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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS


CURSO DE DIREITO

A FIXAÇÃO DO “QUANTUM” INDENIZATÓRIO NAS AÇÕES POR DANOS


MORAIS

ANTONIO SERENISKI JUNIOR

Itajaí [SC], outubro de 2006


UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS
CURSO DE DIREITO

A FIXAÇÃO DO “QUANTUM” INDENIZATÓRIO NAS AÇÕES POR DANOS


MORAIS

ANTONIO SERENISKI JUNIOR

Monografia submetida à Universidade


do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Direito.

Orientador: Professor MSc. Adilor Danieli

Itajaí [SC], outubro de 2006


AGRADECIMENTO

Primeiramente a Deus, arquiteto desta grandiosa obra,

pela força e perseverança que me concedeu durante toda esta


jornada.

A meus pais que com tanto amor e carinho estiveram juntamente


comigo na conquista de mais esta vitória.

À meu Professor Orientador Adilor Danieli, que sempre me


orientou com presteza e eficiência,

a quem devo meu crescimento e amadurecimento

na pesquisa jurídica.

Às grandes amizades que conquistei neste período

neste período de graduação e que levarei pro resto da vida.


iii

DEDICATÓRIA

Dedico a presente monografia a meus pais que


foram, são e serão sempre os meus maiores
professores.
iv

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí [SC], 20 de outubro de 2006

Antonio Sereniski Junior


Graduando
v

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale


do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Antonio Sereniski Junior, sob o
título A fixação do “quantum” indenizatório nas ações por danos morais, foi
submetida em 14 de novembro de 2006 à banca examinadora composta pelos
seguintes professores: MSc. Adilor Danieli (Orientador e Presidente da Banca),
MSc. Eduardo Campos (Membro) e MSc. Aparecida Correia da Silva (Membro), e
aprovada com a nota 10,0 (dez).

Itajaí [SC], 20 de outubro de 2006

Professor MSc. Adilor Danieli


Orientador e Presidente da Banca

Professor MSc. Antônio Augusto Lapa


Coordenação da Monografia
vi

ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o autor considera estratégicas à


compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Dano

Significa todo mal ou ofensa que tenha uma pessoa causado a outrem, da qual
possa resultar uma deterioração ou destruição à coisa dele ou um prejuízo ao seu
patrimônio1.

Dano moral

Pode-se definir o dano moral como a lesão aos sentimentos que determina dor ou
sofrimentos físicos, inquietação espiritual, ou agravo às afeições legítimas e, em
geral, toda a classe de padecimentos insuscetíveis de apreciação pecuniária2.

Direitos da personalidade

É o direito da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a sua integridade


física, a sua integridade intelectual e a sua integridade moral. É o direito comum
da existência porque é simples permissão dada pela norma jurídica a cada
pessoa, de defender um bem que a natureza lhe deu, de maneira primordial e
direta3.

Ato ilícito

1
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 238.
2
BUSTANTE ALSINA, Jorge. Teoria General de la responsabilidad civil. 8.ª ed. Buenos Aires: Abeledo
Perrot. 1993, p. 234.
3
DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 148.
vii

É ato ilícito por conseguinte, todo o ato praticado por terceiro que venha refletir,
danosamente sobre o patrimônio da vítima ou sobre o aspecto peculiar do homem
como ser moral. [...] morais, os dano de natureza não econômica e que se
traduzem em turbações de ânimo, em reações desagradáveis, desconfortáveis,
ou constrangedoras, ou outras desse nível, produzidas na esfera do lesado4.

Indenização

Em sentido genérico, quer exprimir toda compensação ou retribuição monetária


feita por uma pessoa a outrem, ao pagamento feito para recompensa do que se
fez ou para reparação de prejuízo ou dano que se tenha causado a outrem. É,
portanto, em sentido amplo, toda reparação ou contribuição pecuniária, que se
efetiva para satisfazer um pagamento, a que se está obrigado ou que se
apresenta como um dever jurídico5.

Reparação:

É o ato pelo qual se renova, se recompõe, se restabelece ou se restaura a coisa,


para que se conserve ou se retorne ao estado anterior, mostrando-se tal como
era, no mesmo aspecto e na mesma situação6.

Nexo de causalidade

O conceito de nexo causal, nexo etmológico ou relação de causalidade deriva das


leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do
exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se
de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas
nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não

4
BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais, 2.ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais,
1993. p. 31.
5
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 425.
6
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 702.
viii

identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não como ser
ressarcida. Nem sempre é fácil, estabelecer a relação de causa e efeito7.

Quantum debeatur

Locução latina. Quantia devida8.

Responsabilidade civil:

Designa a obrigação de reparar o dano ou de ressarcir o dano, quando


injustamente causado a outrem. Revela-se, assim, ou melhor, resulta da ofensa
ou da violação de um direito, que redunda em dano ou prejuízo a outrem9

7
SALVO VENOSA, Sílvio de. Direito civil- vol. IV. 4.ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2004. p. 45.
8
DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. p. 148
9
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. p. 705.
ix

SUMÁRIO

RESUMO ........................................................................................... XI

INTRODUÇÃO ................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4

CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL .......................................... 4


1.1 HISTÓRICO ......................................................................................................4
1.2 CONCEITO DE DANO MORAL......................................................................10
1.3 CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL ...........................................................12
1.3.1 ATO ILÍCITO ....................................................................................................13
1.3.2 Conduta do Agente ...................................................................................14
1.3.3 Nexo Causal................................................................................................16
1.4 PREVISÃO LEGAL ........................................................................................18
1.5 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE..................................................20
1.5.1 Culpa da Vítima ..........................................................................................20
1.5.2 FATO DE TERCEIRO ..................................................................................22
1.5.3 CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR ..................................................................25
1.5.4 LEGÍTIMA DEFESA ..........................................................................................27
1.5.5 Exercício Regular de Direito .....................................................................30
1.5.6 Estado de Necessidade .............................................................................33
1.5.7 Estrito Cumprimento do Dever Legal........................................................35
1.5.8 Cláusula de Irresponsabilidade ("Cláusula de não Indenizar")..............37

CAPÍTULO 2 .................................................................................... 39

A FIXAÇÃO DO "QUANTUM" INDENIZATÓRIO NAS AÇÕES POR


DANO MORAIS ................................................................................ 39
2.1 CRITÉRIOS PARA A FIXAÇÃO SEGUNDO A JURISPRUDÊNCIA .............41
2.2 CRITÉRIOS PARA A FIXAÇÃO SEGUNDO A DOUTRINA ..........................47
2.3 CRITÉRIO PARA A FIXAÇÃO DO "QUANTUM"
INDENIZATÓRIOUTILIZADO PELOS MAGISTRADOS DE BALNEÁRIO
CAMBORIÚ - SC ..................................................................................................62
x

CAPÍTULO 3 .................................................................................... 65

QUESTÕES CONTROVERTIDAS ACERCA DO DANO MORAL ... 65


3.1 FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO PELO SISTEMA TARIFARIO ........................65
3.2 DANO MORAL A PESSOA JURÍDICA ..........................................................69
3.3 INDUSTRIALIZAÇÃO DO DANO MORAL.....................................................72
3.4 A EXACERBAÇÃO NAS PRETENSÕES INDENIZATÓRIAS .......................78

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 82

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 85


xi

RESUMO

A presente monografia trata do instituto do dano moral, em


específico, a fixação do “quantum” indenizatório que o lesado auferirá ao ser
vítima de uma situação vexatória. Um ponto de suma importância que foi
abordado para a realização do presente trabalho monográfico, foi o entendimento
tanto doutrinário quanto jurisprudencial, presentes na fixação do valor da
indenização do dano moral.

A decisão judicial levará em consideração, entre outros


critérios, o potencial econômico das partes e o bom senso do julgador, todos em
conformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

A importância do tema escolhido se denota partindo de que


os critérios de fixação do “quantum” indenizatório do dano moral são apenas uma
construção doutrinária e jurisprudencial, ainda não positivada, e, portanto, sem
força vinculante. Diante disto é que se evidenciou, com a feitura do segundo
capítulo, que os mesmos são realmente utilizados e, por conseqüência, trazem
uma uniformidade quanto aos valores fixados além de humanizar as pretensões
indenizatórias.

O presente trabalho monográfico constitui-se de três


capítulos. O primeiro capítulo discorrerá acerca da caracterização do instituto,
trazendo à baila um breve histórico, conceituação, sua previsão legal, o ato ilícito,
a conduta do ofensor, o nexo de causalidade e as excludentes de
responsabilidade do dever de indenizar.

Na seqüência, o segundo capítulo, passará a tratar sobre o


cerne do presente trabalho Monográfico, ou seja, a mensuração e os parâmetros
para a fixação dos danos morais. Após finalizada a exposição doutrinária e
jurisprudencial, será apresentado o critério utilizado pelos Juízes das Três Varas
Cíveis da Comarca de Balneário Camboriú – SC.
xii

Finalizando, o terceiro capítulo versará sobre as principais


questões controvertidas acerca do dano moral, diga-se de passagem, são
inúmeras, mas por não ser este o foco da presente trataremos das quatro mais
discutidas no âmbito doutrinário, iniciando com uma explanação sobre a tarifação
do montante indenizatório nas ações por danos morais, passando pela aplicação
do instituto às pessoas jurídicas de acordo com a Súmula 227 do Superior
Tribunal de Justiça e, finalizando, abordaremos a questão da exacerbação das
pretensões indenizatórias e da industrialização do dano moral.
1

INTRODUÇÃO

A presente monografia inserida no âmbito do Direito Privado,


mais precisamente no Direito Civil Brasileiro, tem como tema central a fixação do
“quantum” indenizatório nas ações por danos morais consoante o nosso
ordenamento jurídico pátrio e contexto político-econômico atual.

O objeto de estudo desta Monografia de conclusão de Curso


é o dano Moral, cujo tema foi delimitado pelos seguintes termos: uma análise
doutrinária e jurisprudencial, versando a caracterização do dano moral, desde a
sua origem, com a ocorrência do ato ilícito, até a efetiva quantificação e fixação
da indenização em decorrência do abalo moral sofrido pelo lesado.

O interesse no estudo do tema teve como ponto fundamental


a curiosidade de como vem sendo fixado o montante em casos com a ocorrência
de abalo moral, já que o Código Civil de 2002, ainda que recente, mas seguindo a
mesma linha dos anteriores, não elencou critérios cogentes para tal fim.

Devido a crescente procura pelo Judiciário para julgar


demandas que envolvam o instituto do dano moral, a questão mais árdua a ser
vencida pelo magistrado flutua no campo da fixação do montante indenizatório,
pois, como restará evidenciado no decorrer do estudo, a sua configuração se
opera de forma simples, necessitando apenas, a prova do nexo de causalidade,
entre a conduta do ofensor e o dano sofrido.

A presente pesquisa Monográfica não tem como finalidade


esgotar o tema e muito menos abordá-lo em todos seus possíveis aspectos e
âmbitos. Trata-se apenas de uma pesquisa doutrinária e jurisprudencial acerca da
fixação do “quantum” indenizatório nas ações que envolvam o instituto do dano
moral.
2

A temática do dano moral, dada a sua complexidade,


juntamente com a sua particularidade e incomensurabilidade, recebeu, ao longo
da trajetória percorrida pela teoria da responsabilidade civil, as mais variadas
interpretações tanto na didática quanto na aplicação prática efetuada pelos
tribunais pátrios.

A tese da plena reparabilidade dos danos morais, ou seja,


daqueles danos que atingem única e exclusivamente o patrimônio imaterial,
encontra-se assentada no art. 5º, incisos V e X, da Constituição Federal de 1988,
marco na legislação vigente por ter elevado a reparação do dano moral a status
de garantia constitucional.

A reparação do dano moral é, via de regra, pecuniária, e visa


amenizar os sentimentos negativos de dor, mágoa, angústia, e humilhação,
buscando, de certa forma, trazer alguma satisfação ao ofendido, possibilitando
sensações positivas para atenuar seu sofrimento.

A problemática existente entre doutrinadores e operadores


do direito gira em torno da mensuração e da conseqüente quantificação do valor a
ser indenizado nos mais variados casos de lesão ao patrimônio imaterial do
ofendido, ante a sua incomensurabilidade.

Baseado no levantamento bibliográfico necessário para a


realização da presente pesquisa Monográfica surgiram alguns problemas a serem
pesquisados, tais como: a) o importante papel do magistrado e como ocorre o
arbitramento do quantum indenizatório; b) o caráter da indenização como
atenuação da dor; e ainda; c) quais os parâmetros utilizados para aferição da
indenização, tanto os doutrinários como os jurisprudenciais. Tais questionamentos
serão abordados no decorrer no trabalho.

Para a realização da presente pesquisa foi utilizado o


3

método dedutivo, que no entendimento de Pasold10, busca os elementos legais,


doutrinários e jurisprudenciais com o prévio compromisso científico de, ao
organizar e compor o material recolhido, atendendo à formulação geral que
previamente se estabelece.

A presente Monografia está dividida em três partes.

O primeiro capítulo discorrerá acerca da caracterização do


instituto, trazendo à baila um breve histórico, conceituação, sua previsão legal, o
ato ilícito, a conduta do ofensor, o nexo de causalidade e as excludentes de
responsabilidade do dever de indenizar.

No segundo capítulo, passaremos a tratar sobre o cerne do


presente trabalho Monográfico, ou seja, a mensuração e os parâmetros para a
aferição dos danos morais. Também, após finalizada a exposição doutrinária e
jurisprudencial, será apresentado o critério utilizado pelos Juízes das Três Varas
Cíveis da Comarca de Balneário Camboriú – SC.

Finalmente, o terceiro capítulo versará sobre as principais


questões controvertidas acerca do dano moral, diga-se de passagem, são
inúmeras, mas por não ser este o foco da presente trataremos das quatro mais
discutidas no âmbito doutrinário, iniciando com uma explanação sobre a tarifação
do montante indenizatório nas ações por danos morais, passando pela aplicação
do instituto às pessoas jurídicas de acordo com a Súmula 227 do Superior
Tribunal de Justiça e, finalizando, abordaremos a questão da exacerbação das
pretensões indenizatórias e da industrialização do dano moral.

Nas considerações finais, será feita uma breve análise do


presente trabalho Monográfico e algumas considerações sobre as hipóteses
anteriormente propostas.

10
PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o
operador do direito. 3.ª ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 1999. p. 92/93.
4

CAPÍTULO 1

CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL

1.1 HISTÓRICO

Para um estudo completo e aprofundado sobre o dano


moral, faz-se mister conhecer sua origem, afigurando-se, necessário, pois,
investigar o surgimento do seu conceito.

O conceito do dano moral, consoante registros doutrinários,


surgiu na Índia e Babilônia, com o advento dos Códigos de Hamurabi e Manu,
passando a posteriori, pelo direito romano e, desenvolvendo-se na França.

É consabido que o Código de Hamurabi, surgido na


Mesopotâmia, primava pela garantia do oprimido, mostrando-se Hamurabi, nesse
aspecto, preocupado com seu povo.

Na acepção de Stolze e Pamplona11 o Código de Hamurabi


era:

(...) um sistema codificado de leis, surgido na Mesopotâmia,


através do rei da Babilônia, Hamurabi (1792 – 1750 a.C.),
também conhecido por Kamo-Rábi, que reviu, adaptou e ampliou
diversas leis sumérias e acadianas.

Tal código contém 282 dispositivos legais e foi descoberto graças


a uma expedição francesa, chefiada pelo arqueólogo Jacques
Morgan, sendo tais dispositivos conhecidos por intermédio de
uma versão gravada em uma estrela de basalto negro,
encontrada originalmente em Susa-Irã, mas que hoje é
conservada no Museu do Louvre.

11
GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. 3.ª ed. São
Paulo: Saraiva, 2005. p. 63/65.
5

Seu princípio geral era a idéia de que “o forte não prejudicara o


fraco”, pelo que sua interpretação nos demonstra que havia uma
preocupação constante de conferir ao lesado uma reparação
equivalente, o que ficou mais conhecido através do seu célere
axioma primitivo “olho por olho, dente por dente” (a lei do Talião),
constante dos parágrafos 196, 197 e 200 do código:

“§ 196. Se um awilum destruir um olho de um awilum: destruirão


seu olho”.

“§ 197. Se quebrou o osso de um awilum: quebrarão o seu


osso”.

Ҥ 200. Se um awilum arrancou um dente de um awilum igual a


ele: arrancarão o seu dente”.

Como observa CLEYTON REIS, a “noção de reparação de dano


encontra-se claramente definida no Código de Hamurabi. As
ofensas pessoais eram reparadas na mesma classe social, à
causa de ofensas idênticas. Todavia o Código incluía ainda a
reparação do dano à custa de pagamento de um valor
pecuniário”.

Confira-se, por exemplo, o que dispõem os seus parágrafos 209,


211 e 212, que ordenavam o pagamento de uma indenização a
favor da vítima, em valor pecuniário vigente:

Ҥ 209. Se um awilum ferir o filho de um outro awilum e, em


conseqüência disso, lhe sobrevier um aborto, pagar-lhe-á dez
ciclos de prata pelo aborto”.

Note-se que este primeiro trecho se refere a hipótese de pessoas


de mesma classe (awilum = homem livre). Contudo, também
havia previsão para indivíduos de classes distintas:

“§ 211. Se pela agressão fez a filha de um Muskenun expelir o


(fruto) de seu seio: pesará cinco ciclos de prata”.
6

“§ 212. Se essa mulher morrer, ele pesará meia mina de prata”.

Embora a noção inicial desta cominação legal fosse a de


aplicação de penalidade, o ilustre professor mineiro WILSON
MELO DA SILVA já destacava que se trata de “certos preceitos
que, estabelecendo uma exceção ao direito de vindita, ordenava,
em favor da vítima, o pagamento de uma indenização, o que
denuncia um começo da idéia de que resultou modernamente a
chamada teoria da compensação econômica, satisfatória dos
danos extrapatrimoniais”. [...]

Sendo assim, verificamos que o Código de Hamurabi buscava,


indubitavelmente, a reparação das lesões ocorridas, materiais ou
morais, condenando o agente lesante a sofrer ofensas idênticas
(aplicação da Lei do Talião) ou pagar importâncias em prata
(moeda vigente à época).

Incontinenti, existiu na Índia um personagem mítico


chamado Manu (Manu Vaivasvata), respeitado por todos os povos (hindus e
homens livres), motivo pelo qual, sua legislação, o então Código de Manu, era tão
significativa.

O referido Código possibilitou avanços em relação ao


Código de Hamurabi, assim como asseveram os mesmos autores12, “verbis”:

Manu Vaivasvata, na mitologia hindu, foi um homem que,


extremamente respeitado pelos brâmanes (membros da mais alta
casta daquela sociedade), sistematizou as leis sociais e religiosas
do hinduismo. [...]

Confrontando-o com o Código de Hamurabi, não há como negar


que, do ponto de vista da civilização moderna, o Código de Manu
significou um avanço, eis que, enquanto no primeiro, a prioridade
era o ressarcimento da vítima através de outra lesão ao
lesionador original (dano que deveria ser da mesma natureza), o

12
GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. p. 66.
7

segundo determinava a sanção através do pagamento de um


certo valor pecuniário.

Por esta razão, a contribuição de Manu foi muito mais


significativa para o direito, pois, expurgou da história, o Talião instituído por
Hamurabi.

Posteriormente, valendo-se das regras instituídas pelos


Códigos de Manu e Hamurabi, o dano moral passou a figurar em disposições
esparsas contidas no Alcorão e na Bíblia Sagrada, chegando à Grécia Antiga e a
Roma que, aperfeiçoaram os conceitos e a positivação do dano moral em seus
Códigos, sendo sua contribuição, nesse particular, mais didática do que prática,
porquanto se restringiu à positivação dos meios reparatórios dos danos sofridos
pela vítima, foi nesta época que surgiu a primeira ação de reparatória, a qual era
aplicada aos casos de injúria, denominada pelos romanos de “injuriarum
aestimatória”. Aqui, abre-se um parêntese para frisar que, até o Direito Canônico
prestou sua singela contribuição na evolução da reparabilidade do dano moral,
conforme asseveram Stolze e Pamplona13.

