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resumo Tendo como pano de fundo a expe- jaz em lama podre e de cheiro inconfundível,
riência de trabalho de campo no bairro de Peixi- onde nem os urubus querem pousar, onde se
nhos em Olinda, o presente artigo busca levantar joga adolescentes assassinados chamando-os de
algumas questões relacionadas à importância de se presuntos, onde o lixo exala a situação do povo.
considerar narrativas cotidianas, de passado e iden- (Paula, 1999, p. 15)
titárias, assim como as realidades por elas cons-
truídas nas análises antropológicas. O trabalho Lugar antes considerado “terra de índio” se-
discute a abordagem do psicólogo Jerome Bruner gundo dona Ester, “terra de homens valentes
em torno do que ele chama de “realidades narrati- de peixeira na cinta”, hoje uma das regiões mais
vas”, seus diálogos implícitos com a antropologia, violentas de Olinda, Peixinhos gerou e ainda
como com o conceito de cultura geertziano e com gera grandes movimentos sociais, e pessoais
as discussões atuais na disciplina sobre a análise de (por que não?), dos quais seus moradores se or-
processos de subjetivação. A idéia é pensar critica- gulham, e de cujas memórias compartilham.
mente o alcance e limites da teoria de cultura de Um desses movimentos pessoais vitoriosos
Clifford Geertz e apontar como alternativa alguns foi o de Zuleide de Paula, que em 1999 teve um
dos conceitos de Homi Bhabha acerca da agência livro publicado – uma de suas “realizações mais
social, da subjetividade e do pertencimento cultu- profundas” (p. 11) – reunindo memórias suas
ral a partir de um olhar atento a dinâmicas sociais e de outros moradores do bairro, sobre estórias
e políticas que influenciam e definem grupos en- do passado, da infância, das antigas manifesta-
quanto tais. ções culturais de rua, dos cultos religiosos, das
palavras-chave Realidades narrativas. Antro- mobilizações em nome de reivindicações polí-
pologia da subjetividade. Agência social. Jerome ticas e da sua organização em torno de creches,
Bruner. clubes e centros culturais.
As memórias no livro vão se tecendo quase
com vida própria: os edifícios se ligam aos per-
Dizem que o bairro de Peixinhos começou sonagens, um a um tomando forma. Entre elas
como um engenho no século XVII, mas o que está a memória do já mencionado Matadouro,
vive mesmo na memória de seus moradores é o inaugurado em 1919 e por muito tempo o cen-
antigo matadouro. A construção, que antes era tro da vida dos moradores de Peixinhos. Apesar
o coração do bairro e o sustento da maioria das de fechado em 1970, sua constante presença e
famílias, continua lá, enorme, com uma parte visibilidade o mantiveram como um espaço li-
recém-reformada, palco de disputas políticas, e minar, não apenas pelas figuras que lá passaram
outra apodrecendo com a ação do tempo, do a freqüentar, como os meninos “cheira-cola”,
lixo, dos ratos e urubus. Assim como o rio que mas também por carregar a memória dos ve-
dá nome ao bairro. Divisa de Olinda e Recife, o lhos da comunidade. A cada olhar para o pré-
que antes era um rio cheio de peixinhos, hoje, dio, os fantasmas do passado se erguem para
diz Zuleide, aqueles que então viveram a sua época áurea.
Num livro verdadeiramente dialogado e pagar uma viagem a São Paulo e Rio de Ja-
dialógico em termos bakhtinianos, Zuleide dá neiro para que uma comissão de moradores
voz aos velhos – Maria Gadelha, senhor Biu da visse o quão “seguro” era o funcionamento
Procissão, dona Duda, dona Ester, seu Efigê- deste tipo de instalação. Depois de um em-
nio, senhor Caetano, Oriosvaldo e muitos ou- pate na comissão, os moradores decidiram
tros – e faz do leitor um interlocutor de uma que não assinariam o documento dando seu
conversa informal: consentimento para a Prefeitura efetuar a
obra. Como esta resolveu ignorar a decisão
O nome da rua da Harmonia foi trocado para dos moradores, mais atos públicos, reuniões
Terezita Bandeira. Quem trocou? Quem é ou e debates nas ruas e esquinas, passeatas, peças
foi Terezita Bandeira? Você sabe? Nem eu. (Pau- de teatro, shows, palestras:
la, 1999, p. 15)
No dia 20 de agosto saiu no Diário Oficial que
