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Créditos
Design do Suplemento e Redação: Jorge Valpaços
Revisão e Edição: Prissilla Souza
Equipe de Apoio e Testes: Arautos do Lampião

Bizâncio, Constantinopla e Istambul é um suplemento para o jogo


Desmortos, de autoria de Paul Riddle, publicado no Brasil pela
Fábrica Editora

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A cartilha o Sonhador se inspira no jogo Pesadelos Terríveis, de autoria
de Jorge Valpaços e publicado pela Avec Editora.

Conheça Pesadelos Terríveis: http://aveceditora.com.br/produto/pe-


sadelos-terriveis-beladona-rpg

Jorge Valpaços é membro do Lampião Game Studio.


Conheça o Lampião em: www.facebook.com/lampiaogamestudio

Esta é uma obra de ficção. Contudo, Sangue foi, é, e será Vida.

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indíce
TEMPO, VIDA, SANGUE E HISTÓRIA 4
A ESTRUTURA 11
O SONHADOR 14
JOGANDO COM A HISTÓRIA 17
COMPREENDENDO A COMUNIDADE 18
SEDIMENTOS SILENCIOSOS 20
PENSANDO NO LEGADO 25
BIZÂNCIO, 658 AEC 31
CONSTANTINOPLA, 597 EC 39
ISTAMBUL, 20XX EC 49
RUPTURAS E PERMANÊNCIAS 57
ANEXOS 60

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TEMPO,VIDA,
SANGUE E HISTÓRIA
O tempo. Tempo tecido, tempo inexorável. Nossa experiência de vida só
é cognoscível por meio de nossa interface com o tempo. E damos sentido
à sucessão de presentes, organizamos memórias e atribuímos causalida-
de a eventos. Reconhecer-se é ato-artifício, enxergar o agora por meio de
várias camadas de ontens. Quase sempre jogamos com isso.

A narrativa é um produto dessa relação com o tempo. A história conta-


da é esforço, há um tear, e essa manufatura torna possível as mais dife-
rentes histórias. Dentro da tradição de jogos, olhamos para trás e vemos
muitas narrativas sobre o início dessa tradição. Gostamos de algumas,
não gostamos de outras. Nossa relação com jogos – inclusive jogos de
RPG – é um jogo narrativo.

Como historiador, todas essas questões são fascinantes. E cada vez que
me debruço sobre jogos, penso nos processos que podem se desencadear
em torno de um novo título, de uma partida, de uma aventura publica-
da. Tal qual uma pedra jogada em um lago, um jogo cria ondas e o que
está ali naquele lago – você, eu, outros jogos, etc. – recebe algum efeito
daquela onda. Mas veja, o sistema não é ordeiro ou previsível. Temos,
ao mesmo tempo, várias pedras jogadas, várias ondas. Há interferências
entre as ondas e por vezes nós aplicamos filtros à recepção, escolhendo
algumas correntes em detrimento de outras. E vez por outra essa seleção
que fazemos nem é racionalizada. Nós saltamos algumas ondas, deixa-
mos nos levar por outras, surfamos em terceiras.

Desmortos é um jogo que se posiciona no tempo e que é composto por


diferentes ondas “geracionais”, por assim dizer. Ao lermos e jogarmos
Desmortos somos afetados por diferentes discursos, e vemos que apesar
dele dialogar com duas escolas-tradições, possui em sua tecitura nar-
rativa uma proposta distinta. Desmortos é um jogo que tem o tempo
como matéria de trabalho, objeto de estudo e textura lúdica evidente.

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Sua complexidade é justamente essa, ele resgata um gênero, introduz
algo de uma dada corrente de pensamento em torno de jogos, mas traz
soluções distintas ao quadro geral. E coloca o tempo no centro da ques-
tão.

Os dois modos de jogo, a Jogo Noturno e Jogo Silencioso já dão pistas


de como Paul Riddle brinca com o tempo. O tempo de “vida” para os
mortais, é Dormente aos monstros. As coisas simplesmente estão como
devem estar. As

Tramas e Esquemas dos Predadores se desenvolvem, não há uma Crise.


Mas é necessário agir efetivamente quando as coisas deixam de ser ho-
diernas, quando os Cavaleiros tocam suas trombetas com intensidade.
Ali a Jogo Noturno ocorre, e, paradoxalmente, Desperta-se às noites.

Os Predadores experenciam o tempo de forma distinta dos mortais. Em


Desmortos há um certo desinteresse pelos eventos humanos, efêmeros,
voláteis e abruptos àqueles que convivem com a imortalidade; logo, com
uma experiência de tempo praticamente congelado. E um ponto que me
atrai por demais em Desmortos é justamente isso, a passagem de tempo
em diferentes ritmos, e suas consequências em termos de jogo. É um
excelente exercício jogar com um protagonista que atravessa gerações,
que contempla ascensão e queda de comunidades, que possui uma certa
arrogância em considerar os demais apenas gado, mas que possui uma
relação de necessidade de conviver com os Mortais.

Veja, o drama do vampiro torna-se mais complexo. Não se trata apenas


da perda da humanidade e relação com o futuro. É a condição de teste-
munha da relação de outros com o tempo que molda um pessimismo,
um amargor. E, para que não haja inveja ou compaixão, se voltar à Co-
munidade de Predadores e mergulhar em suas intrigas é mais do que
uma saída. Abraçar a existência enquanto Predador se torna a mais vil, a
mais cruel, mas talvez a única forma de existir para os protagonistas de
Desmortos. E isso se torna explícito ao vermos como Desmortos trata o
tempo, como ele é apresentado no jogo.

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O Jogo Silencioso é um tempo de fabricações, intrigas e apoios. Enquan-
to os humanos se arrastam por suas existências, os Predadores não vi-
sam apenas dominar a cena por trás dos panos. Na verdade, eles vivem
por meio de Tramas e Esquemas, lidando mais com seus objetivos do
que com um certo prazer em manipular a sociedade. As alianças, Status
dentro da Comunidade de Predadores e traições dinamizam não apenas
o mundo dos Predadores, mas todo o cenário de jogo.

Já o tempo da Jogo Noturno é voraz, crítico, sanguinolento. É tempo da


ira ser aplacada, de tentativa para regresso da ordem ou de construção –
revolucionária – de uma nova ordem. De forma extremamente peculiar,
Desmortos trata da experiência da narrativa histórica da humanidade,
que tradicionalmente lê de forma mais aguda instâncias de crise e re-
volução. Sim, é isso mesmo, em um jogo sobre a não-vida, por meio de
monstros da sociedade, Predadores de Mortais, temos a relação com o
tempo e com a narrativa da humanidade em jogo. E isso realmente me
Cativou, tal qual certo

Movimento Básico. Sim, Desmortos age como um Predador de histo-


riadores, afinal.

Talvez seja por isso tudo que me entreguei ao jogar e construir um ce-
nário para Desmortos, jogo publicado pela Fábrica Editora. Quando o
Sílvio (Rivera) entrou em contato comigo para me convidar a escrever,
fiquei alucinado. Sim, eu curtia o jogo, e nem sou grande fã de vampiros,
ainda que saiba de sua importância tanto ao gênero ficcional que tanto
gosto (terror) quanto à cultura de jogos RPG. Mas quando jogava Des-
mortos, antes mesmo de saber que viria para o Brasil, essas questões em
torno do tempo já haviam me capturado. Logo, foi algo incrível para
mim.

De cara me desafiei a pensar em algo que deixasse explícito o passar do


tempo, o jogo com/sobre/no tempo. Pensei em um espaço pouco visi-
tado, e repleto de nuances. E tinha de fazer algo interessante enquanto
jogo, e não como enciclopédia de história. Bizâncio, Constantinopla e
Istambul foi um desafio para mim em vários níveis, e gostei de tudo
entorno do processo. Inclusive essa reflexão inicial ganhou mais corpo
– pude pensar mais sobre tudo que disse até agora – ao jogar e escrever
o suplemento

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Mas um jogo não é apenas um laboratório. Um jogo é sangue, vida, en-
trega. E, ao notar que há um Pesadelo como Predador, pensei: por que
não um Sonhador? Imerso na ficção de Pesadelos Terríveis (jogo que
publiquei pela Avec Editora), pensei que Sonhadores com suas ideolo-
gias poderiam ser arquétipos interessantes para histórias sobre gerações
e sobre o tempo. E que a forma de agir fosse mais subjetiva, indireta
e sutil, uma leitura bem distinta da manipulação do Titeriteiro, ou da
coação do Pesadelo, por exemplo. Mas… como eu poderia encaixar tudo
isso com o mínimo de coerência?

Meu processo, jogando e escrevendo o suplemento, foi analisar a posição


que os tipos de Predadores (Sensualista, Lobo, Demônio, etc.) tinham
para a proposta de Desmortos. Estava claro que não se tratava de haver
algum balanceamento evidente em níveis de poder. Cada Predador era
claramente uma metáfora de um predador social, de alguém que lite-
ralmente se alimenta de outros. Verificar o sentido dos Movimentos de
Status, por exemplo, tornava isso cada vez mais claro.

Decidir criar a cartilha de Sonhador para Desmortos foi, nesse sentido,


algo muito bom. Pesadelos Terríveis flerta com algumas questões, como
a relação entre o Poder e o descontrole que um Sonhador possui. Ele
mesmo pode se tornar a força do Medo – como Samantha foi em um
período do quadrinho

Beladona, que inspira o RPG. Não seria difícil inserir um Sonhador


enquanto Predador em Desmortos. Mas havia algo além…

Uma vez que um Sonhador agiria por meio de suas ideologias e visões
sobre o mundo, ele teria Movimentos mais eficientes durante a Jogo Si-
lencioso e quando os Predadores não estão despertos na Jogo Noturno.
Regressando ao conceito de tempo que Desmortos possui, pensei nessa
Cartilha a representar o poder do inconsciente, do conteúdo não racio-
nal e para tratar ideias, mentalidades e aparelhagens mentais partilha-
das durante médias e longas durações. O Sonhador age de forma dife-
rente no presente e é mais notado em uma visão macro sobre o tempo.
Era isso que queria tratar ao trazer o Sonhador ao jogo.

