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02 – Obstinado em negação
03 – Pães e caldos
04 – Ignorar o óbvio
08 – Colheita de sobreviventes
10 – Abrace a diversidade
Episódio 01
Nossas necessidades
de nos moldar
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brilhante mesmo! — o qual ela imaginava que faria coisas
terríveis a qualquer coisa que o tocasse. Ou possivelmente
a transformaria em um super-herói movido pela raiva. A
primeira visão do laboratório fora vaga demais para que
ela descobrisse para o que estava olhando naquele
pântano, então ela colocara uma escuta no escritório do
Dr. Nathaniel Sturgis, Diretor de Pesquisa, e saíra de lá,
com planos para retornar assim que tivesse mais
informações.
2
Vivi decapitou outro ursinho — ela não deixaria nem
uma migalha —, se sentindo preguiçosa, mas produtiva, o
que era mais relaxante do que quando estava em suas
férias obrigatórias. Ela amava a sensação de estar no
trabalho. Mesmo se o Canadá fosse tecnicamente uma
nação amigável — talvez especialmente por isso —
qualquer erro teria consequências.
“Aqui é Ontario.”
3
quanto podia fingir ser outra pessoa, ela seria o camaleão
perfeito.
4
Arun gargalhou e Vivi permitiu-se sorrir ao telefone,
sabendo que ele não poderia vê-la.
5
“Eles ordenaram um ataque aos EUA? Em agentes?”
Isso estava errado. Não em seu turno.
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triste agora. “É por isso que não temos tantas
informações.”
“Ela não tem certeza, mas disse que tudo foi suspeito
demais para ignorar. Aparentemente, um pequeno grupo
adoeceu de repente, quase ao mesmo tempo, com uma
doença que ainda não foi identificada. O curioso é que só
pessoas relacionadas à agência adoeceram. Ninguém
mais. Médicos, colegas de quarto, colegas de trabalho,
ninguém... Eles ainda não entendem quais são os vetores,
mas a combinação de uma doença desconhecida e um
grupo tão preciso de pessoas afetadas está chamando
muita atenção.”
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conforto’ no escuro, copiando com cuidado os sons das
vogais de Niehaus.
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Vivi conseguia imaginá-lo circulando sua mesa e
colocando sua pesada mão no ombro de Niehaus. Então
Sturgis tossiu uma fraca tosse falsa e a imagem mental
evaporou. Ele ainda estava em sua mesa e estava nervoso
com algo. “Então, ambos sabemos que mudar o mundo
pode ser para dois lados, não é? Afinal, você tem bastante
experiência útil que não aparece em seu currículo.”
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terrível. A ciência da qual as pessoas têm medo. E você
tem experiência com isso.”
“Não sei o que quer dizer com isso.” Disse a moça. Vivi
estremeceu. Se Niehaus estava sendo recrutada para
trabalhar em um projeto sigiloso, ela precisaria aprender
a mentir melhor.
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Vivi ouviu o som da cadeira se afastando, como se
Niehaus tivesse se levantado abruptamente. Ela
tagarelava algo, mas Sturgis falava por cima de sua voz
“Sua experiência a faria única para o projeto—”
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Niehaus era exatamente da altura de Vivi,
provavelmente cinco quilos a mais, com óculos e cabelos
escuros formando dreads. Ela não se parecia com ninguém
da lista de observação, mas a pele de Vivi formigava.
Olhar para seu rosto havia sido como se olhar em um
espelho.
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Cosima olhava para a moça que esbarrara nela. “Ei!”
Ela gritou, mas a moça a ignorou, e a raiva de Cosima
rapidamente se desfez enquanto ela apalpava seus bolsos
para ter certeza de que não havia sido roubada. Ela tinha
problemas maiores do que grosserias triviais. Droga! O
pulso de Cosima ainda estava acelerado, químicos de luta
ou fuga ainda correndo em suas veias, junto com
desapontamento. Ela esperara ansiosamente por essa
entrevista, realmente esperançosa de que seria a deixa
para a ciência de ponta que ela tanto desejava. E em vez
disso...
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muito público para se negar —, mas ela manteve as coisas
baixas. E Cosima nunca mencionava nada em lugar
algum.
“Eu não posso lidar com ela agora, Cos. Ela briga
comigo por tudo. Ela queria ir para a cidade, de qualquer
jeito, e—”
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Ela encontrou Delphine na cozinha, dando os toques
finais ao que parecia ser alguma versão francesa de
ensopado de carne.
Ah, droga.
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“Diga-me exatamente o que ele disse.” Disse
Delphine, balançando levemente na cadeira.
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“Talvez.” Cosima balançou a cabeça. “Ou talvez eles
estejam esperando o momento certo de agir ou...”
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pensei que trabalhar para pesquisa financiada pelo
governo seria uma boa mudança. Que talvez eles
tentassem mesmo usar a ciência para algo bom. Mas é só
a mesma merda.” Mesmo com sua miopia, ela conseguia
enxergar um sorriso irônico no rosto de Delphine.
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“Nesse caso...” Disse Cosima, virando-se para
assumir o controle.
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armário sobre a pia e se serviu do vinho que estava ali.
“Essa tecnologia da qual ele falava...”
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“Eu não ligo!” Resmungou Delphine, levantando a
colher de pau. “Eu não o quero mapeando seu genoma! Eu
não o quero nem perto do seu genoma!”
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“Que dizia que você era patenteada.” Delphine apoiou
sua mão sobre a de Cosima. “Eu me lembro. Mas chérie,
isto não se parece em nada com o que fizeram com você...”
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Charlotte Bowles trabalhava em um artigo, então ela
não podia evitar ouvir Cosima e Delphine no piso superior,
seus passos e suas vozes abafadas traçando um caminho
de discussões e reconciliações. Não parecia que o jantar de
aniversário ia como planejado. Charlotte ficaria ali
embaixo hoje.
Tipo assim.
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“Ah, só minha mãe.” Kira respondeu, com desgosto.
“Eu não aguento ficar aqui com ela o tempo todo.”
Charlotte bufou.
“Eu sei, certo? Mas isso irritou a Mãe e ela disse que
era muito mais inapropriado que ele dormisse com a Sra.
Evans, professora de ciências...”
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“Não é esse o ponto! O ponto é que não posso fazer
nada porque alguém talvez pudesse descobrir nossos
preciosos segredos ou tentar roubar meu DNA.”
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vinha. “Kira? Tenho que ir. Me ligue mais tarde, OK? E
cuidado!”
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O escritório de Sturgis projetava uma estranha
combinação de burocrata e cientista. Claramente, ele
trabalhava mais à mesa, onde um computador estava
cercado de papéis e arquivos. Mas as prateleiras na parede
estavam preenchidas de vidrarias com fluidos, modelos
helicoidais, pequenos ossos e béqueres com líquidos
brilhantes e coloridos que poderiam ser ou decorações ou
experimentos em andamento. Havia o que parecia ser um
pequeno, porém funcional laboratório em um dos cantos,
com um microscópio eletrônico, várias placas de Petri e
pipetas e até um chuveiro de segurança. A coisa toda
lembrava Vivi de que talvez ela estivesse lidando com algo
bem fora de sua liga, então ela tomou a incomum
precaução de calçar um par de luvas antes de folhear os
44
Enquanto Vivi examinava as descrições de
experimentos meticulosos e notas sobre a depuração de
código para algum tipo de equipamento especializado
emmanipulação biológica, ela pensava no rosto da mulher
com que cruzara no IPGT. Quem era ela? Ela não parecia
uma agente, mas, ainda assim, havia algo de estranho
sobre seu encontro com Sturgis, repleto de insinuações e
duplos sentidos. Vivi tinha uma regra sobre não obstruir
sua escuta durante uma operação, mas ela colocou um
fone em um de seus ouvidos mesmo assim, dando replay
na conversa enquanto continuava examinando os
arquivos. Ela poderia jurar que Niehaus e Sturgis não
tramavam algo juntos. Niehaus agira como se estivesse
em choque, talvez assustada com o que fosse que Sturgis
tentara sugerir. O que era DYAD? Sem querer, ela se
lembrou do relance daquele rosto: seus olhos como os de
Vivi, caso Vivi usasse aquele tanto de rímel; o nariz como
o de Vivi, se ela não o tivesse quebrado aquela vez em
Bukhara; a mesma boca, a mesma orelha. Se Vivi soubesse
que uma pessoa tão parecida com ela tinha acesso ao
IPGT, ela poderia ter apenas a personificado.
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que alguém descobrisse. Era o tipo de emoção do qual ela
estava atrás desde então.
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Ele foi diminuindo a velocidade das palavras, seu
cérebro captando o que estava acontecendo. Ela tinha que
mantê-lo ocupado. “Então, talvez você possa me dizer
mais?” Vivi sugeriu, dando um passo à frente como que
para se sentar na cadeira em frente à mesa. Ela estava na
crista uma onda de adrenalina. “Estou realmente curiosa
sobre como posso ajudar.” Ela adicionou um elemento de
tímido flerte ao seu sorriso. Tudo que ela sabia sobre
Sturgis, desde seu histórico de trabalho ao seu terno sob
medida e seu caro corte de cabelo, a diziam que ele
morderia uma isca de admiração.
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Ela o acertou fortemente, logo acima de seu joelho.
Ele se curvou com dor, o que deu a ela a chance de o
segurar de forma submissa. O que quer que fosse que
estivesse acontecendo ali, ela tinha que saber. “Do que
você está falando? O quê faz sentido? Quem é Niehaus?”
Ela sibilou seu ouvido.
51
Ela não podia deixar Sturgis escapar.
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Cosima andava de um lado para o outro, esquecendo-
se do jantar. “Eu sabia que devíamos ter anunciado tudo
publicamente!” Era o que ela temia por anos e era real. “A
lista de Rachel estava incompleta. Pode haver centenas de
clones por aí, precisando de tratamento e não temos como
encontrá-las!”
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respondeu, agora furiosa. “Pensar em nossas carreiras
enquanto pessoas morrem?”
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“Ei.” Charlotte disse subitamente, surpresa demais
para esperar as tias se afastarem. “Olhem isto!” Cosima e
Delphine olharam por sobre seus ombros. Cosima focou no
nome. Dana Emmet. “Olhem a idade.” Charlotte incitou.
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Alguém estava replicar o trabalho dos Duncan fora da
DYAD?”
59
Episódio 02
Obstinado
em negação
59
1
RCMP: Polícia Real Canadense
Os fragmentos de tubos de aço recuperados sugeriam
uma espécie de dispositivo o qual um delinquente sem
recursos poderia ter montado após uma visita à loja de
suprimentos para casas. Mas, mesmo caso o RCMP não
houvesse já recebido um inquérito enigmático de um
oficial do governo dos EUA sobre o incidente, Jaysara
ainda teria dúvidas sobre o ocorrido, com base nas
evidências físicas.
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estava fora de questão e os fragmentos dos tubos poderiam
ser apenas coincidências.
Ou não.
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O tinir de chaves atravessou o som das notícias na TV
na outra sala e desviaram a atenção de Cosima das notas
que fazia em trabalhos de alunos na mesa da cozinha.
Delphine se dirigia à porta, atrasada para a reunião da
BioThreat, da qual ela participava como consultora de
Ética em meio a um monte de gente de paletó do governo.
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Cosima deu um rápido sorriso. “É isso que você quer
que eu faça, não é? Ser uma boa menina e deixar os adultos
cuidarem de tudo?”
To bem, pfvr não conte para a mãe que não estou com
vc, explico dps
“Posso ajudar?”
“Sou eu.”
“Eu, quem?”
“Nathaniel Sturgis.”
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“O que diabos aconteceu?”
“O seu o quê?”
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Delphine mal conseguiu chegar à reunião da
BioThreat a tempo, mas todos já estavam no meio de uma
discussão enfurecida. Todos os nove membros da força
tarefa se viraram para olhá-la como se ela estivesse
atrasada.
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“Aí que está o problema em sair do planejado.” Disse
o mais velho com sua voz chiante. “A agenda original era
aprovada para todos os convidados. Agora estamos
discutindo abertamente detalhes sensíveis sobre uma
investigação criminal na frente de uma... consultora?”
73
“Tudo bem.” Ela disse rigidamente. Ela se levantou
da cadeira, tentando suprimir sua onda de frustração. Ela
precisava estar ali para isso. Mas se ela não obedecesse,
ela podia ser permanentemente retirada da mesa tão
facilmente como eles a colocaram lá. “Vocês sabem como
me contatar caso surja alguma questão que possa se
beneficiar de minha avaliação.”
