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96-112, setembro/2016
http://dx.doi.org/10.5007/2175-8042.2016v28n48p96
RESUMO
4 A Constituição Nacional Brasil (1988) assegura em seu Art. 205 que a educação é direito de todos e dever do
Estado e da família, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania
e sua qualificação para o trabalho.
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5 O Conselho Nacional de Educação-CNE é um órgão colegiado integrante do MEC, o qual tem a finalidade de
colaborar na formulação da política nacional de educação e exercer atribuições normativas, deliberativas e de
assessoramento ao ministro da Educação.
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6 Na sequência do texto será analisada de maneira mais detalhada, a relação entre os conhecimentos universais
(em comum) e particulares (diversificados) que fazem parte do currículo escolar.
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escolar deve conter quais são os direitos e os [...] o docente parte de plataformas
objetivos de aprendizagem em cada ano da pré-elaboradas para poder realizar as
complexas missões que lhes são atribuí-
Educação Básica. Ou seja, de maneira mais
das com grupos numerosos de alunos e
precisa, o PNE (BRASIL, 2014) se propõe a em condições nem sempre favoráveis.
implementar os pressupostos da Constitui- Para o professor não é fácil passar de
ção Nacional de 1988 para a educação for- princípios ideais para a prática coeren-
mal, no que tange aos “conteúdos mínimos” te com os mesmos, a não ser à medida
que possa planejar uma estrutura de ta-
necessários à “formação básica comum” refas adequadas na qual se conjuguem
a todos os estudantes brasileiros. Tal em- conteúdos curriculares e princípios
preitada foi iniciada a partir da nomeação pedagógicos. Essa é a importância dos
da comissão de especialistas de diferentes meios estruturadores do currículo.
áreas do conhecimento publicada no DOU
(Diário Oficial da União) em junho de 2015. Embora possa se reconhecer a
Nesse contexto, cabe à comissão importância dos meios estruturantes do
de especialistas, por meio de consulta currículo, torna-se importante analisar
pública7 junto às secretárias de educação, como os professores podem se apropriar
universidades e demais organizações liga- da BNCC no contexto específico em que
das à educação, organizar e encaminhar ao atuam. Compreender quais são os limites e
Conselho Nacional de Educação a BNCC as possibilidades da adequação dos pressu-
para, então, iniciar o seu processo de im- postos presentes na BNCC é uma das formas
plantação em todas as escolas de Educação de verificar como podem ser implementadas
Básica do Brasil. A construção coletiva desse as diretrizes previstas nesse documento.
documento certamente não é tarefa simples A elaboração de uma BNCC po-
de ser elaborada, no entanto, vem contribuir derá contribuir para a aprendizagem de
com a melhoria da qualidade e, sobretudo, conhecimentos necessários para a atuação
legitima a necessidade de se identificar cidadã e de forma emancipada. Acredita-se,
coletivamente quais são os objetivos de com tal afirmação, que o conhecimento
aprendizagem dos estudantes em um Estado crítico sobre a natureza, a sociedade e o
Republicano e Democrático de direito. mundo pode possibilitar aos estudantes a
Entende-se que a educação formal compreensão de aspectos culturalmente
apresenta, cotidianamente, entraves que construídos e levá-los a agir com autonomia
dificultam o processo de ensinar e aprender. no contexto social do qual fazem parte. A
A elaboração de uma base curricular poderá identificação e sistematização dos conhe-
auxiliar os docentes a superar problemáticas cimentos essenciais em cada componente
pedagógicas. Sacristán (2000, p.149) enten- curricular poderá, nas palavras de Young
de que os professores que atuam nas escolas (2007, p. 1294), “[...] fornecer explicações
necessitam de elementos balizadores do confiáveis ou novas formas de se pensar
currículo. Nas suas palavras, a respeito do mundo”. Tal oportunidade
7 O portal oficial da Base Nacional Comum Curricular é um ambiente de interatividade virtual em que se busca
esclarecer e construir junto as pessoas ligadas a educação o processo de construção da BNCC. Tal canal pode
ser acessado em http://basenacionalcomum.mec.gov.br/#/site/inicio.
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8 O termo “cidadania” está muito presente nos discursos e debates de uma sociedade Republicana e Democrática.
Para Bedin (2005) é possível definir cidadania como o status concedido àqueles que são membros de uma
comunidade política e, em consequência disso, possuem o “direito” a terem “direitos”. Nesses termos, a
educação formal é a instituição autorizada pelo Estado a auxiliar os estudantes a conhecerem e a exercerem
seus “direitos” na sociedade brasileira.