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Logo, de forma complexa, até vagante e errante a princípio, encontrei em
Bizâncio, Constantinopla e Istambul uma forma de reler e expressar de
forma distinta – ampliando possibilidades – o que se propunha em Pe-
sadelos Terríveis (ainda que se apresente de outra forma, já que o terror
psicológico sustenta o jogo), ao mesmo tempo que criava algo diferente
para Desmortos. E tudo tendo o tempo e a história linhas e agulhas
para a tecitura desse suplemento. Peculiar é que isso não estava claro
no início da jornada. Foi durante o caminho que foi me perdendo e me
encontrando e o fruto de tudo isso vocês vão ver nas próximas páginas.
Espero realmente que curtam.

Gostaria de agradecer à Fábrica pela oportunidade de criar esse mate-


rial, a todos que participaram de testes, a quem difunde jogos de forma
segura e inclusiva, a quem apoiou de alguma forma Desmortos e, so-
bretudo, a você, que lê esse texto. Espero que jogue, que tenha ótimas
partidas.

Nas próximas páginas vocês terão, de forma objetiva, orientações para a


condução de campanhas no cenário, sementes de histórias, personagens
prontos, uma nova cartilha e Mapas de Relações para cada instância
temporal. Tenho me esforçado para ser cada vez mais claro ao escrever,
ao falar com vocês. E essa introdução – talvez grande demais – é parte
disso. Quero deixar cada vez mais evidente não apenas o jogo, o produto
mas o processo e as reflexões em torno dele. Acho que “abrir a caixa” é
algo cada vez mais importante para a cultura de jogos, e ficaria feliz se
vocês trocassem um tanto também, por meio da página do Lampião
Game Studio. Criar, jogar, difundir e pensar sobre jogos de forma cada
vez mais ampla é o que mantém a chama do Lampião acesa. Isso é o que
nos faz sonhar. E vocês fazem parte disso.

JORGE VALPAÇOS
PLEBEU E SONHADOR

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A estrutura
Bizâncio, Constantinopla e Istambul é um cenário para campanhas de
Desmortos que se desenvolve por meio de 3 Marcos cronológicos: 658
AEC, 597 EC e 20XX EC. Tudo se desenrola na mesma Cidade, geo-
graficamente falando. Porém, em circunstâncias distintas, com muitos
condicionantes específicos para essa região repleta de história, lendas e
focos de tensão. Os Marcos cronológicos estão delimitados para serem o
pano de fundo de Jogos Noturnos, enquanto as transições entre eles se-
rão o palco de Jogos Silenciosos. Note que há grandes saltos. O primeiro
é do século VII AEC até o século VI EC e o segundo é do sexto século
da Era Comum até o século XXI.

É algo que parece absurdo, e realmente é para uma Presa. Mas lembre-
-se, esse é um jogo sobre Predadores e sua sobrevivência em um jogo
político baseado em hierarquias por meio de Eras. Logo, Tramas e Es-
quemas são fundamentais em uma grande experiência temporal. Afinal,
é importante manter sua imortalidade a custo de seu Sangue (e de seus
desafetos). Pense bem nisto, já que o Despertar dos Predadores sempre
os colocará em situações pesadas, intensas, movidas por violência e êx-
tase.

Estes Marcos cronológicos e suas especifidades, como a fonte da Crise


que os precipita, serão apresentados de forma a alimentar sementes e
ganhos para as partidas. Neste sentido, não temos uma aventura, mas
um – ou vários – cenários de Campanha. Vocês terão mais ideias para
temperar, recombinar e construir suas partidas que um roteiro de jogo.
Sim, ao lado disso sempre buscarei dar exemplos, apresentar algumas
coisas que poderiam acontecer em cada circunstância, bem como utili-
zar a história da humanidade na ficção.

Cada Marco acompanhará também Predadores e um Mapa de relacio-


namentos, posicionando ficcionalmente os coadjuvantes e potenciais
antagonistas no início de cada Jogo Noturno. É possível que os jogado-
res os utilizem, mas recomendo que criem suas próprias personagens e
se insiram na rede. É mais interessante acompanhar cada consequência
que um novo nó na rede gerará.

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Em Desmortos esse posicionamento e o deslocamento em níveis hierár-
quicos e as relações de Dívidas são importantíssimos para o jogo.

A ideia era, além de apresentar um cenário de Campanha, apresentar


um procedimento para que os Mestres de Jogo possam criar seus pró-
prios cenários. E é por isso que vez por outra, assim como faço por aqui,
me dirijo diretamente a você, explicitando minhas escolhas e caminhos
que percorri.

Como já havia comentado, este suplemento acompanha uma nova carti-


lha, o Sonhador, que dialoga com o RPG Pesadelos Terríveis. Uma vez
que temos grandes saltos, talvez o Sonhador seja uma opção interessan-
te às partidas. Note que já há Personagens Não-Jogadores (PNJs) com
esta cartilha. E é claro que você poderá utilizá-la junto às demais em
outros cenários. Introduza Sonhadores às Comunidades de Predadores
e torne os jogos de poder mais intensos. Aliás, falando no Sonhador,
vamos começar apresentando este novo Predador.

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O Sonhador
O Sonhador é aquele que abraça os medos e age por meio dos sonhos.
Ele é um idealista, penetrando no inconsciente por meio de traumas. O
Sonhador vive em 2 mundos, e não sabe se prefere estar acordado ou
imerso em sonhos.

Movimentos de status
Você se torna PATRÍCIO quando for estabelecido na ficção ou quando
você ativa o movimento TRAUMA PSICOLÓGICO.

trauma psicológico
Quando você expõe um PATRÍCIO a uma memória traumática, você se
torna seu porto seguro e ele lhe deve uma DÍVIDA MAIOR. Mas isso gera
efeitos na Comunidade, já que você expôs o que há de frágil e humano
de um Predador. Caso o PATRÍCIO tenha HUMANIDADE menor que a
sua, todos que devem DÍVIDAS a ele tornam-se seus RIVAIS, no caso de
HUMANIDADE igual à sua, eles se tornam INIMIGOS, e caso o PATRÍ-
CIO tenha HUMANIDADE maior que a sua, eles se tornarão NÊMESIS.

Você perde o status de PATRÍCIO quando o Trauma Psicológico for su-


perado pelo PATRÍCIO, representado pelo pagamento da DÍVIDA ao
SONHADOR.

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Movimentos de cartilha
sonhos lúcidos
Você acessa o âmago da mente das suas Presas e de quem lhe deve DÍ-
VIDAS por meio dos sonhos. Quando eles estiverem dormindo ou antes
de você ACORDAR, você pode efetuar quaisquer movimentos que repre-
sentem a sua influência em seus inconscientes.

ideologia
Quando você BARGANHAR, caso tenha menos SANGUE e status igual
ou maior que o outro Predador, você está em posição superior a ele na
ORDEM HIERÁRQUICA.

Movimentos silenciosos
ATERRORIZAR (apenas para o SONHADOR): Você aniquila um Pesa-
delo na Comunidade, toma tudo dele para si (TERRITÓRIO DE CAÇA
e DÍVIDAS) e inicia a JOGO NOTURNO com a cartilha de PESADELO.

INFLUENCIAR (apenas para o SONHADOR): Outro Predador INTER-


FERE ou APOIA outras TRAMAS por você. Você recebe a DÍVIDA (caso
escolha APOIAR) e ele adquire o RIVAL (caso escolha INTERFERIR).

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jogando com a história
Este é um suplemento que trata de diferentes recortes históricos. Sim,
foi um grande desafio. Uma possibilidade de aprendizado a todos. É
uma tentação de inserir muitas informações específicas sobre o territó-
rio que chamamos hoje de Turquia. Foi uma chance real de fazer disso
uma enciclopédia. Mas será que era esse o objetivo? Não, não é sobre
isso este manual. E por quê? Porque este não é um livro de história.

Paul Riddle já nos dá uma boa dica no capítulo sobre a preparação do


jogo. Isso mesmo, no livro básico de Desmortos, o autor do jogo apre-
senta alguns procedimentos básicos para se pensar em um cenário his-
tórico, destacando o seu contexto. Pensar na cultura, eventos históricos,
a tecnologia do período e as relações políticas de então são questões
básicas, mas gostaria de destacar a caixa de texto que trata de precisão
histórica. Riddle nos lembra que não há Predadores que sugam o sangue
de Presas no mundo real, e que o que se pretende é um recorte em um
jogo histórico de Desmortos é um recorte sobre o passado. Essa caixa
de texto é interessante, pois trata aquela questão pífia que um jogo his-
tórico para ser “preciso” deve ser sexista, por exemplo. Sim, há muitas
pessoas que defendem esse tipo de raciocínio. Por isto que acompanho
o pensamento do autor de Desmortos quando pontua que isso não faz
o jogo mais “real” (uma vez que é um jogo, ocorrendo em um espaço
imaginado compartilhado pelos jogadores). Neste sentido, aqui em Bi-
zâncio, Constantinopla e Istambul, o acordo entre os jogadores é o que
vai validar as relações de poder do tecido social de cada cenário, ainda
que haja elementos estruturais a cada contexto.

O que teremos nas próximas páginas será, para além da apresentação de


cada contexto para cada recorte temporal, ganchos e sementes narrativas
para se pensar na criação da sua cidade. Não busco esgotar as possibili-
dades que você e seu grupo de jogo terão para pensar, por exemplo, em
Bizâncio no século VII AEC. Mas listarei, efetuando um recorte, ques-
tões marcantes à sociedade que podem ser trabalhadas na mesa. Logo,
teremos mais questionamentos e estopins que num cenário fechado, fixo
e imutável. E há várias implicações para isso

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A primeira está no próprio livro Desmortos. Ainda que Riddle tenha
sido perspicaz ao tratar o que se pode pensar sobre o jogo entre história
e ficção, os exemplos dados incorrem de certo orientalismo. Enquanto
um jogo dito Clássico (resumido à Grécia e Roma) é caracterizado por
seus mitos, heróis,

filosofia e grandes impérios, o que poderíamos tomar como estruturas


orientais, sobretudo ao pensar no passado, é o que está sob a categoria
Antiguidade, resumido em seus “grandes monumentos, deuses e maravi-
lhas”. Não vemos nada sobre África ou mesmo Ásia, quiçá América sem
ser a do norte no texto, ainda que haja menção crítica ao imperialismo
do século XIX.