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“Me chame de Eloise.” Ela disse. O francês dela tinha
um aspecto agradavelmente rural e antiquado aos ouvidos
de Delphine, ainda mais forte do que da maioria dos
canadenses. “E eles que tentem fazer isso. Não, eu saí para
provar um ponto. Eles ainda estão lá discutindo em
círculos. Ainda bem que te alcancei, queria falar sobre o
elefante na sala.”
“Que é?”
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A Hélice Feliz, um ótimo ponto de encontro para
funcionários do IPGT, ficava a cinco minutos do que
sobrara do instituto. Cosima só conseguia pensar na ironia
da placa alegre e colorida enquanto se aproximava do bar
recém-aberto, o capuz de seu casaco cobrindo seus
característicos cabelos. O cuidado extra provavelmente
não era necessário, mas era melhor ser cuidadosa em
excesso do que não ser. Ela não se incomodara em passar
maquiagem e encontrara um par de lentes de teste
antigas, o que significava que talvez nem Sturgis a
reconheceria de primeira.
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“Ah, vamos.” Cosima relaxou no assento e fixou um
olhar murcho em Sturgis. “Primeiro de tudo, eu não sou
uma ‘conexão’. Eu não estava envolvida em nada disso até
que você ligasse e estava bem com isso.”
“Eu não sei, mas me deixe pedir desculpas por não ter
entrado de cara nisso.”
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O humor de Cosima mudou como se ela fora pega
numa corrente de ar gelado.
“Não fui eu! O meu, er, amigo— acho que ele não é
bem meu amigo — ele mentiu sobre o que ele faria com o
que dei a ele. E o pior é que isso não é nada perto do que
as pessoas que financiavam minha pesquisa fariam.” Ele
esfregou uma das mãos no rosto. “Por favor, tem que ter
algum jeito de você entrar em contato com ela, algo que
você possa—”
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“Fale logo.” Disse. “Agora, ou vou embora. Se precisa
da minha ajuda, melhor fazer eu me importar.”
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que poderia almejar pessoas pela sua genética? Pragas
projetadas?”
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Cosima tomou um momento para pôr os pensamentos
em ordem. “Os voos estão baratos porque estamos no meio
da semana, no início de novembro.” Ela disse. “Adultos
trabalham, Charlotte, incluindo eu e Delphine. Além
disso, acho que nossas vidas acabaram de ficar mais
complicadas ainda.”
“Eu prometo.”
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Art Bell, extraordinário jóquei de mesa, estava no
escritório da CBSA2 preenchendo a papelada para fechar
um caso de contrabando de fentanil quando seu telefone
tocou. Não o telefone que estava em seu bolso, mas o que
se encontrava em cima de sua mesa. Era uma situação tão
rara que Art esperou o telefone tocar algumas vezes, para
ver se quem quer que estivesse ligando iria perceber ser
um erro e desistir. Finalmente, suspirou e atendeu.
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Pela primeira vez, Jay pareceu desconfortável,
trocando seu apoio para outra perna. “Não estou pedindo
que quebre nenhuma regra.” Ela disse. “Mas se tiver
alguma coisa, qualquer pista que pudesse me dar... algum
contato antigo que poderia me passar, alguma coisa que
lembre sobre Katja e a morte dela?”
“Eu sei que deve ser difícil para você.” Ela disse em
um tom gentil, surpreendendo-o com contato visual. Ela
era boa nisso. “Você deve ter mudado de trabalho por um
motivo. Mas um cientista está desaparecido e pode ter sido
morto. O arquivo diz que Katja Obinger está morta há
anos, mas o sangue dela estava fresco no local da explosão.
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Estou tentando entender algo que não faz sentido e a
evidência só me confunde mais.”
Ótimo. Perfeito.
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“Não temos total certeza de que foi um incidente
internacional.” Ela disse. “Mas a Inteligência dos EUA já
está nos questionando por alguma razão, fora o
envolvimento de Obinger. Mesmo que não fosse uma
potencial questão de segurança nas fronteiras, algo me diz
que seu antigo caso será crítico. Eu preciso de sua ajuda.”
Ela pausou, algo apelativamente sério em sua expressão.
“Se estiver disposto.”
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Franjinha subia a sacada da casa agora. Logo antes
de chegar, uma outra moça jovem saiu: uma adolescente
com um caminhar ligeiramente irregular, como se
mancasse. Vivi notou o contorno de uma cinta em seu
leggings cinza. Franjinha deu para Manca o documento
que ela procurara — definitivamente um cartão de
embarque — e Manca foi para o lado de passageiros da
van.
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“Então os fogos de artifício não eram seus?” Disse
Vivi, secamente. “Então mais alguém entrou no jogo. Eu
saí de lá logo antes de explodir.”
“Valdez?”
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“Ela parece exatamente igual a mim, Sanghera.” Ela
disse. “Assim como duas pessoas que estou seguindo até o
aeroporto, acho.”
97
Kira chegou à sede da organização GeneKeep depois
do almoço para fazer check-in em seu primeiro dia de
orientação. Se ela quisesse ter qualquer chance de entrar
em uma faculdade de ponta após ser forçada a aprender
sozinha por correspondência em seu último ano do ensino
médio, ela precisaria de algo espetacular para sua
aplicação. Um estágio de TI em uma empresa voltada à
genética e sem fins lucrativos era tão bom quanto um
convite com seu nome. Havia muito a aprender lá sobre
ela mesma, também, sem revelar o porquê ela estava
interessada nisso e sem se colocar em perigo de virar um
rato de laboratório de novo.
“Isso mesmo.”
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Kira a seguiu por um corredor bem iluminado, cheio
de fotos de cientistas famosos e fotos em grupos de pessoas
sorridentes que Kira não conseguia identificar. Havia
pequenas janelas que davam para dentro de algumas das
salas, embora a sala cuja porta tinha o nome do fundador
— Dr. Parker Bai — não possuía nenhuma. Kira olhou
para dentro de algumas delas enquanto passava. Uma
variedade diversa de pessoas — todas vestidas melhor do
que Kira, ela percebeu — trabalhavam ocupadas. Ela não
ouvia o que discutiam, mas as expressões eram animadas.
Kira aprendera a ler a linguagem corporal por necessidade
e tudo que ela via ali transmitia bons sentimentos.
100
“Tudo bem.” Disse Kira, satisfeita, porém confusa
com a coisa do ‘durona’. Seria aquilo um código para quem
tem cabelo bagunçado e não usa maquiagem? “Eu vivo
metendo os pés na boca também.” Ela assegurou.
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“Não estou surpresa.” Kira disse. “Por mais brega que
fosse, o pequeno texto de Bai sobre preservar genomas
raros realmente fez sentido para mim. Penso que genomas
raros são meio como espécies ameaçadas ou culturas,
linguagens. Coisas frágeis que demoram milhões de anos
para evoluir e não se deveria permitir que apenas
sumissem antes mesmo de as compreendermos.”
“Oh.” Em parou e colocou a mão no coração. “Queria
falar tão bem quanto você. É exatamente como me sinto.”
Ela sorriu timidamente para Kira. “Sou Métis3 e, por mais
que eu ame a cultura popular e tudo mais, sempre foi
importante para mim manter contato com a linguagem
tradicional e costumes da minha família, porque não
existe outra herança exatamente como a nossa e, se
deixarmos as coisas sumirem— Estou falando demais de
novo. Desculpe.”
102
3
Métis: etnia de nativos canadenses
a sair da rotina. E no final do corredor: seu escaninho!
Deve ser grande o suficiente para sua mala. Eles deixam
trancado agora, porque ano passado dois funcionários
foram pegos fazendo sacanagem ali. Hum, ex-
funcionários. O Dr. Bai é tranquilo, mas nem tanto.
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A fila de segurança no Pearson nunca fora
exatamente rápida, mas pela experiência de Charlotte,
aquilo era pior do que o normal. Havia algumas telas que
diziam de maneira confusa quanto tempo faltava, mas
parecia que ainda ia demorar. Infelizmente, Cosima
teimou com a necessidade de um acompanhante e a única
pessoa disponível era a tia Alison.
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“Alison?” Ele disse, incrédulo. “Porque você— ah,
esqueça. Olha, eu preciso que você não volte para a casa
por um tempo.”
“O quê?”
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“Sim, nos aeroportos, checando se algum DNA bate
com o de Katja ou com algum daqueles separatistas
quebequenses que eles querem capturar.”
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momento, se sentindo entorpecida e chocada, então Alison
levantou um dramático e acusador dedo em direção à
ruiva.
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Episódio 03
Pães e caldos
111
O que quer que fosse que a espiã estivesse tramando,
foi bom que ela tivesse aparecido lá. Sua fuga precipitada
fora a distração perfeita para que Alison e Charlotte
fugissem da segurança do aeroporto, assim como elas
também deram a ela uma chance de fugir. Pelo menos
estavam quites.
112
“Sua motivação não vai nos fazer ir presas.”
Charlotte disse. “Isso não é uma peça, tia Alison. Apenas
aja naturalmente.”
113
“Viajando hoje aos EUA a trabalho ou por prazer?”
Ele perguntou.
Charlotte tossiu.
Charlotte bufou.
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“Bom, estamos nos EUA.” Alison disse, ligando o
rádio. “Pare de reclamar.”
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Para Art, ser convocado ao quartel do RCMP era
como ser chamado para a sala do diretor — ou talvez para
o escritório do tenente Gavin Hardcastle, seu antigo
chefe, que estava sempre tentando descobrir o que ele
estava aprontando. O que Art estava aprontando era
ajudar sua parceira, Beth, então Sarah, depois as outras
clones, até cobrindo seus crimes — então sim, isso era
exatamente como nos velhos tempos.
“Me siga.”
117
“Unidade de Crimes Tecnológicos. Os techies.” Jay
abriu a porta. “Esses caras fazem milagres todos os dias.”
“Uma pena. Ouvi dizer que você era muito bom.” Jay
disse.
121
Comícios, cartas de ódio, cartas editoriais, esse tipo de
coisa. Mesmo que a evidência incendiária aponte para
eles, não parece certo para mim. Digo, já é forçar demais
assumir que eles conseguiriam se infiltrar naquele andar
em específico, ainda mais plantar explosivos em áreas
altamente sensíveis.”
“Ou eles estão com medo, pois sabem que foram longe
demais.” Natasia disse.
122
Jay inclinou a cabeça e torceu o nariz. “Sério? Parece
o oposto do que acontece nos casos que você tem, não que
eu consiga detalhes, já que todos os interessantes
parecem estar trancados. Soa meio complicado para
mim.”
123
“Além disso, mais nada sobre esse caso faz sentido.
Nenhum. Então não vejo porque isso seria diferente.”
Cosima.
“CIA?”
125
Art deu de ombros. “Eu te disse, não posso discutir
esse caso.”
Não.
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Mas ela parece muito com alguém que eu conhecia...” Ele
respirou fundo. “Minha antiga parceira, Beth Childs.”
128
“Como ela supostamente morreu?” Jay perguntou.
“Beth.”
Natasia riu.
130
“A essa altura, aceito qualquer coisa nesse caso. E
sabe o que dizem: você não tem que se preocupar, se não
tiver nada a esconder.”
Até parece. Ele tinha que avisar Cosima que ela era
uma suspeita agora, não apenas da explosão, mas de ser
uma agente estrangeira hostil. Ela precisava passar
despercebida, se afastar da casa dela. Ele precisava
avisar todo mundo; assim que o governo começasse a
procurar o rosto de Cosima em todos os lugares, não seria
131
só uma mudança radical — seria o fim de todas as sestras
e suas clones, em todo o mundo.
132
Vivi Valdez observava, em meio a uma visão turva,
através da janela aberta de seu carro alugado, a charmosa
casa de três andares do outro lado da rua em Bailey
Downs. Ela olhou para seu celular e, quando o borrão em
sua mente se desfez, ela confirmou o endereço que
obtivera ao correr a placa do carro da Franjinha no banco
de dados do Centro de Informações da Polícia Canadense.
Ele, de alguma forma, a levara até aqui, à casa de Alison
e Donnie Hendrix. Ela mal se lembrava de dirigir do
aeroporto até aqui.
134
Meia hora se passou — então ela finalmente
identificou uma brecha. As luzes se apagaram e a porta
da garagem se abriu. Um carro azul e empoeirado saiu,
Donnie Hendrix no volante, duas crianças atrás. A porta
da garagem se fechou e o carro foi embora. Talvez eles
fossem jantar, o que daria a ela uma hora ou duas para
fazer seu trabalho. Era sua chance.
“Ei, Alison!”
135
“Na verdade, não estou muito bem. Preciso me
deitar.” Ela lambeu os lábios, mas sua boca estava seca.
“Não preci—”
“Boa ideia.”