A marca dialógica, em que múltiplas vo- Peixinhos não seria depósito de lixo. (...) Em 21
zes da memória discursiva de uma formação de setembro de 1984, às 20 horas, no pátio da
social se mostram em sua heterogeneidade feira, houve a grande festa da vitória. Comemo-
(Fiorin, 2004), emerge a partir do seu tom de ramos com shows, poesias, repentistas, ciranda,
denúncia em relação à violência e ao descaso o bloco da cobra e muito mais. (Paula, 1999,
público: como muitas das mulheres no bairro, p. 101)
Zuleide sofreu a perda de um filho, “vítima
do descaso da saúde pública em nosso Estado Entre as narrativas de mobilização, a luta
para com os que não têm alto poder aquisiti- contra o lixo se tornou recorrente. Tanto assim
vo” (Paula, 1999, p. 11). A dialogia também que um recente movimento musical no bair-
emerge nas diversas referências às mobiliza- ro, iniciado em 1995, foi batizado de Boca do
ções dos moradores: Lixo, trazendo à memória a luta coletiva, como
se quisesse marcar a resistência como espécie de
Da próxima vez que o povo for considerado vocação da comunidade. Os jovens do Boca do
como verme, entre na luta também, pois lem- Lixo foram inicialmente impulsionados pelo
bre-se que cruzar os braços não leva a nada. espaço que o movimento Mangue Beat de Chi-
(Paula, 1999, p. 102) co Science e Nação Zumbi havia conseguido
na mídia, e como dois dos músicos do Nação
Uma dessas mobilizações foi a “luta Zumbi eram originários do bairro, descobria-se
contra o lixo” que durou quase um ano, de ali outra vocação: a vocação para a cultura. À
novembro de 1983 a setembro de 1984, ini- medida que o Mangue Beat toma envergadura
ciada quando descobriram que seria instala- nacional, o movimento Boca do Lixo se afirma
da no bairro uma estação de transbordo de enquanto expressão cultural local.
lixo. Seu lema era: “Peixinhos não é penico”. Protagonistas de narrativas de passado e
Depois de um primeiro ato público, a Prefei- memória, o Matadouro, a luta contra o lixo
tura concordou em dialogar com os morado- e o movimento Boca do Lixo reinscrevem o
res, e, para convencê-los a consentir com a passado, reativam, reposicionam, resigni-
obra, exigência dos financiadores internacio- ficam-no. Essa habilidade, de acordo com
nais, passou a mandar técnicos para reuniões Homi Bhabha:
semanais no bairro, chegando até mesmo a
E não apenas ela. Nesse mesmo movimen- Lixo em Peixinhos como pano de fundo, a dis-
to do quase-grito de memória, quando se anda cussão aqui colocada tem menos a pretensão de
por Peixinhos e se conversa com seus morado- oferecer respostas definitivas, e mais de levantar
res, jorram narrativas cotidianas, marcadas por questões relacionadas à noção de realidades nar-
episódios de nascimento e morte, violência e rativas e à idéia da construção narrativa como
marginalidade, que pulsam como o extraordi- elemento de mediação entre subjetividade e
nário tornado ordinário; jorram também nar- cultura e como lócus de agência social.
rativas do passado, memórias alimentadas pelo Partindo dos escritos de Jerome Bruner, um
presente; e jorram narrativas identitárias, parte psicólogo que colocou no cerne de suas reflexões
do jogo político em que a regra é a da lingua- a discussão sobre realidades narrativas, a primei-
gem do pertencimento cultural. ra questão abordada é a importância de se con-
A proposta do presente artigo é apresentar siderar a narrativa não apenas como objeto de
algumas reflexões que emergiram a partir do estudo, mas também instrumento de metacog-
meu contato com o livro de Zuleide e a partir nição no fazer antropológico. Defendo a impor-
das tais narrativas cotidianas, identitárias e de tância de uma reflexividade crítica em relação
passado com que me deparei como antropóloga às narrativas antropológicas, uma vez que estas
estudando uma organização não-governamen- não são exteriores ao mundo social sobre o qual
tal organizada por moradores do próprio bair- discorrem, mas nele se inserem e nele provocam,
ro.2 Apesar de não diretamente ligadas a meu muitas vezes, efeitos sociais que não podem ser
tema de pesquisa, certas questões a tangencia- desprezados nos estudos antropológicos.