9 Na antiga Grécia, a “paidagogía” era atividade exercida pelo “paidagogós”, (pedagogo). Tal atividade realizada
pelo escravo consistia em conduzir as crianças em direção ao saber, ou seja, a escola da época (SAMPAIO;
SANTOS; MESQUITA, 2002).
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“cultura universal” e sistematizados pelos Brasil (2010) destacam que a BNCC, integra
componentes curriculares. Para Forquin um conjunto de conhecimentos, saberes
(1993, p. 133), existem saberes comuns e valores produzidos culturalmente e que
que não podem ser ignorados durante a es- devem ser didaticamente organizados
colarização dos sujeitos, sendo necessário: considerando-se:
Educação Profissional e Tecnológica (EPT). uma organização curricular que possa apon-
De forma mais específica, a EPT apresenta tar quais os elementos da cultura corporal
peculiariedades relacionadas ao âmbito da que devem ser tratados na Educação Básica
atuação profissional dos estudantes (futuros em sua “complexidade” e “criticidade”
trabalhadores), apresentando-se, então, uma (FENSTERSEIFER; GONZÁLEZ, 2013). Essa
forma peculiar na formação. Para Sacristán demanda é proveniente da necessidade em
(2000), existem finalidades específicas de compreender dois aspectos imbricados: o
acordo com a função social dos diferentes primeiro refere-se à mudança da finalidade
estabelecimentos de ensino pois, pedagógica da EF, diante de um processo
em que essa era considerada como “ativida-
O currículo do ensino obrigatório não de” regular na escola, com a finalidade de
tem a mesma função que o de uma es- aprimorar a aptidão física, a aptidão esporti-
pecialização universitária, ou de uma
va e a saúde, com as origens no período dos
modalidade de ensino profissional, e
isso se traduz em conteúdos, formas e governos Militares, a partir da instituição
esquemas de racionalização internas do Decreto nº 69.450/71 (BRASIL, 1971).
diferentes, porque é diferente a função Por consequência, o desenvolvi-
social de cada nível e peculiar a reali-
mento acadêmico e científico no campo da
dade social e pedagógica que se criou
historicamente em torno dos mesmos EF, como o denominado “Movimento Reno-
(SACRISTÁN, 2000, p. 15). vador” (SOARES, et al, 2012) e a própria Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
Entende-se que uma base nacional – LDB 9394/96, (BRASIL, 1996), que vêm
comum pode se relacionar com as diferen- demonstrar que, na contemporaneidade, a
tes especificidades educacionais e com as EF escolar adquire uma responsabilidade
pluralidades culturais. Cabe, então, à co- que supera a atribuição de uma “atividade”
munidade escolar (corpo pedagógico e ad- escolar restrita e passa a um fazer de exer-
ministrativo) exercer autonomia na organi- cícios corporais. Sobretudo, a EF adquire o
zação do currículo escolar, preservando-se caráter de um componente que compõe o
os componentes culturais universais apre- currículo da escola e, nesse caso, é respon-
sentados nessa diretriz, articulando-os com sável por um conjunto de conhecimentos
o contexto particular, garantindo, dessa que são oriundos do universo da “cultura”
forma, a equidade de direito à aprendi-
corporal de movimento.
zagem aos estudantes. Nessa relação, é
Nesse contexto, há autores que
imprescindível considerar o que há de “hu-
apontam para a necessidade de se organi-
mano”, pautado nos princípios de liberdade
zar uma base curricular para a EF escolar.
e solidariedade, presentes no âmbito da
cultura universal e particular. Kunz (1994) entende que a organização de
um “programa mínimo” para a EF poderia
pôr fim à “bagunça interna” da disciplina,
A Base Nacional Comum Curricular: apro- que ocorre pela falta de um programa de
ximações com a EF escolar conteúdos definidos numa hierarquia de
complexidade e objetivos específicos para
Historicamente, estudiosos no cam- cada série de ensino. Para esse autor, na
po da EF vêm discutindo a necessidade de EF um professor pode optar por conteúdos
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Nesses termos, nada impede que a BNCC De forma especial, para a EF escolar,
apresente conhecimentos que deem ênfase a BNCC poderá vir a contribuir com a práxis
às minorias ou às pluralidades culturais. Ou educativa cotidiana dos professores, consi-
seja, os aspectos multiculturais podem ser derando a falta de tradição na área quanto
ressaltados e discutidos criticamente em à organização curricular de seus conteúdos.