Os sucintos registros retirados da obra de Rui Stoco14,


convergem com exposto acima:

A teoria do dano moral será, talvez a que maior resistência sofreu


desde a sua concepção, que remonta à Índia lendária e à
fabulosa Babilônia (Códigos de Manu e Hamurabi), passando
pelo direito Romano e frutificando e desenvolvendo na França.

Já no Brasil, o dano moral se iniciou de forma modesta, a


princípio com leis esparsas e dispositivos isolados, só chegando a ser aceito de
forma plena, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a qual o

13
GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. p. 66/72.
14
STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jursiprudencial. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 1999, p. 671/672.
8

elevou a categoria de garantia fundamental, conforme se verifica nos incisos V e


X, do art. 5º da Carta Magna15.

Wesley de O. L. Bernardo16 doutrina acerca do início


conturbado do dano moral nos palcos brasileiros:

Quando se estuda o fenômeno do dano moral em nosso direito,


nota-se de forma clara, a existência de três fases distintas: a
primeira, que podemos denominar negativista, na qual a
reparabilidade do dano moral era combatida de forma acirrada,
não logrando reconhecimento, salvo em obras de alguns teóricos
do direito e, em sede jurisprudencial, votos vencidos e decisões
isoladas; a segunda, que podemos denominar fase da
reparabilidade restrita, na qual os tribunais, em notável mudança
de orientação, passaram a admitir a reparação do dano moral,
mantendo entretanto paradigmas monetaristas, o que levava a
conclusões equivocadas e à não admissão de reparação
simultânea dos danos material e moral, quando derivados do
mesmo fato; e, finalmente, a fase atual, de reparabilidade plena
do dano moral, iniciada com a edição da Constituição da
República de 1988, que pôs fim a discussão em torno da
responsabilidade de reparação do dano moral.

Na mesma linha de raciocínio, professa Rui Stoco17, que:

No Brasil, uma legislação esparsa e fracionária adiantou-se ao


legislador constituinte na aceitação e afirmação da
indenizabilidade do dano moral, embora tímida.

Primeiro, através de alguns preceitos isolado de nosso Código


Civil de 1916. Depois em previsões legais estanques, como se
15
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País inviolabilidade do dinheiro à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e
a propriedade, nos termos seguintes: [...] V- é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além
da indenização por dano material, moral ou à imagem; [...] X – são invioláveis a intimidade, a vida provada,
a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo da material ou moral decorrente de
sua violação.
16
BERNARDO, Wesley de Oliveira Louzada. Dano moral: critérios de fixação de valor. Rio de Janeiro:
Renovar, 2005. p. 88.
17
Stoco, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. p. 672.
9

verifica na Lei de Imprensa (Lei 5.250, de 9.2.67) e no Código


Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117, de 27.8.62), apenas
para exemplificar.

Mas foi com o advento da Constituição Federal de 1988 que a


aceitação plena da reparação por dano moral se consagrou.

E fê-lo de forma irrestrita e abrangente.

Fez mais. Alçou esse direito à categoria de garantia fundamental


(CF/88, art. 5.º, incisos V e X), considera como cláusula pétrea e,
portanto, imutável nos escritos termos do art. 60, § 4.º, da Carta
Magna.

Conforme asseverado acima, até a promulgação da


Constituição de 1988, o dano moral se desenvolvia de forma lenta e modesta,
chegando até mesmo a ser combatido, como asseverou Wesley de O. L.
Bernardo.

Os doutrinadores pioneiros no assunto sofreram várias


represálias, pelo pensamento cerrado da época tocante à impossibilidade de
compensar pecuniariamente um dano, cuja mensuração não se podia apurar.
Porém, agora, com sua elevação ao patamar de garantia constitucional, é dever
do Poder Judiciário prestar a tutela jurisdicional, ganhando a jurisprudência com
isso, status de constitucionalidade e, abrindo-se a tendência de abranger cada
vez mais matérias, alongando, assim, os tentáculos dano moral.

Extrai-se da doutrina a seguinte conclusão:

Correta, pois a conclusão de quê a ênfase que os aspectos


morais mereceram na Constituição de 1988 terá de produzir
“conseqüências no âmbito dos direitos obrigacionais, na teoria
dos contratos, na teoria da responsabilidade civil, no
relacionamento familiar – estes influenciados ainda pelas idéias
de igualdade entre homem e mulher e paridade entre os filhos,
10

entre outros posicionamentos específicos – no plano dos direitos


intelectuais e em ouros campos da vida privada (Bittar, op. cit.).18

Caio Mario19, por sua vez, entende que as disposições dos


incisos do artigo 5º da nossa Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 são meramente “exemplificativas” admitindo, por isso, várias interpretações
e, evoluindo constantemente.

1.2 CONCEITO DE DANO MORAL

Passemos agora, à conceituação do dano moral,


salientando-se, nesse ínterim, que várias são as acepções doutrinárias sobre
essa modalidade de dano.

Prima facie, colaciona-se posicionamento do ilustre


doutrinador Rui Stoco20 que, a esse respeito, manifestou-se:

De tudo conclui-se que, ou aceitamos a idéia de que a ofensa a


moral se traduz em dano efetivo, embora não patrimonial,
atingindo valores internos e anímicos da pessoa, ou haveremos
de concluir que a indenização tem mero caráter de pena, como
punição ao ofensor e não como reparação ou compensação ao
ofendido.

E não temos dúvida de que de dano se trata, na medida em que


a Constituição Federal elevou à categoria de bens legítimos e
que devem ser resguardados, todos aqueles que são expressão
imaterial do sujeito; seu patrimônio subjetivo, como a dor a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem que, se agredidos
sofrem lesão ou dano que exigem reparação.

O saudoso Jorge Bustamante Alsina21 assim o define:

18
STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. p. 673.
19
SILVA PEREIRA, Caio Mário da. Responsabilidade civil.8.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 672.
20
STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. p. 673.
11

Pode-se definir o dano moral como a lesão aos sentimentos que


determina dor ou sofrimentos físicos, inquietação espiritual, ou
agravo às afeições legítimas e, em geral, toda a classe de
padecimentos insuscetíveis de apreciação pecuniária.

Já para Silvio Salvo Venosa22, o dano moral consiste em:

Dano moral é o prejuízo que afeta o animo psíquico, moral e


intelectual da vítima. Nesse campo, o prejuízo transita pelo
imponderável, daí porque aumentam as dificuldades de se
estabelecer a justa recompensa pelo dano. Em muitas situações,
cuida-se de indenizar o inefável. Não é também qualquer
dissabor comezinho da vida que pode acarretar a indenização.
Aqui, também é importante o critério objetivo do homem médio, o
bonus pater famílias: não se levará em conta o psiquismo do
homem excessivamente sensível, que se aborrece com fatos
diuturnos da vida, nem o homem de pouca ou nenhuma
sensibilidade, capaz de resistir sempre às durezas do destino.
Nesse campo, não há formulas seguras para auxiliar o juiz. Cabe
ao magistrado sentir em cada caso o pulsar da sociedade que o
cerca. O sofrimento como contraposição reflexa da alegria é uma
constante do comportamento humano universal.

Carlos Alberto Bittar Filho23, por sua vez, professa que:

O dano moral, portanto, é o resultado de golpe desfechado contra


a esfera psíquica ou a moral, em se tratando de pessoa física. A
agressão fere a pessoa no mundo interior do psiquismo,
traduzindo-se por reações desagradáveis, desconfortáveis ou
constrangedoras, bem como trazendo à tona o fato de que o
homem é dividido em corpo e espíritom [...].

Esclarecendo a concepção acima, leciona Luiz da Cunha


24
Gonçalves :

21
BUSTANTE ALSINA, Jorge. Teoria General de la responsabilidad civil. p. 234.
22
SALVO VENOSA, Sílvio de. Direito civil- vol. IV. p. 39.
23
BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro. Disponível
na Internet: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6183>. Acesso em 03/08/2006.
12

É que o homem - digam o que quiserem os materialistas, - não é


só matéria viva; é corpo e espírito. A personalidade física é,
apenas, o instrumento da personalidade moral. O corpo é, por
assim dizer, a máquina, o aparelho transmissor da actividade do
ser, dotado de inteligência, vontade, sensibilidade, energia,
aspirações, sentimentos. Não pode, por isso, duvidar-se de que o
homem possui bens espirituais ou morais, que lhe são preciosos
e queridos, tanto ou mais do que os bens materiais. Estes bens
são, sem dúvida, complemento daqueles; pois fornecem meios,
não somente para se obter duração, saúde e bem-estar físicos ou
do corpo, mas também para se alcançar a saúde e o bem-estar
morais ou do espírito, mediante alegrias, prazeres, doçuras
afetivas, distrações, confortos, leituras, espetáculos naturais e
artificiais, viagens, encantos da vida.

Realça-se que a despeito da diversidade de definições


acerca do tema, todas convergem no sentido de caracterizar o dano moral como
uma lesão ao patrimônio psíquico do indivíduo.

Carlos Alberto Bittar Filho, auxiliado pelo doutrinador Luiz


da Cunha Gonçalves, assevera nessa seara que, o ser humano é composto de
duas “esferas”, uma física, matéria viva e, outra espírita, sujeitando-se essa
última, ao agravo moral.

Nessa ordem de idéias, conclui a doutrina, então, ser o


dano moral uma lesão de ordem imaterial, na qual o bem atingido é o ego do
“indivíduo”, ou seja, aquilo que se encontra dentro de seu “espírito”, suas
emoções, temores, aspirações etc..

1.3 CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL

À configuração da responsabilidade civil e, via de


conseqüência, do dever de indenizar, exige-se a coexistência de uma conduta
antijurídica (omissiva ou comissiva), da culpabilidade (exclusiva ou concorrente)

24
CUNHA GONÇALVES, Luiz da. Tratado de Direito Civil. São Paulo: Max Limonad. 1957. p. 537.
13

e, é claro, do dano, exigindo-se, ainda, a presença do nexo entre causa (conduta)


e efeito (dano).

Neste diapasão, salienta-se que não há necessidade de


provar o dano moral em si e, sim, a ocorrência dos pressupostos que geram o
dever de indenizar, consoante vem decidindo reiteradamente o E. Superior
Tribunal de Justiça:

Não há falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato


que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o
ensejam" (STJ, REsp n.º 268459/SP, Órgão Julgador: 3ª Turma,
Rel. Dês. Carlos Alberto Menezes Direito, julgado em
20/02/2000).

Passaremos neste momento a analisar, de forma


perfunctória, cada um destes elementos.

1.3.1 ATO ILÍCITO

Na acepção de Bittar 25 constitui ato ilícito:

É ato ilícito por conseguinte, todo o ato praticado por terceiro que
venha refletir, danosamente sobre o patrimônio da vítima ou
sobre o aspecto peculiar do homem como ser moral. [...] morais,
os dano de natureza não econômica e que se traduzem em
turbações de ânimo, em reações desagradáveis, desconfortáveis,
ou constrangedoras, ou outras desse nível, produzidas na esfera
do lesado.

Diniz26 por sua vez, assim o define:

25
BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais. p. 31.
26
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil - responsabilidade civil . 17.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p.
41.
14

O ato ilícito é o praticado culposamente em desacordo com a


norma jurídica, destinada a proteger interesses alheios. é o que
viola direito subjetivo individual, causando prejuízo a outrem,
criando o dever de reparar tal lesão. Para que se configure o
ilícito é imprescindível um dano oriundo da atividade culposa.

Da intelecção dos conceitos doutrinários acima citados,


percebe-se que o ato culposo, praticado em desacordo com o ordenamento
jurídico vigente, configura ato ilícito, nos termos dos artigos 186 e seguinte do
Código Civil.

1.3.2 CONDUTA DO AGENTE

Trata-se do elemento imprescindível à configuração da


responsabilidade civil e, dever de indenizar, porquanto não há como subsistir o
dano e a sua reparabilidade, à míngua da conduta do agente.

Sobre o tema, Stolze e Pamplona27 assim se manifestam:

Um fato da natureza, diferentemente, submissível em uma


categoria maior e mais abrangente - de fato jurídico em sentido
lato –, a despeito de poder causar dano, não geraria
responsabilidade civil, por não poder ser atribuído ao homem.

Apenas o homem, portanto, por si ou por meio das pessoas


jurídicas que forma, poderá ser civilmente responsabilizado.

Nesse contexto, fica fácil entender que a ação (ou omissão)


humana voluntária é pressuposto para a configuração da
responsabilidade civil. Trata-se, em outras palavras, da conduta
humana, positiva ou negativa (omissão), guiada pela vontade do
agente, que desemboca no dano ou prejuízo. [...]

O núcleo fundamental, portanto, da noção de conduta humana é


a voluntariedade, que resulta exatamente da liberdade de escolha
27
GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. p. 31/32.
15

do agente imputável, com discernimento necessário para ter


consciência daquilo que faz. [...]

Em outras palavras, a voluntariedade que é a pedra de toque da


noção de conduta humana ou ação voluntária, primeiro elemento
da responsabilidade civil, não traduz necessariamente a intenção
de causar o dano, mas sim, tão-somente, a consciência daquilo
que se está fazendo.

Existem duas modalidades de conduta humana, a positiva


e a negativa. A primeira, positiva, caracteriza-se por um comportamento ativo,
ou seja, pela prática de uma determinada ação, ao passo que a segunda,
negativa, consubstancia-se na inexistência de ação, ou seja, uma vez que o
agente tenha se omitido em fazer algo e, esta omissão acabe por causar dano à
outrem, configurada estará esta segunda modalidade.

Um ponto relevante que se faz mister ressaltar, é que a


conduta humana praticada pelo agente não necessariamente precisa ser ilícita
para ensejar a responsabilidade civil, em outras palavras, a responsabilidade civil
prescinde de ato ilícito, como nos ensinam Stolze e Pamplona28, “verbis”:

Sem ignorarmos que a antijuridicidade, como regra geral,


acompanha ação humana desencadeadora da responsabilidade,
entendemos que a imposição do dever de indenizar poderá existir
mesmo quando o sujeito atua licitamente. Em outras palavras:
poderá haver responsabilidade civil se necessariamente haver
antijuridicidade, ainda que excepcionalmente por força de norma
legal.

Por isso não se pode dizer que a ilicitude acompanha


necessariamente a ação humana danosa ensejadora da
responsabilização.

Portanto, ficou evidenciado que a conduta praticada pelo


ofensor é o elemento basilar na configuração da responsabilidade civil e do dever

28
GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. p. 35/38.
16

de indenizar, salientando-se que esta não necessariamente precisa estar em


desconformidade com a Lei e, em razão disto, pode ser analisada
separadamente.

Neste norte, a conduta isolada pode não acarretar dano


algum à outrem, sendo imprescindível a apuração do nexo de causalidade,
elemento que veremos a seguir.

1.3.3 NEXO CAUSAL

O nexo causal é entendido como a relação existente entre a


conduta - comissiva ou omissiva - do agente e, o dano irrogado à outrem,
esclarecendo Silvio Salvo Venosa29, nesse particular, que:

O conceito de nexo causal, nexo etmológico ou relação de


causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta
do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que
concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento
indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas
nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou
um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao
responsável, não como ser ressarcida. Nem sempre é fácil,
estabelecer a relação de causa e efeito.

No mesmo sentido tem convergido Silvio Rodrigues30,


“verbis”:

Para que se possa impor a alguém a obrigação de indenizar o


prejuízo experimentado por outrem é mister que haja uma relação
de causalidade entre o ato culposo praticado pelo agente e o
prejuízo sofrido pela vítima. Em todas as hipóteses analisadas
até agora, vimos sempre a existência de um dano, causado pela
ação ou omissão do agente, ou pela ação ou omissão de seu

29
SALVO VENOSA, Sílvio de. Direito civil- vol. IV. p. 45.
30
RODRIGUES, Sílvio. Direito civil – vol. 4. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 163.
17

filho, de seu pupilo, de seu preposto, ou de coisa inanimada que


detinha sob sua guarda etc. Sem essa relação de causalidade
não se pode conceber a obrigação de indenizar. Ademais, é a
própria lei que expressamente o exige. Com efeito, dispõe o art.
186 do Código Civil: aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito. A obrigação de reparar
o advém do art. 927 do Código. Portanto, é indispensável a
relação de causalidade entre o ato do agente, de seu preposto,
da coisa inanimada que tem sob sua guarda e o prejuízo
experimentado pela vítima.

Rui Stoco31 por sua vez:

Na etmologia da responsabilidade civil estão presentes três


elementos, ditos essenciais na doutrina subjetivista: a ofensa a
uma norma preexistente ou erro de conduta; um dano; e o nexo
de causalidade entre uma e outro.

Não basta que o agente haja precedido contra jus, isto é, não se
define a responsabilidade pelo fato de cometer um “erro de
conduta”. Não basta que a vítima sofra um dano, que é elemento
objetivo do dever de indenizar, pois se não houver um prejuízo a
conduta antijurídica não gera a obrigação de indenizar.

É necessário que se estabeleça uma relação de causalidade


entre a injuridicidade da ação e o mal causado, na, na feliz
expressão de Demogue, “é preciso esteja certo que, sem esse
fato, o dano não teria acontecido. Assim não basta que uma
pessoa tenha contravindo a certas regras; é preciso que sem esta
contravenção o dano não ocorreria” (Traité des Obligations en
general, vol. IV, n. 66).

O nexo causal se torna indispensável, sendo fundamental que o


dano tenha sido causado pela culpa do sujeito.

Finalizando, realça Caio Mário32, ser o nexo de causalidade:

31
Stoco, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. p. 75.
18

Este o mais delicado dos elementos da responsabilidade civil e o


mais difícil de ser determinado. Aliás, sempre que um problema
jurídico vai ter na indagação ou na pesquisa da causa, desponta
a sua complexidade maior. Mesmo que haja culpa e dano, não
existe obrigação de reparar, se entre ambos não se estabelecer a
relação causal [...]

Com sufrágio no entendimento perfilhado pela doutrina,


salienta-se que não basta apenas, a coexistência do agir do agente e, o agravo
moral impingido ao terceiro, fazendo-se necessária, portanto, a presença de um
liame que os vincule, pois, como visto acima, sendo a conduta, um ato comissivo
ou omissivo praticado pelo agente em conformidade ou não com a Lei e, sendo o
nexo causal a logicidade entre esta conduta e seus efeitos, não há como existir
um dano indenizável, sem a existência destes elementos. Salienta-se que este
entendimento já se encontra pacificado pela doutrina, jurisprudência e pela
própria legislação vigente conforme se explicitará na seqüência.

1.4 PREVISÃO LEGAL

Conforme se verifica pela própria evolução do instituto,


somente com sua elevação à garantia constitucional, a partir da promulgação da
Constituição da República Federativa do Brasil de 198833, foi o dano moral
reconhecido, passando, então, a dar forma aos julgados.

Os pleitos indenizatórios, desafiados com o fito de obter o


ressarcimento do agravo moral sofrido, encontram respaldo nos incisos V e X da
Constituição Federal, in verbis:

Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,

32
SILVA PEREIRA, Caio Mário da. O dano como elemento objetivo da responsabilidade civil. p. 76.
33
Constituição da República Federativa do Brasil 1988.
19

à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:


[...]

V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo,


além da indenização por dano material, moral ou à imagem; [...]

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a


imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo
dano material ou moral decorrente de sua violação; [...] (grifei)

A reparabilidade do abalo moral, sufragada pela


Constituição da República Federativa do Brasil, vem prevista, de igual sorte, em
outras leis esparsas e Códigos, caso do art. 186 do Código Civil34 de 2002, in
verbis:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária,


negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. (grifei)

Ainda do mesmo diploma legal:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano
a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,


independentemente de culpa, nos casos específicos em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Da Lei de Imprensa35, extrai-se:

Art. 49. Aquele que no exercício da liberdade de manifestação de


pensamento e de informação, com dolo ou culpa, viola direito, ou
causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar.

