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Contexto de

Renovação do
Serviço Social
Material Teórico
Contexto da Renovação do Serviço Social

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Esp. Mauricio Vlamir Ferreira

Revisão Textual:
Profa. Ms. Rosemary Toffoli
Contexto da Renovação do Serviço Social

• A organização do Serviço Social nos primórdios da profissão


• Desenvolvimentismo e Dependência – O Brasil e o Social após a II
Guerra Mundial e na Guerra Fria
• A Ditadura Militar e as contradições do Serviço Social no Brasil e na
América Latina
• A ruptura do Serviço Social no Brasil e na América Latina
• Considerações Finais

O objetivo dessa unidade:


»» Traçar um paralelo entre a evolução do Serviço Social e o histórico político
social e econômico no mundo do Pós Guerra, bem como a Guerra Fria.
»» Explicar o avanço do capitalismo e dos monopólios como fortes influência
nos governos do Brasil.
»» Identificar a neutralidade da ação do Serviço Social durante os períodos
opressivos de ditadura militar tanto no Brasil, como na América Latina.
»» Ilustrar a intenção de ruptura como um processo de efetivação do Serviço
Social contemporâneo.

Nesta unidade, explicaremos a história do serviço Social no Brasil, partindo da análise conjuntural
do processo histórico social econômico e político brasileiro.

Você vai perceber que a Guerra Fria e a influência norte-americana na política econômica e social
do país contribui para a expansão do modo de produção capitalista no Brasil.

Vamos identificar a postura de neutralidade do Serviço Social e de que forma o conservadorismo


vai estagnar a produção teórica e prática do Serviço Social.

Assim você poderá compreender que o pensamento marxista e a Teoria da Libertação fixarão
bases teóricas no processo de ruptura do Serviço Social.

Também nesta unidade serão abordados os momentos em que a intenção de ruptura deixa de
ser um processo de contestação da profissão para alicerçar as bases teóricas e metodológicas do
Serviço Social contemporâneo.

Nesse processo de aprendizado, será muito importante a sua participação no fórum de discussão
online e também na realização dos exercícios no ambiente virtual.

Lembramos a você a importância de realizar todas as atividades propostas dentro do prazo


estabelecido. Dessa forma, você evitará que o conteúdo se acumule e que você tenha problemas
ao final do semestre.

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Unidade: Contexto da Renovação do Serviço Social

Contextualização

A atuação conservadora do Serviço Social ficou reconhecida desde a sua constituição nos
anos 1930.
Após a 2ª Guerra Mundial, o mundo entrou em um conflito armamentista conhecido como
Guerra Fria, quando se alinharam de um lado os países capitalistas e do outro os países de
ideologia socialista.
Pela influência dos Estados Unidos na América Latina, o Brasil optou por alinhavar uma
condição de aproximação com os conceitos econômicos de expansão capitalista, o que de um
lado contribuiu para a política do desenvolvimentismo e por outro para uma grande capacidade
de endividamento externo, contribuindo para a opressão da classe trabalhadora e para a
dependência cada vez maior da ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Nesse período, o Serviço Social mantém uma posição de neutralidade, seguindo a cartilha
da burocracia e do funcionalismo em sua ação teórica e prática.
Com o golpe militar de 1964 no Brasil, o Serviço Social adquire uma tendência conservadora
indo ao encontro de princípios reacionários do sistema vigente nesse período.
Temendo uma cubanização da América Latina, dos anos 1960 a 1970 a opressão do
sistema capitalista e a forte influência norte-americana também contribuíram para uma postura
conservadora do Serviço Social.
Nos anos 1970, a Teoria da Libertação e as ideias marxistas contribuem para a ruptura do
conservadorismo no Serviço Social no Brasil e na América Latina.
Diante de um período de reorganização dos movimentos sociais, da redemocratização do
país e da mobilização da classe trabalhadora por melhores condições salariais e de vida, o
Serviço Social renova o seu aspecto teórico metodológico contribuindo para a reorganização
da prática profissional e para a formação de um projeto ético-político, construindo as bases
para a contemporaneidade da profissão.