vam constantemente na minha experiência Levar a sério a idéia de realidades narrativas
em campo: como levar a sério tais narrativas e incita reflexões metodológicas, como se verá na
incorporá-las em minha análise? Que tipos de primeira parte, porém também teóricas, como
conseqüências metodológicas e teóricas advi- será explorado em um segundo momento. O
riam de tal postura? Como pensar uma certa objetivo, na segunda parte, é o de apresentar os
agência social a partir da construção narrativa pressupostos da “psicologia cultural” que Jero-
de uma comunidade, como nos sugere Homi me Bruner busca fundar, baseada no estudo da
Bhabha? Tendo o livro de Zuleide, o Matadou- narrativa como mediadora de um mundo canô-
ro, a luta contra o lixo e o movimento Boca do nico cultural e um mundo idiossincrático. Ape-
sar de tal discussão estar situada dentro de um
2. Minha pesquisa propriamente dita estabelece como contexto específico de discussão teórica, o da
objetivo central elaborar uma etnografia que trace
academia norte-americana, tal reflexão torna-se
conexões entre organizações não governamentais
(ONGs) em Recife e Olinda, especificamente as que interessante para uma discussão antropológica
atuam em torno da “área da infância e adolescência”, mais abrangente por dois motivos. O primei-
e agências financiadoras internacionais. Parto da re- ro é o fato das concepções de Bruner terem
lação entre três ONGs em Recife e Olinda, cujos sido bastante influenciadas pela antropologia
integrantes são moradores das próprias “comunida- interpretativa de Clifford Geertz. A intenção
des” dentro das quais oferecem há cerca de 20 anos
aqui, no entanto, não é a de analisar minucio-
atividades extra-escolares para crianças e adolescentes
(Galpão dos Meninos e Meninas de Santo Amaro, Reci- samente o conceito de cultura semiótico de tal
fe; Grupo Sobe e Desce de Olinda; e Grupo Comunidade antropólogo, tampouco explorar seu uso de
Assumindo suas Crianças, em Peixinhos, Olinda), e a certa linha da filosofia da linguagem, mas sim-
agência financiadora católica inglesa, Catholic Agency plesmente expor como esta psicologia cultural
for Overseas Development (CAFOD), que as financia dialoga com o conceito de cultura geertziano.
desde sua origem.
Em segundo lugar, tal discussão importa para a De fato, não há antropólogo que não tenha no
antropologia porque tangencia uma preocupa- cotidiano de seu campo a experiência da incon-
ção recente em pensar a subjetividade a partir gruência e ambigüidade, através de estórias nar-
de uma perspectiva antropológica. radas de diferentes maneiras, construções diversas
Assim, na parte final, após discorrer acer- de experiências comuns. Segundo Jerome Bruner
ca da tentativa de Bruner de analisar a relação (2001 [1996]), todos nós vivemos em um mar de
entre mundo cultural e mundo idiossincráti- estórias, e como os peixes, que são os últimos a
co através da narrativa, passo para a discussão enxergar a água, temos dificuldades em compre-
empreendida pela antropóloga Sherry Ortner ender o que significa estarmos mergulhados em
(2005), sobre um esforço que está sendo feito estórias. Se as narrativas constroem realidades, e
na antropologia atual para se pensar a configu- são estas realidades que buscamos enquanto aca-
ração cultural da subjetividade. Apesar do tema dêmicos, como se daria o esforço por uma antro-
não ser novo na disciplina, as formas de explo- pologia que tentasse enxergá-las através deste mar
rá-lo o são. Procuro sugerir algumas das idéias de narrativas, tão onipresente e automático?
de Homi Bhabha como um possível caminho Para Bruner, haveria três antídotos clássicos
para essa linha de pesquisa. contra a inconsciência do automático e do oni-
presente. Os dois primeiros são o contraste e a
confrontação de versões de realidades narrativas
Seguindo narrativas: a sensibilidade que colidem entre si. O terceiro é a metacogni-
metacognitiva no fazer antropológico ção, que transforma os argumentos ontológicos
sobre o “ser”, sobre a natureza da realidade, em
Em um livro fenomenal escrito em 1954, argumentos epistemológicos sobre o “saber”,
o antropólogo Edmund Leach, com suas pró- sobre as maneiras como nós conhecemos. O ob-
prias rixas domésticas com o funcionalismo jeto do pensamento é o pensamento em si, que
britânico, escrevia o quanto o antropólogo, em nesse caso é dirigido aos códigos de linguagem
seu trabalho de campo, deparava-se não com que organizam e expressam os pensamentos. Se
sistemas lógicos passíveis de dedução através o contraste e confrontação nos alertam para a
da observação participante, mas sim com um relatividade do saber, a metacognição possibili-
mar de incongruências e contradições. Perce- ta uma postura aberta em relação às formas do
bendo que as incongruências faziam parte de saber e de elaboração da realidade, ou seja, das
uma dinâmica política local por legitimidade construções de diferentes ontologias.
e posições sociais, uma das conclusões a que Vivemos a maior parte de nossas vidas em
chega é a da necessidade de se levar a sério as um mundo construído de acordo com as re-
ambigüidades, e não rejeitá-las como poluição gras e os recursos da narrativa. Voltar nossa
para a sistematização dos dados.3 atenção às narrativas é chave para compreender
a(s) realidade(s) construída(s), realidades estas
3. O autor tenta demonstrar como as versões dos mi- disputadas e compartilhadas, e as dinâmicas so-
tos para os Kachins são fundamentais e significativas
ciais em torno delas, em termos de conflitos e
para justificar posições sociais. As histórias que recon-
tam, que elaboram sobre suas tradições, servem para alianças. Mas não apenas. Como antropólogos,
justificar querelas, legitimar costumes e acompanhar ao irmos a campo, vamos repletos de narrativas
representações religiosas, não havendo, portanto, ver- próprias e nos deparamos com mundos outros
sões autênticas. A divergência entre versões se relacio- narrados. Em uma de suas análises do discurso
na com o interesse dos indivíduos e com o status das narrativo, Bruner (1986) mostra como o modo
linhagens (Leach, 1996 [1954]).