34
Código Civil – Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002.
20

Feita essa breve explanação acerca dos dispositivos legais


que respaldam os pleitos indenizatórios, passa-se a esmiuçar as causas
excludentes de responsabilidade.

1.5 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE

Conforme outrora explicado, uma vez que o agente


pratique um ato omissivo ou comissivo que venha a lesionar o patrimônio moral
de outrem e, provado o nexo etmológico entre a conduta e o dano, patente é o
dever de indenizar.

Porém, uma vez que o agente pratique o ato em


decorrência de: a) culpa da vítima; b) por fato de terceiro; c) por caso fortuito ou
por força maior; d) em legítima defesa; e) no exercício regular de direito; f) no
estrito cumprimento do dever legal; e g) em estado de necessidade, fica eximido
da obrigação de reparar o dano causado, haja vista que tais situações possuem o
condão de desnaturar a relação de causa e efeito.

Alguns dispositivos do Código Civil prevêem expressamente


tais excludentes, caso, por exemplo, do art. 18836 do Código Civil.

Passaremos neste momento a desenvolver um estudo mais


completo e individualizado acerca das situações elencadas nos parágrafos supra.

1.5.1 CULPA DA VÍTIMA

Sílvio Venosa37 define a culpa da vítima como:

35
Lei de Imprensa - Lei 5.250 de 09 de fevereiro de 1967.
36
Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I – os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um
direito reconhecido; II – a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover
perigo eminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as
circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a
remoção do perigo.
21

Apontamos que a culpa exclusiva da vítima elide o dever de


indenizar, porque impede o nexo causal. A hipótese não consta
expressamente do Código Civil de 1916, mas a doutrina e a
jurisprudência, em consonância com a legislação extravagante,
consolidaram essa excludente de responsabilidade. Vimos que o
corrente Código menciona a culpa concorrente da vítima no art.
94538. Com a culpa exclusiva da vítima, desaparece a relação de
causa e efeito entre o dano e o seu causador.

Quando há culpa concorrente da vítima e do agente causador do


dano, a responsabilidade e, conseqüentemente, a indenização
são repartidas, como já apontado, podendo as frações de
responsabilidade ser desiguais, de acordo com a intensidade da
culpa. Desse modo, a partilha dos prejuízos pode ser desigual.
Caio Mário da Silva Pereira (1999:299) conclui que

“a solução ideal, portanto, é especificar matematicamente a


contribuição da culpa da vítima para o efeito danoso”.

No mesmo norte, caminha o posicionamento defendido por


Silvio Rodrigues39, vejamos:

O evento danoso pode derivar de culpa exclusiva ou concorrente


da vítima; no primeiro caso desaparece a relação de causa e
efeito entre o ato do agente causador do dano e o prejuízo
experimentado pela vítima; no segundo, sua responsabilidade se
atenua, pois o evento danoso deflui tanto de sua culpa, quanto da
culpa da vítima.

Conforme a boa doutrina, a culpa da vítima pode ser


exclusiva ou concorrente. Na primeira modalidade, o agente causador da lesão
fica completamente eximido do seu dever de reparar, enquanto que no segundo
caso, o dever de reparar se subordinará à observância do grau de culpabilidade
de cada envolvido.

37
SALVO VENOSA, Sílvio de. Direito civil- vol. IV. p. 46.
38
Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada
tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano. (CC/2002 – grifei)
22

A jurisprudência é uníssona neste sentido, consoante se


apreende dos precedentes oriundos da corte catarinense:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS


MORAIS - BLOQUEIO PARCIAL DA LINHA TELEFÔNICA POR
INADIMPLEMENTO - EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO -
CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA - NÃO COMPROVAÇÃO DOS
FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO - INVERSÃO DO ÔNUS
PROBATÓRIO (ART. 6º, VIII, DO CDC) - SENTENÇA MANTIDA
- RECURSO NÃO PROVIDO. O autor deve provar o fato
constitutivo do seu direito, a teor do art. 333, I, do CPC, sob pena
de improcedência do pedido. A inversão probatória, insculpida no
art. 6º, VIII, do CDC, não é de pleno direito, dependendo de
determinação judicial. Não há dano moral quando o fato
ocorre por culpa exclusiva da vítima, agindo a prestadora de
serviços no exercício regular de direito, ao bloquear a linha
telefônica por falta de pagamento. (A.C. n.º 2005.009845-7, j. em
30/09/2005 - grifei)

Seria ilógico que o agente lesionante respondesse por um


dano que causou em decorrência da culpa do próprio ofendido, como também
seria ilógico que o ofendido não respondesse pela sua parcela de culpa no evento
danoso, como bem asseverou Caio Mario. A solução, portanto, é especificar
matematicamente a culpabilidade do ofendido, atenuando a responsabilidade do
ofensor ou eximindo-o, dependendo do caso.

Na seqüência, veremos a ocorrência do fato terceiro, tópico


que guarda similaridades com o presente, pois enquanto neste há culpa
concorrente ou exclusiva da vítima, no tópico a seguir haverá culpa concorrente
ou exclusiva de um terceiro.

1.5.2 FATO DE TERCEIRO

39
RODRIGUES, Sílvio. Direito civil – vol. 4. p. 165.
23

O fato de terceiro se constitui na interferência exclusiva ou


concorrente com os agentes envolvidos no evento danoso, de terceiro até então
estranho ao fato. Essa modalidade de excludente, semelhante à culpa da vítima,
pode eximir totalmente o autor do dano de reparar a lesão, se ocorrer em sua
modalidade exclusiva, por fazer desaparecer o nexo etmológico. Já no caso de
concorrência entre o terceiro e os agentes, ficará assegurado o direito de
regresso dos últimos em desfavor do terceiro que contribuiu, ainda que
minimamente, para a ocorrência da lesão.

Nos dizeres de Silvio Venosa40:

Nesta seção o problema é saber se o fato de terceiro pode


exonerar o causador do dano do dever de indenizar. Temos que
entender por terceiro, nessa premissa, alguém mais alem da
vítima e do causador do dano. [...]

Nessa situação aqui tratada, não se cuida de pessoas que


tenham ligação com o agente causador, tais como filhos,
empregados e prepostos, Nessa hipótese, os atos desses
terceiros inculpam os pais, patrões e preponentes. [...]

O assunto vem regulado de forma indireta pelos arts. 929 e 93041


(antigo, arts. 1.519 e 1.520), estabelecendo este último
dispositivo a ação regressiva contra o terceiro que criou a
situação de perigo, para haver a importância despendida no
ressarcimento ao dano do bem. Esses artigo não se referem
expressamente à culpa exclusiva de terceiro, mas, indiretamente,
admitem a possibilidade de reconhecimento de culpa e
responsabilidade do terceiro. Frisamos que nada impede que a
vítima ingresse com a ação diretamente contra o terceiro

40
SALVO VENOSA, Sílvio de. Direito civil- vol. IV. p. 56.
41
Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do
perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.
Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor
do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.
Parágrafo único. A mesma ação competirá aquele em defesa de quem se causou o dano (art. 188, inciso
I).
24

causador do dano. A dificuldade prática é que nem sempre esse


terceiro pode ser identificado pela vítima.

No caso concreto, importa verificar se o terceiro foi o causador


exclusivo do prejuízo ou se o agente indigitado também
concorreu para o dano. Quando a culpa é exclusiva de terceiro,
em princípio não haverá nexo causal. O fato de terceiro somente
exclui a indenização quando realmente se constituir em causa
estranha à conduta, que elimina o nexo causal. Cabe ao agente
defender-se, provando que o fato era inevitável e imprevisível.

No mesmo sentido, manifesta-se Silvio Rodrigues42:

O problema que genericamente se propõe é o de saber se o fato


de terceiro, causador exclusivo ou concorrente do evento danoso,
poderá ser considerado causa exoneradora da responsabilidade.
Em caso de resposta positiva, mister se faz determinar as
condições para que isso se dê e o alcance da excludente.

Entretanto, antes de examinar tal questão, convém fixar o sentido


do termo terceiro. AGUIAR DIAS define sucintamente o terceiro
como “qualquer pessoa além da vítima ou do responsável”.
Definição que, sem deixar de ser exata, propicia campo para
dúvida. Porque, como apontam MARTY e RAYNAUD, o fato de
terceiro pode derivar do comportamento de pessoas por quem o
responsável deva responder, tais seus prepostos, filhos, pupilos,
curatelados, auxiliares etc. Neste caso, quando o dano resulta de
fato do preposto, não há exoneração da responsabilidade, pois
terceiro é somente aquele por quem o indigitado responsável não
responde. Verdade que, na hipótese em causa, poderia aquele
que paga a indenização valer-se da ação regressiva contra seu
preposto, causador direto do prejuízo.

O fato de terceiro pode ser o causador exclusivo do dano ou ser


apenas o causador concorrente do prejuízo. Cada qual destas
hipóteses deve ser examinada separadamente.

42
RODRIGUES, Sílvio. Direito civil – vol. 4. p. 169/170.
25

Em rigor, quando o fato de terceiro é a fonte exclusiva do


prejuízo, desaparece qualquer relação de causalidade entre o
comportamento do indignado responsável e a vítima.

Observadas as considerações doutrinárias, ressalta-se que


para a total exclusão do nexo de causalidade é necessário que o terceiro,
conforme muito bem elucidado por Sílvio Rodrigues, seja o único e exclusivo
causador do evento danoso e, ainda, na hipótese de concorrência com o agente
causador indireto, não seja este parente ou tutelado por aquele, a exemplo do
patrão que é responsável pelos atos do seu preposto, onde ficará assegurado o
direito de regresso.

1.5.3 CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR

Acerca do tema tem doutrinado Sérgio Cavalieri Filho43

Estaremos em face do caso fortuito quando se tratar de evento


imprevisível e, por isso, inevitável. Se o evento for inevitável,
ainda que previsível, por se tratar de fato superior às forças do
agente, como normalmente são os fatos da Natureza, como as
tempestades, enchentes etc., estaremos em face da força maior,
como o próprio nome o diz. É o act of God, no dizer dos ingleses,
em relação ao qual o agente nada pode fazer para evitá-lo, ainda
que previsível.

Maria Di Pietro44, por sua vez:

Força maior é acontecimento imprevisível, inevitável e estranho


à vontade das partes, como uma tempestade, um terremoto, um
raio. Não sendo imputável à Administração, não pode incidir a
responsabilidade do Estado [...], caso fortuito, em que o dano
seja decorrente de ato humano, de falha da Administração, não
ocorre a mesma exclusão; quando se rompe, por exemplo, uma

43
CAVALIERI FILHO, Sergio, Programa de responsabilidade Civil. 2ª ed.. Rio de Janeiro: Editora.
Malheiros, 1999. p. 66.
44
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito administrativo. 13ª ed.. São Pão: Editora Atlas, 1999. p. 518.
26

adutora ou um cabo elétrico, causando dano a terceiros, não se


pode falar em força maior.

Na seqüência, Carlos Roberto Gonçalves45, elenca quais


são os requisitos para a configuração dos institutos em questão:

exige-se, pois, para a configuração do caso fortuito, ou de força


maior, a presença dos seguintes requisitos: a) o fato deve ser
necessário, não determinado por culpa do devedor, pois, se há
culpa, não há caso fortuito; e reciprocamente, se há caso fortuito,
não pode haver culpa, na medida em que um exclui o outro.
Como dizem os franceses, culpa é fortuito ces sont des choses
que hurlent de se trouver ensemble; b) o fato deve ser
superveniente e inevitável; c) o fato deve ser irresistível, fora do
alcance do poder humano.

Consoante o elucidado supra, tem-se que a principal e


crucial diferença entre o caso fortuito e a forca maior, está na sua previsibilidade,
ou seja, enquanto o caso fortuito é imprevisível e inevitável, a força maior, é
previsível, porém, da mesma forma, inevitável. Cabe destacar, que para fins de
exclusão da responsabilidade, ambos exoneram por completo o agente do dever
de indenizar.

Vejamos a decisão exemplificadora da configuração do


caso fortuito ou força maior:

Apelação cível. Ação de indenização. Roubo à mão armada em


agência bancária. Vítima baleada. Ausência de nexo de
causalidade entre o evento danoso e a conduta do apelado,
considerando que o roubo à mão armada corresponde à força
maior, excludente da responsabilidade. Configuração de
impossibilidade de agir do recorrido, diante de situação de
violência contra a pessoa, sob pena de, com a reação, causar um
mal maior do que aquele a ser evitado, inclusive, com
recomendação das autoridades competentes nesse sentido.
Dever de segurança fica circunscrito ao compromisso de
45
GONÇALVES, Carlos Roberto, Responsabilidade civil. 6ª ed.. São Paulo: Editora Saraiva, 1995. p. 523.
27

diligenciar as providências e cautelas normais. Apelo não provido.


(TJRS, Apel. Cív. n.º 70006358204, j. em 02.03.05 – grifei)

Seguindo, estudaremos a legítima defesa e o exercício


regular do direito, excludentes previstas no inciso I, do art. 188 do Código Civil, as
quais são amplamente conhecidas e difundidas no Direito brasileiro.

1.5.4 LEGÍTIMA DEFESA

A legítima defesa é uma excludente de ilicitude universal,


amplamente difundida na esfera penal e, com aplicação também na seara cível.

Acerca desta excludente tem doutrinado Rui Stoco46:

Na lição proferida por Caio Mário, observou-se que embora tenha


eliminado a faculdade de o indivíduo de fazer justiça com as
próprias mãos, reconhece, contudo situações em que pode
repelir, pela força, a agressão ou a ameaça de agressão: vim vi
repelle licet (op. cit., p. 293).

Clóvis Beviláqua, citando Köhler, esclareceu que a legítima


defesa não é um direito individual, porém uma faculdade que
emana diretamente da personalidade” (Comentários ao Código
Civil, obs. n. 2, ao art. 160).

A lei civil, contudo, deixou de definir em que consiste a legítima


defesa, devendo-se buscar ao seu conceito e definição no Direito
penal.

Como elucidado pela doutrina supra, a Lei civil não


conceitua a legítima defesa, fazendo-se necessário, portanto, valer-se das

46
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 6.ª ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais. 2004. p.
194/195.
28

definições dadas pelo direito penal. Neste norte, infere-se da doutrina de Júlio F.
Mirabete47:

Várias teorias foram expostas para explicar os fundamentos da


legitima defesa. As teorias subjetivas, que a consideram como
causa de excludente da culpabilidade, fundam-se na perturbação
de animo da pessoa agredida ou nos motivos determinantes do
agente, que conferem ilicitude ao ato de quem se defende etc. As
teorias objetivas, que consideram a legitima defesa com causa
excludente da antijuridicidade, fundamentam-se na existência de
um direito primário do homem de defender-se, na retomada pelo
homem na faculdade de defesa que cedeu ao Estado, na
delegação de defesa pelo Estado, na colisão de bens em que o
mais valioso deve sobreviver, na autorização para ressalvar o
interesse do agredido, no respeito à ordem jurídica, indispensável
à convivência ou na ausência de injuridicidade da ação agressiva.

Retornando para a esfera civil, extrai-se, ainda, da doutrina


de Rui Stoco48:

Em face de uma agressão injusta, dirigida contra a própria


pessoa ou a seus familiares, ou contra os seu bens, o individuo
adota medida defensiva com que repelirá o agressor.

São pressupostos da legítima defesa: a) a iniciativa de agressão


por parte de outrem, sem que do agente tenha partido qualquer
agressão ou provocação; b) que a ameaça de dano seja atual ou
iminente; c) que a reação seja proporcional a agressão.

Vencida a fase conceitual, passemos, então, para o cerne


da questão, ou seja, o dever de indenizar. Quando o agente age em legítima
defesa tem este o dever de indenizar? Carlos Roberto Gonçalves49 defende o
seguinte posicionamento:

47
MIRABETE, Júlio Fabrini. Manual de direito penal: parte geral. 21ª ed. São Paulo: Atlas. 2004. p. 176.
48
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 194/195.
49
GONÇALVES. Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 712.
29

embora quem pratique o ato danoso em estado de necessidade


seja obrigado a reparar o dano causado, o mesmo não acontece
com quem pratica em legítima defesa, no exercício regular do
direito e no estrito cumprimento do dever legal” [...] “o art. 188, I
do Código Civil proclama que não constituem atos ilícitos os
praticados ‘em legítima defesa ou no exercício regular de um
direito reconhecido.

Complementando o entendimento de Carlo R. Gonçalves,


Rui Stoco50 assevera:

Ora, se a repulsa e revide o ato injusto torna essa defesa legítima


no âmbito penal, inexiste ato ilícito na esfera civil. Apoiando-se a
responsabilidade civil na teoria da culpabilidade e exigindo o art.
186 do Código Civil a ocorrência de culpa para que o agente
indenize, na legítima defesa tal pressuposto não se apresenta.

Mas tal e qual ocorre no âmbito penal, havendo excesso na


legítima defesa, responde civilmente o agente por esse excesso –
seja doloso ou culposo – impondo-se-lhe o dever de indenizar.

Dentro do conceito amplo de legítima defesa, compreendem-se


não somente os bens materiais mas, ainda e igualmente os
valores morais, como a honra, a boa fama, a imagem, a
personalidade do agredido, subordinada os mesmos
pressupostos ante enunciados.

Somente a legítima defesa real, e praticada contra o agressor


impede a ação de ressarcimento de danos, nos termos do art.
188, I do Código Civil.

Conclui a doutrina, então, que a presença dos pressupostos


caracterizadores dessa excludente, desobrigam o agente de reparar o dano
causado, salvo se aquele se exceder no tocante ao terceiro requisito.

50
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 194/195.
30

O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina


tem decido da seguinte forma, em relação ao excesso no ato de enjeitar a atual
ou iminente agressão:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS


MORAIS C/C PEDIDO DE PENSÃO. RECURSO DO RÉU -
HOMICÍDIO - LEGÍTIMA DEFESA DA HONRA - REQUISITOS
PARA O SEU RECONHECIMENTO NÃO CONFIGURADOS -
DESPROPORÇÃO ENTRE A AGRESSÃO COMETIDA PELA
VÍTIMA E A REAÇÃO DO AGENTE - DEVER INDENIZATÓRIO
CARACTERIZADO - REQUISITOS DO ART. 159 DO CÓDIGO
CIVIL DE 1916. A falta de elementos nos autos a indicar que a
morte da mãe da autora deu-se em legítima defesa, ante à
ausência de perigo iminente e a desproporção entre a ação
praticada por aquela e a reação do agente, utilizando-se de arma
de fogo, impõe o reconhecimento do dever reparatório em razão
do dano causado. [...] (A.C. n.º 2005.011082-5, j. em 30/09/2005)

Findo o estudo acerca da legítima defesa, passaremos a


tratar da outra modalidade excludente prevista no art. 188, inc. I do Código Civil,
ou seja, o exercício regular de direito.

1.5.5 EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO

Trataremos agora desta modalidade de excludente de


ilicitude que tem como o estrito cumprimento do dever legal, grande amparo na
legislação, pois se trata de escusa do dever de indenizar em virtude do agente
praticar o ato lesivo no exercício de um direito que é seu, legalmente conferido
pelo ordenamento jurídico.

Acerca do exercício regular de um direito, tem asseverado


Rui Stoco51:

51
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 182.
31

Sustenta Caio Mário que o fundamento moral dessa causa de


isenção da responsabilidade civil encontra-se no adágio: qui iure
sou utitur neminem laedit, ou seja, quem usa de um direito não
causa dano a ninguém (op. ct., 240, p. 294).

Na idéia de ato ilícito exige-se o procedimento antijurídico ou da


contravenção a uma norma ou conduta preexistente, de modo
que não há ilícito quando inexiste procedimento contra direito.

Daí o inciso I do art. 188 do Código Civil enunciar a inexistência


dem ato ilícito quando o dano é causado no exercício regular de
um direito reconhecido.