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A organização do Serviço Social nos primórdios da profissão

Os anos 1960 e 1970 foram anos importantes para a transformação do Serviço Social e
sua afirmação como profissão atuante em diversas áreas da sociedade, desde a área social até
a área da saúde, passando pelos setores primários secundários e terciários da produção, ou
seja, o Serviço Social, permeou o trabalho do Assistente Social dentro das indústrias, nas ações
dos governos municipais, estaduais e federais, nos hospitais, nos setores de recursos humanos
das empresas, em creches, escolas, bem como nos sindicatos, associações comunitárias e
organizações sociais do terceiro setor (ONGs).
Esta ampliação da inserção da profissão em diversas áreas permitiu ao Serviço Social a
capacidade de se adequar aos momentos sociais, políticos e econômicos, mesmo que em
alguns momentos essa adequação à realidade do país tenha sido na estagnação, retorno ao
conservadorismo, até se chegar a intenção de ruptura e ao formato contemporâneo como é
a profissão atualmente.
O alinhamento da profissão com os temas sociais, políticos e econômicos do cotidiano se
darão, inicialmente, no governo de Getúlio Vargas, nos anos 1930 e 1940, quando, além
da criação do Ministério do Trabalho e da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), as quais
garantiam vários direitos à classe trabalhadora, inclusive, a organização sindical, Getúlio
anunciou as primeiras medidas de criação de um modelo político de Assistência Social, através
da criação de serviços e institutos que pudessem estabelecer uma participação mínima de
avanços sociais para a classe trabalhadora.
Nesse período, o Governo Vargas desenvolveu um sistema previdenciário, beneficiando os
trabalhadores com direito à aposentadoria, ao pecúlio, em caso de morte do trabalhador, com
a criação dos Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAP’s) para cada categoria profissional.
Além da criação do sistema previdenciário, o governo Vargas criou algumas instituições no
intuito de garantir um sistema de Serviço Social, alinhando trabalhadores e patrões em um
sistema garantido pelo Estado.
No que se refere à coordenação da categoria, a assistência ao trabalhador, ressaltamos,
já na década de 1930, a criação do Conselho Nacional de Serviço Social – CNSS, através
do Decreto-lei n. 1/7/1938, sob a validade do Estado Novo, “com as funções de órgão
consultivo do governo e das entidades privadas, e de estudar os problemas do Serviço Social”.
Entretanto, sua ação efetiva foi muito restrita e caracterizou-se mais pela manipulação de
verbas e subvenções, como mecanismo de clientelismo político, aumentando o prestígio de
Vargas nas camadas mais pobres da sociedade brasileira.
A expansão do Serviço Social nesse período se faz presente na criação do Serviço Nacional
de Aprendizagem Industrial (SENAI), em 1942, e, posteriormente, na criação do Sistema
“S”, ou seja, Serviço Social da Indústria (SESI), Serviço Social do Comércio (SESC), e Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial em 1946, no governo Dutra.
Esses serviços criados visavam atender a demanda de capacitação profissional e atendimento
social à camada urbana da população brasileira.

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Unidade: Contexto da Renovação do Serviço Social

Essas iniciativas tornavam-se estratégicas para governo e empresários, pois o Serviço


Social, no entendimento desses setores, teria a missão de atenuar as demandas da questão
social, fruto da expansão do capitalismo industrial no país.

Assim, a capacitação da massa trabalhadora agregaria o fator de identificação ideológica


com a lógica capitalista, identificando os trabalhadores urbanos como um grande exército de
mão-de-obra.

No sentido da instituição da política do controle social estatal, o governo de Getúlio Vargas


institui, em 1938, o Conselho Nacional de Serviço Social (CNSS), como um organismo de
ação assistencialista e clientelista de distribuição de verbas do governo às camadas miseráveis
da população brasileira.

Também de viés assistencialista e clientelista, em 1942, foi criada a Legião Brasileira de


Assistência, com o intuito inicial de assistir as famílias dos participantes da Força Expedicionária
Brasileira (FEB) que estavam em campo de batalha na II Guerra Mundial.

Na década de 1940, o grande atendimento de Santa Casa – Décadas de 1940. Um dos locais
saúde se concentrava nos centros urbanos, distante de atuação do Serviço Social na saúde.

da população rural. Os grandes hospitais eram


geridos por entidades religiosas, conhecidos como
“Santas Casas”. Nesses locais, o Serviço Social
atuava no atendimento às demandas assistencialistas.

A organização e a formação dos trabalhadores do


Serviço Social era, em seus primórdios, uma função
predominantemente feminina. A Escola de Serviço
Social surgiu em 1936, sob o apoio do Centro de
Estudos de Ação Social, no sentido de atender à
Fonte: novomilenio.inf.br
demanda crescente de trabalhadores qualificados na
área. Tal escola foi anexada em 1947 à Pontifícia
Universidade Católica (PUC) de São Paulo.