paradigmático (lógico-científico) de pensamen- para citar apenas algumas, alimenta-se das re-
to, típico da ciência, compartilha a narrativi- alidades narrativas do mundo social, frequen-
dade com o modo de pensamento narrativo temente “antropologizadas”, por assim dizer,
propriamente dito. Tanto o modo de pensa- ou seja, que incorporam conceitos consagrados
mento paradigmático (lógico-científico) quan- na disciplina como o de “cultura”.4 A relação
to o narrativo se utilizam de certos elementos entre tais narrativas se dá como um ciclo vir-
do texto literário que contribuem, segundo tuoso, como numa condição de hibridez bha-
Bruner, para o que Wolfgang Iser, em uma obra bhaniana, em que narrativas antropológicas e
chamada The Act of Reading, de 1978, inspirado antropologizadas nunca simplesmente “são”,
por Barthes, chama de “subjuntivizar a realida- mas estão sempre “sendo”, continuamente em
de” (estar em modo subjuntivo), ou seja, se re- construção umas a partir das outras.
ferir a possibilidades e não a certezas, tornando Em Peixinhos, o resgate de narrativas do
o mais aberto possível o significado do texto, passado se liga a reivindicações políticas frente
compartilhando com o leitor a responsabilidade ao Poder Público que tomam a forma de afir-
por sua interpretação. Ambos, portanto, o tex- mação de uma cultura comum. No Brasil, não
to literário e o texto científico, utilizam-se em só as demandas das populações indígenas, mas
graus distintos de: a) ativação de pressupostos, também de comunidades remanescentes de
isto é, criação de significados não explícitos, quilombos estão na ordem do dia no que con-
fazendo com que a liberdade interpretativa do cerne ao resgate do passado e de uma genealo-
leitor aumente; b) subjetivação, percepção das gia comum que legitime reivindicações legais.
realidades não através de um olhar onisciente, No mundo todo, é generalizado o uso da idéia
mas através da consciência de protagonistas; e
c) perspectivas múltiplas, como um conjunto 4. Penso aqui em situações em que as narrativas antropo-
de prismas (cf. Bruner, 1986). lógicas e os conceitos que estas carregam exercem certos
Se ambos, o mundo social e o mundo cien- efeitos sociais e se tornam relevantes em determinadas
dinâmicas sociais, como, por exemplo, em situações em
tífico-acadêmico, são marcados pela narrativi-
que obras de Pierre Verger são usadas por grupos de
dade, devemos incorporar no nosso método terreiros como forma de aprenderem o conhecimento
científico uma constante sensibilidade meta- “puro” que possa legitimar sua prática. Para usar um
cognitiva, um perene esforço de ver como o exemplo mais clássico, basta lembrar de como o con-
“mar de estórias” em que o antropólogo está ceito de cultura boasiano foi fortemente usado por
mergulhado se funde e se mostra presente no atores sociais, inclusive pelo próprio Boas, contrários
ao racismo. É evidente que as narrativas antropológicas
“mar de estórias” do mundo social dos sujeitos
não formam um texto social coerente e sólido politi-
objeto de estudo. Narrativas antropológicas de camente, como também é certo que nem todo texto
“culturas”, originalidades e passados tradicio- acadêmico produz efeitos sociais. No entanto, Bour-
nais muitas vezes legitimam narrativas iden- dieu (1984) nos lembra que as disciplinas não flutu-
titárias do mundo social enquanto linguagem am acima do mundo social, mas interagem com ela, e
política. O mundo da realidade narrativa de que, dependendo da posição do acadêmico no campo
do qual faz parte, há uma maior possibilidade de gerar
muitos dos grupos estudados na antropologia
certos efeitos sociais em outros campos. Incorporar tal
é hoje marcado pela narrativa historicamente interação na análise é interessante em situações em que
consagrada da própria disciplina. E o mundo os grupos estudados abertamente recorrem às narrati-
da realidade narrativa antropológica, com suas vas e conceitos antropológicos. Ao ignorar os usos da
etnografias clássicas, descrições densas, análises “cultura” pelos sujeitos objeto de estudo na análise, o
funcionalistas, estruturalistas e pós-modernas, antropólogo corre o risco de reificar tal conceito, como
se este fosse um dado, e não uma ferramenta teórica.