Mas o individuo, no exercício de seu direito, deve conter-se no


âmbito da razoabilidade. Se o excede, embora o esteja
exercendo, causa um mal desnecessário e injusto e equipara o
seu comportamento ao ilícito. Assim, ao invés de excludente de
responsabilidade, incide no dever de indenizar.

Uma teoria, acerca da excludente telada, é alvo de grande


discussão na doutrina, a saber, teoria da “offendicula”, professando Rui Stoco52, a
esse respeito que:

Muito discutida tem sido a questão das denominadas offendicula,


ou aparelhos preventivos, engenhos mecânicos, cercas de arame
farpado, muros recobertos com pontas de vidro, destinados todos
à defesa da propriedade, pois que impedem o acesso ao interior
de terrenos habitações, pátios chácaras etc.

José F. Marques53, por sua vez, manifestando-se acerca


dos aparelhos repelentes suso elencados:

disposto de modo que só funcione no momento necessário e com


proporcionalidade a que o proprietário era pessoalmente obrigado

52
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 182.
53
FREDERICO MARQUES, José. Tratado de direito penal – vol. 2.2ª ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 1965. p.
135/136.
32

nada impede a aplicação da legitima defesa em favor de que haja


usado o aparelho

Divergindo do posicionamento supra, que é o majoritário


entre os doutrinadores, tem doutrinado Aníbal Bruno54:

O que o individuo exercita no fato é o direito de cercar a


propriedade sua dos recursos necessários a assegurar-lhe a
inviolabilidade, de, dentro dele, dispor as coisas como melhor lhe
pareça; o direito que tem todo o titular de um bem jurídico de
protegê-lo contra injusta agressão. Mas protegê-lo por meios
razoáveis de acordo com o valor do bem e a possível violência da
agressão.

A primeira vista, a teoria acima parece não ter muita relação


com o tema da presente monografia, pois se trata de proteção à propriedade com
a adoção de meios repelitórios de agressões, porém, salienta-se que a adoção
desses meios, acaso se mostre errônea e/ou excessiva, pode ocasionar danos,
inclusive morais.

Colhe-se do repertório jurisprudencial do Egrégio Tribunal


do Estado de Santa Catarina, uma ementa elucidativa de tudo o que foi exposto
acima:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO


MORAL C/C ALIMENTOS - RESPONSABILIDADE CIVIL POR
ATO ILÍCITO - OFENDÍCULO - HOMEM QUE TOCOU CERCA
ELETRIFICADA PELO PROPRIETÁRIO (APELANTE) DO
TERRENO - ATIVAÇÃO POR REDE EXTERNA DE ENERGIA -
ATO ABUSIVO NA DEFESA DO DIREITO DE PROPRIEDADE -
DEVER DE REPARAR O DANO - DANOS MORAIS DEVIDOS À
COMPANHEIRA E AO FILHO MENOR - ALIMENTOS FIXADOS -
PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE
AFASTADA - SENTENÇA MANTIDA INCÓLUME - RECURSO
DESPROVIDO (A.C. n.º 2002.018412-3, j. em 27/10/2003)

54
BRUNO, Aníbal. Direito penal. 2º ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 9.
33

Por fim, o mencionado art. 188, em seu inciso II, ainda


preceitua que “a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão à pessoas,
a fim de remover perigo iminente”, isenta o agente de dever de reparar. O
dispositivo legal está tratanto, portanto, do estado de necessidade, o qual
veremos a seguir.

1.5.6 ESTADO DE NECESSIDADE

Toda vez que um indivíduo se achar de fronte a uma


situação atípica, passível de lesionar a si ou a terceiro, conforme o disposto no
art. 188, caput, inciso II e parágrafo único do Código Civil, ficará isento de reparar
os danos que por ventura houver causado, na tentativa de evitar a materialização
daquele primeiro dano.

Acerca desta excludente, tem-se posicionado Rui Stoco55


da seguinte forma:

Acerca do estado de necessidade o Código Civil assim dispõe:

Art. 188. Não constituem atos elícitos: (...) II – a deterioração ou


destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover
perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato
legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem
absolutamente necessário, não excedendo os limites do
indispensável para a remoção do perigo”. [...]

A situação é análoga a legitima defesa, embora ofereça aspectos


diferenciais. Na primeira, há uma agressão dirigida à pessoa ou
aos bens. No estado de necessidade não se configura uma
agressão, porém desenha-se uma situação fática, em que o
individuo vê uma coisa na iminência de sofrer um dano. Afim de
removê-lo ou evitá-lo, sacrifica coisa alheia. Embora as situações
se distingam, há um a similitude ontológica, no dano causado a
outrem, para a preservação de seus próprios bens.

55
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 178/179.
34

Na escusativa fundado no estado de necessidade, existe um ato


que seria ordinariamente ilícito, No entanto a lei justifica eximindo
o agente do dever de indenizar, tendo em vista preservar os bens
mediante a remoção de perigo iminente. [...]

A escusativa de responsabilidade contida no princípio do estado


de necessidade vem temperada pelo conteúdo dos arts. 929 e
930 do Código Civil, pois se a pessoa lesada, ou dano da coisa,
não for culpado do perigo, assiste-lhe o direito à reparação dos
danos que sofrer e se o perigo ocorrer por culpa de terceiro,
contra este terá o autor do dano ação regressiva.

Carlos R. Gonçalves56por sua vez:

Reconhecendo o contra-senso e o paradoxo do legislador, ao


considerar não constituir ato ilícito o ato danoso praticado com
objetivo de remover perigo iminente, mas extraindo dele, ao
mesmo tempo, uma inexplicável obrigação de indenizar, pondera
contudo, Wilson Melo da Silva: “Em face, no entanto, da
presunção de sapiência do legislador (e não do sábio o
contradizer-se), tem-se aceitado que inexistisse, na espécie, o
paradoxal justiçando-se o que se tem por aparentemente
contraditório em decorrência do elástico princípio da eqüidade”
(Da responsabilidade, cit., p. 141).

E prossegue o civilista mineiro: “Ora, se razoável não é que a


vítima inocente de um dano que se levou a efeito com a
finalidade de se afastar um perigo iminente, que viesse a
prejudicar terceiros, fique desamparada, razoável não é, também,
que o autor do dano que a tal situação chegou por uma dura
contingência e não por vontade própria, venha a arcar com a
totalidade dos prejuízos que seu ato teria determinado com a
destruição ou com a deterioração da coisa alheia, no intuito de
afastar um dano iminente que talvez o prejudicasse. A solução
equilibrada, portanto só poderia ser a indenização por uma
responsabilidade limitada, indenização possível apenas por
arbitramento do juiz, ex bono et aequo, e não a da indenização
ampla e comum” (Da responsabilidade, cit., p. 140-1).

56
GONÇALVES. Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 499.
35

Parafraseando Wilson M. da Silva, Carlos R. Gonçalves,


adota o posicionamento de que o magistrado é quem deve fixar a indenização,
quando no intuito de ver extinto o perigo de um dano maior, o agente tiver um
desgaste do seu patrimônio. Esta excludente de responsabilidade guarda
similaridade com a legítima defesa, haja vista que esta última vem a repelir
agressão existente e eminente, enquanto que o estado de necessidade, tem o
condão de assegurar que uma situação que venha a criar uma agressão existente
e iminente à pessoa ou patrimônio, não se concretize.

Passemos a analisar, a excludente do estrito cumprimento


do dever legal.

1.5.7 ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL

Esta modalidade de excludente tem grande amparo legal,


porquanto se dá em virtude do agente praticar o ato lesivo, em nome de um dever
legal que lhe foi conferido pelo ordenamento jurídico. A excludente em questão,
tem peculiaridades interessantes, como, por exemplo, a escusa apenas do agente
frente ao dever de reparar o dano e não, do Estado, consoante se apreende da
lição de Carlos R. Gonçalves57:

Nos casos de estrito cumprimento do dever legal, em que o


agente é exonerado da responsabilidade pelos danos causados,
a vítima muitas vezes, consegue obter o ressarcimento do
Estado, já que, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição
Federal, “as pessoas jurídicas de direito público responderão
pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade causarem a
terceiros”. E o Estado não terá ação regressiva contra o
funcionário responsável (só cabível nos casos de culpa ou dolo),
porque estará amparado pela excludente do estrito cumprimento
do dever legal.

57
GONÇALVES. Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 503.
36

Convergindo com o posicionamento de Carlos R.


58
Gonçalves, ensina Rui Stoco :

Um fato considerado ilícito perde esse caráter quando praticado


no cumprimento de um dever legal.

Quem age limitando-se a cumprir um dever que lhe é imposto por


lei penal ou extra-penal e procede sem abuso desse dever não
ingressa no campo da ilicitude. [...]

Nos casos de estrito cumprimento do dever legal, em que o


agente é exonerado da responsabilidade pelos danos causados,
a vítima deve buscar o ressarcimento do Estado, já que nos
termos do art. 37, § 6º, da CF/88 “as pessoas jurídicas de direito
público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos
responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade,
causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa”. [...]

Por essa razão o Estado não terá ação de regresso contra o seu
servidor, pois estará ele acobertado pela excludente do estrito
cumprimento do dever legal (que legitima o seu ato), cabendo à
Administração, exclusivamente, arcar com os prejuízos que o seu
preposto, nessa condição causar a terceiros, no exercício de um
dever legal, ao qual lhe era escusado descumprir.

É posicionamento majoritário na doutrina e jurisprudência


(TJSC A.C. n.º 2005.022287-6, TJSC A.C. n.º 2005.003943-9, TJSC n.º
2003.002024-1), que o agente no desempenhar de suas funções, está acobertado
por esta excludente, situação que não socorre, contudo, ao Estado, porquanto o
mesmo não é alcançado pelo dispositivo constitucional já mencionado, visto que
responde objetivamente pelos seus atos, sejam eles diretos ou indiretos.

Concluídos os comentários acerca das excludentes suso


elencadas, adentraremos, neste momento, ao campo contratual, para

58
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 181.
37

aprofundarmos os conhecimentos acerca da cláusula de irresponsabilidade, ou


seja, será que uma simples cláusula contratual teria o condão de ilidir o dever de
indenizar? Vejamos.

1.5.8 CLAUSÚLA DE IRRESPONSABILIDADE (“CLÁUSULA DE NÃO


INDENIZAR”)

Consiste em uma convenção das partes que ocorre nos


contratos comutativos, onde na estipulação das recíprocas obrigações, as partes
pactuam cláusula prevendo a “não-indenização” no caso de não cumprimento ou
mau cumprimento do contrato, conforme baliza a doutrina de Carlos R.
Gonçalves59:

[...] é o acordo de vontades pelo qual se convenciona que


determinada parte não será responsável por eventuais danos
decorrentes de inexecução ou de execução inadequada do
contrato. É o caso, por exemplo, do dono de garage que declara,
com a concordância do cliente, não se responsabilizar pelo
desaparecimento de objetos deixados no veículo.” [...]

Muito se discute a respeito da validade de tal cláusula. Para


alguns seria imoral, porque contraria ao interesse social.
Vedando-a principalmente nos contratos de adesão, estar-se-á
protegendo a parte economicamente mais fraca (Aguiar Dias,
Cláusula, cit., n. 15). Outros entretanto, defendem-na estribados
principalmente no princípio da autonomia da vontade: as partes
são livres para contratar desde que o objeto do contrato seja
lícito.

Complementando o posicionamento supra, Rui Stoco60


assevera:

59
GONÇALVES. Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 530.
60
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 177.
38

Em verdade, ocorre mera relevação da responsabilidade civil da


outra parte, com o único objetivo de renúncia ao direito de obter
reparação, posto que só a lei pode estabelecer a licitude ou
ilicitude do comportamento das pessoas, determinando suas
conseqüências.

Apesar de muito discutida na doutrina, os tribunais pátrios


em certas situações tem afastado a cláusula e, em outras, admitido a sua
aplicação.

Vencida a etapa inicial de conceituação e, caracterização do


instituto do dano moral, passaremos, no capítulo seguinte, a tratar do cerne da
presente monografia, ou seja, “a fixação do “quantum” indenizatório” pelo abalo
moral sofrido. Veremos quais são os critérios consagrados pela doutrina, expondo
o pensamento dos autores e, verificando os pontos de convergência entre as
correntes doutrinárias e jurisprudenciais. Por derradeiro, mostrar-se-á um
esquema para a fixação do “quantum” indenizatório nas ações por danos morais,
balizado na experiência vivenciada pelos juízes das três Varas Cíveis da Comarca
de Balneário Camboriú – SC.
39

CAPÍTULO 2

A FIXAÇÃO DO “QUANTUM” INDENIZATÓRIO NAS AÇÕES POR


DANOS MORAIS

Ab initio, mostra-se pertinente demonstrar que, mesmo


anteriormente à vigência do Código Civil de 2002, inexistiam critérios para a
fixação do “quantum” indenizatório nas ações por danos morais, onde a
mensuração se fazia por arbitramento, nos termos do art. 1.553 do Código Civil
de 191661, assim como leciona Cahali62:

Inexistentes parâmetros legais para o arbitramento do valor da


reparação do dano moral, a sua fixação se faz mediante
arbitramento, nos termos do art. 1.553 do CC.

Atualmente, a fixação do “quantum” indenizatório continua a


ser feita por arbitramento – com respaldo no art. 946 do Diploma Civil vigente -
porém, com a evolução da doutrina e da jurisprudência, o campo de mensuração
do abalo moral se ampliou, pois, ainda que inexistentes critérios cogentes e
norteadores, a doutrina e a jurisprudência foram construindo seus próprios
parâmetros, como veremos a seguir.

É sabido que, na quantificação da indenização por dano


moral, deve o julgador, valendo-se de seu bom senso prático e, adstrito ao caso
concreto, arbitrar, pautado nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade,
um valor justo ao ressarcimento do dano extrapatrimonial, consoante ensina a
percuciente lição de. Louzada63:

61
“Art. 1.553. Nos casos previstos neste Capítulo, se ficará por arbitramento a indenização.”
62
CAHALI, Yussef Said, Dano moral. 2.ª ed. São Paulo Editora Revista dos Tribunais. 2000. p. 705.
63
BERNARDO, Wesley de Oliveira Louzada. Dano moral: critérios de fixação de valor. p. 186/187.
40

O princípio da razoabilidade, conquanto de difícil definição, pode


ser conceituado como aquele que visa a“ [...] limitar e
condicionar, logicamente, a discricionariedade para que esta não
se transforme em arbitrariedade, tendo especial importância no
julgamento das questões difíceis [...].

Ou, ainda, segundo Barroso, “é um parâmetro de valoração dos


atos do Poder Público para aferir se eles estão informados pelo
valor superior inerente a todo o ordenamento jurídico: a justiça.”

Numerosos são os acórdãos que citam a razoabilidade e a


proporcionalidade como parâmetros de fixação da reparação.

Entretanto de uma análise mais detalhada, vê-se que a


razoabilidade é utilizada, no mais das vezes, como mera
desculpa, como a “lógica do mais ou menos certo”, já que os
julgados que se utilizam do mesmo princípio apresentam, por
vezes, resultados em muito destoantes. [...]

O que se conclui é que a razoabilidade e proporcionalidade não


são, em nosso contexto jurisprudencial, verificáveis na
sentença,m servindo como verdadeira “excludente de
responsabilidade” do magistrado ao fixar ou reformar a sentença.
[...]

Deveria a razoabilidade incidir sim, sobre todas as sentenças que


envolvem o dano moral, como ferramenta à ponderação dos
interesses envolvidos, a fim de servir como mais um parâmetro
na busca da justa indenização, o que infelizmente não se verifica
na prática. [...]

De outra parte, há o Poder Judiciário que analisar as questões


com razoabilidade, verificando a posição ocupada pelo ofendido o
coloca em situação de gerar interesse público na verificação da
lisura de suas condutas (v. g. agentes políticos), a veracidade dos
fatos e a forma de apuração. Sobre o tema, e extremamente
esclarecedora a manifestação de Luís Roberto Barreto: “Por outro
lado, a democracia não é um fim em si, mas um instrumento de
realização da dignidade humana. Em um cenário ideal de
segurança jurídica, e justiça, em suas múltiplas dimensões, as
41

pessoas aspiram à felicidade, à realização de seus projetos e


titularizam direitos cujo objeto é o apreço ou respeito da
comunidade, a auto-estima, a intimidade. A honra a vida privada
e a imagem, na previsão do ctexto constitucional. Há espaços na
vida das pessoas que devem ser preservados da invasão, da
agressão moral e uso indevido. A tensão entre a liberdade de
informação e expressão e estes denominados direitos à
personalidade é natural e óbvia... [...]

Neste sentido, a reparação de dano moral, pode – e deve –


funcionar como eficiente mecanismo limitador das tentações
mercantilistas e das aventuras com a honra alheia, ressalte-se,
mecanismo a posteriori, uma vez que o controle a priori é
inadmissível como regra. [...]

Desta forma, entendemos que a razoabilidade e


proporcionalidade deverão nortear todos os julgamentos
envolvendo o dano moral. E, diga-se de passagem, não somente
no que tange à segunda fase, ou seja, na apuração do quantum
debeatur, mas também na apuração do na debeatur, exercendo
um duplo efeito: servir de um lado como instrumento hábil a
possibilitar ao magistrado a verificação da existência do dano e,
mantendo o mesmo critério, na fixação do valor reparatório; e, por
outro lado, possibilitar às partes a verificação da razoabilidade
não somente do quantum, mas também das razões expedidas
para obtenção de tal valor. [...]

Nesse contexto, a razoabilidade e dignidade da pessoa humana


encontram-se vinculadas, sendo a primeira instrumento de
concretização da segunda: “Não existe dignidade humana
possível sem razoabilidade axiológico-teleológico.

Vencida essa etapa, passaremos ao próximo, onde


estudaremos os critérios utilizados pela jurisprudência à fixação do “quantum”
indenizatório.

2.1 CRITÉRIOS PARA A FIXAÇÃO SEGUNDO A JURISPRUDÊNCIA


42

A jurisprudência ampara o magistrado na fixação do


“quantum” indenizatório em todos os litígios e, como não poderia ser diferente, é
uma das principais ferramentas na fixação da indenização por abalo moral. E, de
que forma a jurisprudência auxilia os magistrados? Como visto anteriormente, o
sistema tarifário não foi bem recepcionado pelo direito brasileiro e, logo caiu por
terra, porém, a jurisprudência, implicitamente criou uma tarifação, fixando um
montante mínimo para determinadas situações e, evidenciando as variações que
esse montante pode apresentar. Nessa ordem de idéias, salienta-se que a
jurisprudência efetua o controle de fixações exacerbadas em sede de recurso
especial, os quais são julgados pelo Superior Tribunal de Justiça, como
asseverou o Ministro Nilson Naves no acórdão do Recurso Especial n.º
53.321/RJ, “verbis”:

RESPONSABILIDADE CIVIL. IMPRENSA (PUBLICAÇÃO DE


NOTICIA OFENSIVA). OFENSA A HONRA. DANO MORAL.
VALOR DA INDENIZAÇÃO. CONTROLE PELO STJ. 1. QUEM
PRATICA PELA IMPRENSA ABUSO NO SEU EXERCICIO
RESPONDE PELO PREJUIZO QUE CAUSA. VIOLADO
DIREITO, OU CAUSADO PREJUIZO, IMPÕE-SE SEJA
REPARADO OS DANOS. CASO DE REPARAÇÃO DE DANO
MORAL, INEXISTINDO, NESSE PONTO, OFENSA A TEXTO DE
LEI FEDERAL. 2. EM NÃO SENDO MAIS APLICAVEL A
INDENIZAÇÃO A QUE SE REFERE A LEI N. 5.520/67, DEVE O
JUIZ NO ENTANTO QUANTIFICA-LA MODERADAMENTE. O
CRITERIO DA PENA DE MULTA MAXIMA PREVISTA NO COD.
PENAL (EM DOBRO, SEGUNDO O DISPOSTO NO COD. CIVIL,
ART. 1.547, PARAGRAFO UNICO) NEM SEMPRE E
RECOMENDAVEL. 3. O VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANO
MORAL NÃO PODE ESCAPAR AO CONTROLE DO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 4. RECURSO ESPECIAL
CONHECIDO PELO DISSIDIO E PROVIDO EM PARTE,PARA
REDUZIR-SE O VALOR DA CONDENAÇÃO. – grifei.
43

A doutrina reconhece a valiosa contribuição da


jurisprudência na fase de fixação do “quantum” indenizatório, consoante se
apreende da lição de Santos64:

Ante a repulsa da indenização tarifada, o Poder Judiciário poderá


se utilizar de todas as vantagens que o computador oferece e
estabelecer um banco de dados contendo o quantum da
indenização. Estabelecendo comparação diante de caso similar,
poderá o juiz valer-se do que foi decidido pelo Tribunal, para
calibrar o montante da indenização. Essa forma de ver a
quantificação do dano moral, impedirá a loteria jurídica a que as
vítimas se submetem. [...] A harmonização de cifras em casos
similares, ou gradação (para mais ou para menos), diante do que
o Tribunal já consolidou, será fonte de afastamento destes
temores e o fim da loteria jurídica. [...]