Neste sentido, em Bizâncio, Constantinopla e Istambul, explorarei


questões diversas e complexas sobre a ponte entre a Europa e a Ásia,
sem cair em um academicismo tacanho (e chato para jogar), mas indo
além de uma categoria homogênea para um dado contexto. Seria fácil
olhar para o território onde o jogo se passa e pensar: são os bárbaros da
antiguidade (Trácios, etc), os bárbaros do medievo e modernidade (tur-
cos seljúcidas) e bárbaros dos dias de hoje (tomando a Turquia como
algo único). Mas fiquem tranquilos, é isto que vocês não verão nas pró-
ximas páginas.

compreendendo a comunidade

Você é um Predador em Desmortos. Contudo, para além de tomar San-


gue de suas Presas, você pertence, de alguma forma à sociedade na qual
elas vivem. E mais do que isso, você também possui um determinado
papel na Comunidade de Predadores.

Ok, não é exatamente um papel, encare como um nó. Um nó no tecido


social, e esse nó está presente em duas tramas. Uma delas se relaciona
à sociedade das Presas e outra à Comunidade de Predadores. É essa
intersecção que dá sentido a cada cenário em Bizâncio, Constantinopla
e Istambul.

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Ao jogar com um Pária em Bizâncio, você pode ser um escravo, cativo de
guerra que teve seu mestre como Criador. Então você o matou, vivendo
à margem da sociedade. Ser um Plebeu em Istambul pode significar ser
um trabalhador na Turquia atual. E jogar como um Patrício em Cons-
tantinopla pode significar compor setores administrativos do Império
Romano, ou ainda fazer parte do clero cristão oriental.

Observe que é possível não acompanhar o posicionamento no jogo en-


tre a trama da sociedade e a trama da Comunidade de Predadores. Um
bispo poderoso em Constantinopla possui destaque junto ao Impera-
dor, mas pode ter cometido graves crimes aos Predadores, se tornando
até um Pária. Por outro lado, um simples orador de uma mesquita em
Istambul pode não ter muitas posses ou poder político junto aos huma-
nos, mas ser uma figura de poder entre os Predadores, por praticamente
ter acesso a um vasto Território de Caça.

Observar as nuances dos cenários e construir Predadores condizentes


a cada instância é algo bem importante, e, por isso, ao falarmos de cada
um dos três cenários de jogo, apresentaremos algumas questões que
podem ajudar nesta construção. Serão ideias, apresentações de pontos
de tensão e ganchos narrativos que poderão ser utilizados para o de-
senvolvimento de partidas pelo Mestre de Jogo e de Personagens pelos
Jogadores.

Ainda falando da Comunidade, é importante verificar que a composição


e a disponibilidade de Territórios de Caça varia muito com o passar dos
anos. Um chefe de um clã heleno que se assenta em Bizâncio, caso lidere
um grupo de homens armados, potencialmente poderá ter seu Territó-
rio de Caça amplo e

com boa disponibilidade de Sangue, advindo dos soldados e dos pró-


prios saques – prática militar que não era incomum à época. Mas será
que, ainda que tenha contato com muitas Presas, o Território de Caça
de um funcionário da administração de Istambul nos dias de hoje seria
tão grande?

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Pensar na Comunidade e no passar dos tempos também nos auxilia a
pensar nos Movimentos de Legado. A Anatólia está em um local que
abriga o contato de muitas lendas. Inserir questões em torno do cris-
tianismo em Constantinopla para a criação de Movimentos de Legado
Personalizados seria adequado, tal qual trazer a xenofobia aos turcos
pela Europa e o autoritarismo interno – com perseguições à minoria
curda, por exemplo – a Istambul também são pontos importantes a se-
rem explorados. Em outros termos, mantenha seu pensamento na Co-
munidade com Sangue, fluida, quente, em trânsito, ou seja, viva.

sedimentos silenciosos
Bizâncio, Constantinopla e Istambul é um cenário que prevê saltos tem-
porais. Pensar no mesmo espaço geográfico com diferentes configura-
ções e camadas que se adensam no tempo é um dos pontos de conflito
pensados por mim. Ali, na mesma cidade, os Predadores despertarão
em sociedades profundamente distintas. Mas veja, isso não significa que
se assustarão a cada Jogo Noturno. O processo de reconfiguração da
cidade, as transformações urbanas, a nova composição demográfica, as
novas tecnologias e alterações nos Territórios de Caça; tudo isso será
experenciado pelos jogadores no Jogo Silencioso, por meio das Tramas
e Esquemas de seus Predadores.

O que temos de um tanto novo por aqui é o papel do Jogo Silencioso


e os desafios paralelos a esse modo de jogo. O primeiro grande desafio
se relaciona aos saltos temporais. É proposital que haja séculos entre
os Jogos Noturnos. Os jogadores – não os Personagens – saberão das
transformações sociais que o próximo salto terá – sugiro ao Mestre do
Jogo que informe as principais características, bem como o Mapa de
Relacionamentos seguinte. O jogo por aqui é se posicionar neste futu-
ro-presente, fazendo com que as Tramas e Esquemas preencham ficcio-
nalmente essa transição secular e geracional. O Jogo Silencioso, neste
sentido, ganha papel fundamental à continuidade narrativa. Por con-
seguinte os jogadores saberão os elementos básicos de cada instância
temporal, sendo as suas Tramas e Esquemas determinantes para o novo
posicionamento de seus Predadores no xadrez social preconizado por
Desmortos.

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Assim sendo, mais do que ascender na Comunidade dos Predadores,
as Tramas e Esquemas de todos – inclusive dos PnJs – servirão para
representar as mudanças pelas quais a sociedade passou. E é aqui que as
coisas ficam mais interessantes.

Paul Riddle por várias vezes indica que há possibilidade de mudança de


status aos Predadores, e isso pode ocorrer, inclusive, durante as Jogos
Silenciosos. Também não podemos nos esquecer que, durante essa pas-
sagem de anos, temos novas alianças, Nêmesis, Rivais e Inimigos cria-
dos. E tudo isso como consequência das Tramas e Esquemas traçados.

A ideia por aqui é explorar um pouco mais do conceito de Jogos Silen-


ciosos e apresentar desafios aos jogadores, bem como ao Mestre de Jogo
durante esse modo de jogo. Sim, vamos brincar um pouco com o tempo
e com o preenchimento de lacunas narrativas.

O Mapa de Relacionamentos das diferentes instâncias temporais apre-


senta algo como uma foto do tempo presente de cada Jogo Noturno.
É apenas um recorte, um recorte da Comunidade de Predadores que
se envolve diretamente com a Crise. Esse mapa, junto às características
conjunturais de cada momento funcionarão como uma meta ao grupo
de jogo. O Jogo Silencioso entre Bizâncio e Constantinopla é concluído
quando todas as Personagens de Bizâncio se posicionam no Mapa de
Constantinopla e quando se encaixam na sociedade presente. Da mes-
ma forma, o Jogo Silencioso entre Constantinopla e Istambul se conclui
quando todos Predadores de Constantinopla se posicionam no Mapa
de Istambul, se adequando à sociedade do então presente, que abriga a
nova Crise. Em outros termos, cabe ao Jogo Silencioso o papel de escre-
ver a história de séculos e preencher essa grande lacuna.

Se você observar com cautela notará que os Mapas de Relacionamentos


anexos a este suplemento já possuem diferentes Predadores, mas note
que não há indicação de Criadores, por exemplo. Cabe ao grupo de jogo
construir isto, ou mesmo descobrir durante as partidas. O Mestre de
Jogo pode deixar as coisas mais interessantes ao não fornecer essa infor-
mação de cara. Mas veja, os Predadores dos Jogadores não estão repre-
sentados por ali também.

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Isso significa que é possível tomar parte de um dos PnJs no Jogo No-
turno. Contudo, acredito que seja mais interessante criar outros Preda-
dores, uma vez que, dada a configuração de cada Crise temos ambições,
objetivos e rancores diferentes para cada PnJ. O que realmente será de-
safiador por aqui é o que vem a seguir: todas as Personagens devem ser
transportas ao Mapa de Relacionamentos posterior. Sim, os nomes pro-
vavelmente serão trocados e até mesmo pode haver a mudança das Car-
tilhas de Predador – como previsto em Desmortos –, mas o que quero
dizer é que as camadas do tempo são sedimentadas enquanto vestígios
do passado. O jogo torna-se uma arqueologia da predação.

Isso significa que os membros da Comunidade Predadora de Bizâncio,


seus planos e ideais farão parte de alguma forma de Constantinopla, e
também de Istambul, se o Predador se mantiver vivo. É possível figu-
rar uma posição já estabelecida no Mapa de Relacionamentos do futuro
imediato ao Jogo Noturno, e isso pode ser interessante. Os Rivais, Ini-
migos, Nêmesis e demais coadjuvantes de uma Jogo Noturno podem
já estar representados no Mapa de Relacionamentos do próximo Jogo
Noturno, cabe ao Mestre do Jogo efetuar as correspondências.

Também cabe ao Mestre de Jogo selecionar os coadjuvantes. Nem todos


os Predadores envolvidos em Constantinopla podem lidar com a
Crise em

Istambul, por exemplo. Eles podem ter morrido, saído da cidade, não
se envolvido com o problema ou mesmo terem sido vítimas da Crise
atual. Logo, o próprio material de jogo, ou seja, o que foi jogado, deverá
ser alimento para mais fontes de tensão e intriga. Porém, é possível que
haja continuidade a todos os Predadores. Eles podem assumir o papel
das Personagens no novo mapa, ou ainda, se encaixarem na nova teia de
relacionamentos.

