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04782018 1799
ARTIGO ARTICLE
perspectiva resultados, avanços e desafios em tempos de crise
Abstract This article examines progress made Resumo O estudo analisa os avanços e desafios
towards the implementation of the core priorities da implementação da Política Nacional de Pro-
laid out in the National Health Promotion Policy moção da Saúde (PNPS) quanto às suas agendas
(PNPS, acronym in Portuguese) and current chal- prioritárias e aponta aspectos críticos para sua
lenges, highlighting aspects that are essential to sustentabilidade em tempos de crises. Estudo de
ensuring the sustainability of this policy in times revisão narrativa, abrangendo estudos publicados
of crisis. It consists of a narrative review drawing e documentação institucional. A PNPS foi aprova-
on published research and official government da em 2006 e revisada em 2014 e destaca a impor-
documents. The PNPS was approved in 2006 and tância dos condicionantes e determinantes sociais
revised in 2014 and emphasizes the importance da saúde no processo saúde-doença e tem como
of social determinants of health and the adoption pressupostos a intersetorialidade e a criação de re-
of an intersectoral approach to health promotion des de corresponsabilidade que buscam a melhoria
1
Escola de Enfermagem,
Universidade Federal de based on shared responsibility networks aimed da qualidade de vida. Foram descritos avanços nas
Minas Gerais. Av. Prof. at improving quality of life. Progress has been prioridades destacadas na PNPS, em programas
Alfredo Balena 190, Santa made across all core priorities: tackling the use of e ações de enfrentamento ao uso do tabaco e seus
Efigênia. 30130-100 Belo
Horizonte MG Brasil. tobacco and its derivatives; tackling alcohol and derivados; alimentação adequada e saudável; prá-
dcmalta@uol.com.br other drug abuse; promoting safe and sustainable ticas corporais e atividades físicas; promoção do
2
Departamento de Medicina mobility; adequate and healthy food; physical ac- desenvolvimento sustentável; o enfrentamento do
Preventiva, Escola Paulista
de Medicina, Universidade tivity; promoting a culture of peace and human uso abusivo de álcool e outras drogas; a promoção
Federal de São Paulo. São rights; and promoting sustainable development. da mobilidade segura e sustentável; e a promoção
Paulo SP Brasil. However, this progress is seriously threatened by da cultura da paz e de direitos humanos. Entre-
3
Núcleo de Pesquisas
Epidemiológicas em the grave political, economic and institutional cri- tanto, os avanços da PNPS apresentados podem
Nutrição e Saúde, Faculdade sis that plagues the country, notably budget cuts estar seriamente ameaçados frente à grave crise
de Saúde Pública, USP. São and a spending cap that limits public spending política, econômica e institucional que abateu o
Paulo SP Brasil.
4
Departamento de Saúde for the next 20 years imposed by Constitutional país, em especial os cortes orçamentários para os
Coletiva, Instituto de Amendment Nº 95, painting a future full of un- próximos 20 anos, com a Emenda Constitucional
Patologia Tropical e Saúde certainties. 95, desenhando um cenário futuro de muitas in-
Pública, Universidade
Federal de Goiás. Goiânia Key words Health promotion, Health policy, In- certezas.
GO Brasil. tersectorality, Regulation, Smoking Palavras-chave Promoção da saúde, Políticas de
5
Hospital das Clínicas, saúde, Intersetorialidade, Regulação, Tabagismo
Universidade Federal de
Goiás. Goiânia GO Brasil.
1800
Malta DC et al.
4,5
4
3,5
3
2,5
2
1,5
1
0,5
0
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Figura 1. Tendência temporal* do consumo abusivo de álcool e direção na população adulta brasileira, segundo
sexo, Vigitel, 2007 a 2016.
Fonte: Vigitel - Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas Não Transmissíveis, Ministério da
Saúde, 2016. Malta et al.13. Dados atualizados.
*Tendencia 2007 a 2016 – Sexo masculino – p = 0.0024, sexo feminino p = 0.0057, Total de adultos p = 0.0013.