Não poderá o juiz, nem o advogado, abrir mão da saneadora


atividade jurisprudencial. Consolidada a indenização em um
determinado valor, nada impede que esse montante seja utilizado
em casos parelhos, como bússola na definição do dano moral.
Para isso, no entanto, será necessário que em todo o acórdão
publicado, seja mencionado o valor que o juiz de primeiro grau
encontrou e aquele do Tribunal. Somente assim, o profissional do
Direito terá condições de verificar o quantum e como ambos os
órgãos jurisdicionais chegaram ao valor estimado, [...]

O precedente judicial consolidado, surgido de uma reiterada


decisão em casos similares, assinala os valores básicos de onde
deve partir a avaliação, para, depois, ajustar-se as circunstâncias
do caso concreto. Assim, haverá muito menos sentenças
díspares e mais objetividade na mensuração, contribuindo para
dar maior segurança jurídica aos partícipes do drama judiciário.

Santos65 ressalta, ainda, a importância da coerência das


decisões:

64
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. 4.ª ed. São Paulo: Revista do Tribunais, 2003. p.
191.
65
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. p. 185.
44

O guia nesse tema emana do próprio juiz, do juiz que não quer
contradizer suas decisões sobre a fixação do dano moral, nem
tampouco contradizer seus colegas, nem deixar-se levar por sua
inspiração pessoal. A Jurisprudência colabora – e muito – na
unificação de critérios, na harmonização, cristalizando-os. Na
Inglaterra, o juiz Morris tem afirmado que nestas questões de
indenização de danos morais, se não houver harmonia das
decisões, não haverá justiça. Pede-se coerência. Uma mesma
indenização para casos similares. Lesões análogas têm de ser
reparadas de maneira análoga. Dores iguais, reparações iguais.
Do contrário, não haverá atribuição daquilo que é seu.

Acontece que a jurisprudência não é apenas um ponto de


partida ou um controlador de decisões, porquanto ela também explicita os critérios
que julga pertinentes e, aqueles que leva em consideração quando efetua a
minoração ou a majoração do “quantum” arbitrado pelo juízo “a quo”, conforme se
infere do precedente abaixo colacionado:

CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MATERIAL.


INCAPACIDADE TOTAL. ART. 1539, CÓDIGO CIVIL. PENSÃO
INDENIZATÓRIA CORRESPONDENTE A TOTALIDADE DOS
GANHOS DA VÍTIMA. DANO MORAL. QUANTUM. CONTROLE
PELA INSTÂNCIA ESPECIAL. POSSIBILIDADE. VALOR
REDUZIDO. CASO CONCRETO. MAJORAÇÃO.
PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO. I - Em se tratando de
indenização decorrente de acidente de trânsito, a pensão
indenizatória por dano material, deve corresponder ao prejuízo
efetivamente ocorrido. II - O valor da indenização por dano
moral sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça,
sendo certo que, na fixação da indenização a esse título,
recomendável que o arbitramento seja feito com moderação,
proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível sócio-
econômico do autor e, ainda, ao porte econômico do réu,
orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e
pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua
experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às
peculiaridades de cada caso. III - Na espécie dos autos, o valor
fixado a título de danos morais não se mostrou razoável,
notadamente em razão dos precedentes da Turma em casos
mais leves, impondo-se, em conseqüência, a sua majoração.
45

(STJ, REsp n.º 240441/MG, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo


Teixeira, julgado em 25/04/2000 – grifei)

Elucidando tudo o que foi esposado acima, colaciona-se, à


guisa de ilustração, caso em que o nome do indivíduo é incluído indevidamente
no “cadastro dos maus pagadores” (SPC, SERASA, etc.), arbitrando os tribunais
superiores, para esta modalidade de abalo moral, indenização que gira em torno
de quantia similar a 50 (cinqüenta) salários mínimos.

O nosso Egrégio Tribunal de Justiça fixou tal quantia em


caso análogo, vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL - RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO


MORAL - DÉBITO INEXISTENTE - INSCRIÇÃO INJUSTA NO
SPC - DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO - FIXAÇÃO DO
QUANTUM INDENIZATÓRIO - DECISÃO QUE EXTRAPOLA OS
LIMITES DA RAZOABILIDADE - VALOR DETERMINADO EM
PRIMEIRO GRAU REDUZIDO PARA QUANTIA EQUIVALENTE
A 50 SALÁRIOS MÍNIMOS. 1. Em sede de danos morais, a
simples inscrição indevida ou irregular nos órgãos de proteção ao
crédito é fato gerador de constrangimentos e transtornos na vida
do inscrito, que tem seu crédito negado, sendo impedido de
realizar atos comerciais, ou seja, provoca dano moral indenizável.
2. A indenização deve ser fixada de modo a dar uma
compensação ao lesado pela dor por ele sofrida, não podendo,
todavia, ser de maneira tal que lhe pareça conveniente ou
vantajoso o abalo suportado. RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO. (TJ – SC, A.C. n.º 1999.010219-0, Dês. Mazoni
Ferreira, julgado em 31/10/2002 – grifei)

O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais,


convergindo com o entendimento do nosso Tribunal, fixou a mesma quantia para
caso de mesma natureza, “verbis”:

DANO MORAL - INDEVIDO ENCAMINHAMENTO DE NOME AO


SPC, POR SUPOSTA INADIMPLÊNCIA - CULPA
COMPROVADA - PROCEDÊNCIA DA AÇÃO DE INDENIZAÇÃO.
46

REDUÇÃO DO VALOR DA REPARAÇÃO PARA O


EQUIVALENTE A 50 SALÁRIOS MÍNIMOS - PROVIMENTO
PARCIAL DA APELAÇÃO. É indenizável o dano moral decorrente
do indevido encaminhamento de nome de devedor ao SPC, por
culpa do credor, em caso de suposta inadimplência. É razoável o
arbitramento da indenização no valor equivalente a 50 salários
mínimos em casos dessa natureza, tendo-se em vista o grau de
culpa do réu e a extensão do dano dela resultante, sofrido pelo
autor, com a redução do valor arbitrado pelo juiz, correspondente
a 50 vezes o valor da dívida. (TJ – MG, A.C. n.º 314.301-1, Dês.
Fernando Bráulio, julgado em 19/09/2000 – grifei)

Descendo no mapa até o extremo Sul, temos a decisão do


Egrégio Tribunal do Rio Grande do Sul, o qual tem fixado a mesma quantia em
situações similares, conforme se observa do precedente abaixo colacionado:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO


MORAL E ABALO DE CRÉDITO. INCLUSÃO INDEVIDA EM
CADASTRO DE INADIMPLENTES. DANO MORAL. FIXAÇÃO
DA INDENIZAÇÃO. PARÂMETROS DA CÂMARA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. Segundo os
parâmetros desta C. Câmara, para casos semelhantes ao dos
autos, o valor de 50 salários mínimos nacionais é adequado
para indenizar os danos morais. Considerando-se o grau de zelo
e a dignidade do advogado do autor, o lugar de prestação do
serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado e
o tempo exigido para o serviço do procurador, os honorários
advocatícios devem ser de 20% sobre o total da condenação,
com base no art. 20, parágrafo terceiro, do CPC. DERAM
PROVIMENTO AO APELO. (TJ – RS, A.C. n.º 70009686171,
Dês. Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, julgado em
21/06/2006 – grifei)

Da análise dos três acórdãos transcritos, conclui-se que


apesar dos casos terem se dado em tempo e estados da federação diversos, a
fixação do montante indenizatório se deu na mesma medida, ou seja, no patamar
de 50 (cinqüenta) salários mínimos, o que evidencia a tarifação implícita nos
acórdãos.
47

Como asseverou Santos, o magistrado tem a sua


disposição, todo um banco de informações e decisões uniformes em situações
análogas, partindo de um “quantum” pré-estabelecido e moldando-o para a
situação sub judice. Dito isso, passa-se à análise dos parâmetros utilizados pela
doutrina.

2.2 CRITÉRIOS PARA A FIXAÇÃO SEGUNDO A DOUTRINA

A doutrina prestou importante contribuição na questão da


fixação do “quantum” indenizatório nas ações por danos morais. A jurisprudência,
como é sabido, é o desdobramento de uma situação fática sendo, então, aplicada
a legislação pertinente com o auxílio da doutrina, por esta razão, a parcela de
contribuição da doutrina para a questão da fixação da indenização por abalo
moral, foi mais engrandecedora do que a da jurisprudência, pois, enquanto uma
consiste em um ponto de partida para o magistrado, a outra lhe apresenta as
circunstâncias mais específicas a serem consideradas no caso, tais como, a
condição pessoal do ofendido, a extensão do dano, o poder aquisitivo do ofensor
entre outros aspectos.

Santos66 elenca dez critérios, que entende como gerais, os


quais devem ser observados em todas as demandas que envolvem o dano moral
e, devem ser utilizados tanto por advogados em seus pleitos como por
magistrados quando da fase de mensuração e fixação da indenização por abalo
moral, a saber:

I – O dano moral é incomensurável [...]

Em virtude da qualidade de incomensurável que é atribuído ao


dano, a indenização é meramente convencional, de acordo com
os critérios que não são matemáticos, certos, indiscutíveis, em
virtude do mesmo ser incomensurável.

66
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. p. 180/185.
48

A doutrina inglesa é muito clara quanto a esses aspectos. Eles


perguntam por que dez e não cem? E por que cem e não mil?
Ou, ao inverso: por que mil e não dez, ou cem? Esta seria a
primeira idéia. É uma idéia óbvia, por todos conhecida, porém é
necessário destaca-la. Fugir das fórmulas matemáticas, fugir da
pretensão de estabelecer um numero, uma quantidade. Carbonier
denominou, em verdadeiro achado, de critérios da flexibilidade no
Direito.

Nesse diapasão, o tribunal de Justiça de Goiás, já teve a


oportunidade de afirmar que “no dano moral, o pretium doloris,
por sua própria incomensurabilidade, fica a critério do juiz, que
fixa o respectivo valor, de acordo com o seu prudente arbítrio.
Grande, portanto é o papel do magistrado na reparação do dano
moral, competindo-lhe examinar cada caso, ponderando os
elementos probatórios e medindo as circunstâncias” (RT 730/307,
rel. Des. Arivaldo da Silva Chaves).

II – Um piso flexível

A segunda regra é de ascetismo, não incorrer nisso, com base na


falta de uma homogeneidade entre o valor que se quer reparar e
o valor dinheiro. [...]

Em primeiro lugar, a indenização não deve ser tão baixa, tão


pequena, tão insignificante que apareça como uma indenização
simbólica, mas uma quantia que se aproxime da tendência de
castigar. Interessa, no entanto, a reparação compensadora, que
permita, com uma quantidade de dinheiro, suavizar, de algum
modo, a dor e o sofrimento. O que conta, para o cidadão comum,
é uma indenização que tenha força, que tenha peso, que golpeie
onde dói mais: o bolso.

III – Um teto prudente

Essa é a terceira regra. A indenização não pode ser tão elevada


que pareça extravagante e leva a um enriquecimento injusto, a
uma situação que nunca gozou, que modifique a vida do
prejudicado ou de sua família, que o transforme em um novo rico.
49

Não tão alta que pareça um gesto de induvidosa generosidade,


porém com bolso alheio. [...]

Essa idéia é vizinha do critério da flexibilidade, chamado na


Inglaterra de tariff approach, tarifa aproximada, e na França, de
calcule approcher, um cálculo aproximado. Que tenha piso, que
tenha teto, que tenha razoabilidade.

IV – Dentro do contexto econômico do País

O julgador deve estar situado e sintonizado no contexto


econômico do País. Deve ter em conta os males do custo social
brasileiro. Ter em conta a situação média das empresas, dos
fornecedores de bens e serviços. A situação média da nossa
população. Ter em conta a expressiva pobreza dos habitantes do
País, além de levar em consideração o impacto que o valor da
indenização venha a ter sobre o dinamismo econômico. [...]

V – Uma prova convincente, firme e clara [...]

Para que a indenização do dano moral seja concedida é


necessário que a prova seja clara, firme e convincente. Não
podemos igualar e dizer que a perda da mão direita é igual para
qualquer um que tenha sofrido essa amputação. Porém, um é
pianista e o outro é canhoto, que utilizava a mão direita para
pentear-se. Para os adeptos da indenização tarifada, são duas
mãos direitas, podem valer igualmente. Necessário enfatizar que
os advogados que têm de levar o caso com todas as
peculiaridades e fundamentação do pedido e os juízes saberão
declarar o direito.

VI – Capacidade moderadora do juiz

Deve o juiz fixar indenização elevada ou baixa, de acordo com as


circunstâncias do caso. Como não levar em conta que a fixação
de determinada quantia pode levar uma empresa à ruína? O juiz
tem que ficar indiferente à quebra de empresas no meio em que
judica? A quem satisfaz a estimação da quantia alta se o devedor
é insolvente?
50

A sifra deve ser razoável. Porém, não para satisfazer uma das
partes em sua legítima expectativa; uma indenização condigna,
uma indenização que tenha relevância. Por isso, quando existe
seguro que tenha um bom prêmio, então o juiz pode ser um
pouco mais generoso. Sem que isso implique terminar com as
companhias seguradoras. A existência de um seguro que possa
“socializar a reparação”, socializar o prejuízo, estende-lo a toda a
coletividade que paga o seguro, é uma boa idéia. Também é
razoável o caráter punitivo, se o dano moral foi produto de uma
negligência, ou de uma intenção. São dois aspectos que devem
ser sopesados.

VII – Critério de eqüidade e das circunstâncias particulares

Não se pode fazer justiça que não tenha por base na eqüidade,
atendendo as circunstâncias particulares do caso. È lógico que
devem ser valoradas a quantidade e a qualidade dos bens que
podem ser adquiridos e os serviços que podem ser obtidos com o
dinheiro da reparação. O juiz tem que ter em conta o seguinte:
que se pode fazer com essa quantidade de dinheiro ou com essa
pensão que se paga mensalmente, que poderá fazer esta família
ou a vítima? Quais os bens e serviços que podem adquirir com a
pensão? [...]

VIII – Necessidade de consenso

É necessário que os juízes cheguem a um ponto comum sobre a


quantia na indenização dos danos morais. Esse ponto precisa ser
cristalino. Causa escândalo o fato de encontrar-se diferenças
exageradas em decisões que estimam valor da indenização. Não
se pode taxar a Magistratura de, ora egoísta, ora generosa; juízes
avaros e outros pródigos. Ninguém do povo entenderá essa
disparidade e tudo contribui para o descrédito da Justiça. [...]

IX – Segurança Jurídica

A segurança jurídica é um valor a ser perseguido. Segurança,


porém com justiça. A segurança consiste na possibilidade de
saber, de antemão, quais as chances de sucesso da demanda e
qual o valor, aproximado, que a vítima vai receber, que o juiz vai
51

fixar. A segurança jurídica, que ressai da possibilidade de prever


o resultado da demanda, sem maiores angústias e incertezas,
equivale a dizer da necessidade de conhecer a jurisprudência ,
como os juízes estão decidindo na órbita da indenização do dano
moral. Daí, a necessidade do consenso (item VIII, retro).

X – Coerência das decisões

“O guia nesse tema emana do próprio juiz, do juiz que não quer
contradizer suas decisões sobre a fixação do dano moral, nem
tampouco contradizer seus colegas, nem deixar-se levar por sua
inspiração pessoal. A Jurisprudência colabora – e muito – na
unificação de critérios, na harmonização, cristalizando-os. Na
Inglaterra, o juiz Morris tem afirmado que netas questões de
indenização de danos morais, se não houver harmonia das
decisões, não haverá justiça. Pede-se coerência. Uma mesma
indenização para casos similares. Lesões análogas têm de ser
reparadas de maneira análoga. Dores iguais, reparações iguais.
Do contrário, não haverá atribuição daquilo que é seu.

O mesmo autor67 ainda elenca outros quatro critérios,


porém, desta vez, critérios particulares, pertinentes à situação em si, sendo estes:
“a) o grau de reprovabilidade da conduta ilícita; b) intensidade e duração do
sofrimento experimentado pela vítima; c) capacidade econômica do causador do
dano e d) condições pessoais do ofendido”, circunstâncias estas que devem ser
sopesadas caso a caso, professando o referido autor a esse respeito que:

35.2.1 Conduta reprovável

Tem interesse a valoração da gravidade da falta cometida pelo


ofensor. O comportamento do ofensor tem relevância se
considerada a indenização como possuindo uma parte de sanção
exemplar. Tendo o ressarcimento uma função ambivalente –
satisfatória e punitiva – tem incidência e importância a culpa e o
dolo no instante da fixação do montante indenizatório. [...]

67
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. p. 185/190.
52

O parágrafo único do art. 944 do CC acolheu entendimento


jurisprudencial que mostrava o grau de culpa do vitimário como
um bom critério para a aferição do montante a ser indenizado.
Não a simples culpa deve ser observada, mas ela serve, junto
com os outros fatores objetivos, para motivar uma maior ou
menor soma em dinheiro que deve ser entregue ao ofendido. [...]

35.2.2 Intensidade e duração do sofrimento

A magnitude da lesão há de ser verificada sempre. Uma lesão


física que possa ser sanada, evidente que não será considerada
da mesma forma que um dano estético causador da amputação
de uma perna. A permanência da lesão no indivíduo ou a sua
enfermidade, serve para orientar o julgador, porque se a lesão
permanecer, de forma indelével, a dor é mais intensa. [...]

Neste critério em que será observada a magnitude da lesão,


serão levados em conta os sofrimentos psíquicos e afetivos
padecidos pela vítima. A dor, termo que deve ser compreendido
como medo, emoção, trauma, angústia, vergonha, pena física ou
moral, por exemplo, também será tomada em consideração. [...]

Quando vem sendo dito que a indenização deve ter um plus, para
se alcançar aquele algo de punitivo que ela deve guardar, é
porque, além de ser observado o sofrimento, há, também, de ser
considerado o menosprezo do causador da ofensa. Se não existe
nenhuma maneira de fazer com que o ofensor para com a sua
nefasta atividade, o melhor é aumentar a quantia indenizatória,
sem que, com isso a vítima fique mais rica.

35.2.3 Capacidade econômica dos protagonistas do dano

A situação econômica, tanto do ofensor, como da vítima diz


respeito, sobretudo, á sua solidez econômica. Seja qual for a
preferência doutrinária do julgador, a situação econômica de
quem causa dano moral também assume importante rol. Se a
situação econômica, solitária, não pode servir de base para
aferição do quantum, mas o conjunto de situações especiais,
como vem sendo reiterado neste trabalho, há de se ter em vista
que a satisfação da vítima deve ser buscada a todo custo. Assim
53

sendo, essa satisfação depende diretamente da real condição


econômica também da vítima. Verificada a projeção do fato na
vida do ofendido, terá de ser visto qual a quantidade em dinheiro
será possível buscar uma compensação do prejuízo originado.
[...]

