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Aprenda a escrever com Stephen King

– 33 dicas matadoras do mestre do


terror
Publicado por ​Vilto Reis​ em 26 de janeiro de 2018

A história de Stephen King seria muito diferente se não fosse sua


esposa, Tabitha.

Por muitos anos, King varou madrugadas escrevendo contos e tentando


ser publicado. Trabalhou até de tintureiro para sustentar a si e à família.
E chegou a jogar fora o manuscrito de ​Carrie, a estranha​ – que viria a
ser seu primeiro sucesso.

Carrie,​ aliás, rendeu um retorno inesperado ao autor. 2.500 dólares de


adiantamento dos direitos autorais e, depois, US$ 200 mil pela
brochura.

Seus livros viraram filmes de grande sucesso, como o próprio ​Carrie a


Estranha​, ou ​O Iluminado​ e ​Um Sonho de Liberdade​. E, como não
lembrar, o recente boom do ​remake​ de ​It, A Coisa​.

Mas todo esse sucesso não é gratuito. Tem um preço.


Como Stephen King alcançou o sucesso?

King costuma escrever 10 páginas por dia. Seja nos dias de Natal ou
Ano Novo, ele está na labuta. O que explica suas dezenas de romances
e centenas de contos. Talvez também explique seus mais de 350
milhões de exemplares vendidos no mundo.

Sua disciplina o leva a aconselhar: “Coloque sua mesa em um canto e,


todas as vezes em que se sentar para escrever, lembre-se da razão de
ela não estar no meio da sala. A vida não é um suporte à arte. É
exatamente o contrário”.

Muito longe de se considerar alguém virtuoso, Stephen King já passou


por poucas e boas. Inclusive foi alcóolatra e viciado em drogas. Chegou
a admitir que não tem lembrança alguma da escrita de alguns de seus
livros da década de oitenta.

Só houve um momento em que King parou de escrever.

Sobre a escrita, de Stephen King, e o que o fez parar de


escrever

Aconteceu em 1999, enquanto fazia uma caminhada próxima a sua


casa de veraneio, no Maine.

Ele foi atropelado.


Imagine você o estado em que ficou. Teve oito fissuras na coluna e
nove na perna. Quatro costelas quebradas e o joelho partido ao meio.

Neste período, King redigia o livro autobiográfico ​Sobre a Escrita.​

Uma leitura recomendada tanto para quem deseja conhecer mais


Stephen King como para quem quer se aprofundar na escrita.

Em boa parte do livro, o autor se dedica a contar sua história. Revela as


dificuldades que passou e como isso levou a construir sua visão de
escritor. E temos também, na sequência, seus conselhos sobre a arte
da escrita.

E para você já ir tendo um gostinho, separamos as 33 melhores dicas


que você encontra ali.
33 Conselhos sobre escrever, por Stephen King

Stephen King, Maine, Agosto de 2013

1) Escreva com a porta fechada, reescreva com a porta aberta. Em


outras palavras, você começa escrevendo algo só seu, mas depois o
texto precisa ir para a rua. Assim que você descobre qual é a história e
consegue contá-la direito – tanto quanto você for capaz -, ela passa a
pertencer a quem quiser ler.

2) Não deve haver telefone no seu local de escrita, certamente não deve
haver TV ou videogame pra você se distrair. Se tiver uma janela, feche
as cortinas.
3) A boa escrita costuma vir ao deixarmos o medo e a afetação de lado.
A própria afetação, que começa com a necessidade de definir certos
tipos de escrita como “bons” e outros como “ruins”, é um reflexo do
medo.

4) De meu ponto de vista, histórias e romances se dividem em três


partes: narração, que leva a história do ponto A para o ponto B e, por
fim, até o ponto Z; descrição, que cria uma realidade sensorial para o
leitor; e diálogo, que dá vida aos personagens através do discurso.

5) O advérbio não é seu amigo. Considere a frase ‘Ele fechou a porta


firmemente’. Não é de forma alguma uma frase horrível, me questione a
você mesmo se ‘firmemente’ realmente precisa estar lá. E o contexto? E
toda a inspiradora (pra não dizer emocionalmente tocante) prosa que
veio antes da frase? Não seria isso que deveria nos dizer de que forma
ele fechou a porta? E se a prosa precedente realmente diz, não seria
‘firmemente’ uma palavra sobrando? Não seria redundante?”