136
Foram algumas tentativas até que Vivi conseguisse
abrir a fechadura, mas não foi totalmente culpa do
Vicodin. Era uma fechadura bem mais complicada do que
ela esperaria de uma casa suburbana em um bairro quieto
— o tipo de fechadura que alguém usava quando tinha
algo a esconder.
Mova-se, Vivi!
137
um casal tão comum quanto pareciam. Mas ela estava
mais interessada na foto no armário de Alison com outra
moça usando delineador, nem Niehaus nem a garota mais
nova, mas que tinha o rosto de Vivi.
138
Ela balançou a cabeça. Foco. Ela colocou a foto de
volta no lugar e deixou o quarto. Ela estava aqui para
descobrir como Alison e Cosima estavam ligadas à
explosão e possivelmente também ao ataque em Boston.
Aquelas respostas tinham de vir primeiro, então talvez
ela pudesse pensar em todas as outras questões que
giravam em sua cabeça.
139
bateria — e claramente algum tipo de crise de meia idade.
À primeira vista, a coisa mais ousada que ela fazia era
chá kombucha caseiro.
140
Sarah, que, um dia, desceu do trem e se encontrou com ela
mesma.
Não eram?
141
Vivi abriu o agendamento para ‘Chamada das
Clones’ da última semana e encontrou um link para o site
de chat criptografado Hush e um número de conferência.
Ela clicou no link e inseriu o número na janela do chat,
esperando que houvesse um arquivo transcrito que ela
pudesse baixar, mas ela se surpreendeu ao ver que aquela
sala virtual de conferência estava sendo usada naquele
exato instante, com quatro pessoas já logadas.
142
Charlotte estava exausta depois da longa viagem e
sua perna doía em seu exoesqueleto. Ela queria apenas
desabar na cama do hotel, mas se Cosima tinha
organizado uma chamada das clones de emergência,
devia ser importante. Ela se sentou perto de Alison e
logou no software seguro de chat com vídeo.
Sim!
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“Por quanto tempo esse aumento na segurança nos
aeroportos vai valer?” Perguntou Sarah.
147
“E tem o pequeno problema de que qualquer uma de
nós daria positivo para um teste de DNA do sangue de
quem eles estão procurando.” Alison disse.
Sarah bufou.
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Cosima atualizou todas sobre a conversa com Sturgis
e tudo que ele lhe contara sobre o IPGT trabalhar em uma
arma biológica que poderia almejar genomas específicos.
Delphine suspirou.
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“Só diz pra ela... diz que eu disse oi.” Sarah se virou
quando Cal apareceu na chamada atrás dela. Ele colocou
uma mão em seu ombro e se abaixou para beijar sua testa,
provocando um sorriso nela. Ele acenou para a câmera e
depois se afastou.
151
“Não vou deixar pra lá. As coisas seriam muito
melhores para nós.” Charlotte disse. “O RCMP está perto
demais e ninguém pode nos proteger mais. Nem o Pai,
nem Delphine. Se falássemos a verdade sobre as clones
LEDA, todos os problemas sumiriam.”
“Boa noite.”
152
Kira Manning se serviu de outra xícara de café da
máquina do escritório e voltou ao laboratório da
GeneKeep. Trazer comidas ou bebidas ao laboratório era
tecnicamente contra as regras, assim como permanecer lá
depois do horário — ou dormir no armário de suprimentos
à noite.
Para!
155
Uma vez na vida, Kira estava cuidado de seu próprio
futuro, fugindo de casa para trabalhar aqui e então se
analisando no microscópio. Talvez fosse um erro, mas
seria um erro dela. Escolha dela. Ela não seria uma
ferramenta de ninguém ou alguém para se proteger ou
cuidar. Ela estava cheia disso.
Não adiantou.
Me cortaram de novo.
Claro.
157
maneira de ajudar os outros, preferencialmente sem ter
que se expor ou expor sua família de clones.
158
Kira estivera ajudando a reorganizar os dados da
rede da GeneKeep — o banco de dados vinha crescendo
tão rápido que tudo ficara desorganizado — e ela sabia
que havia certos horários durante o dia em que a rede
ficava simplesmente travada por um longo tempo de
tanta gente a utilizando, geralmente no meio da manhã
ou bem depois do almoço. Além disso, a rede se tornava
lenta quando chovia ou mesmo qualquer tipo de mau
tempo. Mesmo comandos simples faziam o sistema travar
por longos períodos enquanto ela tentava armazenar a
coleção de Primeiras Nações e outras linhagens de
genoma canadenses raras. Tipo, ela entendia que os
genomas eram ridiculamente pesados para algo que
caberia na ponta de uma agulha, mas isso era trabalho
deles, os servidores não tinham que aguentar?
159
canadense — para um site remoto. Ela checou o endereço
IP ao qual o cliente VPN estava conectado: um lugar
qualquer em Saskatchewan?
160
“Não tem nenhum paciente aqui com este nome.”
Disse a jovem moça Desi na recepção do hospital. Ela
sorriu rapidamente, de forma não muito convincente,
antes de sua expressão voltar ao normal.
161
Charlotte se virou. Ela puxou seu celular enquanto
passeava lentamente pela área de espera do hospital. Ela
ligou para Alison.
162
“Viemos até aqui e temos que entregar a cura a
Dana. Não podemos desistir.” Disse Charlotte.
“Ela pode ter sido transferida. Ela pode ter tido alta.
Ela pode ter...” Alison não ousou dizer.
163
Charlotte baixou o mapa do hospital e localizou o
escritório de voluntários. Era do lado oposto do lobby,
perto da loja de presentes.
164
pacientes, e ela ainda tinha a outra unidade do hospital
para procurar.
165
“Senhorita? Você está bem?” O guarda correu para
se aproximar.
166
Aquilo era estranho, considerando que a doença das
clones não era contagiosa, mas talvez esses médicos
americanos estivessem ainda mais perdidos do que
pareciam estar na TV. Um quadro tinha vários desenhos
de pessoas seguindo um passo-a-passo.
167
Acabou o tempo. Charlotte vestiu a máscara e abriu
a porta. Ela entrou no quarto e fechou a porta suavemente
atrás de si, segurando a maçaneta para baixo e
lentamente a soltando. Ela virou a fechadura, por
precaução. Havia uma escada de saída logo fora da sala e
ela poderia sair dali rapidamente. Tudo que precisava
eram trinta segundos com Dana.
168
espalhado no bíceps de Dana com veias que se estendiam
pelo antebraço, ao redor do pulso.
169
Episódio 04
Ignorar o óbvio
Do q está falando????
172
mulher, provavelmente ignorante de seu status de clone,
não deveria poder dar.
175
“Entende o que eu digo? Ela se parece e age
exatamente com a Alison.” Donnie disse, seu rosto
pixelado na chamada em grupo de emergência. Ele
compartilhou um vídeo da câmera de frente da casa,
mostrando uma clone que poderia muito bem ser Alison
se aproximando da porta e entrando. Só que não podia ser
Alison, pois Alison estava em sua minivan nos arredores
do hospital em Boston. Donnie apertou os olhos ao se
aproximar mais da tela. “Na verdade, eu acho ela... um
pouco...”
176
dificuldade em seu caminhar. “Ela deve ser a que entrou
na chamada das clones fingindo ser eu. Que bizarra!”
179
“Ceeeeerto.” Cosima disse de forma arrastada. “Seu
‘encontro’ no café.”
181
verdadeira clone responsável pela explosão, desviando a
atenção de mim...”
183
Dana deixou ar escapar, surpresa. “Uau. Duzentas e
cinquenta? Isso é... muito.”
184
aglomerava com o suor. “Desculpe, eu... Eu só pensei que
fôssemos as únicas. Não faz sentido.”
187
Kira acordou com seu celular vibrando em seu peito,
onde ele havia ficado desde que ela dormira. Ela acordou
assustada e tentou esticar seus braços, mas ao invés disso
bateu seu cotovelo com força nas paredes apertadas ao
seu redor. Um pânico momentâneo — salas escuras,
instrumentos afiados —, antes que ela se lembrasse.
189
Kira olhou para o café que Em deixara ali e tomou
um gole. Leite de amêndoa, com um tanto de xarope de
baunilha. Sem pensar, ela tomou outro gole.
190
Em deu de ombros. Ela se afastou, claramente
pronta para voltar para sua mesa, então Kira balançou a
cabeça.
191
“Sim, senhor. Eu...” Ela sentiu as palavras
evaporarem. Toda a confiança que ela sentira antes sobre
o que presenciara na noite anterior sumiu, deixando a
sensação de que ela estava cometendo um erro. “Eu,
hum... só queria verificar uma atividade na rede que eu
vi.”
192
“Sim, claro. Não, você fez certo de vir até mim. Não
se preocupe.” Ele se levantava, já indicando a ela a porta
da sala. “Não foi documentado porque, francamente,
precisávamos de alguém como você gerenciando as coisas
há meses. Mas por isso você está aqui agora. Uma coisa
boa.”
Muito bom.
193
Mas Charlotte era a única pessoa com quem ela
precisava falar. Ela lançou outro olhar para a porta
fechada do Dr. Bai e saiu à procura de alguma sala vazia.
195
A ligação ficou muda.
196
“OK, quem esqueceu de alimentar o hamster da sala
de servidores?” Alguém brincou.
197
“‘Legais’?” Alison chiou para o telefone, as aspas
simbólicas com os dedos audíveis em seu tom. “Você acha
que essas outras clones são ‘legais’?
198
Me escondi debaixo da cama. Tem um homem aqui
interrogando Dana. Ele parece saber muito sobre o
programa de clones.
201
Cosima rangeu os dentes enquanto dirigia a scooter
alugada por mais um grupo de pedestres entupindo a
ciclovia. Suas palavras para Delphine ainda estavam
ecoando em sua cabeça — não vou piorar as coisas —,
mantendo uma brasa quente de culpa ardendo em seu
peito. Tipo, OK, talvez ela estivesse atrás de algo
excitante, aquele entusiasmo que costumava sentir ao se
envolver em todo tipo de merda estranha com suas
sestras. Mas quem poderia culpá-la? (Além de Delphine.
Delphine obviamente poderia culpá-la e foi o que ela fez,
prontamente.)
203
“OK, todo mundo, não precisa entrar em pânico.” O
rosto do Dr. Bai não parecia em pânico. Na verdade, Kira
achou que parecia calmo até demais. Como se ele estivera
esperando isso. De novo, um alarme soou no fundo de sua
cabeça, mas ela tinha identificação para ele, não sabia
direito o porquê. “Tenho certeza de que em breve
estaremos de volta e funcionando normalmente.”
204
Personificar alguém era mais do que aparência. Vivi
aprendera isso cedo, com suas amigas imaginárias (ou
talvez não tão imaginárias). Eram os detalhes, as coisas
às quais ninguém prestava atenção, mas cuja ausência ou
má execução a entregariam na hora.
205
improvável que sua escolha para uma emboscada não
estivesse relacionada à explosão. Qualquer que fosse a
ameaça que Priyantha estivesse investigando, Vivi queria
seguir também.
207
Os quartéis da RCMP de Toronto eram
extremamente simples e também suspeitosamente vazios
para uma manhã. Seu crachá replicado, completo com sua
foto e um nome falso, apitou alegremente ao deixá-la
passar dos portões de segurança. As outras pessoas que
entravam também mostravam seus crachás ao guarda de
segurança, então ela fez o mesmo, sorrindo educada, mas
superficialmente o suficiente para se misturar.
209
A luz verde se acendeu e a tela finalmente
desbloqueou. Direto para a recompensa de várias
informações relevantes para o caso.
210
“É, bom...” Vivi trocou para a caixa de entrada do e-
mail de Priyantha. SARGENTA PRIYANTHA, seu pedido
de acesso aos dados do arquivo ELIZABETH CHILDS foi
recusado. Se achar que isso foi um erro, por favor, contate
o Banco de Dados de Aplicação da Lei Canadense em...
Vivi sacudiu a cabeça. “Se algum dia nos deixarem trocar
o sistema operacional, não teremos mais esse problema.”
212
Vivi bloqueou o computador e foi em direção à rua.
Ela tinha uma doninha para capturar.
213
O homem que atravessava a porta da frente do
Intaglio, no momento repreendendo no telefone o que
devia ser algum pobre assistente pessoal, nem ao menos
vacilou quando Cosima esticou sua mão para segurar a
porta atrás dele. Ele continuou direto para o lobby, ainda
reclamando sobre suas milhas de passageiro, e entrou no
elevador. Infelizmente, ele devia ter apertado o botão de
fechar as portas quando entrou — babaca —, então
Cosima estava agora parada no lobby, câmeras
rastejando por toda sua pele.