A necessidade crescente de profissionais formados, solicitada pelo mercado de trabalho,


motivou a abertura de novos cursos de Serviço Social em diversas regiões do país, além da
criação, em 1940, do Instituto de Serviço Social, atual Faculdade Paulista de Serviço Social
(FAPSS), objetivando a formação e capacitação de profissionais do sexo masculino.

Esta organicidade primária do Serviço Social garantiu a organização do I Congresso do


Serviço Social, organizado pelo Centro de Estudos e Ação Social (CEAS), realizado em 1947,
na cidade de São Paulo. Por meio desse encontro, foi elaborado o primeiro código de ética
da profissão.

O evento foi elaborado também no sentido de subsidiar propostas e ações para o II Congresso
Pan-Americano de Serviço Social, realizado na cidade do Rio de Janeiro, no ano de 1949.

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Desenvolvimentismo e Dependência – O Brasil e o Social após a
II Guerra Mundial e na Guerra Fria

Em meados dos anos 50, o Brasil vivia um clima de euforia sob a liderança do presidente
Juscelino Kubitschek que, com o seu Plano de Metas estabelecia um conceito que prometia o
crescimento do país de 50 anos em 05.
Esta promessa de crescimento nacional coincidia com a perspectiva da expansão do
capitalismo que, entre outras metas, tinha como objetivo a interiorização do consumo.
Nesse período, a expansão capitalista fomentou a instalação de monopólios do capital no país.

Entenda-se por monopólios de capital a expansão do imperialismo, ou seja, a


expansão do interesse estrangeiro pelo controle do sistema produtivo, desde a
Glossário modernização agrícola, criando a expulsão do pequeno agricultor da lavoura,
através da criação de grandes fazendas de produção de insumos como a soja, ao
controle industrial com a instalação de indústrias multinacionais em detrimento do
desenvolvimento da indústria nacional.

De acordo com essa ideologia, a transferência Brasília em construção. Final dos anos 1950. O
Desenvolvimentismo ampliaria a ação ideológica
da capital federal do Rio de Janeiro para Brasília do modo de produção capitalista no Brasil.
constituiria nesse período no símbolo máximo do
crescimento da força de trabalho e da geração de
novos potenciais de expansão e acúmulo da riqueza
no país.

A interiorização do desenvolvimento do Brasil


gerou novos empregos, principalmente no setor
da construção civil e também no setor metalúrgico,
com a chegada das empresas multinacionais
automobilísticas, que se instalaria na região do ABC
paulista, formando um grande parque industrial. Wikimedia Commons

Nesse período, o Serviço Social teve como perspectiva de trabalho o desenvolvimento de


comunidade onde o método de interação, contribuindo para um processo de adaptação e
equilíbrio no envolvimento dos grupos na perspectiva de proporcionar um sentido organizacional
da comunidade, promovendo o fortalecimento cultural social e econômico, na perspectiva do
estímulo e desenvolvimento do trabalho coletivo.

Também nessa época, podemos destacar o trabalho em grupo, que consistia na ação dos
profissionais do Serviço Social na perspectiva de conhecer os conflitos conjuntos dos grupos
no sentido de encontrar soluções e apaziguar o tensionamento social da comunidade atendida.

Esse modelo atendeu, nesse período, a duas expectativas de ação: a ação ideológica e a
ação da propaganda de governo.

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Unidade: Contexto da Renovação do Serviço Social

No sentido ideológico, temos a situação do pós-guerra, quando a disputa ideológica traria


a divisão do mundo entre os países capitalistas desenvolvidos, considerados de 1º mundo, os
países socialistas com uma economia planificada, chamados países do 2º mundo e os países
em desenvolvimento e subdesenvolvidos, identificados como países de 3º mundo.
Dentro dessa classificação, o Brasil seria considerado um país sob alguns aspectos em
desenvolvimento e em muitos outros subdesenvolvido.
Apesar do governo de Getúlio Vargas ter criado um sistema de previdência social, uma
política de Assistência Social, de ter efetivado a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que
foram grandes avanços para uma população que pouco ou nada tinha de direitos, havia várias
lacunas deixadas pelo avanço e expansão do capital, o que no avançar do tempo fomentaria a
organização popular na busca por condições mais dignas de bem- estar social.
Se a elite conservadora, por um lado acreditava que o crescimento em escala industrial era
importante, por outro, negava as condições de desenvolvimento da população no Brasil.
A educação pública era restrita ao ensino básico. A formação intelectual universitária não
garantia acesso à grande maioria da população, tanto na cidade, quanto no campo.
O sistema de saúde público ainda engatinhava, pois não havia um sistema unificado de
atendimento à população.
Portanto, no período do desenvolvimentismo, houve a preocupação em fabricar, construir,
expandir, porém sem a preocupação com as políticas sociais de atendimento à população.
No momento em que os países capitalistas do 1º mundo se preocupavam com a introdução
do wellfare state, ou seja, a política de bem-estar social, no Brasil não houve uma preocupação
mais efetiva de governos e empresários com a questão da regulação social nas décadas de
1950 e 1960.
Somente com a base do modelo desenvolvimentista brasileiro o crescimento econômico
se deu, frente ao clima de euforia pela vinda do financiamento estrangeiro, decorrente de
acordos com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
O endividamento externo e a dependência econômica fizeram com que o Brasil se
aproximasse das ideias e do lado capitalista dos Estados Unidos na Guerra Fria.

