os pequenos
Brasil, que foram adaptando suas necessidades agricultores, principalmente, devido ao seu
aos moldes do cooperativismo da maneira que conceito de autoajuda (Aref, 2011).
aprenderam em seus países de origem. Há autores que apresentam a coopera-
A partir de 1970, a realidade do crédito ção como uma ferramenta de luta política
rural e a agricultura mecanizada propiciou o e social, na medida em que contribui para a
nascimento de cooperativas com estruturas sobrevivência econômica e amplia a competi-
tividade dos produtos no mercado. A coope-
empresariais mais sólidas e preocupadas com
ração contribui para melhorar as condições
a formação dos dirigentes e do corpo técni-
de vida, ao ampliar a possibilidade de acesso
co, para atender ao cooperado. O pensamento
aos bens de uso coletivo (moradia, infraes-
empresarial cooperativista nasceu nesse pe-
trutura, educação, transporte, saúde, lazer,
ríodo. Inicialmente, o ramo que melhor soube
etc.); eleva a capacidade das famílias de per-
utilizar essa relação, graças à especificidade manecerem na terra e possibilita o desenvol-
do seu produto, foi o agropecuário (Organiza- vimento da consciência social (Scopinho &
ção das Cooperativas Brasileiras (OCB) 2011). Martins, 2003).
Os motivos para a criação de uma coo-
perativa podem ser vários, como: a tentativa
de acabar com os atravessadores, facilitar o 2.2. O Cooperativismo no ramo agrícola
acesso ao mercado, comprar insumos a preços
acessíveis, promover registro de marcas, pa- Como visto, as cooperativas oferecem
tentes e rótulos, fornecer nota fiscal e obter as- um meio pelo qual grupos desfavorecidos
sistência técnica adequada; com vistas a obter podem trabalhar juntos, compartilhar os ris-
produtividade, diminuição de custos e melhor cos e resolver problemas comuns. O seu papel
competitividade da atividade produtiva. na agricultura tem sido reconhecido, por ofe-
Atualmente no Brasil, o cenário das coo- recer estabilidade e segurança para pequenos
perativas apresenta-se em diferentes situa- agricultores que lutam sozinhos para fazer
ções: algumas em situação econômica privi- frente à concorrência e mudanças no ambien-
legiada; outras ainda procurando formas de te competitivo.

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Percebe-se que as cooperativas agrícolas exigidas pelo ambiente e a sustentabilidade da


estão passando por adaptações em suas postu- atividade produtiva em debate, parecem ser
ras diante da realidade de mudanças constan- mais plausíveis com a estratégia de cooperação.
tes do mercado competitivo, uma vez que fo- O Brasil pode ser considerado o novo ce-
ram criadas e cresceram num período em que leiro do mundo, graças ao seu potencial de
predominava a agricultura tradicional. Para produção agrícola. Para atender à crescente
fazer frente à nova realidade, elas buscaram se demanda global por alimentos, são necessá-
profissionalizar no que se refere ao processo rias políticas públicas que garantam estabili-
de gestão e às relações com os seus associados dade ao produtor, visão estratégica de mer-
e se adaptar às regras do mercado, obtendo cado e planejamento da produção. Contudo,
maior credibilidade (Simioni et al., 2009). o Brasil precisa, ainda, eliminar os fatores de
O movimento cooperativista brasileiro insegurança jurídica no campo, melhorar a
tem nas sociedades de produção agropecuá- infraestrutura logística, reduzir custos, den-
ria e agrícola sua principal força econômica e tre outros fatores (Schreiner, 2011).
política. Para Pinho (2004), o ramo do coope- Na agricultura e pecuária, os produtores
rativismo mais bem estruturado é o agrícola, participam de um contexto em que há gran-
graças ao crescimento do potencial agrícola de necessidade de seus produtos (Rodrigues,
internacional. Em função da globalização, do 2005). Mas se eles não estiverem organizados,
aumento crescente da competição internacio- poderão perder oportunidades de crescimen-
nal e do protecionismo agrícola dos países de- to e desenvolvimento. Nesse sentido, quando
senvolvidos, as cooperativas agrícolas têm sido o número de proprietários de uma firma é
pressionadas a buscar soluções que garantam a grande, como o caso das cooperativas, é ne-
competitividade e sustentabilidade da agricul- cessária a separação entre a propriedade e a
tura e da própria cooperativa (Pinho, 2004). gestão. A separação entre a propriedade e a
Através da cooperação, os agriculto- gestão implica na necessidade da formula-
res podem realizar economias de escala na ção de contratos para delimitação das res-
aquisição de insumos agrícolas, melhorar ponsabilidades, para evitar o oportunismo e
seus padrões de produção e comercialização, diminuir a racionalidade limitada das partes
buscar acesso ao crédito, transporte, serviços (Trindade & Bialoskorski, 2012). Assim, al-
profissionais e, além disso, criar emprego e guns cooperados são escolhidos e nomeados
proporcionar desenvolvimento socioeconô- como diretores, com cargos e responsabilida-
mico (Zarafshani, Rostamitabar, Hosseini- des definidas. Desse modo, a atividade pro-
nia, Akbari, & Azadi, 2010). dutiva estará sendo mais bem organizada.
Segundo Guasselli (2002), as cooperati- Nessa linha, Simioni et al. (2009, p. 760)
vas agrícolas funcionam como instituições afirmam que “existe na relação entre diri-
de comercialização de produtos de seus coo- gentes e cooperados uma tendência ao aten-
perados, assistência técnica e revenda de in- dimento das demandas individuais, que ca-
sumos. Reúnem tanto os produtores rurais racterizam o oportunismo recíproco, em
do setor agrícola, quanto do setor pecuário. detrimento daquelas derivadas da filosofia
Essas cooperativas têm um papel significa- cooperativista”.
tivo de desenvolvimento rural e redução da O cooperativismo parece ser uma das so-
pobreza. Em todo o mundo, as cooperativas luções para o crescimento e desenvolvimento
desempenham papéis importantes nas indús- da atividade de pequenos grupos, como afir-
trias agroalimentares, ao fornecer produtos mam diversos autores. Juntos os cooperados
agrícolas (Aref, 2011). Portanto, as soluções podem operar como num sistema diferen-