Como foi possível notar, as Tramas e Esquemas e o próprio sentido


do Jogo Silencioso se alterou um pouco. Grande parte disso se dá pela
grande distância temporal entre Jogos Noturnos, o que se choca propo-
sitalmente com a distância espacial inexistente. Serão as mesmas ruas,
mesmo relevo, mesmo clima, mesmas locações para as Cenas.

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Mas o verniz social é outro, a população fala outra língua, o urbanismo
recebe várias camadas, influências e inspirações. E lá, entre testemunhas
e agentes das transformações, estão os Predadores.

Durante a criação de Bizâncio, Constantinopla e Istambul pensei muito


se tudo isso não daria peso demais à passagem do tempo em relação ao
Jogo Noturno, quando os Movimentos são mais agudos. Porém, penso
que o conceito de Crise e a ação urgente que se depreende já respondam
às minhas questões. O que realmente queria transpor para esse guia de
campanha é a complexidade crescente do tecido social com o passar do
tempo. Já que todos os Mapas de Relações se interferem e jogos sociais
se mantém, uma Crise em Istambul se torna mais complexa que em
Constantinopla, e mais complexa que em Bizâncio, já que temos mais
atores, questões e sedimentos da história de todos do passado agindo no
presente. Parecido com a ficção que chamamos de vida, não é mesmo?

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pensando no legado
O Legado costuma ser um dos elementos mais importantes para a
condução das partidas em Desmortos. Isso porque seus Movimentos
constróem a mitologia acerca dos Predadores, indicando inclusive seus
limites de ação. Em Bizâncio, Constantinopla e Istambul pensar nisso
é realmente importante, sobretudo pelo tempo que será coberto pelo
jogo. Não obstante, cabe efetuar algumas considerações acerca de cada
questionamento inicial que define os Movimentos de Legado comuns.

Ao CRIAR um novo Predador, talvez seja importante estabelecer que a


opção de ficar irritado, confuso e emocionalmente frágil ocorra quando
o Escolhido é de uma etnia ou complexo cultural distinto do Criador.
Por exemplo, em Bizâncio, caso o Criador seja heleno e o Escolhido trá-
cio, este pode ter esse efeito, mas isso não ocorre se o Escolhido for hele-
no. Outro efeito interessante seria ter a criação de Escolhidos despertos
como uma besta faminta e sanguinária caso estejam em uma circunstân-
cia de forte pressão psicológica, sendo uma minoria ou grupo persegui-
do. Por exemplo, em Istambul no mundo contemporâneo, um Predador
ao criar um Escolhido curdo, catalisaria todos os seus conflitos, cedendo
a uma besta interior. O mais importante é ter em mente que os efeitos de
criação de Predadores não são tomados como homogêneos no cenário.
A vida da Presa é relevante para a transição ao seu devir Desmorto.

DESTRUIR um Predador pode ser pensado como algo que se altera no


tempo, não havendo controle pela Comunidade de Predadores, mas sim
pela mitologia criada pelos humanos. O Jogo Silencioso e a passagem
de tempo determinará essa mudança, que se descortinará independen-
temente das ações da Comunidade de Predadores, refletindo o papel do
medo no inconsciente coletivo para a existência dos Predadores. Pode
ser mais interessante, inclusive, que apenas o Mestre de Jogo saiba des-
te Movimento de Legado, possivelmente revelando indícios durante as
partidas. Explicite isso aos jogadores e, por exemplo, estabeleça que em
Bizâncio a destruição se dá por meio da decapitação e preenchimento da
boca do Predador com alho, enquanto em Constantinopla há necessidade
de queimar o corpo com fogo purificador; já em Istambul basta o Predador
ser atingido por raios de sol para ter seu corpo destruído.

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Note que essas escolhas dialogam em certa medida com a maior com-
plexidade de viver enquanto Predador com a passagem dos anos, bem
como com elementos partilhados culturalmente pelas Presas, como a
questão do alho em torno da dieta mediterrânea propagada pelos hele-
nos em sua colonização do sétimo século AEC.

A RUÍNA do corpo de um Predador deve dialogar com sua DESTRU-


IÇÃO, sendo por muitas vezes o vetor da compreensão da destruição
dos corpos dos Predadores. Seguindo o exemplo acima, poderíamos ter
os Predadores do tempo presente lidando com uma membrana calcária
de cinzas em um apartamento. Há cordas junto à membrana e traços de
violência em um apartamento. Um Predador pode ter sido agredido e
amarrado em frente à janela, sendo lentamente torturado e consumido
pela luz da manhã. Uma ruína terrível.

DIFICULTAR é um dos Movimentos de Legado mais interessantes de


serem construídos coletivamente. Cada instância temporal apresenta
fontes de conflito, e, dado o repertório que será apresentado em Bizân-
cio, Constantinopla e Istambul, o que dificulta as ações é moldado. Em
Bizâncio, durante a fundação da cidade e permuta/imposição de hábitos
culturais da Hélade, entrar no lar de alguém sem permissão pode ser algo
apropriado. Já em Constantinopla, se relacionar com o que é consid-
erado mal (bárbaros que maculam a cristianitas em ascensão, dada a
reconquista da península itálica no sexto século) pode gerar custos em
Sangue.

O TORPOR também se dinamiza com o tempo. Seria bastante difícil


imaginar em um jogo na antiguidade com todos os Predadores apenas
agindo à noite – ainda que o deipnon, o jantar heleno, seja o principal
lócus de debate e política no Mediterrâneo. Neste sentido, em Bizâncio
o torpor poderia agir de forma a tornar os Predadores helenos acorda-
dos, mas letárgicos, fracos e facilmente oprimidos por presas. E é por isso
que a política, a retórica e os acordos se dão nas noites neste cenário.
Já em Constantinopla e Istambul é possível ficar acordado a custo de 1
SANGUE por hora.

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BEBER é um Movimento de Legado com objetivo de priorizar o con-
sumo de Sangue fresco, recompensando as ações em seu Território de
Caça. Logo, pensar no sentido de beber em cada sociedade como uma
projeção de poder é uma solução interessante. Em Istambul, dada a di-
versidade social presente, beber o Sangue de um mesmo grupo social
seguidamente não sacia a fome de Predadores. Já em Constantinopla,
apenas sangues de fiéis são deliciosos, o sangue de infiéis ou não-batiza-
dos é podre. E em Bizâncio, o sangue mais saboroso é o do estrangeiro,
demonstrando a supremacia do Predador em relação às Presas em um
contexto de colonização.

COMER, por outro lado, abre um leque interessante de possibilidades.


É muito mais fácil apenas tomar Sangue nos dias de hoje, há bancos
de sangue, aliás. Isso pode gerar mais adversidades a quem se alimenta
como as Presas. Porém, quanto mais recuado no tempo se está, estes
efeitos podem ser menores, ainda que igualmente adversos a quem se
alimenta de Sangue. Paradoxalmente, quanto mais disponibilidade de
alimentos diversos, mais hostil ao paladar do Predador uma comida das
Presas é, e isso aumenta o drama e a ficção nas partidas de Bizâncio,
Constantinopla e Istambul.

Movimentos de legado
personalizados
Observando com atenção, você notará que os Movimentos de Legado
comuns já portam uma proposta de personalização. Mas isso não signi-
fica que o grupo de jogo não deva desenvolver os próprios Movimentos
de Legado Personalizados. Desmortos possui um procedimento instru-
cional simples para a criação destes Movimentos, mas lembre-se que
Paul Riddle deixa claro que não se trata de uma ação banal. Se não hou-
ver um princípio de causalidade discreto e que contribua com a ficção,
de forma atrelada às mecânicas de gerenciamento de recursos e posicio-
namento em um jogo de poder, não é necessário um novo Movimento
de Legado.

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Dessa forma, no lugar de listar novos Movimentos, apresentaremos
fontes de tensão a cada instância temporal (Bizâncio, Constantinopla
e Istambul), possibilitando a criação de Movimentos de Legado, caso o
grupo de jogo considere isso relevante. Muito do que será apresentado
mescla elementos ficcionais com história e serve a impulsionar a ficção
dentro da proposta do jogo. Você pode expandir cada fonte de tensão
com novos elementos, por meio de sua criatividade e/ou pesquisa his-
tórica. Mas observe que há uma Crise discreta e um evento catalisador
claro a cada recorte. Desenvolver Movimentos de Legado que neguem o
que está criado em cada circunstância pode reduzir a potência do jogo
nas mesas. Logo, recomendo que a primeira partida de cada recorte
temporal seja jogada sem Movimentos Personalizados. Sim, sei que é
tentador criar várias condicionantes a priori, mas já sabemos que muitas
coisas vão mudar com o tempo, então sinta o que é jogado e trabalhe
com isso – caso seja necessário – para criar Movimentos de Legado Per-
sonalizados. Por vezes isso não será necessário, inclusive.

Um exemplo de Movimento de Legado Personalizado seria em Bizân-


cio, durante as disputas políticas entre nativos e colonizadores helenos.
Este Movimento serve a adensar os conflitos políticos do cenário. Neste
contexto, quando um Predador DESTRÓI outro Predador, ele pode consu-
mir o seu SANGUE e adquirir este valor. Porém, todos que possuíam DÍ-
VIDAS MENORES ao Predador destruído e estão abaixo dele na ORDEM
HIERÁRQUICA, tornam-se INIMIGOS, e quem devia DÍVIDAS MAIORES
torna-se um NÊMESIS.

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BIZÂNCIO,658AEC
A cidade de Bizâncio (em grego: Βυζάντιον; em latim: Byzantium) foi
fundada por colonos helenos da cidade dórica de Mégara, em 658 a.C.
A fundação de Bizâncio faz parte de um processo maior, chamado de
sinoicismo ou sinecismo (em grego antigo: συνοικισμóς, synoikismós,
literalmente “coabitação”) ocorrido no século VII. Bizâncio recebeu o
nome de seu rei mítico, o argonauta Bizas ou Bizante (Βύζας ou Βύζαντας,
em grego).