214
Se ela fosse rápida, ela poderia voltar um pouco após o
jantar, tudo estaria bem e sua vida voltaria a...
2248
Seu notebook não estava por lá, o que não era uma
surpresa, mas assim como em seu escritório no IPGT, ele
preferia trabalhar analogicamente. Montes de pastas de
papel pardo e impressões grampeadas amontoavam-se
em sua mesa de madeira. Parecia que o RCMP
considerara essas coisas irrelevantes, mas valia a pena
dar uma checada. Cosima apertou suas luvas e começou
a mexer nas pastas. Documentos de impostos para seu
216
contador... Contrato de alguma academia chique no fim
do quarteirão. Bilhetes de avião e recibos grampeados a
eles. Cinco cópias agrupadas de seu último artigo na
North American Genomics, seu nome destacado e
marcado com caneta nanquim.
217
Ela se abaixou e alcançou seu celular, registrando
fotos de cada página o mais rápido que podia, não se
incomodando em fazer nada mais do que lançar um
rápido olhar aos cabeçalhos.
219
E ela pressionava uma arma contra as costas de
Nathaniel enquanto ele andava pela sala.
220
“De que porra você está falando?” Vivi perguntou.
Seu tom vacilara? Outra observação para analisar mais
tarde.
221
Cosima se sentia enjoada. As palavras de Nathaniel
no A Hélice Feliz a assombravam. Podemos almejar um
único terrorista em um prédio cheio de reféns. Ou
trezentas clones em um mundo cheio de outras pessoas.
222
“Arma direcionada por genomas! Eu— Eu— OK,
olha, eu sabia que havia algo curioso nos genomas que ele
sugeriu que testássemos. Foi por isso que eu dei a ele um
vírus não-fatal! Eu não achei que fossem pessoas reais...
eu não sei. Eu não confiava nele. Mas o programa TAG
pode ser usado para combinar qualquer vírus com
qualquer marcador genético, você entende? Esse não foi
fatal, mas é possível fazer com que seja. Contagioso.
Customizado. É o que eles estão planejando.” A voz de
Nathaniel estava desgastada com histeria agora.
“Merda— merda—”
223
Cosima também deixou escapar um xingamento
enquanto se encolhia de volta na despensa.
224
Uma resposta a essa arma codificada em folículos
capilares, assim como o código legal criptografado em seu
próprio DNA.
225
encaixada no topo do outro braço. “RCMP! Mãos para
cima! Solte a arma e coloque as mãos para cima!”
Oh, inferno.
226
Episódio 05
Toda criança
expulsa do paraíso
231
“Estamos à beira de um precipício.” Ela dizia agora.
À sua frente, se sentavam membros de sua equipe, os
membros da força tarefa do IPGT e uma delegação
visitante de uma desenvolvedora de microdrones. Os
mesmos microdrones que coletariam amostras ambientes
de DNA por toda a cidade: chicletes, bitucas de cigarro, a
saliva deixada para trás nos copos descartáveis. O grupo
inteiro parecia satisfeito e abastecido de cafeína. Estavam
reunidos na mais impressionante sala de conferência que
o prédio tinha a oferecer: a sala com janelas que iam do
chão ao teto e com a melhor vista do lago Ontario. Era um
dia brilhante, exato tempo do final de outono, com o tipo
de céu que derretia na água até que fossem um único tom
de azul que parecia ondular no espaço como o soar de um
sino. Quando acordou naquele dia, Delphine pensara que
parecia ser o tipo de dia em que nada ruim poderia
acontecer.
234
Instituto Tuskegee. “Mas antes mesmo de Hitler subir ao
poder, o serviço de saúde público americano já havia
começado a experimentar em pessoas de cor no Alabama,
numa tentativa de mapear a transmissão de sífilis. Em
1932, seiscentos homens negros foram informados de que
o experimento do qual participariam duraria seis meses.
Na realidade, o estudo durou quarenta anos. Muito após
o desenvolvimento da penicilina para tratar a sífilis, estes
homens e seus parceiros sexuais continuaram sem
tratamento e sem informação. O serviço de saúde público
permitiu que sofressem e morressem sem tratamento,
prometendo comida de graça e até caixões de graça em
troca da participação em um estudo do qual nunca
souberam a verdade.”
235
“Mas não é essa a posição do cientista? Não seria
realizar pesquisas e descobrir a verdade mais importante
do que as circunstâncias em torno de algum momento
histórico?”
236
sejamos tão otimistas com o potencial de fazer o bem que
esqueçamos do potencial de fazer o mal. Acredito que
exista sérios riscos a longo prazo de coletar essa
quantidade de material genético. Falsos positivos,
mapeamento de perfis raciais, vazamentos de dados—”
237
próprias estatísticas. Estamos cavando um buraco para
um lago de dados que será inevitavelmente ser
envenenado.”
238
“Nós conhecemos alguém que trabalha com leis
criminais?” Cosima perguntava. “Talvez o advogado de
imigração conheça alguém.”
239
“Ma petite chérie.” Delphine sussurrou. “Não se
preocupe, nós resolveremos isso.”
240
“Oh, adorei seu chapéu.” A vizinha disse, quando
Vivi pediu pela chave.
“Claro.”
241
1
Mala: Colar ou pulseira indianos feito de contas.
“É só que, bom, me perdoe por dizer, mas eu acho que
você já o tinha há tempo demais. Penso que já tinha
vencido sua utilidade.”
243
achava ser um museu de ciência parisiense. E assim como
nas fotos da casa de Alison, ela não estava sozinha. Ela
tinha pessoas. Ela tinha esposa e possivelmente um
marido e crianças. Tantas crianças. Meninas e meninos.
Brancos e negros. Gêmeos. Ela tinha amigos. Ela tinha
toda uma maldita companhia de teatro.
244
“Quero te ajudar.” A sargento Jaysara Priyantha
disse. “Realmente quero. Entendo que é difícil. Acho que
você passou por um trauma. Você tremia quando lhe
demos roupas novas.”
245
o comportamento o qual você queria ver nos suspeitos. Se
respirasse devagar, eles respiravam devagar. Se você se
acalmasse, eles ficariam calmos. Você dita o tom, um de
seus mentores havia dito. Em qualquer interrogação, você
define o território.
246
O olhar que a suspeita lançou a Jaysara era de puro
desdém. “É isso que você acha?” Ela disse asperamente.
“Que sou uma maldita espiã?”
247
A suspeita se inclinou para a frente. Suas algemas
tiniram. “Interessante. O que ele te disse, exatamente?”
248
Vivi trabalhava na fechadura do quarto quando ela
ouviu a porta da frente se abrir no andar de baixo. A
música da casa trocou para Elastica e um dos tablets ao
lado da cama mostrou ‘SARAH AQUI’.
“COS!”
“COSIMA!”
“Tentar o quê?”
254
A irritação na pele de Charlotte estava se
espalhando.
257
Vivi recuou e bateu a testa no nariz de Sarah.
258
“Você é mais nova que nós. De onde você vem?
Existem mais de você?” Sarah segurava a frigideira como
uma raquete de tênis.
260
Jaysara estava prestes a perguntar à suspeita sobre
sua opinião quanto a um caso antigo e não solucionado de
desaparecimento de um geneticista chinês, quando
recebeu um sinal de fora da sala de que alguém queria
falar com ela.
261
disso, Jaysara não sabia se seu chefe havia compartilhado
aquela informação. “Mas ela tem informações
importantes sobre a vítima que trabalhava naquele
laboratório. Que inferno, esse assassinato em si pode
mesmo ter sido um ataque terrorista.”
“Mas—”
262
arquivos.” Jaysara disse. “Talvez os contatos dela nestes
grupos terroristas saibam alguma coisa sobre a explosão.
Talvez ela trabalhou com ele. Talvez haverá outros
cientistas que serão atacados. Não acha que o RCMP tem
o direito de saber sobre isso?”
263
Jaysara esperou até que eles sumissem no corredor
antes de sacar seu celular. Art atendeu no segundo toque.
“Você esteve escondendo coisas de mim.” Ela disse.
264
Alison estava ajoelhada no chão. Ela olhou para a
face de Charlotte. “Charlotte? Querida? Você está bem?”
267
estava muito mais tonta do que pensara. Seus ossos
doíam. “Oi, Kira.” Ela resmungou.
268
Houve um longo e terrível silêncio do outro lado da
ligação. Talvez Kira tivesse se esquecido das palavras. Ou
talvez não estivesse pronta. Talvez nenhuma delas
estivesse. Mas a hora havia chegado. Alguém almejava
Cosima. Alguém que precisava ser desmascarado.
269
Jaysara exibiu seu distintivo e passou pelos
detectores biométricos na instalação federal da Rua
Victoria. Um funcionário bem nervoso a guiou através das
portas até um campo de cubículos cinzentos idênticos,
ocasionalmente agraciados com potes de plantas ou
parafernálias de hockey ou fotos de cachorros.
“Oi?”
270
“Não tem nada de vergonhoso em você.” Art disse e,
mesmo com raiva, Jay sentiu-se quente. Ele tocou seu
cotovelo. “Vamos.”
“Muitas quanto?”
“Mais de duzentas.”
272
“Não.” Ela disse. “Mas não tenho nem mesmo
Niehaus ou Valdez ou quem quer que ela seja. O
Departamento de Defesa a levou.”
273
Vivi assistiu às duas mulheres discutirem sobre o
que fazer com ela.
274
Sarah atravessou a sala de jantar. Ela usou um dos
pés e derrubou a cadeira. Ela estatelou no chão. A cabeça
de Vivi bateu contra o piso de madeira. Ela estremeceu e
adicionou essa dor à lista de todos seus outros ferimentos.
Sarah passou uma das pernas por cima de seu corpo e se
abaixou sobre ela.
“O quê?”
275
“Cura de quê?” Vivi engoliu em seco. “Não sei do que
está falando.”
276
portas. A casa percutiu com os sons da tentativa de
invasão.
262
Anteriormente, em Orphan Black: TNC:
266
“Por favor, Krystal.” A clone interrompeu. “Eu a
assisto desde que, sei lá, eu era criança.”
“Coisa de maluco.”
268
participação em nossa comunidade, por anos.” Charity se
inclinou, pronta para a fofoca. “Mas eu sempre tive um
mau pressentimento em relação a ela. E acabou que,
debaixo daquela fachada perfeita, Alison era alcóolatra e
viciada em drogas. Ela traiu seu marido com o marido da
melhor amiga, fez um inferno na vida das crianças dela.
Existiam até rumores de que ela distribuía drogas!” A
gravação parou, congelando na careta sarcástica de
Charity.
269
Um controle remoto se chocou contra a parede ao
lado da TV, cuja tela brilhava com o rosto contorcido de
Charity.
270
“Na estrada. Quero estar com minhas sestras nessa
hora difícil.” Helena disse.
271
“De jeito nenhum.” Sarah disse, se direcionando às
escadas.
Por favor
274
A fotografia de Cosima Niehaus apareceu na tela
onde o programa de Sally Winters passava.
“Ironicamente, ela é doutora em genética humana.” A voz
de Winters saiu de um pequeno autofalante. “E sua
esposa, Delphine Cormier, professora titular na
Universidade de Toronto, é uma expert no campo de ética
genética—” O vídeo pausou.
277
minutos.” Eloise disse por sobre os ombros enquanto se
dirigia ao bar mais próximo.
278
Parado no escuro, Alexander Davis virou o copo de
bourbon e olhou para a mala na sala de jantar. Rhonda o
deixaria de verdade desta vez. Ela vivia desconfiada. E
por que não deveria? Seu trabalho era prejudicialmente
clandestino, o enviando em viagens as quais ele não podia
explicar. E depois de se tornar diretor do Departamento
de Vanguarda Científica e responsável pelo Projeto
Boston, tudo se tornou ainda mais clandestino. No
passado, ele compartilhara informações sigilosas com
Rhonda para salvar seu casamento, mas ele não podia
contar a ela que monitorava clones humanos. Era coisa
demais. Ele provavelmente desapareceria se a CIA
descobrisse que ele contara sobre o Projeto. O preço a se
pagar por esse segredo era seu casamento. Após
numerosas brigas, duas tentativas de separação e flagrar
Rhonda fazendo sexo de vingança com seu barista
preferido, Davis estava OK com isso.
279
erupções cutâneas. E ele deveria ainda estar monitorando
a eficiência do TAG, a nova bioarma do Canadá, que
deveria ter matado as clones. Mas agora nenhuma delas
estava morta ou no hospital. E o pior de tudo, Nathaniel
Sturgis ainda devia a ele informações sobre a bioarma,
mas o panaca havia sido morto. Davis quase acreditava
que o seu colega de faculdade morrera apenas para
impedi-lo de ser um verdadeiro herói americano. Com a
pressão do sangue subindo, ele arremessou seu copo, o
estilhaçando contra a parede.