De nada adiantará a fixação de indenização grandiosa se o


ofensor não puder ou não tiver bens a pagar. Isso somente
concorrerá para o descrédito da Justiça. Boa a situação
financeira do vitimador, deverá o mesmo arcar um pouco mais
com a indenização por seu gesto que orientou a lesão moral
padecida pelo ser humano.

35.2.4 Condições pessoais do ofendido

Ainda a respeito da situação da vítima, o seu geral standart de


vida há de ser observado, como idade, estado civil, sexo, a
atividade social, o local em que vive, os vínculos familiares e
outras circunstâncias tanto de natureza objetiva, como subjetiva
que o caso ofereça. [...]

Os irmãos Mazeaud (Tratado teórico y práctico de la


responsabilidad civil, t. 3, vol. I, p. 587), mostram que “um mesmo
fato pode causar a uma pessoa, por exemplo, mais débil, mais
sensível ou mais nervosa, um prejuízo mais considerável do que
em outra. A perda de um olho ocasiona a um caolho um prejuízo,
material e moral, muito mais grave que a um indivíduo que tenha
ambos os olhos. Um mesmo medo, um mesmo ruído, um mesmo
olor determinam perturbações muito mais importantes em um
nervoso do que em uma pessoa bem equilibrada”. Todas essas
circunstâncias do caso servirão como norte para o juiz fixar o total
da indenização.

Importante a divisão efetuada pelo doutrinador Antonio J.


Santos, pois, ao nos depararmos com uma situação de abalo moral é imperativo
que analisemos as circunstâncias que a rodeiam, ou seja, importante verificarmos
todos os dez critérios gerais suso elencados, para identificarmos o dano moral no
espaço e no tempo.
54

Analisados os aspectos gerais, aí sim é hora de


mensurarmos o “quantum” levando em consideração os aspectos particulares,
estes incidentes sobre a situação em si e a condição do ofendido e do ofensor,
quais sejam: a conduta de ambos para a culminação do dano; a intensidade e/ou
duração do dano para o ofendido, analisando-se ainda, se a repercussão foi maior
do que de ordinário sucede, e, a capacidade econômica de ambos - pois a
indenização deve ser suficiente para amenizar a dor do ofendido e rígida a ponto
de punir o ofensor, mas, sem acarretar o enriquecimento ao ofendido e o
empobrecimento do ofensor. Por derradeiro, cabe levar em conta ainda, as
condições pessoais do ofendido, pois, como visto anteriormente, a repercussão
do dano varia muito de pessoa para pessoa.

Complementando o que foi esposado, Cianci68 entende


como causas de aumento e diminuição do valor indenizatório: a culpa
concorrente, a demora na propositura da ação, a intensidade do sofrimento e a
conduta do ofensor, o número de ofendidos, a Fazenda Pública no pólo passivo
ou ativo da demanda, entre outras genéricas que se encontram englobadas por
circunstâncias atinentes à situação em si, assim se manifestando:

Culpa concorrente – A culpa concorrente tem sido


reiteradamente reconhecida como causa de diminuição do valor
indenizatório. [...]

O atual Código Civil, art. 945, prevê que “se a vítima tiver
concorrido culposamente para o evento danoso, a sua
indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua
culpa em confronto com a do autor do dano”.

O texto consagrou a proporcionalidade na aferição da


responsabilidade, todavia sob o critério da culpa e não da
participação da vítima no evento danoso. [...]

68
CIANCI, Mirna. O valor da reparação moral. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 62/83.
55

De todo o modo, com a inovação, não se poderá mais pura e


simplesmente reduzir pela metade o quantum indenizatório, sem
consideração ao grau efetivo de participação do concorrente.

Demora na propositura da ação – A demora no ingresso em


juízo, de modo exagerado em proporção ao dano sofrido, se
apresenta na jurisprudência como fato capaz de impor redução
ao valor da condenação.

O Superior Tribunal de Justiça admitiu que não só a culpa


concorrente como a grande demora na propositura da ação
seriam mesmo causas de diminuição do valor indenizatório. [...]

Intensidade do sofrimento e conduta do ofensor – Esse o


mais importante critério na aferição do valor indenizatório e que
consagra o caráter exclusivamente compensatório do dano moral.
[...]

A se admitir esse parâmetro, restará ofensa ao princípio da


igualdade, porque qualquer pessoa, dentro do circulo social
próprio, seja ele grande ou pequeno, sente da mesma forma os
efeitos do dano à imagem. [...]

São critérios que de modo algum revelam a repercussão moral do


fato. Uma pessoa idônea, ainda que desprovida de fortuna ou de
importantes laços, certamente padece do mesmo sofrimento, não
se justificando, senão por conta de odiosa discriminação, a
diminuição ou majoração do arbitramento sob tais indicadores,
[...]

Não é também razoável a gradação do valor de acordo com a


culpa ou dolo do ofensor, já que a aferição, como antes
demonstrado, tem em conta a compensação da dor e não o grau
de culpa do causador do dano, a não ser por conta do caráter
punitivo, firmemente rechaçado nesta obra. [...]

Número de ofendidos – Questão de grande dificuldade diz


respeito ao número de pessoas atingidas pelo mesmo fato e
gradação e distribuição do valor indenizatório no círculo familiar.
56

O dano reflexo tem merecido sérias análises do Judiciário.


Importante julgado do II TACSP menciona que “o recebimento de
indenização pelo próprio acidentado exclui a possibilidade de que
sua mulher, ainda que atingida pela dor moral decorrente de ter o
marido ficado paraplégico, receber reparação autônoma. A
reparação concedida àquele não se estende as pessoas que
compõem o núcleo familiar, que participam, por elos afetivos, de
seu drama” (STJ – REsp 169.867-RJ, de 5-12-00 – Rel. Min.
César Asfor Rocha. No mesmo sentido: REsp 306.470-CE, de 7-
6-01 – Rel. Min. César Asfor Rocha.

Já em outro julgado, agora, do STJ, foi reconhecido o dano moral


reflexo dos pais de menor vitimada por queimaduras em todo o
corpo, durante desastrada experiência cientifica escolar. (STJ –
REsp 297.007-RJ – Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar. [...]

Fazenda Pública – Outro aspecto que mercê consideração


reside na aferição do valor indenizatório quando seja parte o
Estado, considerado latu sensu. [...]

Não é, pois, desarrazoado o assento. Há inúmeras passagens no


Codex e em outros textos legais que revelam a preocupação do
legislador, como, e.g., no caso do § 4.º do art. 20 do CPC, que
exclui a Fazenda, na condenação, do limite mínimo na fixação
dos honorários advocatícios ou ainda nos casos em que dilata os
prazos, como os de contestação e dos recursos (art. 188), de
ineficácia da sentença sujeita a reexame necessário (art. 475 do
CPC) e de sujeição da execução ao rito dos arts. 730 do CPC e
100 da CF, do procedimento da execução fiscal (Lei 6.830/80), do
arresto independentemente de justificação judicial (art. 816, I, do
CPC) e da reintegração de posse (art. 928 do CPC), entre outras.

Tais garantias – e não privilégios -, convém ressaltar desde logo,


convivem harmoniosamente com o princípio da isonomia
constitucionalmente consagrado no art. 5.º, caput e inciso I, da
Magna Carta, devendo ser levada em conta essa posição na
fixação moderada da indenização devida pelo Estado.

A autora professa a respeito das causas de aumento e


diminuição do quantum indenizatório, insurgindo-se acerca da culpa concorrente,
57

ao argumento de que uma vez que o ofendido tenha contribuído para o


acontecimento da lesão, há que assumir a sua parcela de culpa.

Pondera a autora, também, acerca da demora na


propositura da ação reparatória, relevando que o longo tempo decorrido entre o
evento danoso e o ajuizamento da ação, levam a crer que o ofendido não
necessita tanto da reparação.

Prossegue a doutrinadora, manifestando-se a respeito da


intensidade do sofrimento e conduta do ofensor. Acerca da intensidade do
sofrimento, o entendimento adotado pelo doutrinador Antonio J. Santos, encontra
maior eco no posicionamento ostentado pela doutrina em geral, pois, na acepção
de Mirna Cianci, a representatividade do ofendido para a sociedade, não deve ser
levada em consideração na fase de fixação do “quantum” indenizatório. A maioria
da doutrina, de outro lado, defende o posicionamento de que a conduta do
ofensor, deve ser posta de lado na fase de fixação da indenização, porquanto a
mesma já foi reprovável o suficiente para ensejar um dano passível de reparação.

Na seqüência, a autora discorre acerca do número de


pessoas atingidas pelo mesmo evento, ou seja, “dano moral reflexo” ou “dano em
ricochete”, relevando, nesse particular, que além do ofendido direto pelo dano há
mais pessoas vitimadas em decorrência deste. Severo69, complementa,
elucidando que:

O dano por ricochete consiste na repercussão de um dano sofrido


por outra pessoa. Em outras palavras, o dano por ricochete é
aquele que tem por fato gerador a lesão ao interesse de uma
terceira pessoa; é uma conseqüência do evento danoso. Trata-se
aqui, também, de um interesse próprio. Este dano pode ser tanto
patrimonial como extrapatrimonial. [...]

69
SEVERO, Sérgio. Os danos extrapatrimoniais. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 22/26.
58

Há fortes resistências à reparação do préjudice d’affection. Muitos


consideram-no como a comercialização da dor, uma indignidade,
pois o sofrimento e o desgosto não podem gerar benefícios.
Trata-se, neste caso, de uma variante do pretium doloris ou dano
moral stricto sensu, reparável a despeito destas resistências, com
se observará oportunamente. [...]

Um dos pontos fundamentais em se tratando de dano por


ricochete é a análise das pessoas habilitadas. [...]

Os familiares próximos da vítima direta gozam do privilégio da


presunção – juris tantum – de que sofreram um dano em função
da morte do parente, mas, se a vítima direta sobreviver, devem
comprovar que a situação é realmente grave e que, em função da
convivência com a vítima, há um curso causal suficientemente
previsível no sentido de que o dano efetivar-se-á.

Portanto, o dano por ricochete, em caso de morte, deve ser


presumido em favor dos familiares, estando sujeito à
comprovação quando pleiteado por terceiros, ao passo que, em
caso de sobrevivência, deve-se comprová-lo em qualquer
hipótese.

Neste diapasão, realçam os doutrinadores que o magistrado


que se deparar com situação congênere, deverá se ater à extensão do ato lesivo,
majorando, assim, o quantum indenizatório e, acrescendo ao montante inicial,
quantia destinada à reparabilidade do abalo moral sofrido pelo ofendido indireto.

Louzada70 , por seu turno, relaciona em sua obra critérios


matemáticos para apuração do dano moral, patenteando que o magistrado na
fase de mensuração precisaria apenas se valer de uma fórmula matemática para
encontrar o resultado/”quantum” indenizatório. Frisando-se, aqui, que a aplicação
de tal fórmula, destina-se à situações específicas, onde o magistrado já parte de
um “quantum” pré-fixado para, então, adaptá-lo ao caso concreto, aclarando o
autor nesse ínterim que:

70
BERNARDO, Wesley de Oliveira Louzada. Dano moral: critérios de fixação de valor. p. 119/131.
59

Dentre os critérios matemáticos identificados, podemos destacar


três, que serão objeto de estudo individualizado: A) O que vincula
o valor do dano moral à pena criminal; B) o que vincula
diretamente o dano moral aos danos materiais; C) O que vincula,
em caso de protesto indevido de título, o dano moral ao valor do
título abusivamente protestado. [...]

4.1.1. Da pena criminal

Na defesa deste critério, tornou-se célere o parecer emitido por


Galeno Lacerda, em resposta a consulta de advogado gaúcho
sobre o limite da indenização por dano moral em caso específico
de demissão de funcionário de um banco multifuncional, por
motivo de ser trabalhador portador do vírus HIV.

O critério é ali descrito: “Então, o máximo da pena de multa que,


em tese, poder-se-ia, no sistema atual do CP, atribuir a qualquer
delito, inclusive calúnia ou injúria, paradigmas da lei civil (art.
1.547) é de 5.400 salários mínimos, valor que se obtém seguindo
o roteiro legal, senão vejamos: O art. 49 do CP diz que a multa
máxima corresponderá a 360 dias-multa. O valor máximo do dia-
multa, diz o par. 1.º daquele artigo, é cinco salários mínimos.
Então, 360 X 5 = 1.800 salários mínimos. Mas o art. 60, par. 1.º
do mesmo CP salienta que “a multa pode ser aumentada até o
triplo se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica
do réu, é ineficaz, embora aplicada ao máximo. Então, a multa
máxima do Código Penal para qualquer delito, inclusive a injúria e
a calúnia, repita-se é de 5.400 salários mínimos. E como o art.
1.54, parágrafo único do Código Civil, prevê o dobro da pena
pecuniária criminal, chega-se a um total máximo, no cível, de
10.800 salários mínimos.” [...]

Com efeito, a reforma do Código Penal, operada pela Lei n.


7.209/84, ao modificar o critério da pena pecuniária,
anteriormente estabelecida individualmente para cada delito e em
valores pequenos, incompatibilizou a Lei Penal com o citado
dispositivo do Código Civil, pois, agora, os valores-limotes
altíssimos poderiam ser aplicados a quase todos os crimes. [...]

E, nem se argumente que com a edição do Novo Código Civil (Lei


10.406/2002) o debate foi encerrado, tendo em vista que o artigo
60

953, substituto do revogado artigo 1547, ainda que tenha


excluído a vinculação à pena criminal, atribuindo a indenização
ao arbitramento judicial, somente reforça nossa tese. Senão
vejamos:

“Art. 953. A indenização por injúria, difamação ou calúnia


consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido.

Parágrafo único. Se o ofendido não puder provar o prejuízo


material, caberá ao juiz fixar, eqüitativamente, o valor da
indenização, na conformidade das circunstâncias do caso.” [...]

Conclui-se que tal critério deve ser abandonado valendo, apenas,


como ilustração histórica de busca de objetivação dos
paradigmas utilizados na fixação do quantum debeatur em sede
de reparação de dano moral.

4.1.2 Múltiplos do dano material

Outro critério verificado ainda que esporádica a sua verificação, é


aquele que estabelece um vínculo direto entre a reparação dos
danos morais e aquela de danos materiais.

Aqui, verifica-se o valor do negócio jurídico celebrado entre as


partes e, via de conseqüência, o efetivo prejuízo material
suportado pelo lesado, extraindo-se, daí, o valor da condenação
por dano morais, que, nos acórdãos pesquisados, variou entre a
metade e dez vez o valor dos danos patrimoniais. [...]

Subordina-lo a existência e ao montante dos danos materiais


parece-nos despropositado, pois consiste, em última análise, em
vincular um instituto que encontra fundamento nos direitos e
garantias fundamentais e, mais, nos objetivos da Republica (art.
1º., inc. III), a valores meramente negociais, patrimoniais, o que
importa claro retrocesso no processo evolutivo da
responsabilidade civil por dano moral, conforme aqui narrado.

Felizmente, as decisões neste sentido são em pequeno número e


entendemos que tendem a desaparecer à medida que avancem
61

os estudos sobre o dano moral e sua natureza de proteção da


pessoa humana e busca da igualdade material e da solidariedade
social constitucionalmente previstas.

4.1.3 Protesto de títulos: múltiplos do valor do título

Em casos de protesto indevido de título capaz de gerar as vítimas


as conseqüências desagradáveis daí advindas, notadamente ter
seu nome inscrito em bancos de dados reativos a maus
pagadores (SPC, SERASA), o que ocasiona restrições ao crédito
no comércio e a operações bancárias, verifica-se a fixação da
indenização por danos morais em montante correspondente a um
múltiplo do valor do título protestado.

Inaceitável a adoção deste critério, tendo em vista que há, aqui


uma nítida vinculação entre o dano moral e os dano materiais,
capaz de gerar, na pratica, situações de profunda injustiça. [...]

Adotado esse critério, a indenização por dano moral assumiria


um caráter de verdadeira loteria: quem der sorte de ter um título
de alto valor protestado será indenizado em quantia vultosa,
independentemente dos danos experimentados; quem, do
contrário, der o azar de ter indevidamente protestado um título de
baixo valor, receberá indenização pífia, irrisória, incapaz de
compensar os padecimentos ocasionados. [...]

Assim, entendemos que o critério de vinculação da indenização


ao valor do título protestado deve ser abandonado, eis que
infundado e aleatório, bem como potencial causador de
injustiças.”

Importante ressaltar que, dos três critérios apresentados, o


primeiro, no tocante a pena criminal, caiu por terra desde a vigência do Código
Civil de 2002, o qual entrou em vigor em 11 de fevereiro de 2003, uma vez que
revogou o artigo que lhe emprestava fundamento, ou seja, o art. 1.547 do Código
Civil de 1916.
62

No que tange aos demais, ambos se vinculam a ocorrência


do dano material, porquanto como asseverado por Louzada, carecem de
fundamento, já que a aplicação de um instituto que encontra respaldo em norma
constitucional, não pode ficar condicionada a ocorrência de outro.

A evolução do instituto do dano moral e, os aspectos dele


derivados, no âmbito doutrinário e jurisprudencial, levam a crer que os julgadores
se desapegarão, pouco a pouco, dos critérios hoje utilizados e, sopesarão cada
vez mais, as circunstâncias particulares que cercam cada caso, agindo,
paulatinamente, dentro dos critérios da proporcionalidade e razoabilidade, que
são as vertentes da fixação do “quantum” indenizatório.

Feitas essas ponderações, passa-se à análise dos critérios


utilizados pelos magistrados da Comarca de Balneário Camboriú.

2.3 CRITÉRIO PARA A FIXAÇÃO DO “QUAUNTUM” INDENIZATÓRIO


UTILIZADO PELOS MAGISTRADOS DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ – SC

O presente tópico foi desenvolvido, com amparo na


experiência vivenciada pelos magistrados da 1ª, 2ª e 3ª Varas Cíveis da Comarca
de Balneário Camboriú, os quais utilizam um critério próprio na fixação do
“quantum” indenizatório, critério esse, que se subdivide em três fases, ais quais
serão objeto de análise, na seqüência.

A primeira fase, intitulada como “patamar”, consiste na


observância do tabelamento implícito das indenizações, ditadas pelos órgãos
fracionários ao julgarem os apelos e, construírem o posicionamento
jurisprudencial. Assim, ao receber um processo para julgamento, os magistrados,
inicialmente, empreendem uma pesquisa junto às decisões das cortes superiores,
ao intento de conhecer os valores usualmente fixados nos casos paradigmas.
63

A segunda fase, por sua vez, intitula-se como fase de


contextualização –, os magistrados observam aquelas circunstâncias gerais –
excluído o “critério de eqüidade e das circunstâncias particulares”, pois, este terá
espaço individualizado na terceira fase – elencadas por Antonio J. Santos, tais
como a atual situação econômica do país, a segurança jurídica que transcende
do pleito em análise, a unicidade das decisões acerca do tema, entre outras,
localizando a lesão sofrida no “tempo e no espaço”, observando os magistrados,
ainda, se aquele montante inicial condiz com a atualidade, ou seja, se está
defasado ou superfaturado.

A terceira fase, denomina-se individualizadora – nesta


fase, já que evidenciado um patamar inicial e localizado o abalo moral no tempo e
no espaço, os magistrados passarão a aplicar algumas daquelas circunstâncias
particulares conjugadas com as “causas de aumento e diminuição do valor
indenizatório” apresentadas por Mirna Cianci. Salienta-se que esta última fase é
de suma importância, porquanto é dentro da sua órbita de análise, que se
conhece o valor do “quantum” indenizatório.

Os magistrados, utilizam, então, o seguinte esboço:

1.ª) fase patamar – pesquisa jurisprudencial evidenciando o


montante que vem sendo fixado para determinada situação.