O processo de colonização do mediterrâneo se originou por um conjun-


to de fatores, como a crise de terras férteis na península Ática e no Pelo-
poneso, o que gerava disputas fundiárias entre herdeiros, o aumento da
população local com o recrudescimento dos conflitos da Grécia insular
e continental e a própria expansão comercial e cultural da Hélade. Ao
jogar com um Predador originário de Mégara, é interessante pensar nas
motivações para o deslocamento à Anatólia (onde Bizâncio foi funda-
da), bem como pensar um tanto no ethos dórico.

Os dórios ou dóricos (em grego: Δωριεῖς, Dōrieis, Δωριεύς, Dōrieus) for-


maram uma das quatro tribos principais que compuseram os helenos,
junto aos aqueus, jônios e eólicos. Dórios etimologicamente refere-se a
povos das montanhas, bosques ou mesmo do interior, e sua relação com
a terra e com a estrutura militar para a proteção. Diferentemente de
povos como os jônios, a sedentarização e a estrutura fundiária para os
dórios é fundamental, sendo esta herança cultural identificada em povos
do Peloponeso, tendo Esparta como destaque.

Bizâncio foi fundada dezessete anos depois de Calcedônia, outra colô-


nia de Mégara, localizada no outro lado do estreito de Bósforo. Toda a
região era ocupada por trácios e bitínios, que saíram da Trácia para fun-
dar a Calcedônia. Muitos bitínios regressaram ao território de Bizâncio
com a colonização da Calcedônia pelos helenos. Logo, povos regressa-
dos que já possuem rancores ante o expansionismo da Hélade.

Conta-se que os colonos helenos de Mégara haviam consultado o orá-


culo de Apolo na Pítia, que lhes disse para “buscar um lar oposto ao país
dos cegos”.

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O enigma levou-os a Calcedônia e, tendo pesquisado os dois lados de
um estreito, escolheram o pior, pois o local de Bizâncio tinha a terra
mais fértil e melhores oportunidades de pesca. Segundo o historiador
heleno Heródoto, quem chamou os calcedônios de cegos foi Megabazo.
Bizas, o rei mítico, era filho de Keroessa, filha de Zeus e Io, cujo pai era
Poseidon.

Características
Além das características gerais de Constantinopla, apresentaremos Fon-
tes de Tensão e possíveis Territórios de Caça para o cenário. Todas as
listas serão estruturadas por meio de tópicos, a fim de facilitar a consulta
pelo Mestre de Jogo para a condução das partidas e pelos demais joga-
dores para o desenvolvimento de seus Predadores. Estes pontos, bem
como a apresentação da cidade e demais elementos da Crise se valem de
referências históricas, mas também apresentam ficções com o propósito
de tornar o jogo mais intenso.

t A cidade foi erigida sob estruturas arquitetônicas dos trácios.


t Muitos bitínios regressaram há pouco, desgostosos da colonização he-
lena.
t Os helenos são novatos no território, ainda que possuam projeção mi-
litar.
t Não é raro haver helenos viajantes em cidades recém-fundadas.
t Edificações recentes projetam o poder heleno sobre o território.
t Território importante no jogo comercial, ligando o Mediterrâneo ao
Oriente.
t As terras são mais férteis que as das cidades de origem dos colonos
helenos.
t Novos sabores e Sangue fresco estão disponíveis e excitam paladares.
t As motivações para a migração para Bizâncio são muitas, qual será
a sua?
t O comércio de Bizâncio possibilita o conhecimento de terras distantes.

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Fontes de tensão
t Helenos precisam se adequar ao jogo de poder local, e isso não é fácil.
t É momento complexo culturalmente para todos povos envolvidos.
t Há tensões com a Calcedônia e com a prótpria Trácia.
t Existem grupos étnicos menores, e por vezes estes se sublevam.
t Povos do Oriente por vezes efetuam saques na região.
t Helenos submetem e escravizam os locais, e os consideram bárbaros.
t Trácios e bitínios aliam-se com helenos para obter vantagens.
t Há quem desaprove as alianças, as traições estão prestes a se precipitar

Territórios de caça
t Os teares para os setores abastados.
t O mercado central de tecidos e cerâmica.
t O complexo votivo com templos para os deuses mediterrâneos.
t O cemitério que se localiza após os muros da cidade.
t Áreas destinadas a trabalhadores urbanos e escravos.
t A zona portuária e comercial.
t Os domínios dos grandes senhores de terra.
t Os ermos que servem aos caçadores de animais selvagens.
t Os campos pastoris, de manejo de cabras, ovelhas e bois.
t A casa de banho helena recém-inaugurada

preparação
Seguindo a estrutura de Desmortos, serão apresentados os elementos
em torno da preparação e condução dos Jogos Silenciosos e Noturnos.

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Tema
Conquista: Uma nova reivindicação é feita para o título de Patrício ou
Príncipe.

Catalisador
Agafesto, Príncipe de Mégara, aniquila Tíneos, Príncipe dos trácios e
dos bitínios que lá estavam. A Comunidade de Predadores deve se re-
posicionar, uma vez que as Presas que controlam a cidade fazem parte
da Hélade, com inúmeros aspectos socioculturais distintos da estrutura
primitiva das cidades do Bósforo.

Cena Inicial
Todos os Predadores estão reunidos no óikos (residência) de Agafes-
to, que recebe Tíneos e propõe a união da Comunidade em um grande
banquete, um elemento tradicional heleno. Em um ato de ausência de
etiqueta, Tíneos comete um deslize e ofende Agafesto, que o ataca de
forma inexorável e verte em rubro o chão do recinto. O Príncipe dos
colonos helenos revela que era apenas o que faltava. Este sacrifício, o
assassinato do Príncipe local em solo sagrado heleno era necessário para
concluir o ritual de fundação da colônia, segundo as tradições.

Puxando os fios
Há quem concorde com Agafesto e vê isso como oportunidade para
melhorar seu status. Há quem considere-o como um estrangeiro usur-
pador. E há quem deseja que o conflito se estabeleça para buscar a sua
oportunidade.

PnJS
Os Personagens Não-Jogadores serão listados abaixo. O Mestre do Jogo
terá acesso as suas Ambições e Agenda, que devem ser adequadas à fic-
ção em jogo.

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Agafesto (pesadelo)
Príncipe heleno, herdeiro de terras em Mégara e mecenas da arte.
Ambição: Unificar as Comunidades de Predadores dos trácios e dos
helenos.
1. Cooptar possíveis aliados.
2. Descobrir possíveis inimigos.
3. Aniquilar dissidências.

Mégate(Loba)
Patrícia helena, consorte de Agafesto e figura notável na Comunidade
de Predadores.
Rancor (Príncipe): Deseja um séquito mais forte que o do Príncipe
heleno.
1. Atacar Territórios de Caça com suas forças.
2. Fornecer alianças em troca de proteção.
3. Efetuar demonstração de força ante o Príncipe.

Dicébalo (Sensualista)
Patrício bitínio que coordena os usos noturnos da casa de banho.
Ambição: Ampliar seus Territórios de Caça com a chegada dos helenos.
1. Demonstrar apoio aos colonos helenos.
2. Chamar não apenas os Predadores, mas as Presas à sua casa de banho.
3. Promover festins orgiásticos.

Estártica(Demônio)
Patrícia trácia Escolhida de Tíneos, sacerdotisa de deuses ctônicos.
Rancor (Príncipe): Deseja vingança de Sangue para saciar a si e aos
seres das trevas.
1. Adquirir força por meio de sacrifícios.
2. Banhar-se do sangue das Presas colonas.
3. Retribuir com violência e miséria à Comunidade helena.

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Arthesus (sonhadora)
Plebeia helena Criadora de Dicébalo, alfa na alcateia de Mégate.
Rancor (Estártica): “Os demônios preferem possuir Estártica, aquela
maldita!”
1. Revelar à comunidade que Estártica é um fardo.
2. Acabar com ela e tomar seu posto de sacerdotisa.

Eurímaco (Titeriteiro)

Plebeu que controla o mercado trácio.


Ambição: Se estabelecer na Comunidade, servindo ao novo Príncipe.
1. Fornecer informações relevantes a Agafesto.
2. Usar as intrigas dos Predadores a seu favor.

Predadores
Os Predadores dos jogadores devem explorar as nuances do cenário.
Eles podem ser helenos, trácios, bitínios ou ainda de outro grupo étni-
co. A tensão por aqui trata da criação de uma Comunidade que abrigue
desejos e ambições de todos. E é claro que alguns ficarão no caminho de
outros. Não bloqueie os conflitos. Será o instinto dos Predadores que
resolverá estas contendas.

REVIRAVOLTAS
Tome uma folha de papel e escreva aleatoriamente cada sentença a se-
guir. Envolva cada sentença em uma elipse. Durante o Jogo Noturno,
lance ao menos uma vez um número de marcadores de Sangue igual ao
número de jogadores sobre a folha. Caso os marcadores caiam sobre as
elipses, aqueles acontecimentos ocorrerão. Você pode criar outras sen-
tenças ou mesmo utilizar conjecturas dos jogadores como sementes de
reviravoltas do Jogo Noturno.

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t Povos do Oriente tentam saquear a cidade, e há Predadores com eles.
t Um grande maremoto devasta o porto de Bizâncio.
t Alguém parece ter envenenado os pastos, muitas ovelhas foram mortas.
t Em diversas paredes é possível ler: “estrangeiros malditos”.
t Um Patrício foi encontrado afogado na casa de banho público.
t Membros das elites propõem casamentos entre helenos e trácios.
t Uma conspiração de bitínios visa tomar Bizâncio para si.
t A Comunidade de Mégara começa a explorar os colonos em Bizâncio.
t Algo extremamente valioso foi roubado do Príncipe Agafesto. O quê?
t Governantes da Trácia interrompem o comércio com Bizâncio.

O TEMPO PASSA
O Jogo Noturno de Bizâncio efetivamente se conclui quando a Crise
que se relaciona à adequação entre as Comunidades de Predadores for
aplacada. O Mestre de Jogo deve mensurar se as Fontes de Tensão e a
Agenda dos PNJs podem ou não fornecer conflitos aos Predadores dos
jogadores. Neste sentido, cabe ao Mestre de Jogo a capacidade de ler se
ainda há choques entre os trácios, bitínios e helenos ante a nova confi-
guração da Comunidade de Predadores.