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ciado com preços justos de compra e venda, tivas, nas quais seus membros combinam
afastando ou disciplinado a presença de atra- atividades agrícolas e não agrícolas, vem se
vessadores e criando a consciência de grupo. elevando.
Segundo Nascimento (2000), a importância Carneiro (1997) salienta que a incapaci-
que as cooperativas agrícolas representam, dade das famílias de se sustentarem exclusi-
com sua tradição, seu crescimento, tanto vamente da agricultura é vista como evidên-
pelo “volume de negócios que elas envolvem, cia de impossibilidade desse tipo de produtor
quanto pelo seu dinamismo”, pode-se dizer de assimilar as demandas e a própria lógica
que o desenvolvimento delas está relacionado do mercado e de incorporar as inovações tec-
ao desenvolvimento do país. nológicas. Consequentemente, o seu enqua-
dramento em uma categoria social periférica,
acaba por reforçar a marginalização desse
2.3 O Cooperativismo na agricultura familiar grande contingente da população rural que
terá a sua sobrevivência dependente das polí-
Buendía Martinez e Pires (2002) veem a ticas sociais.
agricultura como o principal eixo do desen- No tocante às políticas públicas, que
volvimento rural, especialmente, por consti- se mostram tão necessárias para o fortaleci-
tuir principal fonte de ocupação da popula- mento da agricultura familiar, Deponti (2007)
ção rural. Para essas autoras, essa perspectiva adverte que numa perspectiva neomarxista, a
ganha força pelo fato do cooperativismo pos- agricultura familiar na sociedade contempo-
sibilitar a organização da produção, diversifi- rânea, precisa ser reconhecida pela sociedade
cação das atividades agrícolas e a agregação e pelo Estado, de forma que assegure sua re-
de valor às commodities agrícolas. produção.
Por isso, as cooperativas vêm contribuin- Vale ressaltar a visão de Grisa, Gazolla e
do para a potencialização dos locais onde estão Schneider (2010), para esses autores o forta-
inseridas confirmando a perspectiva presente lecimento da agricultura familiar passa por
na literatura que identifica as cooperativas um conjunto de iniciativas do Estado, mas
como estratégias importantes para o desen- também dos próprios agricultores enquanto
volvimento local/rural (Buendía Martínez & atores sociais do seu próprio destino e desen-
Pires, 2002). volvimento.
Ao mesmo tempo, Graziano da Silva (2001) Nesse contexto, diante da importância da
aponta que está havendo êxodo rural, um agricultura familiar para a produção de ali-
fato inevitável, e, que a gestão das pequenas mentos no país, o governo federal criou algu-
e médias propriedades rurais está se indivi- mas políticas públicas para apoiar esse setor.
dualizando, ficando o pai e/ou um dos filhos Uma delas é o Programa Nacional de Alimen-
encarregado das atividades, enquanto os de- tação Escolar (PNAE), implantado em 1955,
mais membros da família procuram outras que garante a transferência de recursos finan-
formas de inserção produtiva e geração de ceiros para a alimentação escolar dos alu-
renda, em geral, fora da propriedade. nos da rede de educação pública (Fundação
Para Graziano da Silva (2001) as ocupa- Nacional de Desenvolvimento da Educação
ções agrícolas são as que geram menor renda; (FNDE) 2011). Cabe salientar que para a ven-
o número de famílias agrícolas vem dimi- da dos produtos para a merenda escolar, os
nuindo, pois elas não conseguem sobreviver agricultores familiares devem estar de acordo
somente de rendas agrícolas. Para esse autor, com as Leis nº 8.666/1993 e nº 10.520/2002,
nem mesmo o número das famílias pluria- que regem a necessidade de efetivação do

