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Qual ser vivo domina a Terra?

 Nic Fleming
 Da BBC Earth
4 março 2015

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Legenda da foto,
Formigas são capazes de modificar o ambiente para seu próprio benefício
Nós, humanos, temos a tendência de achar que mandamos na Terra. Com
nossas habilidades físicas, linguísticas e cognitivas avançadas e com nosso
status de superpredadores, estamos convencidos de que somos a forma de
vida dominante no planeta. Mas será verdade?
Existem seres vivos que são muito mais numerosos, estão mais espalhados pela
superfície da Terra e representam uma parcela maior da biomassa do planeta do
que nós.
Certamente nós causamos enormes impactos em todos os cantos do globo e em
seus outros habitantes. Mas será que existem seres vivos com uma influência
maior e mais significativa? Quem, afinal, domina o planeta?
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Superpopulações
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Legenda da foto,
Colêmbolos são menores que a cabeça de um alfinete e estão por toda parte
Se a resposta for apenas uma questão numérica, nenhuma espécie pode se
comparar aos colêmbolos (Collembola), criaturas de seis patas que mais parecem
com minúsculos camarões, medindo entre 0,25 e 10 milímetros. Em cada metro
quadrado de terra há cerca de 10 mil desses animais, mas em alguns lugares
essa concentração pode chegar a 200 mil por metro quadrado.
As 6 mil espécies dessa ordem de artrópodes podem ser encontradas em todos os
habitats do mundo, de praias tropicais às geleiras da Antártida.
Assim como os fungos, os colêmbolos aceleram a transformação de plantas
mortas em nutrientes reutilizáveis. Sua importância nesse processo varia de
acordo com cada habitat, mas estima-se que eles sejam responsáveis por até
20% da decomposição de matéria orgânica morta em alguns lugares.
Outro animal campeão, em termos quantitativos, é a formiga. Cientistas calculam
que existam de 10 quatrilhões a 1 septilhão (um milhão de quatrilhões) delas no
planeta. É o inseto mais numeroso do mundo.
E, apesar de representarem uma população menor que a dos colêmbolos, as
formigas têm muito mais capacidade de influenciar o ambiente onde vivem.
"As formigas controlam cada milímetro da superfície da Terra que habitam, o que
quer dizer a maioria dos lugares", afirma Mark Moffett, entomologista do Instituto
Smithsonian, em Washington, e autor do livro Adventures Among Ants (Aventuras
entre formigas, na tradução livre). "Elas administram esses territórios alterando ou
removendo elementos para seu próprio benefício."
O controle das formigas ocorre de várias maneiras: ao revolverem mais terra do
que as minhocas, ao removerem seus mortos para reduzir a transmissão de
doenças e ao travarem verdadeiras guerras com populações inimigas. As formigas
são também capazes de cultivar fungos como alimentos e até usar um pesticida
bacteriano para aumentar a produtividade desses cultivos.
Elas ainda "domesticam" afídios (ou piolhos-de-plantas) com a finalidade de extrair
deles uma substância chamada de melada, da qual as formigas também se
alimentam.
Leia mais: Quem foram afinal os primeiros predadores na Terra?
Questão de especialização

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Legenda da foto,
Existem 400 mil espécies de besouros catalogadas, cada uma com funções bem específicas
Mas talvez alguns seres vivos maiores sejam capazes de dominar os menores de
uma maneira menos evidente.
Não podemos nos esquecer das plantas. A biomassa das espécies vegetais
existentes no planeta é cerca de mil vezes maior que a dos animais. E, enquanto
outras formas de vida podem ser mais numerosas, mais diversificadas e
claramente mais assertivas, a vasta maioria não existiria sem o oxigênio liberado
pela vegetação através da fotossíntese.
As angiospermas, capazes de dar flores, representam quase 90% de todas as
espécies de plantas no planeta. Elas também estão na base da grande maioria
dos ecossistemas terrestres.
Só que isso não quer dizer que elas mandam na Terra. Afinal, a dominação
também pode ser uma questão de diversidade e especialização.
E nenhum outro ser vivo tem mais estratificações especializadas do que os
besouros. Cientistas já catalogaram cerca de 400 mil espécies desses insetos –
ou seja, eles representam de 20% a 33% de todas as formas de vida já
reconhecidas no mundo.
"Os besouros são o grupo dominante nos ecossistemas terrestres", afirma Max
Barclay, diretor da coleção de besouros do Museu de História Natural de Londres.
"Eles dividiram o mundo em pequenas partes para se especializaram em
diferentes tarefas, conseguindo coexistir sem entrarem em competição".
Não é só a capacidade de adaptação que coloca os besouros na lista de possíveis
"reis do mundo". Eles também exercem um papel fundamental na maioria dos
ecossistemas, liberando nutrientes para outros seres vivos – ao se alimentarem de
madeira ou esterco, por exemplo.
E se os insetos não existissem (e 40% deles são besouros), a maioria das plantas
não seria polinizada e não estaria no planeta para produzir o oxigênio de que tanto
precisamos.
Leia mais: Voo noturno de milhares de aves migratórias é filmado pela 1ª vez
Manipulação microscópica