280
“Serve de algo que eu pergunta para onde você está
indo?” Ela disse, apertando os lábios.
281
arma TAG era o jeito de Davis para se livrar das amarras
do D.A.O. Ele tentaria aproveitar esse projeto ao máximo.
282
“Lochtaig? Você só bebia essa droga de whisky com
aquele esnobe da faculdade.” Disse Rhonda, juntando as
peças. “Nathaniel Sturgis está envolvido nisso?”
284
No início, Alison Hendrix achou o brilho da luz do dia
através do plástico branco confortante. Não era escuro e
sufocante, como ela esperava. No entanto, o que mais a
incomodava era o som constante do plástico. Tinha um
efeito oposto àquele dos vídeos ASMR que ela assistira
para se distrair da vontade de beber e se drogar. Cada
pequeno ruído e rangido a fazia querer pular para longe.
Ficar sóbria por oito anos não fora fácil e tentar
permanecer imóvel dentro de um saco para transporte de
cadáveres ameaçava essa sobriedade. Arun dissera a elas
para não se mexer e que ele as tiraria dali quando fosse
seguro. Mas e se ele é um mentiroso... Alison pensou
consigo mesma. Mal conhecemos o cara e ainda o
deixamos nos colocar aqui e atravessar o hospital com a
gente para deus sabe onde—
285
“Ei, e eu?” Perguntou Dana, se levantando do seu
casulo mórbido como uma lagarta gigante. Arun libertou
a surpreendentemente ativa clone. Ela parecia estar
quase recuperada do vírus. As irritações em sua pele
estavam se acalmando e ela possuía uma cor vívida em
suas bochechas. Por outro lado, Charlotte estivera
estranhamente quieta por um tempo e surgiu pingando
suor e coberto de vergões que escorriam. Exausta, a
adolescente imediatamente se encolheu no chão.
287
Seriam eles quem expôs as clones LEDA? “Por que você a
mandou atrás de nós? O que você procura?”
288
“Com base na reação dela à palavra ‘clones’ no vídeo,
acho que ela esqueceu também.” Disse Alison.
290
voltar a sobrinha para a casa em segurança. Mesmo que
isso fizesse sua cabeça girar, Dana parecia ser a única
forma de fazer isso. Mergulhar a sobrinha em álcool fora
um plano risível... mas Alison começava a achar que
mergulhar em álcool não seria nem de perto tão ruim.
291
Clone. O rum queimava ao escorrer pelos cortes
irregulares e superficiais deixados pela garrafa quebrada
que fora pressionada em seu pescoço. Ela imaginou o
antisséptico substituto correndo junto ao sangue, a
limpando da palavra: clone. Não, aquilo não seria o
suficiente. Então ela bebeu um longo gole da bebida
barata que encontrara debaixo da pia de sua casa
alugada, sentindo o calor libertador descer pelo seu
esôfago.
292
vivendo vidas completamente diferentes, a fazia se
questionar se ela tomara todas as decisões erradas. Será
que ela era realmente feliz trabalhando como uma
agente? Após anos de trabalho fingindo ser outras
pessoas, como ela poderia saber quem era de verdade, a
este ponto? Será que ela poderia ter tomado decisões
diferentes e sido mais feliz? Será que ela poderia ter
dreads e uma pequena casa vitoriana na cidade? Será que
ela poderia ter um marido bobão e duas crianças arteiras?
Será que ela poderia até mesmo voltar às operações
clandestinas agora? Uma clone não podia ser uma espiã.
Aquilo era ridículo. O que diabos ela faria? Ela precisava
de conselhos e apenas uma pessoa podia a ajudar.
294
os governos queriam o suficiente para trocar pela sua
segurança: a bioarma.
295
A sargento Jaysara Priyantha bateu na porta. Não
ligo se são três da manhã, ela pensou. Aquele FDP
corrupto vai contar a verdade. Quando Art Bell
finalmente respondeu, seu pijama com pequenas pizzas
estampadas o fazia parecer qualquer coisa, menos um
FDP corrupto. Ele parecia inofensivo, mas Jay
permaneceu alerta. Bell era a única pista que restava
sobre o caso da explosão do IPGT/assassinato, que fora
tirado dela. Se ela não o pressionasse, ela talvez perdesse
qualquer chance de o conseguir de volta.
296
“O que parecia algum tipo de irmandade maluca, não
a verdade.” Ela disse.
300
“Eu sei.” Ele disse e então, inesperadamente, sorriu.
“Bem vinda ao Clube das Clones.”
301
Squeech, squeech, squeech.
303
“Ou talvez estejamos ficando velhos demais para
tudo isso.” Colin sugeriu, sério. Isso aterrorizava Fee.
Talvez a ‘rotina’ deles não era só por causa da roupa suja
ou familiaridade ou não reconhecer o valor um do outro.
Talvez ele fosse velho demais para Colin. De repente, ele
se sentiu desesperado e idiota por ter usado aquelas
calças. Era exatamente o que alguém ‘velho demais’ faria.
304
“Então, o que faremos?” Perguntou Jaysara. “Não
podemos levar amostra roubada para nenhum dos nossos
laboratórios.”
305
Bzzt, bzzt.
306
de back up ou cometera um erro profundamente idiota de
se esquecer de manter uma cópia dos preciosos dados.
Mas isso não parecia algo que ele faria. GeneKeep era
como um filho para ele. Ele faria de tudo para preservar
a empresa. Considerar tudo isto enquanto tentava não
mijar nas calças estava deixando Kira louca. Ela não
conseguia segurar mais.
“Ahem.”
308
“Mas você é tão, tipo, o contrário disso.” Em disse,
confusa. “E você foi educada em casa.”
309
não haviam arquivos de log. Alguém cobria os rastros. E
alguns dias depois— boom, todos os dados são apagados.”
“Exatamente.”
310
“Estou sozinho.” Ele disse para o telefone. “Agora
desça aqui e me explique o que diabos está acontecendo.”
Ele ouviu a pessoa na linha. “Por que não? Eu concordei
em autorizar seu acesso, não pensei que você apagaria
todos os nossos servidores...” Ele esperou de novo,
insatisfeito. Qualquer que tenha sido a resposta, ele
estava tendo dificuldades em engolir. “Em nossa
database? Por que ele faria isso?” Bai bufou no celular.
“Não dou a mínima para confidencialidade — vou resolver
isso.” Ele desligou e marchou para fora do prédio.
312
Para um cara ‘zen’ que gostava de yoga, Bai era bem
obtuso quando se tratava da consciência de seus entornos.
Ele não notou quando as duas garotas reabasteceram o
carro delas a duas bombas de distância. Mais tarde, elas
perderam o rastro de Bai na estrada por um momento e
acabaram indo parar bem ao lado dele. Kira cuspiu
chocolate quente na janela de susto, enquanto Emmaline
virava seu rosto e o carro, quase se chocando com a
barreira de segurança. Mas Bai nem percebeu. Seis horas
depois, ele as levou para fora da estrada até uma longa e
monótona pista em Québec e mesmo assim não percebeu
o único carro atrás dele. Kira começava a entender como
os dados deles haviam sido roubados tão facilmente.
313
“Sim.” Em confirmou. “Os moradores não estavam
muito a fim no início, mas o Dr. Bai insistiu. Ele me pediu
para fazer alguns flyers alegres para divulgação, com
pessoas sorrindo num dia ensolarado e coisas assim.”
316
“Certo.” Bai começou. “Quero saber porque vocês
deletou nossos dados.”
318
conseguir culpá-lo por be hackear, vou bandar te prender
por agressão.” Ele pegou o celular e começou a discar.
320
Delphine se apressara vestindo apenas roupas de
baixo para atender a porta, torcendo para que Cosima
tivesse voltado no meio da noite. Quando ela atendeu, Art
e a sargento Priyantha a presentearam com um pedaço de
carne coberto com longos fios prateados e fios negros e
menores. Dizer que ela ficara desapontada seria pouco.
“Me diz que essa pessoa pode ter tido poliose, a perda
de melanina nos cabelos. Ou algum tipo de modificação.”
Delphine respondeu friamente.
“Por favor, diga à mãe que estou bem, mas não quero
conversar.” Kira implorou. “Só quero saber: se você pode
armazenar mensagens em DNA, como o da tia Cosima,
você pode armazenar outras coisas?”
322
“Claro. Esse tipo de coisa é só um programa. Pode
armazenar um livro, até um filme. Converta para
linguagem binária, compacte os dados e você pode
armazenar até cerca de 1,8 bits por nucleotídeo. A
complexidade do que você codifica depende do
comprimento da fita—”
Beep, beep.
323
Com isso em mente, Delphine confrontou Jaysara.
“Esse cabelo talvez contenha evidência que pode exonerar
Cosima. Talvez te ajude a capturar o terrorista real.”
324
verdade. Não faz sentido. Ele não foi direto até a fonte do
possível vazamento— ele não foi até você.”
325
“Então Gilles Sauveterre tinha um vírus de
computador codificado em seu genoma...” Emmaline falou
devagar, ao recapitular o que Kira acabara de dizer a ela.
“E quando estávamos sequenciando seu genoma,
ativamos o vírus, que deletou todos os dados da
GeneKeep. Isso não soa sci-fi demais?”
328
dormia. Então o repetiu cinco vezes, paralisando as
garotas que tentavam não rir. Mas suas risadas
silenciosas pararam ao perceber que ele estava coberto de
pequenos respingos de sangue. O inspecionando de perto,
Kira viu que ele estava sendo picado por mosquitos.
Estranho, não é época de mosquitos. Ela pensou, enquanto
assistia aos insetos. Eles voavam em um padrão bizarro
de zig-zag, rondando a cabeça do prefeito sem parar.
329
Episódio 07
Melhor aprender a
lidar
332
Mais catorze minutos. A tela mostrava. Não se
esqueça de se alongar!
334
Agora
“Acho que foi por isso que puxou uma arma.” Em fez
uma careta. “Mesmo que não tenha nos seguido, ele
provavelmente pegou nossa placa.”
338
“Uau. OK. É coisa demais para processar.” Em olhou
para ela com algo diferente em sua expressão —
admiração? “Mas isso explica totalmente porque você liga
tanto para a segurança de genes. O que é... bacana.” Ela
passou uma mão pelos cabelos. “Tenho tantas perguntas.”
339
aplicação da lei. “Me desculpe. Sou uma idiota. Claro. Eu
não queria...”
“Precisamos...”
“Combinado.”
341
Vivi se alongou em cima das folhas secas da encosta
e pegou seus binóculos. Com Sturgis morto e a policial
aparentemente contente em se esconder com as clones,
Vivi seguira a outra única pista que tinha: Greg
Kurzmann, o contato de Sturgis no Ministério da Defesa.
E, após uma longa e entediante tarde estacionada com
visão para o escritório do ministério em Toronto,
Kurzmann a levara até aquele grande prédio no desértico
norte da cidade, um lugar que acionava todos os botões de
alarmes de Vivi. Perto da cidade, mas não tão perto?
Check. Longe o suficiente da estrada para desencorajar
curiosidade inocente? Check. Longe o suficiente de
vizinhos para que eles não escutassem nenhum som
estranho e gritos? Check. Sinalização totalmente sem
significado (nesse caso, ‘Haras do Jefferson’)? Check. E —
Vivi cobriu o perímetro com seus binóculos — sistemas de
alarme e vigilância inexplicáveis? Check.
O que quer que fosse que Kurzmann fazia ali, ele não
queria que ninguém soubesse.
342
“Não se mexa.” A voz atrás de Priyantha era calma,
controlada e imediatamente familiar, tão familiar que fez
seu coração parar por um momento, na esperança de que
fosse Cosima, após escapar milagrosamente.
344
estou nem aí para mandados ou permissões. Então eu
entro.” Ela soltou o ombro de Jaysara para pegar algo em
seu bolso e entregou um fone a ela. “Mas eu gostaria de
ter sua perspectiva nos assuntos internos canadenses e...”
Ela olhou para a encosta onde Jaysara havia estacionado.
“Que você me avisasse se tivermos que sair de lá rápido.”
Ela se inclinou para mais perto. “Não me passe a perna,
oficial.” Então ela avançou e sumiu em meio à vegetação
rasteira.