“Guerra Fria”: essa denominação se deve ao fato da política de isolamento


econômico, social e cultural entre as potências capitalistas sob a liderança dos
Glossário Estados unidos e os países comunistas liderados pela antiga União Soviética (onde
atualmente se situa a Federação Russa).
Essa mobilização se iniciou ao final da II Guerra Mundial, quando duas grandes
superpotências bélicas se ergueriam no cenário do planeta: os Estados Unidos e
a União Soviética.
A chamada Guerra Fria entraria em ação, tanto na forma de uma corrida
armamentista, em que cada um destes países aumentaria consideravelmente seu
arsenal nuclear, quanto na guerra da propaganda ideológica.

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Para melhor compreensão sobre o período, recomendamos que você assista ao
vídeo Filme 1: “GUERRA FRIA - URSS X EUA”.
O vídeo apresenta o tensionamento entre os países socialistas e capitalistas após a II
Guerra Mundial. O link deste filme pode ser encontrado no material complementar
para atividades de aprofundamento.

No 3º mundo, países subdesenvolvidos e em desenvolvimento ficariam a mercê da ajuda


econômica de órgãos como o Banco Mundial e o FMI para resolverem seus conflitos internos,
porém aumentando consideravelmente suas dívidas e dependência em relação aos países do
1º mundo. Dentre esses países, fariam parte o Brasil, a Argentina, a Índia, e quase todos os
países da África, da Ásia e da América Latina.

Inicialmente utilizado na construção da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), para


construção da usina de Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro, no Governo Getúlio
Vargas, estes empréstimos internacionais também foram utilizados na modernização da
produção industrial de uma maneira geral, na construção de usinas hidroelétricas e até na
construção da capital federal.

Nesse cenário, a ampliação da dívida externa e a aceleração do processo inflacionário


no país ampliaram um clima de acirramento político existente desde a deposição de Getúlio
Vargas, em 1946, e, posteriormente, o seu suicídio, em 1954.

Inaugurada após a II Guerra Mundial, a Escola Superior de Guerra (ESG) formava e preparava
uma elite civil e militar que, posteriormente, estaria envolvida direta e indiretamente tanto na
pressão pelo impeachment de Getúlio Vargas, que desencadeou em seu suicídio; como no
golpe militar de 1964, que acabaria por criar o regime militar no Brasil.

Após a morte de Getúlio Vargas, o clima de golpismo dos segmentos conservadores de direita
teve seu auge na tentativa de se negar a posse ao presidente eleito Juscelino Kubitschek e,
posteriormente, em pequenos levantes na região norte do Brasil, em Jacareacanga e Aragarças.

Porém, a postura conciliatória do governo Juscelino apaziguou as tensões sociais e colocou


o Brasil na pauta do Desenvolvimentismo.

Nesse período, o Serviço Social adotou uma postura de neutralidade política, voltado na
atuação técnica como parte da institucionalidade dos serviços constituídos pela força do capital.

Para a oposição conservadora, restava preparar um candidato forte de oposição com um


discurso moralizante contra a ameaça inflacionária que tivesse como proposta o combate à
corrupção. Esse candidato foi eleito por uma imensa maioria de votos: Jânio Quadros.

A ascensão política de Jânio Quadros deu-se de forma meteórica.

Eleito suplente de vereador em 1947, em menos de 15 anos, Jânio Quadros foi eleito prefeito
e governador de São Paulo, chegando ao seu auge político na eleição presidencial, em 1960.

