A minha perspectiva e sentimentos em relação à morte, consiste na
adopção de uma atitude de receio e medo. Medo em relação ao
desconhecido, medo de deixar de ser e deixar de estar junto dos que conheço e amo. As minhas experiências têm sido dolorosas, enfrentei a morte de pessoas significativas e que amo muito. Não há muito tempo, sensivelmente dois meses atrás, faleceu uma amiga minha, da minha idade. O sentimento de perda, de dor, de revolta e sentimento de injustiça são enormes. O sofrimento é demasiado grande e a saudade acompanha-me… Inevitavelmente, confronto-me com a minha própria morte, com os sonhos por concretizar, com os projectos inacabados,… Toma lugar a sensação de que o tempo pára, de que muitas das nossas actividades e atitudes não têm o mínimo sentido e importância. Por vezes, chateamo-nos com os outros, geramos energia negativa e conflitos, não tendo consciência dos danos que causamos à nossa volta e do precioso tempo que perdemos aborrecidos com os outros, com as coisas, …., com o mundo. Do pouco que vivi, captei a seguinte mensagem – é importante dizermos às pessoas que amamos, o quanto realmente as amamos e aproveitar cada dia que vivemos. Ao longo dos meus estágios, tive algumas oportunidades de contactar com doentes moribundos. Nomeadamente, no estágio que optei por fazer no serviço de Cuidados Paliativos, do Instituto Português de Oncologia de Francisco Gentil, em Coimbra, pude experienciar vários momentos e estádios por que passa um doente oncológico em fase terminal. Vários foram os momentos que experienciei e, aprendizagens que pude obter, de modo a tornar o meu percurso de desenvolvimento pessoal mais rico e diversificado. A minha actuação baseou-se na presença junto do doente e contacto directo com este, proporcionar-lhe o conforto possível e experienciar como se desen 1111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111 1111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111 1111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111 2222222222222222222222222222222222222222222222222222222222222 222222222222 , , ue, os doentes não acompanhados pela família, acabam por passar muitas horas do dia sozinhos. Ao longo do estágio deparei-me com várias situações e tomei contacto com diversos doentes em fase terminal mas, com diferentes estadios da doença e diferentes estados de espírito. Percebi como é importante para um doente em fase terminal acontecimentos simples como as refeições e os cuidados de higiene, por exemplo. Para uma pessoa com uma doença terminal e, para quem já não existe esperança de cura, acções e acontecimentos que aos nossos olhos não têm grande significado, tomam uma importância fulcral. O simples facto de, poder lavar o rosto com as suas mãos, de conseguir vestir a sua roupa, ouvir aquela música especial, ... Acções que podem ser motivo de muita alegria, sentimento de realização e satisfação que, podem ser proporcionadas aos doentes. Em muitos momentos, estive junto de pessoas que estavam muito debilitadas e prostradas e, estive realmente presente de corpo e alma, com tudo o que sou e que pretendo ser. Não pude, por vezes, de me deixar de sentir completamente impotente, triste e melancólica. Outras vezes, como que imersa numa tranquilidade e paz angelical. Em perfeita harmonia com o mundo, com o que se passa à minha volta, com a ideia de que viver é bom e que devemos aproveitar a nossa pequena existência a cada momento, com a ideia de comunhão com o outro numa imensa família que é a Natureza. Muitas pessoas transmitiram-me confiança, calma, energia, tranquilidade e amor, a sensação de que tinham plena consciência de que a morte estava presente, que sabiam que iam morrer mas que isso não era preocupante, tinham realizado tudo o que pretendiam, tinham alcançado os seus objectivos e a realização era plena. Em muitos casos, talvez pelo facto de, muitas das pessoas estarem num estado de grande exaustão e já terem sofrido muito, fiquei com a sensação que a morte chega calma e docemente. Várias foram as situações que, tive oportunidade de acompanhar mas, uma situação em especial deixou-me muito sensibilizada. Fiquei muito angustiada e preferi abstrair-me da situação de tanto sofrimento para a doente e sua família. A doente, a quem tinha sido diagnosticado, há um ano atrás, cancro da mama, deu entrada na unidade de Cuidados Paliativos num estado de evolução da doença muito avançado, com metástases a vários níveis, inclusive a nível cerebral. Em relação ao seu caso, tenho poucas informações porque na altura não consegui aproximar-me mais, apenas entrei uma vez no quarto da doente, colaborei na prestação dos cuidados de higiene e conforto e falei com a sobrinha que estava junto dela. Adoptei uma estratégia de resolução de problemas, provavelmente, não muito correcta mas, naquele momento não consegui agir de outra forma. Foi um grande choque quando vi a doente, apercebi-me do quanto o Ser humano é frágil e vulnerável e, de como podemos, de um momento para o outro, sucumbir a uma doença. A doente era jovem, estava emagrecida, muito debilitada, desidratada, com alopécia total, completamente dependente e prostrada na cama. Não falava, o seu olhar não fixava os nossos olhares e não se alimentava, apenas gemida de dor à mobilização. Estava completamente dependente, num estado comatoso e de muito sofrimento. Como mulher senti-me angustiada, com medo e aterrorizada com o Cancro da mama. Não pude deixar de me rever naquela situação, de imaginar que aquilo pode acontecer a qualquer pessoa, quando menos se espera e, de súbito alterar toda uma vida. A pessoa estava irreconhecível, segundo a familiar presente. Com futura profissional, a morte será uma constante no meu percurso! Deste modo, os meus medos, preconceitos, receios e estratégias de coping utilizadas poderão, de certa forma, influenciar a minha tomada de decisão e atitudes mas, o importante a reter e uma das grandes aprendizagens que fiz na minha pequena, mas não insignificante, caminhada. A descoberta de que cada momento é único, irreversível e majestoso! De como é importante amarmos e dizer às pessoas que amamos, o quanto as amamos. Despertar para a vida e não viver inconscientemente, surpreendermo-nos com o mundo e maravilharmo-nos com o milagre da vida. Pensar que, apesar do meu medo da morte e de não saber o que é morrer, este é também um objectivo da vida!