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Prof.

Túlio Márcio Santos da Trindade – Faculdade Mineira de Direito – PUC/Minas


Direito Civil II

ATIVIDADE TEMÁTICA 1

Tema: Interpretação dos Contratos

Questões:

1. Em que constitui a atividade interpretativa dos contratos?

Contrato é espécie do gênero negócio jurídico e se distingue dos negócios unilaterais, na medida
em que se materializa a partir da intenção de duas ou mais pessoas sendo, portanto, bilateral ou
plurilateral.

A atividade interpretativa dos contratos constitui-se pela elucidação do negócio jurídico, eis que
reveste o objetivo de pormenorizar o sentido e extensão das vontades das partes envolvidas,
tendo como fim traduzir objetivamente a vontade genuína dos contratantes. O exercício da
interpretação deve, contudo, se limitar à intenção consubstanciada nas declarações de vontade,
devendo se esquivar das vontades internas, psicológicas das partes.

Nesse sentido, os artigos 110, 111 e 112 do Código Civil trataram, respectivamente, (1) da reserva
mental ao disciplinar que a manifestação de vontade deve subsistir ainda que o seu autor haja
feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha
conhecimento; (2) do silêncio como manifestação de vontade quando estabelece que o silêncio importa
anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de
vontade expressa; e, por fim, (3) a Teoria da declaração, ao determinar que a intenção
consubstanciada deve prevalecer nas declarações de vontade diante do sentido literal da
linguagem.

Portanto, tem-se na intepretação dos contratos um recurso amparado pelo Código Civil à
disposição das partes em suas relações jurídicas e do magistrado, nas hipóteses de conflito de
interesses.
Prof. Túlio Márcio Santos da Trindade – Faculdade Mineira de Direito – PUC/Minas
Direito Civil II

Segundo Gonçalves1, a interpretação pode ser declaratória ou construtiva/integrativa. A primeira,


restringe-se à elucidação da intenção das partes no momento da celebração do contrato.
A segunda, tem por fim suprir lacunas e pontos omissos não previstos inicialmente pelas partes
envolvidas, e complementa o negócio por meio de normas supletivas, as quais se baseiam,
principalmente, na própria intenção das partes, na função social dos contratos, nos usos e
costumes locais, no princípio da conservação do contrato e ainda, no princípio da boa-fé.

Dessa forma, estabelecem os artigos 113 e 422 do Código Civil:

“Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente.


(...)
Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato,
como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”

O princípio da boa-fé é divido duas concepções, a boa-fé subjetiva e a boa-fé objetiva. A boa-fé
subjetiva, também chamada de concepção psicológica da boa-fé, é uma forma de conduta e esteve
presente desde o Código de 1916. Invoca o envolvimento do contratante em equívoco ou erro, por
ignorância ou conhecimento diante de determinados fatos.

Diferentemente da boa-fé subjetiva, a boa-fé objetiva representou inovação no Código Civil 2002
ao ser positivada no ordenamento. A boa-fé objetiva referia-se a princípio geral em todos devem
ter seu comportamento nas relações jurídicas revestido de boa-fé, baseados em honestidade e
respeito para com a outra parte.

O princípio da conservação e do aproveitamento do contrato, alcança interpretações diversas para


mais de uma de uma cláusula, devendo prevalecer a interpretação que produzir efeito.

O Código estabelece ainda algumas condições especiais na interpretação de determinados


negócios jurídicos. O art. 423, que determina a adoção da interpretação mais favorável ao aderente
na hipótese de cláusulas ambíguas ou contraditórias em contrato de adesão. O art. 823 disciplina
interpretação restritiva em casos de transação e o art. 819 não aceita interpretação extensiva na
fiança. Por outro lado, o art. 1.899 interpretação na cláusula testamentária suscetível de
interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do
testador.

Algumas regras gerais de interpretação fundadas em fontes clássicas, foram formuladas por
Pothier (vide questão 4).

1
Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 3: contratos e atos unilaterais / Carlos Alberto Gonçalves. – 14 ed. – São
Paulo: Saraiva, 2017. P. 63.
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2. Cite e defina as teorias interpretativas dos contratos segundo Savigny e Windscheid.