5.948, de 26/10/2006), além de planos interse- cias, a exemplo do trabalho infantil, violência
toriais e setoriais, como: Plano Nacional de En- psicológica ou moral, negligência e abandono,
frentamento à Violência Sexual Infanto-juvenil tráfico de pessoas, violência por intervenção le-
(2007), Plano Juventude VIVA, que tem como gal20, as violências homofóbicas contra as mulhe-
objetivo prevenir os homicídios em jovens ne- res e homens em todas as idades e outras20. Em
gros. Esses avanços refletem a articulação inter- 2011 as violências passaram a ser registradas no
setorial com outros órgãos e instituições, um dos Sistema de Informação de Agravos de Notifica-
pilares da PNPS3. ção (SINAN) com a publicação da Portaria nº
A Vigilância de Violências e Acidentes (VIVA) 204/201121.
no SUS visou conhecer a magnitude dos eventos, A Figura 2 mostra o crescimento das notifica-
em especial, as violências domésticas, classica- ções compulsórias de violência no período, que
mente subnotificadas. O VIVA, implantado em saltaram de 107.530 notificações em 2011, para
2006, permitiu revelar a violência doméstica e 242.347 em 2015, sendo 70% referentes à vio-
sexual que ainda permanece velada na sociedade, lência contra o sexo feminino. Estas notificações
além de captar a violência autoprovocada, como apontam a melhoria da captação destes eventos
as tentativas de suicídio, dentre outras violên- e a melhor estruturação da vigilância de violên-
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Malta DC et al.
300.000
242.347
250.000
188.728 198.113
200.000
157.033 162.575
150.000 143.953
107.530 132.177
100.000 109.024
75.033
50.000
0
2011 2012 2013 2014 2015
Figura 2. Número de notificações de violência interpessoal e autoprovocada (total e sexo feminino) – Brasil,
2011 a 2015.
cias. Além disto, permitiu articular ações de pro- Alimentação adequada e saudável
teção às vítimas entre o setor saúde e as redes de
Atenção e de Proteção às Pessoas em Situação de A prioridade dada a este tema na PNPS jus-
Violências20. tifica-se por ser um direito básico fundamental
Um dos desafios da PNPS é o alinhamento e um dos determinantes e condicionantes da
da política com a “Carta de Curitiba”22, um dos saúde. Diversas ações de Segurança Alimentar e
legados da “22ª Conferência Global de Promoção Nutricional (SAN) foram implementadas pelo
da Saúde da União Internacional para Promoção MS entre 2003 e 2015, entre elas: articulações in-
da Saúde e Educação (UIPES)”, que ocorreu em tersetoriais e intrassetoriais, buscando a produ-
maio de 2016 e que reafirma a necessidade de ção do cuidado e a autonomia dos indivíduos e
intervir nos determinantes e condicionantes so- das comunidades2,24. Cita-se ainda a implemen-
cioambientais para a promoção da saúde, tendo tação de equipes de apoio matricial (Núcleos de
a equidade como um ponto central, fundamental Apoio à Saúde da Família), o acompanhamento
para a promoção dos direitos humanos e da cul- sistemático das condicionalidades de saúde dos
tura de paz e não violência. beneficiários do Programa Bolsa Família (PBF), a
Outro grande desafio atual é o risco de re- implementação do Sistema Nacional de Vigilân-
trocesso nas políticas de direitos humanos e nos cia de Alimentar e Nutricional (SISVAN), o in-
marcos regulatórios, a exemplo da pressão de centivo ao aleitamento materno, as diversas ações
grupos econômicos e armamentistas por mu- de promoção da alimentação saudável na atenção
danças no Estatuto do Desarmamento (Lei nº básica, o Programa Saúde na Escola (PSE), criado
10.826, de 22/12/2003), uma das grandes ações por meio de Decreto Presidencial em 2007, im-
que reduziu os homicídios em 2004, demons- plantado em cerca de 87% dos municípios em
trando que é possível prevenir violências e que 2015. Destaca-se ainda as ações referentes à ali-
medidas como estas não podem ser abandona- mentação no Plano de ações estratégicas para o
das. Estudo de Souza et al.23, apontou redução enfrentamento das DCNT no Brasil 2011-2022,
de cerca de 3,2 mil homicídios em decorrência buscando incentivar o aumento do consumo de
do recolhimento de armas em 2004. Impõem-se, frutas e hortaliças, a redução do consumo de sal e
ainda, como importantes desafios enfrentar as deter o crescimento da obesidade9.
pressões que visam o rebaixamento da maioria O Guia Alimentar para a População Brasilei-
penal e garantir o Estatuto da Criança e do Ado- ra, versão 2006 e sua atualização em 2014, incluiu
lescente; bem como não permitir retrocessos na novos paradigmas sobre a necessidade de com-
Lei do Aborto que garante à mulher o direito de preensão das práticas alimentares no contexto
fazer um aborto nos casos previstos na legislação. do sistema alimentar e de forma coerente com
1805
em 2009, 2012 e 2015, e inquéritos domiciliares, financiamentos para projetos de atividade física,
como o suplemento de saúde da PNAD (2008) e alimentação saudável, prevenção do tabagismo,
a Pesquisa Nacional de Saúde (2013)3. da violência, além da capacitação de recursos hu-
Destaca-se o financiamento de projetos mu- manos e mobilização social3. O Comitê Gestor da
nicipais de atividade física, e a partir de 2011 a Política de Promoção à Saúde manteve reuniões
criação do Programa Academia da Saúde, com mensais entre 2005 a 2015, articulando e coorde-
estrutura física e incentivo às atividades comuni- nando as ações intra e intersetoriais, construindo
tárias ligadas à promoção da saúde3. Este modelo pautas articuladas e facilitando a integração dos
foi avaliado por diversos Universidades, utili- processos3. Sua continuidade é essencial para a
zando metodologias quantitativas e qualitativas, sustentabilidade da PNPS.