Chegando a uma instância de ordem social, o Mestre de Jogo deve indi-


car que há certa estabilidade política na cidade, conduzindo o a campa-
nha para o Jogo Silencioso. Aqui, vale destacar todos os procedimentos
sobre Tramas e Esquemas já apresentados neste suplemento, bem como
a possibilidade de criação de Movimentos de Legado Personalizados.
Considero interessante reservar uma partida – ou mais, inclusive – ape-
nas ao Jogo Silencioso, já que temos séculos até o despertar. E, este des-
pertar será o coração do Império Romano no século VI da Era Comum.

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Constantinopla,597EC
Constantinopla (Κωνσταντινούπολις), batizada como a cidade de
Constantino, imperador Romano. A cidade veio a se tornar o centro do
Império Romano que falava o idioma grego da Antiguidade tardia até
a Idade Média. Muitos conhecem o poderio deste território como Im-
pério Bizantino, mas quem lá se encontrava portava a herança romana.
As fronteiras do império mudaram muito ao longo de sua existência,
que passou por vários ciclos de declínio e recuperação, sendo a maior e
mais rica cidade durante a Idade Média. Sob Justiniano (r. 527–565),
alcançou sua maior extensão, reconquistando muito dos territórios me-
diterrâneos antes pertencentes à porção ocidental do Império Romano,
incluindo o norte da África, península Itálica e parte da Península Ibéri-
ca. Durante o reinado de Maurício (r. 582–602), as fronteiras orientais
foram expandidas e o norte estabilizado. Não há guerras, não há uma
fratura aberta aos limes. E é nesse período que a Jogo Noturno se inicia.

O orgulho de restaurar o poder do antigo e longevo Império Romano


infla o peito do Basileus (em grego: Βασιλεύς, soberano) e de seus altos
funcionários. O cristianismo monofisista era mais do que discutido em
concílios, mas respirado nas ruas. Mas não pense que o enclave da civi-
litas romana não possuía questões internas. Distintos partidos se orga-
nizavam, o debate filosófico e político em espaço público era pungente e
a diversidade social em um mundo romanizado com distintas camadas
gregas fazia com que as ferventes ruas de Constantinopla tornassem-se
palcos de acalorados debates. E, em um momento de expansão territo-
rial, alterações econômicas se davam, uma vez que o Mediterrâneo en-
saiava retornar a ser o mare nostrum de outrora.

E em meio à prosperidade e aos novos contornos geopolíticos a Crise


se instaura. Sim, uma Crise complexa à Comunidade de Predadores,
uma Crise que se relaciona ao poder nas mãos das Presas. Toda a fé e
prosperidade minaram lentamente a rede de intrigas dos Predadores.
Em virtude disso, a estabilização do poder nas mãos das Presas no im-
pério convergiu com a expansão de práticas cristãs orientais. O império
ameaça os Predadores, uma vez que não há projeção de seus dentes nos
pescoços da sociedade.

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Parece que a glória e a graça divina se espalham sobre a humanidade,
tornando Constantinopla um paraíso de homens, e por conseguinte, in-
ferno dos monstros. Os Predadores parecem cada vez mais fracos, pró-
ximos de sua derradeira extinção. É hora de lembrar à Constantinopla
que é necessário manter o Sangue derramando. Cabe a vocês decidir
quem será entregue neste sacrifício.

Características
Além das características gerais de Constantinopla, apresentaremos Fon-
tes de Tensão e possíveis Territórios de Caça para o cenário. Todas as
listas serão estruturadas por meio de tópicos, a fim de facilitar a consulta
pelo Mestre de Jogo para a condução das partidas e pelos demais joga-
dores para o desenvolvimento de seus Predadores. Estes pontos, bem
como a apresentação da cidade e demais elementos da Crise se valem de
referências históricas, mas também apresentam ficções com o propósito
de tornar o jogo mais intenso.

t Um dos maiores, senão o maior centro de poder do Mediterrâneo.


t Principal centro comercial, possuindo rotas marítimas e terrestres.
t Herdeira da tradição romana, a cidade se projeta sobre seus rivais.
t Sua estrutura política e religiosa andam de mãos dadas.
t Polo de difusão do cristianismo, abriga os principais debates teológicos.
t Guardiã de séculos de história, compila conhecimentos do ocidente e
oriente.
t As ameaças de invasões de povos “bárbaros” não é tão grande.
t Territórios que faziam parte do Império do Ocidente foram anexados.
t O clima de prosperidade econômica é sentido no dia a dia da sociedade.
t Não é raro haver grandes festividades públicas aos mártires e santos
cristãos.

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Fontes de tensão
t Partidos contrários ao poder do Patriarca e Imperador começam a
conspirar.
t Dioceses distantes começam a reclamar pelo aumento de tributos im-
perial.
t Comunidades de ditos “hereges” não são toleradas.
t Predadores convertidos se entregam e delatam outros Predadores.
t A fragmentação da Comunidade de Predadores gera conflitos internos.
t Milícias de Presas perseguem Predadores às noites, vistos como de-
mônios.
t Territórios de Caça estão mais escassos e chegam a ser perigosos.
t As forças de segurança da cidade são eficazes e numerosas

Territórios de caça
t Grupos de cristãos nas proximidades de igrejas.
t As pedreiras e oficinas de mosaicos com seus muitos trabalhadores.
t As áreas campesinas nas margens da cidade.
t O hipódromo e todas as competições esportivas mobilizadas.
t O Fórum de Teodósio, repleto de funcionários imperiais.
t A Porta Dourada com estrangeiros que adentram às muradas da ci-
dade.
t As Termas de Zeuxipo, frequentadas pela elite.
t As mais distintas basílicas com seus elevados níveis de poder.
t A Porta da Peixaria, e seu contato com os pescadores e comerciantes.
t O Estrategio, o campo de treinamento militar do império.

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Preparação
Seguindo a estrutura de Desmortos, serão apresentados os elementos
em torno da preparação e condução dos Jogos Silenciosos e Noturnos

Tema
Julgamento: Predadores são dizimados por uma doença, mundana ou
divina

Catalisador
O Legado dos Predadores vazou de dentro da Comunidade, e Presas
da Igreja passam a utilizar métodos para aplacar os Predadores. Um
dos bispos redige um novo documento após uma reunião com outros
membros da igreja. E este documento representa um novo rito religioso,
praticado por todos os cristãos em Constantinopla. Neste momento, o
grupo de jogo criará um Movimento de Legado Personalizado Chagas
Divinas. Esse Movimento de Legado representa os procedimentos de
fé das Presas que afeta a vida dos Predadores, tendo como efeito o cus-
to do dobro de Sangue e menor efetividade de Humanidade (-1) em
todos Movimentos Básicos e de Cartilha até que a Crise seja aplacada.
Sob o efeito deste procedimento que passou a ser uma parte do ritual
cristão ortodoxo, os Predadores passam a manifestar chagas que violen-
tam brutalmente sua imortalidade. Predadores mais fracos, Presas mais
fortes. A fome se torna incontrolável e é necessário ser discreto para não
ser morto.

Cena Inicial
O imperador Maurício discursa da sacada de seu palácio, e há uma mul-
tidão aguardando suas palavras milagrosas. Após comoção pública, ele
profere um discurso que diz que as chagas que acometeram figuras re-
levantes à sociedade não são mais do que a prova que Deus está ao lado
dos verdadeiros herdeiros de Roma. Os que morreram eram pecadores
ou morreram por nós. Aqueles que temem a Deus devem confiar, pois
nunca houve tamanha prosperidade na cidade eterna. Maurício conclui
o discurso dizendo que expurgar o pecado dentro do seio da oikúmene
(comunidade) é a missão do Patriarca que reunirá todos os povos. A
multidão entra em êxtase, os Predadores apavoram-se.

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Puxando os fios
É necessário estabilizar a Comunidade de Predadores, que além da Cri-
se das chagas da fé cristã, está tomada por intrigas internas: é necessário
reaver a força do Sangue. Considere que todos os Predadores possuem
esta Ambição no início do Jogo Noturno, representando o desejo de
sobreviver. Afinal, aos Predadores é certo que as Presas devem voltar ao
seu lugar como rebanho. Contudo, esta manobra deve ocorrer sem que a
ordem do Império se desfaça, uma vez que Territórios de Caça e Tramas
e Esquemas estão em jogo.

Não se esqueça de posicionar os Predadores de Bizâncio no Mapa de


Relacionamentos de Constantinopla. É possível que algum dos Preda-
dores alcancem o posto de Príncipe durante a Jogo Noturno anterior e
Jogo Silencioso. Neste momento da ficção, há mais de um Príncipe. Na
verdade, como há fragmentação política e o poder do Sangue está fraco,
aqueles que sustentam a Comunidade por meio de um grande Conse-
lho. Contudo, durante o fortalecimento da Comunidade de Predadores,
as facções criadas vão disputar a hegemonia. O Mestre de Jogo deve
dinamizar isto. Inicialmente, enquanto debilitados, todos tendem a se
ajudar. Contudo, ao passo que as Presas ficam mais fracas, os Predado-
res desejarão mais status e poder. Garanta que tudo isso faça parte do
Jogo Noturno

PNJS
Os Personagens Não-Jogadores serão listados abaixo. O Mestre do Jogo
terá acesso às suas Ambições e Agenda, que devem ser adequadas à fic-
ção em jogo.