- Interpretação objetiva= analise do texto => conduz, em regra, à descoberta da intenção dos
pactuantes. As regras de caráter objetivo se referem aos preceitos contratuais em si próprios.
- art 112: “ Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciadas do que o
sentido literal da linguagem.” => deve-se atender à intenção manifestada no contrato, com o sentido
mais adequado a uma interpretação que leve em conta a boa-fé, o contexto e o fim econômico do
negocio jurídico. Compreensão adequada do que aparenta ser a vontade dos sujeitos contratantes,
ainda que isso não transpareça aparentemente da literalidade do quanto escrito. => DEVE-SE
ATENDER À INTENÇÃO MANIFESTADA NO CONTRATO, E NÃO AO PENSAMENTO INTIMO
DO DECLARANTE.
-Interpretação subjetiva = vontade dos contratantes
- Dois princípios que deverão sempre ser observados na interpretação do contrato:
a) boa-fé: INTERPRETAÇÃO SUBJETIVA arts. 113: ”os negócios jurídicos devem ser interpretados
conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. ”. => percebe-se uma relativização do
subjetivismo na interpretação do negócio jurídico, uma vez que, se, por um lado, a investigação sobre
a intenção é importante, por outro, elementos objetivos devem também ser observados.
422 : “ Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como
em sua execução, os princípios de probidade e boa fé” => Deve o interprete presumir que os
contratantes procedem com lealdade e que tanto a proposta como a aceitação foram formuladas
dentro do que podiam e deviam eles entender razoavelmente
b) conservação ou aproveitamento do contrato: consiste na ideia de que o contrato deve ser sempre
interpretado de modo a fazer com que suas clausulas tenham aplicabilidade, extraindo delas o
máximo de utilidade. INTERPRETAÇÃO OBJETIVA
art. 114: “Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente.”
Benéficos = somente um dos contratantes se obriga, enquanto o outro apenas aufere um benefício.
Devem ter interpretação estrita, pois representam renúncia de direitos.

CONCLUSÕES – A vontade é a essência da relação contratual e ela deve prevalecer, entretanto, ela
não prevalecerá sempre de forma absoluta. Toda hermenêutica contratual deve ter por norte o
princípio da dignidade da pessoa humana e as limitações dos princípios da função social e da boa-fé
objetiva. Portanto, o ideal é a convivência e adequação das regras de interpretação (subjetiva e
objetiva) (art. 113).

Critérios práticos para a interpretação dos contratos:


(a) A melhor maneira de apurar a intenção dos contratantes é verificar o modo pelo qual o vinham
executando, de comum acordo;
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(b) Deve-se interpretar o contrato, na dúvida, da maneira menos onerosa para o devedor; in dubiis
quod minimum est sequimur
(c) As cláusulas contratuais não devem ser interpretadas isoladamente, mas em conjunto com as
demais;
(d) Qualquer obscuridade é imputada a quem redigiu a estipulação, pois, podendo ser claro, não foi;
ambiguitas contra stipulatorem
1- (e) Na cláusula suscetível de dois significados, interpretar-se-á em atenção ao que
pode ser exequível (executável) (princípio da conservação ou aproveitamento do
contrato).

3. Como se interpretam os contratos de adesão?

Os contratos de adesão são representados por negócios jurídicos bilaterais ou plurilaterais, em que
prevalece a vontade de um dos contratantes, com conteúdo determinado por apenas por uma das
partes, restando ao outro, tão somente, aderir ou não à integralidade dos termos propostos. Este
tipo de contrato são normalmente são dirigidos a um número indeterminado e desconhecido de
pessoas.

Messineo destaca que “A falta de negociações e de discussão implica uma situação de disparidade
econômica e de inferioridade psíquica para o contratante teoricamente mais fraco” 2. Essa
conjuntura, explica a redação do art. 423 do Código Civil, a qual determina que a deve-se aplicar a
interpretação mais favorável ao aderente nas hipóteses de clausulas ambíguas ou contraditórias.
Deste modo, preserva-se a parte contratante da relação jurídica a quem não foi concedida a
oportunidade de interferir no conteúdo do contrato.

No art. 424 o legislador também levou a cabo a situação de privação do aderente perante o
ofertante ao estabelecer nulidade às cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a
direito resultante da natureza do negócio. Clausulas desta natureza devem caráter abusivo e
devem ser desconsiderados pela magistratura.

O contrato de adesão é frequente em relações de consumo, tendo, por este motivo, o Código de
Defesa do Consumidor – CDC, instituído pela Lei 8.078/90, dedicado um capítulo especial a este
tipo de contrato.