Mead, Ruth Benedict, ligado a uma noção de contemplar a diversidade de interpretações, por
visão de mundo e ethos de um grupo particu- outro lado, a realidade narrativa também seria
lar de pessoas. A idéia que grupos específicos caracterizada por certos padrões: d) a existência
possuem culturas específicas compartilhadas de uma versão canônica nas narrativas; e, e) a ex-
por todos os seus membros leva a uma noção tensibilidade histórica da narrativa. A realidade
extremamente indiferenciada e homogênea do narrativa, segundo o psicólogo, nos ligaria ao
grupo cultural que desconsidera a existência de que é considerado canônico – esperado e legí-
diversas formas de diferenças e desigualdades timo. Os cânones servem como uma forma de
(Ortner, 2005). contexto em torno do qual impomos coerência
Vejamos detidamente como a análise de sobre o passado, transformando-o em história,
Bruner concilia os dois. As narrativas possuem, cujo acúmulo constitui um empreendimento
de acordo com Bruner (2001 [1996]), nove ca- narrativo. Segundo Bruner, é a sensação de se
racterísticas. Três delas se referem à construção fazer parte de um “passado canônico” que per-
de um campo de diferenças: a) a composição mite que estruturemos nossos auto-relatos.5
hermenêutica da narrativa, isto é, os significados Há duas filiações implícitas em sua argu-
de toda estória são múltiplos; b) a ambigüidade mentação. A primeira, que enfatiza a diferença
implícita nas narrativas; e c) a negociabilidade e a heterogeneidade, é dada pela influência de
inerente das narrativas. A primeira característi- Bakhtin e seu sócio-construtivismo. Segundo
ca implica em uma narrativa nunca comportar
uma única interpretação exclusiva. A segun-
5. As outras quatro características da construção narrati-
da característica, da ambigüidade contida nas va são, em primeiro lugar, a temporalidade na estrutura
narrativas, é inspirada por Roman Jakobson narrativa, que é aquela “humanamente relevante”. Já
e seus dois eixos de linguagem. Sendo o eixo muito consolidada na tradição antropológica é a ten-
vertical o da hierarquia das palavras (país-ci- tativa de apreender temporalidades diferentes, portan-
dade-bairro-quadra-rua), e o eixo horizontal o to, o “humanamente relevante” se refere à relevância
temporal de ações dentro de determinados contextos
da localização de uma palavra e seu papel em
e a partir de específicas visões de mundo. Em segundo
uma frase ou contexto (faca-garfo-prato-copo- lugar, a particularidade genérica que marca a narrati-
vinho-conversa), seria o segundo aquele que va, ou seja, as histórias particulares são interpretadas
abre a possibilidade de haver ambigüidade na como se enquadrassem em gêneros ou tipos. Os gê-
palavra, dependendo com quais outras palavras neros são formas de enquadrar certos textos e auxiliar
aquela se relaciona. Essa ambigüidade é caracte- na extração de sentido do mesmo, são “formas cul-
turalmente especializadas de vislumbrar a condição
rizada pela já mencionada “subjuntivização da
humana e de comunicá-la” (Bruner, 2001 [1996], p.
realidade”, ou seja, quanto mais incerto, mais 131). É o gênero que dá à realidade a sua forma, e não
aberto a interpretações. A terceira característi- o contrário. Outra marca da construção narrativa é a
ca, a da contestabilidade essencial das estórias, da centralidade do problema: as histórias giram em tor-
é o que permite se aceitar facilmente versões no de problemas, normas violadas, dilemas. Os tipos
concorrentes de estórias com certa cautela pers- de dilema também diferem dependendo do contexto
dentro do qual essas narrativas são produzidas. A úl-
pectiva, muito mais que argumentos ou provas.
tima característica é o fato de as ações narrativas im-
Para Bruner, esta prontidão a considerar diver- plicarem estados intencionais, motivados por crenças,
sas interpretações confere a flexibilidade neces- desejos, teorias e valores. Isto implica em uma agência,
sária para a coerência da vida cultural. ou seja, um certo elemento de liberdade está sempre
Ora, se por um lado haveria espaço para toda implícito na narrativa (Bruner, 2001 [1996]). Tal as-
a heterogeneidade, para toda a possibilidade de pecto é importante para a nossa discussão seguinte,
acerca da antropologia da subjetividade.
Bakhtin (2004 [1929]), a linguagem não deve algo dentro do qual eles podem ser descritos de
ser pensada como abstração, mas fato social- forma inteligível – isto é, descritos com densida-
histórico. Ele se coloca, portanto, contra a lin- de (Geertz, 1989 [1973], p. 10).