2.ª) fase de contextualização – Contextualizar a lesão


moral, analisando os seguintes pressupostos: 1 – A incomensurabilidade do dano
moral; 2 – Um piso flexível; 3 – Um teto prudente; 4 – Analisar o contexto
econômico do País; 5 – Provas amealhadas aos autos; 6 –Necessidade de
Consenso; 7 – Segurança Jurídica; e 8 – Coerência das decisões.

3.ª) fase individualizadora – Analisar as circunstâncias


particulares do caso, seguidamente das “causas de aumento e diminuição do
valor indenizatório”, na seguinte ordem: 1 – Condições pessoais do ofendido; 2 –
64

Capacidade econômica do ofendido e ofensor; 3 – Intensidade e duração do


sofrimento; 4 – Se houve ou não culpa concorrente; 5 – Número de Ofendidos, se
houve o dano reflexo ou dano em ricochete; e para casos mais específicos 6 – Se
há ou não a figuração da Fazenda Pública.

Assim, demonstrado o critério utilizado pelos magistrados


que presidem a 1ª, 2ª e 3ª Varas Cíveis da Comarca de Balneário Camboriú,
passa-se ao terceiro e último capítulo desse trabalho de conclusão de curso que,
abordará algumas questões controvertidas que envolvem o instituto do dano
moral.
65

CAPÍTULO 3

QUESTÕES CONTROVERTIDAS ACERCA DO DANO MORAL

3.1 FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO PELO SISTEMA TARIFÁRIO

Passaremos neste momento a tratar do sistema tarifário,


que não foi recepcionado com bons olhos pela doutrina brasileira e, tampouco é
utilizado pelos julgadores singulares e cortes superiores.

Acaso a aplicação desse sistema tarifário, houvesse


encontrado eco no ordenamento jurídico vigente, os magistrados passariam a
utilizar uma tabela similar a abaixo transcrita, ao julgarem os pedidos de
indenização por dano moral:

Tabelas com valor indenizatório da dor moral nos seguintes caso:

Inscrição indevida no cadastro dos 100 salários mínimos.


maus pagadores

Perda de um dos dedos da mão 50 salários mínimos.

Perda de um membro. 100 salários mínimos.

Mordida de cachorro. 75 salários mínimos.

Exposição à uma situação vexatória na 150 salários mínimos.


presença de menos de 50 pessoas.

Exposição à uma situação vexatória na 275 salários mínimos.


presença de mais de 50 pessoas.
66

Rui Stoco71 defende, em sua obra, os benefícios que a


aplicação desse sistema traria:

Onde a legislação já estabelece os sistema tarifado, nenhuma


dificuldade remanesce, bastando que arbitre o valor da
indenização, dentro das margens ou limites estabelecidos e
segundo as circunstâncias do caso concreto, levando-se em
consideração os pressupostos necessários para o encontro do
valor consentâneo.

Porém, na contra mão do por ele asseverado, Antonio


72
Jeová Santos pondera que, “durante muito tempo, os tribunais brasileiros
utilizaram-se da Lei de Imprensa e do Código Brasileiro de Telecomunicações
para avaliar o dano moral. Chegaram ao paradoxismo de aplicar aqueles
diplomas até em casos que não versavam sobre Imprensa e Telecomunicações.
O disparato tornou-se tão evidente que, pouco a pouco, os pretórios já não
elegem a tarifa vista naquelas lei para encontrar-se a indenização do dano moral”.

Prossegue o mesmo autor73:

Vista a dificuldade em mensurar o dano moral, e diante da


insuficiência do prudente arbítrio do juiz, poder-se-ia imaginar que
a quantificação do dano moral estaria resolvida se o legislador
fizesse colocar em qualquer diploma legal, que tratasse de
indenização por dano moral, o “quantum” a ser indenizado
quando ocorresse violação a qualquer direito à pessoa.

Diante da disparidade de julgados que fixam importâncias


deferentes em casos assemelhados, o que levou Mosset
Iturraspe a considerar que é escandaloso que em situações
semelhantes (embora nunca iguais) sejam tratadas e valoradas
pelos Tribunais em forma bastante diferente, e a falta de certeza
oriunda da falta de critério fixo, o que induz a que os valores

71
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 1714.
72
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. p. 165/166.
73
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. p. 166.
67

segurança e certeza no âmbito da indenização de dano moral,


não passem de uma lépida brisa de verão, há quem propugne
pelo tarifamento, achando que terá fim a anarquia jursiprudencial
vista neste ponto. [...]

Tarifar vem a ser a fixação rígida, em lei, de um piso mínimo e de


um teto máximo para pagamento máximo de determinadas
infrações, de sorte que o juiz ficaria adstrito aqueles valores,
sempre que tivesse que fixar o montante de ressarcimento. O
tarifamento da indenização não é a melhor hipótese apresentável.
Simplesmente haveria a transferência do prudente arbítrio do juiz
que, ao menos, está diante de um caso concreto e reúne muito
mais condições para aferir quanto vale o desgaste emocional
causado por um dano, para o legislador que, disciplinando algo
para o futuro, tornariam iguais todos aqueles que viessem a
sofrer menoscabo espiritual. Qualquer um que padecesse algum
mal receberia sempre aquele valor que a lei estipulasse, sem
considerar a situação pessoal de cada vítima ou a qualidade da
ofensa e do ofensor.

Rui Stoco74, por sua vez, assevera que:

Nas hipóteses de ofensa a moral, em que não haja previsão na


legislação infraconstitucional, caberá ao julgador valer-se da
equidade, enquanto busca do justo, na consideração de que ela
está no próprio Direito e não fora dele (Agostinho Alvim, “Da
eqüidade”, RT 132/3), e da analogia, para a fixação objetiva de
um valor. [...]

Em razão disso hipóteses há em que inexistem previsão legal


específica, senão e somente a garantia constitucional que, se
vale por si mesma para assegurar o direito, não soluciona a
questão do quantum da indenização, que atuará como a
materialização do direito declarado.

Acerca do tabelamento do “quantum” indenizatório tem se


manifestado Wesley de O. L. Bernardo75:

74
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 1714.
68

Parece óbvio. O que poderia gerar mais segurança jurídica na


sociedade do que uma tabela, semelhante a tabela periódica dos
elementos químicos que fomos obrigados a decorar quando no
ensino médio (e que diga-se de passagem, por toa a vida não
nos serviu nem servirá de nada)?

Para cada espécie de dano moral um valor mínimo e máximo,


aos quais o juiz estaria limitado ao proferir a sentença e que
possibilitaria a qualquer pessoa do povo, de antemão, ter ciência
de suas possibilidades de êxito quando do ajuizamento da ação
indenizatória.

Seria,diga-se de passagem, o nirvana dos magistrados,


livres,agora, de uma das mais árduas tarefas de sua profissão,
qual seja, a fixação da reparação de danos morais.

O primeiro entrave é o risco do estabelecimento de valores


ínfimos ou muito baixos, que não reparem os danos causados ou
mesmo sirvam de um estimulo ao cometimento de novos danos.
[...]

Outro ponto que lhe é contrário é a possibilidade de redução de


todos os sofrimentos humanos em standards homogêneos, o que
se mostra prima facie, inviável.[...]

Outro problema está na limitação do legislador. Como é sabido, o


legislador positiva fatos sociais já existentes. A lei anda a
reboque do fato social. Desta forma impossível será ao legislador
a fixação de valores mínimo e máximo para toda e qualquer
situação de dano, notadamente, porque, como antes afirmado, os
direitos e garantias individuais são atípicos e porque impossível
prever situações futuras.

Nessa ordem de idéias, conclui a maior parte da doutrina


que a utilização do sistema tarifário consiste em um retrocesso, cabendo ao
julgador, portanto, atento as particularidades de cada caso, fixar o “quantum” que
melhor se coaduna com a hipótese telada e o agravo sofrido.

75
BERNARDO, Wesley de Oliveira Louzada. Dano moral: critérios de fixação de valor. p. 132/134.
69

A título de curiosidade, esclarece-se que tramitam no


Congresso Nacional, vários projetos de Leis visando a regulamentação da fixação
do “quantum” indenizatório, destacando-se aqui, o que levou o número 150/99,
que já possui parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça do Senado
Federal.

Feita essa breve explanação acerca do sistema tarifário,


passa-se à análise do agravo moral infligido à pessoa jurídica.

3.2 DANO MORAL À PESSOA JURÍDICA

Quando se fala em dano moral, logo vem à cabeça a figura


de um indivíduo que passou por uma situação vexatória, porquanto a concepção
“stricto sensu”, é a mais difundida.

Por esta razão, estranha-se quando ouvimos falar que uma


determinada empresa sofreu abalo moral. Contudo, é consabido que as pessoas
jurídicas dispõe de uma reputação frente àqueles que delas se utilizam e, por este
motivo, revestem-se de legitimidade à perseguição de justa reparação pelo abalo
moral eventualmente sofrido.

Não há no ordenamento jurídico vigente, previsão legal para


a pessoa jurídica pleitear a reparação do dano que sofreu mas sim, uma
ampliação dos dispositivos já existentes em função da edição da Súmula 227 do
Superior Tribunal de Justiça, “in verbis”:

“A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”


70

Acerca da ampliação do dano moral às pessoas jurídicas


em razão da edição da súmula acima transcrita, Antonio Jeová dos Santos76 tem
se posicionado da seguinte forma:

[...] sob a inspiração de que a honra objetiva da pessoa jurídica


sempre pode ser objeto de ataques por que a proteção dos
atributos morais da personalidade não é apanágio das pessoas
físicas, mas, igualmente das pessoas ditas como de existência
ideal, é que estas últimas estão sujeitas a padecimentos de
ordem moral. Não é porque a pessoa jurídica seja despida de
emoções e sentimentos, como é curial, que fica desprovida de
reputação, da honra objetiva que se abalada, pode trazer-lhes
conseqüências deletérias. A reputação que pode, seja boa ou
má, é que faz movimentar seus negócios. Qualquer abalo tem
repercussão imediata no giro de suas atividades. Porém mesmo
que o agravado não atinja diretamente o seu patrimônio, pode
afetar o bom nome, a fama que ela goze na órbita civil ou
comercial em que se situa. Quando a ofensa causa diminuição ao
respeito público, a pessoa jurídica fica sujeita a abalo quando
algum mal lhe é irrogado.

Tomando posição cimeira nos ordenamentos jurídicos que ainda


vêem a pessoa jurídica não dotada de subjetividade, de anima e
que, portanto, não pode ter perturbação, posição que não se
coaduna com os meios de ataques ao bom nome destas pessoas
é que, em boa hora, o Superior Tribunal de Justiça, colocou uma
pá de cal sobre o assunto, ao editar a Súmula 227 [...].

Divergindo do posicionamento de Antonio J. dos Santos,


Santos Cifuentes77 assim se manifesta:

O eu sujeito que se reflete, pensa raciocina. O eu sujeito-objeto,


sou eu mesmo que me percebo e reflito sobre o que sou. Esta
trilogia de pontos vista sobre o eu, recordava Cipriano, mostra
uma realidade que, verdadeiramente, não torna possível, em
princípio admitir que uma pessoa ideal ou jurídica seja um eu
sujeito. Refletir, raciocina, perceber, sentir, é próprio do homem-
76
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. p. 135.
77
CIFUENTES, Santos. Derecho de daños. Primeira parte. Buenos Aires: La Rocca, 1996. p. 393.
71

pessoa: é próprio de órgãos psicofísicos. Daí que o dano moral


como detrimento ao bem do homem-pessoa em seu conceito
extrapatrimonial, se aproxima muito mais á verdade. Sem
embargo, não é dado compartilhar drasticamente a tese positiva
absoluta nem a tese negativa absoluta. A questão tem outro
rumo. É aceitável advertir algum caso de pessoas ideais que
desfrutem de algum dos bens personalíssimos passíveis de
serem prejudicados, enquanto tais. Nenhuma resposta dogmática
nos conforma, quando, por alguma greta, a realidade revela
variações dignas de serem atendidas.

Assim, verifica-se que a doutrina é mista em seu


posicionamento, porquanto alguns doutrinadores entendem que a pessoa jurídica
sujeita-se à ofensa moral e, outros defendem posição em contrário, como explicita
o próprio Antonio J. dos Santos78, vejamos:

No direito brasileiro, a profunda e oxigenadora interpretação feita


pelos Tribunais, aponta para a indenização das pessoas jurídicas
sempre que existir abalo em seu bom nome. Os arestos
identificam o dano como sendo moral. Porém, em sincronia com
o que vem sendo aqui defendido, em havendo ofensa ao bom
nome ou abalo no crédito de qualquer sociedade comercial, o
dano pode ser patrimonial mas, também moral.

Bosquejando a jurisprudência pátria, não é encontrado


entendimento de que a pessoa jurídica deixe de padecer dano
moral. Parcela pequena de câmaras civis, ao rejeitar a
possibilidade de a pessoa jurídica padecer dano moral, reúne um
aspecto interessante ao exigir prova do prejuízo para que exista,
realmente, a lesão extrapatrimonial.

Os Tribunais pátrios têm decidido:

CIVIL - DANO MORAL - PESSOA JURÍDICA - POSSIBILIDADE


- OFENSA À HONRA OBJETIVA - CARACTERIZAÇÃO -
FINALIDADE DA REPARAÇÃO - RECURSO IMPROVIDO - I- A
pessoa jurídica é portadora de honra objetiva, a qual

78
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. p. 141.
72

compreende o julgamento que terceiros fazem a seu respeito


e, em assim sendo, a ofensa à sua honra objetiva é passível
de reparação (Súmula nº 227 do egrégio Superior Tribunal de
Justiça). II- Caracterizado o dano, emerge o dever de indenizar,
o qual encontra respaldo no art. 186 do Código Civil e no art. 5º,
X, da Constituição da República. III- Na fixação do quantum da
indenização há que ser observada a dupla finalidade da
reparação, qual seja, punir o infrator, elidindo a reiteração de
condutas de tal invergadura e compensar o lesado. (TJ – DF,
A.C. n.º 2002.01.1037387-6, 1ª Turma Cível, Rel. Des. Nívio
Gonçalves, DJU 09.08.2005 - p. 94)

RESPONSABILIDADE CIVIL – DANO MORAL – PESSOA


JURÍDICA – INSCRIÇÃO INDEVIDA NOS ÓRGÃOS
CONTROLADORES DO CRÉDITO – OBRIGAÇÃO DE
INDENIZAR CARACTERIZADA – CRITÉRIOS PARA A
FIXAÇÃO DA VERBA INDENIZATÓRIA – RAZOABILIDADE –
Configura dano moral a inscrição do nome do devedor nos
bancos de dados dos órgãos controladores do crédito
quando quitada a dívida, independentemente de
comprovação do prejuízo material sofrido pela pessoa
indigitada ou da prova objetiva do abalo à sua honra e à sua
reputação, porquanto são presumidas as conseqüências
danosas resultantes desse fato. o valor da indenização do
dano moral deve ser arbitrado pelo juiz de maneira a servir, por
um lado, de lenitivo para a dor psíquica sofrida pelo lesado, sem
importar a ele enriquecimento sem causa ou estímulo ao abalo
suportado; e, por outro, deve desempenhar uma função
pedagógica e uma séria reprimenda ao ofensor, a fim de evitar a
recidiva. (TJ – SC, A.C. n.º 2004.023590-9, 2ª Câmara Cível,
Des. Luiz Carlos Freyesleben, julgado em 16.06.2005 - grifei).

Exaurida a matéria, objeto desse tópico, passa-se à uma


breve explanação, acerca da industrialização do dano moral.

3.3 INDUSTRIALIZAÇÃO DO DANO MORAL

Atualmente o Judiciário está repleto de ações de


indenizações por danos morais, haja vista a abrangência de tal pleito. Porém,
73

cresce a tendência de se coibir a atuação daqueles que litigam ao intento de obter


lucro fácil e, locupletamento ilícito.

A indenização pelo dano moral tem caráter dúplice, um


ressarcitório que visa a satisfação/compensação da vítima pelos danos sofridos e,
outro punitivo que visa desestimular o ofensor à pratica de um novo ato lesivo,
explicando doutrinado Antonio J. Santos79, nesse particular, que:

É sobremaneira discutida a natureza jurídica da indenização da


indenização por dano moral. Se ressarcitória, em que a
indenização serve apenas como satisfação do dano padecido
pela vítima, ou se é punitiva, considerando que não deve ficar
sem receber alguma reprimenda para lembrar-se de que não
deverá, nunca mais, causar dano a outrem. [...]

A reparação do dano moral é vista pela vítima como ressarcitória


e sob o enfoque do autor do ato ilícito, como uma sanção. Por
isso, afastamento de qualquer dogma que aprisione em camisa-
de-força critérios apriorísticos que parecem puros. Daí o caráter
dúplice que deve revestir a reparação do dano moral.

Alguns autores defendem a tese de que o extermínio da


indústria do dano moral está intimamente ligado à comprovação da extensão da
lesão sofrida, como esclarece Mário G. Junior80 em seu artigo:

[...] que advoga a indispensabilidade da prova da angústia,


sustenta que, como todo fato, é possível provar os efeitos do ato
ilícito (e seu nexo), para tanto devendo-se levar em conta não
apenas os sintomas característicos da aflição humana, mas
também a personalidade da própria vítima. Isto porque uma
mesma lesão pode gerar sofrimento ou não, dependendo da
vítima, assim como diferentes graus de intensidade de

79
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. p. 156/157 - 164.
80
GONÇALVES JÚNIOR, Mário. Prova do sofrimento: antídoto contra a industrialização dos danos
morais. Disponível na Internet: <http://estudandoodireito.blogspot.com/2006/03/prova-do-sofrimento-anto-
dos-danos.html>. Acesso em 04/08/2006.
74

sofrimento, o que serviria de parâmetro para o arbitramento de


justa indenização.

CALMON DE PASSOS é um excelente representante desta


segunda corrente. Em artigo intitulado O imoral nas indenizações
por dano moral (www.jusnavegandi.com.br), o renomado autor
ressalta o quão manipuláveis (no pior sentido) podem ser os
sentimentos em pedidos milionários de indenizações por danos
morais: “(...) Nada mais suscetível de subjetivar-se que a dor,
nem nada mais fácil de ser objeto de mistificação. Assim como já
existiram carpideiras que choravam a dor dos que eram
incapazes de chorá-la, porque não a experimentavam, também
nos tornamos extremamente hábeis em nos fazermos carpideiras
de nós mesmos, chorando, para o espetáculo diante dos outros,
a dor que em verdade não experimentamos. A possibilidade,
inclusive, de retirarmos proveitos financeiros dessa nossa dor
oculta, fez-nos atores excepcionais e meliantes extremamente
hábeis, quer como vítimas, quer como advogados ou
magistrados. (...) Se o filho é vitimado, o pai é premiado com uma
indenização, sem se cogitar das verdadeiras relações afetivas
que existiam entre este reprodutor, chamado de pai, e o fruto de
sua ejaculação. Antes, quanto menos dor realmente ele
experimenta, tanto maior é a sua dor oculta para fins de
indenização. Não se indaga se aquele que se enche de furor
ético porque teve recusado um cheque de sua emissão teve, por
força disso, forte abalo emocional, ou é simplesmente um
navegador esperto no mar de permissividades e tolerância que
apelidamos de ousadia empreendedora. Quando a moralidade é
posta debaixo do tapete, esse lixo pode ser trazido para fora no
momento em que bem nos convier. (...)”.

Rui Stoco81, em sua obra, faz um alerta sobre este


fenômeno, trazendo como exemplo, a atual realidade dos Estados Unidos da
América, “in verbis”:

Há neste momento, um sério risco de o Brasil atingir o nefando


status a que chegaram os Estados Unidos da América, onde a
todo e qualquer produto contém em sua embalagem advertências

81
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 1704.
75

(warning) de toda a ordem, visando prevenir possíveis ações


judiciais, que certamente virão.

Nesse país o exagero nas pretensões de quem pede –


particulares ou consumidores – e a perda do senso de equilíbrio e
de eqüidade em que devem nortear e orientar (na fixação do
valor do dano) aquele a quem se pede, contribuíram
decisivamente para estabelecer verdadeira “industria” das
indenizações.