práticas educativas, pois podem estar pre- Mas isso vai depender das políticas públicas
sentes nesse documento oficial. Para citar de incentivo e mobilização à implemen-
somente um exemplo de como as caracte- tação da mesma. Parece, portanto, que a
rísticas multiculturais podem serem tratadas promulgação da BNCC é apenas o primeiro
pedagogicamente, a 2ª Versão Revista da passo de um longo caminho que deverá ser
BNCC apresenta como um dos objetivos percorrido na área.
de aprendizagem para EF no Ensino Médio:
“Reconhecer as práticas corporais como ele-
mentos constitutivos da identidade cultural REFERÊNCIAS
dos grupos e povos, identificando nelas os
marcadores sociais de classe social, gêne- ADORNO, Theodor. Educação e
ro, geração, padrões corporais, raça/etnia, Emancipação. 3. ed. São Paulo: Paz e
religião” (BRASIL, 2016, p. 526). Terra, 1995.
AQUINO, Julio. Da “crise” da educação
Nesses termos, podem-se adequar
formal ao fulgor dos processos de
os conhecimentos universais de acordo
governamentalização educacional. In:
com as especificidades do contexto esco-
Anais do XVI ENDIPE – Encontro
lar, das diferentes modalidades de ensino e
Nacional de Didática e Prática de
dos demais aspectos particulares. Ressalta-
Ensino, Campinas: UNICAMP, 2012.
-se, então, a necessidade de a comunidade ARENDT, Hannah. Responsabilidade e
escolar , sobretudo, os professores, assumir Julgamento. São Paulo, Companhia das
o protagonismo, organizar o próprio pla- Letras, 2004.
nejamento e a implementação das práticas CUCHE, Denys. A Noção de Cultura nas
de ensino a partir das problemáticas ine- Ciêncais Sociais. 2ª Ed. Bauru, EDUSC,
rentes ao contexto sociocultural do qual 2002.
fazem parte. BRASIL, Decreto nº 69.450, de 1 de
Considera-se, diante do exposto novembro de 1971. Presidência da
nesse ensaio teórico, que a BNCC é de República - Casa Civil - Subchefia de
fato uma proposição necessária, tanto para Assuntos Jurídicos, Brasília, DF, 1971.
a EF, quanto para os outros componentes Disponível em: http://www.planalto.
curriculares, pois está prevista em vários gov.br/ccivil_03/decreto/d69450.htm.
documentos e leis, como indicado ao longo Acesso em: 03 mar 2016.
do texto. Diante de tal fato, cabem ainda di- _____. Constituição Federal. Brasília, DF,
versos questionamentos quanto ao processo 1988.
de acesso, compreensão e implementação _____. Lei de Diretrizes e Bases da
dos pressupostos que esse documento apre- Educação. Brasília, DF, 1996.
senta para as disciplinas curriculares, temas _____. Parâmetros Curriculares para
Educação Básica. Brasília, DF, 1997.
para outros estudos.
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ABSTRACT
The aim of this study is to understand the historical and legal aspects that impact on
the development of the Common National Base Curriculum; the proximity of official
documents and school curriculum, universal and particular aspects of the culture; and the
possible links with the context of Physical Education. Given the importance of preparing
the BNCC, it is critical to understand what are theoretical elements that surround this
proposition. We sought to test this theory, present the precursors elements to the “official
document”, locating the historical and legal aspects that impact on the development of
BNCC. The precursors documents to BNCC refer to the analysis of construction of the
curriculum based on universal and particular aspects of culture, pointing to discussion
with Forquin (1993) and Cuche (2002). The dialogue approaches the context of school
PE in Brazil, regarding the systematization of the curriculum for basic education.
RESUMEN
Tuvo como objetivo el estudio, comprender los aspectos históricos y jurídicos que
inciden en el desarrollo del Plan de Estudios Nacional Base Común, los planteamientos
de los documentos oficiales con el plan de estudios y los aspectos universales y
particulares de la cultura y los posibles vínculos con el contexto de la Educación
Física. Dada la importancia en la preparación del BNCC es fundamental para entender
cuáles son los elementos teóricos que son los alrededores de esta proposición. Hemos
tratado de probar esta teoría, presentar los elementos precursores de la “documento
oficial”, de pie en los aspectos históricos y jurídicos que inciden en el desarrollo de
BNCC precursores legales documentos BNCC, se refiere al análisis de la construcción
del plan de estudios basado en los aspectos universales y particulares de la cultura, que
apunta a la discusión con Forquin (1993) y Cuche (2002). El diálogo se acerca como
el contexto de la educación física escolar en Brasil, en cuanto a la sistematización del
plan de estudios para la educación básica.