güística estruturalista de Saussure que abstrai o
contexto social para uma análise da linguagem Este conceito carrega consigo algumas pre-
como sistema abstrato. A idéia estruturalista de missas. A primeira, também presente em Bru-
signo enquanto composto de significante e seu ner, é a busca de uma ciência que não seja uma
correspondente significado ignora a presença do ciência experimental à procura de leis, mas sim
usuário da língua, o que para Bakhtin é essen- de uma “ciência interpretativa à procura do sig-
cial para se entender a atribuição de significados nificado” (p. 4). A segunda é a de que a realidade
aos significantes. Para este autor, a atribuição social é como um texto, “um manuscrito estra-
de significados se dá sempre em processo, os nho, desbotado, cheio de elipses, incoerências,
signos estão sempre em significação a partir emendas suspeitas e comentários tendenciosos
do contexto e dos seus usos. Dessa maneira, a (...)” (p. 7). Fazer etnografia seria, portanto,
preocupação de Bruner e da psicologia cultural ler este manuscrito, construir uma leitura dele
em torno dos significados pressupõe a idéia de através de uma descrição densa de uma “hierar-
significação enquanto processo dialógico, e não quia estratificada de estruturas significantes em
abstraído de seu contexto. termos das quais gestos são produzidos, perce-
A segunda filiação é ao conceito de cultu- bidos e interpretados” (p. 5).
ra do antropólogo Clifford Geertz. O próprio A terceira, e aqui Geertz é inspirado por
livro Acts of Meaning foi fruto de uma série de Wittgenstein, a cultura é pública e à medida
palestras efetuadas em 1989 e 1990 denomina- que mergulhamos mais intensamente numa
da “Jerusalem-Harvard Lecturers”, em que os cultura estranha, as pessoas se tornam “trans-
palestrantes eram justamente Clifford Geertz parentes para nós”. Ao primeiro contato, a falta
em antropologia e Jerome Bruner em psico- de compreensão do povo que se estuda se dá
logia. Argumentando sobre a necessidade de pela dificuldade de se situar entre eles. A pes-
colocar como questão central na psicologia o quisa etnográfica é justamente a experiência
significado e os processos pelos quais os signi- pessoal de nos situarmos, com o fim não de fa-
ficados são criados e negociados numa comu- lar, mas “conversar com eles” (p. 10). A aborda-
nidade através da já mencionada psicologia gem semiótica da cultura auxilia o antropólogo
cultural, Bruner parte de um conceito de siste- a ganhar acesso ao mundo conceitual no qual
mas simbólicos e cultura que segue a tradição vivem os sujeitos para que possa conversar com
da antropologia interpretativa inaugurada por eles e torná-los acessíveis.
Geertz. Segundo Bruner (1990), a psicologia Apesar de Geertz partir de uma perspec-
está profundamente imersa na cultura, deven- tiva semiótica para elaborar seu conceito de
do, portanto, organizar-se em torno de proces- cultura e análise antropológica, a porta que
sos de significação que conectam o ser humano tentava abrir não era, como a de Bruner, a
à mesma. da narrativa, e talvez por isso o antropólogo
O conceito de cultura que Geertz propõe não se estenda tanto quanto o psicólogo nas
em 1973, no seu célebre Interpretação das Cul- ambigüidades inerentes a qualquer interpreta-
turas é o de sistemas entrelaçados de signos in- ção. Vale lembrar que mesmo quando Geertz
terpretáveis, uma espécie de contexto, aborda a questão da contestabilidade das in-
terpretações, ao afirmar que
comprometer-se com um conceito semiótico aos conflitos de significados que advêm da he-
de cultura e uma abordagem interpretativa é terogeneidade social.
comprometer-se com uma visão afirmativa da Bruner, ao contrário, reconhece a hetero-
etnografia como “essencialmente contestável” geneidade, mas não abre mão do conceito de
(Geertz, 1989 [1973], p. 20) cultura que compartilha com Geertz, e a saída
para as divergências de interpretação se dá jus-
Ele se limita às interpretações feitas pelos tamente numa das características mais impor-
antropólogos e não às diferentes interpretações tantes das narrativas: a da canonicidade. Para o
dentro do próprio grupo estudado. A dedução psicólogo:
de que existe uma interpretação nativa, e que
o antropólogo realiza uma interpretação de (…) a viabilidade de uma cultura se encontra
segunda ou terceira mão a partir dela, leva a essencialmente em sua capacidade de resolver
uma falta de visão política do ato de interpre- conflitos, de explicar diferenças e renegociar
tar a realidade social, algo pelo qual o autor é significados comunais. Os “significados nego-
frequentemente acusado (Almeida; Rebouças; ciados” (...) se tornam possíveis pelo aparato da
Silva, 1993; Kuper, 2002). Ao afirmar como narrativa de lidar simultaneamente com o ca-
característica inerente da narrativa a ambigüi- nônico e o excepcional. Portanto, se uma cultu-
dade e sua composição hermenêutica, Bruner ra deve conter normas, deve também conter um
abre a possibilidade de uma visão mais hete- conjunto de procedimentos interpretativos que
rogênea de grupos que compartilham narra- permitam um afastamento daquelas normas
tivas do que estava implícito no trabalho de significativas em termos de padrões estabeleci-
Geertz. dos de crenças. (Bruner, 1990, p. 47, tradução
Seria injusto dizer que Geertz alguma vez minha)
tenha afirmado a homogeneidade do grupo
