Você está na página 1de 5

O que precisamos entender sobre

traduções da Bíblia
Tire suas dúvidas sobre versões e traduções da Bíblia e
compreenda que se trata de um processo antigo, sério e
responsável. E desfrute da leitura da Bíblia.
Por Carlos Olivares 10 de maio de 2019

 Like
 Tweetar

 Imprimir página
 Enviar por e-mail
Manuscritos do Mar Morto da caverna de Qumram. O que se tem hoje são versões a
partir de cópias dos manuscritos (Foto: Shutterstock)

Ao escolher uma ou várias versões da Bíblia, sempre se deve lembrar de que elas não
foram escritas em português. O Antigo Testamento foi escrito em hebraico e, em alguns
casos específicos, em aramaico (ex.: Daniel 2:4-7:28). O Novo Testamento, por outro
lado, foi escrito em grego koiné ou helenístico, que é diferente do moderno e do clássico
em muitos aspectos. Isso significa que aquilo que lemos periodicamente e, em especial
na igreja, é uma tradução da Bíblia. Este artigo oferece dois conselhos que todo leitor
poderia considerar ao ler ou estudar uma ou mais versões.

Leia também:

 Nova versão da Bíblia é a primeira profunda em 60 anos


 Podemos confiar na Bíblia? 
Escolha a tradução correta

Fundamentando-se na metodologia usada, basicamente há duas classes de tradução da


Bíblia. Estas são: equivalência formal e equivalência dinâmica.

Equivalência formal – Uma tradução de equivalência formal adota, na medida do


possível, a estrutura gramatical da língua original e procura respeitar o uso léxico e
sintático do texto traduzido.

Exemplo: Na oração em hebraico, aparece primeiro o verbo e depois o sujeito. A


tradução de equivalência formal propõe seguir o mesmo padrão para apresentar o texto
bíblico de forma literal.

Equivalência dinâmica – O modelo da equivalência dinâmica, por outro lado, propõe


traduzir as línguas do texto bíblico de acordo com seu significado essencial,
independentemente de se a ordem das palavras mudar, ou se um adjetivo for
transformado em substantivo.

O significado dos vocábulos, conforme a proposta, funciona na base do propósito que


eles, contextualmente, buscam, selecionando termos que reúnam sentido semelhante e
não necessariamente a locução original. De acordo com essa interpretação, o importante
para essa perspectiva é adaptar a Palavra de Deus à linguagem, tempo, lugar e cultura
do leitor moderno, zelando para que a mensagem bíblica adquira um sentido atual e
pertinente.

É importante destacar que, tanto a tradução de equivalência formal quanto a dinâmica


têm limitações. Apesar do objetivo íntegro da primeira, e sem dúvida louvável, a
perspectiva formal ignora o fato de que nenhuma tradução é estritamente literal.
Aqueles que acreditam que para entender ou aprender um idioma o falante deve traduzir
literalmente de sua língua materna para que os demais possam entender, estão
equivocados.

Toda pessoa que conhece mais de um idioma sabe que isso é um erro comum. No
inglês, por exemplo, ao perguntar a idade de alguém não se pergunta: Quantos anos
você tem?, mas: Quão velho você é? (How old are you?). A tradução dinâmica, no
entanto, buscará aproximar o sentido do texto ao contexto do destinatário e o exporá de
forma compreensível para os leitores.

Não significa que as traduções de equivalência formal devam ser rejeitadas ou que
exibam nível inferior de conteúdo. Pelo contrário. Para o uso da exegese (interpretação
ou explicação crítica de um texto), essas são muito importantes, em especial, porque
proveem uma ordem e um sabor que nos aproximam do texto original da Palavra de
Deus. O problema é que a forma literal em que uma passagem Bíblia foi escrita, às
vezes, obscurece seu sentido pleno.

Porém, o modelo dinâmico também apresenta limitações, em especial quando os


tradutores escolhem parafrasear o texto bíblico. As paráfrases consistem de traduções
que não se atêm à ordem sintática do texto bíblico, e usam conceitos e frases que
procuram imitar e contextualizar verbalmente a mensagem de salvação. Em certos
casos, a liberdade empregada para realizar uma comunicação atenta contra o sentido
original de uma palavra.

Conhecer idiomas originais

Um elemento importante que merece respeito quanto aos tipos de tradução é o fato de
que os que participam dela devem conhecer e entender os idiomas originais. É verdade
que muitas versões no passado são fruto do trabalho de uma pessoa. Mas também é
verdade que esse indivíduo conhecia a flutuação gramatical das línguas bíblicas e
reconhecia as diferenças próprias da cultura bíblica (ex.: Lutero).