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Unidade: Contexto da Renovação do Serviço Social

A realidade cotidiana do Brasil, quanto aos aspectos sociopolíticos, desde o início da década
de 1960, era de contrastes e diferenças econômicas entre uma população representada pela
sociedade elitista dominante contra uma maioria empobrecida e explorada. Tal paradigma
nortearia o Serviço Social para os fundamentos do pensamento marxista, consolidando seus
métodos atuais de ação, como conhecemos a ação metodológica da profissão nos dias atuais.
O II Congresso do Serviço Social, realizado no Rio de Janeiro, em 1961, contou com o
apoio oficial do governo federal, sob a presidência de Jânio Quadros, que, aparentemente,
demonstrava conciliar o desenvolvimentismo com o bem-estar social nesta área.

Jânio Quadros em 1960 1961. O governo de Jânio Quadros, tenta a aproximação do


desenvolvimentismo com a política de bem-estar social, porém no
mesmo ano, o então presidente renuncia ao seu mandato.

Tal encontro de 1961 objetivava a discussão da ação dos


profissionais nas várias vertentes de atuação do Serviço Social,
como eram concebidas conceitualmente naquele momento: o
Serviço Social de menores, o Serviço Social de famílias, o Serviço
Social de educação popular, o Serviço Social médico, além do
Serviço Social da indústria, da agricultura e do comércio.
As turbulências políticas decorrentes da renúncia de Jânio
Quadros, bem como as tentativas de políticos conservadores
impedir a posse do vice-presidente João Goulart, que tinha forte
Wikimedia Commons ligação com a classe trabalhadora, ocasionaram no Brasil um
momento único na vida constitucional: o parlamentarismo.

Parlamentismo: é um sistema de governo compartilhado com o parlamento, ou seja, o


congresso nacional. É um sistema de governo em que o poder legislativo (parlamento)
Glossário oferece a sustentação política (apoio direto ou indireto) para o poder executivo.

Logo, o poder executivo necessita do poder do parlamento para ser formado e


também para governar. No parlamentarismo, o poder executivo é, geralmente,
exercido por um primeiro-ministro (chanceler).

Dentro do sistema parlamentarista, há uma divisão de poder entre o presidente, que exerce
uma função representativa e que escolhe o primeiro-ministro. Já o primeiro ministro tem a
função de governar.
Em 1963, após a realização de um plebiscito, o presidencialismo retorna e João Goulart
assume o governo com o poder executivo restabelecido.
Em seus poucos meses de governo, seu mandato assume uma característica de apoio à
organização popular que efetivamente apoia as lutas sociais e as ligas camponesas, instituindo
um forte programa de desapropriação de terras nas margens das rodovias federais para a
reforma agrária.

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João Goulart tomou medidas que visavam ao fortalecimento da política econômica nacional,
como, por exemplo, a criação da lei de remessas e lucros, no sentido de fortalecer a economia
nacional e prestigiar o fortalecimento da burguesia interna do país.
As alianças de João Goulart com as organizações democráticas, Posse de Castello Branco.
de caráter progressista, que desencadearam no apoio dos Estados O primeiro presidente militar
de uma ditadura de mais de
Unidos às forças conservadoras reacionárias de direita que se uniram
20 anos no Brasil.
a segmentos tradicionalistas da igreja católica, que acusavam o
governo de servir ao comunismo internacional.
As forças conservadoras ocasionaram a mobilização classe média
para o apoio e a derrubada de Joao Goulart do poder para garantir um
presidente que defendesse o interesse do capital estrangeiro.
O golpe militar garantiria, assim, a retomada de modelos
conservadores de ação do governo, fazendo com que os direitos e as
garantias sociais criassem um modelo conservador de ação.
Nesse sentido, o Serviço Social se moldaria de acordo com a
situação vivida na época, encaixando-se em um perfil de profissão
burocrática de atendimento ao público.
Wikimedia Commons

A Ditadura Militar e as contradições do Serviço Social no Brasil e


na América Latina

Dentro de um sistema opressivo em que a participação da população não fazia sentido


para os padrões dos governos militares no regime militar, as condições de vida da população
brasileira, a queda do poder aquisitivo da população, misturado com o aumento da produção,
incentivou o Estado a ampliar a área do assistencialismo em detrimento a distribuição de
renda, no sentido de fortalecer a acumulação do capital.
A grande preocupação dos Estados Unidos Nesse período não só em relação ao Brasil,
como em relação aos países da América Latina era evitar a ampliação da experiência do
comunismo desenvolvido em Cuba após a revolução Nesse país em 1959.
As ideias da transformação da sociedade para um modelo socialista repercutiu para os
norte-americanos como uma ameaça ao livre mercado e aos interesses do capitalismo, estando
assim a propriedade privada, e a influência dos Estados Unidos ameaçada.
O movimento de renovação do Serviço Social encontra Nesse cenário de dilemas a discussão
das formas de atuação e condução, uma vez que a profissão passa por um período revisionista,
e até de provar e explicar a necessidade de sua própria existência.
A organização das discussões para a renovação do Serviço Social que ressoariam por anos
na teorização da profissão passa pelo movimento de reconceituação organizado em 1965
através do I Seminário Latino-americano de Serviço Social realizado na cidade de Porto Alegre.