4. Descreva as 12 regras interpretativas de POTHIER.


2
MASSINEO, Francesco. Doctrina general del contrato. Trad. De R. Fontanarrosa, Sentis Melendo e M. Voleterra. Buenos Aires:
EJEA, 1952. cit., t. I, p.440.
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1- Nos contratos, importa-se mais a intenção das partes contratantes (boa-fé subjetiva) do
que o sentido literal/ escrito dos contratos (boa-fé objetiva).
2- Deve ser extraído da cláusula contratual o máximo de utilidade e aplicabilidade, caso
haja duplicidade em seu sentido.
3- Quando os termos (expressões) de um contrato possuem duplo sentido interpreta-se no
sentido que mais convém à natureza do contrato.
4- Nos contratos em que haja ambiguidade deve-se interpreta-los de acordo com o
costume do lugar em que foi estipulado.
5- Os costumes locais estão subentendidos em todo contrato, sendo usados, ainda, para
suprir as lacunas existentes nos contratos.
6- As cláusulas contratuais devem ser interpretadas umas em relação às outras, ou seja,
como um conjunto.
7- Na dúvida, uma cláusula deve ser interpretada contra aquele que a redigiu. (regra
analógica ao 256/437 mencionado art. 114 do CC-02 e da qual se extrai o transcrito art.
819 do CC-02).
8- As cláusulas tratam apenas do objeto do contrato, não se admitindo, portanto,
interpretação que desvie o fim contratual em casos de uso de termos genéricos.
9- Tratando-se o objeto do contrato de uma universalidade de coisas, compreende todas as
coisas particulares que compõem aquela universalidade, incluindo aquelas de que as
partes não tiveram conhecimento, protegendo assim, a integralidade do objeto.
10- Um caso expresso para exemplificar uma obrigação não restringe o vínculo.
11- Uma cláusula expressa no plural decompõe-se muitas vezes em cláusulas singulares,
como por exemplo, nos testamentos.
12- O que está no fim da frase ordinariamente se refere a toda a frase, e não só àquilo que a
precede imediatamente, contanto que este final concorde em gênero e número com a
frase toda.

5. A FUNDAÇÃO ALPHONSO VECCHIO, em cumprimento à sua missão institucional


de amparo a pesquisas biológicas em protozoários de lagoas, destinou, em doação à
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS, imóvel constituído por um vão livre
no 4º andar de um edifício situado próximo ao campus da instituição de ensino, onde
funcionava o laboratório de pesquisas da fundação. Não obstante nada constar na
escritura pública sobre os bens móveis que o compunham, ainda encontravam-se em
seu interior, na data do ato, aparelhos e utensílios de pesquisas, bem como todo o
mobiliário anteriormente utilizado. Pergunta-se: deve-se presumir que a doação inclua
os móveis e pertenças que guarnecem o imóvel? Fundamente.
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No nosso direito civil, no que diz respeito aos contratos e demais negócios escritos, a análise do texto
conduz, em regra, à descoberta da intenção das partes. Quando, no entanto, determinada
cláusula mostra-se obscura e passível de dúvida, como no caso apresentado, deve-se a partir da
integração social, preencher as lacunas por meio de normas supletivas, especialmente as que dizem
respeito à sua função social, ao princípio da boa-fé, aos usos e costumes do local, bem como buscando
encontrar a verdadeira intenção das partes.
No tocante ao princípio da boa-fé, dispõe o art. 113 do novo Código que “os negócios jurídicos devem
ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”. Deve o intérprete
presumir que os contratantes procedem com lealdade e que tanto a proposta como a aceitação foram
formuladas dentro do que podiam e deviam eles entender razoável. Já o princípio da conservação do
contrato, em o significado de que se uma cláusula contratual permitir duas interpretações diferentes,
prevalecerá a que possa produzir algum efeito, pois não se deve supor que os contratantes tenham
celebrado um contrato carecedor de qualquer utilidade.
Analisando o caso exposto, com base no conceito e princípios que regem a interpretação dos
contratos, deve-se presumir que a doação inclua os móveis e pertenças que guarnecem o imóvel no
intuito de manter a missão institucional da fundação, que é o amparo à pesquisas
biológicas em protozoários de lagoas, na medida em que, sem os aparelhos e utensílios de pesquisas,
bem como todo o mobiliário anteriormente utilizado, a fundação não estará cumprindo com
sua função, perdendo-se então a utilidade do contrato, e como dito anteriormente, não se deve
supor que os contratantes tenham celebrado um contrato inútil.

‘O art. 114 do Código Civil prescreve que “...”. Benéficos ou gratuitos são os que envolvem uma
liberalidade: somente um dos contratantes se obriga, enquanto o outro apenas aufere um
benefício. A doação pura constitui o melhor exemplo dessa espécie. Devem ter interpretação
estrita porque representam renúncia de direito.”

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios
jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre
imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
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REFERÊNCIAS

1) GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Contratos e atos unilaterais. Vol. 3. São

Paulo: Editora Saraiva, 2017. 63 p.

2) GAGLIANO, Pablo Stolze e FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil.

Contratos: Teoria geral. Vol IV, Tomo I. São Paulo: Editora Saraiva, 2012. 437 p.

3) FIUZA, César. Direito Civil: Curso Completo. Vol. Único. Belo Horizonte: Editora Del Rey,

2013. 1368 p.

4) VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos

contratos. Vol. 2; 6ª, 10ª e 13ª edição. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2006, 2010 e 2013. 616 p.

5) MASSINEO, Francesco. Doctrina general del contrato. Trad. De R. Fontanarrosa, Sentis Melendo
e M. Voleterra. Buenos Aires: EJEA, 1952. cit., t. I, 440 p.

6) BRASIL, Código Civil, 2002. 17ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais; 2012.

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