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procedimento de licitação (Federação das congregando-os de modo que desenvolvam


Associações de Municípios do Rio Grande do todo seu potencial interativo, sobretudo, nas
Sul (FAMURS) 2011). Desse modo, essa po- atividades de Trabalho, Produção e Consu-
lítica representa importante contribuição na mo, assim como em outros campos da ativi-
atividade dos pequenos agricultores. dade socioeconômica da produção familiar,
Segundo Buendía Martínez e Pires (2002), notadamente a integração da produção vege-
as cooperativas trazem consigo alterações na tal e animal, sustentada por agroindústrias”.
geopolítica econômica da sociedade contem- Em reunião realizada em abril de 2010,
porânea, através de suas organizações de pro- foi lançada uma nova oportunidade para ala-
dução e comercialização, e contribuem para vancar a COOMAFAR. Houve a ideia de co-
a potencialização das localidades onde estão mercialização de gêneros alimentícios para as
inseridas, principalmente dentro da perspec- escolas municipais e estaduais da região, pro-
tiva de desenvolvimento local. cesso que seria viabilizado pela política públi-
Por outro lado, quando o potencial de ca do governo federal, o PNAE.
uma localidade é abordado, pode-se dizer que A COOMAFAR foi escolhida para esta
as incertezas e possibilidades de crises são di- pesquisa devido à acessibilidade à cooperati-
minuídas a partir das ações que busquem a va. A diretoria se colocou à disposição para
diversificação da produção. Trata-se de uma o estudo, a fim de conhecer o diagnóstico
estratégia de acumulação, ou de escolha e estratégico e encontrar soluções para alguns
adaptação para atender às necessidades das problemas. Trata-se, portanto, de um estudo
famílias tanto em termos de segurança ali- de caso. Desse modo, pode-se dizer que as
mentar, quanto em termos de criação de no- investigações possibilitaram descobertas im-
vas fontes de renda e maior autonomia. Além portantes para a sobrevivência da entidade.
disso, melhora as condições socioeconômicas Como destaca Yin (2001), o estudo de
dos agricultores familiares (Grisa, Gazolla, & caso conta com muitas técnicas como, experi-
Schneider 2010). mentos, levantamentos, pesquisas históricas e
Enfim, como afirmam Gawlak e Ratzke análise de informações em arquivos, um mé-
(2001, p. 12) “a prática da cooperação educa todo que abrange tudo com lógica de planeja-
o homem, substituindo o individualismo por mento, e preparação na coleta e na leitura dos
uma mentalidade mais aberta, flexível, parti- dados. Houve, portanto, um planejamento
cipativa, humana e solidária”. As coopera- antes de se partir para a coleta de dados.
tivas tornam-se, portanto, uma rede de pes- O estudo utilizou-se de uma aborda-
soas em que suas atividades serão motores de gem qualitativa. Como coloca Matias-Pereira
desenvolvimento local. (2010), a pesquisa qualitativa é considerada
a relação entre o mundo real e o sujeito, que
não requerem métodos estatísticos, apenas
3. Metodologia estudo minucioso do ambiente.
Esta pesquisa é, ainda, de natureza des-
A COOMAFAR foi fundada em janeiro critiva. Segundo Gil (1999) a pesquisa descri-
de 2001, a partir da união de 25 produtores. tiva tem por objetivo a descrição das caracte-
Hoje, há um total de 20 cooperados, todos rísticas de um determinado evento. Para que
pequenos produtores rurais. Os objetivos da fosse atingido esse propósito, foi necessário o
criação da cooperativa estão descritos no ca- cumprimento de algumas regras de pesquisa,
pitulo II de seu Estatuto Social: “administrar como: o estudo do histórico da cooperativa,
os interesses econômicos de seus associados, do seu tamanho e estrutura, dos objetivos pe-