Hoje, diferentemente do passado, as traduções ocorrem em torno de comissões grupais


em que homens e mulheres especialistas em diversas áreas do conhecimento
(antropologia, linguística, teologia, línguas, etc.) discutem termos e frases com o
objetivo de reproduzir fielmente o texto bíblico. Por isso, prefira as versões em que mais
de um indivíduo fez parte, avaliando, além disso, as filosofias usadas na tradução.

O textus receptus sem as versões modernas

Sobre Textus receptus, veja este vídeo:

Visto que os originais da Bíblia, tecnicamente denominados autógrafos, desapareceram,


hoje estão disponíveis cópias. Essas cópias são chamadas de manuscritos que foram
copiados várias vezes por diferentes indivíduos ao longo das eras. Ao comparar os
manuscritos existentes, nota-se certas diferenças entres eles que se originaram durante o
processo de reprodução. Essas diferenças foram chamadas de variantes e são a estas que
o intérprete deve prestar atenção.

Embora seja importante destacar que nenhuma dessas variantes afeta negativamente o
sentido doutrinário da Bíblia nem pode negar sua existência. As versões da Bíblia,
geralmente, mostram essas variantes colocando-as entre parêntese e todo leitor da Bíblia
já notou que elas, em sua maioria, ocorrem no Novo Testamento.

O primeiro Novo Testamento grego a ser publicado foi o de Erasmo de Roterdã, em


1516 (1469-1536). O Novo Testamento de Erasmo, publicado um ano antes do início da
Reforma (1517), foi baseado em poucos manuscritos bizantinos.

Os manuscritos por ele usados inicialmente foram sete, todos encerrados desde o século
12 até o 16. Erasmo publicou várias adições a esses textos (1516, 1519, 1522, 1527,
1535). Nos últimos dois houve melhoras, embora de forma geral todos seguem uma
base semelhante ao primeiro trabalho.

Ao longo do tempo, surgiram outras versões que mantiveram a base do texto de Erasmo
a ponto de, em 1633, ser publicada uma edição na qual os editores incluíram as
seguintes palavras no prefácio: Textum ergo habes, nunc ab omnibus receptum, que
significa: “Portanto, você tem agora o texto recebido por todos”. Desde então, esse texto
se tornou conhecido como o Textus Receptus, ou seja, o texto recebido (TR). O Textus
Receptus serviu de base para a tradução para o português de João Ferreira de Almeida
(Novo Testamento, 1681).
Outros manuscritos mais antigos

Entre os séculos 16 e 19 a.D., foram descobertos novos manuscritos do Novo


Testamento em grego. Muitos desses manuscritos se comprovaram ser bem antigos;
muito mais antigos do que os que já haviam sido encontrados. Isso levou os estudiosos
da Bíblia a especularem que eles eram mais próximos dos autógrafos. Passou-se, então,
a criar normas a partir das quais escolher quais manuscritos correspondiam a que
período e que associação genealógica havia entre eles.

Resumindo, e trabalhando com base na produção de seus antecessores, em 1881 B. F.


Wescott e F. J. A. Horte publicam seu primeiro Novo Testamento em grego crítico, o
qual deu origem a uma nova era da crítica textual. Ou seja, a ciência que procura
estabelecer qual é o texto que mais se aproxima do original. O Novo Testamento grego
de Wescott e Hort foi acompanhado de um volume separado onde eram explicados os
princípios usados para determinar a melhor leitura. Entre outras coisas, Wescott e Hort
estabeleceram que os manuscritos usados no textus receptus tinham qualidade inferior
em comparação com os que compartilhavam um padrão comum mais próximo do texto
original.

A história da crítica textual é muito mais ampla e excede ao propósito deste artigo.
Porém, para resumir, podemos dizer que há duas versões modernas importantes do
Novo Testamento grego: a Nestle-Aland, edição 28, e a versão grega das Sociedades
Bíblicas, 5ª edição. Embora as duas se diferenciem pela forma de apresentação das
variantes no aparato crítico, ambas apresentam um texto grego idêntico e trabalham
tendo como base os mais de 5.500 manuscritos até o presente. Essas duas versões no
grego são as usadas por uma grande quantidade de comissões de tradução que buscam
expor o texto fiel e puro.

Ao escolher uma versão da Bíblia, tenha em mente que a tradução pode se basear em
uma filosofia que pretende recuperar esse texto original ou ignorar as novas
descobertas.

Um trabalho desse tipo requer não apenas conhecimento das línguas bíblicas, mas
também ter acesso a materiais e textos que permitam encontrar as palavras que os
autores da Bíblia desejaram originalmente transmitir.

Você também pode gostar