Leôncio (sonhador)
Bispo da igreja cristã, temente às novas práticas das Presas, é um Prín-
cipe do Conselho.
Ambição: Tornar-se o Patriarca e controlar a Comunidade por meio
de sua fé.
1. Encontrar apoio para seus objetivos.
2. Sobrepujar as palavras de Maurício.
3. Colocar-se como centro da teologia do Império

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Ariadne (titeriteira)
Gerente de uma oficina de mosaicos de luxo, faz parte do Conselho
de Príncipes.
Ambição: Expandir seus empreendimentos por todo o Império.
1. Encontrar financiadores confiáveis.
2. Enviar representantes para Dioceses distantes.
3. Implementar outras oficinas, visando expandir seus Territórios de
Caça e áreas de influência

Valentiano (Demônio)
Antigo Patrício membro do partido do governo que foi humilhado e
hoje é um Pária.
Rancor (Leôncio): Quer retribuição. O bispo Leôncio destruiu seu
templo, tomado como profano para ascender na igreja.
1. Expor a todos quem é Leôncio, além de o humilhar.
2. Tomar o que é de Leôncio para si.
3. Assassinar o bispo o oferecer sacrificialmente

Fábia eudóxia (sensualista)


Antiga consorte de Valentiano, atual esposa de Zenão.
Rancor (Valentiano): Quer que abandone sua vingança a todo custo e
volte a ser seu escravo sexual.
1. Encontrar outro Predador para participar da orgia.
2. Levar Valentiano a um profano ritual de sangue e prazer

zenão (lobo)
General de legiões limítanes (exército que defende fronteiras),
figura proeminente e estrategista.
Ambição: Regressar com a ordem em Constantinopla que lá estava an-
tes de sair em campanha com o exército.
1. Encontrar a fonte que reduz a força do Sangue.
2. Buscar uma ação sutil, ainda que brutal, com força e ódio ante ini-
migos.
3. Aniquilar quem maculou o Legado da Comunidade

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Faustina (Pesadelo)
Plebeia que ainda não se casou, tornou-se Escolhida de Fábia Eudóxia
em uma de suas orgias.
Ambição: Encontrar alguma forma para ascender socialmente.
1. Buscar alguém que seja digno na Comunidade.
2. Estabelecer laços com o mesmo e se aproveitar-se disso

Predadores
Os Predadores em Constantinopla iniciam o Jogo Noturno enfraqueci-
dos. Eles vacilaram com o passar dos anos e viram as Presas projetarem
seu poder. Mas tudo tem um limite, e a Crise com as tais chagas divinas
representa isso. O jogo de intrigas dentro da Comunidade de Preda-
dores precisa cessar por um tempo, as alianças precisam ser feitas, caso
contrário, todos serão extintos. Mas veja, a cada passo dado, o tecido
social se altera, mudando a forma pela qual os Predadores se encaram.
Se há uma possível solidariedade inicial, provavelmente isso vai se dis-
solver com o tempo.

Pense em uma Constantinopla cosmopolita, repleta de sons, odores


e sabores. De certa forma, ela se encara como o centro do universo,
herdeira de Roma e de toda a tradição grega, para além de abrigar um
poderoso complexo religioso. Grande parte da produção intelectual da
Antiguidade é preservada e estudada, ao passo que novas estruturas
administrativas se dinamizam. Logo, é possível ser um mercador, um
soldado, uma artesã ou ainda um funcionário do Império. Mas também
é possível fugir destes esquemas, sendo um serviçal ou ainda um estran-
geiro de passagem que regressou à cidade depois de algum tempo fora.
Trabalhe isso ao trazer os Predadores a esta instância temporal.

Rivais, Inimigos e Nêmesis podem colaborar um tanto com os Preda-


dores ou ainda aproveitar as chagas divinas representadas pelo Movi-
mento Personalizado do Legado para dar um fim às suas inimizades. As
Dívidas em um cenário inicialmente tão hostil ganham um peso muito
grande em Constantinopla.

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reviravoltas
Tome uma folha de papel e escreva aleatoriamente cada sentença a se-
guir. Envolva cada sentença em uma elipse. Durante o Jogo Noturno,
lance ao menos uma vez um número de marcadores de Sangue igual ao
número de jogadores sobre a folha. Caso os marcadores caiam sobre as
elipses, aqueles acontecimentos ocorrerão. Você pode criar outras sen-
tenças ou mesmo utilizar conjecturas dos jogadores como sementes de
reviravoltas do Jogo Noturno.

t Uma coluna militar parte do Estrategio visando aniquilar Preda-


dores.
t Cultos antigos voltam a ser praticados. Mas são atacados pelo im-
pério.
t Uma procissão de fé enfraquece os Predadores (todos perdem 3
Sangue).
t Uma crise de produção de alimentos ataca o império.
t Um incêndio começa no Hipódromo.
t Um conflito entre distintos partidos políticos ocorre em praça pú-
blica.
t As chagas divinas começam a afetar Presas. Por qual razão?
t O Predador com mais Sangue é atacado pela milícia das Presas.
t Um bispo relevante é assassinado. Por quem?
t O Sangue das Presas de Constantinopla parece não saciar mais a
sede…

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O Tempo passa
O Jogo Noturno em Constantinopla apenas termina quando os Pre-
dadores conseguirem algum método para reverter o procedimento que
reduz o poder de Sangue da Comunidade. Não há um caminho para
isso, o rito já foi estabelecido. É possível disputar teologicamente, acu-
sar o rito da precipitação de problemas ou mesmo reverter o quadro
pela força. Contudo o mais importante por aqui não é o aplacamento
da Crise, pura e simplesmente, mas as transformações da Comunidade
de Predadores.

Não se esqueça que, conforme os Predadores adquiram poder, maior o


potencial de traições e intrigas. Traga todos os rancores à tona quando
estiver conduzindo o Jogo Silencioso, pois as tensões serão ampliadas
mais ainda quando os Predadores despertarem e voltarem à ação em
Istambul, no tempestuoso século XXI.

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Istambul,20xxEC
Istambul possui seu nome derivado da expressão grega medieval εἰς τὴν
Πόλιν [istimˈbolin] ou, no dialeto egeu, εἰς τὰν Πόλιν [istamˈbolin]
(em grego moderno: στην Πόλι [stimˈboli]), que significa na cidade, à
cidade ou centro da cidade. Trata-se do centro econômico da Turquia,
sendo o principal polo industrial, comercial, cultural e universitário do
país. É também a sede do Patriarcado Ecumênico de Constantinopla,
sede da Igreja Ortodoxa.

Cerne de uma política instável, com a entrada na União Europeia, é re-


pleta de contradições advindas de um governo autoritário, acusado de
apoios a massacres de minorias e suporte ao terrorismo. É um ponto
de contato cultural, onde armênios, judeus, curdos, árabes e turcos pro-
fessam o cristianismo ortodoxo, o islã sunita (maioria) e até o sufismo
é encontrado no que se apresenta como a esquina entre o oriente e o
ocidente. Neste momento da história de Istambul, as ruas sangram.

Não é raro ouvir o chamado às orações do topo de minaretes. Também


não raro ser atravessado por uma massa de trabalhadores que se projeta
de trens e ônibus. Istambul é um local de encontros e confrontos. Con-
trastando com perímetros tomados por arranha-céus, temos o Grande
Bazar, um dos mais antigos e extensos mercados cobertos do mundo.
Por lá, os cheiros e sabores do passado se apresentam ainda frescos.

Istambul é uma cidade contemporânea com problemas do século XXI.


Há áreas com alta concentração de renda, criminalidade urbana e po-
luição crescente, aumentando os problemas de saúde, sobretudo no in-
verno.

Já a política parece mais firme que noutros tempos. Mas apenas parece.
Pendulando entre interesses internacionais e o sufocamento de revoltas
internas, Istambul tem de resolver questões étnicas como a dos curdos
e armênios, e, mesmo sendo uma das maiores capitais do mundo islâ-
mico, receber vários protestos acerca da expansão de direitos humanos.

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Tudo isso se mistura e explode sob asfalto, derrubando prédios adorna-
dos de cápsulas de fuzil. Cânticos religiosos embalam a destruição e os
montes de areia gerados pelos escombros que escorrem pela ampulheta
desta cidade milenar. Todas as tensões que estavam prestes a se revelar
mostram-se mais pesadas, mais intensas. Atentados nas ruas, repressão
do governo, crises migratórias. Predadores precisarão, paradoxalmente,
salvar as Presas. Afinal, o Sangue é precioso, muito precioso.

Preparação
Seguindo a estrutura de Desmortos, serão apresentados os elementos
em torno da preparação e condução dos Jogos Silenciosos e Noturnos.

Tema
Guerra: As presas destroem-se e tudo que está em seu caminho em
uma disputa de armas.

Catalisador
Atentados começaram a ocorrer em áreas turísticas, no aeroporto de
Atatürk e também em centros econômicos, como nas imediações da bol-
sa de valores. A mídia estatal bloqueia a revelação do que está ocorrendo
e os movimentos sociais críticos ao governo que aproveitam o espaço
para protestar são massacrados.

Cena Inicial
Os Predadores encontram-se nas ruas, nas proximidades de um gran-
de boulevard turístico – o Mestre de Jogo deve perguntar “O que cada
um faz ali, naquela noite?”. Eles têm a chance de mitigar os conflitos
de alguma forma, caso desejem. Contudo, eles são surpreendidos por
explosões. Um atentado ocorre no exato momento. As Presas chegam
às vias de fato. Curdos, fundamentalistas, agentes do Estado e assassi-
nos infiltrados. O sangue escorre. O caos reina. É necessário se salvar e
salvar a Comunidade de Predadores.

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Puxando os fios
Os conflitos centrais deste cenário são: 1) As Presas estão se matando, e
isso afeta os Territórios de Caça, bem como toda a estrutura das Tramas
e Esquemas dos Predadores; 2) Alguns Predadores morrem em meio
ao caos e há suspeita que existem membros da Comunidade envolvi-
dos nisso, inclusive você (e pode ser verdade, depende do jogador); 3) A
Princesa morre no atentado e, nesse momento, ninguém deseja ocupar
o seu lugar de liderança na Comunidade de Predadores, com medo de
algum golpe interno. Quem você apoiará? Você deseja ser o líder nesses
tempos de Crise?

Não é necessário deixar evidente que é o conflito generalizado entre as


Presas que gera o caos na Comunidade de Predadores. Afinal, os Preda-
dores são monstros imortais e podem considerar que o gado não detém
poder sobre eles
– ainda que isso não esteja correto, uma vez que viram como Constanti-
nopla foi dominada pelas Presas e tiveram de lutar para se reestabelecer.
Cabe ao Mestre de Jogo intercalar o caos na sociedade – Presas – com
efeitos devastadores na Comunidade de Predadores.