nativo. Ao contrário, ao comentar a obra de O ordinário, comum, é vivido como canô-
Bruner, esclarece: “Se há algo com o qual a an- nico, como normas esperadas para falar e agir
tropologia é obcecada, é em quanta diferença a em certas situações, e a ação é interpretada como
diferença faz” (Geertz, 2000, p. 197, tradução apropriada ou não pelo contexto, o lócus da ação
minha). No entanto, quando afirma que a in- em questão. A exceção deve ser interpretada ten-
terpretação antropológica deve traçar a curva do em vista o elemento canônico violado e um
de um discurso social, mesmo que seja feito estado intencional. Quando Bruner afirma, jus-
por diversos idiomas, e fixá-lo em uma forma tificando porque a narrativa seria a ferramenta
inspecionável, e que “uma boa interpretação de apropriada para a psicologia cultural, que
qualquer coisa nos leva ao cerne do que pro-
pomos interpretar” (Geertz, 1989 [1973], p. Ela [a narrativa] lida (...) com o material da ação
13, grifos meus), deixa implícita uma noção humana e da intencionalidade humana. Ela me-
de leitura de texto em que a interpretação dia o mundo canônico da cultura e o mundo
está no próprio texto e o leitor participa ape- mais idiossincrático de crenças, desejos e expec-
nas desvendando a interpretação “inerente” tativas. (Bruner, 1990, p. 52, tradução minha)
a ele, como se apenas uma estivesse contida
no mesmo. O que resulta disso é uma visão Fica claro que o que denomina não-canônico
demasiadamente homogênea dos significados se refere ao mundo “interno”, aos estados in-
inerentes à realidade social, sem muita atenção tencionais, e o canônico ao “externo”, à cultura.
Lendo Bruner à luz de Geertz, a impressão que se significados, ethos e visão de mundo, corpo este
tem é a da divisão de tarefas do antropólogo re- não consensuado, mas ideológico e parte das
alizando uma descrição densa, interpretativa, de forças e processos de dominação. A figura mais
uma cultura específica, e a do psicólogo fazendo importante para a reformulação do conceito
a conexão entre a intencionalidade que envolve de cultura, segundo a autora, foi Raymond
crenças e desejos e o mundo cultural, externo. Williams, em Marxism and Literature de 1977,
A discussão que Bruner empreende sobre a com sua mistura da noção de cultura à idéia
relação entre o mundo cultural (canônico) e o gramsciana de hegemonia, para tentar enten-
mundo idiossincrático (estados intencionais) é der as formações produzidas pela cultura nas
extremamente interessante e já antiga também subjetividades (estruturas de sentimento), em
na antropologia. Não farei aqui, no entanto, contextos históricos específicos de poder, desi-
uma discussão de como tal relação se apresentou gualdade e mercantilização (Ortner, 2005).
na disciplina ao longo do tempo, apenas intro- Em alguns momentos, Ortner se aproxima
duzirei brevemente algumas das idéias recentes muito da proposta de Bruner, mas de modo
de Sherry Ortner, que procura justamente rela- invertido. Este, na psicologia, esforça-se por
cionar elementos culturais e estados internos na considerar o contexto (sistemas simbólicos)
busca por uma antropologia da subjetividade. À na construção de significado, e aquela, na an-
luz de suas idéias, sugiro caminhos baseados no tropologia, defende a inserção da questão da
conceito de cultura de Homi Bhabha. subjetividade na consideração sobre os sistemas
simbólicos mais amplos. A autora procura mos-
trar que a importância de reinstalar a questão
Antropologia da subjetividade da subjetividade na teoria social é política, uma
vez que esta é central para se pensar em “agên-
Assim como Bruner, alguns trabalhos na an- cia”, que adota a forma de desejos e intenções
tropologia têm se movido entre o exame de ele- específicos dentro de uma matriz de subjetivi-
mentos culturais e os estados internos dos sujeitos dade, de sentimentos, pensamentos e significa-
atuantes.6 Sherry Ortner (2005), em um artigo dos culturalmente constituídos. Aí estaria, de
em que defende a importância na antropologia da acordo com Ortner, a grande contribuição da
questão da subjetividade, definida como modos teoria de cultura de Geertz: baseado na teoria
de percepção, afeto, pensamento e desejo, afirma filosófica literária do processo cultural e inspi-
que a dimensão da subjetividade já estava pre- rado em Wittgenstein, ele insiste na construção
sente na obra de Geertz. Apesar de reconhecer as das subjetividades através de processos simbó-
razões à crítica ao conceito de cultura de Geertz, licos imersos no mundo social. Assim como
e nos perigos que o conceito traz como forma de Weber pensa a influência do protestantismo
essencializar grupos inteiros de pessoas, também na configuração da consciência dos primeiros
defende o conceito, desde que reformulado de sujeitos modernos (uma estrutura particular
maneira a lhe conferir um valor político. de sentimentos), o balinês vê na briga de galos
Para Ortner, uma formação cultural seria um “modelo de” (ordena-lhe significados parti-
um corpo relativamente coerente de símbolos e culares) e um “modelo para”, numa espécie de
educação sentimental (processo pedagógico). A
6. Segunda a autora, alguns dos antropólogos que ex- participação na rinha daria ao homem acesso à
ploram construções subjetivas da condição de sujei- sua própria subjetividade (Ortner, 2005, tradu-
ção são Lila Abu-Lughod, Jose Limón, Ashis Nandy e ção minha).