345
Ele apoiou sua mochila nos ombros ao atravessar
outro corredor interminável. O ciclo de notícias se repetia
de novo. “Dúzias, talvez centenas, de mulheres pelo
mundo, todas elas clones genéticas idênticas.” A âncora
dizia. Sim, pensou Davis, esse é o exato significado da
palavra clone. “Estou aqui agora com Rachel Duncan,
uma renomada ex-executiva de biotecnologia que não só
possui um extenso conhecimento acerca de clones, como
também é uma.”
346
trabalhei no passado sempre foram muito preocupados
com sua privacidade. Mas, honestamente, foi um alívio.
Pensei ‘finalmente... não tenho mais que esconder quem
ou o quê sou’.”
347
Davis encarou a tela por mais um longo momento
antes de perceber que estava parado no meio do corredor
do terminal. Rachel Duncan parecia ser o tipo de pessoa
que poderia se tornar uma poderosa aliada ou uma
inimiga arriscada. Mas de uma forma ou de outra, se ela
se metesse nos negócios da Agência, ele a manteria em
rédeas curtas.
348
“Então, aquela coisa sobre duzentas e setenta e
quatro clones...” Em disse.
349
Kira respirou fundo. A voz de sua mãe gritava no
fundo da sua mente para que ela guardasse todos os seus
segredos. Mas se Kira não pudesse confiar em ninguém,
de que adiantava? Ela precisava decidir por si mesma.
354
“A vila. Você tem que protegê-los.” Gilles disse com
uma voz áspera. “O vírus— eu o inseri na sequência.
Tentei apagar os dados deles. Mas não foi o suficiente
para pará-lo. Dr. Bai, o resto— eles não pararão. Eles não
pararão...”
355
“Vou te dizer uma coisa.” Vivi disse de forma
descontraída, para testar a comunicação. “Esse lugar
definitivamente não é uma fazenda moderna. Tem
vigilância demais aqui.”
“Isso não—”
356
Vivi esgueirou-se para dentro do bosque de sebes
perto da árvore que atingira. Se o lugar fosse como
suspeitava, enviariam alguém — ou, infelizmente,
alguéns — para checar a câmera imediatamente. Ela só
torcia para que, dada a cortesia e polidez canadense, esses
alguéns brandissem, no máximo, algum tipo comum de
arma pesada e não uma M16.
357
o aperto dela, até que Baixinho estivesse alto o suficiente
para que descer fosse demorar demais.
359
“Estou dentro.” Vivi bebeu um gole. “Mas não por
muito tempo.”
360
Alison dirigia pela 91 pelo que pareciam eras, suas
mãos formigando no volante da minivan. Ela o estivera
apertando com força desde que fugiram daquele terrível
hospital em Boston, com Dana junto a elas. Dana. Outra
— mais nova! — clone, uma nova doença e um novo
pessoal do governo as perseguindo. Fan-tás-ti-co.
363
“O quê? Eu não—” Alison piscou algumas vezes. “Eu
estava apenas pensando no quão orgulhosa sou de vocês.”
364
Vivi rangia os dentes enquanto a barra de progresso
na tela ia aumentando dolorosamente devagar. Ela
duvidava que os guardas de segurança teriam acesso a
quaisquer dados mais sensíveis (e por isso pertinentes) do
complexo, mas não doía pegar o que ela pudesse, não
quando os dados eram tão facilmente duplicados. Ela se
preocuparia em filtrar aquela bagunça mais tarde para
encontrar o que ela e Priyantha precisavam. Agora era a
hora da aquisição.
365
“Está ouvindo isso?” Vivi perguntou. Ouviu um som
afirmativo de Jaysara junto ao discurso em andamento de
Greg.
366
laboratório, dispositivos de dispersão aérea
encaminhados para Nasgwine’g... que porra é essa?”
“Nem eu. Mas não acho que seja algo bom. Quero
descobrir como os separatistas de Gilles Sauveterre estão
envolvidos, mas primeiro você precisa encontrar Niehaus
e essa arma.”
367
de acessos para ter certeza de que possuía o nível de
acesso que precisava. Ela viu que não, mas alguns cliques
e ‘Dale Masterson’ de repente fora promovido a
pesquisador de laboratório. “OK, estou indo para o
laboratório.”
368
“É.” Vivi disse, a boca de repente seca. “Pode-se dizer
que sim.”
369
Os dedos de Sarah tamborilaram contra a mesa da
cozinha do condomínio de Felix ao ouvir outra ligação
recusada. Felix levantou uma das sobrancelhas, olhando
com grande especificidade de suas unhas grossas para a
cerveja intocada em sua frente. Em um só movimento
rápido, ela conseguiu dispensá-lo com uma das mãos ao
mesmo tempo em que batia o celular na mesa com a outra.
370
“Agora, agora. Não vamos falar nada disso.” Ele se
inclinou para a frente, envolvendo as mãos dela. “Você fez
um trabalho brilhante com ela. Ela é esperta, compassiva
e engenhosa; isso é tudo seu, sabia? Não dá nem para
culpar a genética nisso.”
372
“Tem certeza de que isso vai funcionar?” Art
perguntou, calçando as luvas de látex. Eles estavam no
laboratório do segundo andar da casa de Delphine, que
ainda não havia sido finalizado, mas que felizmente já
possuía os equipamentos que eles precisavam para o
teste.
373
“Coordenadas de GPS?” Delphine questionou,
batendo de leve uma das unhas contra os números na
tela.
375
Os olhos de Cosima se abriram com dificuldade e, por
alguns abençoados minutos ela se agarrou aos
fragmentos de sonhos, onde ela estava enrolada em sua
esposa em uma cama suntuosa, com raios de sol dourados
que tentavam despertá-las do sono. Então uma pinçada
em seu pescoço e a fria dor em seus pulsos pelas algemas
a fizeram acordar. Ela gemeu e tentou se sentar, mas ela
estava presa de forma tão firme que mal podia girar no
lugar. Sua bexiga doía, seus ombros doíam e, pela deusa,
tirando toda a coisa de ‘presa e então arrastada por uma
série de cada vez mais sinistras instalações de detenção’,
ela mataria por um trago de Wookie naquele momento.
378
gente.” Ele usou uma das mãos para apertar seu nariz. “O
que faz deles o grupo ideal para testes. As únicas pessoas
em risco são as que merecem. Que são uma ameaça às
outras. Isso é para o bem, não é, doutora boazinha?”
380
“Droga, droga, droga!”
381
morno. Droga. Ela estava torcendo para que fosse algo
perigosamente ácido.
382
seu peito, mas sim segurando algo. Vivi abriu os dedos
dele e encontrou um USB num cordão.
383
gravado em suas retinas. Quando sua visão começou a
clarear, os pequenos pontinhos caíam do ar, um a um.
384
Mas Niehaus tinha respostas — ao menos algumas
delas. Ela estivera próxima demais da verdade sobre o
que Greg e seus cúmplices estavam tramando. E ela já
sabia muito sobre os clones. Suas irmãs.
Irmãs de Vivi.
385
Episódio 08
Colheita de
sobreviventes
388
Quando Kurzmann finalmente chegou, sua
aparência estava horrível. Múltiplos cortes em seu rosto
e em seus braços, olheiras profundas em volta dos olhos
que demonstravam que dormira pouco. Ele tinha o olhar
de mil jardas de um homem que acabara de dirigir por um
longo caminho, abastecido por café e demasiados donuts.
Davis viu aquilo pela luz da geladeira de Kurzmann,
enquanto o homem procurava dentro dela uma garrafa de
uma insípida cerveja mexicana. Kurzmann não se
incomodara em acender as luzes da casa. Quando ele se
virou, Davis pegou seu isqueiro e acendeu um cigarro.
389
Kurzmann franziu a testa. “Que tipo de acordo?” Ele
piscou e balançou a cabeça. Parecia que algo havia
travado em seus processos cognitivos básicos. Talvez fosse
pela exaustão ou por causa de algum golpe forte na
cabeça. “Digo, como chegou até aqui? Como entrou?”
“Não, obrigado.”
393
“Vaping é para crianças, Sr. Kurzmann.” Davis deu
um bom trago em seu cigarro. “Verei o que posso fazer
sobre Valdez.”
395
Top to Bottom era uma construção vitoriana
remodelada e situada no centro de Toronto. Tinha três
andares de diversão, dois bares, uma piscina interna e
sauna e um sistema simples de pulseiras para indicar
quem consentisse em participar. O funcionário que levava
Alison e Donnie até o vestiário explicava tudo enquanto
subiam as escadas. “Vocês estão com a pulseira branca,
então todos sabem que são prospects. Isso significa que
irão esperar até que vocês os abordem.”
397
melhoras maneiras de lutar contra os padrões nocivos de
beleza que—”
398
Ao lado dela, Donnie engasgou. Alison apelou para
seu treinamento em teatro para obter inspiração. Ela
respirou fundo, puxando ar até seu diafragma. O que
Sarah faria nessa situação? Sarah certamente não
deixaria esse bandido pegar o pen drive. Alison arriscou
um olhar a ele. Ele havia se despido, assim como eles,
possivelmente para evitar suspeitas.
399
Alison teria tomado isso por uma oportunidade de entrar
na fila.
400
preta que indicava que ele era um membro que podia ser
seguramente abordado em caso de assédio.
“Hum...”
401
“Eu odeio noite dos solteiros.” A pequena idosa disse.
Então ela franziu a testa. “Espere, você disse clone?”
402
“Sabe, acho que me assumir clone para os meus pais
foi bem mais estressante do que propriamente sair do
armário.” Cosima disse.
“Claro.”
405
Vivi franziu a testa. “Mas seu genoma foi patenteado
e você quase morreu.” Ela disse. “Múltiplas vezes,
inclusive agora há pouco. Tipo, duas horas atrás.”
408
“Vivi Valdez.” Vivi disse. “CIA. Ou pelo menos eu era.
Provavelmente não sou bem vinda lá a esse ponto.”
409
Vivi congelou. O rosto da recém-chegada não tinha o
aspecto mais velho que o das outras. Exceto pelo nariz
reto, era exatamente como o dela. Os pelos de sua nuca se
arrepiaram. Não podia ser. Por que ela estaria aqui? Por
que uma das clones americanas estaria aqui? O que
poderia as ter trazido até aqui?
411
Rumores locais diziam que uma vez houve um bar
secreto naquele hotel, o qual possuía apenas vinte e
quatro assentos e era estilizado como um submarino.
Havia portinholas que davam para um azul profundo e
brilhante. Então mentes mais modernas haviam tomado
a direção e o submarino havia se tornado aquele
mezanino. Agora Alexander Davis se encontrava sentado
ali, encarando a enorme cabeça de alce que pairava sobre
a lareira perigosamente grande do lobby do hotel. Em
seguida, um garçom se aproximou com um dry martini
aproximadamente do tamanho de uma piscina de criança
e um telefone.
412
“Como conseguiu este número?” O sotaque afetado
do outro lado da ligação era ríspido e azedo como uma
maçã verde. “Quem é?”
“É um repórter?”
“Não.”
“É da polícia?”
413
“Eu gostaria de te ajudar a navegar por essas águas,
se me permitir. Eu assisti à sua entrevista recentemente.
Realmente acho que podemos nos ajudar.”
414
“Se você conseguiu encontrar este número, então
certamente saberá encontrar o lugar.”
415
‘Coragem líquida’ parecia ser a única solução para o
tipo de constrangimento social que pairava ali. As clones
de segunda geração se encontrando após uma separação
prolongada; Cosima interagindo com a policial que a
prendera; a mesma policial despertando algum tipo
profundamente esquisito e provavelmente tóxico de
química em Art; Art bravo com Charlotte por ter fugido;
Charlotte doente com o que quer que fosse que a
americlone Dana tinha; Alison e Donnie tendo frustrado
alguém que havia tentado tomar o pendrive de Sturgis
deles no sex club do qual eles eram membros.
417
“Genocídio.” Delphine disse.
418
comigo, não sei dizer se o Ministério realmente sabe disso
ou não — foi customizar um vírus que afetaria apenas
clones.”
419
Risadas vazias e tristes. Não era a melhor piada que
ela já havia feito, sim, mas serviu para aliviar as coisas
um pouco.
422
“É como eles estão fazendo isso.” Cosima parecia
enjoada.
423
“Eu falo.” Dana se voluntariou do sofá. Todos se
viraram para olhá-la. Dana sorriu. “Eu fiz meu trabalho
de campo de etnografia no norte do Québec.”
424
Rachel Duncan chegou ao Artichoke Room quase
meia hora mais cedo. Ela entregou ao homem na porta
seu sobretudo e seu cachecol, mencionou seu nome e pediu
gentilmente para ser levada à sala de encontros agora, ao
invés de esperar no salão de entrada até que seu
convidado chegasse. Ela tinha ligações a fazer e e-mails a
responder, ela havia dito. O concierge concordou e a
guiou, através de pilares espelhados e um longo bar de
mármore, por uma escada curvada, até o segundo andar,
onde uma sala de jantar privada se encontrava, oposta à
sala de jantar principal.