6) Em prosa expositiva, os parágrafos podem (e devem) ser


organizados e utilitários. O parágrafo expositivo ideal contém uma frase
síntese seguida por outras frases que explicam ou ampliam a primeira.

7) Para mim, a boa descrição consiste em apenas alguns detalhes


bem-escolhidos que vão falar por todo o resto.

8) Geralmente, as situações mais interessantes podem ser expressas


como uma pergunta do tipo “e se”.
9) Uma vez que sua história esteja no papel, porém, é preciso pensar no
que ela significa e enriquecer as versões posteriores com suas
conclusões. Fazer menos que isso é privar seu trabalho (e, por
consequência, seus leitores) da visão que faz de cada história que você
escreve única.

10) Em uma entrevista eu disse que histórias são como coisas


encontradas, como fósseis enterrados no chão, e o entrevistador disse
que não acreditava em mim. Eu disse que tudo bem, contanto que ele
acreditasse que eu assim acreditava. E acredito. Histórias não são
como camisetas ou videogames, são como relíquias, parte de um
mundo pré-existente não descoberto. O trabalho do escritor ou da
escritora é usar as ferramentas que possuem em sua caixa de
ferramentas para retira-las tão intactas quanto possível. Às vezes o
fóssil que você encontra é pequeno; uma concha. Às vezes é enorme,
um Tiranossauro Rex com suas costelas gigantes e dentes enormes. De
qualquer forma, contos ou romances de mil páginas, a técnica de
escavação é a mesma.

11) Sempre que penso em ritmo, eu volto a Elmore Leonard, que


explicou isso perfeitamente, dizendo que ele simplesmente deixava de
fora as partes chatas. Isso sugere cortar para dar velocidade ao ritmo, e
é o que a maioria acaba fazendo.
Uma família quase toda de escritores: Joe Hill, Tabitha
King, Kelly Braffet, Owen King, Stephen King, Naomi King
e o cachorro de Joe, McMurtry.

12) E, se você fizer seu trabalho, seus personagens vão ganhar vida e
começar a agir por conta própria. Sei que isso soa um pouco assustador
se você nunca tiver vivenciado algo parecido, mas é incrivelmente
divertido quando acontece. E vai resolver vários de seus problemas,
pode acreditar.

13) Escritores tímidos gostam da voz passiva pelo mesmo motivo que
amantes tímidos gostam de parceiros passivos. A voz passiva é segura.
O tímido escreve ‘a reunião acontecerá às sete horas’, porque isso de
alguma forma lhe diz, ‘Coloque dessa forma e as pessoas acreditarão
que você realmente sabe’. Coloque os ombros pra trás, levante o
queixo, e faça essa reunião acontecer! Escreva ‘a reunião é às sete’.
Pronto! Não se sente melhor?

14) A linguagem não precisa sempre usar gravata e sapatos amarrados.


O objeto da ficção não é a correção gramatical, mas sim fazer o leitor se
sentir bem vindo e contar uma história. Fazer ele ou ela esquecer,
sempre que possível, que ele ou ela estão lendo uma história.

15) Quando você escreve uma história, você está contando essa
história pra você. Quando você a reescreve, sua principal tarefa é jogar
fora tudo que não for a história.

16) O pano de fundo é tudo o que aconteceu antes de sua história


começar, mas tem algum impacto no enredo principal. Ele ajuda a
definir os personagens e a estabelecer suas motivações. Acho que é
importante inserir o pano de fundo o mais rápido possível, mas também
é importante fazer isso com graça.

17) Você precisa ler amplamente, refinando e redefinindo


constantemente seu próprio trabalho enquanto o faz. Se você não tem
tempo para ler, você não tem tempo (ou as ferramentas) para escrever.