Características
Além das características gerais de Istambul, apresentaremos Fontes de
Tensão e possíveis Territórios de Caça para o cenário. Todas as listas
serão estruturadas por meio de tópicos, a fim de facilitar a consulta pelo
Mestre de Jogo para a condução das partidas e pelos demais jogadores
para o desenvolvimento de seus Predadores. Estes pontos, bem como a
apresentação da cidade e demais elementos da Crise se valem de refe-
rências históricas, mas também apresentam ficções com o propósito de
tornar o jogo mais intenso.

t Istambul é a quarta maior cidade do mundo, com mais de 13 milhões


de habitantes na área metropolitana. A maior parte da população é
muçulmana sunita, porém há xiitas, cristãos ortodoxos, sufis e outras
expressões religiosas.

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t Istambul é a quarta maior cidade do mundo, com mais de 13 milhões
de habitantes na área metropolitana. A maior parte da população é
muçulmana sunita, porém há xiitas, cristãos ortodoxos, sufis e outras
expressões religiosas.
t É uma das cidades que mais abriga refugiados de conflitos no Oriente
Médio.
t A política do país é controversa. As reformas que modernizaram e pro-
jetaram a Turquia são acompanhadas por um grave discurso autoritá-
rio de seus governantes, centrado em aumento do poder centralizado,
redução de liberdades individuais e perseguição de dissidências.
t Os curdos possuem uma grande demografia em Istambul. Por bus-
carem a fundação de um Estado próprio, são perseguidos enquanto
minoria étnica.
t A megalópole Istambul é o pulmão econômico da Turquia, com grande
atividade industrial (bem diversificada), comércio e turismo. Museus,
centros culturais e sítios arqueológicos atraem turistas de todo o mundo

Fontes de tensão
t Tensões étnicas dentro do território são crescentes.
t A restrição da liberdade de imprensa oculta graves questões humani-
tárias.
t O autoritarismo é a palavra de ordem das estruturas governamentais.
t Conflitos internacionais, como na Síria, chegam a Istambul.
t Há o regresso de muitos turcos que foram trabalhar na Europa.
t Atentados e sublevações de todos os lados são cada vez mais recorren-
tes.
t Talvez uma intervenção internacional seja apenas uma questão de
tempo.
t Há interesses da Rússia no território Turco

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Territórios de caça
t Hotéis, mercados e complexo turístico em geral.
t A zona portuária da cidade, fundamental até para o transporte.
t Bairros industriais dos mais diferentes tipos (farmacêutico, metalúr-
gico, etc.).
t Algumas áreas agrícolas que contrastam com o pulsar urbano de Is-
tambul.
t O complexo administrativo municipal de Istambul.
t A Universidade de Istambul e suas diferentes instalações.
t Mesquitas, basílicas e demais templos religiosos

PnJS
Os Personagens Não-Jogadores serão listados abaixo. O Mestre do Jogo
terá acesso às suas Ambições e Agenda, que devem ser adequadas à fic-
ção em jogo.

Belma (loba)
Princesa que tentava gerir a Comunidade. Esposa de um general turco.
Ambição: Estabilizar os pontos de conflito em Istambul.
1. Localizar as fontes da Crise.
2. Destruir o que compromete os Territórios de Caça.

hidal (Demônio)
Teólogo fundamentalista (escolha qualquer religião, é indiferente), Pa-
trício e Criador de Ayberk.
Rancor (Eylem): As Presas devem ser apenas oferendas aos seres
das profundezas, Eylem deve ficar em seu lugar.
1. Conspirar contra Eylem, culpando-a pela Crise.
2. Encontrar aliados à sua causa.
3. Assassinar Eylem

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Eylem (Sonhadora)
Patrícia, líder feminista com grande força junto às Presas. É a Escolhida
de Belma.
Ambição: Promover uma espécie de ideal pacifista em toda a Comu-
nidade.
1. Difundir a inclusão de minorias e com isso ampliar os Territórios de
Caça.
2. Mitigar conflitos entre distintas facções em Istambul.

Zeki (titeriteiro)
Jovem Plebeu famoso, uma personalidade digital por meio de vídeos
sobre jogos em redes sociais.
Ambição: Aumentar sua fama e prestígio, ascendendo socialmente.
1. Ganhar mais seguidores em seu canal, algo difícil em tempos de
Guerra.
2. Se esgueirar do controle midiático do governo.
3. Buscar alianças junto à mídia alternativa, talvez.

dilara (pesadelo)
Plebeia líder do movimento trabalhista curdo. É a Criadora de Zeki.
Ambição: Adquirir mais prestígio por meio da demonstração de poder
dos curdos ante o governo.
1. Expor a todos que há tensões entre as Presas e os Predadores.
2. Se posicionar (apoiando ou mitigando) a escalada de conflitos.
3. Obter espaço para suas Presas de forma clara e legítima na cidade.

ayberk (sensualista)
Patrício, amante do prefeito de Istambul, artista plástico reconhecido
mundialmente.
Ambição: Se tornar o novo Príncipe, a todo custo.
1. Acabar com a atual Princesa e cooptar seu séquito.
2. Tornar-se a principal força, manipulando quem for preciso na Co-
munidade

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Predadores
Istambul é um território tenso. Tenso e intenso. Jogar em Istambul é,
irremediavelmente, se expor. Não há como ficar em cima do muro em
um barril de pólvora que já explodiu. Sim, os Predadores possuem uma
sabedoria milenar, conhecem a não-vida como ninguém, mas talvez es-
tejam presenciando algo distinto de outrora. Não se trata de uma guerra
aberta ou mesmo de uma inadequação às Presas. O caos impera e se
aliar ao autoritarismo do Estado pode ser o caminho mais simples, mas
que derramará mais Sangue. Poderiam os Predadores se aliar às Presas
e lutar com elas para uma melhoria na vida? Você se aliará às Presas para
depois se alimentar delas? Os Predadores demonstram compaixão ou
apenas oportunismo e instinto de sobrevivência?

REVIRAVOLTAS
Em Istambul as reviravoltas não serão necessárias. A propensão ao caos
instaurado com os conflitos armados e a deflagração de uma guerra civil,
com desenhos de intervenção internacional já elevará a tensão a um ní-
vel extremo. Traga isso à ficção por meio da descrição da demonstração
de força do Estado, as distintas organizações militares e paramilitares e
a retratação da guerrilha urbana que se desenha. Não polarize as coisas,
porém. Apresente o tecido social complexo e possibilite espaço para o
desenvolvimento do drama e alianças entre Presas e Predadores. Será
que as bestas sedentas de Sangue demonstrarão emoções, depois de mi-
lênios?

O TEMPO PASSA
Como definir a conclusão do cenário e da campanha? Muitas são as
opções ao Mestre de Jogo, mas acredito que, especificamente para Is-
tambul, as coisas devam mudar um pouco. No lugar do Mestre do Jogo
avaliar se a Crise foi aplacada, serão os jogadores que indicarão quando
o cenário se concluirá. Assim sendo, deixe isso claro aos jogadores na
primeira partida que estiverem jogando o Jogo Noturno em Istambul.
Dessa forma, serão os jogadores que avaliarão o ponto de culminância
da campanha. O gosto amargo, porém, ficará no céu da boca de todos.
Por quê? Porque este final de campanha apenas revela outro hiato. Ou-
tro hiato até outra Crise, até outro Jogo Noturno.

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rupturas e permanências
Bizâncio, Constantinopla e Istambul apresenta a mesma cidade em três
cenários bem diferentes, com questões urgentes que desafiarão os jo-
gadores a alterar sua perspectiva ante a Comunidade, as Presas e a si
mesmos enquanto Predadores. E esse é um ponto que merece muita
atenção.

Quando comecei a pensar neste suplemento, observei que não há ônus


aos jogadores que trocarem as Cartilhas durante o passar de anos. As
recomendações são apenas para que haja coerência ao que foi jogado
e aos novos planos do Predador. Aqui reside uma das mais acuradas
contradições de Desmortos. Os Predadores, de natureza imortal e tes-
temunhas do tempo em uma experiência de longa duração, são fluidos,
fluidos como o Sangue que os alimenta.

Eternidade não significa imobilidade, mesmo aos imortais Predadores.


E jogar com as rupturas e permanências da cidade com o passar dos
anos e com os fragmentos que cada Predador porta de seu passado é
algo muito valioso, ainda que difícil. Nesse sentido, a criação de conflitos
tão diferentes será mais uma camada a impulsionar a ficção: a sedimen-
tação de uma nova Comunidade de Predadores com disputas de poder
em Bizâncio; a luta pela sobrevivência quando as Presas se precipitam
e oprimem os Predadores em Constantinopla; e o conflito entre Presas
que demandará uma ação para seu salvamento pelos Predadores em Is-
tambul.

Um Predador pode ser extremamente violento em Constantinopla, mas


será que ele obtém êxito em Istambul, já que a cidade está em guerra?
O mesmo tipo de conflito se dá ao pensarmos que pode ser crescente o
clima de conspirações e aniquilamento de Predadores em Bizâncio, mas,
logo a seguir, em Constantinopla, será necessário tecer alianças e apoios
com aqueles que você traiu e levou à ruína. A alteração da perspectiva
entre cada instância temporal é parte da proposta de Bizâncio, Constan-
tinopla e Istambul, e cabe ao Mestre de Jogo também dinamizar a Agen-
da de cada Personagem Não-Jogador observando o cenário ao redor.

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Por fim, talvez valha dar um tempo entre os Jogos Noturnos, um inter-
valo de alguns dias ou semanas. Pode ser difícil jogar em circunstâncias
tão diferentes, sobretudo em um jogo que demanda grande entrega às
personagens. Converse com seu grupo de jogo e, literalmente, dê Sangue
nas partidas. Por aqui, agradeço a todos que me acompanharam até o
final deste texto. Desejo ótimas partidas em Bizâncio, Constantinopla
e Istambul a todos.

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