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Unidade: Contexto da Renovação do Serviço Social

Porém a perspectiva modernizadora do Serviço Social pregava o uso positivista, fazendo


uma aposta no retorno das práticas antigas e funcionalistas como modo de afirmação da
prática funcional como elemento principal que se adequasse ao parâmetro social vigente, ou
seja, que se enquadrasse dentro da política repressiva dos governos do regime militar.
O caráter funcional e técnico da prática do Serviço Social também agradava as demandas
técnicas e burocráticas das demandas do atendimento aos usuários, fazendo com que a
prática profissional fosse um atendimento que priorizasse unilateralmente as prioridades de
manutenção da ordem vigente sem a necessidade da organização da sociedade.
O conservadorismo, a manutenção da tradicionalidade, fazia-se impor sobre a formação
dos novos profissionais da área social.
Nesse período a liberdade da ação, a autonomia e a capacidade crítica do profissional, era
negado ao profissional, o que acabava por comprometer a ação do profissional nas relações
de atuação com os usuários.
O conservadorismo e a necessidade de encontrar uma Burocracia nos anos 1970:
identidade própria para o Serviço Social ficou evidente O Serviço Social tenta se afirmar como
uma ciência, porém adota métodos e
após o encontro do Serviço Social na cidade de Araxá
ações conservadoras.
em Minas Gerais no ano de 1967, onde a necessidade da
teorização da profissão se explicitou.
Para tanto uma nova tentativa de garantir ao Serviço
Social um caráter de reatualização da profissão foi a
organização da profissão no encontro de Teresópolis, no
estado do Rio de Janeiro em 1970.
Nesse encontro, há a evidência da afirmação do Serviço
Social como um método teórico e prático para a atuação
dos profissionais junto a sociedade, porém da mesma forma
existe Nesse encontro a defesa das práticas empíricas, com
as técnicas de ação científicas, numa evidente preocupação
da profissão apenas como uma ciência com métodos e
iStock/Getty Images
teorias funcionais.

Para melhor compreensão deste período, recomendamos que você assista ao Filme
2: “Operação Condor”.

O vídeo apresenta a troca de informações entre a CIA e os governos do Brasil, da


Argentina e do Chile no período do regime militar durante as ditaduras militares
nesses países latino-americanos. O link deste filme pode ser encontrado no material
complementar para atividades de aprofundamento.

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A ruptura do Serviço Social no Brasil e na América Latina

Nas décadas de 1970 as contradições teóricas e ideológicas estiveram presentes no mundo


e não podiam deixar de se fundamentar na sociedade da época.
Os aspectos econômicos decorrentes da crise do petróleo do mundo também contribuíram
para a crise do capitalismo, aumentando a opressão à classe trabalhadora em um mundo de
recessão no final dos anos 1970.
O aumento do custo de vida, a falta de participação da população na vida política, somado ao
arrocho salarial, contribuíram para a reorganização do Serviço Social nos países latino-americanos.
O processo de repensar o Serviço Social na América Latina se desencadeou em média, com
a mesma intensidade na medida em que os processos de cerceamento e abertura democrática
acontecesse nos países latino-americanos.
Alguns símbolos ideológicos, teóricos e metodológicos questionavam o sistema opressivo
comandado pelo sistema capitalista.
As ideias marxistas, mais do que um meio de libertação ideológica permitiram a condição do
estudo da dominação do capitalismo, dissecando o processo de exploração da classe trabalhadora.
Desta forma a aproximação das correntes intelectuais da época aproximava os profissionais
do Serviço Social com a análise teórica dos fatos, ligando as novas ideias aos acontecimentos
do mundo em sua volta.
Somado ao marxismo, a Teologia de Libertação criada a partir dos ideais norteadores do
Concílio Vaticano II de considerava a opção da igreja católica pelos pobres, onde a luta contra
a desigualdade social.
Nesse sentido a fé racional, acabava por motivar as organizações sociais nas comunidades
carentes na América Latina e aproximava a igreja progressista do marxismo histórico em
contraponto ao materialismo dialético.
A aproximação do marxismo, da Teologia de Libertação, e dos símbolos libertários da
revolução cubana, acabaram por arraigar um sentimento de luta do Serviço Social, junto a
população, passando os profissionais e o meio acadêmico a ampliar o método de análise para
a transformação social dos sujeitos.
Assim, a intenção de ruptura avançou nas discussões do cotidiano do Serviço Social entre
profissionais, alunos e docentes.
A necessidade da reconceituação definitiva da profissão fez emergir o sentimento de
libertação do conservadorismo das práticas e dos conceitos burocráticos e funcionalistas.
Era necessário avançar o processo de diálogo com a população e os movimentos sociais
que se organizavam cada vez mais no processo de redemocratização e de reorganização da
luta social.
Assim no ano de 1978 na cidade de Sumaré no estado de São Paulo, o Serviço Social
entraria na fase da intenção de ruptura, onde a renovação proposta, visava se contrapor à
prática instituída no sistema vigente na época, ampliando o conceito teórico, político cultural
e alterando a prática cotidiana, sob forte influência do marxismo e da Teologia da Libertação,
conforme visto anteriormente.
15
Unidade: Contexto da Renovação do Serviço Social