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los quais os cooperados a constituíram, das terpretar os dados obtidos. Essa metodologia
metas e dos objetivos buscados. de análise de dados é usada para descrever e
Utilizou-se de entrevistas, de questioná- interpretar o conteúdo de toda classe de do-
rio e de observação para a coleta de dados. cumentos e textos (Moraes, 1999).
Sendo que se buscou ir além de questiona- Em seguida é destacada a discussão da
mentos das experiências vividas pelos coo- pesquisa.
perados, mas também houve acesso a docu-
mentos que foram fontes de evidências. As
entrevistas foram feitas na propriedade de 4. Resultados e Discussões: o caso
cada cooperado, em ambiente doméstico e COOMAFAR
privado; fazendo-se uso de um roteiro pre-
viamente construído com base na literatu- Este estudo foi realizado na Cooperativa
ra aqui apontada. Na elaboração do roteiro Mista de Agricultores Familiares de Rubia-
para as entrevistas houve a preocupação em taba (COOMAFAR), composta por 20 coo-
investigar o motivo do ingresso na COOMA-
Este estudo foi realizado na Cooperativa Mista de Agricultores Famil
perados, todos pequenos produtores rurais.
FAR, as principais dificuldades e oportunida-
Rubiataba (COOMAFAR), composta por 20 cooperados, todos pequenos produtor
Atualmente, toda a produção é destinada ao
des encontradas após a adesão, assim como,
Atualmente, toda a produção é destinada
mercado local. ao mercado local.
os fatores impeditivos para a diversificação
Desse modo,e o GráficoDesse
1 apresenta
modo,ootamanho
Gráficoda1 propriedade
apresenta odos ta-produtores.
competitividade da produção rural. A inves- manho da propriedade dos produtores.
tigação teve ainda a intenção de saber como
Gráfico 1: Tamanho da propriedade
andam as ações da cooperativa, relacionadas à Gráfico 1: Tamanho da propriedade
assistência técnica e à oferta de incentivos para
o desenvolvimento da atividade produtiva.
Durante as entrevistas, às vezes surgia a
necessidade de mais questionamentos para
sanar dúvidas que iam aparecendo.
O questionário aplicado foi levado até as
propriedades dos cooperados e respondido
por 15 dos 20 cooperados. Os outros cinco
cooperados não quiseram participar da pes-
quisa. O intuito era descobrir o tamanho de Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pelas autoras, 2012.

suas propriedades, os produtos comercializa- Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pelas autoras, 2012.
dos, o local de comercialização e os produtos No Gráfico 1 é possível observar que to-
que tinham intenção de produzir visando di- dos os cooperados são pequenos agricultores.
versificar a produção. Todas suas propriedades possuem menos de
No Gráfico 1 é possível observar que todos os cooperados são pequenos agr
A técnica da observação foi também fun- 4 módulos fiscais. Eles vivem em regime de
Todas suas propriedades agricultura
possuem menosfamiliar,
de 4mas alguns
módulos produtores
fiscais 2
. Eles vivem em re
damental para complementar as descobertas.
Primeiramente, foi feito um agricultura familiar, mascontam
estudo explora-
com umacontam
alguns produtores pequena comparticipação de
uma pequena participação d
mão de obra contratada.
tório e um planejamento para o registro
obra das
contratada.
Através do Gráfico 2 observa-se que a
informações que seriam captadas.
Através do Gráficomaioria dos produtores
2 observa-se tem como
que a maioria principaltem como
dos produtores
A coleta de dados para este estudo ocor-
atividade a pecuária de atividade
leite, e comoa pecuária de leite, e como
atuação secundária, atuação
a produção de legumes, v
reu no mês de outubro, de 2011.
secundária, a produção de legumes, verduras
frutas. Apenas 13% dos produtores não produzem leite em suas propriedades.
Para a análise dos dados optou-se pela
e frutas. Apenas 13% dos produtores não pro-
análise de conteúdo, e buscou-se, a fundo, in-
duzem leite em suas propriedades.
Gráfico 2: Produtos comercializados