18) Ler durante refeições é considerado grosseria em sociedades


educadas, mas se você pretende ser bem sucedido como escritor,
grosseria deve ser sua penúltima preocupação. A última deve ser uma
sociedade educada e o que ela espera. Se você pretende escrever tão
verdadeiramente quanto pode, seu dias como membro de uma
sociedade estão contados, de todo jeito.

19) (…) eliminar pronomes ambíguos (eu odeio pronomes, não confio
neles; são todos escorregadios como um advogado de porta de cadeia),
incluir frases esclarecedoras onde forem necessárias e, é claro, eliminar
todos os advérbios que eu puder (nunca consigo eliminar todos; nunca é
o suficiente).

20) O ritmo é a velocidade com que a narrativa se desenrola. Existe,


nos círculos editoriais, uma crença tácita (logo, não defendida e não
confirmada) de que as histórias mais bem-sucedidas comercialmente
têm ritmo vertiginoso.

21) A descrição é o que transforma o leitor em um participante sensorial


da história.

22) Precisamos conversar um pouco sobre pesquisa, que é um tipo de


pano de fundo especializado. E se você precisa fazer pesquisa, porque
algumas partes de sua história tratam de coisas sobre as quais você
sabe muito pouco ou nada, lembre-se sempre de que é o pano de fundo
dos acontecimentos. É lá que a pesquisa deve ficar: tão no fundo
quanto possível, misturada ao máximo no contexto.
23) A situação vem primeiro. Os personagens — sempre rasos e sem
características, no início — vêm depois.

24) “Não está ruim, mas está INCHADO. Reveja o tamanho. Fórmula: 2ª
versão = 1ª versão – 10%. Boa sorte”. […] O que a Fórmula me ensinou
é que todas as histórias e todos os romances são, até certo ponto,
reduzíveis.

25) Um apresentador uma vez me perguntou como eu escrevo. Minha


resposta – ‘uma palavra de cada vez’ – o deixou sem resposta. Acho
que ele não soube dizer se era ou não uma piada. Não era. No fim, é
simples assim. Seja uma página simples ou uma trilogia época como ‘O
Senhor dos Anéis’, o trabalho é sempre realizado uma palavra de cada
vez.
26) Ninguém pode imitar a maneira peculiar de um autor de se
aproximar de determinado gênero, ainda que possa parecer a coisa
mais simples. Pessoas que decidem fazer fortuna escrevendo como
outro autor não produzem nada além de imitações pálidas, em sua
maioria, porque vocabulário não é a mesma coisa que o sentimento e a
verdade compreendida pelo coração e pela mente.

27) O parágrafo de uma única frase lembra mais a fala que a escrita, e
isso é bom. Escrever é seduzir.

28) Estou convencido de que o medo é a raiz da maior parte das


escritas ruins. Dumbo conseguiu voar com a ajuda de uma pena
mágica; você pode sentir o desejo de usar um verbo passivo ou um
desses péssimos advérbios pelo mesmo motivo. Antes de faze-lo
apenas se lembre que o Dumbo não precisava da pena; a mágica
estava nele.

29) (…) uma das principais regras da boa ficção é nunca dizer algo que
você pode, em vez disso, nos mostrar.

30) A primeira versão de um livro – mesmo um livro longo – não deve


demorar mais de três meses para ser escrita, que é a duração de uma
estação do ano.

31) A segunda versão serve, por exemplo, para trabalhar o simbolismo


e o tema.

32) Se você nunca fez isso antes, ler seu próprio livro depois de seis
semanas de descanso será uma experiência estranha. É seu, você vai
reconhecer como sendo seu, até se lembrará qual a música que estava
tocando quando escreveu certo trecho, e ainda assim será como ler o
trabalho de outra pessoa, um irmão de alma, talvez. É assim que deve
ser, a razão pela qual você deu um tempo. É sempre mais fácil frustrar
os desejos de outra pessoa do que os seus próprios.

33) Quero encerrar este pequeno sermão com um aviso: começar com
as questões e as preocupações temáticas é receita certa para má
ficção. A boa ficção sempre começa com a história e progride até
chegar ao tema, ela quase nunca começa com o tema e progride até
chegar à história.

***

*Artigo original em:​ ​https://viltoreis.com/stephen-king/

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