Tassadit Yacine.
instante o conceito de cultura geertziano (poli- de consciência dentro das mentes individu-
tizado ou não) de lado, trazer Homi Bhabha à ais, mas distribuídos interpessoalmente. E a
discussão, e voltar a Peixinhos. subjetividade é construída interpessoalmente
Se partirmos de Bhabha e de sua noção de porque está sempre em construção dialógica,
que a comunidade em Peixinhos não é “comu- assim como a cultura. O espaço dialógico é
nidade” por ser marcada por características es- o que Bhabha denomina de terceiro espaço,
senciais, dadas a priori, mas pela construção de em que as diferenças são pensadas enquanto
narrativas do passado e de pertencimento cultu- aproximações e justaposições que nos posicio-
ral, e se, como vimos em Peixinhos, essas cons- nariam sempre na fronteiras entre a diferença
truções estão ligadas a uma dimensão política e a mudança (Bhabha, 2003, p. 178). Para o
das dinâmicas sociais nas quais seus moradores autor, este processo de constante mudança se
estão inseridos, podemos então explorar um materializa através das narrativas comuns do
conceito de cultura que seja também construção passado que criam uma teia de estórias e, aí
narrativa, um produto da configuração política sim, configuram os que compartilham tais
e não um ente que pré-existe à mesma. Ora, a narrativas enquanto grupos, comunidades,
questão que se coloca, portanto, não é como a mudando a direção do próprio fluxo de suas
cultura molda a subjetividade, como quer Ort- ações. É desse modo que devemos pensar a luta
ner, mas como dinâmicas sócio-políticas, aliadas política em Peixinhos não como resultado da
a subjetividades sempre em construção, nunca interação de diferentes grupos pré-existentes,
acabadas, incitam a enunciação de narrativas mas sim como produtora dos grupos enquanto
de pertencimento que, por sua vez, engendram construções narrativas daquele contexto po-
subjetividades deslocadas (mas não descoladas) lítico. A partir desta idéia, podemos explorar
daquelas imediatamente anteriores, num pro- como configurações políticas e subjetividades
cesso sempre contínuo.7 Talvez fosse necessário, abertas, em construção, conjugam-se e orien-
nesse sentido, pensar não na configuração cultu- tam a construção de certas narrativas, que por
ral da subjetividade, mas na configuração polí- sua vez redirecionam a subjetividade de Zulei-
tica da subjetividade, ou então na configuração de, dos participantes da luta contra o lixo, dos
cultural da subjetividade baseada no conceito da integrantes do movimento Boca do Lixo e dos
cultura de Bhabha: uma cultura como constru- usuários do Nascedouro.
ção, que seja híbrida, produtiva, dinâmica, aber- A agência social, a subjetividade e o senti-
ta, em constante transformação; “não mais um mento de pertencimento a um grupo (comu-
substantivo, mas um verbo” (Menezes de Souza, nidade ou cultura no sentido defendido por
2004, p. 125, grifo no original). Bhabha), portanto, estão ligados ao “direito de
Tanto a subjetividade quanto a cultura narrar” dos chamados subalternos. Suas narrati-
são formadas na constante dialogia. Bruner vas, construídas a partir de “arquivos fragmen-
(1990), ao explorar a questão da subjetivida- tados e disjuntos”, moldam as subjetividades e
de, afirma que esta é o resultado do processo constituem “formas de agência que são coletivas
de significação, não enquanto núcleos isolados e afetivas” (Bennet; Bhabha, 1990, p. 39).
A noção de agências afetivas e coletivas abar-
7. Mesmo subjetividades que se afirmam e reafirmam ca as três dimensões – a agência social, a subjeti-
constantes através do tempo necessitam continua- vidade e o pertencimento cultural – que devem
mente reiterar enunciativamente tal similitude tem- ser analisadas em conjunto com dinâmicas so-
poral. Cada enunciação, mesmo que repetindo a ciais e políticas. Se nossas narrativas constroem
anterior, é sempre um deslocamento desta última.
Recebido em 15/02/2006
Aceito para publicação em 30/09/2007