“Chimichurri ou mignonette?”
426
Rachel olhou através das cortinas para se certificar
de que o hall lá fora estava completamente vazio, então
começou a examinar a sala. Ela começou passando os
dedos por debaixo das bordas da mesa, procurando
possíveis dispositivos de escuta. Então repetiu em cada
cadeira. Ela tirou uma pequena câmera e examinou os
cantos da sala. Nada. Sem vigilância, além do que o
restaurante já possuía. Isso não significava que o Sr. Voz
Esquisita do Telefone não teria seus próprios dispositivos,
claro. Na verdade, ela esperava que ele tivesse. Era por
isso que ela havia fixado uma câmera escondida e um
microfone ao seu blazer branco, na forma de um broche
que lembrava uma flor de crisântemo. O dispositivo
enviaria a gravação diretamente a um aplicativo em seu
celular, que a criptografaria e a armazenaria, na nuvem,
em um arquivo que só se abria com a chave dela.
427
“Olá, Rachel.” Ele disse, quando o funcionário se
retirou. Sua mão estava ressecada quando ela o
cumprimentou. A pele era quase como papel. Ele tinha
rugas como alguém que fumava há muito tempo. Isso
dificultava a determinação de sua idade. Ele poderia
estar próximo da aposentadoria ou poderia ser alguém de
meia idade que apenas envelhecia cedo. “Meu nome é
Alexander Davis.”
428
Alex acenou. “Estou muito interessado em sua
história.”
429
Mas ele retirou um dispositivo e o colocou sobre a
mesa. Rachel não reconhecia a marca. Parecia grosseiro,
como algo a ser usado em algum tipo de campo de
combate. A sensação em seu estômago piorou. Ela assistiu
enquanto Alex acionava o dispositivo. Ela assistiu a ele
passando pelos menus. Então assistiu enquanto ele
revelava o rosto de Alison. Então Cosima. E, finalmente,
o rosto de Sarah Manning. Diferente das outras fotos,
aquela não era só dela. Era a fotografia de duas moças:
mãe e filha.
430
“Preciso que você me diga o que sabe.” Ele disse.
“Quem são essas mulheres? O que as faz funcionar? Elas
cooperariam com pesquisas futuras?”
431
“Não quero acordos.” Rachel disse. “Eu quero um
contrato. Quero uma nova vida. Quero a minha vida
antiga de volta.”
“Couture?”
432
laboratórios de fertilidade da Brightborn, até as
atividades da Neoevolução e o destino final de P. T.
Westmoreland.”
“Michael...?”
435
“Essa cara não está muito legal.” Rachel disse,
agarrando-o pelos cabelos. Ela acertou a testa dele contra
a borda da mesa. Ele colapsou no chão. Uma parte remota
dela esperava que ele perdesse a consciência
completamente e se mijasse. Ela não teve tempo de ficar
para assistir, no entanto. Recuperando sua bolsa, ela
fechou as cortinas da sala e desceu as escadas com pressa.
436
“É, bem, talvez você não devesse ter misturado
tequila com Tamiflu.”
440
Episódio 09
Que aspecto
adotamos
444
grande como um tanque, com pneus enormes cobertos de
neve. Parecia militar.
“Kira?”
445
Kira deu um riso baixo. Ele meio que era a única
pessoa que ela não ligava de chamá-la pelo seu apelido
antigo.
446
A segunda clone as alcançou para apertar a mão de
Kira. “Olá, sou a Dana. Prazer te conhecer.” Ela apertou
a de Em em seguida.
Kira riu.
448
“Eu sei disso também. Mas ainda somos família, você
querendo ou não.” Helena olhou para Kira. “E estou aqui
para manter minha família viva.”
“Sério?”
Felix suspirou.
451
Os planos de Greg Kurzmann não incluíam uma
tempestade. Ele só conseguia enxergar branco fora da
janela do helicóptero e duvidava que a cabine do piloto
estivesse muito diferente. Não estava muito esperançoso
de aterrissar tão cedo.
452
Evans se inclinou para a frente e levantou ainda
mais a voz, como se Greg não tivesse ouvido todas as
insípidas palavras que ele havia dito na última hora.
“Tem certeza de que não deveríamos usar equipamentos
de proteção? Se essas coisas conseguem atravessar todas
aquelas roupas de inverno...”
“Há menos que sua avó tenha vindo dessa vila e você
não nos contou isso, você vai ficar bem. Esse é o objetivo
da coisa toda de direcionamento genético.” Greg disse.
453
“Está bem, mas vou ter que aterrissar um pouco
afastado da vila. Estou vendo um bom ponto de pouso e
vou tentar lá enquanto posso. Segurem-se em algo!”
Evans rosnou.
456
Uma mulher foi iluminada pela luz. Aquela vadia do
cabelo ruivo.
“Como—?”
457
“Machuca do mesmo jeito. Eu tenho uma mira muito
boa. Afaste-se dele.”
458
“Merda!” Greg atirou enquanto ela mergulhava,
pegava um tanto de neve e corria em direção ao
helicóptero.
459
“Não seja um covarde. Ande logo.” Greg trocou o
revólver por uma lanterna e correu atrás de uma das
clones, torcendo para que fosse a Valdez de verdade,
enquanto o piloto caçava a outra. Felizmente, suas
pegadas eram visíveis na neve.
460
“Eu realmente acho que você não deve fazer isto.” Art
disse, pela bilionésima vez.
462
Kira, Em e Dana se amontoaram na neve atrás da
árvore e assistiram a Kurzmann e seu capanga
desaparecerem atrás de Vivi e Helena em meio às
árvores.
464
Elas abriram a porta e entraram.
A tela piscou.
“Nada!” Em disse.
467
“Vou mandar uma mensagem para Vivi.” Dana disse,
enquanto se apressavam em direção a Nasgwine’g.
468
Felix se irritou com o zumbido barulhento,
balançando sua raquete elétrica no ar. Vivi adquirira
algumas para eles na estrada — era o mais próximo que
teriam do bastão elétrico que fritara os mosquitos no
laboratório de Sturgis.
469
gritando para as pessoas saírem de suas camas e se
prepararem para um ataque, se sentindo como um Paul
Revere moderno. Só que, neste caso, ele era um inglês
avisando as pessoas sobre os canadenses, que
aparentemente os atacavam com mosquitos robóticos. É,
se fosse com ele, ele provavelmente mandaria se danar
também, então voltaria a dormir.
470
Jaysara dirigiu devagar até o colégio abandonado,
com os faróis do carro acesos. Deitado no banco de trás,
Arthur Bell levantou a cabeça e espiou pela janela.
“Nem me fale.”
“E?”
471
“Hum, sei.” Ele disse. “Eu costumava pegar garotos
invadindo lugares assim. Não parece seguro ali dentro.
Você não parecer ser do tipo exploradora urbana.”
472
Ela dirigiu em volta da escola mais uma vez. Quando
ela chegou à entrada de novo, um sedã preto estava
estacionado lá, no lugar onde ela deixara Art.
Seu instinto dizia que ela deveria sair, mas ela não
podia simplesmente se virar agora—
473
“Alexander Davis?” Jaysara perguntou, quando ele
estava ao alcance de sua voz.
474
“O que você pode me dizer sobre o seu caso até agora?
Alguma pista que possa me ajudar a localizá-la?” Davis
tragou o cigarro.
“Ah, é?”
476
construída tentando amarrá-los e manter a agência e a
nação a salvo.” Davis largou o cigarro e, de repente, tirou
uma arma da manga, mirando-a em Jaysara. “E agora,
sargento, lamento lhe informar, mas você se tornou um
fio solto. Vou perguntar uma última vez. Você sabe onde
a Valdez está? Pense com muito cuidado antes de
responder.”
477
A melhor presa era aquela que pensava ser o
predador.
478
tudo o que tinha quando voltou. É claro que, enquanto ela
estava fora desta vez, tudo tinha virado uma bagunça.
479
Helena golpeou a arma para longe. Ela cuspiu nele.
“Você quer matar os habitantes inocentes da vila?
Crianças?”
480
Jaysara tentou golpear Davis, mas ele avançou
contra ela mais rápido do que ela esperava, acertando o
cabo da arma em seu rosto. Ela cambaleou para trás, se
ajoelhando sobre um de seus joelhos, mas, quando
superou a dor, viu Davis sorrindo e segurando seu pulso,
a arma pendendo de sua mão. Ela se preparou para outro
golpe, mas então Art chegou, mirando a arma para a
cabeça de Davis.
482
“Largue sua arma também!” O homem de corte
militar disse.
483
estará num avião para algum país de terceiro mundo com
leis de interrogatório extremamente frouxas.”
484
Charlotte estava em seu quarto de brinquedos, seu
cabelo recém penteado, vestindo um vestido claro e
brincando com suas bonequinhas de papel. Uma longa
corrente, feita a partir de uma folha interminável de
papel branco, centenas e centenas delas. Ela sentava em
uma cadeira de seu tamanho com a tesoura na mão,
cuidadosamente libertando as pequenas garotas de papel,
uma de cada vez. Clip. Clip. Cada uma flutuava
silenciosamente até o chão de carpete enquanto ela
cantava.
“... Mãe?”
486
mas precisaria comer algo primeiro se tivesse intenção de
ficar em pé tanto tempo.
487
“Eu cuido disso.” Disse a tia Alison, pulando para
pegar um copo. “Quer gelo?”
488
“Fui eu.” Charlotte disse. “Fui eu. Eu contei a eles.”
489
como se quisesse dizer alguma coisa e depois soltou um
suspiro raivoso.
490
“Vocês têm alguma ideia de como é falar coisas
perfeitamente sensatas, de novo e de novo, e ser ignorada
simplesmente por causa da sua idade? Nenhuma de vocês
sequer se importou em me dizer porque o que eu estava
dizendo estava errado, vocês simplesmente se recusaram
a reconhecer o que eu dizia. Como se nada que saísse da
minha boca pudesse ser importante.”
491
fingir que não são clones e torcer para que o resto do
mundo finja também? Para sempre? Não vai dar certo!”
492
lado dela. “Venha sentar. Vamos conversar. Conversar de
verdade.”
493
“Sempre pioram.” Alison disse.
495
Enquanto o amanhecer surgia em uma manhã
sombria, flocos de neve ainda caindo insistentemente,
Kira, Em e Dana chegaram a Nasgwine'g. As luzes de
energia solar da rua piscaram quando chegaram, o que
Kira esperava que não fosse um mau presságio.
496
vetor?” Ela suspirou. “Eu já estou odiando essas
coisinhas."
497
“Bacana.” Disse Dana.
498
brandindo sua arma. “Ah, deixa pra lá. Nós sabemos onde
vocês estão.”
500
Vivi estava ocupada desviando dos tiros de Greg
Kurzmann quando seu telefone vibrou. Era uma
mensagem de Dana: “Na aldeia. Cercadas por homens de
Kurzmann. Uma ajuda seria ótima.”
Ah, merda.
502
Os moradores murmuravam entre si. Alguns deles
erguiam celulares, gravando a coisa toda. Dana começou
a gritar algo em francês. Vivi desejou poder entender.
504
ela pudesse se provar inteligente e valiosa o suficiente
para que a aceitassem de volta.
505
pudesse fugir. Vivi se moveu para ajudá-la. Ela deu um
soco no rosto de Kurzmann e ele caiu como um saco de
batatas. Tão satisfatório.
506
Ainda caído de costas, Kurzmann sorriu
selvagemente para ela do chão. “Não tenha tanta certeza
disso. Eu tenho amigos poderosos e influentes.”
507
Vencemos, Kira pensou. Enquanto Dana explicava à
multidão atordoada o que havia acontecido, com a
evidência dos mosquitos à sua volta, o humor dos
moradores mudou— embora eles ainda mantivessem
certa distância dos clones.
508
Kira se virou. Em encontrou seu olhar, e sua
expressão era tudo.
509
Episódio 10
Abrace a
diversidade
“Talvez pudéssemos—”
512
Cosima desviou sua atenção dos gritos de Sarah para
a TV. A tela mostrava vídeos de baixa qualidade feitos
com o celular de alguém que filmava uma multidão de
pessoas raivosas no meio de uma nevasca e, pela deusa,
sim, havia uma clone, Dana, com uma arma apontada
para sua cabeça. “Ah, merda.” Alguém disse ao lado de
Cosima, mas ela não conseguia tirar os olhos da tela.