Nesse mesmo momento em 1978 é realizado o I Encontro Nacional dos Estudantes de Serviço
Social, que também se alinhavam ao processo de ruptura ao tradicionalismo do Serviço Social.
Na produção de conteúdo escrito, destaca-se a criação da revista ”Serviço Social &
Sociedade” no ano de 1979.
Num período de redemocratização era evidente que os novos debates e as novas ideias
contribuíram para a reorganização da profissão.
As ideias novas construíram alicerces e se fortaleceram dentro das universidades, por sua
capacidade de inovação de projetos, onde a pesquisa e a extensão dos estudos era um bom
motivo para a aplicação de novos métodos e práticas.
Os campos de estágios serviram para por em prática as formulações teóricas, encontrando
espaços também para os novos Assistentes Sociais que surgiram no mercado de trabalho
Nesse período.
A prática da intenção de ruptura Nesse período seria levada para as camadas mais precarizadas da
classe trabalhadora, nos núcleos urbanos relegados a periferia das grandes cidades.

A intenção de ruptura a partir de então passa a ocorrer em três períodos:

Emersão Este momento acontece com a introdução do Método BH que foi desenvolvido
na Pontifícia Universidade de Minas Gerias (PUC/MG). Em Belo Horizonte,
no inicio da década de 70. Os movimentos sociais e operários se destacavam
também entre o movimento estudantil e o interesse do conhecimento das
ideias socialistas.
O Método BH encontraria uma grande crítica no fato em que a sua prática
utilizou recursos positivistas em sua implantação, misturando a inovação dos
conceitos de estudo das relações sociais com instrumentos antiquados de
análise científica.

O Método BH foi introduzido na cidade de Itabira em Minas Gerais, sendo um


método experimental que pregava uma teorização crítica da pratica ao tradicional
do Serviço Social, propondo uma teórico-metoxdológica, para a intervenção
profissional e na formação profissional. O primeiro trabalho de implantação
deste método foi no município de Itabira.

Consolidação Este momento compreende um período de reposicionamento acadêmico,


Acadêmica propondo um novo momento de rompimento com o Serviço Social tradicional,
sendo sua principal ação, o diálogo e a troca de experiências permanente
entre os profissionais dentro das universidades, com vários encontros, debates
e seminários na busca de um novo caminho para o Serviço Social, através
do desenvolvimento de uma produção intelectual criativa, inovadora e
ativamente preparada para produção de conteúdos e bases teóricas para a
prática profissional, onde o marxismo se torna o símbolo da nova fase.

Espraiamento Este momento acontece no período em que o III Congresso Brasileiro de


Assistentes Sociais é realizado na cidade de São Paulo. Conhecido como o
“Congresso da Virada”, este encontro marcou significativamente os rumos do
Serviço Social tanto na reformulação teórica e prática profissional.

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Este processo de amadurecimento do Serviço Social resultou na implantação de um novo
código de ética profissional em 1986, na quebra do monopólio conservador e na consolidação
de um projeto ético-político profissional nos anos 90.
A aproximação do marxismo, da Teologia de Libertação, e dos símbolos libertários da
revolução cubana, acabaram por arraigar um sentimento de luta do Serviço Social, junto a
população, passando os profissionais e o meio acadêmico a ampliar o método de análise para
a transformação social dos sujeitos.

Greves do ABC em 1978. Os ares da redemocratização


e a inovação das relações sociais aproximam o Serviço
Social dos conceitos marxistas, da inovação teórico-prática
e intensificam a intenção de ruptura do da profissão.