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produtos industrializados; pois foi apontado que 46%, a maioria, gostaria de produzir doces
biscoitos ou polpas de fruta.
202
Gráfico 4: Produtos que gostaria de produzir
Gráfico 2: Produtos comercializados Gráfico 4: Produtos que gostaria de produzir

Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pelas autoras, 2012. Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pelas autoras, 2012.
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pelas autoras, 2012.
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pelas autoras, 2012.
A preferência dos cooperados em produ- Esses dados mostram que uma signifi-
zir leite, pode ser explicada pelo fato da ati- cativa parte dos cooperados está disposta a
A preferência dos cooperados em produzir leite, pode ser explicada Esses dados mostram
fato da que
peloproduzir uma significativa
produtos parte dos cooperados
agroindustriais, buscandoestá disposta
vidade leiteira ser tradicional em Rubiataba
leiteira ser tradicional em Rubiataba e região. Percebe-se também
produzir nos produtores,
produtos agroindustriais,
e região. Percebe-se também nos produtores, agregar valorbuscando
e inovaragregar valor e inovar
na produção e, na produção e, talvez
talvez,
ça quanto às mudanças estruturais que seriam necessárias para a diversificação da
insegurança
Fonte: quanto
Dados da às mudanças
pesquisa, elaborado
conseguir
estruturais
pelas autoras, 2012.
conseguir
preços mais preços
favoráveis mais favoráveisSobre
na comercialização. na comerciali-
este aspecto, Beduschi e
rural. Assim, eles preferem evitar as incertezas e não correr riscos, continuando com
que seriam necessárias para a diversificação Abramovay (2004)zação.defendemSobre este aspecto,
que precisa Beduschi
haver destinação e Abramo-
de recursos federais voltados à
o de leite.
da produção rural. capacitação vay (2004)
dos produtores paradefendem que
a elaboração de precisa
projetos haver destina- de caráte
de desenvolvimento
ode-se observar
A preferência no dosGráfico 3 que aAssim,
cooperados maioria
em
eles preferem
dos produtos,
produzir leite, pode
evi-
27%,
ser éexplicada
comercializada
pelo fato da
colas
dade públicas,
tarfeira
leiteira ser
as incertezas
local
tradicionale com e não correr
ema Rubiataba
COOPER-AGRO riscos,
e região.
conti-tambémção
inovador.
(cooperativa
Percebe-seleiteira).
de recursos federais voltados à capacitação
nos produtores,
nuando com a estruturais
produçãoque de seriam
leite. necessáriasQuando dos produtores
questionou-se para a elaboração
os cooperados sobre osdefatores
projetos de
impeditivos para a
gurança quanto às mudanças para a diversificação da
Pode-se observar desenvolvimento de caráter inovador.
dução rural.
Gráfico 3: Assim,
Local de eles preferem evitar
comercialização asno
dos
Gráfico
incertezas
produtos e não3 correr
que ariscos,
diversificação da produção,
continuandoos mais
comcitados foram: a falta de incentivo dos poderes públicos
odução de leite.maioria dos produtos, 27%, é comercializada Quando questionou-se os cooperados
carência de assistência técnica rural e a escassez de mão de obra (tanto familiar quanto
Pode-secom as escolas
observar no Gráficopúblicas,
3 que a feira
maioria local e com a27%,
dos contratada).
produtos,
sobre os fatores impeditivos para a diversifi-
Grisa,é Gazolla
comercializada
e Schneider (2010) citam diversos benefícios decorrentes da
COOPER-AGRO
as escolas públicas, (cooperativa
feira local e com a COOPER-AGROleiteira). (cooperativa cação da produção, os mais citados foram: a
leiteira).
estratégia de diversificação, como novas fontes de renda, menor vulnerabilidade da
falta de incentivo dos poderes públicos, ca-
influências externas, segurança alimentar, entre outros.
Gráfico 3: Local de comercialização dos rência de assistência técnica rural e a escassez
Gráfico 3: Local de comercialização dos produtos No que diz respeito à falta de assistência técnica, Souza (2001) salienta que na
produtos de mão de obra (tanto familiar quanto con-
produção agrícola,tratada).
a decisão Grisa,
do tipoGazolla
de variedades a serem (2010)
e Schneider cultivadas,
ci- depende da
características de cada
tampropriedade. Tais aspectosdecorrentes
diversos benefícios estão relacionados com o tipo de solo
da estra-
tégia de diversificação, como novas fontes de
renda, menor vulnerabilidade das influências
externas, segurança alimentar, entre outros.
No que diz respeito à falta de assistência
técnica, Souza (2001) salienta que na produ-
ção agrícola, a decisão do tipo de variedades
a serem cultivadas, depende das característi-
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pelas autoras, 2012.
cas de cada propriedade. Tais aspectos estão
relacionados com o tipo de solo, clima, plu-
O Gráfico 4 mostra que é significativa a
viometria, pragas, entre outros. Para tanto, a
vontade, por parte dos produtores, de produ-
aplicação de conhecimento técnico especiali-
zir produtos industrializados; pois foi apon-
tado que 46%, a maioria, gostaria de produzir zado é importante com vistas a diminuir as
doces, biscoitos ou polpas de fruta. incertezas e riscos e, assim, obter resultados
favoráveis.