Feitas as explanações acima, observemos alguns


exemplificativos de casos absurdos que foram levados ao conhecimento do Poder
Judiciário, primeiramente dois casos que se sucederam nos Estados Unidos da
América, conforme nos apresenta Moreira e Correia82:

A título de exemplo do que ocorre no EUA, em que o instituto dos


punitive damages já vem sendo criticado em virtude de casos
absurdos, vale citar dois casos famosos ocorridos por lá: 1) Stella
Liebeck v. McDonalds: Neste caso, que ficou nacionalmente
famoso, Stella Liebeck, uma mulher idosa, derramou café após
ter colocado o copo entre suas pernas e tentar retirar a tampa
plástica enquanto dirigia. Sofreu queimaduras de terceiro-grau
em seus pés, virilha e nádegas. Sustentou que seus ferimentos
deram-se por falha do McDonalds, porque serviram o café mais
quente do que outros lugares. Um júri concedeu à Stella Liebeck
U$2,9 milhões. 2) Diana Du Bois v. Edifício 53 East 75th Street: A
autora residia em um apartamento alugado no quarto andar de
um edifício em que sete unidades estavam sendo reformadas. A
autora alegou que o réu (proprietário) fez com que tivesse a
aflição emocional por ser incapaz de viver normalmente em sua
própria casa. O réu argumentou que os problemas, tais como o
ruído e a poeira, eram conseqüências inevitáveis da construção
em outros apartamentos no edifício, que estavam sendo
reformados. O réu ofereceu U$50.000 e a devolução do
apartamento. A autora pediu ao júri U$930.000. O júri concedeu
U$700.000, dos quais U$200.000 eram compensatórios e
U$500.000 como punição ao réu.

82
MIL HOMENS, Fernado e CORREIA. A fixação do dano moral e a pena. Disponível na Internet:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5891&p=2>. Acesso em 04/08/2006.
76

Porém, não é só nos Estados Unidos da América que


acontecem tais absurdos, Eduardo Goldenber83 nos apresenta o caso a seguir
ocorrido na Comarca de Caxambu–MG:

[...] No carnaval de 1997, verificou-se em Caxambu, por iniciativa


da Prefeitura Municipal, um verdadeiro estupro cultural no que diz
respeito às tradições carnavalescas da cidade: não houve o
tradicional desfile das escolas de samba locais, modestas porém
autênticas, não houve o desfile dos blocos de sujos, não houve
qualquer baile de clube. Caxambu, infectado pela moda que
assola o país de norte a sul, decidiu instalar nos quatro dias de
folia um mastodonte elétrico na cidade que, em alto som, tocou o
famigerado "axé music" que tem razão de ser na Bahia, quando
muito no Nordeste. Visando apenas preservar a cultura da
cidade, remeti, logo após o Carnaval, uma carta para a Prefeitura
Municipal, aos cuidados do Prefeito, MARCUS NAGIB GADBEN,
com cópia para 10 órgãos representativos locais, como por
exemplo a Associação Comercial de Caxambu, a Câmara
Municipal, o Sindicato dos Hotéis e alguns outros. O que motivou
esta minha carta foi somente a indignação com o abandono das
tradições locais, a insatisfação generalizada que percebi nos
turistas e, principalmente, o crescimento vertiginoso de cenas de
violência durante os quatro dias de festa (assaltos, drogas,
brigas, etc.). Não foi possível dissociar uma coisa da outra, já que
nunca, antes, se verificou qualquer destes lamentáveis
fenômenos.
Ao contrário do que imaginava, minha carta não mereceu
qualquer apreciação por parte da Prefeitura local. O que houve,
apenas, foi um editorial publicado num jornal da cidade - ARTE 3
NOTÍCIAS -, um dos que recebera minha carta e que nitidamente
apóia o Prefeito, assinado pelo jornalista FERNANDO VICTOR,
em extremo tom de deboche, e uma resposta enviada para a
casa de MARIA FLORINDA BRAGA GOLDENBERG, minha mãe,
assinada pela Secretária de Cultura de Caxambu, VANESSA
LÍCIO PAGANELLI, na qual a mesma, em figura de antagonismo,
anexa uma carta elogiosa ao Carnaval remetida por uma cidadã
de Belo Horizonte, e me chama de "saudosista", enquanto
classifica de "progressista" a referida cidadã.
Até este momento, além da deselegância, nada demais.

83
GOLDENBERG. Eduardo. Um processo absurdo. Disponível na Internet:
<http://www.igutenberg.org/eduardo.html>. Acesso em 04/08/2006.
77

Imbuída do espírito de defesa inerente às mães, MARIA


GOLDENBERG fez remeter à Prefeitura Municipal de Caxambu,
com cópia para os mesmos 10 órgãos que receberam cópias de
minha carta, uma nova carta restabelecendo a verdade dos fatos
e criticando, veementemente, o modus operandi do Prefeito, do
Vice-Prefeito e da Secretária de Cultura, na condução do
Carnaval, na condução da resposta à minha carta e na condução
da política local. Ficamos depois sabendo - eu e minha mãe - que
um outro jornal local - JORNAL DAS ESTÂNCIAS - publicou, sem
autorização, tanto a minha carta quanto a sua. E ficamos
sabendo, também, que distribuiu-se na cidade, também sem
autorização, centenas de cópias de sua carta. Estava "forjada" a
publicidade!!!!! E vale dizer que, mesmo que fosse dada
publicidade à carta, nenhum problema isto teria, já que o envio de
cartas por parte de cidadãos criticando políticos e/ou pessoas de
vida pública é expediente usado diariamente centenas de vezes.
A barbaridade, a aberração, é que, em 28 de outubro de 1997, o
Prefeito - MARCUS NAGIB GADBEN -, o Vice-Prefeito -
MAURÍCIO GUEDES DE MELO - e a Secretária de Cultura -
VENESSA LÍCIO PAGANELLI - ingressaram na Vara Única da
Comarca de Caxambu com uma AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR
DANOS MORAIS, requerendo a quantia de R$150.000,00 (cento
e cinqüenta mil reais) a título de indenização, mais o custeio da
divulgação da eventual sentença condenatória na imprensa local
por 3 vezes e na rádio local uma vez por semana durante 3
meses!!!!!
Alegaram, os autores da referida ação, que sofreram dano moral,
abalo da honra, diminuição do bom conceito, prejuízos à imagem,
danos psíquicos e outras sandices inacreditáveis.

Os Tribunais brasileiros no intuito de coibir a proliferação de


ações infundadas e, conseqüentemente, a industrialização do dano moral, já têm
publicado inúmeros acórdãos entendendo que a lesão sofrida deve ser intensa o
suficiente para causar verdadeiro constrangimento ao ofendido, ou seja, um mero
desconforto ou dissabor não seriam passíveis de caracterizar o dano moral,
“verbis”:

DECLARATÓRIA. Inexistência de débito. Danos morais.


Indenização. Pleito acolhido integralmente. Apelo da
demandada. Débito, efetivamente, inexistente. Prejuízos morais.
78

Não caracterização. Reclamo em parte agasalhado. Recurso


adesivo. Valor indenizatório. Elevação. Insurgência
prejudicada. 1. Confirmada, pela própria administradora
consorcial demandada, a ausência de débito de reponsabilidade
da autora, admissível é o uso da ação declaratória para
reconhecer-se a inexistência desse débito, conferindo-se, com
isso, a certeza jurídica objetivada pela parte autora. 2. Meros
dissabores ou aborrecimentos não tipificam o dano moral,
pois este somente se caracteriza quando se estabelece uma
situação intensa e duradoura, capaz de levar à ruptura o
equilíbrio psicológico do lesado. Sob pena de banalizar-se o
dano moral, legitimando-se a propositura de ações
indenizatórias sustentadas em aborrecimentos apenas
triviais, há que se rejeitar, nessas hipóteses, a concessão da
verba ressarcitória pleiteada. É o que ocorre quando, como no
caso, a suposta ilegalidade residiu em telefonemas da acionada
pedindo à demandante o pagamento do débito, sem que seu bom
nome fosse arranhado, seja pela propositura de qualquer medida
de cobrança judicial ou extrajudicial, ou pela remessa de seu
nome para inclusão em cadastros negativadores do crédito. 3.
Não reconhecido, pelo Tribunal, o direito da postulante à
percepção de indenização por danos morais, resulta prejudicada
a insurgência por ela promovida objetivando a elevação da verba
reparatória arbitrada na instância singular. 4. Provido em parte
o apelo deduzido pela administradora consorcial demandada,
com o êxito da demandante fazendo-se, pois, apenas parcial, os
encargos sucumbenciais impõem-se readequados, passando a
incidir na base de 50% para cada um das contendoras. (TJ – SC,
A.C. n.º 2005.023804-4, Rel. Dês. Trindade dos Santos, julgado
em 22/09/2005 – grifei).

Dissecada a matéria que serviu de recheio a este tópico,


passa-se a uma breve explanação acerca da exacerbação nas pretensões
indenizatórias.

3.4 A EXACERBAÇÃO NAS PRETENSÕES INDENIZATÓRIAS

No tocante ao pleito indenizatório, tanto a doutrina quanto a


jurisprudência, têm entendido que esta quantia deve ser “certa” e “determinável”,
pois assim o magistrado já poderá ter uma idéia da extensão do dano e perquirir
79

acerca da eventual exacerbação do pleito, além de oportunizar ao réu à


apresentação de ampla defesa, o que não ocorre quando o pleito é genérico, em
conformidade com a lição de Antonio J. Santos84, “in verbis”:

A estipulação do valor da indenização, logo na petição inicial,


conserva o direito pleno de defesa do réu. É necessário que ele
conheça a exata extensão do pretendido pelo autor, em termos
econômicos, para não se ver impedido de questioná-lo da
maneira mais ampla possível, inclusive fazendo provas sobre o
exagero da quantia pleiteada.

Tem de haver correlação lógica entre o pedido inicial e a


sentença. Essa vinculação temática também se estende ao
pedido de indenização, pois o juiz não pode condenar o réu em
quantia superior a que foi pleiteada, nem ao pagamento de
qualquer soma em dinheiro, mas do que resulte da demanda e de
todas as provas nela contidas, [...].

O Superior Tribunal de Justiça vem fazendo o controle da


exacerbação das indenizações em sede recurso especial, conforme esclarece Rui
Stoco85 em sua obra:

O Colendo Superior Tribunal de Justiça – talvez preocupado com


essa exacerbação nas pretensões reparatórias a título de dano
moral – e, considerando, ainda, a fixação por alguns julgadores
de valores exagerados, evolui no sentido de fixar o quantum do
dano moral em sede recurso especial.

A esse respeito salientou Cássio M. C. Penteado Júnior, em


seu artigo publicado na Tribuna do Direito (junho de 1999), que
essa Corte vem se orientando no sentido do “controle do valor da
indenização, nas demandas por dano moral, tendo-a como uma
questão jurídica (conforme voto do Ministro Costa Leite no
Recurso Especial 53.321) passível, portanto, de apreciação em
grau de recurso especial, afastando eventuais conotações de

84
SANTOS JEOVÁ, Antonio. Dano moral indenizável. p. 495.
85
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil .p. 1704/1705.
80

conteúdo material ou de prova que, a teor da Súmula 7,


escapariam do âmbito do julgamento Colegiado”.

Infere-se, ainda, da mesma obra, comentários sobre a


realidade vivida atualmente pelo nosso país:

Em resumo, o Brasil corre o risco de o instituto da


responsabilidade civil por dano moral, tal como ocorre aliunde,
banalizar-se e desmoralizar-se, por força dos desvios de enfoque,
da ganância, das pretensões exageradas ou descabidas, do jogo
da esperteza, do desregramento específico e do abandono aos
princípios preceituados na nossa Carta Magna e na Lei de
Introdução ao Código Civil.

Passo certo no sentido poderá ser dado por nosso legislador se


aprovado o projeto de Lei 3.232/92 do Senado Federal (Diário do
Congresso Nacional de 27.10.1992, p. 23.383), enviado para
inclusão na ordem do dia do Plenário da Câmara dos Deputados
desde 14.08.1997, contendo disposições para a futura Lei de
Imprensa que, lamentavelmente, abandonou o atual sistema
tarifado da Lei 5.250/67 para abraçar o perigoso sistema “aberto”
para a fixação da indenização por dano moral.

Em breve resumo, o substantivo adotado pela Comissão de


Constituição e Justiça e de Redação (CCJR) para o referido
projeto de Lei, não traz qualquer limitação ou margens mínima e
máxima para o estabelecimento da indenização por dano moral.

Vejamos alguns acórdãos extraídos do nosso Egrégio


Tribunal de Justiça, em que houve insurgência acerca do valor indenizatório:

DANO MORAL. DEVOLUÇÃO INDEVIDA DE CHEQUES POR


INSUFICIÊNCIA DE FUNDOS. EXISTÊNCIA DE APLICAÇÃO
FINANCEIRA, COM CRÉDITO SUFICIENTE À COBERTURA
DOS TÍTULOS. PROCEDÊNCIA. QUANTUM INDENIZATÓRIO.
ARBITRAMENTO. VALOR EXCESSIVO, ENSEJANDO O
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DA OFENDIDA.
MINORAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL. (A. C. n.º 1999.005054-
8, Rel. Des. Cesar Abreu, julgado em 29/10/2001 – grifei)
81

APELAÇÃO CÍVEL - RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO


MORAL - DÉBITO INEXISTENTE - INSCRIÇÃO INJUSTA NO
SPC - DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO - FIXAÇÃO DO
QUANTUM INDENIZATÓRIO - DECISÃO QUE EXTRAPOLA
OS LIMITES DA RAZOABILIDADE - VALOR DETERMINADO
EM PRIMEIRO GRAU REDUZIDO PARA QUANTIA
EQUIVALENTE A 50 SALÁRIOS MÍNIMOS. 1. Em sede de
danos morais, a simples inscrição indevida ou irregular nos
órgãos de proteção ao crédito é fato gerador de
constrangimentos e transtornos na vida do inscrito, que tem seu
crédito negado, sendo impedido de realizar atos comerciais, ou
seja, provoca dano moral indenizável. 2. A indenização deve
ser fixada de modo a dar uma compensação ao lesado pela dor
por ele sofrida, não podendo, todavia, ser de maneira tal que lhe
pareça conveniente ou vantajoso o abalo suportado. RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO. (A.C. n.º 1999.010219-0, Rel. Des.
Mazoni Ferreira, julgado em 31/10/2002 - grifei)

Conforme elucidado anteriormente, são várias as questões


envolvendo o instituto do dano moral que provocam fervorosas discussões e,
como não é intuito do presente trabalho monográfico esgotar o tema, foram
tratadas, de forma perfunctória, as mais relevantes. Salienta-se que a confecção
do presente trabalho de conclusão de curso, dedicou especial atenção à
industrialização do dano moral e a exacerbação das pretensões indenizatórias
que, na opinião de grande parte dos doutrinadores e julgadores, acabam por
corroer a lisura do Poder Judiciário. Percebeu-se, então, a crescente tendência de
se coibir a proliferação desse tipo de demanda, através da prolação de decisões
que acabam por minorar as indenizações ou, até mesmo, desconhecer a
ocorrência do dano em situações que, causam ao indivíduo, os dissabores
normais do cotidiano, não merecendo as mesmas, portanto, a tutela do órgão
jurisdicional.
82

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a realização deste estudo Monográfico, impende


realizar algumas considerações a respeito do tema proposto.

É incontroversa a notória evolução que o instituto da


reparabilidade dos danos morais vem sofrendo em nosso país.

Com a promulgação da Constituição da República


Federativa do Brasil de 1988, a tese da plena reparabilidade dos danos morais,
em decorrência de sua elevação a garantia constitucional, consolidou-se
definitivamente em nosso estatuto legal. O art. 5º, incisos V e X da Carta Magna
contemplam ao cidadão “o direito à indenização pelo dano material ou moral
decorrente da sua violação”. Assim, além de garantir a inviolabilidade da vida
privada como direito fundamental, assegurou também o direito à indenização pelo
dano moral decorrente de sua violação.

Outrossim, é pacífico o entendimento de que os danos


morais são plenamente indenizáveis. Discute-se a questão da quantificação da
indenização por dano moral, ante a inexistência de qualquer critério legal que
balize o magistrado na sua decisão, no que diz respeito ao valor a ser indenizado.

Através da indenização por danos morais, não se está


evidenciando um “preço” pela dor sentida, mas apenas que se outorgue um meio
que atenue, em parte, as conseqüências do prejuízo, melhorando ou abrandando
a dor, ao propiciar alguma sensação de bem-estar, pois seria injusto deixar
impune o ofensor, frente as conseqüências surgidas em decorrência do abalo
moral.

O valor dos danos morais deve ser estabelecido com base


em parâmetros razoáveis, destacando-se que não pode ensejar um
locupletamento ilícito, nem mesmo ser irrisório ou simbólico. Assim, ao fixar o
83

“quantum” indenizatório, deve o magistrado levar em consideração as


circunstâncias de cada caso, e decidir com cautela sempre atendendo aos
princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

A reparação dos danos morais, não visa o locupletamento


do lesado, mas sim que se compense, ao menos em parte, o seu sofrimento,
tendo a reparação pecuniária a finalidade de proporcionar meios para que a
vítima amenize seu sofrimento.

Em resposta as hipóteses anteriormente apresentadas, foi


possível chegar as seguintes considerações.

No que tange ao papel do magistrado e, como ocorre no


arbitramento do “quantum debeatur”, verifica-se que a fixação fica ao prudente
arbítrio do julgador de acordo com o estabelecido em lei, e, nos casos de dano
moral não contemplado legalmente, a reparação correspondente será fixada por
arbitramento (art. 946 do Código Civil de 2002). Assim, o magistrado determina,
levando em conta as circunstâncias de cada caso, o “quantum” da indenização
devida, que deverá corresponder à lesão e de igual modo ser equivalente ao
abalo sofrido, atendendo ao caráter “punitivo e ressarcitório” a que deve se
prestar a indenização.

Já com relação à finalidade da indenização como atenuação


da dor, foi possível verificar que existem diversas posições doutrinárias no tocante
a reparação dos danos morais, mas todas convergindo na sua
incomensurabilidade, ao passo que a reparação deve propiciar ao lesado a mais
ampla compensação pelos sofrimentos e constrangimentos sofridos com a lesão
experimentada em decorrência do abalo moral.

Para que ocorra essa satisfação, e por conseqüência, uma


compensação, é necessária a presença constante dos princípios da razoabilidade
e proporcionalidade entre a lesão causada e a reparação imposta ao ofensor, por
84

esta razão são inúmeros os julgados que se utilizam destas máximas para
majorar ou minorar o montante indenizatório.

Em relação aos parâmetros utilizados para aferição da


indenização por danos morais, verifica-se que inexistem critérios cogentes para
nortear o magistrado nesta árdua tarefa, devendo o mesmo, orientar-se de acordo
com a jurisprudência e os critérios elencados pela doutrina.

Destaca-se finalmente que se encontra tramitando no


Senado Federal um projeto de lei que estabelece os parâmetros valorativos para
fixação do “quantum” indenizatório nas ações que envolvam o dano moral,
visando organizar o arbitramento judicial, frise-se, entretanto, que por se tratar de
projeto de lei, ainda não sancionado, razão pela qual, não foi abordado nesta
pesquisa.

Finalizando, acredito que tenha sido cumprida, não só a


meta institucional, qual seja, a produção do presente trabalho monográfico como
requisito para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do
Vale do Itajaí – UNIVALI, mas também a meta pessoal do subscritor da presente,
sendo esta, investigatória, buscando, através da pesquisa bibliográfica dissecar, o
presente tema, no intuito de contribuir com os magistrados na fase de
mensuração do “quantum” indenizatório, humanizando cada vez mais a tutela
jurisdicional do Estado, pois, ela existe para atender aos cidadãos de bem que
zelam pela sua honra e que, em razão disto, merecem uma compensação à
altura.
85

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