Fonte: une.org.br

Para melhor compreensão deste período, recomendamos que você assista


ao Filme 3: “Entrevista com Professor norte-americano Noam Chomsky”.
O vídeo apresenta Chomsky explicando a teologia de libertação da igreja católica
e de que forma os Estados Unidos contribuíram para o conservadorismo católico
no nosso tempo atual. O link deste filme pode ser encontrado no material
complementar para atividades de aprofundamento.

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Unidade: Contexto da Renovação do Serviço Social

Considerações Finais

Nesta unidade você conferiu que o Serviço Social em seu início teve uma forte ligação com o
conservadorismo e de alinhamento com as políticas dos governos e da burguesia, influenciado
pelas ideias positivistas, marcas teóricas e metodológicas conservadoras.

Após a 2ª Guerra Mundial, no período da Guerra Fria, o Serviço Social se constituiu em uma
postura de neutralidade política, e voltado na atuação técnica como parte da institucionalidade
dos serviços constituídos pela força do capital.

O Serviço Social de Grupo começa a se cristalizar nas décadas de 1940 e 1950 como uma
força atuante na profissão, consistindo no trabalho coletivo tendo em sua origem a aplicação
principal em centros sociais e comunitários, com o atendimento voltado principalmente ao
atendimento dos trabalhadores e seus familiares.

A grande preocupação dos Estados Unidos Nesse período não só em relação ao Brasil,
como em relação aos países da América Latina era evitar a ampliação da experiência do
comunismo desenvolvido em Cuba após a revolução Nesse país em 1959.

O endividamento externo e a dependência econômica, fizeram com que o Brasil se


aproximasse das ideias e do lado capitalista dos Estados Unidos na Guerra Fria. Dentro
deste contexto, o Serviço Social atuaria de forma funcionalista, lidando com as demandas do
atendimento público e da iniciativa privada, sem levar em conta a participação da sociedade
nos momentos de influência política no Brasil.

O Serviço Social após o golpe militar de 1964 se moldaria de acordo com a situação vivida
nesta época, se encaixando em um perfil de profissão burocrática de atendimento ao público.
Decorrente da crise econômica mundial, na década de 1970, o processo de repensar o
Serviço Social na América Latina se desencadeou em média, com a mesma intensidade na
medida em que os processos de cerceamento e abertura democrática também acontecia nos
países latino-americanos.
A prática da intenção de ruptura do Serviço Social encontraria no marxismo e na teoria de
libertação no final dos anos 1970 e início dos anos 1980 levaria a condição teórico-prática
para as camadas mais precarizadas da classe trabalhadora, nos núcleos urbanos relegados a
periferia das grandes cidades.
A intenção de ruptura a partir de então passa a ocorrer em três períodos:

Emersão Consolidação Acadêmica Espraiamento

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Material Complementar
Para um melhor aproveitamento de seu estudo, sugerimos os recursos didáticos de livros e vídeos.
Todo o material pode ser encontrado na internet, sendo que os livros podem ser baixados
em arquivo PDF.

Vídeos:
Filme 1: “Guerra Fria - URSS X EUA”
Acesse o link: - https://www.youtube.com/watch?v=IIffbV6ZDgg
Filme 2 : “Operação Condor”
Acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=7gX35htXVx8
Filme 3 : “Entrevista com Professor norte-americano Noam Chomsky”
Acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=kMJhtNQVBDw

Livros:
Livro – “Ditadura e Serviço Social. Uma análise do Serviço Social no Brasil pós-64.”
- Autor: José Paulo Netto
Acesse o link: http://goo.gl/BCIjBH
Livro – “Ideologia do Desenvolvimento de Comunidade no Brasil.” - Autora: Safira Amman
Acesse o link: http://goo.gl/ZqwgxH
Livro – “Renovação e Conservadorismo no Serviço Social: Ensaios Criticos” - Autora:
Marilda Iamamoto
Acesse o link: http://goo.gl/0h0KGK

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Unidade: Contexto da Renovação do Serviço Social

Referências

NETTO, J. P. Ditadura e Serviço Social. Uma análise do Serviço Social no Brasil pós-64.
8ªed. São Paulo. Ed. Cortez. 2005.

AMMANN, S. B. Ideologia do Desenvolvimento de Comunidade no Brasil. 10. ed.


Sao Paulo: Cortez, 2003.

IAMAMOTO, M. V. Renovacao e Conservadorismo no Serviço Social: Ensaios Criticos.


7. ed. Sao Paulo: Cortez, 2004.

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Anotações

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