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Legenda da foto,
Bactérias do gênero Wolbachia são capazes de manipular cromossomos de insetos
Mas até aqui estamos adotando uma abordagem totalmente centrada no Homem.
Se o famoso cientista americano Stephen Jay Gould estivesse vivo, ele
certamente reclamaria de termos até agora ignorado uma forma de vida
comprovadamente mais adaptável, indestrutível e espantosamente diversificada:
as bactérias.
As do gênero Wolbachia são um exemplo particularmente bom da dominância
imperceptível desses microrganismos. Extremamente engenhosas e bem
espalhadas, essas bactérias vivem nas células de cerca de 60% de todos os
insetos e outros artrópodes, como as aranhas e os ácaros.
Elas são transmitidas de uma espécie a outra através dos óvulos das fêmeas
hospedeiras, e por isso conseguem manipular esses organismos para aumentar
suas próprias chances de sobrevivência. Isso inclui táticas como induzir mudanças
para transformar em fêmeas os machos de borboletas, cupins e crustáceos.
Essas bactérias também conseguem fazer alterações nos cromossomos de
abelhas e formigas para que elas consigam se reproduzir sem a necessidade de
um macho. Elas ainda são capazes de matar embriões machos em espécies onde
existe muita competição por recursos entre filhotes.
"Pela maneira como manipulam e alteram seus hospedeiros, as Wolbachia podem
ter sido o principal motor de mudanças evolucionárias em muitas espécies", afirma
John Werren, professor de biologia da Universidade de Rochester, nos Estados
Unidos.
Não é de se espantar que essa bactéria seja uma forte candidata ao posto de ser
vivo mais dominante do mundo.
Leia mais: Como é formado o cheiro da chuva?
'Quatro pilastras'

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Legenda da foto,
As cianobactérias foram os primeiros organismos a liberar oxigênio na atmosfera
Mas não podemos esquecer que nem só de terra firme vive a Terra, e que nem
tudo o que produz oxigênio é planta.
A verdade é que a atmosfera terrestre continha pouquíssimo oxigênio até o
advento das cianobactérias, que evoluíram para se tornarem os primeiros
organismos fotossintéticos, há 2,5 bilhões de anos.
Essa mudança na atmosfera foi o que abriu caminho para a biodiversidade que
temos hoje no planeta.
A cianobactéria forma uma sequência móvel de células que podem se destacar de
suas colônias para formar novas. Podem ser encontradas em quase todos os
habitats terrestres e aquáticos, vivendo entre fungos, plantas e animais e
formando a gigante massa visível azul-esverdeada dos oceanos.
Além de gerar oxigênio, elas exercem um papel fundamental com sua capacidade
de converter o nitrogênio atmosférico em nitrato orgânico ou amônia, nutrientes
essenciais que as plantas retiram do solo para crescerem.
Essas funções e sua onipresença em todos os habitats fizeram muitos cientistas
argumentarem que as cianobactérias são os mais importantes e mais bem-
sucedidos microoganismos da Terra.
Mas para Moffett, do Smithsonian, a melhor maneira de definir quem domina o
planeta é pensar em diferentes escalas físicas. "Se levarmos em consideração os
tamanhos dos seres vivos, poderíamos dizer que os micróbios dominam sua
escala, o Homem domina sua escala e as formigas tendem a dominar tudo o que
está no meio", diz.
Já Sandy Knapp, diretora do setor de plantas do Museu de História Natural de
Londres, acredita que é impossível se chegar a uma resposta para essa pergunta
porque os seres vivos são interdependentes. "É a mesma coisa que perguntar
qual das quatro pilastras sustentando uma casa é a mais importante", afirma. "Se
você tirar uma delas, verá que tudo vai desmoronar."
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Leia  a versão original desta reportagem em inglês no site BBC Earth.

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