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Como previsto por Graziano da Silva Por outro lado, segundo a maioria dos
(2001), o último fator mencionado, escas- entrevistados, a maior dificuldade encontra-
sez de mão de obra, se deve ao fato de que da como cooperado da COOMAFAR, é a falta
os filhos dos cooperados, os quais poderiam de união entre os membros. Pode-se afirmar
ajudar a gerenciar a atividade rural, em sua que alguns cooperados, inclusive fundadores,
maioria, estão trabalhando no meio urbano. não têm um autêntico espírito cooperativista.
Nessa linha, Carneiro (1997) concorda que a Como previsto por Simioni et al. (2009), mui-
sazonalidade da produção agrícola pode dis- tos ainda não pensam no coletivo e buscam
pensar parcialmente ou integralmente traba- atender seus interesses próprios. Sabe-se que
lhadores que estarão disponíveis para exercer quando os membros têm tal comportamento,
outras atividades econômicas, mas não con- a estrutura cooperativista tende a se enfra-
sidera esse fato como uma ameaça à conti- quecer e começa a surgir alguns subgrupos
nuidade da atividade agrícola. dentro da cooperativa. Nesse sentido, quan-
Segundo Ávila (2009), um dos fato- do alguns problemas não são resolvidos, se-
res contribuintes para a escassez de mão de gundo os entrevistados, estes grupos come-
obra em Rubiataba e região, está relacionado çam a se confrontar. O que vem a colaborar
à presença das usinas sucroalcooleiras, pro- para o enfraquecimento e a desestruturação
cessadoras da cana-de-açúcar. Desse modo, a da cooperativa, e, ao mesmo tempo, implica
maior parte dos trabalhadores rurais parte em na redução do número de cooperados. Por-
busca das vagas nas usinas da região. E, “o tanto, conforme o ideal defendido por Ga-
desinteresse dos filhos em ficar na terra, in- wlak e Ratzke (2001), está faltando um pen-
viabiliza a produção agrícola” (entrevistado). samento dominante que abarque o bem-estar
Soma-se a isso, o arrendamento de pequenas do coletivo.
propriedades feito pelas usinas, muitas vezes, Esta situação, alinhada aos argumentos
vantajoso para o agricultor. Isso contribui de Simioni et al. (2009) é desfavorável, uma
para o êxodo rural, não apenas dos filhos, mas vez que a competitividade e influência do am-
às vezes, de toda a família. Dessa maneira, fica biente institucional, implica na necessidade de
difícil diversificar e alavancar a produção. uma atuação diferenciada em relação à cons-
Considerando as possibilidades apresen- trução de relações de lealdade mais estáveis.
tadas na literatura por Buendía Martinez e Para Morato e Costa (2001), o coopera-
Pires (2002), foi perguntado aos cooperados o tivismo surgiu como forma de organização e
que os levaram a ingressar na COOMAFAR. democracia para a distribuição de bens, com
O principal motivo apontado foi a busca de objetivos focados na solidariedade e demo-
agregação de valor em seus produtos, além cracia. Portanto, é necessária a educação das
de ter como e onde vender, ou seja, facilidade pessoas envolvidas nas atividades, de modo
no processo de comercialização. Sabe-se que que abracem a filosofia cooperativista.
a produção de produtos com atributos dife- Quando questionados sobre a importân-
renciados e de qualidade, cria novas oportu- cia da COOMAFAR para o desenvolvimento
nidades de mercado. E, essas novas oportuni- socioeconômico de Rubiataba e região, todos
dades incluem a inserção desses agricultores disseram ser importante para a geração de
em mercados nacionais e até internacionais renda para as famílias, valorização da classe
(Maluf, 2004). Outra motivação apontada pe- ruralista e melhor qualidade de vida.
los produtores foi a questão fiscal, pois par- Quando os cooperados foram indagados
ticipando da cooperativa, os impostos ficam sobre as ações da cooperativa para estimular
reduzidos. e mobilizar os agricultores em busca de ino-