Então Vivi apareceu, andando devagar, e a multidão
parecia pulsar de raiva. Alguém gritou. A gravação deu
um pulo, balançou, então foi cortada. “Merda.” Cosima
disse.
514
Cosima pegou o telefone, ativou o viva-voz e discou o
número de Kira. Tocou apenas uma vez até que ela
atendesse.
“Conseguimos! Conseguimos!”
516
“Vou falar com ela.” Delphine disse, indo em direção
à porta.
517
Jaysara hesitou por um momento ao pé da porta do
que ela começava a chamar de ‘mansão clone’. Talvez ela
devesse ter ido direto ao RCMP e tentado direcionar todos
os recursos deles para recuperar Art.
518
A porta se abriu para revelar Cosima, só que com
cabelo liso e franjinha. Não é a Cosima. Quando Jaysara
se acostumaria a isso? E qual era o nome dessa aqui?
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Cosima revirou os olhos para ela. “Não. Deve ser—
ah, merda, os biscoitos de Delphine!” Ela se virou e correu
para a cozinha. Alison lançou um olhar exasperado a
Jaysara e Sarah e as três foram atrás.
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“Não, claro que não.” Jaysara retrucou, apesar de ter
visto uma expressão no rosto de Sarah que a fez pensar
que, ao menos para aquela clone, espiã assassina em troca
de amigo próximo talvez parecesse uma boa barganha.
“Mas ela conhece este cara ou então pelo menos conhece
a organização. Ela terá uma ideia melhor do que nós
temos sobre o que ele quer e quais seus pontos fracos.”
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Cosima checou o relógio na parede, que imitava uma
TARDIS. “Vale a pena pelo menos consultar Vivi sobre
isso.”
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“A chefe dele é, era, a General Eloise Thibault. Ela é
uma condecorada—” Mas antes que Jaysara pudesse
terminar a apresentação cética que Martinez descrevera,
Cosima estava a meio caminho da porta.
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Quando chegaram ao tráfico de Toronto, a atmosfera
no Prius do tio Fee era... bom, “tensa” seria uma maneira
gentil de se colocar. Desde a chamada no celular, tio Felix
esteve dando bronca em Kira por não ter avisado à sua
mãe que estava bem desde que a confusão acabara. Após
um tempo, Kira perdeu a paciência e questionou porque
ele não ligara, agora ele estava de mau humor e ela se
sentia culpada por ter brigado com seu tio favorito. Toda
a sensação de triunfo que viera do sucesso deles na vila
havia evaporado. Enquanto isso, Dana sentava-se
aninhada no banco de trás, encarando a neve que caía lá
fora.
“Ela se foi.”
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estava lutando tanto contra as lágrimas que não se
importou.
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“Sim, mesmo.” Sarah disse com firmeza. “Eu sempre
quis te proteger de toda essa coisa de clones. Eu nunca
realmente pensei que podíamos ter feito... desse jeito.”
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“É isto.” Jaysara disse. “Vou voltar para o RCMP.”
Ela passara os últimos trinta minutos, enquanto Felix
explicava direito o que aconteceu no Québec, tentando
pensar em algum plano melhor. Mas não conseguiu.
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estou me colocando em perigo, tia Alison, porque estudei
artes marciais por oito anos! Eu luto melhor que você!”
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A recepcionista do estúdio de TV foi bem
compreensiva quando Delphine explicou ser uma colega
da general Thibault trazendo novas informações para ela
para o próximo quadro. Era meio que verdade, pensou
Delphine, seguindo as direções dela através de um
labirinto de cubículos, salas verdes e sets vistos através
de vidros à prova de som. Eloise precisava de algumas
informações. Como a de que clones eram pessoas, que
liberdade civil ainda era válida e que não se deve tirar
conclusões baseadas em informações limitadas.
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Delphine tomou um momento, tentando entender o
sentido do que ela dizia. “Ehhh... bien.” Ela disse, incerta.
“Mas se eles são tão violentos, isso só torna ainda menos
provável que os clones tenham instigado o tumulto...”
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“Você entende os riscos. Nossa segurança biométrica,
por exemplo. Pode encontrar os clones, mas não pode nos
dizer qual é qual.”
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A neve finalmente havia parado de cair, mas a
camada no chão ainda era funda o suficiente para tornar
difícil a caminhada e as calças de Vivi estavam
encharcadas. Ela havia arrastado alguns galhos atrás
dela para dificultar que seguissem seu rastro, mas, após
cerca de cinco horas, ela duvidava que alguém ainda a
estivesse seguindo.
“Uh...”
“Eu não s—” Ela era, na verdade, e era algo que Vivi
geralmente até se orgulhava de certa forma, mas
certamente ela não era só isso.
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“Uma excelente pergunta.” Uma voz disse atrás
dela. “O que você fez, general?”
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“Claro.” A moça disse, levantando os olhos
rapidamente de seu iPad. “Mas precisamos ir—” Ela
parou, encarando Cosima. “Você é... é uma clone, não é?”
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Art estava amarrado a uma cadeira em um
apartamento. Um apartamento de condomínio. Não um
armazém vazio, não uma sala dos fundos em algum bar.
O lugar parecia bem arrumado, com um vaso de flores no
centro da mesa. Como se houvesse sido preparado para
visitação ou algo assim.
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afastando a seringa. “Eu preciso manter isso como moeda
de troca, no caso de Vivi dificultar a entrega da arma. Mas
não quero esperar tanto tempo para te contar o que é. Eu
acho que vai gostar de saber.” Ele pousou outro longo
olhar pensativo sobre Art e, de repente, Art entendeu a
situação: Davis estava gostando de fazer aquilo.
Davis riu com mais vontade desta vez; ele deve ter
percebido parte do horror de Art em sua voz. “Então você
passará o vírus a outros vetores não-clones, que o
passarão a outros, uma pandemia da qual ninguém
saberá ou se importará o suficiente, porque tudo o que
causará é a morte de clones.”
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Davis fez uma careta. “Destruir os clones é uma boa
vantagem da história. Vai fechar algumas pontas soltas
as quais não apreciei muito ao assumir este trabalho. Mas
você deve entender que isso seria de uma utilidade
limitada.”
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da arma de maneira ‘preventiva’. Ainda mais, e o horror
subiu pela espinha de Art, se aquilo fosse irrastreável.
A campainha soou.
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“Aí está ela.” Davis disse. Ele pousou o cigarro na
beira do cinzeiro e enfiou a seringa no bolso de seu casaco.
“Espere sentado aí.”
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Cosima seguiu a figura militar de Eloise até o
estúdio, seu coração batendo forte. Ela pensou que iria
desmaiar, então forçou-se a contar suas respirações e
observar seus pés enquanto subia ao palco iluminado.
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“É isso mesmo, temos um clone — uma das poucas
que concordou a dar entrevistas públicas — aqui, para
discutir essas acusações.” A voz da apresentadora soou
clara, mas Cosima não se moveu. Todos estavam a vendo.
Aquilo era cem vezes pior do que sua defesa de doutorado.
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“Ah, é?” Cosima voltou a si, começando a se esquecer
de todas as pessoas que assistiam à cena. “Distorcido
como um programa secreto de pesquisa em clones
humanos? Porque eu sou prova viva de que isso é real. Por
que vocês não nos diz no que o laboratório do IPGT
trabalhava com o financiamento do seu departamento?”
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“Aqueles separatistas nem ao menos queriam ser
considerados canadenses!” Eloise disparou, mas se
conteve. “Não que faríamos algo do tipo, claro—”
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Alison alongou os ombros uma última vez, então
respirou fundo e entrou na personagem.
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paparazzi para que eles bloqueiem esse apartamento e
contem ao mundo exatamente o que você está tramando.”
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Art estava preso a uma cadeira, mas não parecia ter
sido torturado. Assim que Jaysara percebeu isso, ela
ouviu o som de uma porta aberta ecoando das escadas
abaixo.
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“Arrgh!” Jaysara se ouviu gritando, mas parou. Não
houvera impacto algum. Ela passou as mãos nas pernas,
só para ter certeza. Uma granada de luz, só isso. Ela
piscou o mais rápido que pôde e sua visão começou a
voltar através do brilho de superexposição, bem a tempo
de ver Davis se inclinando sobre Art, com a seringa em
sua mão, enquanto Art tentava se afastar o máximo que
conseguia.
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“E... vamos para o comercial.” O diretor de notícias
disse, enquanto um par de oficiais escoltavam uma
raivosa Eloise algemada para fora do palco. Acontece que
nem todos que estavam no estúdio haviam entrado lá
para espiar a clone. Jay havia convencido o RCMP de que
as acusações de Kurzmann em relação à general eram
confiáveis o suficiente para posicionar oficiais à paisana
no estúdio até que Cosima fizesse Eloise mostrar sua
verdadeira face. O fato de que ela ainda havia feito isso
durante a transmissão nacional era apenas a cereja do
bolo.
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não? Mas você pode colocar minha esposa aqui também?
Ela sabe de tudo tanto quanto eu.”
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“Sarah foi embora?” Art perguntou, assim que
Jaysara saiu do telefone que usava para reportar o
tiroteio.
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“Me desculpe...” Art disse. “Você provavelmente está
infectada agora também. Você tem que ligar para seu
pessoal e dizer que precisamos de procedimentos de
quarentena, senão vai vazar de vetor para vetor até que
eventualmente infecte algum clone.”
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Dois dias depois
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“Ei!” Kira disse. “Você fez a melhor decisão que podia
na época. Lembra que Cosima estava prestes a ir para a
cadeia? E além disso, você estava aprisionada. Nossas
tias estavam aprisionadas, mesmo que não admitam. E
você não acha que estas outras clones ficarão felizes,
eventualmente, de descobrir mais sobre si mesmas?”
“Nenhum corpo?”
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“Nenhum corpo. Mas havia muita neve e talvez
algum animal... Ou talvez ela só seja uma superespiã
mesmo e conseguiu escapar.”
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A festa já estava acontecendo quando elas subiram.
Charlotte foi em direção a Alison e Donnie, que contavam
a Delphine sobre o contrato que haviam assinado para
fazer um reality show chamado Clones em Casa, um
programa para mostrar como clones podiam levar uma
vida normal, suburbana e focada em suas famílias, como
qualquer outra pessoa.
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“Isso é incrível, tia Helena.” Charlotte disse,
educada, se perguntando o que diabos devia ter naquele
livro.
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Vivi emergiu das árvores cobertas de neve e avistou
uma estrada com construções em volta. Era apenas uma
pequena vila, remota e praticamente fora da rede, mas
estava do lado Vermont da fronteira. A falta de sinal de
celular favoreceu Vivi, porque havia uma cabina
telefônica na loja de conveniências, e ela pôde comer um
lanche decente e um delicioso pedaço de torta enquanto
esperava.
Foi quase quatro horas após ela fazer sua ligação que
um carro singularmente limpo e novo estacionou no
centro da cidade, parando por tempo apenas suficiente
para que Vivi entrasse no lado de passageiros.
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morta.” Decidiu não mencionar que Helena sabia dela.
Ainda não. “Ser uma clone ainda pode ter suas
vantagens.”
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Um mês depois
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“Ah!” Fee exclamou. “Tenho outra ligação. Por favor,
aguarde.” Ele desligou e bloqueou imediatamente o
número da mulher. Felix deixou escapar um suspiro de
alívio, então observou à sua volta o escritório que
Charlotte e Kira haviam improvisado no porão de Cosima
e Delphine. Era repleto de citações inspiradoras e livros
de gestão de crises e autoajuda. As garotas estavam
tentando de verdade reparar as coisas por expor as clones
e ele sabia que elas não aprovariam o jeito que ele estava
trabalho em seu turno na ‘Clone Care’, a linha direta de
suporte que elas haviam criado para clones recém
conscientes e suas famílias. Mas como ele deveria lidar
com todas as fraudes que ligavam? Ou com aqueles que
ligavam só para criticar clones? A maioria das ligações
nas últimas quatro horas se encaixavam em uma destas
duas categorias. Não era à toa que as meninas haviam
pedido para ele assumir por um dia para que elas
pudessem assistir TV, séries e serem jovens por um dia.
A coisa era meio perturbadora e ele começava a se
preocupar com todo o ódio e insanidade que Charlotte e
Kira estavam absorvendo através daquela linha direta.
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haviam feito para ele, lendo a primeira linha. “Meu nome
é Felix. Minha irmã é um clone. Gostaria de me dizer seu
nome?”
“Só ‘X’?”
“Isso.”
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“OK... estão dizendo que somos clones, mas, na
verdade, somos... aliens.”
“Eu sabia que não devia ter ligado para essa linha
direta idiota.” X disparou, antes de desligar.
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“Explica o quê?” Felix perguntou.
FIM
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