apontando a sua efetividade3,29,30. Foi demons- As diretrizes e as prioridades de uma política
trado que intervenções de base comunitária que pública como a PNPS, os esforços para sua im-
incluam atividade física, políticas públicas e pla- plementação e recursos disponibilizados dizem
nejamentos envolvendo a comunidade, são efi- muito sobre os valores que pautam os conceitos
cientes para o incremento dos níveis de atividade de saúde, cidadania, desenvolvimento sustentável
física populacionais29,30. O avanço do Programa e qualidade de vida para uma determinada so-
Academia da Saúde se deu pela sua articulação ciedade. Permitem reconhecer, ainda, o quanto o
com a atenção básica, buscando a integralidade Estado, por meio de ações intersetoriais, é capaz
das práticas, a inserção da promoção da saúde no de desenvolver ações e programas coerentes com
cotidiano das equipes e a articulação com os Nú- os princípios propugnados em políticas públicas
cleos de Apoio à Saúde da Família (NASF). desta natureza.
Entretanto, os avanços da PNPS estão seria-
Promoção do desenvolvimento sustentável mente ameaçados frente à grave crise política, eco-
nômica e institucional que abateu o país, agrava-
Entre os anos de 2006 e 2015, foram constru- da pelo golpe parlamentar em 2016, que desenha
ídas diversas parcerias intersetoriais envolvendo um cenário futuro de muitas incertezas, marcado
o Ministérios do Meio Ambiente, Integração, Ci- pela visão de estado mínimo, cortes orçamentá-
dades, Casa Civil, Secretarias Estaduais de Saúde rios, austeridade econômica, desregulamentação
e Secretarias Municipais de Saúde para a realiza- do estado, descontinuidade dos projetos que pro-
ção de Planos de Desenvolvimento Sustentável moviam a inclusão social, dentre outros32,33. O que
em áreas como a Região Turística do Meio Norte será do SUS e das políticas sociais nos próximos
(Piauí, Maranhão e Ceará); Plano de Desenvolvi- anos ainda é um capítulo em aberto. A aprovação
mento Regional Sustentável do Xingu, dentre ou- da Emenda Constitucional nº 95 e do Novo Regi-
tros. Destaca-se a realização da Conferencia Rio me Fiscal impõe o congelamento dos gastos pú-
+ 20 no país, e o seu relatório que reconheceu a blicos por 20 anos32,33. A diminuição de recursos
saúde como pré-condição para o desenvolvimen- federais afetará municípios e estados e resultará em
to sustentável e foi importante para a inclusão da retração significativa da oferta de ações e serviços
saúde como objetivos da Agenda de Desenvolvi- do SUS, incluindo-se os previstos na PNPS e que
mento Sustentável das Nações Unidas11,31. dependem de esforços intersetoriais, indicando
enormes dificuldades para a sustentabilidade da
PNPS e do próprio SUS.
Discussão Estudos de Stucker e Basu34 apontam que pa-
íses que adotaram cortes orçamentários preju-
O artigo apresenta um balanço dos resultados da dicam gravemente a saúde da sua população. A
PNPS, destacando avanços e desafios nas agen- austeridade econômica agrava ainda mais a cri-
das prioritárias. Foram financiados projetos de se, causam iniquidades e não são justas, pois há
promoção da saúde em municípios e criados redistribuição desigual dos sacrifícios. Portanto,
diversos programas (Vida no Trânsito, Acade- as medidas implementadas no Brasil só devem
mia da Saúde, Núcleos de Prevenção de Vio- agravar a crise e a saúde da população. Torna-se
lências e Promoção da Saúde, Saúde na Escola, urgente investir em estudos para medir o impac-
dentre outros). A revisão da PNPS em 2014 foi to da austeridade fiscal sobre as condições de vida
um marco no aperfeiçoamento da política e no e saúde da população brasileira.
engajamento dos atores no processo4. Outros Outro ponto crítico é o enfraquecimen-
avanços também devem ser destacados, como a to do papel regulatório do Estado. Eviden-
inserção da PNPS na programação orçamentária, cia-se a ampliação dos lobbies empresariais e
1807
Colaboradores
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