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vações organizacionais e tecnológicas, todos Sobre os ganhos ou avanços obtidos após


disseram que há incentivos verbais nas reu- o ingresso na COOMAFAR, todos os coope-
niões, ou seja, discursos. Mas a cooperativa rados afirmaram que há melhor poder de ne-
ainda não garante aos cooperados o acesso às gociação e oportunidades de comercialização
inovações tecnológicas. dos produtos.
Ao serem perguntados, se a cooperativa
oferece cursos voltados para o planejamento
e controle da produção, práticas de gestão da 5. Considerações finais
qualidade, produção orgânica e agregação de
valor aos produtos, grande parte dos entrevis- Este trabalho buscou intensificar os de-
tados declarou que estas questões são discuti- bates em torno das relações do cooperativis-
das nas reuniões, mas ainda não foram concre- mo e a agricultura familiar. Seu objetivo foi
tizadas por falta de recursos financeiros. Nesse identificar e analisar as práticas, dificuldades
sentido, Aref (2011) lembra que é essencial que e oportunidades encontradas pelos coopera-
as cooperativas agrícolas busquem inspirar, dos de uma cooperativa de agricultores fami-
motivar e apoiar seus membros, bem como as- liares, denominada COOMAFAR.
segurar a sustentabilidade da produção. A COOMAFAR é constituída por peque-
Nota-se que as atividades desempe- nos produtores rurais que tem como objetivo
nhadas pelos produtores rurais carecem de buscar melhor acesso ao mercado, diversifi-
respaldo de políticas públicas ou até de es- car a produção e agregar valor aos produtos,
tratégias da diretoria administrativa, pois, através de processos industriais, e assim al-
a inexistência desses fatores tem comprome- cançar melhor posição competitiva.
tido os resultados da cooperativa. Corroborando as afirmações de Buendía
Complementarmente, entre os princi- Martínez e Pires (2002) o tipo de cooperativa
pais públicos-alvo da cooperativa, está a feira estudado, além de contribuir para o cresci-
local. Porém, quando se busca inserir os pro- mento econômico do Brasil, propicia desen-
dutos da cooperativa nesse mercado, conside- volvimento não só para a classe ruralista,
rado mais exigente, não há boa aceitação. Os mas para a comunidade em geral. Por isso,
produtos da cooperativa, principalmente as a COOMAFAR pode ser vista como uma al-
verduras e legumes, possuem uma aparência ternativa para o desenvolvimento socioeco-
inferior àqueles encontrados nos supermer- nômico das famílias dos pequenos agriculto-
cados, um dos motivos principais para serem res de Rubiataba. No entanto, é preciso que
rejeitados. Sabe-se que os consumidores va- ela avance em alguns aspectos relacionados à
lorizam, cada vez mais, nesse tipo de produto gestão, respeito à filosofia cooperativa, escas-
a autenticidade, os produtos recém-colhidos, sez de mão de obra, capacitação e inovação.
a cor e o sabor (Van der Ploeg, 2009). Portanto, para essa condição, com linha as
Uma política pública que favorece a agri- visões de Deponti (2007) e Buendía Martínez
cultura familiar brasileira é o PNAE. Tal pro- e Pires (2002) há a necessidade de atuação
grama rege que a compra de 30% dos produtos por parte do Estado, através de políticas que
destinados à merenda escolar, seja oriunda permitam o desenvolvimento da agricultura
da agricultura familiar. Sobre a contribuição familiar no Brasil e, consequentemente, do
dessa política pública, todos os cooperados grupo de produtores aqui destacado.
comentaram sobre essa oportunidade, que Um dos pontos fortes dessa cooperati-
garante a venda para as escolas, de R$ 9.000 va é a possibilidade de vender sua produção
(nove mil reais), por produtor, anualmente. para as escolas públicas, através do PNAE.
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Por isso, o interesse dos cooperados em fazer produtores ou, até mesmo, à diretoria da coo-
o beneficiamento de alguns produtos, pois há perativa buscar alternativas para fortalecer a
exigências nesse sentido; ao mesmo tempo, é atividade econômica.
necessário adotar algumas políticas e práti- Por fim, a principal limitação deste traba-
cas de gestão da qualidade dos produtos que lho é a de ser um estudo de caso de modalida-
são destinados à merenda escolar. de única, pois os resultados encontrados não
Com relação ao comportamento dos podem ser generalizados. Porém, as discus-
membros da COOMAFAR, nota-se que os sões aqui apresentadas servem como reflexão.
princípios cooperativistas precisam estar mais 1 ALIANÇA COOPERATIVA INTER-
presentes em seus modelos mentais, para as- NACIONAL (ACI): Congresso realizado em
sim, refletir em seus comportamentos. Em Viena em 1966, para a atualização dos princí-
consonância à pesquisa de Simioni et al. pios cooperativistas; realizado novamente em
(2009), alguns cooperados não têm um au- 1995, com a finalidade de fazer uma revisão
têntico espírito cooperativista e muitos bus- nos princípios, em Manchester (Irion,1997).
cam atender seus próprios interesses. Sabe-se 2 Segundo o INCRA (2008), módulo fis-
que nessas condições, a estrutura cooperati- cal é a unidade de medida expressa em hec-
vista tende a enfraquecer e abre espaço para tares, fixada para cada município. No caso de
comportamentos oportunistas. Assim, cor- Rubiataba, o módulo fiscal é de 30 hectares.
roborando o estudo de Simioni et al. (2009),
percebe-se que neste estudo, os valores coo-
perativistas de igualdade, coletividade e soli- Referências
dariedade são relegados a um segundo plano.
Em se tratando da atual diretoria admi- Abreu, M. A. P. (2008). Urbanização e (des)
nistrativa, nota-se por parte desta, falta de ruralização da agricultura familiar e seus
iniciativas em proporcionar aos produtores atores. Dissertação de Mestrado em Ecologia
cursos de qualificação, tanto nas áreas admi- e Produção Sustentável, Pontifícia Universi-
nistrativas quanto técnica, com vistas a supe- dade Católica de Goiás, Goiânia, GO, Brasil.
rar as dificuldades mencionadas e obter um
Aref, F. (2011). Agricultural Cooperatives
melhor desempenho de suas atividades pro-
for Agricultural Development in Iran. Life
dutivas. Haja vista que essa lacuna tem pre- Science Journal, 8(1), 82-85.
judicado o desempenho geral da cooperativa.
Portanto, tais iniciativas estariam relaciona- Ávila, S. R. S. A. (2009). Efeitos sócio-ecô-
das à busca pela modernização das técnicas nomicos da expansão da cana-de-açúcar no
administrativas e produtivas. Vale do São Patrício. Dissertação de Mestra-
Pois, como afirmam Simioni et al. (2009), do em Agronegócios, Universidade Nacional
para fazer frente à nova realidade do am- de Brasília, DF, Brasil.
biente competitivo, as cooperativas do ramo Beduschi, L. C., Filho., & Abramovay, R.
agrícola precisam se profissionalizar no que (2004). Desafios para o desenvolvimento das
se refere ao processo de gestão e às relações regiões rurais. Nova Economia, 14(3), 35-70.
com os seus associados e se adaptar às novas
regras do mercado. Complementarmente, Buendía Martínez, I., & Pires, M. L. L. S.
conforme a linha de pensamento de Grisa, (2002). Cooperativas e revitalização dos
Gazolla e Schneider (2010), pode-se dizer que espaços rurais: uma perspectiva empresarial
a intervenção do Estado com políticas públi- e associativa. Cadernos de Ciência e Tecnolo-
cas apropriadas é importante, mas cabe aos gia, 19(01), 99-118.

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Cooperatives and Family Farming: a case study

Abstract

This work focuses on some practical advantages and challenges facing family farmers Rubiataba
city, state of Goiás, towards the strengthening of productive activity. Therefore, this article aims
to identify and analyze the main practical difficulties and opportunities faced by the cooperative
to a cooperative of farmers, called Mixed Cooperative of Family Farmers Rubiataba (COOMA-
FAR). We conducted a qualitative research, and data collection was used questionnaires and in-
terviews. As a result, the research shows strong interest from producers to diversify production,
add more value to the products, have greater access to the market and thereby achieve better
competitiveness. But hindered by issues such as lack of incentives from the government, finan-
cial resources, technical expertise and shortage of manpower. This research aimed to contribute
to a better understanding of the relationship between cooperatives and family farms.

Keywords: Cooperative. Producer. Coomafar.

Endereço para contato:


Marta Cleia Andrade
E-mail: <marta.cleia@hotmail.com>.
Rua Pindaíba nº 96 Centro – Rubiataba-Go, CEP 76350-000

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